MARCOZERO 2023

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CONCEPÇÃO E IDEALIZAÇÃO Marcelle Lago TEXTOS Ivana Motta, Bárbara Mathias, Flávia Meireles, Marcelle Lago

2023 @ FESTIVAL MARCOZERO Qualquer parte dessa obra pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.

FOTOGRAFIA Thiago Sabino

PROJETO GRÁFICO

Mica Design & Cultura

REDAÇÃO E REVISÃO Cris Britto


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“As ruas desencantadas, a festa combatida, os tambores calados e as bandeiras recolhidas são crônicas do desencanto e da arenização das cidades.” Luís Antônio Simas (O corpo encantado das Ruas - 2021) “Uma cidade triste é fácil de ser corrompida” Flaira Ferro (Revólver)

Poéticas e políticas das artes que se

pensam desde a rua, com a rua, para a rua guiam o Festival Marco Zero, uma iniciativa que já nasceu se amostrando, se expondo ao encontro regado de incertezas, desafios, prazeres e provocações que moram nos espaços de fluxos e presenças diversas. Escolher agir com este componente-rua demarca a singularidade deste festival no território do DF e assenta uma sinergia com os fazeres das celebrações e festas pretas e populares. Sempre foi na rua que estas coletividades derramaram suas potências de resistência e reexistência em ações criativas, estéticas, simbólicas, celebrativas. Estas ocupações fomentam neste lugar-rua uma força de pulsão de vida, lutas e encantarias. Na rua se arreia o alguidar da oferenda.

Texto por Ivana Motta

Rua que é morada das forças de uma poética sagrado-cultural afro-indígena presente nas caboclarias, nas pombagiras, exus… lugar de eco, em alto e bom som, das risadas das encantadas/dos encantados/des encantades, da ginga de corpas malandras/corpos malandros/ corpes malandres. É na rua que pulsam os sambas, frevos, afoxés, os passinhos do funk, os maracatus, caboclinhos, as batalhas de break, os slams, cocos… Alegria como tecnologia coletiva/social de manutenção da vida. Lugar de manifestações sociais, das lutas políticas das coletividades, de visibilidade e materialidade das linhas de força de ideias, posicionamentos e seus tensionamentos relacionais. A rua revela, a seus modos e para quem quiser ver, os fracassos de uma sociedade alicerçada sobre as fundações coloniais, escancarando desigualdades estruturantes e violentas preenchidas de marcadores de raça, gênero, classe, territorialidade e sexualidade. A rua, com sua existência também indisciplinar, convida ao exercício de ser/estar em co-movências, compreendendo modos dinâmicos de uma (des)organização própria.

Justamente por esta potência insurgente, este local também é um dos primeiros a ser cerceado, “disciplinado” para a manutenção de uma convenção social que pretende adestrar corpos/corpas/corpes, desejos e gestos. Como herança de uma experiência colonial/ocidental, nos vemos enredades por uma lógica binária que destitui possibilidades múltiplas e criou pólos diretamente opostos. Desconsidera-se as tantas matizes que podem ocorrer entre uma coisa e outra ou mesmo elementos que derramam-se de qualquer “linha reta” que pode ser traçada entre os extremos. Em diálogo com estruturas institucionais como a escola, a família, entre outras, as estratégias de limitação das existências se concretizam como política de Estado e estruturação de sociedade, tentando padronizar a nossa potente diversidade e abafar expressões que podem pluralizar nosso modo de viver em coletividade. Muniz Sodré em seu livro “Samba, o dono do corpo”, registra: É verdade que o sistema de poder da cultura ocidental se apoia numa estratégia de disjunção, na redução da heterogeneidade simbólica a um esquema de divisões binárias (produtor/consumidor, cultura/natureza, morte/vida, etc.) segundo o qual uma identidade só pode existir disjuntivamente como “isto ou aquilo” (...)” (SODRÉ, 1998, pg 55)

E ele mesmo nos lembra na sequência de seu texto que nenhum movimento de dominação e opressão é isento de enfrentar as resistências, a exemplo do Samba, tema de sua escrita. 1 Trabalhadora da arte e da cultura. Artista da dança, docente, curadora, pesquisadora e gestora cultural. Graduada em Dança pela UNICAMP; Especialista em Gestão e Políticas Culturais pela Universitat de Girona (ES) e Itaú Cultural; Especialista em Estudos Contemporâneos em Dança pela UFBA; Mestra e doutoranda em Artes Cênicas pelo PPG CEN- UnB

Sim, o samba, resistência cultural negra presente e pulsante em nossa sociedade brazuca-colonial. Aquela que ao mesmo tempo celebra, ama e se sacode ao som do seu “ziriguidum” enquanto rechaça a presença preta (e indígena) com as agruras de um racismo perverso. Sodré também nos faz um alerta: é importante não reduzir tais resistências apenas como oposição a uma situação adversa. Antes, são ações criativas, com agência própria, com políticas e intencionalidades que estão para além de algo provocado como possível reação direta. (…) nenhum poder se exerce sem que haja resistência. Talvez seja melhor dizer resistências: os incontáveis lugares que rompem as opacidades sociais e individuais instituídas pelo poder. Embora essas resistências - táticas, funcionamentos, matrizes de sentido - possam estar no interior do campo de poder, deste não são dedutíveis à maneira de uma contrapartida lógica, de uma classe negativamente complementar.

(SODRÉ, 1998, pg 56)

Diante destas questões, aciono aqui a possibilidade de pensar a ação artística na rua como enfrentamento e afirmação da vitalidade dos encontros. Como movimento de resistência, preenchida de intencionalidade, que assenta diálogos sociais, políticos e estéticos. Relaciono esta ideia ao Festival Marco Zero e o enuncio como possibilidade de saculejar algumas lógicas, abrir espaços oxigenados para pensar relações artes-públicos e colocar na roda algumas questões pertinentes. Quais são as possíveis “funções” da rua? Há algum lugar específico para o fazer/mover das artes cênicas (o teatro, o palco, o centro/ equipamento cultural)? Fazer arte na rua é “menos legítimo” do que fazer arte no palco?


No Marco Zero - Festival Internacional de Dança em Paisagem Urbana, é a inteireza da experiência que revela os afetos que conduzem os modos de relacionar arte, rua e transeunte. Nos espaços rueiros, os encontros não programados ou disciplinados por uma lógica dada pela função dos espaços, abrem a possibilidade do encanto fazendo do território do DF um chão possível e fertil para semeaduras poéticas. Dançar, performar, derivar, mover, cantar e festejar como ações políticas para encantar a cidade, potencializar o vigor e a força coletiva. Essas foram as oferendas trazidas pelo MZ 2023 e despachadas nas ruas de Taguatinga, Ceilândia e Plano Piloto, territórios nos proporcionaram encontros potentes entremeando artistas e públicos. Nesta edição, o fazer coletivo suleou a curadoria e afirmou a nossa fé neste modo de produzir arte e vida. A programação valorizou grupos, ajuntamentos, coletivos, núcleos e cias artísticas, um modo de afirmar a necessidade do fechamento, do bonde, da galera, dos encontros de corpas e corações. Um chamamento pra gente se pensar em povoada, sendo corpas coletivas, ancestrais, plurais, pra gente acreditar na força de memorar juntes como sabedoria de permanência e revitalização do axé. Outra questão que permeou nosso exercício de curadoria foi a articulação entre arte e as agendas populares, das coletividades indígenas, negras, femininas, LGBTQUIAPN+, das pessoas com deficiências,

entre outras, o que imprimiu desafios para ação curatorial, já tão atravessada por questões delicadas na abertura ou fechamento de espaços, na “escolha” de presenças e também de ausências. O que não entra em uma curadoria também diz muito sobre ela. Uma das questões que permanentemente me/nos atravessava era: como fazer uma curadoria carregada das sabedorias das gingas, que nos ensinam a todo tempo que os equilíbrios são dinâmicos e exigem a continuidade do mover? A resposta, ou as respostas, foram descobertas na compreensão coletiva das realidades que se apresentaram, na percepção ampliada da composição de uma programação, na implicação das existências/experiências das curadoras, nas escutas, no exercício político de perceber presenças e ausências históricas. Assim pudemos movimentar a curadoria em direções a (re)invenções, (re) fazimentos, Não se trata de inventar a roda, mas de perceber que ela pode girar no sentido anti horário e, assim como um xirê, abrir o campo dos tempos espiralares para assentarmos encontros reais e realizar exercícios críticos movimentados pelo visível e invisível. Se trata de pensar a curadoria como uma prática encantada-pragmática, em processo, movente, e que, em alguma medida, pode também nos fazer encarar limitações e lacunas. Diante de tudo isso, alimento minha disponibilidade e vontade de continuar exercitando os modos de estar junta para experienciar, vivenciar e criar tecnologias

curatoriais em sinergia com este festival. Atentar a seus posicionamentos, que passam por formular uma ação cultural que vá ao encontro das pessoas onde elas estão e converse com seu dia a dia, friccionando e ficcionando com o ordinário, que também tem seu componente poético. Passam por dialogar com artistes que, em seus fazeres, exercitam a disponibilidade para o jogo com o incerto e com o possível que mora no risco e no prazer de não adentrar a caixa cênica do teatro que é, em certa medida, um lugar de proteção. Passam por abrir um campo de percepção que borra as fronteiras pré - concebidas de um festival de dança para alquimizar experiências artísticas corporificadas em movências plurais, entre tantas outras questões. Sigo com as companheiras deste fazer, Bárbara Matias Kariri, Flavia Meireles e Marcelle Lago no labor e na feitura delicada, sorridente, crítica e comprometida de fiar e (con)fiar este Festival que me mobiliza em lugares únicos, pois me convida a viver intensamente arte e vida sem cisões. A rua como plataforma de fazer artístico é simultaneamente lugar político, onde se projetam questões urgentes de nossa sociedade, lugar de agenciar, pela imagem, pelo simbólico, pelo sensível, um outro programa ético-relacional que nos permita ser/estar em um mundo menos adoecedor e violento. É neste lugar que o Marco Zero movimenta suas energias e despacha, ano a ano, seus ebós artísticos nas encruzilhadas do DF.

Juntando as corpas rueiras, pluriversais, arruaçeiras, convocando a força das artes-encantarias, dos rezos, dos sons dos tambores, dos maracás e confiando nas movências poéticas-políticas para encantar o chão, acordar sensibilidades e fabular possibilidades, o MZ 2023 se fez em coletividade, celebrando as diversas formas de corporificar arte e encontros. Axé!

IVANA MOTA

BIBLIOGRAFIA SIMAS, Luiz Antonio. O Corpo Encantado das Ruas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021. SODRÉ, Muniz. Samba, o dono do corpo. 2 ed. Rio de Janeiro: Mauad, 1998.


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“No canto do cisco no canto do olho. A menina dança. E dentro da menina. A menina dança. E se você fecha o olho a menina ainda dança. Dentro da menina. Ainda dança. Até o sol raiar. Até o sol raiar” ...¹

Vivenciar a experiência de vários corpos dançando em tempos diferentes, em ruas diversas de um lugar que é marcado pelo símbolo do formal, do terno, da política das leis, do lugar onde assinam documentos que determinam o futuro do resto do país. É assim, que do interior do Ceará no auge dos meus trinta anos enxergava Brasília. Tem um ditado popular que diz: quem faz o lugar são as pessoas. E as pessoas que fazem Brasília são pessoas para além das que estão no Congresso, ainda que no congresso encontramos alguns de nós. Eu sou Barbara Matias, sou indígena do Povo Kariri e essa foi a minha primeira curadoria e talvez, o Marco Zero seja o primeiro festival de artes da Cena do Brasil com uma curadora indígena, gerindo narrativas,

Texto por Barbara Matias

escolhendo discursos a serem pautados. Os corpos ausentados historicamente insistindo em acontecer, em coletivo. Através do festival conheci várias realidades de Brasília, me apaixonei pela cor avermelhada e amarelada da região, pela insistência das arvores, pelo olhar barulhento dos transeuntes que ligeiramente parava para assistir as obras e pelo movimento dos artistas que se apresentaram no referido festival, com energia e vigor, me senti como na música “No canto do cisco no canto do olho. A menina dança” e dancei, não somente fisicamente, mas minha perspectiva de vida moveu-se, enxerguei outros mundos através de outras realidades que o Marco Zero partilhou.

1 A menina dança - Compositores: Antônio Carlos De Morais Pires / Luiz Dias Galvao. (1972). Disponível em https://www.letras.mus.br/os-novosbaianos/122203/ Acessado em 17 de agosto de 2023.

Curadoria Cura – Do – Ria A cura. A dor e a Ria que é a costas onde o mar é raso e os recortes são profundos, mas possível para a navegação. Curadoria. Aprendi também com Ivana Motta (Curadora do Festival) que curadoria é escolha. Escolher, significa ter que abrir mão, pelo menos por enquanto de outras possibilidades, a escolha envolve a ótica que estamos acostumados a olhar o mundo, ou a possibilidade de uma nova lente, envolve desejo político e afectual. E envolve saúde histórica, diante de um país que não olha para as próprias entranhas. Então, primeiramente fui indicada por Flavia Meireles (curadora), acolhida por Marcelle Lago (Idealizadora e produtora do festival) e Ivana (também curadora), me ajuntei nessa navegação entre a dor e a cura para nadar nesse mar que é o Marco Zero. É válida alembrar que em 2022 tive a oportunidade de me apresentar no festival com o espetáculo “Ané das Pedras”, o qual faço com Idiane Crudzá que é liderança espiritual do Povo Kariri Xocó e professora da Língua Karirí-Dzubukuá, após a apresentação naquela roda de conversa entre artistas, público e curadoria eu fiquei extremamente curiosa com o interesse no exercício de ampliação da ideia de dança, de corpos e de público também. Onde a palavras espontânea e sensível naquela conversa se repetiu algumas vezes. Então, eu me senti pertencente, em Ané dançamos com as padras e elas vão as mãos das pessoas para também

se moverem – é um movimento carregado da memória da pedra e da narrativa de cada corpo que se entrelaça entre a pedra e as nossas mãos. Voltei forte e no ano seguinte (2023) tive a imensa alegria de receber o convite para ser curadora, o qual aceitei imediatamente. Eu sou a primeira pessoa indígena no Brasil sendo curadora de um festival das artes da cena, que venham mais festivais como o Marco Zero para que mais parentas possam ocupar com dignidade e amorosidade, pensando, gerindo e aprendendo. É assim que me sinto. Reflorestando memórias através do nosso pisar na rua. Nossa musculatura carrega milhares de anos de (sobre) vivência, com ela, sem dúvidas o que mais fizemos foi dançar quando o movimentar-se, narrar -se no mundo por meio do gesto não era codificado como linguagem artística e sim, expressão de vida. Necessidade intuitiva de conversar com bichos, árvores e gente. A rua é o maior Arquipélago dos sonhos. É onde a vida se regenera a céu aberto. É o lugar com todo tipo de gente, de história de movência. A rua é antes de qualquer coisa, um lugar que já foi floresta, já foi mata, já teve onça, jibóia e veredas, muitas. Quando pisamos na rua estamos pronunciando o desejo de segredar com os ancestrais, pelo pé, mão, pelo olhar que fareja o mundo. O Festival Marco Zero 2023 escolheu fazer isso com artista que tem ligação com as memórias da luta pela terra,


aqueles que fazem luta política/resistência enquanto fazem o que chamamos de arte. Nosso desejo é alongar a musculatura para ativar essas arqueologias-vivas de uma memória que dança para a lua, para o sol, para a pessoa em situação de rua, para o político que passa na avenida em seu carro importado, para a criança indígena, preta, para a criançaLGBTQIAPN+. Dançar para perguntar e dançar quando ainda não se entende a resposta. Dançar pelo desejo de deslocar-se das dores, para expor as dores e dançar para plantar sonhos. Nesse desejo do corpo retroalimentar-se na paisagem - em 2023 insistimos em dançar coletivamente, então, propulsemos uma possibilidade de palco/ mundo/arruaçeiro com corpos diversos - corpos múltiplos, com as pessoas que sustentam esse país. Como a curadoria é composta por quatro mulheres com trajetórias de vida e realidade sociocultural diferentes, de regiões diversas do Brasil, a lente na hora de enxergar os trabalhos inscritos insiste em optar por obras que apresentem uma ótica em confluência com as necessidades dessas mulheres, então, as pessoas que dançam nesse festival, elas estão falando das travessia delas - memória de feminicídio, de festejo ao feminino, ancestralidade indígena e preta por meio da criação que dizem a que vinheram e dizer a que veio é o que a rua mais sabe fazer! Uma das coisas mais complexa é

curar um festival, mirar na escolha e confiar nela, por isso, tomei como base para esse ano alguns apontamentos. A discussão do Trabalho: O que o trabalho pergunta, do que se trata? Quem são os autores: De onde vem as pessoas que estão fazendo esse trabalho? Esse trabalho por si, responde porque as pessoas estão levantando essas questões? (quase redundante, mas reflexiva). E um caminho de confluência entre a obra e o festival: Qual a aposta para 2023 do festival Marco Zero? Vamos criar um roteiro a partir das obras curadas. Finalizo agradecendo e desejando fertilidade a esse festiva. É uma honra pertencer ao Marco Zero, viva a cena que acontece na rua, feito uma guerra que não para como a vida, bem vivona é a rua. Fluxo contínuo. Bocuwya!

BARBARA MATIAS Artista da cena e da escrita. Indigena do Povo Kariri, nasceu e se criou na aldeia Marrecas, Quitaíus, Lavras da Mangabeira, Ceará. Doutoranda em Artes na UFMG.


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Um fio de curadoria Fincando os pés na terra vermelha de Brasília, mais uma vez o Festival Marco Zero ocupa a cidade, de Taguatinga, passando por Ceilândia e Plano Piloto, impulsionando 24 intervenções urbanas e 1 mostra de videodança em 2023. O festival, em realidade, começa meses antes, quiça no ano anterior, já que a continuidade e ampliação da linha curatorial (com agora quatro curadoras) vem tecendo uma trama invisível que, embora pareça um evento, tem força de se estender de um ano a outro. Essa trama é alimentada e sustentada pelos/as/es artistas que participam do Festival – que, por sinal, vêm colando junto edição atrás de edição -, emprestando suas energias e fiando os pontos dessa rede de conexão que atravessa espaços e corpas. Não foi por acaso que o tema central por onde orbitaram as intervenções desse ano evocam a coletividade: na quantidade e

Texto por Flavia Meireles

na qualidade de sustentação de um coletivo, comunidade, grupo, ajuntamento, aldeia. Esse tema emergiu organicamente da edição de 2022 e a partir da inclusão de Bárbara Matias Kariri ao conjunto de curadoras, qual sejam: Ivana Motta, Marcele Lago e eu, Flavia Meireles. Esse quarteto, puxando o fio das conversas do ano anterior, aprofundou seus laços e desejos de encantar a cidade com camadas menos óbvias, mais perenes, de rocheda (como diz no Recife), latentes e, muitas vezes invisíveis a olho nu e sozinho. É a coletividade que faz emergir as camadas da cidade que se apresentam nessa edição, trazendo gente que sempre esteve lá e resiste, que são, por assim dizer, ancestrais. Estão lá antes de Brasília ser Brasília, ou quando da construção da cidade ou ainda nas futuras atualizações do que a cidade pode ser. Como diz a deputada federal Célia Xakriabá, uma voz repentista poeta parlamentar: “antes do Brasil da coroa, tem o Brasil do cocar”. E é com

esse cocar, maracás, sementes, cachimbos, pinturas corporais e gestos que o MZ virou terra e corpos vermelhos, tingindo tudo de jenipapo, em formas mais explicitas ou não. Em Taguatinga, no Mercado Sul, tivemos a explosiva Casa de Oninja, “emecizada” por Ruan Guajajara, numa ball room imantada de ancestralidade e glamour. O Baila Clava 4.0 mostrou como se produz comunidade e, numa parceria com o Festival, nos recebeu em sua casa-rua, cheia de cuidados e hospitalidade. Foi uma noite de mútuos aprendizados: um festival de dança encontra um movimento de ball- room na rua e os dois saem fortalecidos e vinculados. Um pouco depois temos a presença de Íris e Iara Campos, numa dança-oferenda intitulada “arreia”, saudando e jogando sementes do caboclinho 7 Flexas, de Recife. A dupla ocupa o gramado ao lado do Restaurante Universitário da UnB, chamando com sua flauta, dança e luta, os cabocos e a sagrada Jurema. Em seguida temos Oziel Ticuna e Ticuna Maguita apresentando danças tradicionais dos Ticuna. Quem apareceu por lá? Ruan Guajajara e es estudantes indígenas da UnB e mais uma coletividade se atualiza, agora em forma aldeada. A conversa após as intervenções verteu lágrimas dessa curadora por alinhavar pessoas indígenas, arte e espaço acadêmico, num debate que precisa mais e mais aparecer. É muita riqueza ver corpas indígenas, pretas e de todas as dissidências circulando pelas universidades.

Chegaram junto, ainda, a companhia Antípoda – cia de dança libras em cena, que havia se apresentado dias antes, no eixão. Fechando o círculo de aldear contamos com a performance Futura, de Lian Gaia, Idiane Crudzá e Lucas Dan, apresentada ao lado da igrejinha na Asa Sul. Ali víamos um espaço católico, uma igreja, conviver com rituais indígenas karirixocó, com rezos, cantos e danças, propondo uma convivência que não se deu na época da invasão colonial. Ver pessoas indígenas em sua plenitude, realizando rituais em pelo Plano Piloto, ao lado de Igreja Católica, infelizmente não é uma cena comum. Ainda com o fio da ancestralidade tivemos a intervenção “Breve Cultura Ancestral”, da Likida cia de dança, onde bonecas pretas de pano são cuidadas, bem como as longas e vermelhas tranças das três performers. Através de um delicado toque no manuseio das bonecas, há a evocação de proteger o Orí e um ritual sutil que envolve quem vê. Num outro movimento, vemos o artista Thiago Nau, com a intervenção “Ilógico” se alternar entre espectador de vídeo projetado em contra-plongée, na parte de baixo do viaduto do Setor Comercial Sul; dançarino, em sua dança suave, fluida e forte em piso quadriculado; e em dj tocando músicas autorais e convidando outros bboys e bgirls a fazerem sua passagem na pista preto e branca. Uma coletividade de várias funções (ver, dançar, tocar) vai se alternando também com o que chamamos de “público”, que vai sendo seduzido


a se aproximar da festa que culmina com Thiago nas carrapetas sonoras. Temos a sensação de que uma pessoa vai atraindo outras e quando vemos, a festa está produzida, embalada com sons de hip-hop e soul. Nesse viés de ir produzindo uma coletividade, dessa vez com a imagem do cardume, temos a intervenção “Sobrecarga”, da Cia. Navegris, que faz um passeio em silêncio, corpos curvados e agachados ou levando um fardo nas costas, que lentamente caminham da Rodoviária ao Conic, juntando uma multidão curiosa atrás. Uma maré lenta vai levando esse cardumecortejo. Igualmente em clima de cortejo, agora de Carnaval, temos a Fanfarra das Maludivas, que faz o mesmo caminho tocando músicas com temática feminista, numa banda de mulheres, um carnaval feminista. Em Taguatinga, vemos o trabalho “Qual mundo carrega em você”, do Coletivo Sistema. Trabalho de itinerância, o público também segue os dançarinos num percurso escolhido por eles. Imantando de energia dançante, pulsante e elétrica, a grande circulação de pessoas na Rodoviária ventou as passagens das companhias “Corpos entre mundos” e do trabalho “Reerguer”, de Karina Araújo, uma dança pulsante que diz a que veio e que foi recebida com entusiasmo pelos passantes. Ainda na rodô um raio passou com a cia Under 7 e o seu trabalho “Burnout”, que colocou uma multidão de dançarines precisos, ágeis e ligados de 220V dos movimentos. Numa energia da palhaçaria, tivemos a presença dos irmãos Sukulonsky Dançante, do Circomvida, trazendo

sua dupla acrobática e comunicativa para o Conic. Importante relembrar da presença do trabalho “Antípoda”, da cia de dança Libras em Cena, que coloca pra jogo a dança de libras, literalmente. No fim, o festival Marco Zero ganha seu próprio sinal de libras. O Setor Comercial Sul recebeu a performance “Ruído de fundo”, da Cia. Vísceras, propondo-nos uma caminhada com fones que bloqueiam o som circundante, e fazendo- nos viajar pelos becos e vielas sintonizades com uma “viagem interna” que são os barulhos que nosso próprio corpo faz ao caminhar. Ainda lá os passantes puderam testemunhar o trabalho “condutor e conduzido” no qual um vemos uma dança conviver com os olhos do dançarino grudado na tela do celular. Quem conduz, o dançarino ou o celular? Fica para nós a reflexão. No fim do horário comercial de trabalho, tivemos o artista Vanderlei Costa, sempre provocativo em suas intervenções, dessa vez com “Barranco”. Num momento muito forte, Vanderlei lembra de dois jovens que construíram o Setor Comercial Sul: Gilmar Marques e Expedito Xavier Gomes. Esses jovens, junto a tantos outros, construíram Brasília e seguem anonimizados, como muitos de nós. Vanderlei, com o corpo pintado de torre de TV, traz um homem-camadacidade- construção tornado número, na cidade de concreto. Na mesma esteira, agora das migrações, vemos o extenuante trabalho de Dyego Pizarro e seus companheiros que rolam no sol quente e no asfalto por quilômetros no eixão. O trabalho

“Migração sul- sul” é um perturbador lembrete dos corpos que se exaurem, que acabam e sofrem durante as migrações. Emprestando o seu axé pro festival, mais uma vez Nego Val se torna presença marcante. Dessa vez o artista mostra “Dança Lixo”, abordando a homofobia contra as bixas pretas e, ao mesmo tempo, seu deboche e insistência na vida. Nego Val faz trocadilho entre a música de Gal Costa “Meu nome é Gal”, sambando na cara da sociedade todo seu orgulho em existir como bixa preta. Nessa pegada do orgulho em ser o que se é, a dançarina Clara Oliveira apresenta “corpo-funk” na Ceilândia, reverenciando e chamando pra dança os diversos estilos do funk e suas danças e músicas marcantes. Uma verdadeira celebração da contribuição do funk para a dança e para a música. Também na Ceilândia, temos a artista Juliana Louzada com sua “medusa passista”, colocando-nos num lugar de estranhamento e atração com sua dança.

olhos e pelos e convidando a um momento sensual e seguro na rua. Encerrando essa edição, vimos o trabalho potente e arrebatador, tão lindo quanto uma grande onda no mar, da Cia Mutum, sob o título “Showcase”. Este trabalho nos mostra, no suor, na pele e na dança de cada um dos maravilhosos e versáteis integrantes, o quanto a gente pode viver as individualidades, isto é, nossas características singulares, dentro de um coletivo, num conjunto harmônico entre essas singularidades. Provocando tensão e tesão, es dançarines se entregam ao momento e à dança, nos mostrando como gestos criam prazer, conexão, compartilhamento e sentido de grupo. No fim, estávamos todos vibrando alto, com a certeza de que essa edição ainda vai reverberar pra nós por muito tempo. Que puxemos o fio da próxima! FLAVIA MEIRELES Artista, professora, pesquisadora, cuír lésbica futurista e sapatona convicta. Co-curadora do Festival Marco Zero desde

E, por fim, fechando o último dia do Festival Marco Zero, tivemos, pela primeira vez, uma programação noturna, ocupando o espaço entorno da estátua do zumbi, em frente ao Conic. A noite começa num clima de cabaré na rua, com a incrível apresentação da pole dancer Lalá Teles, trazendo o trabalho de stripper para a rua. Lalá, em um momento da performance, distribui pequenos panfletos com frases tais como “strippers efetuam trocas”, lembrando-nos sutilmente sobre a carga social em cima des trabalhadores/as da noite. “Às strippers, com carinho” estimulou um prazer coletivo durante a performance, atiçando nossos

2017. Professora de artes/dança e professora permanente do Programa de Pós-graduação em Relações Étnico-raciais do CEFET-RJ. Pesquisa arte, movimentos sociais, de/anti/contra colonialidade, indigeneidade, branquitude, gênero e sexualidade atravessados pelas relações étnico- raciais. Pós-doutora como Fellow do Projeto Mecila (Universidade de Colônia, Universidade de São Paulo e CEBRAP). Doutora em Comunicação e Cultura (UFRJ), mestra em Artes Visuais (UFRJ) e licenciada em Dança (Faculdade Angel Vianna). Foi pesquisadora visitante no Centre for Transforming Sexuality and Gender da University of Brighton (Reino Unido, 2022). Professora convidada na Leuphana University (Alemanha, 2023) em parceria interinstitucional com o PPRER/CEFET-RJ.



MANIFESTO

Texto por Marcelle Lago

Pulsação, rua, movimento genuíno, ocupação e pertencimento!!!

de precariedades, limitações financeiras e falta de trabalho.

Realizar um festival de dança todo nas ruas do DF, é dizer não a higienização dos centros culturais!! Curamos também onde queremos estar. E nosso lugar é na rua.

Nessa intervenção - Francisco Rio - convidou e convocou, sua rede de afetos, amores, pertencimento, com a seguinte orientação: - Venham a pé !!

PRECISO FALAR DAS DUAS ÚLTIMAS EDIÇÕES – 2022 E 2023

FRANCISCO fluiu num ritual cheio de vazios, luz, silencio, por do sol, árvore arquibancada plateia, cerrado, silêncio!! Localização – atrás do do Hospital dos olhos, muito simbólico!!! Porque atrás dos olhos tem a retina, onde se constrói as imagens que os olhos vem. Somos terreiro efêmero – material, imaterial, mágico!!!,

Abrimos a 5ª edição, com Francisco Rio e a performance - Rio Novo, Tempo e minhas Mães. O primeiro MZ pós 2017, pós extinção do MINC, pós pandemia. Em agosto de 2023 o sentimento de tensão percorria todos os fazedores de cultura, que atravessaram por um período precário com o fim do MINC, e de leis de incentivos a cultura; em março de 2020, a pandemia do COVID, impôs um isolamento a toda população responsável e consciente. O setor cultural e de entretenimento foi o primeiro a entrar em lockdow e o último a sair, artistas, técnicos fazedores de cultura atravessaram um período cheio

Naquele momento no Brasil, tudo estava desfocado, turvo, a gente não sabia se a democracia iria vencer. A meses de um dos momentos mais tensos das eleições presidenciais do Brasil, desaceleramos por alguns breves 40 minutos, quando entramos numa frequência budica, contemplativa e assistimos em silêncio, em

cima de uma árvore arquibancada platéia, a movência daquela entidade encantada, com indumentária colorida, com coroa de espada de São Jorge; fomos presenteados com um fim de tarde e pôr de sol rosa, laranja terra em suspensão, flutuamos como as folhas e como a poeira vermelha que dá tantos tons avermelhados no céu de Brasília, em agosto. Suspensos por aqueles galhos de árvores arquibancada platéia, acompanhamos um thai chi chuan da movencia e da macumbaria sutil. No final, compartilhamos uma fruta , que foi distribuída para a platéia em suspensão, demos as mãos para a pausa, para a ciranda , renovamos votos de esperança, resistência e comprome-timento, regamos nossos movimento de esperança, vida. Naquele encontro, nossos olhos choviam águas de alegria, tristeza, reencontro, e assim , numa tarde de terça feira , na L2 sul, no meio do cerrado, o FMZ brotou!!!

começava a se desenhar, quando a trança formava um círculo, e dentro dele ficava o livro, que tinha suas páginas arrancadas pela boneca, que oferecia aos transeuntes, essas folhas. Atrás do ponto de ônibus na Praça do Relógio, e do lado de fora da Feira da Ceilândia , Lourença, a boneca presen-teava os transeuntes com poesias. Crianças, atentas, abertas, curiosas e brincantes acompanhavam tudo, mas muitos transeuntes estranhavam aquela cena, cheia de pausa singela, nós da produção, observávamos as reações dos passantes apressados nas suas conclusões superficiais e dogmáticas : - “Que falta de respeito, fazer isso com a bíblia sagrada!! “ Quem ficava para ver, e aceitava a palavra da senhora boneca, modificava a frequência e o semblante. E , assim com muita sutileza conseguimos dinamitar superficialmente um pouco daquelas pedras duras.

Preciso falar sobre o singelo, sensível que contornou muitas pedras embrutecidas pelos dogmas neopentescostais tão presente nas quebradas de Brasília – Feira da Ceilândia e Praça do Relógio, Lourença – da Cia Coletivo Entrvazios. Uma boneca com um cabelo para mais de metros, carregava na ponta da trança um livro, ela era acompanhada por uma mulher que tocava violino. E assim, nesse deslocamento lento, sensível, delicado a boneca cheia de procissão, convidava os transeuntes para aquela peregrinação. A epifania

Na Rodoviária de Brasília, teve a fanfarra - Muralha Antifa!!! Cantando - É Preciso Estar Atentos e Fortes, não temos tempo de temer a morte!! Nesse dia, a polícia informou a produção que não poderia ter música no estacionamento da Martin Penna, Teatro Nacional, porque nossa autorização de alvará era, das 18h às 19h30 na plataforma inferior da Rodoviária. Nossa produção explicou que, aquela performance já havia terminado, logo depois das fotos.


Os fanfarristas terminaram a apresen-tação no Festival, fizeram uma pausa e seguiram para o estacionamento do Teatro Nacional para ensaiar. Após fotos para o Festival, e longa pausa, eles subiram as escadas rolantes , em cortejo. A policia que monitorou todas as intervenções do festival, entendeu que a performance continuava. Então, ligou para a organização e produção do Festival, para nos informar e coibir, que estávamos sujeitos a multas e outras advertências; com muita habilidade explicamos novamente, que aquela ação, no estacionamento do Teatro Nacional, não era uma ação do FMZ, mas eles não acreditaram no que falamos, foi tudo muito tenso. A produção conseguiu falar com os músicos que ensaiavam e pediu para eles terminarem aquele ensaio. Essa mesma tensão, aconteceu no dia da performance - Ruína em Ruínas!!! Do performer Vanderlei Costa, que foi realizada nas paredes do Athos Bulcão, do teatro Nacional . De forma ríspida, impositiva, autoritária a polícia chegou num carro grande com uma tropa composta por mais de 10 policiais. Essecena era para nos alertar, e nos dar segurança. Vale ressaltar que, a PM-DF foi público presente em toda a programação do FMZ, depois do Teatro Nacional, seguiu acompanhando a programação do Festival Marco Zero, no CONIC, Praça Zumbi dos Palmares, na intervenção da Matrizes, da bailarina Fab Girl,

Essa mesma abordagem intimidadora , mas com polícia monta- da e viaturas , aconteceu no dia das intervenções na Torre de TV – na performance, Anne das Pedras , com as mulheres indígenas, Barbara Mathias, Idiane Crudze, e Negrito, coreografia da Cia Corpos entre Mundos; e também na Praça do Compromisso, 705 sul W3 sul; Essa praça foi o local escolhido pela bailarina Poema Muhlenberg, para a coreografia Pendurada, que tinha como trilha sonora, narrativas jornalísticas sobre o assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista, Dom Phillips, assassinados no Vale do Javari, área de terras indígenas no Amazonas, em junho de 2022. O aparato esteve nas ruas.

repressor,

policial

O elemento dessa edição foram as árvores arquibancadas, as pedras e sonhos enterrados embaixo da árvore, do lado da fonte!! Ali, plantamos sonhos, regamos esperança e depositamos nossos votos e desejos!!! Voltamos em 2023!!! E estamos aqui, para dizer: SOMOS RUEIROS!! ARRUACEIROS!!! Reverenciamos os encantados!! Em 2023, o FMZ , aportou no DF e suas quebradas com uma curadoria ainda mais diversa, alongamos nossos

afetos!! Agora somos 4, Barbara Matias, mulher indígena; Ivana Mota, mulher afrodescendente, Flávia Meireles, sapatona convícta, e Marcelle Lago, essa que vos fala, cheia de povoamentos e pertencimentos. Somos uma curadoria de mulheres, onde todas são artistas de formação e de fazer artístico, e isso faz muita diferença na produção de um Festival de Dança. Olhamos para os daqui com maravilhamento, porque Brasília pulsa dança , mais do que nunca. O FMZ quer ocupar as ruas e dialogar com os transeuntes. Inclusão com identidade, corpas, corpos legítimos cheio de dizeres, aqui não tem palquinho, palcão, nem hierarquia de artistas - porque a rua é horizontal, cheia de tudo, todas e todes a rua é linda, democrática, todos estão dentro e fora das performances, e intervenções de dança. A rua não tem poltrona marcado, convidados vips não tem condições especiais para assistir o festival, porque a horizontalidade da rua iguala a todos, nessa apreciação sinestésica e vivência estética. Em 2023, o FMZ começou na Biblioteca Nacional com 11 vídeodanças, poesia, instalação e pipoca. MARCO ZERO NAS QUEBADAS!!!! Mercado Sul Vive, Baile Clava, com Casa de Onynja, foi inspirada nos movimentos Zapatistas, todos, todas e

todes com rostos cobertos, para assim criar um rosto coletivo que luta pela terra, pelo território, pelas ocupações!!!! O Mercado Sul é um território no DF, e na região de Taguatinga em disputa, ou seja, a especulação imobiliária, as igrejas boicotam, demonizam e não querem a cultura nesse território!!! Realizar o FMZ lá foi um presente, uma escuta, abrimos um novo portal de percepções, e encantamentos; A Casa Onynja no Mercado Sul acolheu o FMZ, a comunidade fechou a rua, para realizar o Baile Clava, construção coletiva, linda . No dia seguinte , Eixão norte , Cia Libras - Antípoda e Migração sulsul reflexão e deslocamentos pela cidade, metáfora dos movimentos migratórios. Corpos rolando por quilômetros da 206N até o Buraco do Tatu, numa procissão reflexiva, por vezes, angustiante. Nos que acompanhávamos essa peregrinação, por vezes, éramos atravessados por pedestres e ciclistas, onde muitos chamavam os artistas de patriotas, e sei lá qual construção imagética faziam , desejavam para os corpos rolantes força guerreira!!! O SCS foi ocupado por Marcos Davi, Condutor e Conduzido, Cia Viçeras, Ruído de Fundo, Barranco de Vanderlei Costa e Ilógico de Thiago Nau!!! Foi uma tarde, cheia de rua gregária, escadas rolantes, camelos. Intervenções distintas, em horários diversos, com plateias repletas


de transeuntes, alguns passavam e paravam para ver, outros não se davam esse tempo, mas o olhar de estranhamento, NOSSA ESSE A GENTE ADORA. Na UNB foi lindo, uma roda de conversa inspiradora, mas antes, teve no RU - Restaurante da Universidade de Brasília, Iris e Iara com Arreia; Oziel e a Dança Indígena do povo Ticuna Maguta, do Alto Solimões AM, nossa platéia foi formada pela comunidade de estudantes indígenas da UNB, novamente agregar, encantar e dialogar. Nesse dia também teve às 17h, Rodoviária, lotada!!! No palco, horizontal, democrático, cheio do nosso público – transeuntes. As coreografias: Reerguer, luta da mulher preta linda movencia, resistência; Semutsoc com a desautomatização cotidiana, trazendo esperança, movimento e nutrição, alimento da alma; Burnout , às 18h , lotada de formiguinhas BURNOUTS, em filas longas, aguardando o voltar para casa, ir e vir ; também de lá, Plataforma inferior, às 17h, mas na sexta-feira, 28 de julho, a intervenção, Sobrecarga, da Cia Nave Gris, causou desconforto incomodo , reflexão, lentidão e a pressa do dia a dia, exaustão cheia de peso, uma longa caminhada até o CONIC, estatua de Palmares, fluxo no discurso, no mover . Preciso falar das quebradas e das ações de acessibilidade na Ceilândia e Taguatinga .

Praça do Relógio é acessível, central, movimentada, recebemos nesse dia o Instituto de Promoção das Pessoas com Deficiência Visual – eles acompanharam, as intervenções - Breve Costura Ancestral, Dança Lixo e Qual mundo carregas em você? Na Praça do Cidadão – Medusa Passista e Corpo Funk, reflexão, percurso. Os irmão Sukulonsky Dançantes, da Circomvida no CONIC –foi presenteado pelo gerente da loja 7 Mares, que assistiu essa performance da sacada da sua loja, assim como os trabalhadores do andar de cima, do prédio comercial Boulevard; Futura, com Idiane Crudza, Lian Gaia , Lucca Dan dialoga com a ancestralidade , ao lado da Igrejinha da 308 sul tem como inspiração , um chapéu de freira que também se parece com uma cabana, tudo é olhar. A performance internacional aconteceu a noite, no CONIC, na Praça Zumbi dos Palmares, à frente do Birosca transeuntes baladeiros pararam para assistir – As Stripers, Com Carinho - coreografia da bailarina de Pole Dance, Lala Teles brasiliense, radicada em Portugal que convidou Dani Macedo, à 6ª edição do FMZ foi encerrada pela coreografia, Show Case 2 da Cia Mutum!!!

MARCELE LAGO



ANTÍPODA

A primeira companhia de dança bilíngue (Libras e Português) no Brasil composta majoritariamente por bailarinos surdos e duas ouvintes fluentes em Libras. A coreografia Antípoda apresenta um mundo diametralmente oposto em que a Língua de Sinais é majoritariamente utilizada e que os ouvintes precisam se esforçar para se comunicar. Ao final dessa performance, surdos sinalizantes manifestam poeticamente a exaustão de lidar com as barreiras linguísticas que os ouvintes tentam impor sobre eles. CIA. DANÇA LIBRAS EM CENA


ARREIA

O enredo constrói a relação entre as tradições indígenas sobre o universo dos sonhos, a criação do Caboclinho 7 Flexas do Recife. Além disso, Arreia se ancora na ancestralidade indígena que Íris, Iara e Paulinho 7 Flexas têm em seu tronco, construindo uma narrativa que honra seus antepassados. A apresentação traz à tona a resistência dos povos originários do Nordeste em diferentes contextos e aponta reflexões para preservação e manutenção de suas culturas.

IARA CAMPOS E IRÍS CAMPOS


ATL


BAILE CLAVA 4.0

Como ferramenta de resistência em uma cidade predadora de direitos, a BAILECLAVA é um levante da juventude originária, negra, LGBT e periférica, criando um momento de celebração da comunidade ballroom. Inspirada no Movimento Zapatista Indígena, cobrimos os rostos com balaclavas customizadas a partir da nossa identidade. O Mercado Sul como espaço de moradia e ocupação cultural, recebe o festival convocando todes a cobrirem suas faces, criando um rosto coletivo na guerrilha pelo território. CASA ONYNJA E RUAN GUAJAJARA


BARRANCO

Entre duas pessoas, o tempo, a distância, infinitas possibilidades definem um do outro. Barranco é uma provocação sobre o que nos distingue e afasta. Barranco é também Brasília, onde o centro monumental foi erguido pelo trabalho de Candangos obrigados a morar distante. Retrato de um conflito entre o que se preserva e a voracidade do capitalismo.

VANDERLEI COSTA, MALU ENGEL E ATAN PINHO


BURNOUT

A coreografia Burnout foca em expressar as sensações de quando se sofre desta síndrome. Uma construção que representa o ápice do cansaço e sanidade gerados por uma cobrança insaciável de excelência das pessoas.

CIA. UNDER7


CONDUTOR E CONDUZIDO

A partir do exercício teatral “Condução Colombiana” cunhado por Augusto Boal, a performance explora as relações de contato e movimento entre o celular e o humano, utilizando-se de técnicas da dança acrobática e da mímica. Analogamente, é uma crítica sobre a priorização do celular no campo de atenção da nossa sociedade contemporânea.

MARCOS DAVI


CORPO-FUNK

Resultado de pesquisa realizada durante residência artística sobre a história do funk e como, desde a origem até os tempos atuais, o corpo foi se organizando para conversar com outros durante os bailes.

CLARA OLIVEIRA


BREVE COSTURA ANCESTRAL

Bonecas negras feridas são apresentas como retratos da violência da colonização. Em contraste, performers trançam símbolos de afeto e cuidado, repassando histórias para preservar a memória imortal.

LIKIDAH


DANÇA LIXO

De Samambaia, bailarino, coreógrafo e cantor, Negro Val apresenta a performance “Dança Lixo” motivado pelas seguintes questões: Lixões são inevitáveis? O que fazer para que não existam? Como a arte pode transformar tais espaços? Num exercício performático as perguntas funcionam como possibilidade de mudanças de postura de quem assiste.

NEGRO VAL


FUTURA

Composto pelas personagens a ancestral (Idiane Crudzá), a mãe (Lian Gaia) e o filho (Luca Dan). A ancestral, em seu traje do povo Kariri-Xocó, canta, fuma seu cachimbo e sopra palavras no ouvido da criança. A mãe, balbucia e parece cansada/chorosa/exausta. Ela representa o corpo indígena mulher-terra-mãe apagada de sua identidade e de vivências. O filho, trajando o que mescla ancestralidade e futurismo, dá colo à mãe e declama em voz alta, ora em português, ora em dzubukuá-kariri-kipea, da etnia Kariri Xocó, numa tentativa de curar e continuar. IDIANE CRUDZA, LUCA DAN E LIAN GAIA


ILÓGICO

Fala sobre a necessidade do artista se sustentar e ter apoio no processo de construção de carreira. Uma construção não lógica diante dos desafios que se enfrenta durante a profissionalização na arte. Percurso que faz a maioria dos artistas desistirem de suas carreiras.

THIAGO NAU


MALUVIDAS

Maluvida, palavra muito utilizada em algumas regiões do Nordeste brasileiro, é uma pessoa mal-ouvida, desobediente e inquieta. Nossa proposta é expressar nossas inquietações como mulheres e mostrar que o nosso lugar também é na música, e na rua. Com nosso repertório de músicas compostas ou interpretadas por grandes mulheres, queremos trazer cada vez mais mulheres para o universo das fanfarras e ocupar todos os espaços com música, festa, afeto, ativismo, feminismo e luta. FANFARRA MALUVIDAS


MEDUSA PASSISTA

Encenação inspirada no mito da Medusa, fábula aborda a cultura do estupro e silenciamento feminino, passista é um termo subjetivo para seu ato de carrasca. Considerada a mais bela de três irmãs, Medusa foi estuprada por Poseidon e punida por Atena, sua sobrinha, com o castigo de jamais se contemplada, pois quem a olha é transformado em pedra.

JULIANA LOUZADA


MIGRAÇÃO SUL - SUL A performance “Migração Sul-Sul” provoca um afastamento da bipedia como principal modo de deslocamento humano e propõe o rolamento na horizontal como meio disruptivo de transportarse pelo mundo. Rolando pelo Eixão Norte rumo ao Buraco do Tatu, no Plano Piloto de Brasília, a ação carrega a sujidade rugosa do deslocamento pela cidade como metáfora dos movimentos migratórios internacionais do século XXI, cada vez mais marcados por percursos intensos entre os países do sul global. Quais as potências de vida do caminho inóspito que nos leva a um caminho de sobrevivência? CEDASSIDF


SHOWCASE

Apresenta a pluralidade dos corpos na versatilidade de estéticas da dança. Ao narrar a história de corpos não padrões, os dançarinos usam de suas bagagens culturais para dialogar com um novo jeito de mover, um grito daqueles que querem mudança. A trilha sonora tem como base os ritmos regionais e afro-brasileiros.

CIA. MUTUM


OS DANÇARINOS IRMÃOS SUKULONSKY

Dançar para comemorar da igualdade de gênero. Uma apresentação cômica, onde o assunto é a alegria de uma mulher Palhaça nas ruas e praças do DF. A crítica envolve o empoderamento feminino e o seu direito de ir às ruas, trabalhar com arte colocando o corpo e a voz no centro.

CIRCOMVIDA


POVO INDÍGENA TICUNA MAGÜTA

A nossa dança cultura Magüta se manifestará por meio da nossa conivência e vivência. Os nossos clãs e nossos rostos serão as nossas identidades, os nossos cocares serão as nossas histórias e cada movimentos representarão as nossas resistências e luta. Somos a resistência dos nossos povos Magüta e a nossa dança trará a energia positiva, a espiritualidade, a paz e a alegria.

ZEZINHO BARRO, TAYVAN FARIA


QUAL MUNDO CARREGAS EM VOCÊ?

Questiona o tempo acelerado da modernidade e que causa ansiedade. Imbuídos dessa reflexão, pessoas usando fones de ouvido imersos em seus próprios mundos enquanto transitam e seguem. Costuram movimentos nas saídas do metrô, faixas de pedestres, calçadas e no trânsito onde há o barulho da cidade. Elas dançam reverberando o bamboleio de seus corpos no espaço.

COLETIVO SISTEMA


REERGUER

Movimentar-se, é a luta da mulher preta para se reerguer todos os dias. Com seu corpo marcado, potente e que contagia, a energia chega, se multiplica, emana e comunica com o seu redor.

KARINA ARAÚJO


RUÍDO DE FUNDO

Expõe sensações corpóreas ativadas ao longo de uma caminhada, fundindo corpo e urbanidade. É uma intervenção em diálogo com um local específico. O deslocamento poético é feito por um grupo de até 10 pessoas, tocadas por elementos sonoros e paisagem arquitetônica que propiciam ações que se dão durante o percurso.

CIA. VÍÇERAS


SEMUTSOC

Contextualiza os ciclos da vida e como a esperança motiva o prazer de viver e desautomatizar o cotidiano. A cena destacada o estar consigo, sem esquecer o outro e como essa conexão é necessária. Como explica o diretor e coreógrafo Dilo Paulo, é “um despertar da potência individual e fortalecimento do coletivo”. A montagem traz referências a ritmos, danças e elementos afro-diaspóricos.

CIA. CORPUS ENTRE MUNDOS


SOBRECARGA

Dançamos uma possível imagem da condição do ser humano em queda: o animal bípede implume, reelaborando situações de riso e da dor através da artificialidade da criação cênica e sua relação entre individualidades, espaço coletivo e de que a tragédia contemporânea se dá no corpo.

GRIS CIA. CÊNICA


ÀS STRIPPERS, COM CARINHO

Uma homenagem às strippers, precursoras do pole dance. A proposta é resgatar a imagem dessas mulheres de uma maneira não romantizada e não marginalizante – a realidade é diversa e cada trabalhadora sexual tem uma relação pessoal com seu ofício.

LALA TELES E DANIELA MACEDO




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