Além do Registro - A importância da fotografia na arquitetura moderna

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A importância da fotografia na Arquitetura Moderna


“O fotógrafo olha como quem constrói.” Gabrielle Basílico


UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO” UNESP FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES E COMUNICAÇÃO

Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo

Além do registro A importância da fotografia na Arquitetura Moderna

Trabalho Final de Graduação apresentado ao curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual Paulista - Unesp Orientador: Prof. Dr. Sidney Tamai

MARIA OLÍVIA DE CALLIS SIMÕES

Bauru, 2015



Aos pais, que s찾o base. Aos av처s, que s찾o estrutura.


Resumo O presente Trabalho Final de Graduação tem como objetivo analisar a importância do papel da fotografia durante a história da arquitetura, tendo sua máxima relevância na expansão e divulgação da arquitetura moderna, que passa a ser produzida no século XX. Mais do que reportar o surgimento de um novo estilo arquitetônico, a fotografia foi responsável pela difusão e educação modernista ao redor do mundo, nos respaldando com imagens de uma nova era e um novo modo de pensar que perduram icônicas por gerações.


Sumário 1. introdução 2. breve histórico da fotografia

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3. fotografia como documento

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3.1. Desenvolvimento das cidades e da arquitetura

3.2. Precisão de registro

3.3. Necessidades da sociedade moderna

4. fotografia como percepção

4.1. A visão do observador

4.2. Percepção do espaço e da arquitetura

5. fotografia e a arquitetura moderna derna

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5.1. A importância da fotografia na arquitetura mo5.1.1. Ezra Stoller 5.1.2. Marcel Gautherot

6. contemporaneidade e Nelson Kon

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7. ensaio | A estação rodoviária de Jaú 56 de Vilanova Artigas 8. considerações finais

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1. introdução Em meio a tantas expressões artísticas foi a fotografia que trouxe ao mundo uma nova imagem, uma nova forma de se produzir imagem. Foi ela, a nível de representação, que passou a influenciar todas as outras formas de arte – dentre elas a arquitetura – trazendo a tona uma nova forma de percepção, não apenas por seus variados pontos de vista proporcionados pela seleção da objetiva, que também exprimem uma nova posição do observador em relação ao espaço, mas também permite a articulação entre o inalterável e o infinito na imagem congelada. A arquitetura e a fotografia tem andado juntas desde a explosão das grandes cidades no século XIX. A máquina de fotografar estava entre os grandes inventos daquela época de plena urbanização e capturar imagens com precisão se tornou uma de suas principais ferramentas. Após mais de um século de função documental a fotografia passa a se voltar a uma vertente de cunhos artísticos. Fotógrafos ar8


quitetos e arquitetos fotógrafos de todo o mundo têm acompanhado de perto o desenvolver da arquitetura, dando a nós, espectadores, diversas maneiras de absorvê-la. Algumas imagens “tocam o real”, outras nos levam a novas formas de percepção daquilo que se vê. Com o modernismo, as fotografias, arquitetura e arte passam a dividir o mesmo cenário. Para os arquitetos do movimento moderno, a arquitetura era a resposta à chamada experiência da modernidade e aos problemas e possibilidades advindos dela. Torna-se então a arquitetura parte de uma discussão generalizada, mas tendo em sua representação fotográfica e imagética a proximidade com as artes, cada vez mais acessíveis à cultura de massas. As grandes obras do movimento moderno na arquitetura brasileira foi por diversas vezes registradas pelas lentes de renomados fotógrafos, e continuam sendo até hoje. Em uma era de euforia imagética e visual, a reprodução dessas imagens que documentaram com destreza uma época de marcante mudança estética da arquitetura, moldaram valores estéticos e as tornaram icônicas, servindo como referência ao decorrer das décadas que se seguiram.

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2. breve histórico da fotografia Embora a história reconheça a descoberta da fotografia como a somatória de esforços e estudos de vários pesquisadores durante épocas e países diferentes - os quais realizavam experiências individuais a caminho da captura da imagem e chegaram a resultados parecidos - é a imagem do francês Joseph Nicéphore Niépce, obtida 1826,considerada marco do nascimento da técnica, denominada por ele de heliogravura, e que mais tarde viria a se chamar fotografia. O processo óptico da fotografia baseia-se no comportamento da luz. A primeira fotografia, feita por de Niépce, foi realizada quando ele utilizou uma placa com betume numa “câmara obscura” - um dos primeiros instrumentos ópticos desenvolvidos pelo homem para explorar e estudar a captura de imagens e cujo uso pelos pintores, permitiu a descoberta de novas maneiras ver a realidade. Após oito horas de exposição, de uma espécie de asfalto em pedra ele conseguiu uma pálida imagem dos telhados que compunham a vista de sua janela. 10


‘ 1. Primeira imagem fotográfica permanente. Niepce, 1826.

Durante muito tempo os créditos a invenção da fotografia foi dada ao também francês Louis Daguerre. Niépce foi procurado por Daguerre, artista que já utilizava e desenvolvia as técnicas da câmara obscura, e que ouvira falar dos experimentos de Niépce. Os dois acabaram se tornando sócios em busca de desenvolver o processo da heliogravura. Niépce continuava a desenvolver suas emulsões baseadas no betume, enquanto Daguerre concentrou-se no estudo com base em sais de prata. Sem ir muito além com a sociedade, Niépce faleceu em 1833 e reconhecimento de sua contribuição para fotografia só aconteceu no início do século XX. (FREUND, 1994) 11


Daguerre continuou as tentativas de aperfeiçoar o processo desenvolvido por Niépce, pois ainda que soubesse como produzir a imagem, não dominava sua fixação. Em 1835, após expor rapidamente algumas chapas, e colocá-las em um armário que acidentalmente continha vapor de mercúrio, percebeu, após alguns dias, que a imagem havia desenvolvido. Essa descoberta de que a imagem podia ser revelada, permitiu que o tempo de exposição fosse reduzido para 30 minutos. Após alguns anos aperfeiçoando a técnica, em 1839 é anunciada sua invenção, o daguerreótipo. Nos anos que seguiram a descoberta da daguerreotipia, as ruas de Paris foram tomadas por fotógrafos, ainda que amadores, que buscavam experimentar o novo dispositivo. Como salientado, a história da fotografia não considera sua descoberta mérito de um só homem e o processo que Daguerre concluiu foi apenas um entre tantos desenvolvidos no início do século XIX. Outros pesquisadores, porém chegaram outros resultados, e acabaram por desenvolver processos de reprodução de imagens mais eficientes e contribuíram para o surgimento da fotografia, entre eles merecem destaque o inglês Henry Talbot e o franco-brasileiro Hercule Florence. O desenvolvimento da fotografia apoia-se nos fenômenos da sociedade industrial nascente na metade do século XIX. As cidades européias, principalmente Paris e Londres, vivenciavam uma aceleração da vida cotidiana e passavam por marcantes transformações culturais: urbanização, industrialização, desenvolvimento da economia, crescimento das metrópoles e a evolução das comunicações. Chegava-se a modernidade. 12


3. fotografia como documento Desenvolvimento das cidades e da arquitetura Por vezes possuidora de características documentais, a fotografia nasce como evidência de uma sociedade industrial em desenvolvimento e permanece por anos em sua função utilitária, registrando o nascer da modernidade. Desde o início a fotografia esteve ligada à urbanização e à arquitetura. Os primeiros momentos do daguerreótipo no século XIX foram preenchidos por amadores encantados com as imagens que conseguiam obter da cidade em suas próprias janelas. “Se extasiavam diante dos tubos de aquecimento; contavam sem parar as telhas dos telhados e os tijolos das chaminés; admiravam-se de, entre cada tijolo, ver o lugar do cimento.” (GUDIN apud ROUILLÉ, 2009, p.43) A paisagem estável, por estar mais suscetível ao ato fotográfico, era certamente mais atrativa a ser captada do que as figuras em movimento, como a humana. É por isso que apesar dos grandes tamanhos e pesos das câmeras fotográficas no início, muitos saíram de suas casas para captar as paisagens e as imagens presen13


tes na cidade, como as ruas, edifícios e monumentos, como fez o próprio Daguerre, para aprimorar e divulgar o seu invento. Devido à necessidade de uma longa exposição, a imagem ficava com aspecto vazio, uma vez que tudo que se movia não era propriamente captado pela câmera. Ao superar a capacidade de apreensão dos olhos, a precisão da fotografia está mais adaptada às formas urbanas, como ângulos retos, linhas e arestas, do que às formas da natureza encontrada nos campos. Urbana em sua própria origem no surgimento das metrópoles, a fotografia a é também por ter a cidade como um de seus principais cenários. Muitas lógicas urbanísticas passaram a ser implantadas baseadas e motivadas pela nitidez técnica e precisão proporcionada pela fotografia das cidades. Por assim dizer, no século XIX, a fotografia proporcionou imagens carregadas com valores almejados por aquela sociedade em ascensão, imagens estas que a transformaram e a nutriram. Exposições como “Photographierl’Architecture: 1851-1920”, em Paris ou “Trackingthe West: A. J. Russel Photographs of the Union Pacific Railroad”, em Nova Iorque, reuniriam nestas décadas inúmeros registros da “estética industrial” predominante na época. No início, porém, essa documentação fotográfica urbana ignorou as agitações e deficiências da cidade; armazéns, ateliês, ruas tortuosas, casebres e o proletariado que passava a se instalar na periferia não faziam parte do registro das lentes. Exaltava-se o belo, e a fotografia via na cidade, segundo Rouillé (2009), o cenário do poder: os monumentos que representam seu passado, e as grandes obras urbanas que o projetam para o futuro. 14


É somente a partir da Comuna de Paris que o proletariado passa a ter acesso à fotografia. A cidade não é mais reproduzida por si só, agora a população posava juntamente com ela, era parte dela. As metrópoles não são mais apenas representadas por construções, ruas e monumentos, ela encontra seus habitantes e é representada também através destes. É desse encontro das massas com a imagem que surge a reportagem. A cidade passa a ter o papel de acusada, denunciase a insalubridade, a prostituição nas ruas, crimes, drogas, abrigos noturnos; era o cenário do lado obscuro das grandes metrópoles da modernidade. Porém, a imagem de cunho documental foi dominante enquanto pôde. Após 1960 as imagens da cidade se modificaram e suas funções diversificaram. Depois de um longo caminho a serviço do poder e em sintonia com o sistema, a foto documental perde lugar de destaque para a reprodução de imagens imediatas, como as imagens televisionadas em tempo real via satélite, que inegavelmente melhor serve as necessidades contemporâneas.

Precisão de registro

A grande crítica fomentada a partir da criação da fotografia foi a da substituição do homem pela máquina. As mãos, que reproduziam imagens através de seus instrumentos de trabalho como o pincel e o lápis, e os olhos dos pintores, desenhistas e gravadores, seriam substituídos pela máquina de fotografar. A verda15


de é que a fotografia não pode ser considerada uma substituição da pintura, elas seguem vias paralelas. A produção de imagens passa a se guiar por novos protocolos. Não surgiam como na pintura, ao decorrer de um longo processo de observação e criação, e sim, eram obtidas de uma só vez pela câmera escura, através de reações químicas e das propriedades da luz. As técnicas científicas conferem à fotografia a propriedade de conservar todas as impressões. Diferente da pintura e do desenho não apenas representa, ela registra e reproduz. Segundo Jules Janin, jornalista renomado da época e grande entusiasta do daguerreótipo, “a câmara escura não produz nada por ela própria; não é um quadro, é um espelho.” (apud ROUILLÉ, 2009, p. 35) De frente ao crescente distanciamento entre o espaço do objeto material e o espaço do espectador da imagem, a representação não mais se basta com o talento de desenhistas e pintores, devido a sua intrínseca subjetividade, e passa então a se apoiar no mecanismo fotográfico, permitindo uma precisão analógica menos de pendente das competências humanas. A fotografia se torna então aquela que documenta com destreza a imagem de uma sociedade em pleno desenvolvimento, lhe servindo como ferramenta, ao mesmo que o fotógrafo vê na cidade industrial seu principal objeto e possibilidade. No início do uso deste novo dispositivo, as primeiras imagens nos apresentam a uma fidelidade ao real observado, e tem 16


uma grande preocupação em representar o mesmo. Esta busca determinada pela precisão da imagem com o real pode ser entendida quando consideramos que toda a nova tecnologia possuía certa responsabilidade e ambição de equivaler-se ao mecanismo humano. A fotografia sempre foi cercada de pressões estéticas. Uma vez que assumiu o papel de representação pictórica, ao mesmo tempo que se livrava das críticas em relação à pintura, o seu avanço tecnológico a elevou a um novo patamar, o de reprodução fiel a realidade, papel esse logo foi em partes desacreditado em razão dos mesmos avanços tecnológicos, que possibilitaram a manipulação das imagens.

Necessidades da sociedade moderna A sociedade moderna vive na urgência. Urgência por informações em uma era ditada pelo tempo, em que se necessita da transmissão de acontecimentos em tempo real e o cotidiano nos é apresentado em um ritmo quase que frenético, nos tornando dependentes das imagens. Usamos das imagens para informar e sermos informados, para catalogar e arquivar, para estudos e pesquisas, descrições, identificações, para guardar memórias, para publicidade, entre outras diversas finalidades que se especializaram ou tornaram-se possíveis com o avanço da tecnologia fotográfica e de seus meios de reprodução. Assim como aconteceu em muitas áreas, sejam elas artísti17


cas ou não, esse avanço na reprodução da imagem chegou também à representação da arquitetura, uma vez que possibilita a apreensão de uma obra em seu determinado espaço e tempo. Essa união fotográfica-arquitetônica tem influenciado fases e processos projetuais, abrangendo desde uma fase inicial – a da concepção das ideias – até a obra concluída, como é absorvida pelo entorno. Pode-se até mesmo dizer que as imagens arquitetônicas e o conhecimento por elas transmitido passaram a provocar maiores debates sobre as obras do que apenas a partir da vivência do sujeito que por ela passa ou se insere. . As descobertas e a modernidade abreviaram, para o homem, a distância e o tempo, como exalta o jornalista, político e historiador francês do século XIX, Louis de Cormenin, “a heliografia (fotografia), delegada a alguns intrépidos, fará por nós a volta ao mundo, e vai trazer-nos o universo em portfólio, sem que deixemos nossas poltronas”. (ROUILLÉ, 2009). A fotografia tece elos entre o aqui e o longínquo.

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4. fotografia como percepção A visão do observador

Dada a evolução do aparato tecnológico, o fotógrafo passa então a agregar às suas fotos novos sentidos e intenções. O que se pretende é explorar as novas maneiras de se registras as paisagens, espaços, edificações e a vida cotidiana, exprimindo-as através de sensações e impressões diferentes daquelas que a percepção direta e crua pode oferecer. Para o fotógrafo Húngaro Maholy-Nagy “a fotografia quase equivale a uma ‘transformação psicológica da visão humana’ que com a qualidade e ‘absoluta precisão’ treinou a capacidade de percepção do mundo apenas por oferecer novas imagens, uma ‘nova visão’”. (Fontcuberta, 2004. p. 192 in VIEIRA, 2012, p. 266) que:

Walter Benjamin, em seu ensaio sobre fotografia, aponta

“apesar de toda perícia do fotógrafo e de tudo o que existe de planejado em seu comportamento, o observador sente a necessida19


de irresistível de procurar nessa imagem a pequena centelha do acaso, do aqui e agora, com a qual a realidade chamusca a imagem(...)” (BENJAMIN, 1994, p. 94). A fotografia nos provoca admiração, seja pela beleza ou emoções transmitidas das imagens, ou por seu poder de nos transportar ao passado e de registrar o presente. Não por acaso, rapidamente se tornou o grande diferencial das publicações de revistas, jornais ou livros. “Cada dia fica mais irresistível a necessidade de possuir o objeto de tão perto quanto possível, na imagem, ou melhor, na sua reprodução” (BENJAMIN, 1994, p.101) “As imagens são feitas para serem vistas” inicia o pensamento de Aumont (2002), que prossegue dissertando que os olhos não são instrumentos neutros, que apenas transmitem os dados fielmente. A visão é o encontro do cérebro com o mundo. Aquele que olha a imagem é o chamado “espectador”, e este é construído por diferentes determinantes e características que vão alem da capacidade perceptiva, como a bagagem de conhecimento que possui esse sujeito, seus afetos e crenças, região onde vive ou viveu, classe social, cultura, entre outros “enunciados ideológicos, culturais, em todo caso simbólicos, sem os quais ela não tem sentido” (AUMONT, 2002, p. 248) Uma abordagem semiológica, a qual estuda o papel dos signos culturais na vida dos grupos humanos, distingue diferentes níveis de codificação de uma imagem, os quais serão desiguais para cada espectador, obtendo interpretações e percepções do espaço representado também diferentes entre si. 20


Esses espaços tridimensionais representados, ainda que sejam, na imagem, fictícios e imaginários, são referências do espaço real por analogia. Ainda segundo Aumont, “de fato, o espectador não percebe apenas, na imagem, o espaço representado, percebe também ‘como tal’ o espaço plástico que é a imagem” (2002, p. 137). Cabe ao espectador, portador da capacidade de “sujeito que olha”, estabelecer suas próprias relações entre espaço e imagem. O lado artístico da fotografia pode criar um mundo artificial, mas até que ponto tal peculiaridade do registro das câmeras intervém na percepção dos lugares e da arquitetura? A imagem fotográfica tem o poder de coagir na forma de interpretação da arquitetura e pode até mesmo repercutir no ato de projetar, devido ao seu inegável domínio de manipulação ou exaltação da realidade. Há que se discutir, então, ate que ponto as imagens capturadas pelas lentes e pelo fotógrafo são reproduções plausíveis ou fiéis da realidade, ou exemplos de uma representação de cunho artístico e criativo. Uma dualidade teórica que se mescla e se confunde na prática. O público alvo da fotografia de arquitetura, normalmente especializado, tem a capacidade e a vontade de compreender e apreciar os produtos dos arquitetos que, por sua vez, encontram nela uma forte aliada na comunicação e transmissão do conteúdo entre quem faz e quem aprecia. A imagem fotográfica apresenta uma dimensão espacial que expressa uma dinâmica da cidade que foi, por um determinado instante, artificialmente interrompida. Através dessa capacida21


de de paralisação do tempo e de uma conseqüente relação passado-presente-futuro, é possível utilizar-se da linguagem fotográfica e do olhar do observador para alimentar reflexões diversas sobre a arquitetura e o meio urbano. Dado o poder da fotografia sobre a percepção humana, é possível que ela interfira até mesmo no ato de projetar. Uma vez que grandes obras têm sido eternizadas por imagens durante os séculos, o arquiteto, ao projetar, ganha uma nova consciência a respeito das proporções que poderá tomar seu produto final.

Percepção do espaço e da arquitetura A fotografia tem a habilidade de provocar no espectador associações com outras imagens, sobre o momento que a precedeu e ao que a segue, prolongando através da mente os acontecimentos anteriores e posteriores àquele determinado instante. Tal poder de alimentar a imaginação faz da fotografia uma arte do tempo e do espaço, assim como a é a arquitetura. Limitaríamos-nos se considerássemos que a arquitetura é composta apenas por suas construções físicas. Mais do que isso, ela tem sua concretização na forma como é vivenciada e apreendida pelo “sujeito que vê” e que tem ali um olhar singular sobre sua interface. Assim sendo, o conceito de arquitetura possui, também, um viés subjetivo, que abrange toda uma complexidade de estruturas e fatores constituintes da cidade e dos sujeitos que nela habitam. 22


Dentre as artes visuais, a maioria foi, e ainda o é, capaz de produzir uma estética que exprime a relação do sujeito com o meio, porém é a fotografia aquela que mais abre caminho a interpretações subjetivas das transformações do espaço real em que se vive, e tem na sua própria origem um paralelo com a cidade. Da mesma forma que a arquitetura só passa a existir espacialmente quando sai do plano gráfico do projeto, a fotografia só é possível quando há a projeção de luz no espaço. Desta forma, a relação entre a arquitetura e a fotografia não está resumida no espaço planificado como imagem, e sim no próprio plano espacial. Nossa experiência através dessas imagens não é, de fato, arquitetônica, vivenciada no próprio edifício ou espaço, mas uma experiência intermediada sobre as imagens desses edifícios e espaços – “duplamente intermediadas, primeiro pelos que produzem as ideias ou as imagens sobre os edifícios (os fotógrafos e os críticos especializados), e, em segundo, pelos que exercem ou procuram exercer controle sobre esse meio de difusão.” (SILVA, 2012) Podemos dizer que este fenômeno, denominado por Silva de meta-arquitetura, é um outro tipo de experiência, relacionada com edifícios, mas não sobre edifícios – é sobre suas imagens. É algo que virou cultura sobre as imagens sobre ou da arquitetura e exerce grande influência no fazer arquitetônico, uma vez que “se constitui numa sua inspiração ou num seu imaginário” (SILVA, 2012, p. 38) Inserida neste contexto, uma “fotografia urbana” torna-se então, um forte instrumento de reflexão sobre a arquitetura e os decorrentes fenômenos urbanos de uma sociedade em ascensão. 23


No ramo da arquitetura, há a preferência da foto sobre os outros tipos de imagem, até mesmo como o desenho, as perspectivas e as simulações digitais – ainda que estas consigam apresentar o projeto de forma mais completa - e isto se da pelo fato de que as fotografias são capazes de “tocar o real”, ou seja, manter um contato e uma fidelidade àquilo que ela representa. Aos nossos olhos, é a prova de que aquilo que vemos fotografado realmente existe, ou existiu – é ainda a prova que o que era idéia se tornou fisicamente em arquitetura. Assim como em qualquer outro tipo de imagem, as fotografias são mais do que apenas um meio de comunicação. Nela está contido um modo de ver particular a cada autor, sua visão, impressão e aquilo que ele quer mostrar, bem como aquilo que foi contextualmente adquirido por ele como memória coletiva.

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5. A fotografia e a arquitetura moderna A arquitetura moderna, que se origina ao longo dos anos 1920 e se afirma após a II Guerra Mundial, procurava superar os desafios colocados pela modernidade, servindo-se para tanto dos novos materiais e incorporando novos sistemas construtivos. A industrialização permitiu inovações nas construções e, aplicada aos materiais tradicionais, permitiu uma maior eficácia em sua utilização. A introdução de novos materiais estruturais como o aço, ferro e principalmente o concreto armado foram um divisor de águas para as novas técnicas construtivas, que passa a ter novas possibilidades plásticas, respondendo as exigências daquele novo estilo que se afirmava. Rompia-se então com o sistema oitocentista e nasce a vanguarda européia do século XX, representada por Gropius, Le Corbusier, Sigfried Giedion, entre outros expoentes da arquitetura, ex25


plorando as qualidades estéticas próprias do concreto armado. A escola modernista assume uma autonomia estética que procurava a racionalidade da construção e uma linguagem baseada em grandes vãos com extensos envidraçados, volumes cúbicos e puros, e a preferência por superfícies lisas e rebocadas.

A importância da fotografia na arquitetura moderna Ao mesmo tempo em que se consolidava mundialmente a arquitetura moderna e seus aspectos estéticos, a fotografia também passa por um momento de mudanças de linguagens. Na época, exposições e mostras exerceram influência na construção de um novo visual arquitetônico. Um dos primeiros movimentos, e de maior importância, foi a “Photo-Secession” em 1910, com o fotógrafo Alfred Stiglitz como artista de destaque e considerada um determinante na formação de uma escola de fotógrafos de arquitetura moderna, ainda dentro de um enfoque documentarista. (COSTA, 2007) Tais movimentos, que também contaram com nomes importantes na fotografia do século XX, como Edward Weston e Ansel Adams, buscavam uma aproximação com a realidade através da fotografia, pelo aprimoramento dos recursos técnicos e uma clareza sobre suas limitações, bem como a produção de uma fotografia mais técnica e menos artística, livre de manipulações de caráter pictórico que pudessem levar a perda de sua clareza ou a um distanciamento com o real e o referente. (COSTA, 2007) 26


Paralelamente a estes representantes documentais, houve também uma corrente moderna mais abstrata de fotógrafos, também importante a construção de uma estética modernista dentro da fotografia. O húngaro László Moholy-Nagy, um dos grandes expoentes da fotografia que guiou o discurso da “Nova fotografia” no ensino da arte de fotografar na renomada Bauhaus, encorajando ativamente seus alunos no uso da nova tecnologia e na ruptura com o prévio sentido clássico da imagem arquitetônica, onde “apreciar o espaço era compreender uma nova cultura espacial.” As fotografias de Maholy-Nagy, assim como as de Man Ray, são exemplos de um estilo que influenciou uma nova visão e um maior dinamismo, uma vez que reorganizou a estrutura pictórica promovendo uma sensação subjetiva de movimentono observador. Esta vertente buscava uma imagem formal estética que caracterizasse os ideais daquele momento, negando até mesmo o uso da perspectiva em detrimento de uma aproximação mais radical da foto com o objeto, que conseqüentemente acabaram por distanciá-la da realidade. Ainda que a corrente fotográfica abstrata não seja dominante na prática da fotografia de arquitetura, foi muito importante por inovar com suas novas pesquisas estéticas e enquadramentos diferenciados e, principalmente, por ter desenvolvido as técnicas sobre as câmeras fotográficas, mais leves e práticas, tendo como máxima representante a 35mm. Nas décadas de 1920 e 1930, a fotografia passa a ser parte fundamental da formação de uma arquitetura midiatizada, em uma cultura consumista de informação e imagem. As várias parce27


rias formadas entre arquitetos e fotógrafos na época são o reflexo desse desejo por comunicação, divulgação e publicidade, possibilidades tornadas reais pela reprodução fotográfica. Não foi apenas a nova forma de ver e entender arquitetura que marcou este período na história da fotografia de arquitetura, mas também a sua nova forma de ser exibida. É a explosão da cultura de exposições, que se tornam muito populares na sociedade de consumo, bem como a grande quantidade de publicações, revistas e catálogos, que levavam esse conhecimento às massas. Segundo Nelson Kon, um dos mais importantes nomes da fotografia de arquitetura atual, “O modernismo precisou delas, precisou mostrar os novos edifícios e a nova forma de projetar. Mais que isso: precisou ensinar as pessoas a enxergar e apreciar o novo espaço arquitetônico.”(2008, p.14) Como visto, o final do século XIX e o inicio do século XX foi um período marcado por intensas transformações na vida ocidental. Surge ai a necessidade de divulgação e veiculação da produção cultura e arquitetônica (e de todos os aspectos relacionados a habitação) desta época de euforia criativa pelos periódicos e revistas em atividade. Buscava-se encontrar formas de expressão adequadas àquela época de desenvolvimento, na qual a arquitetura teve papel de destaque. Os periódicos e publicações voltadas a arquitetura passou a, de certa forma, educar seu publico frente as inovações no ramo da construção em geral, atribuindo significados e sentidos à arquitetura moderna e a engenharia, e foram numerosos os artigos 28


publicados preocupados com a modernização das cidades. Quase tão importantes quanto as próprias construções, as fotografias produzidas com enfoque na arquitetura moderna ajudaram a consolidar o design modernista na consciência e no repertório das pessoas. O sincronismo entre a arquitetura e a fotografia que se intensifica na década de 1930 no centro de difusão da modernidade para o mundo que foi a escola alemã Bauhaus, liderada por Walter Gropius, determinou um momento histórico que mudou o olhar sobre a nova arquitetura e apresentou ao mundo uma nova forma de mostrá-la. A fotografia se fortalece como mediadora entre as obras arquitetônicas e seu público. Continuava a ser o meio de maior credibilidade de registro, uma vez que evidencia e reproduz o real, algo que o desenho não possibilita. Os avanços tecnológicos da produção e reprodução de imagens, a exploração das novas formas e materiais que originaram e regeram o movimento moderno, possibilitou que através das imagens produzidas por grandes fotógrafos como Julius Schulman e Ezra Stoler, uma grande parcela da população pode conhecer a arquitetura moderna, que passava se propagar pelo mundo graças a fotografia. A fotografia voltada à arquitetura brasileira das décadas de 1940 e 1950 se concentrou nos dois principais centros urbanos e difusores da modernidade, Rio de Janeiro e São Paulo. Nesta época houve um grande aumento da demanda de fotografias de arquitetura, uma vez que aumentava também o número de revistas e bibliografia especializadas, nacionais e internacionais, interessadas em materiais para explorar e divulgar a arquitetura moderna que 29


estava se produzindo no Brasil. As várias parcerias formadas entre arquitetos e fotógrafos na época são o reflexo desse desejo por comunicação, divulgação e publicidade, possibilidades tornadas reais pela reprodução fotográfica. Como principais exemplos de publicações estavam os já citados “Brazil Builds: Architecture new and old”, “Latin America Architecture Since 1945” e o “Modern Architecture in Brazil, livros estes que deram destaque a arquitetura brasileira. Merecem destaque também as revistas ilustradas “Fon-Fon!”, “Kosmos”, “Selecta” e “Para todos”, que iniciaram suas atividades entre 1902 e 1918, e percorreram as décadas seguintes se dedicando a moldar e divulgar uma imagem urbana brasileira ligada a modernização. Muitas das imagens presentes nestas publicações se tornaram referencias à produção arquitetônica moderna brasileira servindo de registros memoriais e contribuindo ativamente nas diretrizes e noções básicas sobre a mesma. Como cita o antropólogo Lauro Cavalcante em “Moderno e Brasileiro – História de uma nova linguagem da arquitetura (19301960), a influencia das transformações sociopolíticas e econômicas pelo qual passava o mundo chegou também aos fotoclubistas brasileiros, que aproveitaram para digerir as artes e a transformaram numa nova fotografia. A fotografia estava então inevitavelmente análoga à arquitetura, por um lado se aproveitando do modernismo internacional e, principalmente, o transformando e adaptando a um novo estilo e a uma nova leitura. 30


Uma junção de acontecimentos políticos e as condições históricas do período de transformação pelo qual passava o Brasil e o mundo nas primeiras décadas até a metade do século XX impulsionaram a divulgação da produção arquitetônica e voltou a atenção da crítica a ela. Foi a época em que se lançaram ao mundo arquitetos como Oscar Niemeyer, Lucio Costa, Afonso Reidy, Roberto Burle-Mark, Rino Levi, entre outros profissionais brasileiros os quais tiveram uma projeção grandiosa durante as gerações seguintes. Os meios de difusão elegeram a fotografia como principal artefato didático e de divulgação da arquitetura moderna, o que culminou nas grandes exposições e mostras realizadas na época, como as do Museum of Modern Art (MoMa) de Nova York, fundado em 1929. A repercussão e as críticas advindas destes eventos foram fundamentais para a difusão das idéias da arte moderna e da arquitetura mundiais, principalmente a americana e européia, e para tanto, possuía variados departamentos especializados em sua estrutura, como o de arquitetura e design, e o de fotografia, bem como uma gráfica que produzia as publicações ilustradas. É no MoMa que ocorre, em 1931, a importante exposição que marcou a história da arquitetura moderna. “The International Style: Architecture since 1922” foi organizada por Philip Johnson e Henry-Russel Hitchcok, resultado de viagens pelos EUA e Europa coletando desenhos e fotografias de obras modernistas. Através das fotografias de nomes como Piet Zwart, Even Van Ojin, Jan Kamman e pela Companhia Arquitetônica Fotográfica de Chicago, retratou as obras de Frank Lloyd Wright, Philip Johnson, Louis Sullivan, 31


entre outros nomes da arquitetura modernista. Essa forma de apresentação inovadora levou a criação de um catálogo homônimo, que se espalhou pelo mundo como apresentação de um novo estilo e servindo assim de referência. Nessa época, Philip Morton Shand escrevia sobre o poder da fotografia num artigo para a “Architectural Review” (1934), afirmando que “sem fotografia moderna, a arquitetura moderna nunca teria vingado”, reconhecendo a importância deste meio de difusão e propaganda do modernismo. Mais adiante, 1943, o MoMA foi cenário de mais uma mostra de relevância para a arquitetura moderna. Predominantemente fotográfica, “Brazil Builds: Architecture New and Old 1652-1942”, foi organizada pelo arquiteto Philip Goodwin, da comissão de relações exteriores do museu, e por G.E. Kidder Smith, um dos grandes nomes na fotografia de arquitetura da época. A mostra exibia a arquitetura brasileira a partir de imagens que se tornariam icônicas, registradas em alguns estados do país, a apresentando em três fases, a colonial, a eclética e finalmente chegando ao então estilo moderno. Tal exposição gerou o catálogo “Brazil Builds”, que veio a se tornar um clássico na historiografia da arquitetura brasileira. Discute-se então o surgimento de uma cultura visual da arquitetura moderna a partir destes documentos imagéticos produzidos pelos diversos fotógrafos de destaque neste meio. Algumas décadas a diante, os anos de 1950 e 1960 marcaram a presença da fotografia nos museus, estando igualmente importantes ao lado de outras expressões artísticas, como a pintura, a escultura e o desenho. Por ter uma relação direta e próxima com o referente fotografado e pela sua capacidade inegável de comuni32


cação clara do mesmo com o público, a fotografia recebe lugar de destaque juntamente às outras formas de arte, o que tornaram as imagens de arquitetura em verdadeiros ícones. Haja visto que a fotografia revolucionou a crítica arquitetônica desde seus primórdios, ainda mais intensamente o fez no movimento moderno. Philip Morton Shand, crítico do modernismo ligado a Gropius, Alvar Aalto e Maholy-Nagy, publicou um artigo em 1934 intitulado “Novos olhos para o velho”, no qual destacou a relação entre a Nova Arquitetura e a Nova Fotografia, afirmando serem estes os campos em que o espírito da época moderna conseguiu se manifestar definitivamente, uma vez que “(...) a mesma ornamentação que mudou a fotografia arquitetônica, revolucionou a crítica arquitetônica.” (MÉNDEZ, 2007) O modernismo foi um período importante para a fotografia de arquitetura, pois foi quando esta se transformou num poderoso artifício de comunicação e exposição em favor da arquitetura, indo além do valor arquitetônico como objeto e acrescentando-lhe um novo valor imagético, trabalhou a favor dos arquitetos modernos, mostrando ao mundo uma nova forma de projetar. Foi aí que se desenvolveu a rica relação entre arquitetura e representação que perdura até os dias de hoje. A cor também passa a ser vagarosamente inserida, cada vez mais utilizada pelas revistas, porém de muita relutância por parte de alguns fotógrafos de arquitetura, que partilhavam da opinião de que quando se tem cor, há uma distração, ela interfere nos contrastes, que se tornam menos evidentes. Segundo Eric de Maré, a cor era “menos criativa”. 33


O uso das cores era positivo para a publicidade e a fotografia documental, uma vez que tem o poder de transmitir mais informação. Porém, quando falamos em fotografia da arquitetura moderna, a cor não é enriquecedora, e em muitos casos pode ser considerada mera ornamentação distrativa, como afirmava Schulman, que depois de muito persistir, acabou por ceder as pressões da imprensa e das revistas, gradualmente transitando para as imagens em cores. O objeto registrado em preto e branco era conciso, direto e determinado. Ressaltava e focava o olhar para as nuances de tonalidades, texturas e contrastes, e principalmente as formas puras, tais quais os ideais dos arquitetos da arquitetura moderna. O uso da fotografia na arquitetura é importante também para o processo criativo, como uma ferramenta de memória dos espaços e referências, uma vez que fornece conhecimento, como visto, independentemente da experiência física, captando e classificando as informações. Segundo Gabrielle Basílico, o fotógrafo deve buscar a imagem no mesmo lugar que o arquiteto analisou onde deveria referenciar sua intervenção. Se este observa e desenha, induzindo mudanças na forma, o fotógrafo analisa e recontrói esse espaço, restituindo uma imagem, “O fotógrafo olha como quem constrói”. (GABRIELLE, 2006) Frank Lloyd Wright foi um dos primeiros grandes arquitetos a se dar conta da importância da fotografia de suas obras, mantendo ao longo de toda sua carreira o controle absoluto das imagens que o representava ao público. Arquitetos como Schindler e Richard 34


Neutra também sabiam da importância da imagem fotográfica de seus projetos e firmaram parceria com Julius Schulman, tendo suas casas registradas e, portanto divulgadas, através de suas lentes, o que contribuiu imensamente para seu reconhecimento frente ao público em geral. As famosas e aclamadas fotos das casas de Neutra foram seguidas de inúmeras encomendas de outros grandes representantes da arquitetura moderna. Segundo Eduardo Costa, Schulman muito colaborou com a disseminação das imagens das vanguardas de arquitetura para toda a comunidade de arquitetos, e ampliou seus horizontes na medida em que atingiu outras classes sociais. (COSTA, 2011)

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Ezra Stoller “A verdadeira fotografia arquitetônica é, principalmente, um instrumento de comunicação entre o arquiteto e seu público.”

Ao lado de Julius Schulman, Ezra Stoller é mundialmente conhecido como um dos melhores fotógrafos de arquitetura do século XX e principal referência para a fotografia de arquitetura em geral. Suas imagens tiveram papel de educadora da então jovem arquitetura moderna e ajudaram a estabelecer a harmonia e o bom gosto durante o modernismo. Foi muito influente dentro os arquitetos da época, associando-se a grandes nomes como Frank Lloyd Wright, Le Corbusier, Mies Van der Rohe, Aero Saarinen e Alvar Aalto, devido a sua exímia capacidade de captar os edifícios de acordo com a visão do arquiteto, o que conquistou o respeito e admiração destes grandes mestres da arquitetura moderna. Entusiasta do modernismo e de espírito disciplinado e consistente, chegava a esperar dias pelo momento exato em que a luz e a forma se combinariam com perfeição. Produziu fotografias que não apresentam distrações ou interferências, são imagens di36


retas e limpas, que foram de muita importância na introdução do modernismo na cultura de massas e na formação de sua percepção. Stoller fotografava com técnica impecável e capturava detalhes com precisão de focagem a todas as distâncias, excluindo o que considerava desnecessário para poder enfatizar o essencial com a sobriedade e clareza que demandavam os edifícios de arquitetura moderna. Stoller fotografou os pontos fortes da arquitetura moderna: simplicidade, proporção e equilíbrio. Seu trabalho revelava a narrativa do edifício, dedicando-se a mostrá-lo da melhor maneira possível, ajudando o espectador a melhor compreender o espaço. “Stoller via na geometria inerente aos edifícios, na perspectiva, profundidade, detalhe e iluminaçao, os instrumentos para tornar as suas imagens inesquecíveis.” (ABREU, 2012) As fotografias de Stoller dos edifícios icônicos do século XX refletem até hoje sua luz mistériosa, e uma vez vanguarda de uma era, embora recente, ja faz agora parte da história da arquitetura. As articulações de Stoller sobre os variados tipos de um modernismo heróico, o classificam e idealizam de maneira a qual a arquitetura por si só nao o faria, fossem eles volumes baseados em uma grelha como o Seagram Building, biomórfico como o TWA Terminal no aeroporto J. F. Kennedy (antigo Idlewild), ou de volumetria heterogênia como o Museu Guggenheim de Nova York, o que nos remete novamente a importância da destreza dos fotógrafos de arquitetura para aquela época, que se valiam de recursos como a geometria inerente do próprio prédio, as escolhas de perspectiva e profundidade, enquadramento, luz e tudo mais que 37


conspirasse para tornar aquelas imagens inesquecíveis. Stoller não temia em adicionar elementos triviais em suas fotografias, carros, asas de avião, hidrômetros e principalmente as pessoas, particularidades que demonstravam que aquele modernismo era acessível a todos.

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2. TWA Terminal no Aeroporto JF Kennedy (ent達o Idlewild), New York. Aero Saarinen, 1962.

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3. Seagram Building , New York. Mies Van der Rohe e Philip Johnson, 1958.

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4. Guggenheim Museum, New York. Frank Lloyd Wright, 1959.

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Marcel Gautherot

O fotógrafo francês Marcel Gauterot traçou uma trajetória de destaque na fotografia de arquitetura mundial. Foi um dos profissionais a integrar a importante publicação Brazil Builds, com fotografias que produziu de obras da arquitetura colonial e moderna brasileiras, e é desse momento em diante que veio a se tornar o autor dos principais e mais reconhecidos registros das obras de Oscar Niemeyer, destaque para a cidade de Brasília, e da arquitetura moderna em geral. Gautherot iniciou seus estudos acadêmicos em arquitetura e durante sua formação incompleta, a arquitetura foi marcada pela ascensão e euforia do modernismo, centrado no pensamento de Le Corbusier e da Bauhaus o que pressupostamente veio a moldar a sua estética fotográfica. O interesse pela fotografia cresce quando passa a participar de projetos fotográficos e arquitetônicos, e ao atuar como fotógrafo etnográfico passa a viajar a outros países em busca de novas culturas para registrar. Muito influenciado pela cultura latino americana, em viagem ao Brasil fez expedições pelo norte e nordeste, e após sair e 42


retornar do país se estabeleceu no Rio de Janeiro, onde foi convidado a colaborar com o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – SPHAN, o que o levaria mais adiante a se aproximar de Niemeyer e do círculo de arquitetos modernistas, para Carlos Drummond de Andrade, foi “um dos mais notáveis documentadores da vida nacional”. Contratado como fotógrafo viajou pelo país registrando as imagens que viriam a fazer parte do Brazil Builds, juntamente com Kidder Smith. Gautherot passa a registrar toda a obra de Niemeyer, onde fortalecem uma parceria colaborativa desde a Pampulha em Belo Horizonte, até Brasília, a qual acompanhou desde o grande canteiro de obras até os edifícios finalizados, produzindo imagens hoje icônicas do apogeu da arquitetura moderna brasileira. Em razão da parceria estabelecida, Gautherot participou de importantes publicações sobre as obras de Niemeyer que contribuíram para sua consolidação como um dos mais importantes arquitetos do ainda jovem modernismo nacional e para repercussão de suas obras pelo mundo.

Brasília permanece, por exemplo, nas páginas das pu-

blicações de arquitetura como projeto de grandiosidade e êxito, resultante do trabalho dos arquitetos modernos que representavam ali, para o mundo, a arquitetura brasileira.

Freqüentemente a cidade projetada por Lúcio Costa e

suas conhecidas edificações de Oscar Niemeyer são retomadas em exemplos, debates, críticas e volta as publicações atuais. Tor43


naram-se suas imagens ícones da arquitetura moderna brasileira e forem exportadas a conhecimento mundial, bem como as obras de outros expoentes do modernismo, como Lina Bo Bardi, Vilanova Artigas, ainda que seguissem entre si diferentes frentes de ação na arquitetura por eles postulada. “Já a valorização da imagem como fator projetual parece ser mesmo outra inovação nos modos de projetar de Lúcio Costa (...). Não projeta uma imagem à guisa de espaço. Ao contrário, ele elabora um espaço e se apropria das imagens para forjar, formular uma espacialidade que opere seu discurso sobre o Brasil.” (ROSSETTI, 2007) Mais do que divulgar Brasília, as fotografias mostraram a técnica, logística, política e estética de que se valeram os arquitetos para reestruturar o país. A modernidade enquadrada por Gautherot foi utilizada para reafirmar o patamar já alcançado e como meio de consolidar a grandeza proposta por Lúcio Costa ao projetar a cidade. A coleção de fotografias de Gautherot no Brasil é grandiosa. A principal delas acompanhando as obras no planalto central anos mais tarde veio a produzir o livro Brasília. Em acervo hoje pertencente ao Instituto Moreira Sales, são quatro mil imagens que documentam a construção de Brasília, entre 1955 e 1960. Ao lado de trabalhos sobre o complexo da Pampulha e o prédio do Ministério da Educação e Saúde, as fotografias de Brasília garantem a Gautherot o título incontestável de principal documentador e divulgador da arquitetura moderna brasileira, com imagens publicadas em revistas do mundo inteiro nos anos 1950-1960. (Instituto Moreira Sales) 44


5. Congresso Nacional, BrasĂ­lia. Marcel Gautherot. Oscar Niemeyer, 1960.

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6. Congresso Nacional, BrasĂ­lia. Marcel Gautherot. Oscar Niemeyer, 1958.

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7. Palácio da Alvorada, Brasília. Marcel Gautherot. Oscar Niemeyer, 1960.


6. A contemporaneidade e Nelson Kon A era da tecnologia digital tem permitido uma produção e reprodução das imagens em um ritmo frenético e facilitado, de modo que a fotografia tem se expandido democraticamente e é atualmente onipresente. As imagens de arquitetura fazem hoje parte do nosso cotidiano e seu registro fotográfico nunca esteve tão presente no desenvolvimento e crescimento da arquitetura. Nunca na história da fotografia de arquitetura sua fixação no tempo e na memória foi de tanta importância e relevância. A sociedade se tornou dependente das imagens, sendo la fundamental para a sobrevivência de variados meios, como o artístico, cultural, comercial e o social. A importante participação da fotografia na arquitetura modernista do século XX alterou pra sempre a sua relação nas décadas seguintes até os dias atuais. Essa relação induziu a uma forte dependência pela representação do espaço arquitetônico, desconectando a fotografia de um valor meramente documental e a aproximando dos meios de comunicação 48


e representação artística. O arquiteto contemporâneo freqüentemente deposita numa reprodução por imagem um valor próximo a perfeição, sem deixar de exprimir uma neutralidade do espaço e do objeto arquitetônico em questão, compatível com o que seria a materialização máxima do seu imaginário. Os fotógrafos mais contemporâneos procuram transmitir e captar a experiência do edifício, de vivenciá-lo, um modo de ver de determinado instante, como se tentasse transmitir uma sensação de encontro com a obra arquitetônico. Alguns fotógrafos gostam de explorar o espaço público, onde acontece a vida cotidiana. As histórias que se desenrolam nesse ambiente construído servem como validação da arquitetura, mostram que ela funciona e que os espaços públicos podem, de fato, fazer a diferença na vida da população. Portanto, é comum a encomenda da imagem de representação de uma obra de arquitetura a “fotógrafos-artistas” que possuidores de uma capacidade criativa e estilo próprio, produzem fotografias com características visuais que vão além da propriedade apenas documental. “O convite a ‘fotógrafos-artistas’, ao contrário dos fotógrafos ‘documentalistas’ que tentam permanecer invisíveis perante a realidade fotografada, comporta os seus riscos: o seu olhar é sempre crítico e raramente inócuo perante o objeto arquitetônico”. (BANDEIRA, 2007, p. 118) 49


Sabendo da enorme exposição e divulgação devido a atual midiatização, os arquitetos buscam no trabalho deste fotógrafo artista uma visão da sua própria idealização, em oposição a um caráter meramente documental e com base em suas bagagens estéticas e filosóficas do mesmo. As contribuições visuais destes fotógrafos sobre o produto de imagem final asseguram sua participação na representação da arquitetura, tornando-se verdadeiros aliados dos arquitetos. “Os arquitetos com os quais tenho mais afinidade não aflam muito. Entendo melhor a arquitetura deles e eles confiam em mim. É interessante terem um certo desprendimento e permitirem, ao fotógrafo, uma leitura mais livre de sua obra – podem ter boas e más surpresas.” (KON, 2008, p. 16) O legado de obras da arquitetura moderna continua sendo registrado pelos fotógrafos em atividade nos dias de hoje. Da mesma forma que alguns buscam retratar obras de cunho patrimonial e histórico do Brasil colonial, alguns tem dedicado parte de suas carreiras em busca dos melhores registros das edificações do movimento moderno. Nomes como Gabriele Basilico (falecido em 2013), Richard Pare, Fernando Guerra, Nelson Kon e o jovem Leonardo Finotti, entre outros, são nomes de destaque na cena da fotografia de arquitetura atual, e em seu currículo podemos também encontrar obras de grandes arquitetos do modernismo.

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Nelson Kon Arquiteto formado pela FAUUSP em 1983, Nelson Kon tem seguido uma trajetória que já o consolidou como um dos melhores fotógrafos de arquitetura da atualidade. É um dos distintos profissionais que consegue traduzir em imagens as palavras, desenhos e conceitos dos arquitetos, especialmente aqueles com quem tem ideias em comum. Kon foi muito influenciado pelo trabalho do fotógrafo japonês Yukio Futagawa, referência no ramo da fotografia de arquitetura que viajou os últimos 50 anos retratando os marcos do modernismo, como as obras de autoria de Le Corbusier e Mies Van der Rohe, é também editor e fundador da referenciada revista FAGlobal Architecture, de muito reconhecimento para a fotografia de arquitetura moderna. A precisão técnica encontrada em profissionais como Futagawa se tornou uma meta e um método para Nelson Kon. Kon também diz ter sido inspirado por fotógrafos de rua como Cartier-Bresson, Robert Frank e Bressai, e ainda que possa se encontrar características destes em suas fotos, se auto classifica como fotógrafo comercial, uma vez que há por trás um cliente com uma solicitação a ser atendida e afirma que “por alguma razão, é pecado você não ser um fotógrafo autoral. Isso durante muito tempo me incomodou – hoje não. Sou um fotógrafo comercial. Não tenho talento para ser um fotógrafo autoral, mas acho até que faço bem o que faço.” (KON, 2008). Seu acervo é formado por encomendas de clientes, com algumas exceções em momentos que realizou ensaios de motivação própria. 51


Kon tem opinião de que as revistas de arquitetura, que surgiram no século XX, não foram criadas para fazer crítica à arquitetura e sim para uma militância a favor da difusão da arquitetura moderna. No momento em que o modernismo se consolidou, esse caráter deveria ter mudado, mas pouco se alterou até os dias de hoje, Kon pontua que “as revistas e fotógrafos continuaram militantes, a serviço de uma arquitetura e com uma posição quase sempre positiva e acrítica em relação aos projetos que apresentam.” (KON, 2008) Nas últimas décadas as fotos de Nelson Kon têm marcado presença em livros e revistas nacionais e internacionais sobre arquitetura moderna e contemporânea. Além de registrar as obras desta com destreza, fotografou obras modernas icônicas de grandes mestres, como Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Rino Levi, Lina Bo Bardi e Vilanova Artigas, com destaque a este último pelo seu registro da Rodoviária de Jaú, a qual foi tema do estudo fotográfico do presente trabalho. A capacidade técnica de Kon somada a sensibilidade resulta em imagens que envolvem o espectador. Ao retratar e pontuar as edificações realizadas pelos principais arquitetos modernistas e contemporâneos brasileiros, seu acervo representa e transmite “a aspiração e a materialização de um pensamento sobre o ser humano na relação com os espaços sociais e privados”. (CHIODETTO, 2014).

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8. OCA (Palรกcio das Artes), Sรฃo Paulo. Nelson Kon, 2009.

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9. Rodoviária de Jaú. Nelson Kon, 2009.

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10. Rodoviária de Jaú. Nelson Kon, 2009.

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7. Ensaio | a estaçao rodoviária de Jaú, de Vilanova Artigas “- A senhora não vai descer? - Não, eu vou para Jaú. - Mas nós estamos em Jaú. - Que nada, rapaz, eu conheço Jaúe, lá, não tem dessas coisas!”1

O projeto modernista de 1973 de Artigas se caracteriza por uma engenhosa solução estrutural e sua inserção na cidade, e está entre a principal das cerca de 15 obras que o arquiteto realizou em Jaú em um período de dez anos. Os pilares medem oitenta e cinco centímetros de lado, se abrem em formato de flor. Estão dispostos sob uma retícula de dez por dezessete metros: dezoito pilares em três linhas de seis. Sobre cada pilar, a laje desfaz-se numa abertura circular de quatro metros de diâmetro no nível superior e seis metros no nível inferior. O pilar segue a abertura, gira quarenta e cinco graus e se desabrocha em quatro componentes curvos. Cada vértice transforma-se num com1 Anedota. Fundação Vilanova Artigas e Instituto Lina Bo e PM Bardi. VIlanova Artigas: arquitetos brasileiros. São Paulo. 1997, p.178

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ponente, dividindo cada face ao meio e mantendo a ortogonalidade da retícula. Sobre eles, uma laje retangular em caixão perdido de cinquenta por cinquenta e oito metros, e um metro e meio de altura, configura a cobertura do edifício. O edifício aproveita o acentuado declive topográfico de 7 metros. Dele surgem os cinco níveis principais construídos à meia altura entre eles e conectados por rampas. As três fileiras de seis pilares criam dois vazios transversais no edifício. Um deles dá lugar as rampas que conectam os pavimentos. O outro é a entreda dos ônibus para a plataforma de embarque e desembarque. Os acessos principais ao edifício estão por seus dois lados opostos mais extensos, através das vias que passam pela cota mais alta e pela mais baixa do terreno. Outros dois acessos secundários estão nas laterais do edifício, paralelos à via de acesso dos ônibus, através de uma rampa que surge do passeio público e leva a um nível intermediário do edifício. (FRACALOSSI, 2013) A estação rodoviária de Jaú é um dos projetos mais importantes de João Batista Vilanova Artigas e, realizado em sua ultima fase de projetos, sintetiza uma série de procedimentos que fazem parte da carreira de Artigas como arquiteto. O projeto ficou muito conhecido e foi incansavelmente publicado pelas revistas da época, sendo até hoje destacado nos recentes estudos da obra de Artigas, principalmente no ano presente, de seu centenário. “Desde as primeiras divulgações, esse projeto de Artigas foi objeto de uma certa curiosidade, tornando-se, ao longo do tempo, bastante conhecido nos meios arquitetônicos. Sua 57


marca símbolo costuma ser representada nas imagens, pela singularidade do desenho, de seus apoios internos. Porém, há que se observar que o projeto contém uma dimensão muito maior. O alcance da proposta se revela no tratamento arquitetônico de um problema concreto do ambiente urbano. Atento a essa questão, Artigas responde ao cumprimento de um programa restrito para uma estação rodoviária, de uma forma tão ampla e inusitada, que a obra acaba promovendo uma integração urbana.” (THOMAZ, 2007)

As fotografias presentes nesse ensaio foram realizadas

entre os meses de Setembro de 2014 a março de 2015, em diferentes horários em busca de uma melhor luz e resultados diferentes. Foi escolhida a fotografia monocromática (preto e branco) para seguir uma linguagem sem interferências de cores, como ja visto. Buscou-se inspiração nos fotógrafos aqui descritos, porém com conteúdo e características próprias, em uma tentativa de, além de registrar, transmitir o potencial da obra de Artigas.

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8. considerações finais

A fotografia de arquitetura permite uma comunicação do arquiteto com seu publico. Através das competências do fotógrafo de capturar, além da forma, a essência dos objetos arquitetônicos e de seus respectivos criadores, tem sido possível a construção de um vasto arquivo imagético referencial, histórico e memorial – um rico portfólio - capaz de exaltar grandes obras e as trazerem ao alcance do espectador. A imagem fotográfica das obras arquitetônicas é também o resultado do imaginário e da idealização do arquiteto, reproduzido através das lentes do fotógrafo. A fotografia como representação e expressão da arquitetura segue o resultado da obra e olhar do fotografo que a produz, mas, sobretudo, o desejo e idealização do arquiteto. Portanto, além de algo que representea essência dessas obras, buscam-se cada vez mais imagens que se fixem no olhar e se transformem em memória e que mais adiante serão recordadas como aspetos inspiradores para novas mentes e novos imaginários. A paisagem urbana é algo a ser visto e lembrado, a cidade com suas ruas, edifícios e espaços formam um conjunto de elemen70


tos nos quais buscamos prazer e que são cenários da vida cotidiana. Através das imagens possibilitou-se o congelamento dessas ambiências por quais passam os olhares, ou levaram até eles lugares e obas então distantes e inacessíveis. Desta forma, encurtaram-se as distâncias e o tempo, algo de valor eminente na sociedade cotemporânea. Por meio do rico trabalho de grandes fotógrafos que têm acompanhado o desenvolvimento e crescimento da arquitetura desde o surgimento do dispositivo fotográfico, somos servidos por infinitas imagens das obras de renomados arquitetos, o que permite a construção de um vasto arquivo imagético, ao qual todos podem ter acesso a partir do avanço da tecnologia. Durante toda a ainda relativamente recente história da fotografia de arquitetura, fotógrafos e arquitetos têm formado parcerias que perduram durante toda a carreira. A necessidade e procura de midiatização arquitetônica tem influenciado, desde a expansão do modernismo no início do século XX e de forma mais intensa na contemporaneidade, a forma como os arquitetos procuram nas imagens de representação um meio de divulgarem e sobrevalorizarem seus projetos, as vendo também como possibilidade de expandirem sua obra a nível de conhecimento mundial. A arquitetura moderna nascente precisava ser vista, buscava ali sua propaganda e sua divulgação. Há quem defenda que a arquitetura moderna só a foi como conhecemos graças à fotografia. É difícil afirmar tal hipótese com certeza, porém grande parte de sua repercussão de sucesso e expansão mundial se deve, de fato, a fotografia. Sem as imagens das grandes obras modernistas que revelaram os arquitetos modernos


ao mundo, tal difusão em grande escala não seria possível. A fotografia foi necessária ao modernismo, foi ela alavanca, propulsão. Através da conexão de ambos os artistas, fotógrafo e arquiteto, a explosão da modernidade no meio urbano foi registrada com destreza. Os arquitetos em destaque naquela época de transformações e inovações que marcaram o final do século XIX e inicio do século XX, encontraram respaldo nos registros fotográficos de grandes profissionais, que fizeram das obras modernas referências e memória de uma era que rompeu com as tradições e marcou uma era de intensa modernização. A fotografia de arquitetura foi e continua sendo meio de relevante importância para a arquitetura. Ainda que apenas parte de uma representação de um edifício, um fragmento de um todo, arquitetura faz-se valer de uma série de formas de representação, sendo uma delas a fotografia de arquitetura, que atreladas comunicam, representam e sobretudo captam a intenção do arquiteto.

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