Migração: entre o risco e a liberdade

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26 de junho a 2 de julho de 2014 | www.arquidiocesedesaopaulo.org.br

Migração: entre o risco e a liberdade Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO

Haitiano agradeceu a solidariedade dos brasileiros durante encerramento da 29ª Semana do Migrante, na Catedral da Sé Nayá Fernandes

Reportagem no Centro

Winial Pierrette, 40, é haitiano, mas está no Brasil há 2 anos. Ele trabalha como pedreiro e aluga um quarto no Brás. “Ganho R$ 800,00 e R$ 500,00 vai para o aluguel. Não sobra quase nada para comer ou enviar para a família no Haiti”, afirmou o haitiano que deixou os 2 filhos e a mãe e veio para o Brasil em busca de oportunidades de trabalho. Mas Winial mostrou-se insatisfeito com as condições de trabalho que encontrou por aqui. “Até no Haiti, quando o Brasil joga é uma festa e as empresas liberam as pessoas. Aqui, o patrão libera, mas depois temos que pagar as horas não trabalhadas em dobro. Acho isso uma injustiça”, lamentou. O trabalhador haitiano é um dos mais de 20 mil que migraram devido à destruição causada pelo

Causas e consequências da migração são apresentadas em símbolos durante a missa no domingo, 22; a falta de água, por exemplo

terremoto em 2010 que ainda assola o seu país. E, mesmo tendo críticas às “injustiças brasileiras” ele pediu à reportagem para transmitir aos brasileiros um agradecimento pela solidariedade com os haitianos que chegaram em grande número nos últimos meses e ocuparam as dependências da Casa do Migrante, que pertence à Missão Paz, no Glicério, centro da capital paulista. “Queremos procurar os meios de comunicação para agradecer oficialmente a acolhida e as doações que recebemos”, disse Winial que estava desempregado, e por isso, ia todos os dias para a Missão Paz ajudar

os compatriotas que chegaram. Outro agradecimento foi dirigido à Missão Paz ao Serviço Pastoral dos Migrantes (SPM) e aos demais institutos e pastorais que trabalham diretamente na acolhida e assistência aos migrantes. Quem o fez foi o cardeal Odilo Pedro Scherer, arcebispo metropolitano de São Paulo, presidente da celebração na qual se recordou o Dia do Migrante, domingo, 22, na catedral da Sé. A missa aconteceu durante a 29ª Semana do Migrante, 15 a 22 de junho, que teve como tema: “Migração e Liberdade” e lema: “Migrar é Direito: Tráfico Huma-

no é Crime!”. Países latino-americanos, Haiti, África, e, diversas regiões brasileiras participaram da celebração que chamou atenção para situações de exploração e sofrimento que vivem os migrantes, mas também para a grande riqueza cultural e humana que eles trazem. “Os migrantes vivem situações de sofrimento na partida e na chegada”, lembrou o Cardeal que fez um apelo a todas as igrejas e comunidades para que acolham os migrantes e que eles se sintam em casa. A resposta ao pedido pode colaborar para que eles estejam menos expostos ao tráfico, à prostituição, ao traba-

lho análogo à escravidão, ao uso e tráfico de drogas, situações às quais são mais vulneráveis. Com uma lata de água na cabeça, carregando um facho de cana, uma casinha feita de madeira ou vestidos com roupas típicas entraram em procissão os migrantes que deram a conhecer os motivos pelos quais migram e as diversas formas de violação dos direitos humanos pelos quais passam. Por fim, um canto emocionado foi dirigido à Maria, mãe de Deus e dos migrantes enquanto imagens de diferentes títulos de Nossa Senhora foram trazidas até o altar.

levantamento dos dados dos operários mortos nas obras dos estádios da copa feito pelo serviço pastoral dos migrantes (spm)

Antônio José Pita

Carlos de Jesus

Fabio Hamilton Cruz

Fábio Luiz Pereira

liveira José Afonso de O

José Antônio da Silva

José Elias Macha do

Marcleudo de Melo

Muhammad Ali Maciel

dos Santos Ronaldo Oliveira

Ponto de Vista Rezar a vida na celebração eucarística é atitude sábia de quem vive, no cotidiano, o seguimento de Jesus. Ver os nomes e alguns rostos dos operários mortos nas obras dos estádios da Copa do Mundo da Fifa espalhados pela escadaria da Catedral da Sé, me fez pensar isso.

E digo rezar a vida num contexto de dor e morte. Muitos dirão que uma coisa não tem nada a ver com a outra, que acidentes acontecem sempre. É verdade. Todos os dias morrem inocentes, muitas vezes, para sustentar o lucro e o luxo. Dos 14

mortos nos estádios, pelo menos 7 eram migrantes, a maioria do nordeste, uma das regiões mais pobres do Brasil. Mas as discussões sobre os gastos excessivos na Copa aos poucos vai dando lugar à euforia de uma possível vitória. Enquanto isso, no Catar, sede

da Copa em 2022 já morreram 1.200 imigrantes, enquanto trabalhavam na construção dos estádios e em obras de infraestrutura. O relatório é da International Trade Union Confederation. A estimativa da entidade é que, no total, 4 mil operários

morram até o começo dos jogos. Lá os trabalhadores enfrentam jornadas longas de trabalho num clima que se aproxima dos 50ºC. A maioria da mão-de-obra barata é formada por imigrantes do Nepal, Índia e Paquistão. Por Nayá Fernandes


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