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CAPACITAÇÃO Professores e alunos deverão fazer visitas a unidades de preservação, como o Jardim Botânico do Recife
Educação ambiental turbinada no Recife
SUSTENTABILIDADE Secretarias de Educação e do Meio Ambiente se unem para sistematizar um programa de capacitação e sensibilização de professores e alunos da rede
entrevista k Leonardo Boff Alexandre Gondim/JC Imagem
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erca de 500 professores da rede pública municipal do Recife fazem capacitação, hoje, para desenvolver o programa de educação ambiental, denominado Educar para um cidade sustentável, que será implantado nas 302 escolas do município. O treinamento começa com uma palestra do teólogo e professor de Ecologia, Ética e Filosofia da Religião na Universidade do Estado do Rio de Janeiro Leonardo Boff. A temática já integra o currículo da rede de ensino do Recife mas, segundo o secretário-executivo de Sustentabilidade, Maurício Guerra, é a primeira vez que as Secretarias de Educação e de Meio Ambiente se organizam para sistematizar um programa de capacitação e sensibilização de professores e alunos. “Educação ambiental é uma disciplina transversal, ministrada muito espontaneamente na sala de aula. Mas ainda não tínhamos uma metodologia própria, estruturada”, explica. “Com esse programa, fortaleceremos o tema e ajudaremos a formar consciências mais críticas.” O secretário garante que os professores terão muitas ferramentas para cumprir o cronograma de atividades dentro e fora da escola. O material didático inclui cartilhas, gibis, um guia prático de sustentabilidade, calendário ecológico, legislação ambiental e vídeos. “Professores e alunos também vão encenar peças teatrais, abordando os quatro temas de interesse: arborização, água, resíduos sólidos e biodiversidade”, informa Maurício Guerra. A expectativa é que os alunos venham a se tornar multiplicadores desses conceitos nas comunidades onde vivem, promovendo mudanças de comportamento que favoreçam o meio ambiente, como estimular a separação do lixo. Para se aproximar da natureza, professores e alunos deverão fazer visitas a unidades de preservação, como o Jardim Botânico do Recife, e passeios no barco-escola pelo Rio Capibaribe. As escolas também vão participar do calendário ecológico da capital deste ano. Já estão na programação a campanha de reciclagem do Movimento Limpa Brasil, em abril, a Mostra Ambiental do Recife (Maré) e a Caravana Ambiental. Em setembro, os primeiros resultados do programa serão expostos no Parque Dona Lindu, na Zona Sul.
“Cuidado começa em casa” Mais conhecido por ser um dos formuladores da Teologia da Libertação (doutrina cristã que prioriza os pobres), o teólogo e professor Leonard Boff hoje é um defensor ardoroso da natureza. Ao JC, ele falou sobre educação e meio ambiente. JC – Num país que busca a sustentabilidade, como deve ser a educação de crianças e jovens? LEONARDO BOFF – Não dá para chegar diretamente à sustentabilidade. Temos que trabalhar uma categoria anterior, cujo resultado produz a sustentabilidade: o cuidado. Todos os seres vivos devem ser cuidados senão morrem. É preciso garantir condições para que conti-
nuem existindo. Esse cuidado começa em casa, separando o lixo, cuidando da água, do ar, dos alimentos, respeitando o ritmo da natureza. Se violarmos esse ritmo, ela se rebela na forma de enchentes, secas. Devemos aproveitar os recursos naturais, pensando nas futuras gerações. Tendo esse cuidado, a consequência é a sustentabilidade. JC – Por que, apesar dos recorrentes desastres ambientais, governos, empresas e sociedade hesitam em assumir a responsabilidade de cuidar da natureza? LEONARDO BOFF – Porque, por trás dessa conduta, há grandes interesses econômicos, especialmente o das petroleiras, que ditam a agenda dos encontros da ONU. Há os grandes projetos de mineração e produção de energia, que sempre sacrificam o meio ambiente. Eles fazem pressão para que não mude a relação que temos com a natureza, que é de agressão, exploração, não de cooperação. Não permitem que a natureza se refaça. Como os governos estão ligados a esses interesses econômicos, são impotentes para aplicar medidas que os contrariem. Por isso, a crise ambiental se aprofun-
da e pode vir a sacrificar grande parte da humanidade. JC – Como conciliar os sonhos de consumo da juventude com a necessidade de adotar práticas como reciclagem? LEONARDO BOFF – Nossa tarefa é de esclarecimento, de fazer as pessoas olharem o que está acontecendo no mundo e perceberem a conexão. Fenômenos como secas e enchentes não são arbitrários, eles mostram que a terra está em desequilíbrio. Cada pessoa deve dar sua contribuição (ao planeta). Se esperarmos que venha dos governos, vai chegar tarde. JC – Que lição quer que os professores aprendam na capacitação? LEONARDO BOFF – Se cada um fizer o mínimo, esse mínimo poderá ser o ponto que vai deslanchar o grande movimento. Devemos fazer como as moléculas, que estão sempre interagindo com a matéria para sobreviver. Devemos sempre estar conectados com a natureza e estreitar as interdependências, já que estamos todos ligados uns aos outros. Esse é o caminho da salvação.