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7 a 13 de janeiro de 2015 | www.arquidiocesedesaopaulo.org.br

www.arquidiocesedesaopaulo.org.br | 7 a 13 de janeiro de 2015

| Reportagem | 13 Su Florentino/Movimento Down

A cumplicidade entre Fabio e Francesco ‘Ele teve a sorte de estar sempre rodeado de amigos que o querem muito bem’

Nayá Fernandes

nayafernandes@gmail.com

“Se as pessoas com a Síndrome de Down ajudam a humanizar um ambiente? Não sei. O que sei é que o Fabio ensinou-me e ensina ainda muito. Não me lembro de uma noite que tenha saído com ele que não tenha sido um passeio cheio de risadas e de simplicidade.” As palavras são de Francesco

Stella, 31, clown (o que seria um doutor da alegria no Brasil) que mora em Roma e é amigo-irmão de Fabio Lacovitti, 37, portador da Síndrome de Down que trabalha no guarda-volumes da Basílica de São Pedro há 10 anos, de segunda-feira a sábado. Os turistas que precisam deixar o carrinho de bebê para subirem até a cripta da Basílica, percurso que só pode ser feito a pé, encontram-no sempre à disposição por ali. Fotos: Arquivo pessoal

“Não sei quantas vezes, ele troca o número 7 pelo 8, para dizer um exemplo, de suas limitações pequenas. Mas suas dinâmicas humanas são iguais às nossas, tendo grandes qualidades e terríveis limites”, disse Francesco, que logo após conversar com a reportagem confessou que o bate papo o deixou com saudades de Fabio e que iria fazer em seguida um telefonema ao amigo. Para Francesco, encontrarse com Fabio é um momento de risadas sem fim. “E depois, cada abraço seu me comove. Ele tem uma alma esplêndida! Tem alma de uma criança e também os caprichos dos pequenos [risos] no corpo de um homem. Mas, das crianças podemos aprender sempre. Cada encontro é uma emoção a mais pra mim.” Eles se chamam de “irmãozão” e “irmãozinho”. “Certa vez, em um passeio, encontrei-o perdido no escuro e no meio da neve. Ele, desde que começou a participar de uma associação para pessoas com down, é convicto que não tem mais a Síndrome. E nós nunca falamos, por exemplo, de questões como preconceito e exclusão, pois o Fabio teve a sorte de estar sempre rodeado de amigos que o querem muito bem”, contou Francesco. Outra característica particular do amigo Fabio pelos olhos de Francesco é que ele está perenemente apaixonado. “Gosta de todas as meninas e eu digo sempre que ele deve namorar uma garota down como ele, mas, Fabio é muito danado.” O amigo ressaltou, ainda, que para ele Fabio nunca foi diferente, só muito mais sensível que os outros amigos. “No nosso grupo, ele sempre foi tratado como todos os outros, no bem e no mal. Contudo, sinto que na sociedade italiana, em geral, não há muito espaço para a diversidade. Para mim, sem retórica, uma pessoa com down é um dom maravilhoso”, afirmou Francesco, que trabalha também como ator e escritor de peças teatrais.

Um entre todos Nayá Fernandes

nayafernandes@gmail.com

Um estudo realizado pela Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) de São Paulo, organização fundada em 1961, sem

fins lucrativos, que promove a prevenção e a inclusão da pessoa com deficiência intelectual, indicou que alunos com deficiência se desenvolvem melhor quando frequentam escola regular do que quando estão matriculados em escolas es-

peciais. Esse resultado não é um consenso entre pais e especialistas que convivem dia a dia com as pessoas com deficiência e divide opiniões a respeito. A instituição divulgou em seu site e nas redes sociais que, desde 2007, a Apae de São Paulo segue as recomendações internacionais como a da ONU de que crianças com deficiência frequentem escolas regulares. Com isso, extinguiu o colégio especial e passou a oferecer apenas atividades extracurriculares. “As crianças que estudavam no colégio especial tiveram que ser matriculadas em outras escolas. O estudo da Apae foi feito com 62 delas, 40 que foram para escolas regulares públicas e 22 de escolas especiais. O acompanhamento desses alunos mostrou que, após três anos, as crianças das escolas regulares melhoraram a autonomia, socialização e principalmente a comunicação, que foram as áreas avaliadas no estudo. Já os alunos das escolas especiais quase não apresentaram evolução nas três áreas consideradas”, apontam trechos do estudo.

Conselho de Francisco

O Papa Francisco em mensagem vídeo para o 4º Festival da Doutrina Social da Igreja, em Verona, de 20 a 23 de setembro de 2014, citou o exemplo de um pai que tem um filho com a Síndrome de Down. “O pai fez tudo e usufruiu dos serviços postos à disposição pelas entidades públicas para a educação, o cuidado e a assistência social do filho. Mas não estava satisfeito. Desejava algo que lhe desse mais dignidade e autonomia. Criou uma cooperativa constituída por adolescentes portadores da mesma Síndrome, projetou um trabalho adequado para eles, estabeleceu uma convenção com uma empresa sem fins lucrativos para a venda dos seus produtos... enfim, criou as premissas de trabalho com as quais o seu filho pode construir o próprio

4º Fórum Internacional em 2015 A Fundação Síndrome de Down promove na cidade de Campinas (SP), entre os dias 20 e 23 de maio de 2015, o Fórum

futuro e uma sua autonomia sadia.” O Papa usou o exemplo acima para falar sobre a necessidade de ir além do essencial. “Parar significa pedir ainda e sempre ao Estado ou a qualquer entidade assistencial, mover-se significa criar novos processos. Eis o segredo: criar novos processos e não pedir que nos deem novos espaços”, continuou Francisco em sua mensagem. Em outra ocasião, na visita pastoral que Francisco fez às crianças com deficiência e aos doentes do Instituto Seráfico em Assis, no dia 4 de outubro de 2013, leu uma carta que recebeu de um jovem de 16 anos que vive em Buenos Aires, Nicolás, com uma deficiência de nascença. “Querido Francisco: chamome Nicolás e tenho 16 anos; dado que não te posso escrever (porque ainda não falo nem caminho), pedi aos meus pais que o fizessem por mim, porque eles são as pessoas que mais me conhecem. Quero contar-te que quando tinha 6 anos, no meu Colégio que se chama Aedin, o Padre Pablo conferiu-me a primeira Comunhão e este ano, em novembro, recebi a Crisma, o que me dá muita alegria. Todas as noites, peço ao meu anjo da guarda, que se chama Eusébio e é muito paciente, que te guarde e te ajude. Tenho a certeza de que o faz muito bem porque se ocupa de mim e me acompanha todos os dias! Ah! E quando não tenho sono... vem brincar comigo! Gostaria tanto de te ir visitar e receber a tua bênção

e um beijo: só isto! Envio-te muitas saudações e continuo a pedir a Eusébio que se ocupe de ti e te dê força. Beijos. Nico.” O Papa enfatizou que na carta de Nicolás, “está a beleza, o amor, a poesia de Deus. Deus que se revela a quem tem o coração simples, aos pequeninos, aos humildes, a quem nós consideramos muitas vezes últimos”. Dom Roberto Francisco Ferrería Paz, bispo de Campos (RJ), em sua mensagem no dia 20 de setembro de 2014, lembrou que 21 de setembro foi o dia escolhido no Brasil para comemorar o dia de luta das Pessoas Portadoras de Deficiência. “No 1º Encontro de Delegados da Coalizão Nacional de Entidades e Pessoas com Deficiência, que aconteceu em Vitória (ES) nos dias de 12 a 14 de julho de 1982, foi definida esta data pela sua proximidade com a primavera, que dá um sentido de pleno renascimento às esperanças e sonhos de uma inclusão social generosa e completa”, explicou. Para ele, “a pedagogia da inclusão e a defesa da valorização humanitária, cultural e espiritual deste imenso setor da população distam muito ainda de ser uma realidade. A acessibilidade é mais que um direito, é um olhar e uma atitude de profunda igualdade, compreensão e empatia ao mesmo tempo. É ajudar a construir uma sociedade de aprendizado de convivências e práticas cada vez mais dialógicas e afetivas”.

Internacional sobre Síndrome de Down. O evento contará com palestrantes nacionais e internacionais e o destaque será a autonomia das pessoas com Síndrome de Down e sua capacidade de ter uma vida plena de acordo com as suas potencialidades. O Fórum destina-se a psi-

cólogos, médicos, educadores, pedagogos, terapeutas, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, pais e familiares de pessoas com deficiência, estudantes e pessoas interessadas no assunto. Informações no site www.fsdown.org. br/forum ou pelo telefone (19) 3289-2818.


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