Trupé | Boletim Informativo do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore.

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TRU PE

Boletim Informativo do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore Nº 02, Dezembro 2012

SEMANA DAS CULTURAS POPULARES

ENTREVISTA

PÉ NA ESTRADA

A cultura popular através do olhar de Maria Laura Cavalcanti, professora da UFRJ

Trupé foi a Coqueiro Seco e conheceu grupos de folguedos

ISSN 2316-5413

Museu Théo Brandão comemora o Dia Internacional do Folclore


eDitorial No dia 6 de outubro de 2012, a equipe do programa “Folguedos Populares” pegou a estrada rumo ao município de Coqueiro Seco. A beleza da viagem, com deslumbrantes paisagens de coqueiros e manguezais (ainda preservados!) à beira da lagoa Mundaú, anunciava o que estava por vir. Era um sábado de sol e céu azul, e o propósito da visita era promover o encontro entre nós, pesquisadores e estudantes da Universidade Federal de Alagoas, interessados na temática dos folguedos, e o grupo da finada mestra Luzia Simões, atualmente coordenado por Lucimar Alves, para um dia de vivência e troca. Chegando à praça central, na beira da lagoa, onde ao longe se tem uma bela vista de Maceió, esperavam-nos mestres, mestras, brincantes e crianças que, com dedicação e perseverança, seguem firmes conduzindo, com alegria, a Chegança, o Pastoril e as Baianas de Coqueiro Seco. O que se sucedeu nesse dia? Isso é o que você, leitor, verá nas páginas desta segunda edição do Trupé, boletim informativo do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore. Ainda nesta edição, o leitor poderá acompanhar as principais atividades e discussões da Semana das Culturas Populares, evento que aconteceu entre os dias 21 e 23 de agosto no Museu, em comemoração ao Dia Internacional do Folclore. Com uma programação diversificada, abrangendo a entrega do Prêmio Gustavo Leite ao artesão do ano, apresentações culturais, oficinas de danças populares e um seminário para discutir a obra de Théo Brandão, a semana agitou o Museu nesses três dias do mês de agosto, provocando debates e vivências a respeito das culturas populares. O momento do lançamento desta segunda edição do nosso Trupé coincide com o período natalino, ocasião de maior mobilização e efervescência de folguedos e folias ao redor de todo o Brasil. Com a luz da estrela que tão intensamente brilhou para os Três Reis Magos, guiando-os pelo bom caminho, desejamos a todos um Natal de paz e um novo ano repleto de amor e alegria. E viva Santos Reis! Viva! Wagner Chaves

Expediente Trupé - Boletim Informativo do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Coordenação Editorial: Fernanda Rechenberg e Wagner Chaves Jornalista responsável: Jacqueline Batista MTb 576 Texto: Francisco Ribeiro e Jacqueline Batista Projeto Gráfico/Diagramação: Victor Sarmento (publicitário) MTb 001 Fotografia: Jacqueline Batista, Victor Sarmento e Francisco Ribeiro Fotografia de Capa: Francisco Ribeiro Edição e Revisão: Jacqueline Batista 02


ENTREVISTA

"Todo bom legado é para ser usado" A professora da UFRJ, Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti, fala sobre a obra de Théo Brandão, os estudos do folclore e a cultura popular brasileira. Jacqueline Batista Jornalista

maria Laura Cavalcanti

Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti é referência quando o assunto é Antropologia e cultura popular. Professora do Departamento de Antropologia Cultural e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA) do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é autora de vários livros e artigos sobre o tema. A professora já atuou como pesquisadora do Instituto Nacional do Folclore da Fundação Nacional de Arte e do Setor de História da Fundação Casa de Rui Barbosa, além de prestar consultorias ao IPHAN, Biblioteca Nacional e UNESCO. Atualmente, ela realiza as pesquisas “Simbolismo e análise cultural: um estudo comparativo de rituais populares” e “Fundo Oracy Nogueira: um capítulo das ciências sociais no Brasil”. O Museu Théo Brandão recebeu Maria Laura para apresentar a conferência "Antropologia e estudos de folclore em diálogo", na programação da “Semana das Culturas Populares”, promovida em agosto. Na ocasião, houve o lançamento do seu último livro “Reconhecimentos. Antropologia, folclore e cultura popular. Trupé aproveitou a presença da professora para uma conversa. Nesta entrevista, ela fala sobre políticas públicas para a cultura, o papel de um museu universitário, e avalia a obra de Théo Brandão. Como a senhora percebe a relação da antropologia e os estudos do folclore? A antropologia é um campo de conhecimento formado por muitas correntes de pensamento. A tradição dos estudos do folclore é uma entre as vertentes formadoras da Antropologia no mundo e no Brasil. Especificamente em Alagoas, como esses estudos vêm sendo desenvolvidos? No Brasil, entre os anos de 1940 e 1950, aconteceu um movimento muito importante em prol dos estudos do folclore, foi o Movimento Folclórico Brasileiro. Esse movimento promoveu muitas semanas nacionais de folclore em diferentes estados brasileiros, congressos nacionais de folclore, que estimularam o estudo do folclore no país todo. Uma das semanas importantes foi realizada em 1952. Em Alagoas, quem se destacou foi Théo Brandão. Seus trabalhos marcaram o folclore alagoano no país todo. Hoje em dia, com o crescimento das Ciências Sociais e da Antropologia dentro das universidades, esse campo do estudo do folclore passa por uma renovação. Isso é muito estimulante. Há muita coisa para ser feita de uma forma contemporânea, tanto no Brasil, quanto em Alagoas. Aqui, especialmente, o Museu Théo Brandão, que é da Universidade Federal de Alagoas, é um lugar propício para estimular essa retomada. 03


Como pesquisadora dos estudos do folclore, como a senhora avalia o legado deixado por Théo Brandão? São trabalhos percussores e fundamentais. Os fatos vivos que ele estudou nas décadas passadas continuam vivos. Mas, como todo bom legado, é para ser usado, apropriado, estar acessível, sujeito à crítica, ao conhecimento, à renovação do conhecimento. É importante inventariar, catalogar, mas não deve ser posto no altar. O desafio é continuar atualizando o conhecimento sobre os fatos vivos da cultura popular. Assim como Alagoas, outros estados brasileiros são muito ricos em manifestações culturais. Faltam políticas públicas para o fortalecimento da cultura popular no Brasil? O Brasil tem se desenvolvido muito sob esse aspecto. No século XX, muitas de suas instituições culturais nascerem com um pensamento muito moderno. O Movimento Folclórico Brasileiro sensibilizou a opinião pública e autoridades da época para democratizar a cultura com a criação de museus, bibliotecas. Foram feitos esforços importantes para valorizar a cultura popular tanto quanto a cultura erudita é valorizada. As coisas têm caminhado no sentido de atender as demandas desse desafio. A política de patrimônio imaterial é um passo importante nesse sentido. Tem sido um instrumento importante, um trabalho sério, que tem inventário, registro. Foi uma conquista. Eu não sinto que há um descaso com a cultura popular no Brasil. O descaso é maior com as instituições culturais. De um modo geral, as instituições públicas no Brasil são precárias. O desafio é cuidar, aprimorar as instituições culturais. O país precisa de instituições culturais ativas, que tenham manutenção, cuidado com o acervo, e de técnicos capacitados. Isso é fundamental para o país fazer jus à cultura popular. É um trabalho de médio prazo, mas que é fundamental para o processo democrático. Qual papel deve exercer um museu universitário, como é o caso do Museu Théo Brandão? É muito feliz que Alagoas tenha um Museu de Antropologia e Folclore dentro da Universidade. Isso mostra o quanto Théo Brandão considerava o conhecimento importante. Honrar essa herança é manter o desafio, produzir o conhecimento aberto, arejado, pôr as pessoas no seu tempo, articular a produção do conhecimento atualizado e disponibilizar esse conhecimento. É um potencial muito animador. Nos anos de 1990, vim aqui e o Museu estava fechado. É muito feliz ver o Museu aberto e com o trabalho que está sendo feito.

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FOLCLORE EM FESTA Francisco Ribeiro Estudante de Jornalismo

Ele atravessou gerações e continua presente nos dias atuais. Pouco se sabe de onde veio e como surgiu, mas acredita-se que seja resultado da mistura entre a cultura europeia, negra e indígena. O folclore nacional é constituído por crenças, mitos, lendas, festas, superstições e artes manifestadas pelo povo. Por isso, desvela a formação da cultura popular e da identidade brasileira. Ao pé da letra, a palavra “folclore” quer dizer “saber do povo”. Ela foi utilizada pela primeira vez por William John Thoms (1803-85), importante arqueólogo, escritor e colecionador inglês, numa carta publicada no jornal londrino O Ateneu, em 22 de agosto de 1846. Desde então, a data passou a ser o Dia Internacional do Folclore. Décadas depois, em 1965, a festividade foi instituída no calendário comemorativo do Brasil, mas celebrações não ficaram restritas a essa data, e, sim, distribuídas ao longo de todo o mês de agosto. Celeiro de diversas manifestações populares, como, por exemplo, os folguedos Guerreiro, Baiana, Reisado, Pastoril entre outros, o Estado de Alagoas não poderia ficar de fora das comemorações. Dessa forma, o Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore (MTB) promoveu a “Semana das Culturas Populares” nos dias 21, 22 e 23 de agosto. A programação do evento proporcionou atividades culturais variadas, contemplando os alagoanos com a apresentação da companhia teatral franco-brasileiro “Teatral La Voix Du Hérisson” e o seminário “Théo Brandão, a antropologia e os estudos de folclore”, cujo propósito foi o de destacar o papel do médico, professor e folclorista alagoano Theotônio Vilela Brandão enquanto pesquisador da cultura popular alagoana, nordestina e até mesmo brasileira. Na ocasião, foi entregue o tradicional Prêmio Gustavo Leite 2012, em homenagem aos artesões alagoanos. CICLO DE DEBATES Resultado de uma ação do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore (MTB), através do programa “Folguedos Populares em Alagoas”, a semana dedicada às culturas populares foi uma entre várias atividades que foram inseridas no “Ciclo de Debates sobre Cultura Popular, Museus e Acervos Documentais e Audiovisuais”. O Ciclo de Debates é formado por quatro seminários temáticos e um encontro de mestres da cultura popular alagoana. A Semana iniciou a sua programação na terça-feira, 21 de agosto, com a “Oficina aberta de danças populares”. A iniciativa faz parte do Programa “Museu em Movimento”, que é uma promoção da própria instituição, em conjunto com a Pró-Reitoria de Extensão (Proex), a Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e a Companhia dos Pés. As oficinas são coordenadas pela professora do Curso de Dança da Ufal, Telma Cesar Cavalcanti, e ministradas pelo professor Edson Santos. Iniciadas em maio desse ano, as aulas são gratuitas e vem reunindo interessados em aprender passos típicos das danças de frevo, coco de roda, forró, baiana, fandango, guerreiro e pastoril. De acordo com Santos, “a oficina tem a finalidade de promover a cultura popular e aproximá-la da comunidade por meio da dança”.

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COMEMORAÇÕES No segundo dia da Semana, 22 de agosto, foi realizado o seminário “Théo Brandão, a antropologia e os estudos de folclore” – o primeiro entre os eventos que compõem o Ciclo de Debates. Divido em dois painéis, o seminário contou com a presença da professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti, da museóloga Cármem Lúcia Dantas, do diretor do Museu da Imagem e do Som (Misa), Fernando Lôbo, e do folclorista e antropólogo, José Maria Tenório Rocha. Na cerimônia de abertura, a Vice-reitora da Ufal, Rachel Rocha, e o antropólogo e professor da Ufal, Bruno César Cavalcanti, destacaram a importância de Théo Brandão enquanto estudioso do folclore alagoano. “Se hoje temos vasto conhecimento a cerca das manifestações da cultura popular do Estado devemos isso a ele”, salientou Rachel Rocha. “Théo Brandão foi um homem de destaque e permanece vivo por meio das suas obras. Ele possuía um interesse real e afetivo com seus objetos de estudo. Cármem Lúcia cumpriu a sua função de guardiã desse acervo e Fernando Lôbo traz como marca a sua atuação como gestor de bens culturais. Ambos contribuíram significativamente para a preservação do Museu, que hoje é dirigido por Wagner Chaves”, disse Bruno César Cavalcanti. O primeiro painel “Aspectos da obra e da trajetória de Théo Brandão: o olhar de discípulos” reuniu profissionais que conviveram boa parte de suas vidas ao lado do folclorista alagoano, falecido há 30 anos. Ao longo da sua fala, Lôbo aproveitou a oportunidade para revisitar a história do Museu. “O Museu foi criado no dia 20 de agosto de 1975 e instalado provisoriamente na casa nº 3 do Campus Tamandaré, no Pontal da Barra, para abrigar a grande quantidade de bens que Théo recolhia sobre os aspectos da cultura popular. Eram tantos que já não cabiam em sua residência. Somente em 1977, por ocasião da V Festa do Folclore Brasileiro, realizada em Maceió, a coleção do museu foi transferida para a atual sede própria, situado na Avenida da Paz, no centro de Maceió”, contou. Segundo Lôbo, Théo Brandão além de competente médico e folclorista era um grande professor. “Sua verve acadêmica se relevou logo quando procurou inserir o estudo do folclore dentro da universidade, como disciplina dirigida a Antropologia”, disse. Sempre preocupado com a qualidade das aulas que ministrava, ele buscava usar os recursos mais avançados que dispunha na época, como o retroprojetor. 06


“Enquanto pesquisador, Théo deixou muitos trabalhos para serem divulgados. O programa 'Folguedos Populares em Alagoas' que está em andamento no Museu pode ser uma forma de disponibilizá-los ao público”, observa. O folclorista e antropólogo José Maria Tenório Rocha resgatou lembranças do seu convívio com Théo Brandão e, assim, apresentou a todos um homem humilde e extremamente dedicado ao seu trabalho. “'Quem já viu um médico desse jeito? Vôti!', dizia o povo sobre Théo. Isso acontecia porque ele consultava as mulheres que iam consultá-lo, pois via naquelas pessoas uma forma de aprender mais sobre as crendices e religiosidades do povo. Outra coisa que chamava a atenção era o bom humor e o fato de estar sempre produzindo e publicando”, lembra o autor do livro “Théo Brandão: mestre do folclore brasileiro”. A museóloga Cármem Lúcia Dantas concluiu o painel destacando o entusiasmo do folclorista alagoano em relação à cultura popular. “Éramos jovens e acredito que não tínhamos noção da dimensão que estar ao lado de Théo acabaria ganhando. Ele tinha um enorme prazer em estimular os jovens alunos a seguirem adiante na carreira acadêmica. Em vida, deu verdadeiros ensinamentos de humanidade”, conta. REDESCOBRINDO O BRASIL “Minha obra toda badala assim: brasileiros, chegoua hora de realizar o Brasil.” Ao fazer a seguinte declaração, o romancista e historiador paulista Mário de Andrade (18931945) revelaria o caminho que iria percorrer em busca da identidade nacional. Assim, em 1938, reuniu uma equipe com o objetivo de catalogar músicas do norte e nordeste do país. À frente do Departamento de Cultura e Recreação da Prefeitura Municipal de São Paulo, que ajudou a criar, juntamente com o escritor e arqueólogo Paulo Duarte, Andrade lançou a missão de “conquistar e divulgar a todo país, a cultura brasileira”. O leque de ações da entidade era amplo, indo desde a investigação cultural e demográfica, como construção de parques e recriações, até o lançamento de importantes publicações culturais. Foi resgatando a importante atuação de Mario de Andrade para os estudos do folclore nacional, que a professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti, deu início ao painel “Antropologia e estudos de folclore em diálogo”. Segundo Maria Laura, os primeiros antropólogos foram percussores de uma série de preocupações sociais. “Os estudos de folclore penetraram na mentalidade cultural do país. Se feito um comparativo, o assunto estava tão em evidência quanto à sustentabilidade é hoje. Entretanto, no início, essas pesquisas eram vistas como trabalhos descontextualizados. Os profissionais que se lançaram anos depois a redescobrir o que foi feito na época assumiram um grande desafio: o de compreender a grandeza do pensamento brasileiro, o qual ainda há muito a ser feito”, observa. “Por isso, foi crucial inserir o folclore como campo de estudo. Afinal, ele também deve ser alvo de políticas públicas, pois traduz os processos de cultura popular brasileira”, defende. Na ocasião, foi realizado o lançamento do livro “Reconhecimentos. Antropologia, folclore e cultura popular”, da professora Maria Laura. A obra é formada por artigos de abrangência variada e de diversos autores. Com isso, a autora enfatiza que o tema da cultura popular revela sua grande riqueza exatamente em suas diversas ressignificações e adaptações. Os artigos discorrem sobre antropologia e folclore a partir de ensaios da própria autora, além de Florestan Fernandes, Edison Carneiro, Oracy Nogueira, Roberto DaMatta, Mário de Andrade e outros. 07


O segundo dia da Semana foi encerrado com a cerimônia de entrega do Prêmio Gustavo Leite 2012 aos artesãos alagoanos. Neste ano, os vencedores foram Mestre Vieira e Mestre Valmir, ambos artistas da Ilha do Ferro, povoado de Pão de Açúcar. Para finalizar a programação do dia nacional do folclore, subiu ao palco dos jardins do Museu, o Guerreiro Campeão do Trenado, do Mestre José Cícero. UNIVERSO VIVO No terceiro e último dia, 23 de agosto, o grupo teatral franco-brasileiro apresentou o espetáculo “Cabanas, habitações precárias, poéticas, essenciais”. O musical é uma produção da companhia “Teatral La Voix Du Hérisson”, de Grenoble, França, que contou com o apoio de Francisco Oiticica. De acordo com Wagner Chaves, o propósito da semana foi dar visibilidade ao universo vivo, dinâmico e plural das culturas populares “que se fizeram presentes de distintos modos, nas reflexões, exibições e emoções suscitadas e compartilhadas durante bons dias de vivência fraterna e democrática nessa instituição pública chamada Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore”.

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Francisco Ribeiro estudante de Jornalismo

Desbravar caminhos nunca antes trilhados não é uma tarefa fácil até para quem tem como ofício a etnografia, imagine então para quem decide por paixão se arriscar em terras desconhecidas. “Eu nunca fui um pesquisador que saísse para fazer uma pesquisa armado de todo aquele aparato dos sociólogos e de uma equipe que pudesse ajudar. Eu saía sozinho, às vezes acompanhado (...) mas isso tudo fazia, roubando sábados e domingos da minha atividade como médico, era o meu 'hobby', descanso da minha profissão”, contou Théo Brandão ao amigo antropólogo Bráulio do Nascimento. Ainda que tenha levado a atividade de estudo in loco como hobby, Théo reuniu um extenso acervo tridimensional com cerca de três mil fotografias em diferentes suportes, mais de duzentos documentos sonoros e variada documentação arquivística, composta por manuscritos, livros, folhetos de cordel e documentos pessoais. Revisitados desde o início do ano, todo o material coletado pelo folclorista alagoano serve de apoio para os temas do grupo de pesquisa formado pelos bolsistas do Programa “Folguedos Populares em Alagoas”, o qual conta com a coordenação do diretor do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore, Wagner Chaves, da antropóloga e professora da Ufal, Fernanda Rechenberg, e do bibliotecário Yuri Rizzi. “Os bolsistas do Programa trabalharam durante meses em equipes de higienização de documentos textuais e fotográficos, e de realização de pesquisas bibliográficas e em websites sobre os folguedos alagoanos. Um trabalho rotineiro onde a produção de conhecimento sobre os grupos era acessada principalmente através dos documentos de arquivo, ou nas distanciadas estatísticas e mapas disponibilizados em websites”, disse Fernanda Rechenberg. Com o propósito de proporcionar aos estudantes uma experiência in loco do tema principal das pesquisas empreendidas por Théo Brandão, foi realizada no dia 6 de outubro, uma saída de campo a Coqueiro Seco. “Lá, eles se colocaram numa posição desafiadora ao fazer pesquisa de campo, entrevistas, fotografias e gravações sonoras junto a um grupo de folguedo popular atuante”, lembra a antropóloga.

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TRADIÇÃO VIVA Distante 22 km da capital e situada às margens da Lagoa Mundaú, Coqueiro Seco tem o nome originário do local onde surgiu o comércio no município: à sombra de um coqueiro de palhas queimadas. Com pouco mais de 40 km² de extensão e cinco mil habitantes, a cidade está repleta de grupos de festas populares, como, por exemplo, o Pastoril, o Reisado, a Chegança, a Marujada e também o Guerreiro. Esses folguedos são apresentados ao longo do ano, seguindo o calendário comemorativo a que estão relacionados. Em Coqueiro Seco, destaca-se o folguedo das Baianas. Caracterizada por não possuir um enredo determinado, elas cantam uma sequência constituída de marchas de entrada ou abrição de sede, peças variadas e, por fim, a despedida. O traje é composto de três peças: blusas de cetim com lantejoulas, saias longas, rodadas e estampadas e lenço amarrado à cabeça. O grupo A Baiana de Coqueiro Seco ficou desativado por mais de quatro décadas, retornando as atividades em 2003. A força da memória popular não deixou o folguedo desaparecer, e além do repertório tradicional, trazem novas composições e está conseguindo trazer a participação de alguns jovens. Atualmente, o grupo é formado por mulheres da terceira idade. PASTORIL: A ORIGEM DO MUNDO Sentados em torno dos brincantes dos folguedos, alunos e professores escutavam atentos os depoimentos de Eronildes Soares dos Santos, conhecida como Nem, Maria do Carmo, apelido Carminha, Nilza Cícera da Silva Araújo e José Gomes Pureza, o Zé Um. Regatando a história de um dos folguedos mais tradicionais da época natalina, o Pastoril, Zé Um iniciou uma “prosa” com o grupo. “Esse folguedo veio do começo do mundo. É o nascimento de Jesus”, disse ele explicando a narrativa presente nas músicas. Segundo Carminha, o Pastoril tem origem em Portugal e é acompanhado de uma orquestra variada, desde violões, sanfona, instrumento de sopro e percussão, as músicas são cantadas em forma solta, sem sequência, havendo a jornada inicial e a do encerramento em cada apresentação. “As pastoras se apresentam composta de saia, blusa e avental, Chapéu de palha ou outro material tocando pandeiro de lata, decorando com fita no cordão. O pastoril é composto em média de 16, garotas, distribuída em dois cordões, azul e o encarnado. A primeira pastora do encarnado é a mestra, a do azul é a contramestra. Tem a Diana que sou eu. Ficam no meio outras figuras como borboleta, a cigana, o anjo”, contou ela. Após o bate-papo com os brincantes, os pesquisadores contemplaram a apresentação dos grupos Baiana Volta a Sorrir e Chegança Silva Jardim. A mestra Nilza, a contramestra Sílvia e a diretora (personagem da Baiana) Eronildes fazem parte do Volta a Sorrir. Alguns brincantes participam de outros folguedos: na Chegança, Eronildes interpreta o personagem patrão. O Silva Jardim também tem como destaque o mestre Zé Um, a contramestra Carminha e a almirante Ana Lúcia. Os dois grupos são coordenados por Lucimar Alves da Costa. Para a pesquisadora Fernanda Rechenberg, a antropologia é uma ciência que se caracteriza pelo confronto entre teoria e dados de campo: “o conhecimento antropológico é produzido justamente no encontro entre as referências conceituais e os dados oriundos da experiência de pesquisa do etnógrafo em campo”, afirmou. “Por isso a etnografia é tão importante, pois ela permite a investigação da realidade de um grupo e o saber gerado a partir do ponto de vista do outro. Além disso, ao propormos essa ida a campo, nós estamos resgatando uma prática comum do folclorista alagoano Théo Brandão. Esperamos repetir mais vezes essa iniciativa tendo em vista o tanto que representou para os estudantes envolvidos no Programa Folguedos Populares em Alagoas”, ressaltou Rechenberg. Contato com os grupos podem ser feitos com a coordenadora Lucimar Alves da Costa (82-32671167 e 82-88706286).

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MUSEU THÉO BRANDÃO

EXPOSIÇÃO TROFÉUS - GEOGRAFIA SIMBÓLICA DE ZÉ DO CHALÉ

DE ANTROPOLOGIA E FOLCLORE

05 DE DEZEMBRO A 09 DE MARÇO 2012 - 2013 Parceiro

Realização MUSEU THÉO BRANDÃO UFAL

PROEX

Pró-reitoria de Extensão

Patrocínio


Caderno de Imagens

Baiana Volta a Sorrir

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Cheganรงa Silva Jardim

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Quem Somos Trupé é um boletim informativo, que tem o objetivo de divulgar as ações, pesquisas, projetos e programas desenvolvidos no Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore (MTB). Localizado à beira mar, na Avenida da Paz, em Maceió, o Museu pertence à Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Instalado, provisoriamente, no bairro do Pontal da Barra, o MTB foi criado em 20 de agosto de 1975 pelo médico, etnógrafo, folclorista, antropólogo e escritor alagoano Theotônio Vilela Brandão (1907-1982). Em 1977, por ocasião da V Festa do Folclore Brasileiro, o Museu é transferido para sua sede própria, onde está localizado atualmente. Concebido para abrigar a coleção de arte popular de seu patrono e idealizador, o Museu, em 1982, diversifica seus acervos quando recebe, da família de Théo Brandão, um conjunto expressivo de suas fotografias, documentos pessoais, manuscritos, registros sonoros, livros e folhetos de cordel. Em 1983, o prédio (um palacete construído no início do séc. XX), foi tombado pelo Patrimônio Histórico Estadual e, em 2002, restaurado, processo este que ampliou e estruturou suas salas de exposições. No circuito museográfico, o visitante encontra obras em madeira e cerâmica, indumentária de folguedos populares, estandartes e bonecos de carnaval, brinquedos populares, objetos de fibra vegetal, peças de culto afro-brasileiro, ex-votos e tantos outros objetos produzidos por artistas populares. Além das salas de exposição de longa duração, o Museu possui um espaço voltado para mostras temporárias, além de uma lojinha, um auditório e uma biblioteca especializada em antropologia, folclore e cultura popular. O Museu é aberto à visitação de terça-feira a sexta-feira, das 9h às 17h, e aos sábados, das 14h às 17h. Mais informações pelos telefones (82) 3221-2651 e 3221-2977. www.facebook.com/MuseuTheoBrandao I @MTheoBrandao

Equipe do Programa “Folguedos Populares em Alagoas: recuperação, disponibilização e pesquisa nos acervos sonoro, fotográfico e documental do Museu Théo Brandão de Antropologia e Folclore”: UFAL

Apoio Técnico e Administrativo

Bolsistas

Reitor Eurico Lobo Vice-reitora Rachel Rocha Pro-reitor de Extensão Eduardo Lyra Direção Geral MTB Wagner Chaves Direção Administrativa MTB Victor Sarmento

Alexandre Silva de Oliveira Anna Christina de Queiroz Rodrigues Francisco José Barboza dos Santos Jacqueline Batista José Carlos da Silva Julio Cézar Chaves Cristiane Cyrino Estevão Maristher Moura Vasconcellos Victor Sarmento Souto Jesuíno Ferreira de Moura Josefa Sales Barros Maria das Graças de Oliveira Maria Madalena de Oliveira Rogério Lira

Adriana Conceição Nascimento Daniela Inês dos Santos Pessoa Ellen Cristina da Silva Ewerton dos Santos Freitas Francisco Ribeiro João Paulo de Farias Silva Kelliane Maria da Silva Klessiane Ferreira da Mota Lidiane de Sales Pereira Renata Amorim Costa Soares Vanessa Matcki Souza Veronilda da Silva Lucy Muritiba Juliana Gonçalves

Coordenação do Programa Wagner Neves Diniz Chaves Coordenador Geral Fernanda Rechenberg Vice-coordenadora Iuri Rocio Franco Rizzi Vice-coordenador

Colaboradores Bruno César Cavalcanti Fernanda Capibaribe Leite


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