O EDIFÍCIO COMO ARTICULADOR DA URBANIDADE A BIBLIOTECA E A CIDADE POR NICOLAS LE ROUX
ORIENTADOR PROF. DR. ANTONIO CARLOS BAROSSI COORIENTADORA PROFA. DRA. MARTA BOGÉA 2013 - 2014
“[O]s gregos, ao contrário de civilizações posteriores, não consideravam a função de legislar como atividade política. Em sua opinião, o legislador era como o construtor dos muros da cidade, alguém cujo trabalho devia ser executado e terminado antes que a atividade política pudesse começar. [...] Antes que os homens começassem a agir, era necessário assegurar um lugar definido e nele erguer uma estrutura dentro da qual se pudessem exercer todas as funções subsequentes; o espaço era a esfera pública da polis e a estrutura era a sua lei; legislador e arquiteto pertenciam à mesma categoria. [...] [A] convivência dos homens sob a forma de polis parecia garantir a imperecibilidade das mais fúteis atividades humanas - a ação e o discurso - e dos menos tangíveis e mais efêmeros ‘produtos’ do homem - os feitos e as histórias que deles resultam. A organização da polis... é uma espécie de memória organizada. [...] Segundo esta auto-interpretação, a esfera política resulta diretamente da ação em conjunto, da ‘comparticipação de palavras e atos’. A ação, portanto, não apenas mantém a mais íntima relação com o lado público do mundo, comum a todos nós, mas é a única atividade que o constitui. [...] A rigor, a polis não é a cidade-estado em sua localização física; ... Trata-se do espaço de aparência, no mais amplo sentido da palavra, ou seja, o espaço no qual eu apareço aos outros e os outros a mim. [...] Privar-se dele significa privar-se da realidade que, humana e politicamente, é o mesmo que a aparência.” Hannah Arendt, trecho de “Action”, capítulo V do livro A Condição Humana (1958)
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SUMÁRIO
PRIMEIRA PARTE O EDIFÍCIO E A CIDADE INTRODUÇÃO E PROBLEMATIZAÇÃO
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OBJETIVOS
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METODOLOGIA
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- REAL GABINETE PORTUGUÊS DE LEITURA, RIO DE JANEIRO
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DAS RELAÇÕES ENTRE A ARQUITETURA E O URBANISMO
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- CENTRE GEORGES POMPIDOU, PARIS
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AS EXPERIÊNCIAS DOS CEU E DE MEDELLÍN
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- SESC POMPEIA, SÃO PAULO
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- OS CEU
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- PRAÇA DAS ARTES, SÃO PAULO
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- OS PARQUES-BIBLIOTECA DE MEDELLÍN
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ESTRUTURAS MÓVEIS
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- MUROS OU PORTAS?
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O SISTEMA DE ÔNIBUS-BIBLIOTECA
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HIPÓTESE DE PROJETO
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DA ARQUITETURA DE BIBLIOTECAS
- PARQUE-BIBLIOTECA ESPAÑA
O EDIFÍCIO E O ESPAÇO PÚBLICO: UM ESTUDO
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- BIBLIOTECA NACIONAL DA FRANÇA E MIDIATECA DE TOULOUSE
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- O EDIFÍCIO
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- BIBLIOTECA MUNICIPAL DE SEATLE
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- AS NAVES E OS PORTOS
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SEGUNDA PARTE PROJETO COMO PESQUISA DISTRIBUIÇÃO DAS SEDES
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- RELAÇÃO COM O ENTORNO IMEDIATO -
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ESCOLHA DO TERRENO
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- REFERÊNCIA DE PROJETO -
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ENTENDENDO O CONTEXTO URBANO DA PERIFERIA
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- O EDIFÍCIO E A ITINERÂNCIA -
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ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO
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- PONTOS DE ANCORAGEM -
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A QUADRA ENQUANTO UNIDADE TERRITORIAL
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O PROJETO COMO PESQUISA
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A BIBLIOTECA
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BIBLIOGRAFIA
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- PROGRAMA -
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PRIMEIRA PARTE O EDIFÍCIO E A CIDADE
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INTRODUÇÃO E PROBLEMATIZAÇÃO O filósofo alemão Martin Heidegger disse que “um local somente se torna um lugar quando o apropriamos culturalmente”. 1 Isso significa que a cidade necessita de bons espaços de convívio que possibilitem o encontro e a troca cultural e social. Por muito tempo esses espaços podem ter sido as praças ou as esplanadas, frequentadas de modo democrático por pessoas de todos os tipos. Contudo, na sociedade cada vez mais movida pelo ritmo frenético e pela autodestruição dos espaços de convívio urbanos, os ambientes de encontro podem adquirir novas formas, no interior dos edifícios. Nesse contexto, os equipamentos públicos se tornam importantes mediadores da vida urbana, provendo de possibilidades culturais e espaciais seus entornos. O projeto da Praça das Artes (2012, obra em construção), concebido pelo escritório Brasil Arquitetura e inaugurado parcialmente há pouco tempo no centro de São Paulo, é uma evidência de que um projeto pontual de edifício também pode ser uma intervenção urbanística, com potencial de alterar seu entorno. Lá, se optou por conectar três ruas pelo miolo da quadra ao liberar todo o térreo para que se torne mais uma passagem em meio à já permeável malha urbana da região. É uma tentativa não apenas de gerar uma apropriação do lugar por parte dos usuários do entorno, mas também de propor novas situações: “A Praça das Artes foi isso, uma apropriação de um lugar como ele estava e se ofereceu, mas ao mesmo tempo foi uma provocação de novas si1 | HEIDEGGER, Martin. Apud BRITTO; PEDROTTI, disponível em: http://www.archdaily. com.br/97751/mais-seguranca-requer-melhores-espacos-publicos/. Acesso: 17/03/2013.
tuações urbanas, uma preparação para futuras transformações naquele espaço urbano.” 2 “Não existe uma decisão de embelezar a quadra, existe uma decisão de deixar uma passagem pra trazer as pessoas pra dentro e fazê-las se encontrarem.” 3 Com o projeto ainda inacabado, é impossível saber quais serão as consequências de se optar por essa solução que altera o entorno, mas fica claro que aquela parcela de cidade não será mais a mesma, e que o edifício-extensão do Teatro Municipal é um elemento estruturador do arredor. Por outro lado, ao analisarmos projetos com intenções semelhantes que obtiveram sucesso comprovado, podemos observar as vantagens de se pensar o edifício de modo articulado com a cidade. Um dos exemplos mais famosos em São Paulo talvez seja o Conjunto Nacional, na Avenida Paulista. Obra modernista, ele se utiliza de um dos conceitos do movimento arquitetônico para criação espaços de convívio – o edifício elevado sobre pilotis – coadunando usos e se abrindo para a rua. Assim, ele se torna um equipamento público que constrói o entorno e estrutura a quadra. Suas passagens são tão importante quanto as próprias ruas 2 | FANUCCI, Francisco. In: “Brasil Arquitetura, entrevista com Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci”, Revista Contraste. São Paulo, LPG-FAUUSP, 2013, p. 48. 3 | FERRAZ, Marcelo. In: “Brasil Arquitetura, entrevista com Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci”, Revista Contraste. São Paulo, LPG-FAUUSP, 2013, p. 48.
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e a mistura de usos é uma solução urbana para problemas que enfrentamos nas grandes cidades. Problematizado isso, podemos ir mais adiante e analisar o formato dos equipamentos públicos da cidade perante as novas demandas da sociedade contemporânea. Para tanto, a biblioteca pública entra como elemento de destaque, tendo em vista seu caráter ancestral de instituição social e fruto do imaginário coletivo que carrega uma imensa carga simbólica. Assim como Otavio Leonídio e Luiz Fernando Martha observam no livro “Midiateca da PUC-RIO” (2006, obra em construção), ela é mais do que sua definição material de coleção de livros preservados e disponíveis para leitura, é o desejo universal de reunir o conhecimento e a memória ancestrais. Contudo, esse edifício, considerado um “monumento precioso para a nação” pelo arquiteto Étienne Louis Boullée, está colocado à prova hoje. Com o advento das novas tecnologias e o bombardeio de informações cada vez mais fáceis de serem acessadas via internet, muitos questionam o futuro das bibliotecas. Assim, várias tentativas de substituição de livros por versões digitais dos mesmos já foram postas em prática em alguns países e até chegou a se cogitar a futura obsolescência de edifícios destinados à abrigar livros impressos. Mesmo assim, pensadores como um dos maiores historiadores contemporâneos do livro e da literatura Robert Darnton parecem convencidos de que as bibliotecas estão asseguradas pelo fato de que “uma cópia digitalizada não pode ser substituto adequado para o original”, e que as novas tecnologias não vieram para substituir o livro, mas sim para se somar ao suporte tradicional: o papel.
Ao mesmo tempo, vemos que o papel da biblioteca é muito maior do que armazenar e disponibilizar livros. Seus salões de leitura são historicamente um ambiente compositor importante do edifício. Eles promovem o isolamento físico e intelectual dos hiperestímulos do mundo contemporâneo e são, até hoje, parte de uma prática social importante, mantendo-se cheios diariamente em diversos países. No projeto do Office for Metropolitan Architecture (OMA) para a Biblioteca Central de Seatle (1999-2004), nos Estados Unidos, essas problemáticas são levantadas e o edifício se propõe a encontrar soluções que mostrem que essa instituição não está ultrapassada, mas sim que deve ser repensada para adquirir importância ainda maior na articulação da cidade. Para o OMA, “numa época onde a informação pode ser acessada de qualquer lugar, é a simultaneidade de todas as mídias e, mais importante, sua curadoria conteudística que tornarão a biblioteca vital.” Dessa forma, esse projeto trabalha com a articulação dos espaços, tornando-se um importante ponto de encontro na cidade com seus andares-praça conectados de forma inteligente, separando espaços de convívio de espaços de trabalho ao mesmo tempo que os mantém conectados entre si e com a rua. O programa está estruturado dentro de dois grandes grupo: os “espaços contidos” e os “espaços que contém”. O primeiro, formado por cinco usos da biblioteca, gerou volumes que foram sobrepostos de forma deslocada e unidos por uma pele fortemente esticada, gerando áreas intersticiais, onde estão localizados usos comuns específicos de forma dinâmica e expressiva, formando os “espaços que contém”. Dessa forma, o segundo grupo se organiza de forma excêntrica por elementos diagonais
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e abertos, enquanto o primeiro, de uso mais direcionado, se instala em volumes ortogonais e contidos, para que tenham eficiência operacional correspondente. As grandes diagonais da Biblioteca de Seatle anunciam seus vastos espaços públicos, enquanto o volume modulado é funcional e prático. Combinados, estes modos de articulação espacial geram um equipamento público que desafia não apenas as convenções de estilo, mas também as de planejamento arquitetônico antigas e conservadoras. Isto está bem expresso na proposta feita pelo projeto sobre o que é a área de disponibilização de livros de uma biblioteca. Em Seatle, o OMA cria um sistema organizacional de livros inovador – o qual batiza de “Espiral de Livros” – onde todos eles estão dispostos ao longo de uma fita que segue uma rampa em espiral e possui capacidade para se adequar a uma coleção muitas vezes maior à existente hoje na biblioteca. Contudo, os exemplos inovadores não estão apenas nos mais novos projetos estrangeiros. Em 1936, Mario de Andrade propôs uma biblioteca móvel que circularia pela cidade através de diversos veículos que possuiriam parte do acervo e o levariam para pontos específicos da cidade periodicamente. Essa ideia foi adotada e existe até hoje no sistema de Ônibus-Biblioteca Mario de Andrade. Ela já deixou de existir e voltou diversas vezes por dificuldades de infraestrutura, não apenas nos seus módulos circulantes, mas principalmente por nunca ter possuído um edifício sede projetado para receber os veículos de forma eficiente e fazer a articulação entre o acervo fixo e o itinerante. Mesmo assim, o sistema atende bairros desprovidos de recursos culturais, facilitando o acesso ao livro e incentivando o interesse pela leitura como forma de apoiar a ação educativa da escola,
oferecendo oportunidades de enriquecimento cultural. O conceito de arquitetura móvel já foi bem trabalhado por diversos arquitetos, com soluções bastante interessantes. Renzo Piano tem alguns projetos de sucesso nesse tema e, dentre eles, podemos destacar o Laboratório Móvel da UNESCO (1979). Nesse projeto, o objetivo era produzir um módulo itinerante que seria colocado em centros de cidades degradados para promover atividades com intuito de reabilitar essas áreas. O laboratório consiste em um corpo que não está atrelado à máquina que o transporta – um cubo carregado por um pequeno caminhão. A partir do momento em que ele é colocado no chão, suas paredes, formadas por painéis articulados, se desdobram para gerar nichos de atividades. Uma tenda dobrável é instalada como cobertura e o cubo de pouco mais de dois metros de lado passa a configurar uma área coberta de mais de 36 metros quadrados. Podemos concluir que tanto a Biblioteca Mario de Andrade quanto o Laboratório da UNESCO: “São arquiteturas itinerantes, mescla de mecânico e construto, e, às vezes, não são incluídas no ‘vocabulário’ ou na prática da disciplina, pois navios, trens, carros, etc. são associados a design e engenharia. Configuram, no entanto, espaços de atividade humana e, por conseguinte, configuram arquitetura.” 4 4 | BOGÉA, Marta, Cidade Errante: Arquitetura em movimento. São Paulo, Senac, 2009.
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BIBLIOTECA CENTRAL DE SEATLE, OMA
テ年IBUS-BIBLIOTECA
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São formas de pensar arquitetura e articular a cidade sem necessariamente construir edifícios nas áreas carentes. Apresentam suas vantagens ao levarem as atividades, por exemplo a de biblioteca, à regiões onde elas não existem, dando a liberdade para a população se apropriar dos usos de um edifício sem a necessidade de se deslocar até ele. Isso é uma forma de integrar essa parcela da sociedade, que fica excluída muitas vezes pelas enormes dificuldades impostas pelos grandes centro urbanos no que tange a mobilidade e o crescimento não planejado das cidades que afasta as pessoas da infraestrutura. Entretanto, temos outros exemplos que devem ser levados em consideração e que talvez tenham feito o caminho inverso para atingir o sucesso. Na Colômbia, as bibliotecas têm sido usadas como instrumento para qualificar bairros degradados e resolver grandes questões ligadas à articulação urbana em diversas cidades. Grande parte do país é urbanizado de forma irregular através da autoconstrução, conformando imensas áreas de favela e bairros sem qualquer infraestrutura, que sofrem com problemas ligados à pobreza como violência, trafico de drogas e falta de acesso ao ensino. Assim, umas das principais medidas dos governos municipais e federal da Colômbia é investir na construção de bibliotecas de relevância regional ou municipal, não apenas nas áreas centrais, mas principalmente na periferia. Com isso, a biblioteca, apesar de ser uma construção pontual, tem caráter de intervenção urbanística de influência até municipal. Isso acontece ao considerarmos que a implantação deste equipamento em formato de grande
porte em áreas periféricas trará não apenas facilidades locais como se tornará atrativo de caráter extra-regional. Essa condição confere à comunidade onde está implantada a biblioteca um edifício público que qualifica a região não apenas ao promover a cultura e a educação através dos livros e de atividades de ensino, mas também ao gerar espaços públicos de qualidade integrados à cidade construída. Mais além, ao desenvolver um grande projeto de destaque arquitetônico e funcional em regiões periféricas, inverte-se a lógica do deslocamento periferia-centro. A nova edificação pode conformar um marco para a região, que passa a ser um atrativo para aqueles que habitam em outros sítios, fazendo com que moradores das áreas centrais também possam desfrutar de estruturas encontradas na periferia, e não apenas o contrário. Essa situação inverte o valor que as áreas centrais de muitas cidades possuem por terem uma relevância cultural superior as demais, independente da concentração populacional. Ou seja, essa proposta encontrada na Colômbia busca equalizar as regiões urbanas e acabar com a “má distribuição de cidade”. Talvez seja possível dizer que os Centro Educacionais Unificados (CEU), implantados no governo Marta Suplicy em São Paulo, partem de um objetivo semelhante. São praças-equipamento que disponibilizam estruturas antes pouco encontradas nas regiões periféricas e buscam se inserir nas áreas pobres da cidade como articuladores da região, sendo apresentados por um de seus idealizadores, o professor Dr. Alexandre Delijaicov da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, como Centros de Estruturação Urbana. Mas é importante destacar também que, na Colômbia, a ideia foi aplicada junto com um plano mais abrangente do que
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LABORATÓRIO MÓVEL DA UNESCO, RENZO PIANO
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OBJETIVOS a construção de edifícios. Dessa forma, alguma bibliotecas são articuladas com conjuntos habitacionais populares, promovendo a mistura de usos como forma de conectar os projetos. Mais do que isso, a profissão de bibliotecário passou a ser muito mais valorizada e os acervos das bibliotecas são vastos e de alta qualidade. Isso também contribuiu muito para o sucesso dos projetos, que talvez não tivessem obtido o mesmo desempenho urbanístico sem esses conceitos. São muitos os exemplos que podemos encontrar de edifícios articuladores da cidade e, dentre eles, as bibliotecas se destacam por sua importância histórica e conceitual. Mantendo suas portas abertas ao público desde o Renascimento mesmo com todas as mudanças culturais e materiais trazidas pelos anos, elas se mostram uma conquista, prova de que os livros são a melhor forma de armazenamento de informações e devem estar disponibilizados em bibliotecas, que devem ser públicas. Estão sofrendo um recente processo de revisão de conteúdo e formato para se adequar à novas tecnologias, dando origem às midiatecas. Mas acima de tudo, continuam a intrigar os arquitetos com a ideia de dar uma forma limitada e finita para algo que conceitualmente é ilimitado e infinito: o conhecimento.
A pesquisa tem como proposta estudar como criar edifícios que articulem bem as grandes questões urbanas de forma a construir uma cidade interligada e que possibilite sua apropriação por parte dos habitantes. Dessa forma, a ideia é entender como um projeto localizado está construindo a cidade como um todo, partindo do pressuposto de que ela se forma da união de inúmeros projetos pontuais, que devem se articular independentemente da simultaneidade de suas construções. Visa-se também entender como se constroem os espaços de convívio dos habitantes e como se projeta espaços de transição entre as diferentes hierarquias espaciais do âmbito público e privado. Aliado a isso, o estudo do edifício da biblioteca se justifica na sua importância histórica para formação das cidades, tanto filosoficamente, no plano das ideias, quanto praticamente, tendo em vista seu caráter cultural e pedagógico para o desenvolvimento de uma sociedade. Assim, a biblioteca oferece um grande potencial como edifício público que pode abrigar funções responsáveis pela qualificação de seu entorno e até mesmo de sua cidade. Não obstante, essas funções deixam de ser as mesmas que se mantiveram desde sua criação para agregar emergentes possibilidades de adaptação às novas mídias e dinâmicas urbanas. Dessa forma, visa-se entender e propor como um edifício pode qualificar seu entorno física, cultural e socialmente. Concomitantemente, pretende-se estudar, dentro de toda sua complexidade, a biblioteca como equipamento público de grande potencial e importância, buscando uma alternativa ao questionamento real de seu valor na atual situação de desenvolvimento tecnológico e disponibilidade maciça de informações para qualquer um que possua conexão on line.
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A pesquisa está vinculada ao Grupo de Pesquisa em Projetos de Arquitetura de Equipamentos Públicos (GPPAEP), coordenado pelo Prof. Dr. Alexandre Delijaicov 5, ao orientador da pesquisa Antonio Carlos Barossi 6 e à coorientadora Marta Bogéa 7. O GPPAEP é um grupo formado por estudantes e professores com intuito de reunir pesquisadores com a mesma abordagem para que uma pesquisa complemente a outra em encontros periódicos e trocas de informações. Entende-se assim que trabalhos diferentes podem se complementar, enriquecendo a pesquisa e o repertório dos membros do grupo. Ao mesmo tempo, a proposta dele é produzir projetos de edifícios, a partir do momento que se considera projeto como forma de pesquisa, já que para todo desenho de arquitetura é necessário uma pesquisa aprofundada sobre diversos assuntos como fundamentação teórica para viabilizar bons resultados. Com isso em vista, o objetivo do trabalho a ser desenvolvido é a produção de um novo projeto, ou seja, de desenhos, textos e modelos tridimensionais que o representem. Portanto, é o desenvolvimento do projeto de uma biblioteca guiado por pesquisas, estudo de edifícios já existentes e análise de obras. Esse embasa5 | O Professor Dr. Alexandre Delijaicov também coordena o grupo de infraestruturas que pesquisa o hidro anel metropolitano, além de ser um dos formuladores e projetadores dos Centros Educacionais Unificados, sistema de equipamentos públicos em São Paulo. 6 | O Professor Dr. Carlos Antonio Barossi já orientou trabalhos de conclusão de curso e participou de bancas de TCC sobre arquitetura de bibliotecas. 7 | A Professora Dra. Marta Bogéa tem doutorado no tema arquitetura móvel, que gerou o livro “Cidade Errante” além de já ter coordenado o workshop “Tecer Tramas” em 2010 sobre o ônibus-biblioteca.
mento teórico deve orientar a escolha de parâmetros do projeto, como o terreno de implantação, o partido, o desenho e a justificativa urbana. O produto final deve se concretizar, então, com textos que apontem conclusões e descobertas a cerca da arquitetura de edifícios na construção da cidade e em um projeto de biblioteca que se utilize delas para a proposição de uma solução urbana e edificável.
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METODOLOGIA A princípio, o método de trabalho está dividido em três vertentes: pesquisa bibliográfica, análise de projetos existentes e desenvolvimento de um meta-projeto. Para tanto, o estudo se iniciará debruçado na bibliografia específica, de onde serão levantados e problematizados os principais conceitos a serem empregados no projeto. A pesquisa estará amparada por livros, revistas e sites que possibilitem o estudo de conceitos arquitetônicos e urbanísticos que visem a integração do edifício com a cidade e que tratem de premissas e desafios da elaboração do projeto de uma biblioteca. Ademais, o estudo de projetos existentes de bibliotecas se dará por leitura crítica de textos e imagens referentes a pelo menos três exemplos diferentes, que permitam a compreensão de como cada situação lidou com as problemáticas encontradas para esse desafio projetual. Para melhor compreensão, croquis esquemáticos, diagramas e estudos volumétricos serão bem vindos. Outra forma desejada de estudo é a visita à campo e conversa com arquitetos. Para tanto, uma ou mais bibliotecas serão selecionadas para análise presencial do projeto ou em entrevistas com arquitetos, de forma a compreender seu processo construtivo e sua organização espacial de forma mais clara. Algumas possibilidades são a nova Biblioteca Brasiliana José Mindlin da Universidade de São Paulo, o Ônibus-Biblioteca Mario de Andrade, a Midiateca da PUC-RIO e a Biblioteca São Paulo. Em se tratando de um estudo urbano e arquitetônico, que envolve diversos fatores complexos que não fazem parte das ciências exatas, um dos principais métodos utilizados na pesquisa será a comparação. Ao analisar projetos
e situações e coloca-los lado a lado, podemos tirar conclusões preciosas que nos permitam avançar em nossos estudos. Por fim, o desenvolvimento de um projeto – ou anteprojeto – será a forma de assimilar a compreensão dos vários itens analisados e principalmente é uma forma concreta de aprendizado, já que um estudante de Arquitetura e Urbanismo necessita não apenas da teoria, mas também da prática para uma boa formação. Essa é a maneira de aprendizado do pensamento de projeto, das técnicas de desenho e representação e de concretizar um estudo em forma de solução espacial e construtiva. Dessa forma, em conjunto com o Grupo de Estudos em Projeto de Arquitetura de Equipamentos Públicos da FAUUSP, orientado pelo Prof. Dr. Alexandre Delijaicov, a pesquisa estará articulada a encontros regulares com outros pesquisadores e profissionais que juntos organizam entrevistas com arquitetos e urbanistas, visitas à obras, levantamento de dados e desenvolvimento de projetos de frentes variadas. Compreende-se, então, uma complementaridade de conhecimentos e práticas que enriquece a pesquisa e a torna parte de estudos maiores.
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DAS RELAÇÕES ENTRE A ARQUITETURA E O URBANISMO Cidades como São Paulo carecem de espaços públicos hoje mais do que nunca. São cidades que cresceram em ritmo acelerado em um período em que o pensamento urbanístico foi negligenciado em função da implementação do automóvel, que passou a ser o cidadão protagonista. Essas cidades não tiveram o mesmo tempo de crescimento que as cidades antigas na Europa, por exemplo, cresceram em poucas décadas, se estendendo por dezenas de quilômetros, de forma que grande parte do que foi construído pelo poder público para acompanhar essa expansão foram infraestruturas de transporte automobilístico e quando muito alguns equipamentos públicos de primeira necessidade, como creches e postos de saúde. O planejamento de espaços públicos passou longe desse crescimento e a maior parte das praças e áreas verdes ficou restrita à restos de traçados viários como rotatórias, alças de acesso e bifurcações. Não é necessário dizer que não são adequadas ao uso e se tornam espaços esquecidos pelas pessoas. Ademais, restaram as calçadas para o uso público. Contudo, quando existem, ou são muito estreitas e abarrotadas de postes, árvores e canteiros, ou não são nem caminháveis, deixando aos pedestres a escolha de caminhar pelo próprio leito carroçável. Mesmo quando possuem dimensão para receber os passantes, as calçadas ainda não providenciam uma capacidade do usuário utiliza-la como espaço público. Podemos observar, por exemplo, que avenidas largas e movimentadas como a Avenida Paulista e a Avenida Faria Lima em São Paulo possuem pouquíssimos bancos ou lugares para as pessoas sentarem. Jan Gehl, fundador da empresa da empresa de Consultoria de Qualidade Urbana Gehl Architects, ressalta em seu livro Cidades para pessoas que “uma boa cidade pode ser reconhecida pela quantidade de pes-
soas que não estão andando”. Se a cidade oferece qualidade de vida, isso se reflete na quantidade de pessoas que estão utilizando o espaço público não apenas para circular, mas também para descansar, comer, estudar, etc. Considerado isso, devemos entender que em uma cidade como essa, não devemos esperar uma remodelação completa dos espaços como forma de corrigir os erros que acompanharam seu crescimento. Estamos lidando com cidades consolidadas, que não possuem mais espaço para grandes projetos de desenho urbano como o de Cerdà para Barcelona e estamos trabalhando com a premissa de que não se pode querer refazer tudo do zero como dizia Le Corbusier sobre Paris. Sobre isso, Rem Koolhaas escreve: “If there is to be a “new urbanism” it will not be based on the twin fantasies of order and omnipotence; it will be the staging of uncertainty; it will no longer be concerned with the arrangement of more or less permanent objects but with the irrigation of territories with potential; it will no longer aim for stable configurations but for the creation of enabling fields that accommodate processes that refuse to be crystallized into definitive form; it will no longer be about meticulous definition, the imposition of limits, but about expanding notions, denying boundaries, not about separating and identifying entities, but about discovering unnameable hybrids; it will no longer be obsessed with the city but with the manipulation of infrastructure for endless intensifications and diversifications, shortcuts and redistributions – the reinvention of psy- chological space.
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PRAÇAS EM SÃO PAULO VERDE = PRAÇAS, CINZA = LEITO CARROÇÁVEL, AZUL = ÁGUA, BRANCO = ÁREA EDIFICADA OS TRÊS PRIMEIROS DESENHOS SÃO BASEADOS EM PRAÇAS ENCONTRADAS EM SÃO PAULO. VEMOS QUE SE TORNAM ILHAS EM MEIO AO TRÁFEGO DE AUTOMÓVEIS. NÃO SE RELACIONAM NEM COM OS EDIFÍCIOS NEM COM RIOS OU CÓRREGOS – ESTES ÚLTIMOS TAMBÉM FICAM ISOLADOS DOS PEDESTRES.
TRÊS DESENHOS DE BAIXO REPRESENTAM FORMAS COMO AS PRAÇAS SE RELACIONAM COM OS EDIFÍCIOS E COM OS RIOS EM OUTRAS CIDADES OU EM RAROS CASOS EM SÃO PAULO. SÃO CONTINUAÇÕES DA CALÇADA E MANTÉM CONTATO DIRETO COM AS ATIVIDADES URBANAS.
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Since the urban is now pervasive, urbanism will never again be about the new only about the “more” and the “modified.” It will not be about the civilized, but about underdevelopment.” 8 O que Koolhaas nos diz é que a nova forma de pensar o urbanismo não pode ser a de idealizar grandes planos urbanos que busquem um desenho correto e fixo para a cidade, mas sim buscar a inteligência de adaptar, de modificar os espaços existentes e transformá-los de acordo com as novas necessidades da sociedade contemporânea. Devemos pensar a cidade através de solução sistêmicas que saibam manipular a infraestrutura para permitir quantas modificações forem necessárias. Tendo isso em vista, entra a importância dos equipamentos públicos no pensamento urbano contemporâneo. Agora, esses edifícios adquiriram novas funções, muito mais abrangentes do que aquelas para as quais são planejados tradicionalmente. Para compreender isso, podemos nos debruçar sobre um curioso caso que apareceu nos jornais de São Paulo em janeiro de 2014. Após conseguir uma liminar da justiça, um shopping da cidade conseguiu proibir o uso de seu espaço para atividades de encontro cotidiano e lazer, tornando proibido o uso do centro comercial para qualquer um que não tenha o objetivo de fazer compras. Isso nos mostra uma importante informação sobre São Paulo. Ela carece tanto de espaços públicos que centros comerciais privados passam a desempenhar essa função, mesmo que sem intensão. Muito mais grave do que 8 | KOOLHAAS, Rem. S,M,L,XL, OMA. New York: The Monicelli Press, 1995, pp. 959/971.
isso, os lugares de encontro e de lazer são mal distribuídos na cidade, e os mais pobres acabam sendo os mais prejudicados, já que quanto mais próximo das periferias, existem menos praças, parques, calçadas e possibilidades de espaços de estar. As pessoas passaram a se apropriar de estruturas urbanas que não são projetadas como espaços públicos como forma de compensar a carência da cidade. A transformação do Elevado Costa e Silva em São Paulo em parque aos domingos é um dos maiores exemplos disso. Mesmo sem acessos fáceis, banheiros públicos, arborização, bancos ou qualquer outro tipo de adaptação do Elevado, as pessoas passaram a utiliza-lo como se ele tivesse sido pensado para isso. É dessa forma que os equipamentos públicos nos interessam nessa pesquisa. Como se pode levar espaços públicos para a cidade e torna-los articuladores da vida urbana com a implementação de um edifício? Trata-se de uma intervenção pequena mas com grande potencial de alteração do espaço. Vemos isso acontecendo em lugares como os Sescs. São equipamentos públicos que levam uma série de atividades para comunidades da cidade e tem o potencial de fornecer espaços públicos muito utilizados. O Sesc Pompeia 5 , por exemplo, mais do que as atividades que proporciona, trouxe em seu desenho uma nova rua interna que se torna um ambiente de extrema vitalidade durante o dia. Mesmo assim, ainda possui uma vida limitada ao períodos em que os portões estão abertos e perde a oportunidade de se tornar uma conexão da região. Um fenômeno que nos interessa considerar nessa pesquisa também é a histórica separação entre arquitetura e urbanismo na construção das cidades brasileiras. Não é o objetivo aqui tentar precisar uma data para esse processo,
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5 SESC POMPEIA: PLANTA E USO VEMOS NA PLANTA COMO OS ESPAÇOS INTERNOS DOS EDIFÍCIOS SE CONECTAM ATRAVÉS DA RUA PRINCIPAL ATÉ CHEGAREM AO DEQUE DE MADEIRA LINEAR QUE SERVE COMO PRAÇA. A FOTO MOSTRA A COMBINAÇÃO DE MATERIAIS DA CONSTRUÇÃO E A LIBERDADE DE USO QUE PERMITE QUE CRIANÇAS CORRAM E BRINQUEM COMO EM UMA RUA DA CIDADE. (IMAGEM CRIADA PARA ILUSTRAR UM TEXTO DA REVISTA CONTRASTE 2)
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nem mesmo se aprofundar em seus motivos, mas devemos tem em mente que ele existe para que possamos nos posicionar em relação a ele. O que se deve entender é que por anos, os problemas urbanos ficaram restritos à decisões políticas despreocupadas com a forma. Enquanto isso, os arquitetos realizaram suas maiores obras dentro de lotes limitados aos muros. O que pretendo dizer com isso é que as obras arquitetônicas não tem contribuído com a geração de urbanidade, pois deixaram de ter relevância para além de seus muros. Mesmo do ponto de vista paisagístico não existe um pensamento do conjunto dos edifícios construídos na cidade, o que é mais um fator de desqualificação do espaço, que se torna quase que autoconstruído. Mesmo em casos como os Sescs e outros equipamentos públicos vemos que do edifício para fora não existe melhoria do espaço, às vezes até mesmo uma piora, já que os muros são deixados voltados para a rua, que se torna pouco ativa e perigosa. Se observarmos mais uma vez o Sesc Pompéia, perceberemos que sua entrada, na Rua Clélia, torna a rua convidativa e muito utilizada. Contudo, na fachada da rua Barão do Bananal, encontramos apenas uma grande muro que se estende por quase toda ela, com exceção de uma entrada secundária do teatro que nunca é utilizada por questões que também se relacionam com a gestão do conjunto. Isso torna a rua Barão do Bananal um espaço opressivo que transmite insegurança e não é nada convidativo ao pedestre. Sobre isso, Jane Jacobs escreve: “...uma rua movimentada consegue garantir segurança; uma rua deserta não.
[...] Uma rua com infraestrutura para receber desconhecidos e ter a segurança como trunfo devido à presença deles – como a rua dos bairros prósperos – precisa ter três características principais: Primeira, deve ter nítida separação entre espaço público e espaço privado. O espaço público e o privado não podem misturar-se, como normalmente ocorre em subúrbios ou em conjuntos habitacionais. Segunda, devem existir olhos para a rua, os olhos daqueles que podemos chamar de proprietários naturais da rua. Os edifícios de uma rua preparada para receber estranhos e garantir a segurança tanto deles quanto dos moradores devem estar voltados para a rua. Eles não podem estar com os fundos ou um lado morto para a rua e deixa-la cega. E terceira, a calçada deve ter usuários transitando ininterruptamente, tanto para aumentar na rua o número de olhos atentos quanto para induzir um número de suficiente de pessoas dentro dos edifícios da rua a observar as calçadas. [...]” 9 Essa cisão entre essas duas áreas do conhecimento parece ter afetado em muito a forma como elas são tratadas até hoje no Brasil. Os urbanistas ficaram muito voltados à problemas sociais – que são alarmantes em nosso país – como o direito à moradia adequada, e deixaram a preocupação com a forma para os arquitetos. 9 | JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. 1ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
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RUA BARÃO DO BANANAL, LADO DO SESC POMPÉIA (FOTO TIRADA DO GOOGLE STREET VIEW)
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Contudo, limitados a atuar dentro dos lotes segundo a legislação construtiva, esse pensamento espacial não ganhou um caráter urbano. São poucos os edifícios em São Paulo que conseguiram integrar uma alteração extra-lote no seu desenho. Esse trabalho parte então do interesse de trazer um caráter mais urbano aos projetos de edifícios públicos. Nos dias de hoje eles já vem desempenhando funções muito mais abrangentes que dizem respeito a vida em espaço público e à promoção de atividades culturais, de ensino e lazer. Muito mais do que isso, a implantação de um edifício deve levar em conta os efeitos de sua arquitetura para o entorno e de como seu desenho pode trazer mais vitalidade e qualidade de espaço para as ruas e para o bairro.
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AS EXPERIÊNCIAS DOS CEU E DE MEDELLÍN Como ponto de partida desta pesquisa, escolhi dois estudos de caso de projetos com os quais tive contato durante minhas atividades acadêmicas e extracurriculares. O primeiro é o projeto dos Centros Educacionais Unificados (CEU) que tem como um de seus idealizadores o professor da FAUUSP Alexandre Delijaicov, que também é coordenador do Grupo de Pesquisa em Equipamentos Públicos da FAUUSP. O segundo são os Parques-Biblioteca de Medellín, que conheci em uma palestra ministrada por Alejandro Echeverri – um dos idealizadores do projeto – na Biblioteca Mario de Andrade em 2013. Ambos os projetos tem como característica fundamental a implantação de edifícios de equipamentos públicos em áreas da cidade que sofrem com problemas sociais e ambientais com o objetivo de levar certos princípios urbanísticos para a região à fim de requalificá-la. Os urbanistas colombianos que elaboraram os Parques-Bibliotecas tiveram contato com os projetos dos CEU em São Paulo em uma experiência de aprendizado mútuo, o que leva os projetos colombianos a apresentarem diversas semelhanças conceituais, além de várias diferenças, nos permitindo estabelecer uma comparação dos dois casos.
- OS CEU “O atual projeto dos CEU constitui mais um passo em uma longa história de interação entre arquitetos e educadores no desenvolvimento de propostas para enfrentar a perversidade do processo de urbanização
das nossas cidades” 10 Os CEU são produto de um diálogo intenso entre educadores e arquitetos que colocam a escola como objeto de transformação de agrupamentos populacionais heterogêneos da cidade de São Paulo. Sendo assim, a escola passa a ser entendida como instrumento de estruturação da cidade e da sociedade. Eles são herdeiros de um conceito de escola anterior proveniente de da mescla da concepção programática do educador Anísio Teixeira e da forma arquitetônica moderna dos arquitetos Hélio Duarte e Diógenes Rebolças, as escolas parque. É justamente o caráter de proposta pedagógica vinculada à proposta arquitetônica que tornou as escolas parque um projeto tão interessante e que torna os CEU um objeto de estudo valioso. Nas escolas parque as atividades previstas foram estruturadas em três conjuntos dispostos das mais variadas formas em terrenos amplos e ajardinados, interligados por marquises. Os blocos de ensino (salas de aula, museu e biblioteca), administração e recreação (área esportiva e galpão coberto para o recreio) formavam conjuntos que tinham ênfase nas atividades de socialização dos alunos entre si e destes com a comunidade local. O projeto dos CEU, seguindo um caminho parecido, agrupa o programa em três conjuntos volumétricos. O maior, em forma de grelha ortogonal, engloba 10 | ANELLI, Renato Luiz Sobral. Centros Educacionais Unificados: arquitetura e educação em São Paulo. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.055/517. Acessado em: 10/12/2013
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salas de aula, refeitórios, biblioteca, programa de inclusão digital, padaria-escola, áreas para exposições e para convivência. O menor, em forma de disco elevado do solo, abriga a creche. O terceiro é um paralelepípedo de cinco andares que reúne o teatro, ginásio esportivo e sala de ensaios de música. Tudo isso é feito com estruturas pré-moldadas disponíveis no mercado que possibilitam a execução rápida de várias unidades dos CEU, sendo feitas 21 na primeira fase e 24 na segunda. Para atenuar o efeito desse processo construtivo foram utilizados alguns recursos arquitetônicos simples os quais Renato Anelli destaca: “Alguns recursos de projeto, como o recuo da estrutura horizontal do segundo pavimento em relação ao plano externo da grelha e a forma implantação dos painéis de vedação do bloco de teatro, denotam a intenção dos autores em atenuar o impacto dessa opção construtiva, usualmente associada às construções fabris. Assim, o forte aspecto tectônico é submetido a uma visualidade geométrico-abstrata onde os volumes principais procuram uma pureza formal tencionada apenas por pequenos volumes agregados que acentuam acessos e circulações e conferem uma certa escala humana à forma. Participam do conjunto duas torres cilíndricas de caixa d’água, dispostas para conferir um contraponto vertical à horizontalidade dominante e marcar o acesso principal.” 11 11 | ANELLI, Renato Luiz Sobral. Centros Educacionais Unificados: arquitetura e educação em São Paulo. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.055/517. Acessado em: 10/12/2013
Os três volumes permitem um leque de opções de implantação que podem variar com o terreno com a escolha do arquiteto responsável. Existem dois partidos de implantação mais comuns: a distribuição perpendicular dos edifício, fazendo com que o espaço entre eles remeta à uma praça urbana; o alinhamento dos blocos em um longo edifício único. A grelha ortogonal da estrutura permite flexibilidade na configuração para se adaptar a variações no programa e diferentes implantações. Mesmo assim, a degradação urbana e social da periferia de São Paulo dificulta uma interação mais aberta com o tecido urbano circundante, que muitas vezes se torna desconexo do equipamento. O CEU quer inaugurar uma nova urbanidade nos bairros onde é implantado. Mais do que isso, ele introduz aos habitantes dessas comunidades conceitos pouco presentes em suas vidas como atividades culturais relacionadas à musica e ao teatro e uma nova forma de se relacionar com o meio ambiente. Como a ocupação descontrolada das periferias tomou quase todo o espaço livre, os espaços que restaram para a implantação de equipamentos públicos se tornaram as áreas de preservação como várzeas e nascentes. Os arquitetos dos CEU tiraram proveito disso e introduziram o partido de incorporar rios e córregos no ambiente urbano. Redesenhando as margens e integrando às praças esportivas e piscinas eles deram um novo significado aos cursos d’água, que deixaram de ser os fundos das edificações. No atual governo de São Paulo está sendo criado pela prefeitura o conceito de “Territórios CEU”. Trata-se da tentativa de tornar os CEU parte de um sistema de equipamentos e espaços públicos interligados. É um refinamento do conceito
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CEU ROSA DA CHINA PODEMOS OBSERVAR FACILMENTE NA PLANTA OS VOLUMES UTILIZADOS PARA CONSTITUIR O COMPLEXO. A FOTO MOSTRA QUE AO VIVO, TAMBÉM SE PERCEBE AS FORMAS QUE IDENTIFICAM CADA FUNÇÃO DO PROGRAMA.
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de equipamento público que caminha no sentido das praças de equipamentos e visa um caráter mais metropolitano. Trata-se de instalar novos CEU próximos à edifícios públicos de outras naturezas e possibilitar uma requalificação do entorno visando uma conexão entre todos esses espaços públicos através de ciclovias e calçadas que permitam a transformação desse “território” em um espaço público qualificado e contínuo. O conceito de “sistema” é algo estudado também por outro laboratório de pesquisas da FAUUSP. O Quapá trabalha em cima do que chama de sistema de espaços livres. Para entender esse conceito é necessário enxergar que “espaços livres” não são a mesma coisa que “espaços verdes”, são na verdade qualquer espaço livre de construção. Isso significa que todas as áreas não edificadas da cidade fazem parte desse sistema, desde praças e parques até ruas e vielas. Dessa forma, para construir um sistema qualificado de espaços livres, deve-se pensar todas as formas de relações entre esses espaços e como se dá sua leitura volumétrica e paisagística. “A qualidade espacial urbana está diretamente vinculada à existência de inúmeros e generosos espaços livres, diversificados, tratados paisagisticamente, arborizados, equipados, bem mantidos, atendendendo às variadas demandas sociais. Entende-se ainda que a realização da esfera pública exige espaços livres amplamente acessíveis para o seu desenvolvimento. Os espaços livres são essenciais para a superação de significativos
problemas ambientais enfrentados pelas cidades brasileiras e lugares fundamentais para a construção da sociedade verdadeiramente democrática e justa. O sistema de espaços livres (SEL) não se define somente a partir dos seus elementos constituintes, mas também das relações entre todos os espaços livres de edificações urbanos, independentemente de sua dimensão, qualificação estética e funcional, de sua localização, sejam eles públicos ou privados. A idéia de sistema se apóia sobretudo na vinculação funcional e ambiental, já que fisicamente somente os espaços públicos estão conectados entre si, principalmente pelo sistema viário. Nele, ruas, avenidas e vielas estão totalmente conectadas permitindo ao usuário, em tese, o acesso visual ou ainda físico tanto às construções e aos espaços livres a elas vinculados, assim como a parques, praças, calçadões e aos demais espaços livres públicos. Devido a este papel integrador e por seu intermédio se dar grande parte da vida urbana cotidiana, tanto no quesito circulação como das demais atividades sociais, tem-se que as vias podem ser consideradas como os mais importantes espaços livres públicos de qualquer cidade.” 12 É, portanto, fundamental incluir um pensamento sistêmico em interven12 | MACEDO, Silvio Soares. Os sistemas de espaços livres e a constituição da esfera pública contemporânea no Brasil. 1ª Edição. São Paulo: FAUUSP, 2013.
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TERRITÓRIO CEU EXEMPLO DE FUNCIONAMENTO: TERRITÓRIO CEU TATUAPÉ (IMAGENS RETIRADAS DO SITE DA PREFEITURA DE SÃO PAULO)
TERRITÓRIO CEU EXEMPLO DE FUNCIONAMENTO: TERRITÓRIO CEU JOSÉ BONIFÁCIO (IMAGENS RETIRADAS DO SITE DA PREFEITURA DE SÃO PAULO)
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ções urbanas, já que em uma cidade todos os espaços já estão conectados, mas poucas vezes pensados. Vemos também a importância da relação os edifícios com a rua – que por serem os principais espaços livres da cidade – já que eles alteram não só a percepção desse espaço mas também a forma como ele funciona. Assim, a provocação de Alexandre Delijaicov ao tratar os CEU como Centros de Estruturação Urbana deve-se à necessidade de enxergar esse potencial nos edifícios públicos, quando bem implantados e sistematizados, podem trazer grandes mudanças para as comunidades locais.
- OS PARQUES-BIBLIOTECA DE MEDELLÍN Nos últimos anos, a Colômbia tem se tornado um país de referência no manejo e planejamento de suas cidades. Bogotá – a capital – já foi tema de bienais de arquitetura pelo mundo, mostrando como a implementação de políticas públicas ligadas ao planejamento territorial e a implantação de projetos arquitetônicos e urbanísticos tem reduzido drasticamente os índices de criminalidade e melhorando a qualidade de vida da cidade. Há alguns anos, Bogotá era um lugar que poucas pessoas desejariam conhecer e quiçá morar, pois apresentava elevadas taxas de pobreza, violência, tráfico de drogas e outros indicadores de baixa qualidade de vida. Contudo, essa situação vem mudando e Bogotá passou a ser um exemplo internacional de como lidar com grandes problemas urbanos.
O arquiteto colombiano Carlos Niño Murcia discute em uma entrevista realizada para a Bienal de Arquitetura de Veneza de 2006 a arquitetura pública recente de Bogotá. Nela ele destaca que as cidades se estruturam em três elementos fundamentais: os monumentos, as residências e o espaço públicos. O primeiro, diz ele, são as instituições, criadas pela sociedade para assegurar sua coesão e seu desenvolvimento. Ela e seus valores se representam através dos edifícios públicos, que devem ter um caráter público e aberto, uma localização privilegiada e uma maior elaboração de seus materiais e elementos de plasticidade e espacialidade. Em Bogotá, foram implantadas pelo governo municipal três grandes bibliotecas públicas em áreas da cidade onde não havia esse tipo de equipamento. O intuito foi levar a comunidades carentes a oportunidade de possuir e utilizar a boa arquitetura. Desse ponto de vista, Murcia considera que elas obtiveram sucesso e ajudaram no acesso ao serviço e a requalificação das regiões. Mesmo assim, ele reconhece que a Biblioteca de El Tinal, por exemplo, poderia ter sido melhor implantada, pois careceu de acesso fácil via transporte público e gerou uma esplanada muito grande e pouco utilizada, a qual ele compara a Brasília. Num caminho muito parecido com o de Bogotá, a cidade de Medellín passou a fazer reformas urbanas que também obtiveram grandes resultados. Apesar de se tratar de uma cidade bem menor – Bogotá possui cerca de oito milhões de habitantes enquanto Medellín possui aproximadamente três – era uma das mais violentas e dominadas pelo tráfico de drogas em todo país. Sua geografia única em forma de grande vale – cuja área mais alta está a mais de mil metros de altura da várzea do Rio Medellín – isolava completamente as populações mais pobres nos
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topos de morro onde não existia quase nenhuma infraestrutura de mobilidade ou equipamentos públicos que atendessem a população. Pensando nisso, foi elaborado um plano de “acupuntura urbana”, espalhando pequenos projetos pontuais pela cidade visando uma requalificação geral. Essa estratégia permitiu melhorar os espaços que já existiam em vez de refaze-los do zero. Ao mesmo tempo, ao espalhar igualmente pela cidade essas intervenções, foi evitado um processo de expulsão populacional e gentrificação. Esse trabalho foi dividido em cinco conceitos. O primeiro é trabalhar os espaços de fronteira, o qual buscou direcionar os projetos para áreas de conflito e disputa de poder entre diferentes comunidades da cidade, ou onde o acesso é dificultado por falta de infraestrutura de transposição. Dessa forma, visa-se entregas melhor as regiões e os habitantes. O segundo ponto seria dar visibilidade à cidade através de uma discussão integrada dos problemas urbanos. Nela, foram envolvidos desde a população carente até empresários e grandes comerciantes. Seguido disso, existe a preocupação com a rua, entendendo que se trata do principal espaço público da cidade. Assim, foram recuperadas calçadas, ruas de carro se tornaram peatonais, foram implementados mobiliário urbano e nova iluminação. O quarto ponto é cultura e comunicação. Foram criados inúmeros programas culturais e educacionais vinculados à projetos arquitetônicos, servindo como forma de tirar as crianças das drogas e da violência. Por último, foi destacado a beleza dos novos edifícios públicos. “Os edifícios mais belos devem estar nas comunidades mais pobres”, destacou Alejandro Echeverri em palestra na Biblioteca Mario de Andrade.
Para execução desse plano, o principal objeto de requalificação utilizado foram equipamentos públicos, em especial as bibliotecas. Chamadas de parquebiblioteca elas sempre acompanharam a implementação de espaços livres públicos abertos em sua implantação, recuperando os espaços existentes. Quando era necessária a desapropriação de casas para a construção desses edifícios, os projetos passavam a abarcar a parte residencial também, de forma de toda a população sempre era realocada para a mesma área em conjuntos habitacionais integrados ao espaço públicos criado. Ao mesmo tempo, sempre se buscou integrar nas intervenções a implementação de novas infraestruturas de transporte, como o metrocable, que é uma espécie de teleférico que ajuda a vencer os grandes desníveis de Medellín. Todos os projetos de edifício e espaço públicos implantados na cidade foram resultado de concursos internacionais. Dessa forma, cada um deles possui propostas diferentes e arquiteturas originais, que levam uma identidade única seus bairros. Essa estratégia também contribuiu para trazer mais visibilidade internacional à cidade, que passou a ser um novo polo de atração turística e de investimentos dentro do país
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IMPLANTAÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLICOS EM ÁREAS DE DIFÍCIL ACESSO EM MEDELLÍN
REQUALIFICAÇÃO DAS RUAS EM MEDELLÍN, TRANSFORMAÇÃO EM RUAS COMPARTILHADAS POR CARROS E PEDESTRES
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PARQUES-BIBLIOTECA EM MEDELLÍN PARQUE-BIBLIOTECA SAN JAVIER (ACIMA); PARQUE-BIBLIOTECA LA LADERA (ABAIXO)
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- MUROS OU PORTAS? Apesar de apresentarem naturezas muito similares, os CEU e os parques-biblioteca de Medellín possuem formas de intervenção muito distintas. O que nos cabe analisar nessa pesquisa não são tanto as diferenças programáticas dos edifícios em cada caso, mas a forma de interação deles com o espaço público e como cada um foi capaz de intervir nas dinâmicas do bairro ou da cidade. A direção dessa pesquisa é a mesma da filosofia do escritório de consultoria de qualidade urbana Gehl Architects quando se trata do pensamento conjunto das formas urbanas. Ela é uma crítica a forma como são tratadas as políticas urbanas tradicionalmente, que separam em departamentos diferentes problemas como o trânsito, a arborização, as calçadas, as praças, os parques, os edifícios, etc. São departamentos que não se dialogam e buscam resolver cada desafio de forma isolada. O resultado é que uma transformação urbana que poderia resolver diversos problemas da cidade ao mesmo tempo acaba tratando apenas de um e muitas vezes gerando inúmeros outros. Essa crítica já foi feita por arquitetos brasileiros também. Em seu trabalho denominado Vazios de água o escritório de arquitetura MMBB problematiza e repensa a forma como são feitos os “piscinões” em São Paulo. Eles são uma forma criada pela prefeitura para ajudar na drenagem de água durante períodos de chuvas fortes. São basicamente grandes poços cavados no chão em áreas onde os alagamentos são constantes para onde deve correr a água durante as chuvas. Dessa forma, são evitadas enchentes nessas áreas, mas o que se ganha em troca é um imenso fosso no meio da cidade que não pode ser acessado por ninguém e não possui nenhuma função paisagística. O que os arquitetos do MMBB apon-
tam é que se os piscinões fossem responsabilidade não apenas da secretaria que lida com drenagens, mas também daquela que lida com espaços públicos, trânsito, ruas e parques, eles poderiam se tornar áreas muito mais úteis na cidade, pois além de ajudar na contenção das águas pluviais ainda poderiam gerar áreas qualificadas de uso público e transporte. O que se pretende com esse pequeno desvio de assunto é justamente indicar o primeiro ponto de comparação entre CEU e parques-biblioteca. Como é tradição no Brasil, a implementação dos CEU não envolveu intervenções para além de seus portões. Isso significa que apesar de sua proposta de estruturação urbana, eles não trouxeram consigo melhoria da infraestrutura de transportes, tão pouco requalificação de espaços públicos vinculados ao seu entorno. Os únicos espaços públicos que podem ser considerados ficam dentro de seus portões e, portanto, não configuram espaços realmente urbanos, pois são inacessíveis por parte do tempo. Considerando que os CEU são escolas, é justificável a existência de áreas descobertas de uso controlado, pois deve haver a preocupação com as crianças. Contudo, não foram abertos outros espaços que possam se configurar como praças ou largos do bairro, e portanto, não contribuíram com o combate à carência desses espaços no meio urbano paulista. Em muitos casos, mesmo gramados não utilizados nas atividades dos conjuntos ficam dentro das cercas, se tornando espaços perdidos tanto para o equipamento público quanto para a cidade. Os parques-biblioteca, por outro lado, estão sempre acompanhados tanto de uma implantação vinculada a infraestruturas de deslocamento na cidade quanto da doação de áreas livres públicas qualificadas para os bairros. Sendo as-
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ESQUEMA DO FUNCIONAMENTO DA GESTÃO PÚBLICA DESENHOS FEITOS COM BASE EM APRESENTAÇÃO DO ESCRITÓRIO GEHL PARA O PROJETO DE REQUALIFICAÇÃO DO VALE DO ANHANGABAU EM SÃO PAULO EM PARCERIA COM A SP URBANISMO. EM VERMELHO, ESPAÇO URBANO PENSADO DE FORMA SEGREGADA; EM VERDE, ESPAÇO URBANO PENSADO DE FORMA CONJUNTA.
Espaço Público Órgãos Y, H, W, M, N, Y
Calçadas Órgão Y
Vias Órgão H Arborização Órgão W
Iluminação Órgão M Transporte Público Órgão N
Edifícios Órgão Y
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sim, se tornam mais acessíveis e agregam mais à qualidade de vida dos habitantes de seu entorno. Em suma, diferente do que acontece nos CEU, junto ao projeto dos edifícios das bibliotecas de Medellín existe também um projeto paisagístico dos espaços livres. Um importante elemento que logo sobressai aos olhos quando comparamos essas duas propostas de intervenção urbana é a forma dos edifícios. Sobre isso podemos levantar algumas questões, contudo é necessário entendermos as duas estratégias de projeto e o contexto no qual foram feitas. Os CEU partiram de uma opção por estruturas pré-moldadas que pudessem ser facilmente adquiridas no mercado e que permitissem aos arquitetos da prefeitura projetar todas as unidades em um curto período de tempo. Para isso, foram elaborados módulos construtivos que pudessem ser feitos com esses elementos pré-fabricados e que permitissem diversas formas de combinação. Por outro lado, os parquesbiblioteca são frutos de concursos internacionais. Isso permitiu que os edifícios resultantes obtivessem formas muito mais variadas e conseguissem uma integração maior aos terrenos de implantação, pois cada projeto teve um escritório de arquitetura único pensando cada área e com menos limitações construtivas do que no caso dos CEU. Sem levantar questões relacionadas à verba pública, é importante perceber que enquanto em São Paulo foram construídos 21 CEU em um governo e 23 no outro, em Medellín foram construídos aproximadamente cinco parques-biblioteca. Isso significa que as escalas de implantação desses projetos foram muito diferentes, até porque as cidades possuem tamanhos muito distintos. De qual-
quer forma, o que se quer observar com isso é que talvez a opção por módulos construtivos de forma tão limitada tenha prejudicado a implantação dos CEU no que tange o diálogo com o terreno, por mais que sempre se tenha buscado isso em seus projetos. Além disso, a repetição desses módulos pela cidade possui a vantagem da construção rápida e de criar uma certa identidade visual para os CEU, mas acaba tornando eles edifícios menos convidativos, tratando todos os bairros sem buscar uma identidade – ao contrário do que foi uma das intenções dos projetos de Medellín. O título desse texto é, portanto, um questionamento ao modelo de edifício – não apenas público – que se tem feito no Brasil. Existem basicamente dois modos de lidar com o controle de pessoas ao espaço “privado” de um edifício: cerca-lo, impedindo o acesso à seu terreno, mas podendo deixar as portas do objeto construído sempre abertas; ou fechando as portas do edifício, mas deixando o espaço livre do terreno aberto e integrado completamente à cidade. Em geral, a primeira opção é o que acontece em nossas cidades, onde tanto os edifícios habitacionais como muitos dos equipamentos públicos e prédios comerciais muram seus terrenos ficando livres para desenhar os edifícios sem preocupações de como ele deve impedir a entrada de não usuários. A vantagem de escolher o muro é que ele permite ao desenho do edifício uma integração muito maior entre o ambiente interno e externo (restritos ao lote). Isso dá uma sensação de liberdade ao usuário, que passa do céu aberto ao edifício sem mesmo perceber. É o caso, por exemplo, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, projetada por Vilanova Artigas. Apesar de não pos-
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suir muros diretamente, o edifício está protegido pelos muros da universidade que distanciam a cidade do edifício. Ele pode, então, privar-se das portas e criar um grande térreo livre que dá acesso ao interior da faculdade, de forma que não existe qualquer possibilidade de controle de entrada de pessoas, tornando espaços internos e externos quase um só. Entretanto, em algum momento essa solução agride o meio urbano, pois necessitou ignorá-lo. No caso da FAU, isso acontece a dezenas de metros de distância, quando o muro da universidade encontra a cidade. Nessa fronteira, são gerados espaços de conflito, pois as ruas que margeiam essa enorme parede se tornam mais agressivas, mais perigosas e perdem o caráter urbano. O espaço público que poderia se integrar ao restante da cidade, permitindo que os transeuntes desfrutassem de espaços públicos e tivesses contato direto não com muros, mas com edifícios ativos, fica nas mãos de um público restrito. O mesmo acontece em muitos outros prédios de São Paulo, principalmente quando se trata de edifícios habitacionais. É comum a criação de condomínios cercados, onde o edifício, isolado no lote, não busca contato com a rua. Assim, a interface entre o espaço público e o privado se dá por muros, cercas e guaritas, em uma relação prejudicial a urbanidade. É gerado um espaço livre que, apesar de ser privado, está em contato com a rua pública, mas que não pode ser acessado. O edifício não se propõe a participar da vida urbana e cria sua própria lógica de funcionamento, que ignora a cidade e suas dinâmicas. Ao observarmos os CEU, podemos notar que sua implantação buscou um caráter próximo ao da FAU. Os edifícios são permeáveis e integrados ao espaço externo. Por outro lado, seu terreno é cercado e seus espaços livres desconectados da
cidade. O própria necessidade de criar aterros para abrigar os módulos construtivos dos edifícios acaba gerando muros de arrimo que se voltam para a rua. Em Medellín, houve um cuidado maior em criar uma interface entre edifício e espaço livre público, de forma que esses conflitos se tornam menos frequentes. De qualquer forma, mais uma vez devemos lembrar que se tratam de programas distintos e contextos diferentes, de forma que não se podem distingui-los entre melhor ou pior, apenas foram analisados aspectos de seus edifícios que nos interessam.
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FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
MURO DA USP NA AVENIDA POLITÉCNICA
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EXEMPLOS DE INTERAÇÃO DO EDIFÍCIO COM A RUA RUA DOUTOR MARTINS DE OLIVEIRA EM SÃO PAULO (ACIMA); CALLE MAYOR EM MADRID (ABAIXO).
RELAÇÃO DOS EDIFÍCIOS COM A RUA CEU FEITIÇO DA VILA EM SÃO PAULO (ACIMA); PARQUE-BIBLIOTECA ESPAÑA EM MEDELLÍN (ABAIXO)
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DA ARQUITETURA DE BIBLIOTECAS Como já foi dito anteriormente nesse trabalho, os equipamentos públicos possuem um valor simbólico muito grande dentro da cidade, pois tratam-se de sinais da vontade coletiva expressos através da arquitetura e se tornam pontos de referência na dinâmica urbana. Ao mesmo tempo, enfrentamos mudanças na sociedade que alteram as demandas por espaços públicos e redefinem as funções dos edifícios de uso coletivo. Devemos lembrar também que eles trazem uma função social muito forte, e são capazes de resolver problemas urbanos como a violência e as drogas com o tratamento dos espaços públicos e com o poder de trazer classes sociais diferentes para o mesmo lugar, tornando-se um espaço mais democrático. A biblioteca é, dentre os equipamentos públicos, um dos que mais tem a capacidade de trazer mudanças sociais e urbanas significativas para seu entorno caso possua um projeto e um plano para isso. Ela é também um dos equipamentos que mais teve seu programa alterado ao longo dos anos com o advento das novas tecnologias de mídia e dos novos potenciais que ela passou a abrigar. Dessa forma, podemos listar alguns exemplos de como novas utilidades podem ser incorporadas as bibliotecas para que se tornem importantes catalizadores de transformação em seus bairros. Para começar, mesclar serviços para a comunidade dentro do edifício pode ser muito útil. Incluir um centro-creche na biblioteca pode contribuir tanto para o aprendizado infantil quanto para atender a novas dinâmicas urbanas como o ingresso de mães de família no mercado de trabalho. Fomentar a comunicação através da possibilidade de acesso à vários meios de informação e
serviços de alfabetização e cursos de idioma ajuda a comunidade a se integrar ao mercado de trabalho e ao mundo ao seu redor. A biblioteca também pode oferecer formas de valorização da cultura e da história através da promoção de eventos culturais, contadores de história e até mesmo a inclusão de um centro de referência urbana e formação cívica, onde existe um espaço para o debate de questões locais e transparência do governo nas obras públicas. Pode servir também de lugar público de encontro, com exibição de filmes ao ar livre, instalações artísticas temporárias, mesas de xadrez e áreas de brincadeira ao ar livre relacionadas à área de leitura infantil. É importante explorar também o fato de que a biblioteca pode impulsionar o comércio local. Não apenas ela serve de vetor de atração para seu entorno, que passa a ser mais ativo, como também pode incluir em seu programa algumas funções como café, loja de livros usados, espaço para locação para pequenas galerias de arte e para eventos. Partindo de um pensamento sistêmico, devemos garantir que o acesso à biblioteca seja fácil, conectando-a ao metrô, aos ônibus, aos carros, às bicicletas e aos pedestres. Ao mesmo tempo, deve-se buscar uma ativação dos espaços públicos, podendo ser incluída, por exemplo, uma praça de uso público que permita uma conexão dos espaços internos e externos do edifício. Dessa forma, também podem ser oferecidas áreas agradáveis de estar tanto dentro como fora da biblioteca, incluindo serviços como ponto de uso de wi-fi gratuito, por exemplo. Mas é essencial destacar que para que a biblioteca tenha sucesso, ela deve ter um projeto que inclua todas as possíveis funções. Mais do que isso, a gestão
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dela é uma das formas mais importantes de manutenção de sua atividade, sendo necessário uma constante revisão dos programas oferecidos e visando a qualidade e diversidade do acervo. A seguir, serão apresentados alguns estudos de caso de projetos de bibliotecas que nos ajudam a compreender melhor como trazer todas as funções de um edifício desse porte para o desenho. Assim, poderemos começar a compreender melhor questões de organização do programa, desenho dos ambientes e relação dos espaços que devem ser consideradas no projeto de uma biblioteca. Foram escolhidos projetos que possuem novas propostas na forma de lidar com o tema em questão e ao mesmo tempo que possuem alguma relevância nas dinâmicas urbanas de suas cidade.
BIBLIOTECA NACIONAL DA FRANÇA -EMIDIATECA DE TOULOUSE Esses dois projetos foram selecionados para estudo pela oportunidade que tive de visitá-los pessoalmente em Julho de 2013. Embora seus desenhos técnicos não estejam disponíveis para consulta, os textos que existem a respeito deles e a vivência que tive de seus espaços e suas cidades permitiu que fosse desenvolvida uma análise muito importante sobre seu funcionamento, forma e simbologia. Desse modo, através de fotos e croquis feitos por mim, tentarei descrever os elementos presentes nesses edifícios que interessam à essa pesquisa.
A Biblioteca Nacional da França, localizada em Paris, foi resultado de um importante concurso internacional que reuniu mais de 200 escritórios de arquitetura de diversos países. Era de interesse da França a construção de um novo símbolo nacional e um marco para Paris. Essa foi também a estratégia utilizada para criar um novo eixo de urbanização na cidade. A região onde foi inserida a biblioteca era um antigo polo industrial da cidade que estava passando por uma fase de mudanças. Era, então, necessário indicar que esse novo eixo é uma importante parte da cidade para atrair investimentos privados para não transformar o bairro em um simples dormitório, e sim em uma região de interesse municipal. O projeto vencedor do concurso, do arquiteto francês Dominique Perrault, se consagrou ao propor uma forte simbologia e um por sua proposta de ocupação. Com uma imensa área livre, a biblioteca serve como um respiro para a tão adensada cidade de Paris. São 60 mil metros quadrados de praça pública e um jardim interno com área de um acre em frente ao Rio Senna em um diálogo constante com as ruas ao redor e com a paisagem natural da cidade. A praça é formada pela cobertura da biblioteca e está em nível com a rua mais alta. 19 Conforme as ruas descem em direção ao rio, é formada uma grande escadaria que, ao mesmo tempo que se impõe, convida os transeuntes à acessarem a biblioteca ou mesmo a sentarem e observarem a orla do Senna. Sobre essa praça, se erguem quatro grandes torres em forma de livro aberto que marcam as quinas da biblioteca e olham para seu interior. Com um poder de Gestalt, elas demarcam esse imenso retângulo que pode ser compreendido à grande distância.
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FOTO DE SATÉLITE DA BIBLIOTECA NACIONAL DA FRANÇA PERCEBE-SE A IMENSIDÃO DO PROJETO EM COMPARAÇÃO AO RESTANTE DA CIDADE
CROQUIS EXPLICATIVOS CORTE MOSTRA A RELAÇÃO DO PROJETO COM O RELEVO E PRESENÇA DE TRAÇOS HORIZONTAIS E VERTICAIS FORTES NO PROJETO (ACIMA); ESQUEMA QUE MOSTRA PLANTAS DAS TORRES CONFIGURANDO O ESPAÇO DA BIBLIOTECA E O GRANDE JARDIM INTERNO (ABAIXO)
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> FOTOGRAFIAS DO EDIFÍCIO AS FOTOGRAFIAS MOSTRAM A GRANDE ESCADARIA DE MADEIRA E A IMPONENTE FACHADA DE VIDRO E AÇO QUE SE ERGUE NAS TORRES SOBRE ELA.
Diferente do que são os monumentos na França, com seus grandes pórticos, colunatas e frontões, a Biblioteca Nacional cria uma nova forma de conferir importância ao edifício através da forma pura e da ortogonalidade. Também são utilizados diversos materiais com uma combinação muito refinada, desde a imensa escadaria em madeira até a vastas fachadas de vidro e aço. Cada material é escolhido com precisão para conferir aos volumes e espaços diferentes características que tomam proveito da tecnologia contemporânea. Através desses recursos a biblioteca se impões sobre a cidade mas também se integra a ela com cores muito urbanas e com uma regularidade e uma estabilidade formais que amenizam sua imensidão. Enquanto as torres abrigam escritórios públicos e espaços de pesquisa, a biblioteca funciona no grande embasamento delas sob a praça pública. Sendo assim, para acessa-la, o usuário deve descer em direção à grande floresta do jardim central. Os principais pontos de descida são feitos por esteiras rolantes à céu aberto e estão indicado de forma sutil pelas paredes que às acompanham, mas que continuam a subir além do nível da praça depois que estas já encontraram o térreo. Se apropriando de uma característica dos edifícios mais antigos, Dominique Perrault torna o jardim interno a principal janela da biblioteca que acontece em cinco andares de anéis retangulares que circundam esse espaço de vegetação criado para parecer uma floresta natural. Voltadas ao jardim estão as circulações horizontais, com um pé direito imponente e paredes de vidro que vão do teto ao chão. Esses corredores dão acesso aos diversos espaços da biblioteca e a floresta
confere ao edifício um sentimento de isolamento e paz que quase engana alguém que não saiba que está no meio de uma das maiores metrópoles do mundo. A Biblioteca Nacional da França é um projeto que se apoiou em características históricas de monumentos para criar uma nova forma de edifício que explora ao máximo às novas tecnologias construtivas e o uso dos materiais de modo sóbrio e equilibrado. Suas dimensões talvez sejam muito exageradas, e a escala humana quase se perde em tamanha vastidão. Contudo, essa foi a opção do arquiteto para anunciar a grandiosidade desse equipamento público de imenso valor para a cidade e para o país.
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> ESTEIRAS E INDICAÇÕES DA ENTRADAS DA BIBLIOTECA
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> JARDIM INTERNO E CORREDORES DE CIRCULAÇÃO
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HALL DE ENTRADA OESTE
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FOTOGRAFIA DE SATÉLITE DA MIDIATECA DE TOULOUSE PERCEBE-SE O ALINHAMENTO DO EDIFÍCIO COM A AVENIDA E A PRAÇA PÚBLICA ATRÁS DELA
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> A MIDIATECA EM FORMA DE ARCO DO TRIUNFO
A Midiateca de Toulouse nos interessa por motivos similares, mas de outra escala. Assim como em Paris, ela se torna um grande marco urbano da cidade. Seguindo uma tradição francesa, ela foi implantada no eixo visual de uma importante avenida e ganhou uma forma muito similar a de um arco do triunfo, se apropriando de seu simbolismo para conferir valor ao edifício e dar à biblioteca um significado comparável ao de uma grande conquista nacional. Mas além do seu poder visual, o edifício tem uma interessante proposta urbana e de organização do programa. Apesar de seu rasgo central alinhado com o da avenida, o edifício não pode ser cruzado por automóveis. Ao invés disso, cria uma passagem para pedestres e gera atrás de si uma praça pública de uso misto, onde existem prédios públicos, comerciais, de serviços e habitacionais. Desse modo, a vitalidade urbana é garantida pelos múltiplos usos ao mesmo tempo que o espaço público ganha destaque através do edifício da midiateca. Ele mesmo possui um caráter de mistura de usos interessante. Das duas torres do edifício a mais delgada é uma escola de artes audiovisuais, enquanto apenas a mais robusta abriga realmente o programa da midiateca. A ligação entre as duas torres pode cima abriga a parte administrativa do edifício. Existe também uma ligação subterrânea entre as torres. Nela estão uma saída de metro que permite acesso direto ao edifício e a parte infantil da biblioteca. Esta última recebe a privacidade e o isolamento necessário para abrigar suas atividades ao mesmo tempo que possui iluminação natural proveniente de sua implantação circundada por um generoso rebaixamento. Desta forma, a passa-
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REBAIXAMENTO EM FRENTE À CRECHE E ÁREA INFANTIL
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VÃO INTERNO, ESCADARIA PRINCIPAL E ILUMINAÇÃO ZENITAL
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gem de pedestres que cruza o edifício pelo meio é dada por uma ponte sobre esse fosso. Também está associado à biblioteca um ponto de empréstimo de bicicletas do sistema público, localizado à frente dela. Sendo assim, o equipamento consegue ser acessível através de diversos meios de transporte e sua forma dialoga com os fluxos que cria. Dentro da midiateca, os andares se organizam ao redor de um generoso espaço cuja cobertura, no último andar, possui entrada de luz natural e contribui para iluminar todo o edifício. Na parte oposta a entrada da biblioteca, neste grande vazio, está a circulação vertical. Ela se destaca por uma grande escada helicoidal de revestida por lâminas de metal que formam um grande redemoinho que ascende ao céu. Atrás da escadaria estão os elevadores, que possuem paredes de vidro de onde se pode ver tanto a parte de dentro como a de fora da midiateca. Em seus andares se distribuem diversas funções: coleção de livros em francês, coleção de livros em outras línguas, computadores para estudo de idiomas, salas de computação, coleção de filmes, televisões para assistir filmes, coleção de CDs, poltronas onde se pode escutar os CDs, mesas de estudo e salas de atividades. O empréstimo de materiais pode ser feito tanto com os recepcionistas de cada andar como em máquinas de autoatendimento. Todo o edifício é revestido com brises metálicos móveis que ajudam a barrar o sol, mas podem ser abertos sempre que necessário. Sua cor avermelhada remete à história de Toulouse, que é famosa por suas construções em tijolo que as tornou“a cidade vermelha”. No térreo do edifício também está presente um programa interessante: um centro de referência urbana. Trata-se de um local onde a
prefeitura expõe as obras públicas que estão sendo realizadas e educa a população sobre a cidade de forma transparente. Esse uso parece muito apropriado de estar associado à uma midiateca (local de ensino e conhecimento) e incluso em um edifício de relevância urbana.
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USUÁRIOS EM PONTOS DE LEITURA E DE AUTOATENDIMENTO DE EMPRÉSTIMO
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> CENTRO DE REFERÊNCIA URBANA E BRISES METÁLICOS AVERMELHADOS
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- BIBLIOTECA MUNICIPAL DE SEATLE A Biblioteca Municipal de Seatle foi selecionada para este estudo pois apresenta não apenas um interesse programático muito grande, como também estético e estrutural. O programa do edifício e sua organização trazem invenções que merecem ser estudadas. Foram elas que levaram tanto à forma final do edifício quanto às suas soluções estruturais. Dessa relação, surge uma nova forma de pensar a arquitetura e entender seu papel na contemporaneidade. O poder estético do edifício deve ser menos considerado por questões de beleza do que por questões de destaque e Gestalt. Sua forma exterior nos conta muito sobre sua planta e confere à biblioteca o status de monumento de grande destaque. O OMA criou, na Biblioteca de Seatle, um verdadeiro complexo de atividades mescladas de difícil compreensão através de apenas plantas e cortes. Isso porque o pensamento tridimensional é a chave para desvendar o edifício. Depois de uma leitura crítica e propositiva do extenso programa de atividades da biblioteca, os arquitetos reagruparam as funções da forma que consideraram mais eficaz, propondo novas divisões e possíveis significações do espaço. Foram definidos então áreas de uso específico e áreas de uso mais livre. Aquelas, distribuídas em paralelepípedos, foram sobrepostas de forma a não se encostarem. Depois, eles ainda foram desalinhados, deixando de ter um centro em comum. Foi então que uma pele esticada de vidro cobriu todos os blocos, ligando-os e gerando novos espaços entre eles. Foi essa estratégia de organização do programa que gerou então a forma final do edifício. Foi algo espontâneo, não era possível saber seu formato final até que tudo estivesse reorganizado. Em uma observação mais geral, podemos dividir a lógica do programa da
seguinte maneira: os espaços de estacionamento e área técnica estão localizados no subsolo; no térreo – que tem dois níveis acessados por ruas em cotas distintas – estão as atividades mais públicas e próximas das atividades urbanas como entradas, auditório, área infantil e jovem, centro do línguas, área de estudos, café, loja e a coleção de livros de ficção; acima disso estão os andares de informação onde se pode usar computadores e pesquisar tudo que a biblioteca oferece, funções que fazem a conexão entre o espaço público e o acervo da biblioteca; o volume maior se encontra acima deste e abriga a coleção de livros de não ficção e espaço de leitura principal; por fim, o último volume abriga a administração geral da biblioteca. Essa organização vertical do programa aproxima da rua as atividades mais cotidianas e de interesse da população em geral. Ao mesmo tempo, permite criar um espaço para o acervo principal que se impõe sobre a biblioteca e é capaz de abrigar uma vasta coleção de livros. Fugindo da forma tradicional de acervos de biblioteca, o OMA propõe que o volume que abriga a coleção funcione como uma grande espiral, uma rampa contínua de dois graus de inclinação (o suficiente para não prejudicar cadeirantes ou carrinhos de livros, mas ainda sim indicar uma constante subida) que comporta estantes com capacidade para muito mais livros do que a coleção inicial da biblioteca. Desse modo, apesar da verticalização do acervo, ele permanece como um espaço contínuo e totalmente conectado, onde se pode transitar livremente sem a necessidade de interromper o percurso por causa de escadas ou elevares. Essa engenhosa solução transforma o entendimento do usuário sobre o edifício e permite uma nova forma de dinâmica do edifício vertical.
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A BIBLIOTECA E A CIDADE | NICOLAS LE ROUX < INFOGRÁFICOS MOSTRAM COMO FUNCIONAM OS BLOCOS DE ATIVIDADES
VEMOS COMO O PROGRAMA DEU FORMA AO EDIFÍCIO
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< INFOGRÁFICO DOS ANDARES PÚBLICOS ENTRADA PRINCIPAL PELA FOURTH AVENUE, PRIMEIRO NÍVEL PÚBLICO. DESTACAM-SE AS ÁREAS INFANTIL, DE ENSINO DE IDIOMAS E AUDITÓRIO. (IMAGEM DO MEIO) ENTRADA SEDUNDÁRIA PELA FIFTH AVENUE, SEGUNDO NÍVEL PÚBLICO. DESTACAM-SE ÁREA PARA JOVENS, AUDITÓRIO DE ARENA, ESTANTES DE LIVROS DE FICÇÃO, CAFÉ E LOJA. (IMAGEM DA DIREITA)
< INFOGRÁFICO DO ANDAR DE INFORMAÇÃO CHAMADO “MIXING CHAMBER” O ANDAR DE INFORMAÇÕES É O NÚCLEO DO PROJETO E CONECTA O PÚBLICO AO ACERVO. DESTACAM-SE AS ÁREAS DE INFORMÁTICA E DE PESQUISA DE LIVROS (IMAGEM DA ESQUERDA)
A suave inclinação do bloco de acervo e leitura também influencia na espacialização dos outros blocos. No mezanino de informação o pé direito varia e o piso ganha diferentes espacialidades e dinâmicas visuais. O mesmo ocorre no último andar do acervo, onde o piso inclinado aliado à cobertura horizontal conferida pelo bloco administrativo também cria uma variação de pé direito. Um outro fator interessante para a dinamização e integração dos espaços é o deslocamento horizontal dos blocos. Ao fazer isso, o OMA cria mezaninos internos e pés direitos de diferentes alturas. No caso da parede de vidro inclinada que vai do bloco público ao de acervo, é criado um grande vazio que confere ao espaço uma sensação de quase estar ao ar livre. É aí que o bloco de informações funciona como mezanino e mira o bloco público como se fosse uma praça urbana. Em outros lugares, a inclinação da pele de vidro ganha outra função. Quando se inclina para fora do piso, ela se transforma numa grande janela que olha para o espaço público externo de cima e permite uma nova forma de relação entre o interior e o exterior do edifício. É importante perceber que, apesar do deslocamento horizontal dos blocos ser bem variado, todos os andares ainda podem ser acessados pelas mesmas torres de elevadores e escadas, permitindo uma funcionalidade melhor do edifício como um todos. Pro outro lado, os usuários nunca são obrigados a utilizar essas torres, já que existem escadas rolantes alternativas que se destacam no meio da biblioteca com cores vibrantes, convidando as pessoas a subirem e descobrirem todos os espaços públicos desse grande equipamento. Para estruturar esse complexo edifício, o OMA utiliza, na maior parte do
projeto, uma estrutura relativamente simples de colunas alinhadas em grid que passam por todos os andares. Contudo, em determinadas regiões do projeto foram incluídas vigas de aço inclinadas para permitir os grandes balanços dos blocos deslocados ou para evitar que colunas invadissem certos espaços como o piso público interno. Algumas das propostas de espaço interno que mais chamam a atenção no projeto além das já comentadas são: um auditório sem teto acessado por cima através de um dos pisos públicos; a posição das estantes de livros de ficção em leque, alterando a percepção espacial do vasto andar público e transformando-o em uma floresta de livros; o uso de cores fortes para indicar espaços ou atividades; o espaço de transição entre a calçada e o interior do edifício, onde existe um estacionamento de bicicletas.
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< CORTE DO EDIFÍCIO COM DESTAQUE PARA O ACERVO E SEU FUNCIONAMENTO
PERCEBE-SE NO CORTE COMO AS DIAGONAIS DE VIDRO GERAM ESPAÇOS INTERNOS E VISUAIS
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> NO CORTE, A TORRE DE CIRCULAÇÃO VERTICAL; NAS FOTOS, A CIRCULAÇÃO ALTERNATIVA
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DESTAQUE PARA AS ESTRUTURAS
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DISPOSIÇÃO DAS PRATELEIRAS DE LIVROS DE FICÇÃO. ALÉM DE PLANTA EM LEQUE POSSUEM ALTURA BAIXA, POSSIBILITANDO INTEGRAÇÃO VISUAL DO ESPAÇO
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A BIBLIOTECA E A CIDADE | NICOLAS LE ROUX < AS FORTES DIAGONAIS DE VIDRO MARCAM O DESENHO DA BIBLIOTECA E CRIAM ESPAÇOS DE TRANSIÇÃO COMO A ENTRADA E AS ÁREAS PÚBLICAS
O AUDITÓRIO ABERTO E AS JANELAS QUE OLHAM PARA BAIXO SÃO ALGUMAS INVENÇÕES DO EDIFÍCIO QUE O TORNAM ESPECIAL.
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> IMPLANTAÇÃO DOS EDIFÍCIOS E MIRANTE FORMADO ENTRE ELES
> RELAÇÃO DOS EDIFÍCIOS COM A PAISAGEM NATURAL E URBANA
- PARQUE-BIBLIOTECA ESPAÑA Como parte do grande projeto de requalificação urbana de Medellín já abordado nessa pesquisa, o Parque-Biblioteca España é um projeto resultado de um concurso internacional. Seu interesse para essa pesquisa existe por uma série de razões. Além de seu grande sucesso na recuperação do espaço público do bairro onde se insere, se tornou um equipamento de destaque que chamou a atenção do público para os problemas de Medellín e para suas iniciativas de combate à eles. Esse projeto lida não apenas com a dificuldade de se inserir em uma zona degradada da cidade com terreno de difícil acesso, mas também com o fato de ser um empreendimento público de um país em desenvolvimento. Dessa forma, diferentes dos projetos analisados anteriormente, que surgem em países com grande poder econômico, a Biblioteca España se enquadra num contexto sociopolítico mais próximo do enfrentado no Brasil. Dividindo o programa da biblioteca em três grandes blocos individuais, foi possível estabelecer funções que podem ser acessadas de forma independente e estão ligadas através de uma grande praça pública que se encontra no nível da rua. Com uma implantação em forma de leque, os edifícios configuram essa praça em diálogo com o volume das construções preexistentes. Ao mesmo tempo que demarcam o espaço público sem a necessidade de grades ou muros, deixam rasgos na paisagem que permite a criação de mirantes de onde se pode ver a vasta paisagem urbana de Medellín. O que chama atenção à primeira vista nesse projeto é seu grande destaque simbólico na comunidade onde se insere. Trata-se de um edifício que investiu em um poder estético capaz de se destacar chamar a atenção dos cidadãos apara
esse novo espaço público da região. Mesmo assim, consegue manter uma forte relação com a paisagem onde se insere e dialoga com ela de forma positiva. Ao ser construído no alto de um dos morros da cidade, ele pode ser visto de longe e indica que naquela área atualmente pobre da cidade existe um equipamento público de grande importância. Ao mesmo tempo, se disfarça na paisagem montanhosa como se fizesse parte dela, onde poderiam existir três grandes rochas existem três edifícios públicos. Esse diálogo com a paisagem também se dá nos detalhes de aproveitamento do terreno pelos edifícios. O arquiteto soube utilizar o grande desnível a seu favor, sem a necessidade de significativas movimentações de terra de criação de grandes platôs. Os cortes feitos no terreno receberam diretamente espaços internos dos edifícios, de forma que não são perceptíveis por fora. Por vezes, a cobertura desses espaços ajudou a configurar a praça pública de forma plana. Para isso, o nível de acesso dos edifícios não é necessariamente através do piso mais baixo, já que existem níveis acima e abaixo do nível da rua, mas que, pela forma do terreno, não configuram exatamente subsolos, já que possuem janelas para o lado oposto à praça. Essa solução permitiu, por exemplo, que o edifício que abriga o auditório pudesse ter uma entrada por cima, fazendo com que a arquibancada se aproveitasse do desnível preexistente. De uma maneira diferente do que ocorre na Biblioteca de Seatle, a Biblioteca España também possui uma forma abstrata com a presença de fortes diagonais. O que as diferencia é o fato de, em Medellín, a forma exterior não ser uma consequência da organização interna dos edifícios. A solução aqui é uma pele
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> CORTES DOS EDIFÍCIOS PODEMOS NOTAR COMO O TERRENO FOI APROVEITADO NA PARTE INTERNA DOS EDIFÍCIOS E COMO ELA AJUDOU A CRIAR A PRAÇA PÚBLICA
que envolve os volumes de forma descolada e independente deles. Assim, não se pode deduzir o formato interno dos blocos à partir de sua forma externa. Essa estratégia permite uma solução estrutural mais simples que a do OMA, sem a necessidade de vigas na diagonal ou grandes balanços, apenas lajes e colunas. Ao mesmo tempo, o espaço que existe entre a pele e as lajes permite uma integração entre os andares, que compartilham da mesma ventilação e das mesmas janelas. É possível perceber todos os andares quando se está dentro dos edifícios. Em uma observação mais detalhada também podemos destacar uma solução interessante para o armazenamento dos livros. Todas as estantes estão localizadas nas bordas das lajes e possuem uma altura de aproximadamente 1,2 metros. Assim, funcionam também como parapeito e balcões que permitem uma integração visual completa do espaço e liberam a parte central das lajes para as mesas de leitura e estudos.
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PERCEBEMOS A INTEGRAÇÃO ENTRE OS ANDARES E A DISPOSIÇÃO DAS ESTANTES
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PERCEBE-SE COMO A FORMA INTERNA E EXTERNA DO EDIFÍCIO SÃO INDEPENDENTES
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O EDIFÍCIO E O ESPAÇO PÚBLICO: UM ESTUDO Um dos fatores de maior interesse nessa pesquisa é compreender como se dá a relação do espaço construído com o espaço livre para que ambos se completem e tragam qualidade de vida para a cidade. Em um estudo mais simplificado, pretendo entender a relação da forma dos edifícios com o espaço livre resultante e como isso pode contribuir para gerar bons espaços públicos e vitalidade para eles. Assim, escolhi alguns edifícios públicos da arquitetura brasileira e internacional como foco dessa análise. Esses edifícios foram escolhidos por terem algum tipo de proposição em relação à geração de espaço público exterior relacionado ao edifício. Sendo assim, não se tratam apenas de obras que resolveram bem o desenho ou se tornaram ícones da arquitetura, mas sim que trouxeram de alguma forma uma intenção de elaboração do espaço livre.
- REAL GABINETE PORTUGUÊS DE LEITURA, RIO DE JANEIRO O primeiro edifício a ser analisado é também o mais antigo deles. O que existe de tão especial no Real Gabinete Português de Leitura é sua relação com traçado antigo da cidade do Rio de Janeiro. Ela nos remete às análises do antigo urbanista Camillo Sitte, que nos interessa por ser muito pouco presente no pensamento da arquitetura e das cidades brasileiras e nos permitir tecer novas observações – apesar de publicadas há mais de cem anos – acerca da forma de se projetar espaços públicos.
Apesar de ser uma biblioteca de grande importância na época em que foi construída, com arquitetura luxuosa e forma imponente, o Real Gabinete se mescla aos edifícios do quarteirão, dando continuidade à fachada da quadra. Em vez de se isolar para ganhar destaque, o que lhe confere maior importância é justamente seu diálogo com o conjunto. Essa configuração permite que se abra uma praça seca em sua frente de lados não paralelos que sinalizam na direção do Gabinete de Leitura. Assim como observou Sitte em seu livro quando diz que das 255 igrejas de Roma, apenas seis não eram geminadas em algum dos lados. Dessas seis, quase todas foram feitas em tempos modernos ou não eram católicas. Mais do que isso, ele observa que os monumentos em geral (edifícios, estátuas, chafarizes) nunca são colocados de forma centralizada no espaço público e isso potencializa sua percepção e seu diálogo com o contexto. Camillo Sitte nos dá uma visão mais artística do fazer urbano. Para ele, a crítica ao pensamento moderno está no fato da implantação dos monumentos ter passado a ser dada por regras puramente formais e geométricas, deixando em segundo plano a sensibilidade aguçada dos arquitetos em compreender como posiciona-los. Ele nos mostra como essa sensibilidade pode fazer falta e nos conta o caso de David, de Michelangelo, que foi posicionada pelo próprio artista no canto de uma praça ao lado de uma parede, mas que mais tarde foi movido para um museu e teve sua réplica posicionada no centro geométrico da praça. Isso fez com que David perdesse sua imponência, já que passou a ficar em campo aberto, ao mesmo tempo que perdeu seu contato com o público, que não passava pela estátua a menos que quisesse vê-la.
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REAL GABINETE PORTUGUÊS DE LEITURA FOTO DO INTERIOR DO EDIFÍCIO (ACIMA) DEMONSTRAÇÃO DA RELAÇÃO DO EDIFÍCIO COM A MASSA CONSTRUIDA E COM A PRAÇA À FRENTE DELE (ABAIXO)
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Basicamente, o urbanista nos mostra como algumas características de cidades aparentemente autoconstruídas sem planejamento na realidade guardam grandes segredos e sabedorias sobre a forma de se fazer a cidade. Saber escolher a posição de monumentos, muito mais do que saber como valorizá-los visualmente, também tem a ver com os fluxos e os usos do espaço, e tudo isso deve ser estudado quando se projeta.
- CENTRE GEORGES POMPIDOU, PARIS Acompanhando a tradição parisiense na inserção do edifício, ele mantém suas extremidades juntas às calçadas, de forma que suas paredes delimitam as ruas. Apesar disso, é mais do que perceptível a transgressão que faz em seu desenho em relação aos edifícios de seu entorno, já que foge completamente da lógica estilística do centro de Paris. Isso, somado ao seu gabarito levemente mais alto que dos edifícios ao seu redor, lhe confere o destaque que mostra sua função de monumento urbano. É interessante em sua implantação o fato de delimitar uma grande praça seca que está diretamente vinculada ao edifício. Ao mesmo tempo que ela permite o respiro que a construção merece para ser vista, se torna um espaço vivo e muito utilizado pelos habitantes e turistas. Ao analisarmos a volumetria do Centre Georges Pompidou e seu entorno, vemos que ambos agem igualmente no sentido de delimitar a praça principal,
ao mesmo tempo que criam outras pequenas pracetas conectadas à ela. As formas do museu e das massas formadas pelos edifícios do entorno são similares e fazem com que ele se torne parte daquele tecido apesar de sua estética provocativa. A praça se integra ao edifício através de seu térreo de vidro que permite uma troca visual muito grande entre dentro e fora. Ao mesmo tempo, o sistema de escadas rolantes e mirantes instalados na fachada do prédio fazem com que essa integração continue até o último andar e o edifício passa a dialogar não apenas com a praça que vê e enxerga, mas também com toda a paisagem urbana que permite ao visitante deslumbrar. A leve inclinação da praça no sentido do edifício contribui para que ele receba atenção, já que direciona os grupos de pessoas a se sentarem voltadas para ele. Em contrapartida, o lado oposto do museu dialoga bem menos com a rua, e não se propõe a alterar a dimensão de sua calçada. Mesmo assim, isso não se torna um problema a medida que o edifício em frente garante a vitalidade das calçadas ao oferecer janelas e comércio voltados para a calçada.
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CENTRE GEORGES POMPIDOU FOTOGRAFIAS DO EDIFÍCIO
IMPLANTAÇÃO
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CENTRE GEORGES POMPIDOU PERCEPÇÃO VOLUMÉTRICA
CROQUI DE CORTE
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- SESC POMPEIA, SÃO PAULO Lina Bo Bardi criou uma pequena cidade quando projetou o Sesc Pompeia. Com ruas e edifícios independentes, o equipamento público se tornou na verdade vários e, dentro de si, se transformou no modelo de uma cidade. Um ambiente urbano é composto por múltiplos edifícios com diversas funções. As ruas conectam tudo, levando carros, pedestres e ciclistas para o comércio, a praça, o esporte, o cinema, a escola, enfim, para todas as atividades que uma cidade pode oferecer. Quando um edifício se fecha em si mesmo, ele corre o risco de deixar de fazer parte dessa cidade e se tornar uma barreira, uma espécie de câncer. São assim alguns shoppings ou condomínios residenciais cercados, que obrigam a vida urbana a acontecer dentro de seus muros, tornando o redor hostil ao pedestre e segregando as funções urbanas, que passam a ser acessíveis apenas com auxílio do automóvel. No Sesc Pompeia, acontece o mesmo que em uma cidade. As ruas são praças que se tornam restaurantes, que se tornam clubes esportivos que se tornam oficinas. Tudo tem vitalidade e está conectado. A posição dos edifícios é que configura as ruas e praças, tornando-os espaços de transição e estar. Atividades culturais e apresentações não possuem espaço definido, mas possuem espaços preparados para recebe-los tanto por sua configuração espacial – ora coberta, ora descoberta; ora grande, ora diminuta – quanto por suas múltiplas personalidades dadas pelo matérias e pela forma. O maior pecado do Sesc Pompeia é, então, não ter levado essa vitalidade e urbanidade para além de seu interior. Não se pode culpar exatamente a arquitetura dele por isso, já que grande parte do problema advém de decisões
administrativas. Em suma, muitas de suas ruas internas terminam em grades e muros, impedindo um fluxo de grande potencial que poderia conectar as atividades internas do Sesc com as do restante do bairro, como o shopping, o mercado e as residências. Um elemento importante em sua volumetria é o edifício de esportes, o mais alto e de arquitetura mais chamativa. Ele cria uma importante marca no território e indica um endereço coletivo de acesso público. Suas passarelas externas tem um efeito semelhante às escadas do Instituto Georges Pompidou, permitindo uma relação entre o interior e exterior do edifício que se faz verticalmente. Elas também guardam uma característica interessante. Ao conectarem os edifícios por cima da rua, ajuda a quebrar o conceito de lote urbano. Claro que se a rua fosse aberta e se tornasse parte da cidade isso ficaria mais evidente: o edifício atravessa o espaço público sem que um interrompa o outro. Uma nova forma de entender a morfologia urbana.
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GALPÕES PERMEÁVEIS COM ATIVIDADES DIVERSAS
RUA INTERNA PRINCIPAL
PEQUENAS PRAÇAS ENTRE EDIFÍCIOS
GALPÃO PRINCIPAL ATIVA A RUA INTERNA E DÁ AS COSTAS PARA A RUA EXTERNA
PRAÇA LINEAR COM DEQUE DE MADEIRA
ELEMENTOS MAIS ALTOS
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< SESC POMPEIA FOTOGRAFIAS DO EDIFÍCIO (ESQUERDA) VOLUMETRIA E ESPAÇOS (DIREITA)
IMPLANTAÇÃO
ENTRADA PRINCIPAL
MERCADO
PRAÇA TIPO ILHA
SHOPPING
MUROS OU CERCAS
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> PRAÇA DAS ARTES FOTOGRAFIAS DO EDIFÍCIO (ESQUERDA) IMPLANTAÇÃO (DIREITA)
- PRAÇA DAS ARTES, SÃO PAULO A Praça das Artes, assim como já mencionado anteriormente, nos interessa por trazer consigo um novo posicionamento na arquitetura contemporânea brasileira. Sua forma e implantação não apenas são muito propositivas como também trazem uma solução muito interessante em relação à gestão e à já discutida dualidade entre muros e portas. Ao fazer uma releitura das galerias de lojas em miolos de quadra, elemento muito presente no centro de São Paulo, esse equipamento público cria uma praça pública com esse formato. A vontade de tornar aquele espaço uma passagem conectada com o entorno levou os arquitetos a elevarem os edifícios do chão e a esconderem suas estruturas, de forma que não existem colunas no caminho. Desse modo, para quem está nas ruas do entorno, existe um grande rasgo térreo na fachada contínua do quarteirão que indica a entrada como se fosse o térreo do edifício. Para quem está sob os edifícios, eles são apenas marquises em uma praça ora coberta, ora não. Já para quem está no miolo da quara, é possível enxergar todas as ruas do entorno numa simples girada de cabeça, tornando-se rápida a compreensão das múltiplas possibilidades de caminhos. A mesma vontade de liberar o térreo teve que lidar com a necessidade de controle de entrada para o terreno em certos momentos. Para isso, diferente do que é feito normalmente ao se elevar o edifício sobre pilotis, liberando o térreo mas gerando a necessidade de cercas no entorno, o os edifícios foram colocados diretamente na rua. Dessa forma, quando o acesso está fechado, existe um portão junto ao edifício, ao mesmo tempo que é uma grade, é como a porta de qualquer um dos edifícios da rua. Quando está aberto, o portão se esconde por sob o piso e
desaparece, mantendo a sensação da ausência de muros e de conexão total entre o espaço público e o semi-publico. A forma dos edifícios também nos interessa, não pela sua estética puramente, mas pelo funcionamento de seu programa. Tratam-se de seis edifícios com funções diferentes, mas que se unem física e esteticamente, gerando uma linguagem única para o conjunto que não denuncia a primeira vista sua separação de atividades. Assim, Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci vão além do que Lina fez com as passarelas do Sesc Pompeia e criam transposições através dos próprios edifícios para quebrar o conceito de lotes urbanos e transpor o espaço público sem interrompê-lo. Dessa forma, apesar de abrigarem diversas atividades independentes, os edifícios se tornam um só. A volumetria variável dos corpos, que surge da mistura entre o programa de cada um a relação com o espaço no qual foi inserido, se torna aliada do conjunto e dá a ele uma linguagem em comum. Mais do que isso, essa variação de gabaritos e formas quase se confunde com a quadra onde a Praça das Artes se insere, pois, lá, edifícios altos, baixos, largos e estreitos evidenciam uma certa ausência de ordenação. Sendo assim, o diálogo que a Praça das Artes faz com seu entorno varia de uma tentativa de manter a lógica desordenada e pluriformal da quadra e do posicionamento de quebrar com a própria ideia de quadra e transformar aquele espaço em algo novo.
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PRAÇA DAS ARTES VOLUMETRIA E ESPAÇO PÚBLICO
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ESTRUTURAS MÓVEIS A princípio parece estranho considerar o estudo de estruturas móveis como objeto de uma pesquisa que visa compreender as relações da arquitetura e do espaço livre. Contudo, é fácil perceber que esse assunto é mais do que pertinente por uma série de motivos. O primeiro e mais importante talvez seja o fato de que será alvo de projeto deste trabalho o sistema de Ônibus-Biblioteca de São Paulo, que envolve elementos circulantes. Porém, mais do que isso, é notável que a arquitetura recente lida com a mobilidade e com a capacidade de produzir espaços nômades. Diversos projetos da atualidade são feitos considerando a capacidade de deslocamento dos corpos construídos. Desde casas montadas por módulos préfabricados que abrigam cômodos prontos que se juntam no local de implantação da residência até estruturas implantadas no espaço público por espaços de tempo limitados, como é o caso do Pavilhão Itinerante da IBM, projetado por Renzo Piano. Existem iniciativas parecidas com o próprio sistema de Ônibus-Biblioteca que envolvem corpos em deslocamento, criando pequenos teatros e até mesmo cinemas à céu aberto que são montados temporariamente com módulos deslocáveis que podem facilmente transitar entre diferentes regiões da cidade. Essas estruturas são importantes, pois são formas da arquitetura se adaptar às dinâmicas urbanas e responder a novas demandas de forma prática e rápida. Desse modo, não são necessárias grandes obras estáticas para responder a problemas pontuais e fluidos. Pode-se dizer: “Além disso, significa compreender arquitetura e cidade como fatos relacionados de modo sistêmico e, portanto, em interferência mútua a
gerar (re)organizações. E não como fatos isolados, estanques e hierarquicamente distribuídos, como sugere a noção de infraestruturas como subsídio ou base a partir da qual a arquitetura e a cidade se organizam. Parece significativo, numa época de rápidas transformações, que se pense em espaços onde, mais do que uma alucinante e incessante destruição, seja necessária uma materialidade que absorva as alterações. Ao comparar os sólidos (que diante ao impacto sua forma permanece inalterada ou é destruída) aos líquidos (ao impacto, sua forma se reorganiza, assumindo outras configurações), Bauman fornece uma metáfora desafiadora para uma arquitetura que, nesta época de variações e transformações, (re)organiza-se mais do que se destrua com os impactos naturais.” 13 Mais recentemente foi criado um conceito de “praças de bolso” denominados parklets. Com a preocupação de qualificar o espaço público e repensar as formas de uso das calçadas nas grandes cidades, essas pequenas praças podem ser implantadas sem a necessidade de reformas urbanas ou mesmo de grandes intervenções na configuração da rua. Tratam-se de elementos pré-fabricados que possuem a dimensão de uma vaga de carro. São trazidos para regiões da cidade onde o uso das calçadas é intenso e necessita de ampliação e onde opta-se por ceder parte do espaço destinado ao automóvel para uso dos pedestres. Assim, eles são facilmente implantados e se adaptam a diversas necessidades, trazendo consigo mobiliário urbano que envolve 13 | BOGÉA, Marta, Cidade Errante: Arquitetura em movimento. São Paulo, Senac, 2009.
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PAVILHÃO ITINERANTE DA IBM
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INE ITINERANTE VEFAVE, CHILE
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bancos, paradas de bicicleta, canteiros, entre outros. É uma solução fluida e simples que abriga grande potencial de transformação. Outra experiência do mesmo tipo feita no Canadá para a comemoração de seus 400 anos criou “praias móveis”. Na verdade são estruturas cujo conceito surgiu da ideia de uma praia, já que são espaços conciliação social que reúnem pessoas de todos os tipos e classes sociais. A ideia era criar uma paisagem que permitisse o mesmo tipo de apropriação que uma praia, mas mesclada com um jardim. O resultado foi uma instalação que funcionava como um grande tapete laranja que se dobrava e abria furos de forma a ser tornar ao mesmo tempo piso, banco, jardim e caixa de areia. Dessa forma, diversas atividades podiam ser realizadas nessa simples estrutura. Ao mesmo tempo, sua cor forte marca sua presença no território e atrai os transeuntes curiosos.
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PARKLETS PARKLETS NOS ESTADOS UNIDOS EM OKLAND (FOTO 1), SEATLE (FOTO 2) E Sテグ FRANCISCO (FOTOS 3 E 4)
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PLAGES, SPMB
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O SISTEMA DE ÔNIBUS-BIBLIOTECA Após algumas pesquisas, conversas com funcionários do Sistema de Ônibus-Biblioteca e visita às suas instalações, pude compreender melhor seu funcionamento e tecer algumas críticas e observações que servirão de base para a formulação do projeto final. São 72 locais de parada dos ônibus, espalhados pelas regiões Norte (18), Sul (27), Leste (24) e Oeste (03). E sempre há pedido para colocação de mais Ônibus-Biblioteca. O primeiro ponto importante diz respeito ao acervo. Como ela faz parte do sistema municipal de bibliotecas, os volumes que possui são os mesmos comprados para todas as outras bibliotecas da rede, variando apenas naquilo que recebe como doação. Mesmo assim, possui uma coleção própria para circular nos ônibus, não necessitando de empréstimos de bibliotecas físicas. Por outro lado, não existe um edifício exclusivo para abrigar seu acervo e seus funcionários, que dividem provisoriamente o espaço do edifício da Biblioteca Affonso Taunay, localizado na Mooca. Trata-se de um edifício térreo e de arquitetura simples, localizado dentro de um complexo institucional que abriga outros equipamentos como postos de saúde e postos da AACD. A Biblioteca Affonso Taunay fica distante de qualquer rua, de forma que para acessá-la é necessário atravessar os portões desse complexo e caminhar até o edifício, que tem a entrada voltada para o lado oposto, dando às costas aos ingressantes. Ela não foi projetada para abrigar o sistema circulante, de forma que os funcionários e o acervo dividem todos o mesmo espaço edifício em um grande galpão separado da outra biblioteca por uma porta. Também não existe nenhum planejamento da interface do edifício com os ônibus, que para
fazerem a carga e descarga de volumes apenas permanecem estacionados à céu aberto em um pátio em frente ao galpão. O carregamento é feito de forma manual em caixotes de plástico que guardam livros previamente selecionados pelos funcionários para serem distribuídos entre os ônibus. Cada ônibus carrega cerca de quatro mil volumes entre livros, gibis, revistas e jornais. A troca de acervo ocorre de quatro em quatro meses além de eventuais reposições e complementações. Pela dificuldade de transportar computadores, todo o sistema de empréstimos é feito manualmente. Os ônibus são contratados de empresas que trabalham com o transporte público da cidade e adaptados com estantes, pintura e um toldo para servirem à nova função. Eles ficam estacionados nas próprias garagens da empresa, de forma que só utilizam a central para troca de acervo e pela manhã para pegar os funcionários responsáveis por cada ônibus. As paradas dos ônibus ocorrem em locais onde existe dificuldade de acesso ao sistema de bibliotecas, até porque possuem o mesmo acervo que as outras bibliotecas municipais e seriam pleonasmos ambulantes caso não mantivessem certa distância delas. São buscados pontos próximos a escolas e locais de passagem para outras atividades, de forma que fiquem mais próximos de possíveis usuários. Ao mesmo tempo, situam-se próximos a pequenos comércios onde os funcionários podem almoçar e à escolas públicas onde eles podem utilizar o banheiro. Esses pontos buscam ser fixos para que seja fácil encontrar os ônibus estacionados, variando suavemente a localização quando há conflitos na região. Normalmente eles se instalam em pequenas praças, por mais raras que sejam na
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BIBLIOTECA AFFONSO TAUNAY IMPLANTAÇÃO DA BIBLIOTECA AFFONSO TAUNAY NO COMPLEXO INSTITUCIONAL DA MOOCA
FOTOGRAFIAS DA BIBLIOTECA E DO PÁTIO ONDE ESTACIONAM OS ÔNIBUS
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> MAPEAMENTO DAS PARADAS DO ÔNIBUS-BIBLIOTECA O MAPEAMENTO FEITO PARA ESSA PESQUISA VISA COMPREENDER A DINÂMICA DO SISTEMA. EM VERMELHO ESTÁ A SEDE NA BIBLIOTECA AFFONSO TAUNAY, EM AMARELO ESTÃO TODAS AS PARADAS ATUAIS DOS ÔNIBUS.
RUA TAQUARI (ENTRADA DO COMPLEXO) RUA BRESSER (RUA MAIS PRÓXIMA DA BIBLIOTECA)
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periferia da cidade. Dessa forma, os ônibus-biblioteca oferecem também atividades como sarau, clown, contadores de histórias, cordelistas e teatro de rua que utilizam essas praças como palco de suas apresentações. O sistema é bastante utilizado, principalmente por crianças e jovens durante a época de aulas. Apesar de simples e com pouca infraestrutura o Sistema de Ônibus-Biblioteca se mostra um importante instrumento de combate à carência de bibliotecas da cidade. Por mais que se trate de uma solução temporária – já que o ideal é que cada bairro tenha sua própria biblioteca – ele faria bom uso de uma infraestrutura melhor elaborada que ampliasse seu potencial. Seria necessário repensar e relação do acervo fixo com o acervo circulante e o local de trabalho dos funcionários de sua central. Poderiam também ser desenvolvidos desenhos de estruturas móveis mais elaboradas que pudessem trazer em si propostas de uso diversas. As paradas também merecem atenção, pois são os portos dessas naves e poderiam dialogar melhor com elas, inclusive marcando melhor sua presença no bairro.
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HIPÓTESE DE PROJETO O Sistema de Ônibus-Biblioteca guarda um potencial enorme do ponto de vista da transformação urbana. Se houver um projeto realmente pensado para ele, podese criar um sistema não apenas de empréstimo de livros, mas também de espaços públicos em rede pela cidade. Ao mesmo tempo, um edifício sede adequado pode aprimorar seu funcionamento e contribuir com a urbanidade de seu bairro, os inúmeros pontos de parada podem se tornar pequenas intervenções locais que levam novos espaços públicos para áreas carentes da cidade. Aqui serão levantadas algumas hipóteses iniciais de projeto tanto para o edifício central do sistema como para os portos de parada e suas naves. Em uma próxima etapa elas serão desenvolvidas a nível de anteprojeto trabalhando o desenho e o funcionamento que podem toná-las viáveis.
- O EDIFÍCIO No caminho das discussões promovidas nesse trabalho, deve ser elaborado um edifício que gere urbanidade para seu entorno, contribuindo com os espaços públicos e se tornando um organizador das atividades do bairro e até mesmo da cidade. Para isso, a condição atual da central do Sistema de Ônibus-Biblioteca indica uma estratégia. Apesar de estar provisoriamente dividindo espaço com outra biblioteca, essa situação não deve ser necessariamente um problema, pode ser uma solução. Caso possuísse um edifício para uso exclusivo do controle de acervo circulante, talvez estivesse em um lugar sem utilidade para os não funcionários.
Não existiria interesse por entrar no edifício, que não precisaria ser aberto ao público. Contudo, ao possuir parte do prédio destinado ao acervo circulante e parte ao uso de biblioteca, ele tem o potencial de gerar um importante equipamento público multifuncional onde todas as atividades se complementam. Quanto a construção desse novo edifício, temos que levar em consideração alguns fatores. Se formos seguir a lógica dos CEU e das bibliotecas de Medellín, ele deveria ser implantado em uma região periférica da cidade, onde existe grande densidade populacional e a carência por espaços públicos e equipamentos de cultura é muito elevada. Contudo, devemos lembrar que sua localização não pode dizer respeito apenas a esses elementos, pois dele partem as naves para todas as regiões da cidade, de sorte que ele deve ter uma posição razoavelmente central em relação aos destinos delas. Inicialmente me ocorreu que o edifício deveria se localizar em alguma região mais central da cidade, até porque São Paulo possui diversas áreas degradadas que necessitam de recuperação muito próximas à seu centro, como é o caso do Brás e do Bom Retiro. Entretanto, após conversar com os funcionários do Ônibus-Biblioteca, descobri que grande parte dos destinos estão localizados a mais de uma hora de distância da central. Dessa forma, uma outra estratégia seria a criação de mais de uma administração, preferencialmente uma para cada região da cidade. Assim, não apenas a cidade ganharia quatro novas bibliotecas fixas como também tornaria mais eficiente esse sistema, que passaria a ter uma escala menor de administração e poderia implantar mais paradas. Considerando o tamanho da cidade de São Paulo e a demanda, essa opção se mostra muito promissora.
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EDES DO SISTEMA DE ÔNIBUS-BIBLIOTECA, HIPÓTESE MODELO ATUAL, COM UMA SEDE MAIS CENTRALIZADA NA CIDADE (ESQUERDA) HIPÓTESE DE MODELO, COM SEDES PARA CADA REGIÃO DA CIDADE (DIREITA)
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Para a próxima etapa de trabalho, a pesquisa ganhará um caráter mais prático e se focará na escolha de um terreno em alguma das quatro regiões da cidade para ser implantado um edifício sede do sistema de ônibus-biblioteca seguindo a hipótese levantada. Também será elaborado um programa para o edifício, avaliando tanto as necessidades do sistema em geral quanto da própria biblioteca e da comunidade onde se insere. Dessa forma, poderá se iniciar o processo de projeto que resultara em um modelo de aplicação dos conteúdos problematizados ao longo dessa pesquisa.
- AS NAVES E OS PORTOS A ideia de uma biblioteca itinerante é algo muito elaborado, sem dúvidas. Quando foi criada por Mário de Andrade décadas atrás, ela se utilizou da mais nova tecnologia para poder existir: o automóvel. Contudo, mais de setenta anos se passaram e pouco foi alterado em seu funcionamento, ainda se trata apenas de um ônibus adaptado para comportar estantes de livros. Isso prova que não existe uma necessidade de aplicar grandes tecnologias da modernidade nesse modelo para que ele tenha sucesso. Mesmo assim, com um bom projeto pensado para seu funcionamento, pode-se criar um sistema muito mais funcional e atraente para o uso. Isso ajudaria a disseminar a cultura dos livros para as crianças e contribuiria mais com a formação pessoal dos indivíduos, que é seu objetivo.
Para tanto, dois níveis de modificação podem contribuir com a melhoria do sistema. O primeiro é nos módulos circulantes. Apesar de funcionais do ponto de vista do deslocamento, eles deixam a desejar quando estacionados. A única entrada para seu acervo é a pequena porta do ônibus, tornando seu espaço interno apertado e pouco integrado com o exterior. Não há também uma boa infraestrutura de apoio, o que torna as atividades realizadas no ônibus bastante manuais. Por outro lado, é possível que as principais soluções estejam não nas naves, mas nos portos. São eles as componentes fixas que podem ajudar na construção de um endereço. Isso é muito importante, pois a atividade de uma biblioteca busca incentivar um hábito: a leitura. Para que isso ocorra, é necessário que se tenha essa componente estática. Assim como os monumentos são capazes de se tornarem pontos de referência no meio urbano guardando um importante significado, esses portos podem adquirir funções similares. Se existirem portos estruturados, projetados e prontos para receberem essas naves, passa a se configurar no bairro quase a presença de uma biblioteca fixa. Eles indicam que ali existe um acervo, que aquele é o lugar onde se vai para ler e aprender, por mais que esse acervo só se torne disponível em determinados dias. Mais do que isso, se as paradas dos ônibus fossem projetadas para eles, poderiam guardar elementos que contribuíssem com o funcionamento da biblioteca ambulante que não precisassem ser carregados pelas naves. Esses elementos passariam a ser parte do bairro e poderiam ajudar na requalificação de seus espaços públicos. Dessa forma tanto a biblioteca poderia propor mais atividades que se utilizassem desses recursos quanto esses portos poderiam ser muito mais utiliza-
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BIBLIOTECA CIRCULANTE ORIGINAL DE MÁRIO DE ANDRADE
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> PARADA DO ÔNIBUS FOTO TIRADA EM VISITA MOSTA A SITUAÇÃO DAS PRAÇAS QUE RECEBEM OS ÔNIBUS-BIBLIOTECA. SEM PROJETOS E SEM MANUTENÇÃO, SE TORNA MAIS DIFÍCIL E POUCO ATRAENTE O USO DESSES ESPAÇOS
> ÔNIBUS-BIBLIOTECA POR DENTRO
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< MAPEAMENTO DAS PARADAS DE ÔNIBUS-BLICLIOTECA E DOS CEU O MAPEAMENTO INDICA OS CEU EM VERMELHO E AS PARADAS DE ÔNIBUS EM AMARELO. APESAR DE PRÓXIMAS, NUNCA COINCIDEM REALMENTE
< LEITURA DAS PARADAS DO ÔNIBUS-BIBLIOTECA TRÊS PARADAS FORAM SELECIONADAS PARA ANÁLISE RÁPIDA. AS PRAÇAS SÃO USUALMENTE DO TIPO ILHA, SEMPRE RODEADAS POR RUAS (CINZA) OU MUROS (VERMELHO). ISSO JÁ INDICA UM PRIMEIRO DEFEITO DESSE MODELO.
dos mesmo quando não estiver acoplada a biblioteca. A exemplo disso podemos citar espaços de leitura, pequenos palcos e arquibancadas que podem receber apresentações de teatro, áreas cobertas de estar e até mesmo banheiros públicos e quiosques comerciais. A princípio, chegou-se a pensar em relacionar as paradas de ônibus aos CEU, já que ambos acontecem em lugares relativamente próximos, na periferia da cidade. Dessa forma, seria possível tornar os espaços dos CEU mais abertos e integrados com a cidade e os portos poderiam receber um espaço projetado mais dinâmico, dialogando com outras atividades. Foi feito um mapeamento para entender a proximidade das paradas e desses equipamentos. Ele mostrou certa proximidade, mas sempre com algum afastamento quando visualisado em escala menor. Depois da pesquisa, pode-se compreender que não é de interesse do sistema de ônibus-biblioteca essa proximidade, já que os CEU possuem biblioteca municipais com acervos muito parecidos com o do sistema. Dessa forma, será necessário pensar como tratar as paradas na situação na qual elas se encontram atualmente.
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SEGUNDA PARTE PROJETO COMO PESQUISA
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DISTRIBUIÇÃO DAS SEDES A partir dos estudos de caso realizados na primeira parte desta pesquisa e da problematização do Sistema de Ônibus-Biblioteca, foram propostos três novos edifícios sede que comporiam essa rede. Com o intuito de multiplicar tanto o número de bibliotecas públicas em áreas carentes quanto a quantidade de pontos de apoio do sistema itinerante, esses três novos edifícios devem estar sediados em áreas que facilitem a distribuição dos módulos móveis. Para tanto, foram determinados três territórios de implantação das bibliotecas que estão ao mesmo tempo próximos a áreas carentes da cidade e centrais em relação aos pontos de parada do atual Sistema de Ônibus-Biblioteca, de modo que atendem o maior número possível de paradas de ônibus em curta distância. Outro fator que contribuiu para a escolha desses territórios foi a conexão com o sistema de transporte público de grande escala da cidade, como trens e metrôs. Dessa forma, as bibliotecas, ao mesmo tempo que possuem um caráter comunitário local, podem se integrar à um sistema de rede e se tornarem importantes pontos de atração de atividades culturais de caráter metropolitano, levando mais atividades para suas regiões e promovendo um ambiente urbano mais ativo. Com isso, se configura também um sistema de centros culturais integrados, como é o caso do Sesc, no Brasil, ou dos Parques-Biblioteca de Medellín. Cada um dos três territórios de implantação está localizado em uma das regiões da cidade com mais destinos de ônibus biblioteca: sul, leste e norte. Foram determinados pontos de implantação em escala metropolitana que servem de referência para a escolha de um terreno disponível próximo, que deve estar localizado de modo a manter a lógica dessa escala metropolitana.
No modelo atual do Sistema de Ônibus-Biblioteca, com um único ponto de suporte, o edifício da biblioteca deve atender um raio de 28 kilômetros e 72 pontos de parada, com 12 ônibus partindo diariamente. No modelo proposto, esse raio cai para 12 kilômetros. Dessa forma, é possível tanto desafogar o sistema reduzindo o número de paradas atendidas por biblioteca, quanto multiplicar essas paradas e atender até 216 localidades. Sendo assim, não apenas mais bibliotecas públicas são distribuídas em áreas carentes da cidade quanto dezenas de novas regiões podem receber o acesso facilitado aos livros e à atividades ligadas a eles. Para demonstrar essa proposta, optou-se por detalhar apenas um dos edifícios de apoio. Através dele, serão estudados conceitos de relação com o entorno e de funcionamento do edifício para que se torne um local de estruturação de atividades urbanas e um ponto de atração do bairro. Através da compreensão do local e do processo de projeto do edifício, será feito um processo investigativo dos conceitos trabalhados na primeira parte do trabalho. Ao mesmo tempo, serão estudados, também em forma de projeto, três paradas do sistema móvel da biblioteca para que se compreenda melhor novas formas de relação do edifício com esses outros pontos da cidade.
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SITUAÇÃO MAPA DAS PARADAS DO ÔNIBUSBIBLIOTECA E RAIO DE ATUAÇÃO DA SEDE
PROPOSTA MAPA DAS PARADAS DO ÔNIBUSBIBLIOTECA COM RAIOS DE ATUAÇÃO DAS NOVAS SEDES
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ESCOLHA DO TERRENO Dentre os três territórios propostos, foi escolhido aprofundar o estudo do território leste. Ele apresenta diversos fatores que o tornam um espaço de reflexão e estudo importantes, que inclusive ajudam a compreender melhor o contexto da região e suas potencialidades. Lá, estão acontecendo importantes intervenções urbanas ligadas à realização da Copa do Mundo 2014, à Operação Urbana Rio Verde-Jacu e à implantação de um grande parque linear ao longo do Rio Verde que levanta inúmeras questões acerca da criação de espaços públicos e da ocupação urbana de margens de rios e córregos. A região de Itaquera é formada historicamente pela instalação de bairros caracterizados literalmente por uma condição domitória. Sendo uma região afastada e diametralmente oposta ao vetor sudoeste de São Paulo – no qual se concentram os investimentos públicos e bairros de alta renda – verifica-se na área, desde a década de 1950, a ocupação por bairros populares. Posteriormente, já na década de 1980, seria instalado neste território também os primeiros conjuntos habitacionais da COHAB, que impactariam de uma outra forma na malha que já vinha se consolidando. Ainda neste período, em 1988, chega à região a estação hoje denominada Corinthians Itaquera da linha vermelha do Metro. Isto demonstra mais uma vez a lógica de atuação urbana do Estado Patrimonialista1 que, consolidando a marginalização das populações e bairros da Zona Leste, nunca proveu grandes investimentos estruturais que favorecessem a constituição de uma cidade democrática, 1 | Termo utilizado pelo urbanista João Sette Whitaker para descrever o modelo de Estado que favorece aqueles que detêm o patrimônio financeiro.
policêntrica e dotada de um grau mínimo de urbanidade. Ao contrário disso, os investimentos foram sempre na lógica radial de proporcionar a conexão da Zona Leste ao centro, que concorda com o processo de urbanização com baixos salários, consolidando a condição dos bairros domitórios de população operária que, justamente pela situação de renda, não possuem acesso à outras localidades. Considerando essas condições de urbanização de Itaquera, observa-se a constituição de uma série de problemas socioterritoriais, dentre eles a situação de mobilidade e acessibilidade. Trata-se de uma região extremamente fragmentada, tanto pelo modelo de ocupação do solo adotado na implantação dos inúmeros conjuntos habitacionais quanto pela presença das grandes estruturas e glebas intransponíveis. Somado a isso, a forma de manipulação do relevo gerou grandes taludes e muros de arrimo que, mesmo quando não estão cercados ou murados, se tornam obstáculos à fruição urbana. Em meio a isso, a Operação Urbana e a Copa do Mundo vieram como instrumentos de alteração do território com potenciais de compensar esses equívocos passados e transformar a região para conferir maior urbanidade através da instalação de atividades, empregos e de desenho urbano adequado. Apesar disso, além de não realizarem com êxito essa transformação, podemos até mesmo considerar que em alguns aspectos ela se deu de forma ainda mais prejudicial. Como parte do Polo Institucional proposto pela Operação Urbana Rio Verde-Jacu, o Estádio de Itaquera foi construído junto com algumas intervenções urbanas pontuais. Todas as construções seguiram um modelo de ocupação do solo pautado pelas conexões automobilísticas sem considerar o pedestre como agen-
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LOCALIZAÇÃO DO TERRENO ÁREA EM ITAQUERA
LEITURA DA ÁREA TALUDES E GRANDES GLEBAS ENCONTRADAS NA REGIÃO DE ITAQUERA DIFICULTAM A MOBILIDADE EM ESCALA LOCAL.
LEITURA DA ÁREA AVENIDAS SE TORNAM BARREIRAS NA MALHA URBANA E CONJUNTOS HABITACIONAIS GERAM GRANDES TERRENOS CERCADOS QUE DIFICULTAM A MOBILIDADE EM ESCALA LOCAL.
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te urbano. Foram construídos viadutos, ruas e avenidas de difícil travessia com proporções exageradas para o pedestre. O estádio se implantou na região criando grandes muros de arrimo e taludes deixando em segundo plano os percursos peatonais. O entorno do estádio continua inabitado por outras atividades, de sorte que qualquer percurso até ele não se dá de forma natural, conectada ao tecido urbano. E mesmo o tipo de atividade trazida pela implantação desse equipamento já foi apontada por alguns urbanistas como menos potencialmente qualificadora da região do que o próprio Shopping Itaquera, que gerou empregos, comércio e lazer para o bairro – mesmo que com uma implantação urbana tão questionável quanto a do estádio. Outro projeto proposto na Operação Urbana que já foi parcialmente implantado é o Parque Linear do Rio Verde. Com o propósito de liberar as margens do rio de construções e prevenir enchentes, o projeto propõe um extenso parque que vai da região do Estádio de Itaquera até o Parque do Carmo e tem uma largura de mais de cem metros. Contudo, com a maior parte das margens do rio já ocupadas por construções, só foi possível implementar um pequeno trecho do projeto. Mesmo assim, foi necessário remover moradores da área para viabilizar sua construção. Era demanda da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente2 que o projeto 2 | A Lei Federal no12.651/12 define APP como: “II - Área de Preservação Permanente - APP: Área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. (artigo 3°, II) que é definida como “I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: a) 30 (trinta) metros, para
do parque não se pudesse ter nenhum tipo de construção numa margem de 30 metros do rio e que uma margem de 15 metros fosse reservada exclusivamente para o reflorestamento de vegetação nativa. Sendo assim, cria-se uma faixa de mais de 60 metros de largura por toda a extensão do parque onde não podem haver quaisquer tipo de construção, nem mesmo quadras esportivas, marquises, banheiros públicos ou outros equipamentos de promoção de atividade pública. É um modelo de tratamento do rio urbano que persiste na ideia de exclui-lo da vida da cidade como forma de preservá-lo. Isso gera um extenso e largo trecho que corta a cidade, mas onde atividades urbanas não podem acontecer. Dessa forma, o único trecho do parque que já foi implementado apresenta apenas um pequeno campo de futebol de terra batida, uma pequena marquise, um espaço para esqueitistas, uma ponte de pedestres, um gramado generoso e uma área arborizada. Não é possível chegar até o rio, pois ele é cercado para proteger as árvores do reflorestamento. Além disso, nem tudo que foi projetado pelos arquitetos foi realmente implementado, deixando de fora canteiros de plantas olfativas e um espaço pensado para receber crianças de escolas para atividades pedagógicas à céu aberto – programa demandado pelas próprias escolas da região. Vinculada à todas essas questões se encontra a Favela da Paz. Localizada entre o Rio Verde e o viaduto que leva os trens do metro da linha férrea ao estacionamento, ela configura uma ocupação irregular e precária. Contudo, mais de os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura (...); IV - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água, qualquer que seja a sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros”. (artigo 4°, I e IV )
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OPERAÇÃO URBANA RIO VERDE-JACU IMAGEM RETIRADA DE APRESENTAÇÃO DE SETEMBRO DE 2012 DA SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO URBANO. PERCEBE-SE UM PROPOSTA DE OCUPAÇÃO MUITO GENERALIZADA PAUTADA POR GRANDES EDIFÍCIOS SEM A PRESENÇA DE MORADIAS. O PARQUE LINEAR PODE SER VISTO À DIREITA AO LONGO DO RIO VERDE.
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> PARQUE LINEAR DO RIO VERDE IMAGENS DE APRESENTAÇÃO DO PROJETO PARA O PARQUE DO RIO VERDE E FOTOGRAFIAS DO QUE FOI IMPLEMENTADO. ACERVO DO ARQUITETO FÁBIO MARIZ.
300 famílias já habitam fixamente a área, tendo sido configurada uma comunidade que desenvolveu comércio e serviços próprios. Atualmente, ela sofre ameaça de remoção vinculada à implementação da Operação Urbana com a justificativa de estar ocupando uma área destinada à instalação de um trecho do parque linear. Com o apoio de acessórias técnicas, a comunidade do assentamento organizou um plano alternativo no qual prova que existe espaço para a implantação do parque e para a manutenção das pessoas na mesma quadra – que é composta majoritariamente por terrenos vazios ou subutilizados. Desta forma, após um longo processo investigativo de territórios de atuação, foi escolhido trabalhar em um terreno vinculado ao processo do Plano Alternativo da Favela da Paz. Essa área se mostrou muito oportuna para o estudo de implantação de um novo equipamento público. Ao mesmo tempo em que corresponde à uma região que já está sofrendo um processo de transformação, essa área permite um estudo de como o edifício pode se relacionar tanto com outros edifícios, quanto com estruturas como rios, viadutos e parques. É um terreno que sintetiza muitas das questões que se colocam na cidade em termos de dificuldade de incorporar estruturas pré-existentes à intervenções que visam trazer melhorias urbanas. Além disso, é uma área que já foi estudada antes, de sorte que apresenta uma base de trabalho rica.
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ENTENDENDO O CONTEXTO URBANO DA PERIFERIA A busca por um terreno para a implantação do edifício da biblioteca foi verdadeiramente complexa e reveladora. Segundo a discussão proposta pela pesquisa, o objetivo inicial era compreender como o desenho do edifício de equipamento público pode promover uma boa relação com o ambiente urbano e, por consequência, proporcionar um ambiente urbanisticamente bem resolvido. Contudo, durante o processo de levantamento de terrenos que poderiam servir de base para esse estudo, inúmeros outros fatores foram sendo revelados e novas problemáticas surgiram. Do modo como a pesquisa se encaminhou, o terreno de implantação do edifício deveria se localizar na periferia da cidade, próximo aos destinos finais do ônibus-biblioteca e atendendo a uma carência dessa região tanto por equipamentos públicos quanto por arquitetura de qualidade. Muitas opções foram levantadas, e diversos tecidos urbanos da periferia foram considerados. Dentre eles, destacaram-se assentamentos precários, grandes vazios urbanos, bairros residenciais autoconstruídos e tecidos completamente formados por conjuntos habitacionais de interesse social. Nesses tipos de tecido é difícil afirmar que um edifício consiga, sozinho, trazer uma alteração da dinâmica urbana. A periferia paulista é muito fragmentada e apresenta tecidos muito pouco consolidados. Diferente de áreas centrais de grande parte das cidades, onde existe certo grau de coesão urbana, a periferia de São Paulo apresenta níveis muito diversos de fragilidade urbanística. Essa característica não está em fatores pontuais, mas sim no conjunto de sua lógica urbana. Nas avenidas principais, onde deveria existir maior número de atividades
e de interesse pela cidade, é onde menos se encontra espaço para interações no nível do pedestre. São áreas pensadas exclusivamente para o automóvel que, por causa disso, tem em suas margens grandes vazios urbanos, galpões (muitas vezes abandonados) ou edifícios monofuncionais de maior porte que não visam se relacionar com o arredor – como hipermercados e grandes lojas. Isso torna essas importantes artérias de conexão fortes barreiras urbanas. O ambiente residencial autoconstruído é o predominante. Ele é configurado basicamente por casas em modelos muito similares construídas em uma lógica urbana de loteamento. A ausência de desenho urbano e a presença maciça de muros e grades como elemento de interface entre espaço público e privado faz com que seja gerado um ambiente onde o desenho da rua enquanto espaço livre passa a ser resíduo da solução interna dos lotes. Nada se conecta com o passeio público se não portas de garagens. Os moradores acabam por modificar esses passeios de modo negativo ao adapta-lo para uso próprio, criando desníveis sequenciais para facilitar o acesso do automóvel à garagem. A monofuncionalidade das ruas, vinculada a condição dessas calçadas irregulares, estreitas e ocupadas por postes e árvores promove a não fruição do espaço público e constrói uma urbanidade deficiente, constantemente interrompida por terrenos vazios de grande porte. Em meio a essa situação, pousam grandes conjuntos habitacionais. Desvinculados de qualquer relação com o tecido existente, esses conjuntos apresentam tipologias repetidas que se isolam do contato com a rua, criando uma interface de muros ainda pior do que o das casas autoconstruídas e reforçando a monofuncionalidade dos bairros e a necessidade de deslocamentos através de veículos. São
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AVENIDAS PRINCIPAIS IMAGENS DA AVENIDA ARICANDUVA NA ZONA LESTE DE SÃO PAULO MOSTRAM A LOGICA DE OCUPAÇÃO DOS EIXOS DE MOBILIDADE NA PERIFERIA PAULISTA, ONDE NÃO EXISTE VIDA NA ESCALA DO PEDESTRE.
AMBIENTE RESIDENCIAL AUTOCONTRUÍDO IMAGENS DA VILA RIO BRANCO NA ZONA LESTE DE SÃO PAULO MOSTRAM A FORMA TÍPICA DA PERIFERIA PAULISTA FORMADA POR CASAS.
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ambientes onde a escala do pedestre não está pensada em nível urbano, pois as quadras são muito extensas e os edifícios isolados em condomínios. Por fim, os assentamentos precários parecem ser os mais bem sucedidos nesse meio. Apesar da fragilidade das construções e das péssimas condições de habitabilidade de muitas das casas, o microambiente urbano dessas áreas é mais coeso e interessante que o resto. Coeso porque apresenta uma relação das construções com os espaços livres muito mais forte, uma mistura de usos muito rica e um sentimento de comunidade muito mais intenso. Interessante porque os espaços livres se desenham à partir das edificações e ganham múltiplas formas, como vielas de pedestres, pequenos largos e até mesmo praças, todos conectados a usos diversos. Contudo, a ocupação do solo nessas áreas é muito alta e as precariedade das construções é um problema crônico. Dessa forma, em qualquer que seja o terreno de implantação de um equipamento público na periferia, o desafio de criar urbanidade se mostra muito mais complexo do que o de desenhar o edifício. O ambiente do assentamento precário provavelmente é onde um equipamento público mais poderia se integrar à urbanidade existente. De todo modo, a falta de espaço livre nessa área impossibilita que isso aconteça sem a necessidade de remoção de parte das construções. Já nos outros ambientes, onde há terrenos vagos para implantação de edifícios, a manutenção de seus parâmetros urbanos pode fazer com que o equipamento público seja implantado de forma muito desconexa, e se torne mais um grande edifício isolado da dinâmica urbana – principalmente no nível do pedestre. Com isso em vista, é possível observar que grande parte dos edifícios de
equipamento público da periferia paulista não obtiveram sucesso em criar urbanidade para a cidade, pois estão inseridos na mesma lógica não urbana dessa região. Ao implantar edifícios que teoricamente possuem potencial de transformação urbana sem alterar essa lógica de funcionamento da cidade suburbana, eles aterrissam como naves e essa força se dissolve. É importante destacar que grande parte dos edifícios possui um desenho padronizado que é repetido em vários pontos da cidade com poucas alterações e isso torna sua implantação ainda mais distante de uma capacidade de diálogo efetivo com o território e, portanto, de alteração do mesmo. A arquitetura desses equipamentos muitas vezes acaba nem se propondo a alterar a lógica de isolamento do edifício no terreno, o que, aliado à gestão, resulta em prédios cercados por muros resolvidos dentro de seu lote. Por outro lado, não é possível saber se a alteração do desenho desses edifícios, visando uma interação mais intensa com o espaço público e propondo um desenho do espaço livre teria sucesso sem a alteração geral de parâmetros urbanos que predominam na periferia. Parece pouco provável que edifícios bem desenhados em meio a um ambiente tão fragmentado possam trazer coesão urbana para o território, até mesmo porque parte do que qualifica o desenho arquitetônico é sua relação com o território. Ao observarmos os edifícios que mais contribuem com a urbanidade da cidade em outras áreas de São Paulo, podemos levantar alguns parâmetros de comparação com a periferia. No caso do Conjunto Nacional, por exemplo, vemos um edifício que possui um embasamento que ativa fortemente a rua. Acompa-
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ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS A IMAGEM DE CIMA MOSTRA A FAVELA DE PARAISÓPOLIS EM SÃO PAULO, ENQUANTO A DE BAIXO MOSTRA O CENTRO DE MADRID. ESSA COMPARAÇÃO FOI FEITA PARA MOSTRAR COMO EM AMBAS AS SITUAÇÕES O ESPAÇO PÚBLICO É COMFORMADO PELOS EDIFÍCIOS.
CONJUNTOS HABITACIONAIS AS IMAGENS DE CIDADE TIRADENTES, NA ZONA LESTE DE SÃO PAULO, MOSTRAM COMO O AMBIENTE CONSTITUÍDO INTEIRAMENTE POR CONJUNTOS HABITACIONAIS GERA UMA PAISAGEM MONÓTONA E FRAGMENTADA, COM UM ESAÇO PÚBLICO INDEFINIDO.
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nhando o passeio público em todos os lados da quadra, proporcionando novos percursos e um interesse por adentrar o edifício, o projeto cria um foco muito importante de atividades no espaço público. Além disso, detalhes como uma marquise que protege o pedestre das intempéries e um desenho de piso que continua da calçada para o interior do edifício ajudam a construir um ambiente qualificado que atrai usuários. Entretanto, não é possível dizer que o desenho do Conjunto Nacional teria a mesma força se o edifício não estivesse localizado na Avenida Paulista, em uma das esquinas de maior atividade da cidade. Ao mesmo tempo em que ajuda a construir esse ambiente urbano ímpar em São Paulo, ele se beneficia fortemente dele. Não existiria interesse em cruzar a quadra pelo interior do edifício se a quadra oposta não oferecesse diversos outros atrativos (habitação, comércio, serviços, etc). Também não seria tão significativo o fato de a marquise criar uma proteção na calçada, se na Avenida Paulista não passassem pessoas à pé naturalmente. A periferia apresenta um ambiente verdadeiramente diferente. A dinâmica urbana dessas regiões não funciona da mesma forma que nas áreas centrais, em parte pela carência de edifícios que busquem se relacionar com o espaço público, em parte por uma conjuntura urbana mais complexa que envolve questões históricas de formação socioespacial. As figuras ao lado ajudam a evidenciar a configuração urbana da região que será trabalhada. Nelas, pode ser visto todo o entorno da estação Corinthians Itaquera da linha vermelha do metrô. Trata-se da área destinada a um futuro polo institucional segundo a Operação Urbana Rio Verde-Jacu. Atualmente, já foi
implementado uma nova arena de futebol na área, bem como o já existente shopping Itaquera, um Poupa Tempo projetado por Paulo Mendes da Rocha e uma Fatec. Com o mapa de negativo dos espaços livres é possível compreender os problemas da distribuição espacial de território. É visível o enorme rasgo na costura urbana da região no entorno direto da estação de metrô – uma área de mais de 1500 metros de uma ponta a outra. Nessa área não existem construções que não as já apontadas e o espaço livre é completamente indefinido, sendo composto por ruas, rotatórias e grandes áreas cercadas de posse privada e do Estado. A ausência de edifícios habitacionais na região é um dos elementos de maior fragmentação do espaço. Sem pessoas morando na região, não existe atividade naturalmente nessa imensa área. Ao mesmo tempo, não existem percursos típicos de uma cidade a serem feitos. Nenhum transeunte encontra em seu percurso comércios, praças, pessoas varrendo a calçada ou passeando seu cachorro. Isso pode parecer supérfluo, mas é o que torna um aglomerado de construções uma cidade. Sem essas atividades o espaço se torna hostil até mesmo perigoso. Não existe respeito ao pedestre, já que se instaura um modelo de deslocamento pensado exclusivamente para o automóvel e os crimes ganham a liberdade de não estarem sendo vistos por terceiros. Para Jane Jacobs, a questão da plurifuncionalidade dos bairros é essencial para garantir uma boa cidade: “... O distrito, e sem dúvida o maior número de segmentos que o compõe, deve atender a mais de uma função principal; de preferência, a mais de duas. Estas devem garantir a presença de pessoas que saiam de casa em
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COMFIGURAÇÃO ESPACIAL DE ITAQUERA AO COMPARARMOS A FOTOGRAFIA DE SATÉLITE DE ITAQUERA COM A IMAGEM DE FIGURAFUNDO DOS EDIFÍCIOS, PERCEBEMOS COMO O ESPAÇO LIVRE É INDEFINIDO E DESFRAGMENTADO E FICA EVIDENTE O GRANDE VAZIO URBANO DESSA REGIÃO.
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horários diferentes e estejam nos lugares por motivos diferentes, mas sejam capazes de utilizar boa parte da infraestrutura” 3 Contudo, essa monofuncionalidade não se encontra apenas nesse grande vazio urbano. Logo à oeste podemos identificar outro grande trecho urbano que se conforma por uma imensa quantidade de conjuntos habitacionais destinados à famílias de baixa renda. Ao mesmo tempo em que as atividades não residenciais são muito pontuais nessa área – conformadas em sua maioria escolas, postos policiais e outros equipamentos públicos básicos – os espaços públicos da região claramente não está configurada através de desenho urbano. Todos os edifícios estão implantados no modelo de lote onde se resolvem dentro de suas grades e muros. O espaço público é resultado de um processo de parcelamento do solo e se torna indefinido e hostil. Os edifícios são implantados como se não houvesse entorno, de sorte que sua forma independe de sua localização. Ele se torna um carimbo, não uma construção urbana. O restante da região é configurado basicamente por casas autoconstruídas dentro de seus lotes. Configuram o espaço público melhor do que a situação anterior, pois sua proximidade e afastamento do leito carroçável razoavelmente semelhante (por consequência de uma aproveitamento melhor do terreno pelo morador e não por demanda do poder público) conseguem definir os quarteirões e desenhar melhor a rua. Mesmo assim, ainda são construídos no sentido de buscar 3 | JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. 1ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
se afastar da vida coletiva e criam uma interface agressiva com o espaço público, configurada por portões e grades. A monofuncionalidade também impera nesses bairros, muitas vezes por conta das próprias leis que criam os zoneamentos exclusivamente residenciais. Atividades comerciais surgem num modelo informal, nas próprias casas. É a cidade que tenta acontecer da forma que naturalmente existe desde a Idade Média. Finalmente, o que vemos é um espaço público esquecido, tratado em terceiro plano. Uma incapacidade de unir equipamentos públicos e infraestrutura ao planejamento dos espaços livres públicos, de sorte que cada um é feito separadamente, como se assim pudesse ser. Vemos esquecido um conceito essencial à vida humana sobre o qual a filósofa Hannah Arendt se debruçou em grande parte de sua carreira. Ela define o homem dentro de três grupos de atividades que ele realiza por natureza. Aquele que chama de “ação” só pode ocorrer no espaço público, espaço de aparência, onde o homem aparece diante do coletivo e com ele pode se relacionar. Pois no isolamento, as ações do ser humano nada significam, é em público que elas passam a existir. E este espaço deveria ser projetado e assegurado em uma estrutura que garantisse que todas as ações subsequentes do homem pudessem acontecer.
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O DESENHO DA CIDADE POR LÉON KRIER DESENHOS RETIRADOS DO LIVRO DRAWING FOR ARCHITECTURE DO URBANISTA EUROPEU LÉON KRIER. ATRAVÉS DE ESBOÇOS ELE CRITICA A FORMA URBANA DA PERIFERIA NA QUAL OS ESPAÇOS LIVRES NÃO SÃO CONFIGURADOS PELOS EDIFÍCIO, FICANDO DESTINADOS AO QUE SOBRA DO DESENHO DELES. TAMBÉM IRONIZA A MONOFUNCIONALIDADE DO SUBÚRBIO, DEMONSTRANDO SUA ETERNA DEPENDÊNCIA DO CENTRO E PROPONDO OUTRO MODELO DE CRESCIMENTO URBANO.
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ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO O terreno escolhido inicialmente para a implantação do edifício da biblioteca foi resultado de uma leitura do Plano Alternativo da Comunidade da Paz. Ele porpõe a remoção parcial das famílias do assentamento precário para que sejam realocadas em edifícios nos terrenos vizinhos, que não servem a qualquer função social do solo atualmente. Dessa forma, se libera um trecho da margem do Rio Verde para que seja incorporado ao parque linear e um trecho ao longo do viaduto do metro para que seja aberta uma rua. Sendo assim, restaria ainda um generoso terreno vazio onde nada está proposto. Dessa forma, imaginou-se que essa gleba pudesse se tornar a biblioteca, que poderia então fazer o elo de ligação de diferentes espaços públicos – o parque, o rio e a avenida – e atividades urbanas que acontecem na favela e nos novos edifícios. Contudo, após diferentes tentativas de transformar essa proposta em projeto, ficou claro que não seria essa a solução. Optar por trabalhar na lógica onde a favela permanece de modo parcial e não se sabe a configuração urbana do arredor tornaria a biblioteca mais um edifício pensado numa lógica de isolamento da cidade. Por mais que se propusesse um edifício conectado à rua e que trabalhasse o controle de entrada para permitir uma melhor interface com o espaço público, não seria possível configurar uma situação urbana completa sem considerar o entorno construído. A gleba a ser trabalhada possuía dimensões muito grandes e não seria possível utilizar seu espaço livre para configurar espaços públicos sem saber como eles se relacionariam com o entorno imediato. O projeto do edifício não basta para isso, é necessário que parta de um projeto urbano definido anterior ou concomitantemente.
Assim, ficou estabelecido que seria trabalhada toda a quadra da gleba enquanto unidade territorial urbana. Como ela é inteiramente configurada por grandes terrenos vazios – além do assentamento precário – e já existe uma proposta de alteração do modelo de ocupação tanto por parte do Plano Alternativo da Comunidade da Paz quanto pela Operação Urbana Rio Verde-Jacu, foi considerado que alterar seus parâmetros urbanos não seria irreal. A escolha da quadra enquanto unidade territorial permite pensar um trecho de cidade relevante o suficiente para configurar seus próprios espaços e indicar possíveis configurações urbanas mais gerais. Ao mesmo tempo, isso não significa projetar todos os edifícios da quadra, mas sim os espaços livres públicos. Trata-se de colocar o projeto urbano acima do projeto arquitetônico, o espaço público acima do privado. Desse modo, não se visa definir a forma dos edifícios, mas sim o tipo de relação que possuem entre si e com a cidade, bem como as funções que oferecem à ela. Essa estratégia permite que se defina um modelo de ocupação para essa unidade territorial que pode se dar tanto através da intervenção estatal quanto do processo natural de construção da cidade. O terreno ainda pode ser comercializado e construído por investidores privados, desde que seguindo o desenho urbano pré-estabelecido. O único projeto de edifício que cabe se definir nesses parâmetros é o da própria biblioteca. Entretanto, com essa nova configuração urbana se torna possível propor soluções físicas ao edifício que se relacionem com o seu entorno e possam configurar os espaços livres públicos e sua hierarquia.
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ÁREA DE INTERVENÇÃO AS FOTOGRAFIAS DE SATÉLITE DA ÁREA DE 2000 E 2014 PERMITEM VER O CRECIMENTO PARA DA FAVELA DA PAZ E A IMPLANTAÇÃO DO PRIMEIRO TRECHO DO PARQUE LINEAR AO NORTE.
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O EDIFÍCIO COMO ARTICULADOR DA URBANIDADE | NICOLAS LE ROUX PLANO ALTERNATIVO DA COMUNIDADE DA PAZ AS IMAGENS CRIADAS PELA ACESSORIA TÉCNICA PEABIRU MOSTRAM DE FORMA GERAL A PROPOSTA DE MANUTENÇÃO DAS FAMÍLIAS DA FAVELA DA PAZ NA MESMA GLEBA, LIBERANDO ESPAÇO AO LONGO DO RIO E DO VIADUTO DO METRÔ.
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> LEITURA DO ENTORNO LEITURA DO ENTORNO FEITA PARA O PLANO ALTERNATIVO DA COMUNIDADE DA PAZ. EXISTEM DIVERSOS EQUIPAMENTOS PÚBLICOSSÃO LOCALIZADOS, A MAIORIA DELES DE NECESSIDADE BÁSICA, POUCOS ESTÃO A MENOS DE 1KM DO TERRENO E NÃO HÁ EQUIPAMENTOS DE CULTURA NA REGIÃO.
A QUADRA ENQUANTO UNIDADE TERRITORIAL “[...] Aqui a tela de fundo é a metrópole da informação que está explodindo, um sistema de redes visíveis e invisíveis que está pondo por terra velhas definições de campo e cidade, e que está exigindo uma nova escala de pensamento que se localize em algum lugar entre arquitetura, urbanismo, paisagismo e planejamento territorial.” 4 Um longo processo de projeto levou ao desenho final do que seria a configuração urbana da quadra. Alguns princípios básicos serviram de plataforma para o início do desenho. Primeiramente, a quadra, que tem mais de 300 metros de comprimento, deveria ser mais permeável e possibilitar novos fluxos e possibilidades de encontro. Em segundo lugar, os edifícios deveriam desenhar os espaços públicos, de sorte que seriam definidos primeiros estes espaços e as construções surgiriam de seu negativo. Por fim, era pressuposto que diversas atividades se acomodassem nos edifícios. Deve haver habitações suficientes para que no mínimo se mantenha a população local, mas é desejável que se aumente em número as unidades para que se alcance uma densidade urbana capaz de gerar mais atividade na rua. Isso dependerá tanto do destino que se der para cada edifício quando do projeto dele, que será mais ou menos eficiente em balancear as dimensões das moradias e número de apartamentos. Também é necessário que se crie atividades mescladas nestes edifícios, como comércio e serviços, que devem estar de preferência no térreo. 4 | CURTIS, William J. R. Arquitetura moderna desde 1900. 3ª edição. Porto Alegre: Bookman, 2008
Mas a forma como isso se dá também cabe ao projeto individual de cada situação. Desse modo, o volume sugerido no projeto urbano não corresponde a forma final dos edifícios, somente ao seu alinhamento com a rua. Cada solução arquitetônica possibilitará um desenho diferente para cada edifício, que corresponderá também às soluções internas de organização do espaço privado. Alguns edifícios terão apenas cinco andares, para que possam servir à habitação de interesse social sem a necessidade de elevadores. Outros poderão ser mais altos, mesclando diferentes públicos e usos, desde que evitem um sombreamento exagerado de seus vizinhos. É desejável que edifícios mais altos se concentrem próximos à espaços livres maiores como avenidas ou largos. Sendo assim, o alinhamento do edifício com o espaço público se torna talvez o mais importante fator de definição deste. É esse alinhamento que permite também que se crie uma hierarquização dos espaços. Nas avenidas mais movimentadas foi definido um alinhamento a 10 metros do leito carroçável, deixando um largo passeio público que possa comportar o fluxo de pessoas e de atividades. Nos eixos menores esse alinhamento se altera, a as dimensões do passeio se adequam ao caráter do espaço. Dessa forma também é possível definir mais claramente as clareiras urbanas: as praças. Quando conformadas pelo edifício elas são mais facilmente interpretáveis e seu espaço ganha forma. As atividades dos edifícios podem se misturar às da praça e o espaço público e o privado passam a trabalhar numa relação de mutualismo onde um se beneficia do outro e vice-versa. Apesar de ter um formato razoavelmente regular, a quadra é cortada pelo rio e pelo viaduto, o que torna mais difícil uma organização reticular dos edifícios.
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LEITURA DOS ESPAÇOS LIVRES A COMPARAÇÃO ENTRE AS DUAS IMAGENS PERMITE OBSERVAR COMO OS ESPAÇOS LIVRES SÃO INDEFINIDOS NO ESTORNO DO TERRENO DE ESTUDO. SEM A PRESENÇA DAS RUAS NÃO É POSSÍVEL IDENTIFICAR A FORMA DAS QUADRAS NEM OS ESPAÇOS PÚBLICOS.
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MOBILIDADE O MAPA INDICA OS PONTOS DE ÔNIBUS E AS RUAS. AS FOTOS INDICAM O CARÁTER DAS AVENIDAS LINDEIRAS AO TERRENO.AO MESMO TEMPO EM QUE EXISTEM POUCAS RUAS, ELAS SÃO LADEADAS POR GRANDES MUROS, CERCAS E TALUDES.
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Esses elementos quebram a ortogonalidade da quadra e criam a necessidade de certo afastamento de construções em relação à eles. Para evitar que se que se gerem edifícios muito isolados da trama urbana entre essas duas estruturas e também para que esse espaço não se torne um grande vazio que perde a definição, foi decidido que a biblioteca seria implantada entre o viaduto e o rio. Dessa forma, o desenho mais orgânico do equipamento público poderia se acomodar à topografia e ao terreno e suas atividades públicas poderiam servir de elo entre essas infraestruturas e as atividades urbanas. Ao mesmo tempo, para que fosse possível viabilizar esse desenho, se tornou necessário definir o traçado as margens do rio. Diferente do que se propõe na legislação atual, foi decidido que as margens poderiam ter ocupações, desde que respeitassem conceitos de permeabilidade do solo e criação de espaço público ao longo das margens, mantendo a ideia de parque linear. Para incorporar o rio à dinâmica urbana, ele não pode ficar isolado das atividades da cidade. É necessário, então, implementar passeios pavimentados, travessias e até mesmo edifícios próximos à ele. Caso contrário, esse curso d’água corre o risco de se tornar mais uma barreira na já truncada malha urbana da cidade. Assim como se faz em cidades como Amsterdã, Paris, Seul e muitas outras, os rios urbanos devem fazer parte do espaço público e trabalhar como compositores da vida urbana. É importante ter em mente que tornar as margens dos rios permeáveis não é apenas deixa-las livres de construção, mas também investir na captação de águas pluviais em um sistema secundário, exigir que os edifícios tenham captação e armazenamento de águas e trabalhar com canteiros e pavimentação que permitam a infiltração da água no solo.
Como a biblioteca foi projetada em junto com esse espaço, se tornou possível vincular o desenho do edifício, o paisagismo e o desenho urbano. Essa combinação trouxe soluções mais ricas tanto para o edifício quanto para a configuração do espaço público. Sendo feitos separadamente ainda seria possível elaborar meios da margem do rio ganhar forma e do edifício desenhar o espaço público, mas com a oportunidade de se projetar tudo de uma vez, foi possível enriquecer esse processo. O mesmo aconteceu com o viaduto. Por ser muito elevado, ele não configura um espaço opressivo no seu baixio, contudo, exige certo afastamento para que não se torne uma estrutura agressiva. O projeto da biblioteca conseguiu permitir que o desenho urbano definisse uma massa edificada distante do viaduto e configurasse uma nova praça conectada à malha urbana.
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RIOS URBANOS EM OUTRAS CIDADES CANAL EM AMSTERDÃ E RIO SENA EM PARIS
RIO CHEONGGYECHEON EM SEOUL
TRATAMENTO DOS RIOS EM SÃO PAULO RIO VERDE, ÁREA DE PROTEÇÃO PERMANENTE
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> DESENHO GERAL RESULTANTE DA QUADRA PLANO DE MASSAS RESULTANTE DO DESENHO URBANO.
PROCESSO DE PROJETO ALGUNS DOS ESBOÇOS FEITOS PARA O DESENHO URBANO DA QUADRA.
SITUAÇÃO ATUAL IMAGEM PARA COMPARAÇÃO.
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A BIBLIOTECA
TERRENO DE ESTUDO SITUAÇÃO E PROPOSTA
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> PLANA NÍVEL CAIS ENTREDA PRINCIPAL, BANHEIROS, DEPÓSITO DE LIVROS, ADMINISTRAÇÃO E ÁREA DE CARGA E DESCARGA.
PLANA NÍVEL SUPERIOR BIBLIOTECA, ÁREA INFANTIL, AUDITÓRIO, SALAS DE ATIVIDADES, SALA DE INFORMÁTICA, CAFÉ-LIVRARIA E CENTRO DE REFERÊNCIA URBANA.
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CORTE LONGITUDINAL DO EDIFÍCIO O SALÃO MULTIUSO CONECTA DOS EDIFÍCIOS POR BAIXO E A PRAÇA OS CONECTA POR CIMA.
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CORTE DO RIO VERDE É POSSÍVEL VER A RELAÇÃO DO CAIS COM A ENTRADA DO EDIFÍCIO E A SUCESSÃO DE PRAÇAS ESCALONADAS
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< ESPACO CULTURAL VISTA AÉREA DO EDIFÍCIO SEM COBERTURA
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> BIBLIOTECA VISTA AÉREA DO EDIFÍCIO SEM COBERTURA
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– PROGRAMA – O programa proposto tem por objetivo tornar a biblioteca mais do que apenas um edifício de armazenamento e disponibilização de livros. Ele visa torna-la um complexo de atividades culturais maior capaz de gerar um espaço de congregação comunitária e de oferecimento de serviços. Ao mesmo tempo, ele é o primeiro passo para tornar o edifício mais conectado ao cotidiano do bairro e mais diverso em atividades para que possa se tornar mais atrativo e, portanto, mais relevante na dinâmica urbana. Mais uma vez surge a ideia do mutualismo, onde as atividades presentes no edifício se beneficiam e dão benefícios umas às outras, tornando-o mais frequentado e incentivando que todas as atividades culturais que oferece façam parte da vida de seus usuários. Dentre os programas mais específicos se destacam o Centro de Referência Urbana, a área infantil da biblioteca, a lanchonete e os espaços de estudo. O primeiro deles é talvez o que mais chama a atenção, pois é um programa inexistente em equipamentos públicos brasileiros. Assim como na Midiateca de Toulouse, estudada na primeira parte deste trabalho, foi proposto que se incorporasse às três sedes deste sistema de bibliotecas essa nova função. Este espaço tem como proposta se tornar um centro de politização da população através do contato com as políticas urbanas e da exposição das principais intervenções em processo de implementação na cidade. Trata-se de uma forma de aproximar a população das reformas urbanas de uma forma mais pedagógica e direta, que permita uma melhor compreensão de conceitos urbanos e de formas de participação popular na política. Pretende-se, com isso, que o sistema de bibliotecas que busca se relacionar com o espaço público também instrua as pessoas sobre
ele e sirva de plataforma de discussão da cidade que dê à população uma outra noção de urbanidade. Nesse mesmo sentido, foram propostos também espaços de congregação, onde a população pudesse se reunir para discutir questões que lhes interessasse. O próprio processo de elaboração do Plano Alternativo da Favela da Paz passou por grandes dificuldades pela ausência de estruturas que comportassem uma reunião da comunidade, que teve que ser feita na casa de pessoas e em comércios locais. Sendo assim, o edifício da biblioteca traz a possibilidade de viabilizar este espaço através de um novo auditório. Ao mesmo tempo que serve como estrutura para acontecimentos culturais, ele também pode ser uma estrutura de apoio à comunidade local em momentos de reunião. Por isso, o programa da biblioteca contou com um auditório de mais de 300 lugares, além de um segundo anfiteatro a céu aberto que foi possibilitado posteriormente durante o processo de projeto. O espaço infantil da biblioteca tem como objetivo mais do que apenas fornecer livros para crianças, mas também oferecer estrutura para que as mães possam deixar seus filhos no local durante um período do dia enquanto não podem ficar com eles. Para isso, o espaço também deve oferecer entretenimento relacionado ao ensino para as crianças, como contação de histórias, exibição de filmes, peças infantis, etc. Desse forma, pode ser criada uma estrutura que possibilita que as mães possam se dedicar a afazeres próprios sem ter que se preocupar com a segurança dos filhos ou ter que deixar de fazer essas coisas por conta disso. Ao mesmo tempo, tem-se uma estrutura de apoio ao ensino e uma alternativa de atividade para as crianças do bairro.
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PROGRAMA DO EDIFÍCIO
NÍVEL DO CAIS DEPÓSITO DE LIVROS ESCRITÓRIOS ADMINISTRATIVOS ÁREA DE CARGA E DESCARGA ESPAÇO MULTIUSO E DE ESTUDOS BANHEIROS ÁREA TÉCNICA
NÍVEL DA PRAÇA ACERVO LIVROS, PERIÓDICOS E MÍDIA ACERVO INFANTIL E ESPAÇO DA CRIANÇA ESPAÇO MULTIUSO E DE ESTUDOS AUDITÓRIO CAFÉ E LIVRARIA SALAS DE ATIVIDADES ESPAÇO DE INFORMÁTICA CENTRO DE REFERÊNCIA URBANA
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A presença de espaços de estudo e reunião também é um elemento importante. Foi a forma encontrada para dar suporte adicional ao estudo e ao trabalho. Através destes espaços espera-se que as pessoas encontrem um local confortável e apropriado para se dedicar a atividades acadêmicas e mesmo de trabalho. Muitos não encontram estes espaços dentro de suas casas e isso pode tanto dificultar que jovens e crianças se interessem pelo estudo quanto impossibilitar que profissionais fornecedores de serviços específicos possam se encontrar com clientes. Assim, está proposto que estes locais de encontro e concentração estejam espalhados pelo edifício e ganhem diferentes formas ligados ao acervo da biblioteca, à espaços multiuso e à áreas específicas de trabalho. Por fim, a presença da lanchonete se torna essencial para a vitalidade do edifício. A presença de um comércio que qualifica também um local de encontro atrai pessoas para o uso das instalações. Ao mesmo tempo, este é o suporte que permite que os usuários passem mais tempo no edifício, já que encontram um local para comer e fazer pausas das atividades. Esse comércio pode também dividir espaço com uma pequena livraria, onde a comunidade pode comprar livros novos e usados da biblioteca, tornando-se mais um instrumento de incentivo à leitura. Mais uma vez, a multiplicidade de funções do edifício é vital para a construção de uma estrutura urbana ativa e dinâmica.
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ESPAÇOS MULTIUSO O SALÃO MULTIUSO NO NÍVEL DO CAIS CONECTA OS DOIS EDIFÍCIOS (IMAGEM DE CIMA); SALÃO MULTIUSO DÁ ACESSO À DIVERSAS ATIVIDADES DO EDIFÍCIO CULTURAL (IMAGEM DE BAIXO).
BIBLIOTECA A RECEPÇÃO DA BIBLIOTECA MANTÉM O MESMO PISO DA PRAÇA (IMAGEM DE CIMA); O MESANINO DA BIBLIOTECA GUARDA O ACERVO DE MÍDIA (IMAGEM DE BAIXO).
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– RELAÇÃO COM O ENTORNO IMEDIATO – Uma das principais estratégias para projetar o edifício da biblioteca de modo a torna-la mais conectada à cidade e à dinâmica urbana foi buscar uma forte relação com o entorno natural e construído. Eram muito diversos os elementos que se colocavam como desafios nessa busca. O rio tornava necessário que a biblioteca se abrisse para a margem e trabalhasse uma reação de simbiose com ela, evitando dar as costas à este espaço para que não se tornasse mais uma vez os fundos da cidade. O viaduto do metro, por outro lado, é uma estrutura pesada e potencialmente agressiva, de modo que se não fosse incorporado ao desenho do edifício, poderia se manter como um elemento de ruptura do espaço público. O trecho de parque já implementado configura um grande espaço livre pouco definido e desconectado de atividades urbanas relevantes, de sorte que cabe à biblioteca conseguir se tornar um elemento de articulação deste espaço com os demais espaços livres, como a margem do rio e a praça em frente ao viaduto. Por fim, o último elemento é o relevo. Estando localizada às margens do rio, a biblioteca se encontra no pondo de maior desnível da quadra. Mesmo não sendo muito acentuado – sete metros do nível d’água até a praça – o relevo não poderia ser tratado com muros de arrimo e taludes desconectados do edifício. Deste modo, cabe ao projeto do edifício trabalhar também o projeto da paisagem e, por consequência, do relevo. Foi através da inserção no relevo que a biblioteca pode criar uma forte conexão entre o cais do rio e a grande praça em frente ao viaduto do metro. Ao trabalhar a topografia, foi possível criar duas frentes para o edifício, uma voltada para o rio, outra voltada para a praça. Assim, ela pode tornar as duas áreas mais ativas, além de criar novas formas de vencer os desníveis ao permitir esse deslo-
camento se dê através de suas áreas internas. Para conectar estes dois espaços, foi criada uma praça central de dois níveis entre os dois blocos principais que compõe a biblioteca. Os níveis são conectados por uma grande escadaria em forma de anfiteatro que também dá acesso a um salão interno que liga os dois blocos e se localiza sob a praça superior. Essa estratégia permitiu criar um espaço de alargamento para a margem do rio onde atividades diversas podem tomar lugar. Este local também se torna a cabeceira de uma ponte onde de pedestres que cruza o rio mirando a biblioteca em perspectiva desde o outro lado, efeito reforçado pelos edifícios vizinhos que definem o espaço do passeio peatonal que leva à travessia. A grade escadaria permite que este espaço se torne um ambiente também de contemplação e de realização de apresentações, multiplicando suas possibilidades de uso. Com piso em madeira e espelho de vidro, a escadaria se torna uma grande janela para o salão da biblioteca e permite uma conexão visual entre o espaço interno e o externo. Essa estrutura também dá acesso ao nível superior da praça, que se conecta com a grande praça do viaduto, mas ganha uma outra escala conferida pela implantação do edifício. Para possibilitar uma definição melhor dos espaços livres criados ao redor do viaduto, optou-se por explorar a forma dessa estrutura. Pela altura deste elevado (25 metros) e pela presença de apenas quatro colunas em toda a quadra, mesmo possuindo um grande impacto visual na paisagem, o viaduto era incapaz de, por si só, definir os espaços ao seu redor no nível do pedestre. Observando estruturas de dimensões semelhantes em outras cidades do mundo, os antigos
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aquedutos se sobressaíram enquanto referência para solucionar o problema. Ao analisar estruturas como a dos Arcos da Lapa no Rio de Janeiro e o Aqueduto de Segóvia na Espanha, é possível notar como elas conseguem marcar sua presença na paisagem definindo espaços livres ao seu redor com grande leveza. Apesar de possuírem um desenho mais sofisticado em termos estéticos do que o grosseiro viaduto de concreto em Itaquera, o que mais contribui para essa configuração não é sua beleza, mas sim o ritmo de suas colunas. Sendo assim, decidiu-se incorporar no desenho da biblioteca elementos que dialogassem com os pilares do elevado para conferir uma noção de ritmo à eles. Sendo assim, foi criada uma modulação da estrutura da biblioteca que se evidencia para além do edifício. Grandes paredes estruturais serviriam de base para a configuração dos ambientes internos, ao mesmo tempo em que se estenderiam para além deles, buscando relações com outros elementos ao redor. Ao se alinharem aos pilares do viaduto, essas paredes criam uma repetição plástica que permite a configuração da grande praça evidenciando a presença o elevado. Concomitantemente, criam uma série de pórticos que definem um espaço de transição entre a praça e o edifício, gerando áreas de escalas e características diversas. Uma dessas paredes se estende ainda mais e chega ao outro lado do rio, convidando os transeuntes a visitarem o novo equipamento público. Este projeto, com isso, ensaia uma forma alternativa de inserção dos edifícios públicos na cidade. Demonstra um pensamento de relação do edifício com a seu contexto urbano que não pode ser tabelado ou padronizado, mas que envolve conceitos que, estes sim, podem se repetir em outras situações de forma até mais
bem elaborada. Fazer com que a forma do edifício não surja antes nem independentemente da forma do entorno parece ser uma das grandes chaves. É necessário que se busque articular os diversos elementos urbanos para que o projeto tenha um real poder de inserção na cidade. Nesta experiência, arriscou-se inclusive criar uma modulação construtiva que mostrasse que para que se empregue este caráter no edifício, ele não precisa perder a racionalização da produção – característica importante para projetos públicos de grande escala. Uma outra pesquisa poderia inclusive investigar um modelo de racionalização da produção diferente do existente hoje para edifícios públicos, que permitisse uma adaptação maior das construções aos respectivos contextos e uma liberdade plástica maior para os arquitetos, criando variedade de soluções e adequação às necessidades locais.
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ARCOS DA LAPA, RIO DE JANEIRO FOTOGRAFIA AÉREA (FONTE : EN.WIKIPEDIA.ORG) E IMAGEM DO GOOGLE STREET VIEW.
AQUEDUTO DE SEGÓVIA, ESPANHA FOTOGRAFIA AÉREA (FONTE : THE-TIN-MAN.COM) E IMAGEM DO GOOGLE STREET VIEW.
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< VISTA AÉREA DA BIBLIOTECA FORMAÇÃO DA PRAÇA ATRAVÉS DO RITMO DOS PILARES E DAS PAREDES SEQUENCIAIS
< CORTE GERAL DO RIO RELAÇÃO COM A PAISAGEM NATURAL E CONSTRUÍDA.
BIBLIOTECA VISTA À PARTIR DA MARGEM OPOSTA DO RIO OS EDIFÍCIOS ENQUADRAM A BIBLIOTECA E O PÓRTICO QUE CHEGA AO OUTRO LADO CONVIDA O TRANSEUNTE PARA O EDIFÍCIO.
IMAGENS ESPERNAS DO EDIFÍCIO PRAÇA NO CAIS BAIXO, ONDE ESTÃO A ENTRADA, O ANFITEATRO À CÉU ABERTO E A ÁREA DE CARGA E DESCARGA (IMAGEM DE CIMA); FORMAÇÃO DE PÓRTICOS JUNTOS AO VIADUTO NA PRAÇA SUPERIOR (IMAGEM DE BAIXO)
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– REFERÊNCIA DE PROJETO – O arquiteto italiano Renzo Piano desenvolveu um revestimento industrializado feito de tijolos de terra pré-fabricados. Esse sistema foi utilizado como referência para a proposição das grandes paredes da biblioteca. O tijolo de terra é um material barato e guarda uma identidade forte, que se destaca ao mesmo tempo em que mantém uma sobriedade e passa sensação de aconchego. Ao industrializar sua produção e criar um desenho específico dele para o edifício, pode-se conferir personalidade à biblioteca e otimizar seu processo produtivo. Com um modelo de revestimento deste tipo é possível também criar paredes mais permeáveis sem perder sua força visual. Renzo Piano cria um sistema onde as aberturas do edifício se camuflam sob os tijolos e recebem proteção contra incidência de luz solar direta. Assim, é mantida a uniformidade da parede, mas se torna possível a criação de aberturas. Isso é importante no projeto da biblioteca nas áreas onde o muro estabelece contato direto com o espaço público, como na área infantil e no Centro de Referência Urbana. Isso torna possível que os espaços interno e externo se relacionem e que a extensa parede de tijolos afirme sua grandiosidade. Os desenhos à seguir foram retirados do livro Renzo Piano Building Workshop Complete Works Volume 4 e fazem parte do projeto da Banca Popolare di Lodi, na Itália. Através deles é possível compreender melhor o funcionamento do revestimento de tijolos industrializado criado por Renzo Piano.
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– O EDIFÍCIO E A ITINERÂNCIA – O sistema itinerante da biblioteca foi importante para o desenvolvimento do desenho do edifício. Apesar de não ter havido tempo para uma elaboração mais detalhada de seu funcionamento, ele sempre fez parte da preocupação da dinâmica dos espaços e das soluções propostas. Uma das principais preocupações foi como otimizar a relação entre o acervo da biblioteca e os veículos que cotidianamente deslocam parte dele. No modelo atual, não existe nenhuma proposta de desenho para o edifício ou para o ônibus que torne está relação mais eficiente e prática. O que se pretendeu então, foi esboçar uma possibilidade de aperfeiçoamento deste sistema. Optou-se por não propor grandes alterações ao ônibus que transporta o acervo móvel. Além de não ser o foco desta pesquisa trabalhar na escala do desenho industrial que possibilitaria tal estudo, ficou claro que grande parte do melhoramento deste sistema deveria ser feito no edifício que guarda o acervo e nos pontos de parada. Mesmo assim, foi levantada a hipótese de uma adaptação maior dos veículos que permita uma abertura maior de suas faces e uma conexão mais próxima entre interior e exterior. Desse modo, as pequenas bibliotecas podem se integrar melhor às atividades das praças onde ancoram e o sistema de carga e descarga se facilita. Para o edifício, optou-se por localizar o depósito do acervo no cais do Rio Verde, sob a biblioteca. Assim, seria possível que os veículos pudessem atracar no ponto de carga e descarga sem interferir nas fachadas principais da biblioteca. Ao fazer isso, também foi possibilitado que os escritórios administrativos se dispusessem junto ao acervo de frente para a margem do rio. Essas funções sozinhas já garantiriam que este espaço se tornasse ativo e com pessoas presentes em
grande parte do dia. Para otimizar a relação entre o veículo e o edifício, o acervo está elevado do solo em meio metro para que se forme uma plataforma na mesma altura do piso do ônibus. Isso facilita o carregamento dele, evitando que seja necessário sair da biblioteca com livros, subir as escadas do ônibus e organiza-los em seu interior, como é feito hoje. Dessa forma, se torna possível, inclusive, que as estantes de livros do ônibus sejam móveis e possam ser trocadas por inteiro a cada viagem. Os livros seriam organizados no edifício diretamente nas estantes e elas poderiam ser deslizadas para dentro do veículo substituindo outras que já estejam desorganizadas e com livros emprestados. Ao posicionar o depósito de livros sob o acervo também se viabilizou uma separação física mais clara entre a parte acessível ao público e a restrita. Um elevador de serviços faz a conexão entre todos os andares com coleção de livros ou mídias, permitindo uma relação mais direta entre os funcionários e o acervo. Assim, o acervo fixo e o itinerante se tornam totalmente conectados podem compor uma mesma coleção que muda e se renova.
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CORTE ÁREA DE CARGA E DESCARGA ESQUEMA DE ACOPLAGEM DO ÔNIBUS AO DEPÓSITO DE LIVROS E À ADMINISTRAÇÃO. A ELEVAÇÃO DO PISO PERMITE UMA COMUNICAÇÃO MAIS EFICIENTE ENTRE EDIFÍCIO E VEÍCULO.
CROQUIS DE REFLEXÃO SOBRE O ÔNIBUS NA IMAGEM SUPERIOR, O MODELO ATUAL DE ÔNIBUS, NA INFERIOR A PROPOSTA DE UM MODELO MAIS ABERTO.
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– PONTOS DE ANCORAGEM – Para o estudo das praças de parada dos ônibus biblioteca, foram escolhidos dois casos com situações distintas e dentro do raio de abrangência da biblioteca projetada. O estudo delas consistiu numa leitura dos elementos que dificultam sua integração ao cotidiano do bairro e uma proposta esquemática de como seus espaços podem ser melhor aproveitados e gerar mais interesse pelo uso, tornando-se capazes de receber melhor o sistema itinerante do Ônibus-Biblioteca. Ambas as praças apresentaram um modelo comumente encontrado na cidade e já destacado no início desta pesquisa. São restos da urbanização do bairro, sendo conformadas em locais de bifurcação de ruas onde a ocupação seria muito difícil pela dimensão e pelo formato do terreno. Dessa forma, são caracterizadas por serem rodeadas por ruas em todos os lados e apresentarem uma dimensão relativamente pequena. Ao mesmo tempo, os desenhos das praças tratam elas como canteiros verdes, diminuindo ainda mais o espaço útil delas em detrimento da implementação de caixas de terra para arborização. Esses canteiros tornam seu espaço truncado e determinam muito fortemente as áreas caminháveis. Por outro lado, as duas praças disponibilizam bancos e mesas, elementos de acolhimento local. Esse tipo de mobiliário é importante para a garantir a permanência de pessoas no espaço público, pois possibilita atividades naturais desse tipo de espaço, como sentar, conversar, observar, etc.*** (JAN GEHL). Contudo, esses elementos estão colocados na praça num modelo interiorano, que não corresponde à dinâmica contemporânea da metrópole. Por mais que estejam na periferia, onde o ambiente é predominantemente residencial e a utilização dos espaço públicos é muito diferente das áreas centrais e densas da cidade, a praça precisa
comportar uma apropriação maior de seu espaço e possibilitar atividades mais diversas que possam se integrar ao entorno. Posto isso, as principais modificações pensadas para as praças vão no sentido de aproximar mais seu espaço do passeio público e dos edifícios ao seu redor ao mesmo tempo que se tenta criar uma outra forma de apropriação do espaço vinculada a uma identidade visual comum que remeta ao fato de serem um ponto de ancoragem do Ônibus-Biblioteca. Para tanto, foi proposto primeiramente a alteração do caráter de uma das ruas lindeiras à cada praça, tornando -as um espaço compartilhado que prioriza o pedestre e permite o alargamento da calçada. Essa rua deve ser elevada para o nível do passeio público e receber um tratamento de piso que indique seu caráter peatonal, com pedras ou outro tipo de revestimento texturizado. Com isso, a praça deixa de ser uma pequena ilha no asfalto e se torna um alargamento do espaço do pedestre. As paredes que marcam o projeto da biblioteca foram escolhidas como elemento de criação da identidade visual das praças também. Para isso, as paredes são pensadas como o próprio mobiliário urbano. Através de perfurações, variação de alturas e acoplamento de estruturas parasitas esses muros podem se transformar para receber diversos tipos de bancos, mesas, lixeiras, brinquedos, espaços de armazenamento, elementos decorativos, quadro de avisos, etc. O mesmo elemento que compõe a biblioteca pode então compor as praças ao redor dela e as demais praças vinculadas ao seu sistema, criando uma identidade única para tudo. Isso é importante, pois marca a presença da biblioteca na cidade e cria um endereçamento oportuno que permite que os
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PRAÇA GERACINA BRAGA LIMA A PRAÇA APRESENTA A CURIOSA CARACTERÍSTICA DE ESTAR RODEADA POR BLOCOS DE CONCRETO DE SINALIZAÇÃO DE TRÂNSITO. APESAR DO ESPAÇO DOS CARROS EM SUAS MARGENS TER SIDO REDUZIDO, ELE NÃO FOI INCORPORADO À ELA, TORNANDO-SE UM LOCAL SEM UTILIDADE E QUE DIFICULTA A MOBILIDADE DOS PEDESTRES.
PRAÇA CÂNDIDO MENDES DE ALMEIDA A PRAÇA ESTÁ EM FRENTE À UMA ESCOLA PÚBLICA, DE FORMA TEM A OPORTUNIDADE DE SE TORNAR UMA EXTENSÃO DE SEU ESPAÇO. A ALTERAÇÃO DE SEU DESENHO É UMA FORMA DELA RECEBER MAIS ATIVIDADES, MAS A ESCOLA TAMBÉM PODE CONTRIBUIR PARA ISSO SE TORNAR SUAS FRONTEIRAS MAIS PERMEÁVEIS.
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usuários à identificarem com facilidade, permitindo que o contato com ela se torne cotidiano. Outras modificações importantes foram a determinação de uma área reservada para o estacionamento do ônibus-biblioteca mais articulada com a praça e a proposição de pequenos quiosques que podem abrigar comércio e banheiros públicos. É demanda do sistema que as praças estejam próximas à locais onde os funcionários possam comer e utilizar o banheiro. Sendo assim, estes quiosques poderiam tanto cumprir essa função quanto introduzir novos elementos de ativação do espaço público. Também é proposta que os canteiros de plantas deixem de ser caixas e se nivelem ao piso, deixando de conformar barreiras e criando pequenos gramados onde as pessoas possas se sentar. O projeto Tiquatira em Construção (representado nas imagens ao lado) das arquitetas Andréa Helou e Julieta Fialho foi uma das referências para a definição do muro enquanto mobiliário urbano. Em Tiquatira, as recém formadas arquitetas se aproveitam de um longo muro préexistente para requalificar a região ao projetar diversos parasitas que o transformam em um percurso de diferentes ursos e surpresas. Apesar de muitas das idéias não terem saído do papel, o trecho implementado mostra que realmente é possível utilizar essa estrutura de forma positiva.
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TIQUATIRA EM CONSTRUÇÃO AS IMAGENS DO PROJETO REVELAM DIVERSAS IDEIAS DO QUE PODERIA SER FEITO NO MURO PARA TRANSFORMADO EM MOBILIÁRIO URBANO MULTIUSO. DENTRE ELAS, DESTACAM-SE A ARQUIBANCADA, O BICICLETÁRIO E A MESA. MAS SÃO INFINITAS POSSIBILIDADES DE USO. IMAGENS DE DIVULGAÇÃO DO PROJETO.
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PRAÇA GERACINA BRAGA LIMA CROQUIS DE ESTUDO DA PRAÇA ANTES (ESQUERDA) E DEPOIS (DIREITA) DA IMPLEMENTAÇÃO DO PROJETO.
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PRAÇA CÂNDIDO MENDES DE ALMEIDA CROQUIS DE ESTUDO DA PRAÇA ANTES (ESQUERDA) E DEPOIS (DIREITA) DA IMPLEMENTAÇÃO DO PROJETO.
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O PROJETO COMO PESQUISA “A arquitetura abrange o exame de todo o ambiente físico que circunda a vida humana; não podemos subtrair-nos a ela, até que façamos parte da sociedade urbana, porque a arquitetura é o conjunto das modificações e das alterações introduzidas sobre a superfície terrestre, em vista das necessidades humanas, excetuado somente o puro deserto.” (WILLIAN MORRIS, 1881) A elaboração de um projeto enquanto forma de pesquisa permitiu descobrir questões que não estavam planejadas no início. A partir do momento em que se projeta, também se descobre novos elementos que não estavam previstos e que necessitam de problematização para permitir que o projeto se desenvolva. Desde o início do processo de proposição do edifício novos paradigmas surgiram e obrigaram mudanças tanto na forma de se trabalhar quanto na percepção inicial do problema. A simples questão da implantação do edifício no terreno inicialmente definido já revelou inúmeras questões que não haviam aparecido antes. Elas tornaram mais evidente a complexidade e a necessidade de estruturar o edifício em conjunto com a forma urbana e os elementos construídos e naturais do entorno. No momento do projeto afloram novas leituras da situação urbana que permitem uma compreensão mais estruturada das problemáticas levantadas no início da pesquisa. Enquanto arquiteto, essa metodologia é muito rica, já que permite desenvolver conceitos aplicados diretamente à prática profissional da categoria. É
também uma forma de aplicar os conceitos enquanto os estuda, para que seja fundamentada a argumentação. Tento em vista que construir edifícios ou projetos urbanos é algo impossível para uma pesquisa, o exercício do projeto permite uma aplicação dos conceitos de uma maneira próxima da prática do arquiteto urbanista e permite uma leitura dos resultados que só pode ser superada pela real implementação o projeto, que estará sujeita às dinâmicas urbanas, aos usuários, aos recursos financeiros e materiais, etc. Assim, o projeto é uma forma de tornar elementos abstratos mais próximos da compreensão do pesquisador e de seus possíveis leitores. A arquitetura é uma ciência muito complexa, pois envolve uma diversidade de fatores que dependem de elementos tanto abstratos quanto voláteis, que se alteram a cada circunstância. Ao projetar como forma de pesquisa, essa multiplicidade de fatores se evidencia mais facilmente e grande parte dos elementos que não são o foco da pesquisa se tornam presentes na problematização. Por mais que continuem como segundo plano em relação à proposta de trabalho, se não forem levadas em conta, muito se perde, pois a arquitetura se distancia da aplicabilidade. O processo de produção da arquitetura é provavelmente o que mais chama atenção como plano de fundo da pesquisa. Principalmente pelo fato de se tratar de um projeto público com caráter social num contexto pós-industrial em um país emergente, esse elemento se torna importante para a viabilização de projetos. Considerando o tema desta pesquisa, podemos destacar a crítica de Kenneth Frampton para Mies van der Rohe quando afirma que “procura reduzir o trabalho da construção à categoria de desenho industrial numa escala enorme.
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Visto que está preocupado em otimizar a produção, tem pouco ou nenhum interesse pela cidade”. Para podermos repensar a cidade através da arquitetura, devemos saber vincular seu processo produtivo ao conceito de implantação e articulação do edifício com o entorno. Esse modelo de pesquisa nos permite criar esse processo de forma mais articulada. À partir do momento em que se precisa dar forma à teoria, todas as outras questões vem à tona. Um projeto que se resolve apenas dentro de uma questão muito específica não pode ser considerado eficiente. Muitos dos grandes marcos da arquitetura ganharam destaque justamente por se dedicar a uma só questão, normalmente à forma. Contudo, se tornam obras muito pontuais, que não podem ter seu conceito reproduzido em qualquer situação e, quando tem, acabam por se distanciar de processos produtivos locais, de realidades socioespaciais e da relação com o entorno. O processo de investigação através do projeto é muito interessante para um estudante de arquitetura inclusive, pois permite praticar o exercício da profissão de uma maneira crítica. É uma ferramenta para estabelecer fundamentos críticos para as possibilidades da arquitetura que se verificam somente através dele e com ele aprender de forma metaliguística.
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