fauna
Sentinela da Savana getty images
texto | AguinAldo MAtos
Simpática e desengonçada, a pernalta e pescoçuda girafa, o maior animal terrestre, encanta crianças e adultos. Mas na Savana Africana, seu hábitat, a espécie está ameaçada mais pelo homem que lhe tira casa e comida do que pelo leão, seu único predador natural 14
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gUstaVo goDoy
fotos: agUiNaLDo matos
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m sol de rachar! Temperatura na casa dos 40 graus ou mais. Estamos em um caminhão adaptado como ônibus para levar passageiros. Porém, afora o fato de ter poltronas, nada lembra um ônibus. Os assentos não são reclináveis e macios, a suspensão é dura e, claro, ar condicionado no semiárido da Savana Africana é tecnologia de outro mundo. Viajamos por estradas de cascalho, a cerca de 80 quilômetros por hora. Ao volante, o guia não raramente se empolga e acelera ainda mais. A vibração no caminhão é infernal. Malas, mochilas, equipamentos, o que
estiver solto balança para lá e para cá, e às vezes cai na cabeça dos desatentos. É uma bagunça em meio a uma densa névoa, pura poeira. Com o calor, o jeito é andar de janelas abertas. Nesta aventura, “engolir poeira” não é apenas força de expressão. Seguimos pelo norte da Namíbia, país ao sul do Continente Africano, e nosso objetivo é chegar ao Parque Nacional Etosha, um dos maiores e mais famosos do mundo, considerado um paraíso dos bichos da Savana. Entre tantas espécies para conhecer, uma é prioridade: a girafa. Por mais que eu já tenha visto esse animal no zoológico, para quem gosta da natureza nada se compara a observar o bicho em seu ambiente natural. E a curiosidade pela girafa vem de longe. É um dos mais belos animais do Planeta. Quem nunca soletrou ou ouviu “G de girafa”? Seria exagero dizer
que é uma das espécies mais carismáticas? Com certeza, não. O jeito bonachão, pacato, desengonçado e ao mesmo tempo com um certo charme ganha a afeição de qualquer um. Criança ou adulto, não há quem não se encante com elas. BEM DE PERTO Pela estreita janela do caminhão o que se vê, além da poeira, é uma extensa planície branca, repleta de arbustos secos. Apesar da vegetação, visualmente o verde não predominda por aqui. Passamos por um dos portões que dão acesso ao Parque e logo os animais começam a surgir pelo caminho. Além de zebras, várias espécies de antílopes como as gazelas, o órix e o gnu. Estamos em outubro, auge da seca na Savana. Nessa época, água é coisa rara – por isso, líquido sagrado – e o pouco que resta é disputado por toda a vida selvagem. Nosso guia avisa: vamos descer perto de um pequeno lago, um reservatório natural, um bom ponto de observação. É o único sinal de água num raio de 40 quilômetros. Enfim, uma pausa
Os outros animais ficam atentos à sentinela: se ele para, todos param; se ela corre, todos fogem do perigo no sacolejo do caminhão e seguimos a pé até uma área cercada. Logo temos pela frente uma visão do paraíso. A cerca de 30 metros, centenas de animais se aglomeram ao redor de um pequeno lago, ansiosos por alguns goles de água. São elefantes, antílopes, zebras e até aves em grandes bandos. Ao fundo, vejo o que parecem ser tocos de árvores secas. Mas, logo, a surpresa! Toco não anda sozinho! Eram elas, as girafas. Como estavam longe e contra o sol, fui facilmente enganado. Mas pelo zoom da câmera, não houve dúvida. Dava para ver as orelhas e os pequenos chifres. Daquele ângulo, apesar da distância, pelo tamanho elas já se destacavam entre todos e tudo por ali. Poucas árvores são do tamanho ou maiores que elas. Estavam lá, observando a movimentação. Pareciam esperar uma chance de se aproximar e também saciar fa u n a | Terra da Gente
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Girafa
Dieta veRDe Não há folha que escape da viscosa língua de de 50 cm (acima). Seca na Savana é problema para os turistas e em especial para os animais (págs. anteriores) 18
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GIGANTE O nome girafa teria vindo do árabe, xirapha, que significa “quem caminha rapidamente”. Faz sentido: no galope, ela chega a 60 quilômetros por hora. É um mamífero herbívoro da família dos girafídeos, do gênero Giraffa. A girafa chama a atenção pelo tamanho: é o maior animal terrestre do mundo em altura. Pode chegar a 5,70 metros, por causa dos membros alongados, principalmente o pescoço, formado por sete vértebras cervicais – a mesma quantidade dos humanos –, cada uma com cerca de 10 centímetros de comprimento. Grande e pesada, a girafa pode chegar a 1.400 quilos. Existe apenas uma única espécie de girafa, a Giraffa camelopardalis, dividida em 9 subespécies. Elas se diferenciam pelo
padrão de manchas da pelagem e pela área de distribuição. A bela gigante passa cerca de 20 horas por dia forrageando. Alimenta-se de folhas, brotos, frutos e plantas trepadeiras. Tem predileção pelas acácias – espécie de árvore africana conhecida por ter muitos espinhos –, mas sua dieta é bem variada. Em algumas áreas chega a comer mais de 60 espécies vegetais. Os pelos compridos ao redor dos lábios protegem dos espinhos e têm a faculdade de transmitir ao cérebro, por via nervosa, todas as informações sobre o grau de amadurecimento das folhas. A língua é preta e viscosa e chega a 50 centímetros de comprimento. Com isso, prolonga ainda mais o seu tamanho e permite alcançar os petiscos mais escondidos entre os galhos altos. A boca é revestida por uma mucosa resistente, adequada ao seu regime. A girafa normalmente vive em grupos de 4 a 30 indivíduos. Considerado um animal pacífico, pouco se fala do lado
nome científico: Giraffa camelopardalis ..........................................................................................................
» háBItAt
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Savanas do Continente africano ..........................................................................................................
» ASPectoS fÍSIcoS
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até 1.400 kg, 5,70 m de altura e língua de 50 cm. Cada uma das 9 subespécies se diferencia pelo padrão de manchas da pelagem ..........................................................................................................
» reProduÇÃo
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fêmea no cio a cada 15 dias, gestação de 15 meses e 1 filhote ..........................................................................................................
» AlIMentAÇÃo
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folhas, brotos, frutos e trepadeiras
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» coMPortAMento
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Pacífica, passa 20 horas do dia comendo, anda em grupos de 4 a 30 indivíduos ..........................................................................................................
» teMPo de VIdA
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Cerca de 25 anos fotos: agUiNaLDo matos
a sede. Enquanto esperavam, algumas aproveitavam para beliscar as folhas do topo das árvores.
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fotos: getty images
PeRnalta As pernas longas atrapalham na hora de beber água, quando a girafa se expõe ao predador, mas ajudam a alcançar as folhas das árvores mais altas da Savana 20
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brigão da espécie. A disputa pela liderança do grupo e pelas fêmeas é na base da pescoçada. Geralmente os machos rivais se apóiam com as pernas afastadas, de frente um para o outro, virando o pescoço para o mesmo lado ou para o lado oposto. Aí começam a movimentar a cabeça de forma cadenciada, abaixando o pescoço para tentar atingir o adversário com os chifres. Isso é só o começo da disputa, que pode se arrastar por horas. A girafa se reproduz durante o ano todo. A fêmea fica no cio a cada 15 dias. A gestação dura cerca de 15 meses e é normalmente de um filhote. O parto da girafa é um dos mais curiosos da natureza. Quando o filhote nasce, sofre uma queda de cerca de 2 metros de altura. No entanto, o pequeno gigante com quase 2 metros e cerca de 100 quilos aguenta o
tranco. Meia hora depois, levanta-se sobre as patas trêmulas e busca os carinhos da mãe. VIGILANTES O sol já se encaminha para o poente e a movimentação dos animais ao redor do reservatório não para. Com passadas largas, parecendo marchar, as girafas começam a se aproximar do lago. A qualquer barulho, recuam. Entre avanços e recuos, tem-se a impressão de que nunca vão chegar. Depois de quase duas horas, as primeiras se aproximam do objetivo. Sentinelas exemplares, ainda dão uma última espiada em tudo ao redor antes de beber. E ver esses bichos se abaixando é um espetáculo à parte. Se o pescoço comprido ajuda a alcançar o alimento nas alturas, acaba sendo um
transtorno nessa hora. É uma proeza e tanto. Ela dobra os joelhos para a frente e afasta as patas dianteiras. Esse movimento é auxiliado pelo pescoço, que funciona como um pêndulo. Aos poucos, a cabeça da girafa alcança a água. Não é em vão todo o cuidado ao vigiar as redondezas. Quanto está nessa posição, ela se torna presa fácil dos predadores, pois tem dificuldade em recompor a postura para fugir às pressas. Depois de beber, vira-se e sai a galope. Nas horas em que permanecemos para observar as girafas, cerca de 15 vieram até o lago, todas com o mesmo cuidado para chegar e rapidez na despedida. PRESA AMEAÇADA A girafa adulta tem apenas um predador natural: o leão. A tática é cercar o herbívoro até que um dos leões pule nas costas
Só o leão ataca a girafa adulta. Mas a população dela está diminuindo porque perde espaço para o homem do animal. Numa ação coordenada, os predadores mordem a girafa nas pernas, no rabo, na barriga e em minutos o grupo consegue derrubar e matar o animal. As baixas que vão para a conta do rei das selvas não representam perigo para a preservação da espécie da gigante das savanas. De acordo com a organização não governamental Fundação de Conservação da Girafa (GCF, na sigla em inglês), o que compromete a população desses animais é a perda de hábitat. Entre os motivos, o crescimento da população humana é o principal problema. Segundo estimativas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), no
SAIBA MAIS ECOTURISMO Uma das operadoras de ecoturismo com roteiros completos no continente africano é a Nomad Tours (www.nomadtours.co.za)
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fotos: getty images
tOMBO O pescoço, com sete vértebras, a mesma quantidade dos humanos, é muito flexível. Após a gestação, o filhote cai de um altura de 2 metros quando nasce 22
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final dos anos 1990 existiam cerca de 140 mil animais na natureza. Hoje, o número teria caído para menos de 80 mil, pelos dados da GCF. Atualmente, as girafas vivem, na sua maioria, em reservas e parques nacionais espalhados pelo continente africano. Algumas subespécies vivem sob sério risco de extinção e duas estão na Lista Vermelha internacional. Segundo especialistas, estima-se que existam menos de 750 indivíduos da girafa-de-rothschild (Giraffa camelopardalis rothschild) na natureza. O caso da girafa-do-chade ou girafa-do-oesteafricano (G. c. peralta) é bem mais grave. Há indícios de apenas cerca de 300 animais
vivos. A GCF apoia mais de 30 projetos na África para a conservação das girafas. No final da nossa aventura, no norte da Namíbia, tivemos a sorte de encontrar um casal bem de perto, na beira da estrada, comendo a folhagem das acácias. Curiosas, nos olharam por alguns minutos enquanto mastigavam sem parar e logo saíram “de fininho”. De acordo com especialistas, a Namíbia é a única região da África onde há registro de crescimento da população de girafas. Para quem tem o privilégio de conhecer esse animal na natureza, fica o desejo de que os protetores das girafas vençam a batalha pela conservação da espécie. fa u n a | Terra da Gente
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a espécie Giraffa camelopardalis tem 9 subespécies, assim distribuídas pelo Continente africano: getty images
» GIrAfA-retIculAdA ou GIrAfA-dA-SoMálIA (G. c. reticulata) - manchas cor-de-fígado, reticuladas e separadas por linhas brancas muito nítidas. Quênia, Etiópia e Somália. » GIrAfA-AnGolAnA (G. c. angolensis). angola, Zâmbia. » GIrAfA AntIquoruM (G. c. antiquorum). Sudão.
áfrica
cHaDE SUDÃO ETiÓPia
» GIrAfA-MASAI (G. c. tippelskirchi) - manchas irregulares, em forma de folha de videira, cor-de-chocolate. Quênia, Tanzânia.
» GIrAfA-núBIA (G. c. camelopardalis) - manchas grandes, quadrangulares, cor-de-avelã,
ausentes nas patas. Sudão, Congo.
UGaNDa
SOMáLia QUÊNia
cO N G O TaNZÂNia
» GIrAfA-de-rothSchIld (G. c. rothschildi ) - manchas retangulares castanho-escuras,
de contornos mal definidos. uganda, Quênia.
» GIrAfA-Sul-AfrIcAnA (G. c. giraffa). África do Sul, namíbia, Botsuana, Zimbábue, Moçambique.
» GIrAfA-dA-rodéSIA (G. c. thornicrofti ). Zâmbia. » GIrAfA-do-chAde (G. c. peralta). Chade.
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MOÇaMBiQUE
ZiMBáBUE NaNÍBia BOTSUaNa
áfrica DO SUL
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