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STANDARD BANK ECONOMIC BRIEFING Entre o ‘Apertar do Cinto’ e o Alargar do Crescimento a Dois Dígitos

O Standard Bank realizou esta quinta-feira, 27 de Abril, em Maputo, a primeira sessão anual do Economic Briefing, um evento que chega este ano à sua 18.ª edição e que, bem mais do que apenas um instrumento para orientar os clientes em particular, é, de há anos a esta parte, um referencial de conhecimento (decision making e partilha de tendências macro-económicas do País e do Mundo) para o mercado nacional

No evento, em formato híbrido (presencial e virtual), o tema foi “Moçambique: As Complexidades do Caminho para uma Recuperação Económica Sustentável”.

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Bernardo Aparício, administrador delegado do Standard Bank em Moçambique, começou por sublinhar a “resiliência da economia moçambicana” em 2022, com a estabilidade do metical evidenciada nos últimos 18 meses, uma inflação com tendência decrescente e um crescimento a aumentar (4,2%) com perspectivas de regresso, no médio prazo (assim sejam aprovados os FID dos projectos de gás da Exxon e da segunda área de exploração offshore por parte da ENI) aos 7% ou 8%, “depois de anos de crescimento económico abaixo do crescimento médio da população”.

Depois, abordou o tema do investimento em infra-estruturas: “para nós representa uma grande aposta. Temos apoiado os grandes projectos, a N4 com a TRACK, a expansão do porto de Maputo, do porto de Nacala, a rede ferroviária e o corredor de Nacala e, mais recentemente, a linha Beira-Machipande. Isto está no nosso DNA.

O nosso compromisso continuará a apoiar a reabilitação da N1. Mesmo em projectos em que estão instituições como o Banco Mundial ou o BAD, este é o papel dos bancos comerciais – apoiar o Estado, os subcontratados e as PME, e o Standard quer ter um papel cada vez mais marcante do que o que já tem a esse nível. Continuamos comprometidos com o desenvolvimento das infra-estruturas em Moçambique”, disse.

Perspectivas de curto prazo

Fausio Mussá, chief economist do Standard Bank, fez, de seguida, uma análise mais detalhada da economia. Primeiro a visão global: “as implicações da desacelaração da economia mundial para uma economia mais frágil como a moçambicana são complexas e diversas. Nem sempre o crescimento gera transformação de uma economia. Prevê-se uma desaceleração económica global, com vários graus.

A mudança de política em relação ao covid-19 na China fez com que o País entrasse num ciclo de recuperação próprio e, no segundo semestre, isso irá alavancar outras economias, o que levará a uma desaceleração menos agressiva do que o esperado na economia mundial”, assinalou.

Inflação

Naquele que é um dos temas do último ano, Fáusio Mussá assinalou que, de acordo com as perspectivas do banco, “ainda demorará algum tempo até chegar, de novo, aos 2-3%, que é o limiar dos bancos centrais”, assinalando, no entanto, que “os mercados prevêem que a partir do próximo encontro destes bancos das economias mais avançadas irá haver o último aumento de taxas de juro, prevendo-se então que comecem a descer. Isto traz consigo algum risco. Será que os bancos centrais vão deixar de aumentar as taxas de juro cedo demais? E será isso correcto para conter a inflação e mantê-la na curva descendente?”, questionou.

Nova dinâmica na economia Mundial… e Moçambique

Depois, olhou em pormenor para a tendência a que se assiste, relativa a uma tendência (ou vontade dela) de ‘desdolarização da economia mundial. “Os BRICS estão a chegar a um acordo para reduzirem as trocas comerciais em dólares, os EUA irão reagir e a pergunta que fazemos é se o dólar mais forte ou mais fraco é impactante para uma economia como a de Moçambique, que tem grandes assimetrias.

Para resolver estas macro desigualdades é necessário ‘bons samaritanos’, e tenho dúvidas que haja muitos no mundo”, relevou. Olhando mais para África e aos números do FMI, há uma tendência, no geral, de recuperação das economias africanas. Mas há a questão generalizada da pressão sobre as balanças de pagamentos, com apenas Zâmbia e Angola sem terem défice da conta corrente e todos os outros países com pressão cambial negativa sobre as suas moedas.

Juntando um dólar forte a nível mundial a fazer aumentar a pressão sobre estas moedas, vimos uma depreciação generalizada das moedas locais africanas. Moçambique foi excepção, porque há um controlo apertado sobre estas questões”, disse. “A estabilidade macro-económica tem requerido alguma contenção, caracterizada por uma política monetária apertada, para ajudar a manter a estabilidade da moeda e conter a inflação. Observa-se também um espa- ço limitado da política fiscal para apoiar a aceleração económica, uma vez que a despesa de investimento se mantém relativamente baixa”.

Dívida pública é “problema”

“Em Moçambique, a dívida pública excede 100% do PIB, o que leva, em teoria, a que o Estado tenha espaço reduzido para o investimento face à urgência das despesas correntes. Em última análise, provoca um crescimento económico menos robusto. Aqui, os recursos naturais podem compensar o facto de o Estado estar a fazer um menor investimento.”

Desafios e oportunidades: liquidez é questão a resolver

“O País exporta, em média, 8 mil milhões de dólares (grandes projectos, responsáveis por 6,2 mil milhões) e o resto da economia dois mil milhões. Há um crescimento assinalável da exportação de commodities, como o carvão (que para além do aumento do preço nos mercados também viu a produção reforçada, em 2022, em 34%), e um aumento de volume de produção na agricultura (16%) que reflecte o bom trabalho do Governo em projectos como o Sustenta, por exemplo.

No entanto, apesar disto, a questão que se coloca quando falamos de exportações em Moçambique é que o mercado não está com liquidez de moeda externa. Nós consideramos que há aqui um elemento de muita pressão das importações sobre a liquidez – a importação de combustíveis – que, sozinha, consome dois mil milhões de dólares anualmente.

Temos visto um Banco Central muito proactivo junto da economia, suportando em 100% as facturas de importação de combustíveis, mas isto mudou recentemente, com a questão da redução das reservas internacionais.

O banco central aumentou o quoficiente de reservas obrigatórias e já foi anunciado que a partir de Abril vai suportar apenas 60% da factura de combustíveis, cabendo o resto aos bancos comerciais. O preço dos combustíveis em Moçambique é uma questão com impacto na política monetária. No ano passado houve três aumentos e esperamos mais este ano.

A Dívida

“Entre a despesa corrente e a de investimento, privilegia-se a corrente (salários e despesas imediatas do Estado), sendo que a de investimento tem vindo a cair, estando nos 8% do PIB e a corrente nos 28%. A questão que se coloca é: como acelerar o crescimento económico com uma política monetária aperta- da e um espaço reduzido para as despesas de investimento? Moçambique consome 25% a 26% para serviço da dívida, em juros e capital.

Podiam ser recursos para investimento em crescimento mais sustentável. É importante gerir a dívida pública e o programa do Governo com o FMI pressupõe o rácio da dívida abaixo dos 100%. É preciso ‘apertar o cinto’, uma expressão pouco popular, eu sei, mas é a forma de atingir esse desígnio”, apontou.

Crescimento económico a dois dígitos

“O crescimento será alavancado nos três projectos de gás natural. Estávamos com um PIB de 18 mil milhões em 2022, este ano chegará aos 20 mil milhões e experimentaremos anos com crescimento económico superior a 10%.

Se tirarmos o choque da pandemia, sempre que há desaceleração do IDE (Investimento Directo Estrangeiro), o PIB desacelera. Porque isto traz moeda externa e, nos anos em que houve crescimento do IDE, o mercado operou com moeda, a inflação era baixa e o crescimento acelerou”.

Sustentabilidade

“O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Moçambique comparado com o da região é dos mais baixos. Ou seja, para termos desenvolvimento, temos de incluir o factor humano, educação, saúde, acesso a infra-estruturas, tecnologia… Estes números da pobreza ajudam-nos a perceber que há um longo caminho a percorrer para termos um crescimento económico mais sustentável em Moçambique.

Falamos hoje em ESG, está no topo da agenda, e as empresas de todo o mundo estão a organizar-se para contribuir menos para degradar o meio ambiente, a olhar para a parte humana dos negócios e a colocar a governança com a importância que deve ter. Esta discussão faz-nos correr o risco de pensar que o sector privado pode substituir o sector público em relação aos ODS (Objectivos do Desenvolvimento Sustentável). O ESG pode complementar o esforço feito para alcançar um mundo mais justo e desenvolvido.

Olho para estes dois aspectos de forma complementar. Desde 2020 que o cumprimento dos 17 ODS está a sofrer com as crises e guerras, podendo vir a ficar esquecidos. Espero que a liderança mundial se reúna para dar avanço a isto.”

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