O CÂNTARO DE PRATA

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Andréia Sales

O Cântaro de Prata

Coleção

NOVOS TALENTOS DA LITERATURA BRASILEIRA

São Paulo 2012


Prólogo

– Oi, Adérito! – Aléxia chegou à escola correndo, com um enorme sorriso no rosto, a expressão radiante. Vinha com a mochila pendurada em um dos ombros e uma grande caixa colorida nas mãos. Sentou-se no banco e colocou ao seu lado tudo o que estava segurando. – Oi, Aléxia! Que animação! – Adérito cumprimentou a amiga rindo. Um sorriso maroto brincava em seu rosto. – Será que é porque a festa está chegando? – Eu estou sempre animada, não é só por causa da festa! – e, vendo a cara zombeteira que Adérito fez, ela completou: – Ah, mas é claro que estou animada com a festa! – Que ótimo! Porque essa será a melhor de todas! E será o melhor dia de nossa vida. – Adérito suspirou, com o olhar perdido; seus olhos brilhavam. Parecia estar sonhando acordado. Mas logo foi interrompido bruscamente: – Oi, pessoal! – Erianthia apareceu na frente dos colegas e, parecendo intrigada ao ver a expressão de Adérito, perguntou para Aléxia: – O que deu nele? Ele sacudiu devagar a cabeça, dando a impressão de ter se recuperado, e sorriu envergonhado para Erianthia. Ela também estudava com Aléxia e Adérito e fazia parte do quinteto mais unido do colégio. Os outros dois eram Irina, garota tímida e discreta, que tinha um poder incrível de acalmar e resolver os problemas de todos, e Leon, que sempre queria se mostrar

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valente e corajoso. Embora ele dissesse não ter medo de nada, em muitos casos era o mais temeroso e preocupado dos cinco. – E então, o que tem aí nesta caixa? – Erianthia olhou curiosamente da caixa para a amiga e da amiga para a caixa. – Coisas para a festa! Vocês querem ver? – Aléxia perguntou, quase dando pulos de alegria. – É claro! Mostre, mostre! – Acho que talvez depois – a resposta foi abafada pelo sinal enquanto Adérito fazia uma careta. Aléxia pensou que talvez o barulho o tivesse incomodado. Ele as puxou pelo braço, andando pelo corredor, em direção à sala de aula. As duas iam tagarelando empolgadas sobre os preparativos enquanto Adérito as rebocava. – Até mais tarde, meninas – disse ele quando chegaram à porta da classe delas, e em seguida se dirigiu à sua sala. – Até mais – responderam Erianthia e Aléxia, virando-se e entrando na classe. Na sala encontraram Irina e Leon, que já estavam ali havia algum tempo, sentados em uma das mesas. Inclinados um para o outro, os dois conversavam em voz baixa. Quando perceberam os amigos se aproximando se endireitaram nas cadeiras acenando com a cabeça em um cumprimento e esboçaram um sorriso, um tanto desconcertados. Aléxia se sentou entre Leon e Erianthia e ficou pensativa. Era estranha a empolgação de Adérito. Estranha e repentina. Até o dia anterior ele parecia um tanto desinteressado pela festa. O que poderia ter mudado de um dia para o outro? Não deveria ser nada de importante. Decerto havia sido contagiado por seu entusiasmo. Então ela se esqueceu logo do assunto porque o que realmente importava era que seu melhor amigo agora compartilhava de sua felicidade e estava tão ansioso pelo dia do ani-

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versário quanto ela! E nada poderia ser mais importante que a presença dele.

À tarde Adérito apareceu na casa de Aléxia e foi recebido pela mãe dela, Penélope: – Olá, Adérito! Imagino que você queira falar com a Aléxia, não é? – Sim, ela está no jardim? – Está, ela e Célia estão conversando lá perto da fonte. – Certo, obrigado. Adérito atravessou a grande sala e abriu a porta para o quintal. Caminhou até uma das partes mais escondidas da casa. Lá estavam elas. Aléxia estava sorridente, apoiada em uma estátua de mármore em forma de pégaso, o famoso cavalo alado da mitologia. Sua prima Célia estava apoiada em uma harpia, outra criatura mitológica que tem o corpo de ave de rapina e o rosto de mulher, e segurava a caixa colorida que Aléxia levara à escola. – Oi, Adérito! – Aléxia gritou ao ver o amigo se aproximando. Seu sorriso se alargou ainda mais. – Venha cá ver as coisas da festa! – Oi, Aléxia! Oi, Célia – ele as cumprimentou sorrindo. – Tenho uma novidade! – Conte-nos, então! – Aléxia se empolgou ainda mais. – Não sei se já te contei, mas eu tenho um primo alemão – os olhos de Aléxia brilharam e Adérito continuou: – E ele está vindo para cá passar um tempo conosco, chega semana que vem!

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– Sério? Ah, mas que legal! – Aléxia não se continha. – É aquele seu primo de Fritzlar? – É, esse mesmo! – E ele chega a tempo para a festa? – a garota se encheu de expectativa. – Sim. Chega na quarta-feira! – Que ótimo! Mal posso esperar para falar com ele! – Aléxia disse enquanto sua prima se pendurava em um pégaso e fingia que estava voando para longe. – Pessoal, eu ainda estou aqui, tá? – Célia ficou em pé em cima da estátua e pulou; quase caiu em cima da prima. Era impressionante como ela conseguia agir como uma completa criança, principalmente quando queria ser o centro das atenções. E essa era uma das características de que Aléxia mais gostava nela. – É mesmo, Célia? Nem dá para perceber! – Aléxia riu. – Será que agora você quer ver os enfeites, Adérito? – Ah, é claro! – ele respondeu. – Pode mostrar. Aléxia pensou ter visto o brilho no olhar do amigo desaparecer por uns instantes, mas convenceu-se de que era apenas impressão sua e logo pegou a enorme caixa que Célia deixara no chão. Abriu a tampa de grandes bolas e estrelas de cores diferentes e começou a tirar enfeites bordôs, dourados e marfim e um caderno com as listas de convidados e de músicas para a festa. Enquanto a prima e o amigo se sentavam, ela espalhou tudo pelo gramado, no meio deles, formando um grande círculo. Nesse momento chegou Erianthia, que foi logo se sentando no meio da roda. – Olá para todos! O que estão fazendo?

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– Estamos vendo os preparativos para a festa da Aléxia! – Célia respondeu. – Sério? Quero ver, quero ver! – ela se jogou na grama, apoiando-se em uma estátua. – E a Irina e o Leon? Onde estão? – Adérito perguntou. – Não faço ideia. Aléxia, você os convidou também, não é? – Erianthia indagou. – É claro que sim! – Ah, não importa! Tem alguma coisa para comer? – Tem, Thia! – Aléxia se levantou, enquanto todos riam da amiga que estava sempre com fome. – Já estou indo buscar. – Vou ajudá-la – Adérito se levantou de um salto e em um instante estava ao lado da amiga. – Está bem, obrigada! – a garota sorriu para o amigo. Alguns minutos depois Aléxia e Adérito voltaram com bandejas cheias de kourabiedes, uma espécie de biscoitos doces com amêndoas muito servida na Grécia. Todos os atacaram e ali ficaram por muitas e muitas horas, comendo, rindo, conversando, fazendo planos.

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Parte Um Aléxia


Kefálaio Éna

Era uma linda e quente noite de março na Grécia. A primavera parecia ter se adiantado, desafiando as leis da natureza. As estrelas brilhavam no céu escuro como o ébano, a prateada luz da Lua Cheia banhava as infinitas flores no quintal de Aléxia Sfakianakis, que mais parecia um bosque encantado, principalmente quando ficava todo iluminado e enfeitado. Finalmente chegara o dia! Dentro da grande casa branca com sacadas e janelas azuis como quase todas as casas na Ilha Mykonos, todos se preparavam para a festa. Aquele seria um dia especial para todos, não só porque era aniversário de quinze anos da filha mais nova, Aléxia, mas também porque mudaria o rumo daquela família para sempre. Bateram na porta de entrada e Aléxia desceu correndo para atendê-la. Ela já sabia quem era mesmo antes de descer o primeiro degrau, pois todos os convidados entrariam pelos portões da casa, e não pela porta principal. Com exceção de um deles. – Aléxia! Feliz aniversário! Você está muito bonita hoje. Como sempre, aliás – foi o cumprimento de Adérito, quando ela abriu a porta. O melhor amigo dela era sempre o primeiro convidado a chegar. – Deixe-me apresentar-lhe meu primo, Osmond, aquele de quem lhe falei, lembra-se?

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– Olá, Adérito. Obrigada – respondeu um pouco sem graça por causa do elogio e, virando-se para o outro, disse: – Muito prazer, Osmond. Seu primo me falou sobre você. Sua família mora em Fritzlar, não é? Infelizmente nunca tive a oportunidade de ir à Alemanha, mas suponho que seja um lugar muito bonito, especialmente o interior! – As cidades interioranas costumam ser bonitas, sim! Mas, se comparadas com as lindas ilhas gregas, não são nada – disse Osmond. Ele falava grego muito bem, quase sem o sotaque alemão, que costuma ser muito forte. – Aléxia é doida pela Alemanha, vou levá-la para lá algum dia – disse Adérito, com um largo sorriso. A garota retribuiu o sorriso e se imaginou indo para a Alemanha com o rapaz. Pensou no quanto eles se divertiriam juntos, assim como em todas as vezes que viajaram. Porém, desta vez, iriam apenas os dois, sem Erianthia, Irina, Leon ou Célia. Aléxia estava realmente bonita, com um lindo vestido longo bordô, sua cor preferida, apertado no busto com flores costuradas em dourado e depois caía cheio de pregas, com babado embaixo. Seus cabelos louro-escuros estavam presos nos lados com fivelas em forma de flores douradas e cheios de cachos volumosos e brilhosos. A sandália era de camurça bordô, com tiras e de salto alto fino com fivelas douradas. A maquiagem era delicada e reforçava seus melhores traços; a sombra bordô realçava a pele branca, seus cílios estavam com um pouco de rímel, o que chamava a atenção para os olhos cor de mel, que brilhavam de felicidade. Estava usando brincos dourados compridos, com um rubi pendurado e uma gargantilha de ouro. Era como uma verdadeira deusa grega!

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Adérito era um jovem bem bonito, musculoso, tinha cabelos escuros, olhos e pele muito claros. O primo dele nascera e vivera toda a vida na Alemanha. O pai de Osmond, Franz Hoffmann, era alemão e conhecera Evelyn, tia de Adérito, numa viagem às Ilhas Cíclades. Casaram-se e foram morar na Alemanha. Havia muito tempo que os primos não se encontravam. Osmond fora passar um tempo com a família na Grécia, antes de ir para a França, para onde sempre quisera ir, e conseguira uma bolsa para a faculdade. Apesar de ser dois anos mais velho, era muito parecido com Adérito fisicamente, ainda que mais atraente. Ambos estavam de smoking preto. Os pais de Adérito, Macrina e Dânao, eram muito amigos de Penélope e Péricles havia bastante tempo. – Aléxia! Nossa, mal te vi hoje. Nem sei se lhe dei os parabéns, mas estou dando agora, tá? – disparou Célia, melhor amiga e prima de Aléxia. – Ouvi a tia Penélope conversando com alguém hoje de manhã ao telefone, parece que ela vai te fazer uma grande surpresa! O que será que ela preparou? – Uma surpresa? Ah, Célia! Eu te conheço, se você ouviu essa parte, não deixaria de ouvir o resto – respondeu a aniversariante num tom distraído, tentando disfarçar sua curiosidade. – Não vou te dizer o que mais eu ouvi, porque daí não seria surpresa – antes mesmo de pronunciar a última sílaba, saíra rapidamente de perto para não se sentir tentada a contar tudo nos mínimos detalhes. Célia estava vestindo um longo azul-marinho muito estiloso com detalhes em pedras azuis. A sandália era prateada e os brincos também. Usava um colar de safiras, nos cabelos pretos e lisos tinha uma formosa tiara azul-marinho, nos olhos cas-

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tanho-escuros apenas um pouco de rímel e uma pincelada de sombra azul. Aléxia olhou em direção a uma das entradas, na qual dois seguranças supervisionavam os convidados que chegavam, e avistou uma de suas amigas agitando os braços do lado de fora da casa. – Oi, Aléxia! – gritou Erianthia, atravessando o portão no instante em que o guarda liberou sua entrada. Correu em disparada em direção à amiga, deu-lhe um forte abraço e disse: – Feliz aniversário! – Obrigada! – Aléxia falou um tanto sufocada pelo abraço. Quando Erianthia a soltou ela sorriu, aliviada. Erianthia retribuiu o sorriso e logo foi se esgueirando por entre as pessoas à procura de algo para petiscar. Usava um vestido longuete cor-de-rosa com babados no decote. Desfilava cuidadosamente sobre o gramado com sua sandália de salto fino e decorada com pedrinhas cor-de-rosa, combinando com o vestido e também com os brincos. A graça e a naturalidade com que andava eram impressionantes. Logo em seguida apareceram Irina e Leon. Aparentemente os dois chegaram juntos. Ambos se aproximaram da aniversariante e deram-lhe os parabéns. – Irina, Leon! Que bom que chegaram! – Aléxia os cumprimentou. – Se quiserem se sentar com Erianthia e Adérito, eles estão na mesa próxima à piscina. Tenho que ficar aqui recepcionando todos, mas assim que puder vou me sentar com vocês. – Está bem, Aléxia, obrigado! – Leon respondeu, dando um sorriso para Irina e segurando sua mão, fazendo-a corar. – Depois nós iremos. – Claro! Como quiserem.

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– Até daqui a pouco, Aléxia – Irina disse à amiga. Aléxia continuou ali, recebendo e cumprimentando todos que chegavam. A casa estava movimentada, havia muitos garçons, impecavelmente trajados, que carregavam bandejas com horiátikisaláta, uma salada grega feita com tomate, pepino, queijo e azeitonas pretas, e bourekasim, empanadas recheadas de queijo, legumes ou carne. Havia também recepcionistas por todas as entradas da casa. No fundo do jardim foram montados um palco com telões e uma pista de dança. Em torno da enorme piscina havia flores e ramos bordôs e dourados emaranhados em uma e outra lamparina. Nas mesas haviam toalhas marfim com rosas bordadas estendidas. Algumas eram enfeitadas com arranjos de rosas vermelhas. Outras, com velas bordôs trabalhadas em dourado. Havia luminárias em alguns pontos especiais que emitiam luz bordô. A maior parte da decoração ficava ao ar livre, mas havia algumas mesas e enfeites que estavam na vasta varanda da casa. Havia uma banda tocando e os outros convidados começaram a chegar, entrando pelo vistoso portão de ferro, revestido de flores e caracóis de ouro, e atravessando o riacho ao redor do qual floresciam lindas rosas de Chloris. Todos estavam elegantemente vestidos. Aléxia andava no meio das decorações e dos convidados cumprimentando e conversando com todos. Mas queria poder se sentar com seus amigos, com Adérito e Osmond e conversar mais sobre a Alemanha, que além da lira e da Geografia, era sua grande paixão. Queria perguntar sobre a cultura, o povo, os lugares, a língua. Queria aprender o máximo que pudesse sobre o país, principalmente com tão agradável moço. Ela não entendia ao certo o porquê dessa paixão toda por um país com o qual

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não tivera qualquer contato ou ligação. Exceto por lembranças muito vagas de um menino alemão que estudara durante um ano com ela e fora seu amigo quando era mais nova. Seu nome era Ralf, ou seria Rulf? E, também, é claro, pela parte alemã da família de Adérito. Aléxia fazia aniversário no dia 3 de março que, de acordo com o calendário helênico, é também o dia da deusa Afrodite. Por isso sempre havia duas comemorações. A família Sfakianakis era de Mykonos, uma das Ilhas Cíclades, na Grécia. Apesar de morarem em um país, em sua maioria, ortodoxo, toda a família de Aléxia era ainda politeísta, pois admiravam muito a religião e cultura da Grécia Antiga, e, além de acharem que deveriam ser conservadas, acreditavam realmente naquilo que, pelos os outros, era chamado de mitologia. Portanto, cultuavam os vários deuses gregos, em especial a linda deusa do amor e da beleza. O pai, Péricles, era um ilustre médico muito admirado por toda a Grécia. A mãe, Penélope, não tinha nada a ver com seu nome, que quer dizer “aquela que desfia tecidos”, pois passava longe de trabalhos manuais. Os dois gostavam muito de saber o significado e a origem dos nomes, achavam que eram informações importantes, até para a formação do caráter de uma pessoa. Também gostavam de imaginar que os nomes poderiam ter algum tipo de força. E, embora não acreditassem muito nessa ideia, os filhos do casal tiveram seus nomes escolhidos de acordo com a função que deveriam exercer na família. Assim, o mais velho, de 19 anos, chamava-se Macário e traria felicidade e alegria para a casa. Depois vinham Helena e Hélio, os gêmeos de 17 anos que iluminariam o caminho da família. As trigêmeas de 16 anos, Carina, com graça e bom humor, Calina, a espirituosa e Calistene, que traria força e

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beleza. Então vinha Aléxia, que sempre defenderia a família. E por fim Otacílio, de 13 anos, que sempre escutaria os problemas de todos. Célia, que traz a verdade, e Calistrato, que comanda, eram filhos de Basileu e Acácia, estes morreram em um voo para a Inglaterra quando seus filhos eram ainda bem crianças, e, portanto, eles foram para a casa do tio Péricles, irmão mais velho de Basileu. Célia tinha 14 anos e era muito impulsiva e falante. Era a pessoa em quem Aléxia mais confiava. Seu irmão, Calistrato, de 16, era muito maduro e, talvez por isso, se dava muito bem com Macário, apesar da diferença de idade. Todos estavam muito felizes com a grande festa. Gente de toda a cidade e até de outras partes do país compareceram. A família toda de Aléxia estava no aniversário, suas tias, tios, primos, avós, avôs. E todos os seus amigos também. A maioria dos convidados já estava acomodada na festa, a música já tocava e todos elogiavam a deliciosa comida, quando se deu início à cerimônia dos pratos. Para depois começarem os discursos, fotos e danças, momento pelo qual todos esperavam, pois era aí que realmente começava a festa. As trigêmeas usavam tubos iguais, um verde-escuro, outro preto e o outro rosa-shocking. Brincos, sombras e sandálias combinando com os vestidos. Os cabelos castanhos presos com laços da cor dos vestidos. Helena usava um vestido amarelo, que lhe caia muito bem, realçando seu bronzeado; era a única irmã que adorava ficar horas ao ar livre e tomar sol, uma vez que suas funções eram iguais – iluminar. Penélope usava um elegante vestido marfim com detalhes em pedras. Os homens da família estavam todos de smoking preto ou azul-escuro. Todos pegaram seus pratos. Chegara a hora.

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Atualmente a cerimônia de quebra de pratos é realizada com flores. Mas, por ser uma família que adora conservar os antigos costumes gregos, todos fizeram um círculo, pegaram seus pratos e, ao som de bouzouki, começaram a estilhaçá-los enquanto dançavam alegremente em torno de uma fogueira. Toda a emoção reprimida era extravasada. A tensão era destruída com a louça e deixava o espírito leve para dançarem à vontade. Dançaram o tsámikos, dança típica que imita a batalha dos gregos contra a ocupação dos otomanos. Dançaram também o tsiftetéli, dança popular que se parece com a dança do ventre, nela os casais dançam em cima das mesas. Por fim, fizeram a libação para Afrodite, derramando vinho em homenagem à deusa. Esse ritual era praticado na Grécia Antiga e consistia em derramar vinho, água, mel ou leite para que os deuses se alimentassem. Em seguida, Aléxia foi chamada ao palco. Subiu lentamente os degraus e seu olhar cruzou com o de seus pais, os olhos dela brilhavam. A mãe lhe entregou sua linda lira. Era bastante antiga, porém muito bem conservada. Era feita de uma madeira brilhosa e macia, trabalhada formando pequenos caracóis no fim de seus montantes. Aléxia esticou os braços, acolhendo gentilmente o instrumento, como se fosse um bebê que precisasse de todo o cuidado. Posicionou-se e pôs-se a percorrer com o plectro, com agilidade e graça, cada uma das oito cordas, tão naturalmente como se fizesse parte de seu próprio corpo. Produzindo uma doce melodia, capaz de penetrar nos ouvidos e arrastar delicadamente os corações de cada um dos convidados através de ondas de puro encanto, deleitar e sensibilizar até ao mais frio dos humanos.

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