DIARIOde P E R N A M B U C O - Recife, segunda-feira, 21 de abril de 2014
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Edição: Paula Losada FOTOS: BLENDA SOUTO MAIOR/ESP. DP/D.A PRESS
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JO CALAZANS /ESP.DP/D.A.PRESS
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Roberto Tavares
Uma política para o saneamento
82,3% da população pernambucana tem água tratada 35,5% é o percentual de pessoas com acesso à coleta de esgoto em Pernambuco
Recém-empossado como representante nacional das empresas de saneamento, o presidente da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), Roberto Tavares, tem como desafio promover melhorias no setor em um país onde 42,9% das residências não têm acesso a esgoto. Administrador de empresas por formação e auditor da Secretaria da Fazenda de Pernambuco licenciado, Tavares acumulará a gestão na Compesa e o comando da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe), entidade composta por 25 instituições que atendem a 3.943 municípios brasileiros, o equivalente a 76% da população urbana do país. A chegada do primeiro pernambucano à presidência da entidade trará mais visibilidade e fôlego aos projetos de água e esgotamento sanitário tocados em Pernambuco. Em entrevista ao Diario, o presidente da Compesa revelou o desafio de colocar de vez na pauta nacional a adoção de uma política forte para o saneamento básico e garantiu que vai cobrar ações para o setor por parte dos governantes neste ano eleitoral.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísti tística (IBGE) mostrou que 42,9% das residências do país não têm acesso a esgoto. De 2011 para 2012, a rede coletora cresceu apenas 2,1 pontos percentuais, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). São muitas pessoas sem esgoto, e o crescimento é lento. Esse quadro vai mudar? O quadro é realmente dramático. A questão do saneamento foi deixada de lado há muito tempo no
14,3 milhões de moradias no Brasil não têm água encanada 35,5 milhões de residências não têm coleta de esgoto
ANAMARIA NASCIMENTO anamarianascimento.pe@dabr.com.br
112ª é a posição do Brasil em um conjunto de 200 países no quesito saneamento básico 22 estados do Brasil contam com menos de 50% de cobertura de esgoto 4,1% foi o aumento no acesso de moradias do país à coleta de esgoto na última década R$ 313 bilhões até 2033 é o investimento que o país precisa fazer para que o saneamento básico alcance 100% da população Fontes: Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, do Ministério das Cidades, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Compesa
“O Brasil não conseguiu sanear nem metade do seu território” Brasil. Os políticos do passado, mas não todos, obviamente, deixaram de investir no setor. Isso porque o saneamento básico é um dos patinhos feios da infraestrutura. É um dos setores de infraestrutura que menos recebe investimentos. A tarifa paga pelo consumidor não sustenta o setor. É preciso financiamento por parte dos governos. É para isso que estamos trabalhando, para reverter esse quadro e correr atrás do tempo perdido. Em 2010, a então candidata à Presidência da República Dilma Rousseff prometeu lançar o programa de incentivo a serviços, com o objetivo de zerar o pagamento de Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para as empresas de saneamento, energia elétrica e transporte. A desoneração do setor, no entanto, ainda não aconteceu. Sob seu comando, a Aesbe fará pressão para que a isenção deixe de ser apenas uma promessa? Como presidente da Aesbe, assumi uma estratégia de fortalecimento do setor. O pagamento do PIS e Cofins tira do setor cerca de R$ 2 bilhões por ano. Uma das bandeiras que defendemos é a isenção dessas taxas. Sobre isso, algumas pessoas poderiam argumentar que o governo federal oferece linhas de financiamentos de R$ 20 bilhões para o saneamento. Respondo que seria melhor que o governo subtraísse os R$ 2 bilhões e deixasse o financiamento em R$ 18 bilhões. Por quê? Porque esse dinheiro pago passa por uma burocracia que não é condizente com o setor, com a urgência que
CECILIA DE SA PEREIRA/AQUI PE/D.A PRESS
No ano passado, a Organização Mundial da Saúde informou que o mundo não conseguirá cumprir as metas do milênio - que devem ser cumpridas até 2015 - relacionadas ao saneamento básico e à água. Como está Pernambuco e o Brasil nesse sentido? Se continuarmos com o atual modelo de financiamento, taxação e regulamentação do setor, o Brasil vai ficar muito pior que o restante do mundo. Temos no Brasil uma situação muito negativa com relação ao saneamento como um todo e, mais especificamente, com relação ao esgotamento sanitário. Para dar uma ideia disso, dados do IBGE mostram que 22 dos 27 estados brasileiros contam com menos de 50% de cobertura do esgoto. Essa não é uma realidade apenas do Nordeste ou de Pernambuco. Nas últimas décadas, o Brasil não conseguiu sanear nem metade do território. Além dissso, o modelo de financiamento atual está incorreto. Pernambuco tem cerca de 20% de área com esgotamento sanitário. Aqui, criamos um modelo diferente, que contrasta com o formato adotado no país. Acredito que estamos dando nossa contribuição para inverter essa realidade. A Região Metropolitana do Recife tem, hoje, cerca de 30% de cobertura. Um programa da Compesa vai nos permitir que esse alcance chegue a 90% nos próximos 12 anos. É uma meta extremamente ousada.
+ saibamais
Segundo o IBGE, 22 dos 27 estados do país têm menos de 50% de cobertura de esgoto o setor clama. Se o PIS e Cof Cofins ins fossem devolvidos na própria fatura, as empresas teriam o dinheiro no caixa automaticamente sem nenhuma burocracia. Defendemos a desoneração, mas não para engordar os caixas das companhias, mas para retornar em investimentos. Se não forem investidos na melhoria do setor, o goins. verno pode cobrar o PIS e o Cof Cofins. Vamos aproveitar este ano, já que 2014 é um ano de debates e de compromissos, para cobrar não só da presidenta Dilma, mas de todos os candidatos à Presidência da República. Por outro lado, algumas entidades, como a Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), acreditam que a medida pode acabar atendendo apenas às empresas e signi-
ficando uma redução na tarifa paga pelo consumidor, sem expansão da rede de saneamento. É algo que a associação leva em consideração? Sem dúvidas. A simples desoneração do PIS e Cofins pode ter um impacto muito pequeno, significando apenas uma redução na tarifa e não um retorno para investimentos. É por isso que defendemos que o recurso do PIS e Cofins seja voltado para o fortalecimento das empresas de saneamento básico. E por que não defendemos tirar o PIS e Cofins e baixar a tarifa? Porque a redução na tarifa seria de apenas 0,5% a 1%, e a vantagem seria apenas para as pessoas que já têm o serviço. Assim, as que não têm saneamento básico não seriam beneficiadas. A ideia é tirar o PIS
e Cofins e investir no sistema, para melhorar a rede existente ou para implantar a infraestrutura necessária para quem não tem o serviço. Quando o esgotamento estiver universalizado, aí sim, fazer a redução da tarifa. Afinal, todo benefício que for dado à empresa deve ser repassado ao consumidor. Há ainda muita disparidade regional no país quanto à oferta de saneamento básico. Onde a situação é mais crítica? O Nordeste continua sendo a região mais crítica pela dificuldade de encontrar fontes de armanezamento de água e por conta dos investimentos, que foram menores ao longo das décadas. No Norte, temos problemas relacionados às distâncias. No entanto,
o Sudeste brasileiro está enfrentando um conflit conf lito pela água que não se imaginou que viesse tão cedo. Tem que haver um planejamento nacional com relação aos recursos hídricos e dar condições para que se realizem obras estruturadoras que permitam o fim do problema nas próximas décadas. O grande obstáculo é que só se pensa em socorrer o setor quando ele está em crise. Sua chegada ao comando da Aesbe trará mais visibilidade e fôlego para os projetos de saneamento tocados em Pernambuco? A defesa que estamos fazendo numa entidade nacional fortalece o setor como um todo. O estado de Pernambuco é respeitado nacionalmente pelo seu corpo técnico qualificado e pela forma profissional de buscar os recursos e apresentar os projetos. Acredito que teremos uma projeção maior por ter um representante do estado ocupando o cargo. Investir em saneamento é investir em saúde? Sem sombra de dúvidas. Inclusive, estamos apoiando pesquisas que relacionam investimentos em saneamento básico e a diminuição dos índices de mortalidade e de doenças de veiculação hídricas. Temos exemplos claros de obras de saneamento que mudaram a qualidade de vida das pessoas, como em Tamandaré (Litoral Sul do estado). Lá, fizemos um novo sistema de abastecimento de água e de esgotamento sanitários. Recebemos um feedback muito positivo da população sobre a diminuição de problemas relacionados à agua. Investimento em saneamento básico é medicina preventiva.