Mistério de Elêusis: o mestre do crime

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Márcio Sidney

MISTÉRIO DE ELÊUSIS Volume 1

o mestre do crime

TALENTOS DA LITERATURA BRASILEIRA

São Paulo, 2015

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Mistério de Elêusis: O mestre do crime Copyright © 2015 by Márcio Sidney Copyright © 2015 by Novo Século Editora Ltda.

gerente editorial

gerente de aquisições

Lindsay Gois

Renata de Mello do Vale

editorial

assistente de aquisições

João Paulo Putini Nair Ferraz Vitor Donofrio

Acácio Alves auxiliar de produção

preparação

revisão

Vânia Valente

Luiz Alberto Galdini Larissa Caldin

diagramação

Equipe Novo Século

Luís Pereira

capa

Renato Klisman

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor desde 10 de janeiro de 2009. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) (Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil) Sidney, Márcio Mistério de Elêusis, volume 1 : o mestre do crime Márcio Sidney Barueri, SP: Novo Século Editora, 2015. (talentos da literatura brasileira) 1. Ficção brasileira I. Título. II Série. 15­‑00048

cdd­‑869.93

Índice para catálogo sistemático: 1. Ficção : Literatura brasileira 869.93

novo século editora ltda. Alameda Araguaia, 2190 – Bloco A – 11o andar – Conjunto 1111 cep 06455­‑000 – Alphaville Industrial, Barueri – sp – Brasil Tel.: (11) 3699­‑7107 | Fax: (11) 3699­‑7323 www.novoseculo.com.br | atendimento@novoseculo.com.br

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Para meu pai e minha mãe. Eternos incentivadores.

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agradecimentos

Agradeço a Deus, por ter colocado em minha vida pais tão maravi‑ lhosos e que em tudo me ajudaram, à minha mãe, pela educação, a meu pai, pelo apoio, aos meus amigos, por compartilharmos sonhos, e à Editora Novo Século, por essa minha realização.

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cRIMES DE MESTRE

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[ELÊUSIS 1]

JOgO DE MESTRES

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uropa. Ano: 2040… O MILENIUN, um luxuoso museu, recebeu pouco tempo atrás uma mensagem datando o dia em que seria roubado. Eventos misteriosos como esses já vinham acontecendo há alguns anos e contra diversas instituições, porém, os detalhes acerca dos crimes, e principalmente, acerca dos ladrões, eram conhecidos por poucos. Todos esses crimes tinham apenas duas peculiaridades. A primeira, to‑ dos eram prévia e anonimamente avisados aos proprietários das instituições postas como alvo. A segunda era o fato dos criminosos serem geniais em burlar toda a segurança eletrônica – às vezes, como se ela nem ao menos existisse –, despistar todos os guardas e, por fim, alcançarem seus objetivos. No MILENIUN, essa história estava para se repetir; e o roubo, que parecia inevitável devido à triste realidade desses ladrões nunca serem im‑ pedidos, destinado a acontecer. Entretanto, o dono do MILENIUN, o Sr. Felix Feldman, era muito influente. Seu próprio museu servia para demonstrar o poder que tinha para conseguir objetos inestimáveis. Um suntuoso museu de várias alas, como alas de quadros, joias, antiguidades; e continha em especial uma área dedicada à alta tecnologia, a qual estava sempre sendo atualizada, apresentando grandes novidades e fazendo muito sucesso, pois, en‑ quanto muitos museus apresentam o passado, esse tinha uma ala onde fazia seus visitantes se deslumbrarem com o futuro. 11

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Com a honra em risco, Feldman não poderia simplesmente esperar que o MILENIUN não fosse roubado, tampouco depois do que ficou sa‑ bendo acerca dos ladrões e suas façanhas. Ele logo providenciou o que de melhor havia no quesito segurança. O que foi simples. Foi só contratar a NEW SILVER; e ele tinha bons motivos para contratá­‑la, os serviços dela eram impecáveis. E o interessante era: até mesmo as instituições anterior‑ mente roubadas agora se serviam­do sistema de segurança dela e, após isso, passaram a ser invioláveis. Lamentavelmente, o museu até então não tinha essa nova e implacável segurança, apesar de ter uma excelente proteção; todavia, Feldman não queria dar a grande chance aos gatunos. E como não restava tempo para instalar o novo sistema, solicitou aos diretores da NEW SILVER que to‑ massem alguma providência que garantisse que a MILENIUN não fosse roubado. E, em resposta a tal pedido, cinco experts lhe foram indicados com a garantia de que eram tão bons quanto os ladrões que iriam combater; e certamente, além dos sistemas tecnológicos de segurança, eles eram os únicos, pelos seus talentos e habilidades, que se demonstravam capazes de evitar tal roubo. Na noite da data marcada a MILENIUN foi invadido; a começar com uma avassaladora invasão eletrônica que comprometeu quase todos os sistemas de segurança. Mas, dessa vez, esses especialistas estavam lá para cooperar com a segurança e evitar o roubo a qualquer custo; porém, o retrospecto desses crimes pré­‑avisados dava a entender que isso não seria fácil.

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[SIncROnIa I]

o rouBo

a

primeira vez que se tem relato de que esse grupo cometeu um crime avisando antes (o que em nada garante que esse tenha sido o primeiro crime do grupo, mesmo que previamente avisado) foi quando um banco europeu, não se sabe exatamente qual, misteriosamente recebeu uma mensagem dizendo que à meia‑noite 1 centavo seria retirado de cada conta. Bem, para um hacker com um programa avançado, e que já tivesse minado as seguranças virtuais do banco há um bom tempo, isso poderia até ser possível. Mas a segunda proposta dos ladrões pareceu absurda aos seguradores do banco. Eles informaram que, próximo ao horário desse roubo, o próprio cofre do banco seria aberto. – Matamos a charada – disse orgulhosamente Frank, o principal responsável pela segurança do banco, e explicou: – É simples! Uma des‑ sas informações pode ser verdadeira, a outra com certeza não. Se for o caso, os ladrões só querem cometer um roubo virtual, mas eles precisam que fiquemos distraídos com a outra possibilidade, eles querem que nos preocupemos também com a segurança interna do banco para terem alguma chance. – Como assim? – perguntou Gonçalves, o dono da agência bancária, revelando‑se preocupado com ambas as ameaças. – Fique tranquilo, não vai acontecer! – respondeu Frank. Mas, nada satisfeito com tal proposta, Gonçalves se propôs a perguntar com ênfase:

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– Como assim, ficar tranquilo, com a possibilidade dos clientes e do banco serem roubados ao mesmo tempo? – Exatamente por isso! Não é possível que ambos aconteçam ao mes‑ mo tempo – afirmou o chefe da segurança que, para demonstrar sensatez, argumentou: – Esses ladrões teriam de ser gênios da informática para bur‑ lar nosso sistema de contas, e fantasmas para passarem despercebidos por toda a segurança interna. – Então é isso? – indagou, ainda insatisfeito. – Não vamos fazer nada só porque supomos que esse roubo é impossível? – Não é isso! Veja o que vamos fazer.Vamos colocar a tranca do cofre totalmente fora da rede. Assim, nenhum hacker poderá abri­‑lo por mais que seja genial ou tenha um sofisticado programa invasor. Então, primeiro problema resolvido. – Já que havia um modo exclusivo para o dono abrir o cofre sem estar presente; mas esse sistema, agora, seria desabilitado. E, após um sorriso de satisfação, o chefe da segurança continuou a argumen‑ tar: – Com isso, nenhum ladrão poderá abrir o cofre para zombar de suas habilidades, a menos que esteja frente a frente com ele; e francamente, Sr. Gonçalves, você não espera que algum espertinho passe por nosso sistema interno de segurança só para abrir o cofre, e isso enquanto ainda pretende tirar 1 centavo de cada conta? – Certamente, não espero que isso aconteça! – respondeu o Sr. Gon‑ çalves, ainda temendo que algo pudesse acontecer. – Tudo nos planos, senhor! Uma vez que o cofre não será aberto, só precisamos confiar no nosso sistema de segurança das contas e pronto! Mas se o senhor acha que esse hacker vai conseguir roubar alguma coisa, nós podemos fazer melhor, podemos manter um plantão e ficarmos vigiando as contas dos clientes – sugeriu Frank, supondo que isso seria mais do que necessário, mas ele viu nos olhos de Gonçalves que ele queria que algo mais fosse feito. Gonçalves de imediato aceitou a sugestão e, na noite marcada para o crime, ele deixou os funcionários mais experientes e confiáveis fiscalizando o sistema de contas hora após hora, tudo sobre a supervisão constante de Frank. E então, às 23h soou o alerta no banco. Os ladrões finalmente fizeram a sua primeira tentativa contra o sistema de contas, e logo os seguradores perceberam que se tratava de alguém muito experiente, porque senhas 14

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básicas foram violadas e o sistema poderia ser corrompido; mas a estrutura que já estava previamente preparada tratou de dar conta do recado. E os seguradores impuseram uma segurança que nesse período os ladrões não conseguiram prosseguir. Às 23h05 a ameaça foi totalmente neutralizada e cessou; porém, agora a equipe de segurança sabia que alguém estava mesmo disposto a invadir o sistema de contas; e mais, que eram bons e confiantes o bastante para avisarem antes. – Pronto! – disse Moreno, um experiente funcionário. – Já sabemos o que eles querem e que realmente vão tentar fazer isso. – E prosseguiu: – Mas com essa estrutura que nós preparamos, e com todos nós atentos a qualquer falha no sistema, certamente eles não vão conseguir. – Vamos checar todo o sistema para ver se nada foi corrompido – disse Marcos, outro funcionário, não tão experiente quanto Moreno, no entan‑ to, muito mais prudente. – Eles não vão conseguir violar o sistema como da primeira vez – tornou a falar Moreno, e sentenciou: – Se tentarem, não irão muito longe. Cinco minutos depois, às 23h10, alerta nos sistemas das contas. Os ladrões tentaram novamente, mas dois minutos depois a ameaça já estava totalmente sob controle. Pelo que parecia, os ladrões estavam insistindo, o que era sinal de muita ousadia, mas agora, por melhores que fossem, mal estavam conseguindo ir além do primeiro passo. – Eu não falei? – indagou Moreno, e com mais convicção ainda repe‑ te: – Eles podem tentar, mas com a gente aqui, atento, eles não irão longe. – Eles não foram tão longe como fizeram na primeira vez – disse Mar‑ cos, e sem deixar a prudência, completou: – Mas é bom ficarmos atentos. Eles são bons. Eles conseguiram entrar no sistema, e isso sem ter o acesso especial que nós temos. – Marcos disse isso porque era uma burocracia para se acessar tal sistema, e ainda mais para utilizá­‑lo; senhas pessoais de nível básico, médio e até mesmo nível elevado eram requeridas a cada etapa, de‑ vido ao grande número de informações pessoais e transações que esse sis‑ tema podia liberar. Entretanto, o próprio Gonçalves providenciou as senhas para que eles fizessem o monitoramento em cada um dos níveis.

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Às 23h30, independente das tentativas dos ladrões, toda a equipe estava muito atenta na defesa do sistema de conta dos clientes. Os ladrões haviam feito algumas tentativas, mas, indo eles mais longe ou não, as ameaças fo‑ ram totalmente eliminadas e, a cada interceptação, parecia que tinham que começar todo o processo de invasão novamente. Nesse momento, Frank olhou orgulhosamente para Gonçalves, dando a entender que inspecionar constantemente o sistema tinha sido uma boa ideia dele, ainda que ele tivesse julgado isso desnecessário, mas a menção desse plano foi dele. Estava tudo seguindo nesse ritmo até que às 23h55, inesperadamente, o alarme da sala do cofre disparou como se ele tivesse sido deixado aberto por mais tempo do que deveria.Vinte segundos depois, o alarme da porta da sala do cofre também disparou, como se tivesse sido deixada aberta além do tempo. Neste momento, Marcos, usando de sua rápida precaução, averiguou os sistemas de segurança interno e disse algo alarmante: – As câmeras só estão registrando imagens antigas, os sensores de mo‑ vimento não funcionam e os infravermelhos estão neutralizados dentro de um padrão que deixa um corredor aberto dentro de cada corredor. Logo que Marcos terminou de falar, outro alarme sinalizou que a porta de acesso à sala do cofre não estava fechada. Instantaneamente, todos perceberam que a ameaça era grave e começaram a reativar os sistemas da segurança interna que, misteriosamente, foram desativados. – Se eles entraram, monitorem o sistema interno! Eles não vão con‑ seguir sair! – gritou o chefe da segurança por puro impulso, e no mesmo fôlego acrescentou: – Ativem logo os sistemas extras, quero imagens de todas as câmeras, quero ver tudo que se mexe dentro deste banco, e tran‑ quem todas as saídas! 23h59. Devido a grande monitoração das câmeras e dos sensores in‑ ternos, o processamento da rede ficou mais lento, o que dificultou um pouco o monitoramento interno; então, para melhorar o desempenho do sistema da segurança interna, alguns funcionários fecharam o sistema das contas que antes estavam inspecionando, outros não. E, como deveria acontecer, logo a empresa contratada pelo banco mandou seus seguranças para cercarem o banco, enquanto os seguranças do banco, que não eram por necessidade muitos, fizeram uma varredura interna. Essa varredura 16

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aconteceu até à 1h do dia seguinte; todavia, ninguém foi encontrado e realmente o cofre estava aberto, mas, pelo que pôde ser observado, nada havia sido roubado. Na perícia da madrugada foi constatado que a porta do banco foi aber‑ ta por volta das 23h da noite anterior; na ocasião, o alarme havia disparado misteriosamente por uma fração de milésimos, o que só um computador le‑ varia em consideração. Pareceu também que, de cinco a sete minutos depois, alguns sistemas da segurança interna foram reprogramados e, em seguida, em um ritmo cada vez mais fulminante, cada sistema de segurança até o cofre. Observaram também que, como os ladrões deixaram o cofre aberto na saída, dez minutos depois o temporizador dele disparou, e o mesmo aconteceu com as outras duas portas. Mas nada foi levado. Devido a isso, a segurança in‑ terna e os funcionários foram coagidos a não falarem nada; e foi dada como desculpa à empresa de segurança que ela só foi alertada para o banco testar a prontidão de seus funcionários em uma eventual emergência. Por tudo o que foi analisado, os ladrões entraram em silêncio e, po‑ dendo também sair em silêncio, saíram seguidos pelo alarme por comete‑ rem um erro simples: deixarem as portas abertas. Se bem que, abrir a porta do cofre era a proposta absurda que os ladrões apresentaram na mensagem. O chefe da segurança, um homem de boa lógica, percebeu que a hora da possível entrada coincidia com a hora em que houve a primei‑ ra ameaça de invasão ao sistema de contas dos clientes, e que parecia que cada nova ameaça a esse sistema estava sincronizada a um eventual progresso dos ladrões sobre os recursos de segurança interna do banco. Assim, ele descobriu que tinha adotado exatamente o plano que eles queriam. Percebeu também que os invasores desejavam que os segura‑ dores e os sistemas estivessem focados no banco de dados dos clientes, pensando que abrir o cofre do banco era apenas um engodo para despis‑ tar a atenção, quando, na verdade, tentar roubar 1 centavo de cada conta era o blefe para atrair a atenção, enquanto o sistema de segurança interna do banco era violado. Ele notou, então, que cooperou para isso, porém ainda não havia percebido quanto. – Tudo restabelecido. Não perdermos nada! – disse Frank ao dono do banco, respirando um pouco aliviado. 17

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– Agradeça a Deus! – replicou Gonçalves. – Teria sido um vexame para nós, e especialmente para você, se os ladrões roubassem algo do nosso cofre. – Não entendo! Esses ladrões fizeram isso tudo só para abrir o cofre e não levar sequer 1 centavo? – indagou Frank, em voz baixa, mais para si mesmo do que para Gonçalves. Nesse exato momento se aproximou Marcos, com uma apavorante notícia: – Sr. Gonçalves, em todas as contas que eu verifiquei está faltando 1 centavo! – Mas como? – perguntou Gonçalves a Marcos. Enquanto Frank co‑ meçava a suar frio. – Não sei. Só sei que após restaurarmos todos os sistemas internos, observei o sistema de dados de clientes, que anteriormente verificávamos para monitorar se não estava violado pelos ladrões, mas, desta vez, notei que algo havia sido alterado; e pelo que vi, isso aconteceu segundos após a porta do cofre ter alarmado. Frank então colocou as mãos na cabeça e viu a loucura que cometeu. Percebeu que o alarme interno disparou com atraso, de propósito pelos la‑ drões, pois com isso a atenção de todos se voltaria (principalmente por causa dele) para um possível roubo interno. Ele percebeu que, naquele momento, fez o que não queria fazer a princípio: preocupou­‑se com um roubo inter‑ no enquanto, na verdade, o que os ladrões queriam era efetuar um roubo através da rede que estava desprotegida devido a uma distração. Ele perce‑ beu que quando o cofre alarmou tão repentinamente, deu a ordem para monitorarem o sistema interno, o que deixou totalmente exposto o sistema das contas. E mais, ele compreendeu que a lentidão do sistema próximo à meia­‑noite possivelmente era pelo fato de eles estarem usando o sistema in‑ terno para acharem os ladrões e, simultaneamente, os ladrões estarem usando o sistema que eles deixaram aberto para subtrair um mísero centavo de cada conta. Ele percebeu como, de maneira surpreendente, a sua lógica foi usada para possibilitar o inusitado crime. Aposto que eles violaram o sistema de contas quando o alarme da porta da sala do cofre disparou. Como estávamos voltados para o sistema interno, só identificamos esse alarme disparando e não os dois. – Pensou Frank consigo mesmo como quem, 18

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depois de ter sido feito de louco, tem um surto de genialidade de como suce‑ deu o roubo. E em seguida diz: – Eles usaram o alarme do sistema de contas para ocultar o alarme interno e depois usaram o alarme interno para ocultarem o alarme de invasão ao sistema das contas – disse, como quem não acredita que isso aconteceu. E não consegue engolir a ideia de que, todo o tempo, os ladrões usaram os alarmes para os despistarem. Neste momento, o dono do banco percebeu que, por ter disponibili‑ zado a sua senha especial para os seus funcionários de confiança, havia co‑ metido um grave erro. Bastava que um dos acessos estivesse aberto ao nível mais alto de segurança para que esse computador pudesse ser usado pelos ladrões como ponte para o roubo (é mais fácil penetrar em um micro do que invadir todo um sistema), o que passou a ser mais provável quando disponibilizou as senhas. A questão era que os ladrões queriam que esse sistema já estivesse totalmente aberto e se mantivesse aberto, no entanto, também não queriam que alguém estivesse com a atenção voltada para esse sistema. Depois de concluir esse raciocínio, Gonçalves se expressou: – O tempo todo fomos induzidos a fazer o que eles queriam. – Por‑ quanto, havia compreendido que, pelo que constava no sistema, ele mesmo havia autorizado cada uma das transações. Ao perceber que o dono também foi enganado e cometeu erros que possibilitaram o roubo, Frank observou que os ladrões não estavam fazendo um joguinho de inteligência apenas com ele, mas com todos. A questão ago‑ ra era: os ladrões já teriam conseguido o que anunciaram, mas será que esse joguinho de inteligência, onde não se podia errar, já havia terminado? Ou seja, será mesmo que os ladrões já conseguiram tudo o que queriam? Frank agora estava com receio de tomar mais alguma decisão, assim pergunta: – Sr. Gonçalves, o que vamos fazer? – Veremos! – respondeu Gonçalves, dirigindo­‑se à sala onde estavam os demais funcionários para certificar­‑se quais foram os processos de tal transação. Ao chegar à sala, Gonçalves viu os funcionários frustrados e tentando entender o roubo. Relatórios foram impressos, e todos os checavam suas informações. E, antes mesmo dele perguntar, Moreno, o mais experiente, lhe deu uma informação que ironicamente era o que ele queria ouvir: 19

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– Os ladrões roubaram todas as contas, debitando de cada uma delas uma das nossas tarifas. – De que valor foi essa tarifa? – Gonçalves quis logo saber por dois motivos. Primeiro: os clientes não desconfiarão de roubo se o débito esti‑ ver identificado como tarifa do próprio banco, já que até nesse momento, os bancos cobram inúmeras tarifas. E, segundo e mais importante: o di‑ nheiro das tarifas ia para o banco. No entanto, ele ouviu algo que poderia fazê­‑lo acreditar que os la‑ drões teriam roubado de fato mais de 1 centavo de cada conta. – A tarifa cobrada foi a de Porte Mensal de Conta. Essa tarifa geralmente é no valor de 20 centavos para pessoa física e 1 euro para pessoa jurídica – respondeu Moreno. – Não estranhe! O valor dessa tarifa pode ser pou‑ co; mas com outras tarifas, os clientes pagavam um bom valor. Essa era a clássica armadilha: pague pouco pra ter, mas pague muito por ter. Raciocinando rápido, Gonçalves percebeu uma contradição: – Marcos me informou que em todas as contas que ele havia verifica‑ do tinha um débito de 1 centavo. – Para Gonçalves, se a tarifa tivesse sido aquela, o valor do roubo seria bem maior. – Exatamente! Deixe­‑me completar. – Gonçalves o havia interrompido. – Essa é uma tarifa simples e ela pode ser debitada de todas as contas de uma só vez, e também o seu valor pode ser alterado; lembre­‑se que o senhor tem a liberdade de alterar esse valor até 5 euros nas contas de pessoa física e para até 15 euros nas contas de pessoa jurídica, os ladrões apenas usaram o seu acesso para reduzir essa tarifa para 1 centavo em ambos os casos – conseguiu completar Moreno. – Certo! Agora entendo, mas diga­‑me, esse dinheiro foi para a conta do banco? – A princípio sim, mas dessa conta os ladrões fizeram um débito para uma empresa – respondeu Moreno, de maneira simples para não ser interrompido. – Para que empresa? – Gonçalves desejou imediatamente ser informa‑ do, talvez fosse possível rastrear a empresa e assim o dinheiro. – Uma empresa com o seu nome, Gonçalves!

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– O quê? Eu não tenho empresa alguma em meu nome – respondeu Gonçalves, assustado. Será que agora os bandidos queriam colocar a culpa em cima dele? – Calma! Eu disse que eles colocaram o dinheiro em uma empresa com o seu nome e não em seu nome. – Mas eu estou certo que não há em meu banco nenhuma empresa aberta que tenha o mesmo nome que o meu. – Bem que ele gostaria que houvesse uma grande empresa com conta em seu banco que tivesse o seu nome, e se tivesse, ele lembraria. – Agora tem, ou de alguma forma tinha – disse Moreno. – Os ladrões pensaram em tudo. – Me explique bem isso. – A parte de os ladrões pensaram em tudo cha‑ mou a atenção de Gonçalves. Esse crime estava se demonstrando mais engenhoso do que parecia. – Bem… conforme os relatórios – especulou Moreno –, parece­‑me que um deles se utilizou do sistema de contas dos clientes para debitar uma tarifa de 1 centavo, isso enquanto outro hacker utilizava o acesso ao mesmo sistema para, com a sua senha, abrir uma conta em nome de uma suposta empresa com o seu nome. Assim, de alguma forma, no sistema de contas, um deles teve acesso à conta do próprio banco e efetuou uma transação para a tal empresa. – Interessante, uma empresa fantasma com meu nome, mas diga­‑me, mesmo não podendo encontrar tal empresa por ela ser falsa, quanto ao dinheiro, ainda podemos rastreá­‑lo através da conta dessa empresa? – Não, Sr. Gonçalves. Após o banco pagar um suposto serviço a essa empresa, logo todo o dinheiro foi sacado de sua conta, e essa conta foi, minutos depois, cancelada e quase que totalmente apagada do sistema. – Como eles conseguiram fazer tudo isso? Quantas vezes eles inva‑ diram o nosso sistema de contas e ninguém foi capaz de descobri­‑los? Lembre­‑se, tínhamos uma estrutura para isso – Gonçalves, olhando de um lado para o outro, perguntou muito intrigado. – Eles invadiram o sistema, pelo que me parece, apenas uma vez. Eles utilizaram os acessos que já estavam abertos. – E explicou: – Alguns de nossos funcionários os fecharam antes, outros não. Mas, se fechassem o 21

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acesso que os ladrões estavam utilizando para o roubo, eles seriam pegos, pois neste caso apareceria um aviso de deseja interromper ‘tal’ processo? – Mas isso não aconteceu. O Sr. Gonçalves entendeu o que estava sendo dito, assim continuou o raciocínio de Moreno: – Mas, se, só por um instante, um de nossos funcionários acessasse o sistema no computador onde estava ocorrendo o crime, ele poderia desconfiar. A pergunta agora é: como isso não aconteceu, se eles devem ter precisado de dez a quinze minutos para todo o processo até poderem enfim excluir a conta? – Eles pareciam saber que um de nós não faria isso, que um de nós estaria tão atento ao sistema interno após o alarme, que só tiraria a atenção dele quando tudo parecesse de fato seguro – disse Moreno, já sabendo quem poderia ter sido esse. E Gonçalves deduzindo quem seria, chamou irritado: – Henrique, viu o que a sua desatenção nos causou? Henrique era um bom funcionário, muito prestativo, sempre queria estar a serviço, mas perdia a concentração com facilidade. Assim, Gon‑ çalves deduziu que foi a falta de atenção dele ao sistema de contas que assegurou que os ladrões tivessem sucesso no roubo, afinal, essa não seria a primeira vez que Henrique deixava um sistema importante exposto por distração. – Não, senhor. Não pode ter sido por minha causa – Henrique defendeu­‑se logo que possível, sem ao menos apresentar uma prova para isso. – Não, Sr. Gonçalves – disse Frank –, eu não acredito que os ladrões tenham utilizado a falta de atenção dele, mas sim a superatenção bem co‑ nhecida de um outro. – E logo deduziu: – Eles deveriam saber que um de nós se manteria tão atento ao sistema de segurança interno para detectar qualquer falha, quanto anteriormente estava atento ao sistema de contas; e eles sabiam que essa atenção à segurança interna requer tempo para averiguações, tempo esse em que tal funcionário estaria centrado em um trabalho, de modo que não se lembraria do outro. – Marcos? – perguntou Gonçalves, supondo quem tenha sido. 22

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– Ele foi o mais prudente ao avaliar o sistema de contas, mas também o primeiro a constatar os erros no sistema interno de segurança e começar a restabelecê­‑los. Ele deve ter agido muito rápido para fechar o sistema de contas e se manteve ocupado demais para observá­‑lo enquanto restaurava o sistema interno – deduziu Moreno, se perguntando como os ladrões pu‑ deram prever até mesmo isso. – Então, assim eles puderam ficar o tempo que precisaram em nosso sistema e não foram detectados. Impressionante como eles tiveram tempo até mesmo para excluir a conta do sistema! – disse Gonçalves, e perceben‑ do que tinha poucas coisas em mãos, supôs: – Como tudo foi excluído, eu acredito que agora só temos essas informações nos relatórios que foram impressos, certo? – Verdade, senhor! Não existe mais essa empresa em nosso sistema, apenas alguns relatórios com prévios registros do surgimento e desapare‑ cimento dela. E o pior, com a conta da empresa excluída não temos como acessar as movimentações dela… Então o que o senhor deseja fazer agora? – perguntou Moreno, com a impressão de que nada dava para se fazer com o que lhes restou. – Vamos esquecer isso tudo! Essa empresa não existe, todas as suas informações são falsas e agora estão excluídas de modo que quase não podemos encontrar e, já que o dinheiro não pode ser rastreado, quero que vocês se livrem de todas as informações que temos… Ou melhor, quanto a tudo isso, que pareça que nada aconteceu. – E quanto a todo o prejuízo? – Moreno procurou saber o que fazer com o débito na conta do banco. Os ladrões poderiam ter escapado sem deixar rastro, e as informações poderiam ser destruídas, mas o prejuízo ainda continuaria. – Nós ganhamos muito com as tarifas cobradas das contas dos clientes, esse débito sequer representa uma pequena parte disso. Também geral‑ mente temos lucros que não declaramos especificamente, dessa vez não vamos declarar tais prejuízos. – Mas Sr. Gonçalves, nós perdemos 1 centavo de cada conta para os ladrões. E agora não podemos cobrar neste mês essa mesma tarifa. – disse

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Moreno, e conclui: – Assim nós tivemos de fato, uma perda de 20 centavos por pessoa física e 1 euro por pessoa jurídica. – Calma, eu já pensei nisso! – Foi uma tarifa mensal que foi cobrada de cada cliente, certo? Então, vamos dizer que, carinhosamente, baixamos o valor dessa tarifa para 1 centavo. Agora é só instituir uma tarifa anual para esse mesmo serviço de 3 euros para pessoa física e 15 euros para pessoa jurídica e nós passaremos a ganhar mais do que ganhávamos com isso e, no fim de tudo, não teremos prejuízo algum. – Muito bem pensado… Mas, detesto a ideia de deixar os ladrões escaparem como se nada tivesse acontecido – disse Moreno, o experiente funcionário diante da maior frustração profissional de sua vida. – Te entendo Moreno, mas detestaríamos ainda mais se a informação sobre o roubo vazasse. – Gonçalves começava a agravar a voz – Seria sinal de incompetência da nossa parte. Então, vamos fazer um pequeno favor para eles e um ainda maior para nós mesmos, não vamos mencionar exata‑ mente nada disso para exatamente ninguém. Todos me entenderam? Todos no local fazem algum sutil sinal de que entenderam o recado; al‑ guns, como Moreno, expressaram esse entendimento com a lamentável afei‑ ção de quem não estava nada feliz por tal atitude ser absolutamente necessária. – Precisamos da confiança de nossos clientes para recuperar o que perdemos. Se essa informação vazar, de fato teremos um prejuízo que não pode ser compensado nem mesmo com a recuperação do que os ladrões roubaram – concluiu Gonçalves. Nesse momento, ficou no ar uma fria sensação de que pegar os ladrões seria uma das piores coisas que poderia acontecer, até se eles fossem julgados e condenados por tal crime, seria um grande prejuízo moral para o banco. Todos perceberam que era bom para eles que os próprios ladrões sumissem com tudo e ocultassem qualquer sinal de que tal roubo aconteceu. Parecia até mesmo que, se os ladrões se entregassem confessando o roubo, todos teriam que negar tudo por dois motivos simples. Primeiro: para não confessarem que foram tão humilhantemente enganados passo a passo pelos ladrões, ajudando­ ‑os tanto que poderiam até mesmo serem chamados de cúmplices; e segundo: o banco não poderia ser invadido internamente e virtualmente num mesmo

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momento, sem que ninguém percebesse isso a tempo, mesmo tendo sido pré­ ‑avisado. Confessar que isso aconteceu seria admitir grande incompetência e ninguém queria engolir o orgulho (e é claro, perder o emprego) ao fazer isso. Então, finalmente, o Sr. Gonçalves retornou para o seu assento e começou a pensar em tudo o que aconteceu, passo a passo, para ver se descobria mais alguma coisa. Assim, ele se lembrou do que Moreno lhe havia dito quando o sistema foi invadido, um dos ladrões possivelmente utilizou o sistema para debitar 1 centavo de cada conta, enquanto outro abria uma suposta empresa; ao se lembrar disso, descobriu que, desse modo era necessário que os ladrões penetrassem e se utilizassem de dois micros por algum tempo – um para cada ação – e ainda assim não fossem detectados em nenhum deles. Ele então se perguntou: – Se um foi o de Marcos, de quem era o outro micro? No entanto, Gonçalves imediatamente descobriu a resposta, percebeu que ele mesmo tinha deixado o seu acesso aberto para ir monitorar o cofre – e o seu acesso até então ainda estava aberto. Ele logo percebeu que, para ele também, de imediato o cofre passou a ser prioridade, afinal de contas ele era a única pessoa que tinha a senha que poderia abrir o cofre e, mesmo as‑ sim, ainda era necessária a confirmação da digital de sua mão e a sua retina. O cofre logo passou a ser sua grande prioridade, porque era de sua inteira responsabilidade, e de algum modo os ladrões sabiam que seria dessa forma. E outra vez ele começou a se interrogar: – A senha eles podem ter conseguido descobrir, mas como abriram o cofre, se era necessário a impressão de minha mão e a análise da minha retina? Por fim, assegurou para si mesmo: – Eu vou descobrir como eles fizeram isso. No dia seguinte não havia expediente no banco, porém Gonçalves e Frank estavam lá. Frank devido ao trabalho, Gonçalves para uma boa reflexão sobre o roubo. Ele ainda ponderava a respeito de tudo que havia se passado, quando Frank lhe veio com um pensamento aparentemente extravagante: – Esses ladrões não são comuns, não posso imaginar um ser humano no mundo que tenha frieza para anunciar e executar um plano desses, sem contar a inteligência. 25

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Mas, de alguma forma, isso chamou a atenção de Gonçalves: – Bem, então me fale o que você acha. – Não é desculpa para o que houve, mas acho que esses ladrões não são pessoas comuns, estou certo que nenhum de nós facilitou esse crime e ainda assim eles conseguiram. Não tem como! – respondeu Frank e completou dizendo algo que transcrevia o sentimento de todos os fun‑ cionários: – Eles deixaram a fria sensação de que, se nós pensássemos em mais alguma coisa para impedir o roubo, eles usariam isso para favorecer o crime ou nos prejudicar. – Todo sistema de segurança inevitavelmente se mantém dentro de um padrão de reação… mas todo segurança também – disse Gonçalves, vagarosamente. – O que você disse? – Foi apenas algo que me veio à mente… mas sabe, existe um padrão inevitável dentro de tudo, ou algo desse tipo, foi isso que eu quis dizer. – É, então havia um padrão estabelecido no qual esse banco poderia ser roubado de forma inevitável e esses ladrões sabiam qual era. – Acredite nisso! – aconselhou Gonçalves. – Assim esse roubo não vai parecer algo mais assustador. – É… por um instante eu cheguei a pensar que eles pudessem estar dentro das nossas mentes. Além das mentes perturbadas, o dia após o roubo foi tranquilo como voltaria a ser os demais dias. E algum tempo depois desse primeiro crime, o próprio dono do ban‑ co solicitou os serviços de uma empresa de tecnologia, a qual recente‑ mente havia entrado no ramo de segurança, para que melhorasse o sistema interno de segurança e protegesse todos os arquivos do banco de qualquer possibilidade de uma nova infiltração.

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