SIENNA MERCER
SurpreenDentes
S達o Paulo 2010
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CAPÍTULO 1 Ivy Vega arrastou-se sonolenta até a sala onde o café da manhã era servido, sentou-se preguiçosamente numa cadeira e apoiou a bochecha na mesa de pedra fria. Desejava estar ainda em seu caixão. Detestava as manhãs de segunda-feira. – Bom dia, dorminhoca! – disse-lhe o pai, depositando uma tigela ao lado de sua cabeça. – Shh – murmurou Ivy, de olhos fechados. – Ainda estou dormindo. – É o seu prato favorito – o pai procurou convencê-la. – Coágulos sanguíneos com marshmallow. Ivy deu uma olhada nos pequeninos marshmallows brancos com pedacinhos marrons boiando no caldo leitoso. – Obrigada – balbuciou ela. 7
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O pai já estava vestido para ir trabalhar: calças pretas chino1 e uma camisa também preta, risca de giz, com punhos franceses. Bebia seu chá e pegou o controle remoto da TV. – Não há nada melhor para uma mente jovem entediada pela manhã do que a tediosa programação matutina na televisão. Zapeou pela previsão do tempo e alguns programas de entrevistas antes de se fixar no The Morning Star2. – Por favor, não! – pediu Ivy. – O sorriso de Serena Star brilha tanto que posso ter queimaduras de segundo grau só de olhar para ela. Serena Star, a repórter mais famosa de um canal de TV a cabo canadense, tinha um cabelo inacreditavelmente louro e brilhoso, e uns olhos que, de tão arregalados sempre, pareciam ter sido modificados com cirurgia plástica para manter aquela permanente expressão de espanto ou empolgação. Nos últimos tempos, vinha tentando se afirmar como jornalista séria em seu próprio noticiário matutino, The Morning Star. Não fazia muito tempo, Ivy havia desligado a televisão irritada, depois que Serena per1 As calças chino foram originariamente produzidas na China e chino é o termo
espanhol para chinês. São feitas de algodão, uma espécie de sarja, e se tornaram popular nos EUA em 1900, após a Guerra Espanhola-Americana. (N.R.) Literalmente, “estrela da manhã”. É como o planeta Vênus é chamado, pois pode ser visto ainda brilhando no céu ao amanhecer. 2
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guntou: “Diga-me, Sr. Senador, como é ter uma lei com o seu nome?”. Naquela manhã, Serena Star estava parada de costas para uma pequena multidão, falando ao microfone. Usava uma minúscula minissaia de camurça azul por baixo de um trench coat que ia até os joelhos, e a expressão em seus olhos grandes dizia “choque!”. Encontrava-se em um parque ou, talvez, num cemitério. Um adolescente desleixado, vestido de preto, estava ao lado dela... O pai de Ivy trocou de canal. – Volte para onde estava! – Ivy falou rápido. – Mas, você disse... – Eu sei. Mas, volte! – repetiu ela. Ivy não podia acreditar no que via. O garoto ao lado de Serena Star não era outro senão Garrick Stephens, um dos vampiros mais toscos de sua escola. Ele e seus amigos bobões – que todos chamavam de Feras – estavam sempre fazendo idiotices, como apostar qual deles aguentava comer mais pedacinhos de pão de alho antes de passar mal de verdade. Aparentavam ser perigosos, mas, na verdade, não eram de nada. Uns chatos de galochas, isso sim! O que ele estaria fazendo ali, em rede nacional? – Ivy se perguntou. – Acho que é o cemitério do bairro – observou o pai dela. Ivy se deu conta de que ele tinha razão: aquilo estava sendo filmado a menos de cinco quadras de sua casa. A câmera focalizou uma sepultura aberta, e o pai de Ivy aumentou o volume. 9
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– ... ontem, as coisas em um funeral numa cidadezinha deram terrivelmente errado – dizia a voz de Serena Star em off. – O Sr. Alan Koontz, um morador local, faleceu e seu enterro estava previsto para ser realizado aqui, no Cemitério Franklin Grove. Quando o Sr. Koontz estava sendo baixado ao túmulo, segundo testemunhas oculares, o caixão se abriu. – A câmera deu um close no reluzente ataúde azul-escuro aberto ao lado da sepultura. – Numa bizarra reviravolta nos eventos, de dentro dele saiu alguém aparentemente vivo! – Serena prosseguiu: – A viúva do Sr. Koontz desmaiou na mesma hora e foi levada às pressas para o Hospital Geral de Franklin Grove. O rosto de Serena Star, com a testa franzida, reapareceu na tela: – Amigos da família dizem que a pessoa que surgiu não se parecia nem um pouco com o Sr. Koontz e tratavase, na verdade, de um adolescente. – A câmera afastou-se para mostrar Garrick, que estava lambendo a palma da mão e passando-a no cabelo, para ajeitá-lo. Agora, Ivy também estava com a testa franzida; Garrick e os amigos dele não conheciam o significado da palavra “discrição”. Provavelmente, sequer sabiam como se escrevia isso. Desde quando eram pequenos, Ivy sempre se admirou de como os Feras rotineiramente viviam no limite de quebrar a Primeira Lei da Noite: vampiros jamais devem revelar sua verdadeira natureza a quem não pertence à sua espécie. 10
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Tal pensamento deixou Ivy desconfortável. Afinal de contas, ela própria havia quebrado a Primeira Lei recentemente. Não teve escolha, entretanto: não poderia manter o segredo de que era uma vampira para sua irmã gêmea idêntica, Olivia, mesmo ela sendo humana. Ela e Olivia haviam descoberto a existência uma da outra no início do ano letivo. As duas foram separadas ao nascer e adotadas por famílias diferentes, de modo que Ivy não sabia que tinha uma irmã gêmea até Olivia entrar para a Escola Franklin Grove. Posso ter quebrado a Primeira Lei, mas, pelo menos, não me revelei para o mundo inteiro em rede nacional!, pensou Ivy. Serena Star encarava a câmera: – Eu, Serena Star, trago agora uma entrevista exclusiva com o garoto de 13 anos que quase foi enterrado vivo. Creio que vocês irão achar essa história realmente... IMORRÍVEL! – uma tarja com a palavra “IMORRÍVEL!” se materializou sobre a cabeça de Garrick, e Ivy revirou os olhos. Serena sempre escolhia palavras ridículas como aquela para suas manchetes eletrônicas. – Impressionante! – Garrick Stephens sorriu de orelha a orelha. A cabeça de Ivy doeu. Como iremos fazer, pensou ela, para encobrir o caso de um vampiro levantando do caixão no meio de um funeral? – Sr. Stephens – Serena Star virou-se para olhar na direção do entrevistado. – Como você está se sentindo? – Eu me sinto ótimo! – Garrick disse. 11
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– Espantoso! – Serena comentou, franzindo a testa ligeiramente. Estava claro que ela esperava que Garrick estivesse aborrecido. – Quanto tempo você ficou naquele caixão? – Tipo sete, oito horas. – Deve ter sido muito perturbador – Serena Star falou, em sinal de solidariedade. – Só quando os coveiros me acordaram ao carregarem o caixão – Garrick contou, olhando para a câmera com ar chateado. – Você está me dizendo que estava dormindo ali? – perguntou Serena Star, com os grandes olhos ainda mais arregalados. – É isso aí – respondeu Garrick. – Dormi como uma pedra. Ivy fez uma careta quando Serena Star sacudiu a cabeça, incrédula. – Parece até que você curtiu a experiência. Garrick encolheu os ombros. – Sr. Stephens – Serena Star continuou, com uma pontinha de desaprovação em sua voz – que tipo de pessoa dorme num caixão? – Não foi essa minha intenção – Garrick encolheu os ombros novamente. – Sério? – disse Serena Star. – E qual foi? Garrick estava prestes a responder, mas, então, pareceu mudar de ideia. Cruzou os braços. – Não quero encrencar meus camaradas. – Está dizendo que as pessoas que fizeram isso com você são amigos seus? – perguntou Serena Star. 12
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– Sem dúvida – respondeu Garrick, sorrindo. – Tem certeza... – A gente apavora na Escola Franklin Grove! – gritou Garrick, exibido. – Ei, Kyle, Ricky, Dylan! Estou na TV! Que perfeito imbecil!, pensou Ivy. – O que seus amigos planejavam, exatamente? – quis saber Serena Star. – Eles me desafiaram a entrar no caixão – explicou Garrick, com os olhos marotos cintilando. – Foi por isso que eu fiz. Ivy sabia que Garrick estava mentindo, só de olhar para a cara dele. Só estava fingindo que havia sido uma aposta para evitar revelar algum dos segredos dos vampiros... como, por exemplo, o fato de que eles dormiam em caixões. Mesmo assim, tratava-se de uma desculpa esfarrapada, ainda mais depois de dizer que “nunca havia dormido tão bem”. – O Interna 3 é o melhor caixão que existe – continuou ele, sem pensar, agarrando o microfone. – Nele, “descanse em paz” é mesmo pra valer! – Sr. Stephens, por favor – interrompeu Serena. – Isso ainda não explica como você veio parar no funeral do Sr. Koontz. – Tá bom. Acho que meus amigos pensaram que seria engraçado me deixar lá... valeu, caras! – Garrick deu uma piscadinha. – Então, a casa funerária trocou os caixões. Você sabia que o Interna 3 é o modelo mais vendido na América? 13
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Serena Star arrancou o microfone das mãos dele: – Devemos acreditar que isso foi apenas uma inocente piada de estudantes? – disse ela a Garrick, que encolheu os ombros outra vez. – Ou – prosseguiu ela, virando-se lentamente para a câmera – há algo mais sinistro por trás disso? Ô-ou, pensou Ivy. Serena Star farejou sangue. – Obviamente, uma mórbida obsessão pela morte – Serena continuou, enquanto a câmera fechava num close de seu rosto chocado – quase custou a vida desse jovem desorientado e desajustado! – Quem você está chamando de desorientado? – ouviu-se a voz de Garrick protestar em off. – E ele não está sozinho – Serena informou, ignorando Garrick. – Uma rápida olhada nessa sonolenta cidadezinha é suficiente para revelar uma sinistra obsessão consumindo a mente de suas crianças – enquanto ela dizia isso, a TV exibiu breves imagens gravadas, mostrando alguns góticos, alunos do sexto ano, no shopping. – Será que toda a juventude da América embarcará nessa? – Serena perguntou com ar agourento, quando reapareceu na tela. Então, franziu a testa com determinação. – Eu, Serena Star, não descansarei até descobrir a maligna verdade por trás do que está acontecendo por aqui. Oh, não, pensou Ivy. Lá vem ela com aquele bordão. – Porque a Estrela da verdade deve continuar a brilhar! – Serena Star declarou dramaticamente, brandindo o microfone no ar. Aquele era o pior fechamento de matéria 14
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jornalística que Ivy já havia escutado na vida. – Sou Serena Star. Acorda, América! Entrou um comercial, e o pai de Ivy desligou a TV. – Prometa-me que se algum dia você aparecer na televisão não fará o mesmo papelão que esse garoto Garrick Stephens – ele pediu. – Não tem graça, pai – disse Ivy. – Se Serena Star começar a investigar seriamente os góticos de Franklin Grove, sabe o que ela pode descobrir. E se ela acabar desencavando a existência de vampiros? Nunca mais nenhum de nós estará seguro! O pai depositou a xícara de chá na mesa. – Ivy, estamos falando de uma mulher cuja matéria mais bombástica foi sobre os calçados dos ricos e famosos! Duvido muito que ela seja capaz de descobrir qualquer prova. Além disso, é só surgir uma nova fofoca em Hollywood que Serena Star se esquece de Franklin Grove. Ivy suspirou. – Espero que tenha razão – ela falou, levantando-se para levar sua tigela vazia para a cozinha – pois, se não tiver, vai ficar muito difícil conseguir coágulos sanguíneos com marshmallow por aqui. Ao estacionarem diante da Escola Franklin Grove naquela manhã de segunda-feira, Olivia Abbot passava seu batom cor-de-rosa, olhando-se no espelhinho da viseira do assento do carona, quando ouviu sua mãe soltar uma ex15
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clamação de espanto. Olivia levantou a viseira e viu uma pequena multidão aglomerada na escadaria da escola e uma fileira de vans de reportagem ao longo do meio-fio. – Uau! – disse Olivia. Sua mãe estacionou em fila dupla e começou a descer do carro. Olivia a segurou pelo braço: – Aonde você vai? – Quero saber o motivo de toda essa confusão – respondeu a mãe. Olivia balançou a cabeça. – Você não pode entrar comigo. – Por que não? – perguntou a mãe. – Porque estou na oitava série – explicou Olivia. A mãe dela sorriu e sacudiu a cabeça. – Bem, está certo – concordou com um suspiro. – Não é por você – Olivia confortou-a. – Vale para todas as mães. É uma espécie de regra. Eu telefono para você – deu um beijo na mãe e saiu do carro, espremendo-se para passar entre duas vans. Começou a subir os degraus, tentando não tropeçar nos cabos do aparato televisivo, enquanto abria caminho por entre as pessoas. Examinando a aglomeração de repórteres, enxergou lá adiante uns cabelos louros encaracolados que conhecia: – Camilla! – chamou. Camilla Edmunson virou-se e acenou. Quando Olivia se juntou a ela, perguntou: 16
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– Dá pra acreditar numa coisa dessas? – O que está acontecendo? – perguntou Olivia. – Todo mundo está tentando aparecer na TV – Camilla respondeu. Perto delas, Olivia viu Kyle Glass, um dos garotos do grupo que todos chamavam de Feras, colocando chifrinhos por trás da cabeça de um repórter, que nem percebia o que estava acontecendo. O câmera gesticulava freneticamente tentando afugentá-lo. Olivia franziu a testa. – Hum, eu perdi alguma circular? – Vai me dizer que você não está sabendo? – Camilla perguntou incrédula. – Garrick Stephens saltou de dentro do caixão de alguém no meio de um enterro, ontem. Foi parecido com o que o vilão Zolten fez quando escapou escondido numa cápsula criogênica. Olivia presumiu que a amiga estivesse se referindo a um de seus adorados livros de ficção científica. Olivia, por sua vez, sempre havia preferido a ficção vampiresca. Na verdade, quando se mudou para Franklin Grove, ela pensava que vampiros eram apenas ficção. E não é que estava errada? Ainda ficava atordoada quando parava para pensar no fato de que Franklin Grove estava cheia de vampiros: vivendo, respirando, bebendo sangue. A maioria dos quais, com exceção de Garrick e seus amigos, era realmente legal. Afora ela, nenhum dos outros humanos em Franklin Grove fazia a menor ideia de que a cidade era uma espécie de quartel-general dos vampiros, pois a Regra Número 17
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Um do Código Vampiresco era: não conte a ninguém. Portanto, saltar de um caixão durante um funeral provavelmente estava fora de cogitação. Olivia só sabia dos vampiros por causa de Ivy Vega, que ela havia conhecido no seu primeiro dia de aula na Escola Franklin Grove. Olivia era a típica líder de torcida e Ivy era gótica até a raiz dos cabelos; por isso, a princípio, pareciam tão diferentes como bala preta de alcaçuz e algodão doce. Mas não demorou muito para Olivia e Ivy se darem conta de que uma era exatamente a cara da outra. – Na verdade – e isso era o mais estranho, como concluiu Olivia – elas eram gêmeas idênticas. Idênticas a não ser por um detalhe: Ivy era vampira! – Não importa – respondeu Camilla. – O caso é que, agora, a América inteira está fascinada por Franklin Grove, e a mídia – especialmente Serena Star – está tentando tomar Garrick como exemplo do declínio da juventude americana. – Não acredito! – Olivia ficou de queixo caído. – Serena Star da WowTV? Ela é famosa pra caramba! Camilla balançou a cabeça, confirmando, embora estivesse claro que não estava tão impressionada: – Ela acha que todos nós escondemos algum segredo terrível. Olivia sobressaltou-se. – Tipo o quê? – Sei lá... – disse Camilla. – Duvido que ela encontre alguma coisa. Franklin Grove provavelmente seja a cidade mais normal da América. 18
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Olivia deu um sorriso amarelo. Camilla não fazia ideia. É melhor eu encontrar Ivy, pensou Olivia – para ver o que ela está achando dessa história! – Vamos entrar? – perguntou. Ela e Camilla contornaram a multidão para chegar à entrada da escola. De repente, Olivia escutou uma conhecida e estridente vozinha chamar o seu nome. Tentou ignorá-la e continuar seu caminho, mas a vozinha insistiu, ainda mais alto: – OLIVIA! Olivia fez uma careta e disse para Camilla prosseguir sem ela. Então, relutantemente, virou-se para Charlotte Brown, a capitã de sua equipe de líderes de torcida, gesticulando de longe para que se reunisse a ela em seu círculo de câmeras. Desde que Olivia havia entrado para a equipe, poucas semanas antes, Charlotte parecia ter-se esquecido de que havia sabotado Olivia no teste para líder de torcida. Na verdade, Charlotte e suas amigas Katie e Allison tratavam Olivia agora como “amiga do peito para sempre”. Pelo menos, isso mantém a equipe atuando como um time, pensou Olivia, enquanto ia até lá. – Conte a eles, Olivia! – disse Charlotte, agarrando-a pelo braço e puxando-a para a frente das câmeras. – Sabe? Como é ser nova por aqui. Como é assustador, com tantas más influências. Olivia franziu o nariz. Alguém bateu uma foto. – Eu, hum, realmente não... 19
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Um repórter de terno amassado meteu um microfone na cara de Olivia: – Alguma vez você já dormiu num caixão? – Não – respondeu Olivia, incrédula. Uma mulher, de gravador em punho, perguntou: – Você é amiga de uma gangue de rua conhecida como os Feras? Olivia sacudiu a cabeça: – Eu não os chamaria propriamente de... Uma mulher baixa e decidida, trajando um terninho laranja justo, abriu caminho por entre os outros na marra, com o cabelo louro brilhando ao sol. Olivia abriu a boca em choque: era Serena Star em pessoa! Ali, ao vivo, parecia muito mais baixa do que na TV. – Alguma vez – Serena Star disse, enfiando o microfone debaixo do queixo de Olivia – você se sentiu ameaçada por todos à sua volta se vestirem de preto? – perguntou. Charlotte meteu-se diante dela. – Sim, Serena, totalmente! – gritou ela, visivelmente empolgada por estar falando com uma celebridade como Serena Star. – Uma vez – disse ela, sacudindo o cabelo de maneira dramática – eu estava no banheiro feminino, retocando o brilho labial, quando duas góticas entraram. Vestiam preto da cabeça aos pés, e até suas unhas eram pintadas com esmalte preto. E adivinhe só o que elas fizeram? Elas rosnaram para mim! – Rosnaram para você? – Serena Star repetiu. – Aham – Charlotte confirmou balançando a cabeça, muito séria. – Fiquei tão assustada que fugi sem passar rímel! 20
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– Então, você acha que é um problema – Serena Star insistiu – que tantos alunos em Franklin Grove sejam obcecados “pelas trevas”? – Totalmente! – Charlotte concordou. – Usar preto é tão ultrapassado – apontou os sapatos azul-turquesa salto agulha que Serena Star usava. – Por falar em moda, eu simplesmente amei seus sapatos. São de Hollywood? Olivia aproveitou a oportunidade para sair de fininho, subir a escadaria correndo e entrar na escola. Precisava conversar com a irmã sobre o que estava acontecendo lá fora. Do final do corredor, avistou Ivy parada ao lado de seu armário, com seu novo namorado, Brendan Daniels. Até mesmo Brendan ainda não havia reparado que ela e Ivy eram idênticas. – Vejo você depois, tudo bem? – Olivia escutou Brendan dizer. Ivy retorceu o pingente de esmeralda na corrente em torno do pescoço. – Está certo – concordou ela. Sua irmã estava tão apaixonada. Olivia achava isso uma gracinha. Enquanto esperava que Ivy e Brendan terminassem de se despedir, Olivia brincava com o anel de esmeralda em seu dedo. Na verdade, havia sido graças às esmeraldas idênticas que Ivy e Olivia se reconheceram. As joias eram tudo que lhes restava dos verdadeiros pais. Brendan passou por ela com um amistoso “Oi, Olivia!” e Olivia andou apressada até sua irmã. 21
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– Deixe-me adivinhar – começou Olivia. – Você ainda não contou a ele sobre nós. – Juro que tentei – respondeu Ivy, tirando o suéter todo preto e revelando uma camiseta baby-look cinza estampada com o rosto de Edgar Allan Poe. – Mas parece que nunca encontro o momento certo de dizer: “Ei, a propósito, tenho uma irmã gêmea da qual desconhecia a existência”. – Vamos acabar sendo obrigadas a contar para todo mundo, inclusive aos nossos pais. De repente, houve um tumulto no final do corredor e Olivia ergueu a vista para ver Garrick Stephens caminhando a passos largos, usando óculos escuros e uma camiseta preta com os dizeres “INTERNA 3 – DESCANSE EM PAZ!” Os outros Feras vinham logo atrás dele. As pessoas abriam caminho para eles passarem, como se Garrick fosse uma estrela do futebol que acabasse de vencer um jogo importante... ou de perder um jogo importante por jogar a favor do time adversário. – Quem quer autógrafo? – Garrick perguntava despreocupadamente. – Quem quer autógrafo? Ivy sacudiu a cabeça, zangada. – Que vontade de estrangular esse cara! – disse ela. – Acredita que fui obrigada a entrar pela porta lateral esta manhã? Brendan também. Do contrário, não conseguiríamos sair vivos da confusão em frente à escola. – É sobre isso que queria falar com você – respondeu Olivia. – Vi Charlotte sendo entrevistada pela Serena Star. Ela disse que, certa vez, duas góticas rosnaram para ela no banheiro. 22
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– Não foi um rosnado – protestou Ivy. – Foi um latido. Palavra de honra: ano passado, ela fez um permanente no cabelo que a deixou parecendo um poodle. Olivia riu, mas sua irmã ficou séria. – Isso é muito grave, Olivia – Ivy disse, preocupada. – Pensei que essa história fosse cair no esquecimento rapidinho, mas isso não vai acontecer com todos esses repórteres por aí e Charlotte e Garrick querendo chamar atenção. Sophia Hewitt, a amiga mais antiga de Ivy, apareceu, com a sua enorme câmera digital pendurada no pescoço. – Código negro – sussurrou de maneira misteriosa. – Repito, código negro – disse isso e desapareceu no corredor. Ivy apressou-se em colocar a bolsa de couro preto no ombro e a fechar a porta do armário. – O que significa código negro? – Olivia perguntou em voz baixa. – Banheiro da ala de Ciências – Ivy falou, disparando pelo corredor. Olivia correu para alcançá-la. As duas empurraram a porta do banheiro e encontraram Sophia checando se as cabines estavam vazias. Então, ela se virou para Ivy e Olivia com as mãos nos quadris. – Garrick Stephens não estava numa aposta. Estava fazendo um test-drive! – Você está falando sério? – Mortalmente sério – respondeu Sophia. – Não entendo, disse Olivia. – Os vampiros fazem upgrade nos caixões assim 23
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como a maioria das pessoas fazem com seus celulares – explicou Ivy. – E o Interna 3 é o modelo mais avançado, o sonho de consumo de todo vampiro que se preza – acrescentou Sophia. – Não é provável que Garrick possa adquirir um. Ele simplesmente achou que seria divertido experimentá-lo. Ivy franziu a testa. – Os proprietários das casas funerárias geralmente são vampiros. O mostruário tem múltiplos propósitos. Mas, dessa vez, acho que eles misturaram o mostruário com o caixão do morto. Sophia mordeu uma unha pintada de preto. – Estou realmente preocupada, Ivy. Serena Star parece desesperada por uma grande história. Mesmo se ela não conseguir encontrar uma, provavelmente vai fabricá-la! Foi só então que Olivia começou a perceber o quanto estava em jogo. Não se tratava apenas de uma matéria sensacionalista de TV. Podia virar a maior caça às bruxas desde, bem, a caça às bruxas. O que as pessoas fariam se descobrissem que há vampiros vivendo entre elas? – Nós realmente precisamos tirar Serena Star da nossa cola – disse Sophia. Ivy e Olivia concordaram. – O que você tem em mente? – Ivy perguntou. – Nada! – disse Sophia, desesperada. – Foi por isso que arrastei vocês duas para cá. Ivy suspirou, e as três garotas ficaram em silêncio por um momento. – Precisamos de algo para desviar a atenção – Olivia 24
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acabou dizendo. – Exatamente – concordou Ivy. – Meu pai acha que Serena Star se esquecerá de Franklin Grove assim que surgir uma fofoca nova em Hollywood. – Maravilha! – Sophia respondeu com sarcasmo. – Tudo que uma de nós precisa fazer é começar a namorar o cara mais gatinho do momento segundo a revista Celebridades. – Posso me voluntariar? – candidatou-se Olivia, tentando quebrar a tensão. – Só estou dizendo – Ivy respondeu à Sophia com rispidez – que precisamos achar uma história que seja mais interessante para Serena do que vampiros. – Está certo – disse Olivia – vamos nos acalmar. Talvez possamos convencer Serena de que há lobisomens em Franklin Grove em vez de vampiros... ou alguma outra coisa idiota assim. Ivy e Olivia trocaram olhares nervosos. Olivia piscou. – Não me digam que há lobisomens em Franklin Grove! Ivy arqueou as sobrancelhas no momento em que o sinal para a primeira aula soou. – Salva pelo gongo! – Sophia deixou escapar. Ela e Ivy saíram apressadas do banheiro, deixando Olivia ali parada, boquiaberta.
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