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RO D R I G O RO S A N T
DAS CINZAS AO FOGO
Volume 1
TALENTOS DA LITERATURA BRASILEIRA
São Paulo, 2 017
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O herdeiro sombrio – série Das cinzas ao fogo Copyright © 2017 by Rodrigo da Silva Santos Copyright © 2017 by Novo Século Editora Ltda. coordenação editorial
editorial
Vitor Donofrio Cleber Vasconcelos
João Paulo Putini Nair Ferraz Rebeca Lacerda Talita Wakasugui
preparação
revisão
Luiz Alberto Galdini
Alessandra Miranda de Sá
diagramação
capa
Nair Ferraz
Dimitry Uziel
aquisições
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor desde 1o de janeiro de 2009.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) Rosant, Rodrigo O herdeiro sombrio / Rodrigo Rosant. – Barueri, SP: Novo Século Editora, 2017. (coleção talentos da literatura brasileira; série Das cinzas ao fogo) 1. Ficção brasileira I. Título. 17 ‑1449 cdd ‑869.3 Índice para catálogo sistemático: 1. Ficção: Literatura brasileira 869.3
novo século editora ltda. Alameda Araguaia, 2190 – Bloco A – 11o andar – Conjunto 1111 cep 06455‑000 – Alphaville Industrial, Barueri – sp – Brasil Tel.: (11) 3699‑7107 | Fax: (11) 3699‑7323 www.gruponovoseculo.com.br | atendimento@novoseculo.com.br
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Agradeço especialmente a duas pessoas que sempre
estiveram presentes em minha vida, e que em momento al‑ gum bloquearam qualquer desejo que eu almejei, ainda que parecessem sonhos incomuns e difíceis de se concretizarem, meus eternos super‑heróis: Roseleine Aparecida e Antônio José; algumas vezes, os pais embaraçam seus filhos de segui‑ rem adiante por interpretar suas vontades distintas demais às crenças, aos valores e aos princípios deles. Aos meus pais, que me guiaram pela estrada da vida, eu não devo atribuir nenhu‑ ma barreira, já que sempre me ouviram, compreenderam‑me e permitiram que eu seguisse sem muitos questionamentos. Agradeço ainda aos meus familiares, irmãos, tios(as) e primos(as) que, direta ou indiretamente, cederam por mui‑ tas vezes algum momento para que eu pudesse compartilhar cada sonho que desbravara, e sou muito grato por terem me escutado, por terem acreditado em mim e de certa forma me impulsionado a persistir no caminho. Aos amigos que são inúmeros e tenho a certeza de que todos sabem o imenso carinho que sinto por cada um em sua particularidade, eu também agradeço. Eles, que estiveram tão próximos de mim no dia a dia, mesmo em dia conturbado e rotineiro e cederam um espaço de tempo das suas vidas
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por meio de palavras singelas, para me dar a inspiração que buscava incansavelmente; em especial eu não poderia deixar de citar a grande amiga Jéssica Paula, se não fosse por seu estímulo, talvez, eu não tivesse seguido em frente. Ao grande amigo Felipe Renan, que me acompanhou capítulo por capí‑ tulo, sempre me motivando e demonstrando o desejo de ler mais e mais à medida que avançava. Por fim, agradeço aos mestres e professores de Língua Portuguesa, aos roteiristas e cineastas que cruzaram meu ca‑ minho na longa estrada da vida acadêmica desde o colégio, grandes inspirações que revolucionaram a minha escrita, que semearam em meu coração o desejo pela criação e me condu‑ ziram ao fascínio do universo literário. Que O herdeiro som‑ brio possa repercutir em vossos corações a mesma sensação de orgulho e de felicidade que eu senti ao fim de cada capítulo.
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Sumário
Prólogo 9 1. O Último Confronto 13 2. Da luz às trevas 23 3. Longe de casa 32 4. Carniça 43 5. Penumbra 51 6. Montanhas Perdidas 58 7. Colossus 66 8. Tristan 74 9. Pântano 84 10. Soprãno 92 11. Morte 101 12. Contra o Vento 109 13. Revelações 116 14. Herdeiro Sombrio 123 15. Emboscada 130 16. Acquária 138 17. Do fogo ao gelo 145 18. Transição 152
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19. O último Senhor 158 20. O pacto 164 21. Conciliação 172 22. Inverno 179 23. Cinzas e fogo 185 24. Um novo começo 195 Um pouco mais que cinzas – Quendi Filho das Sombras 201 Conspirando 207 Devaneios 213 Montanhas de Baixo 220 Uma visita inesperada 227 Redenção 232 Um pouco sobre o próximo livro da série 235 Glossário 251
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Prólogo
Eram quatro os Clãs daquela Era, no leste viviam os
nômades do ar, piratas que velejavam no vento em naus flutuantes; mais ao norte, o povo da água habitava imen‑ sos castelos esculpidos no gelo maciço e denso das terras congelantes; no oeste, à volta dos imensos vulcões, havia o condado do Clã de Cá, camponeses adoradores do cintilar vívido do fogo; e distante, no sul, onde o tempo seco e ári‑ do se alastrava em meio às grandes montanhas, divididos por duas crenças, mas que não intervinham na união entre eles, viviam os adoradores da terra; Soprãnis, Acquarianos, Flanarianos e Tristanianos, irmãos de carcaça e de couraça que sofriam com a desolação e viviam distantes por muito tempo, vigiados pelo poder hostil que se alastrou com a as‑ censão das trevas. Pertenciam à mesma casta, não haveria nada que os se‑ parariam uns dos outros ou que os tornariam distantes, se no início deste mundo não tivesse surgido o Sombra, criatura obscura e perversa como a escuridão que nos cega a visão e nos mantém aprisionados no medo. Juntos, os povos que habitavam os Quatro Ventos pode‑ riam guerrilhar e confrontar as forças guiadas pelas ordens do inimigo, mas o exército de criaturas era vasto o bastante para 9
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destruir todos os que se opusessem, e os Clãs já não tinham mais os Senhores de outrora como aliados. Mas, embora o Sombra almejasse o poder em sua pleni‑ tude e sonhasse com o dia de confrontar cada um dos quatro Clãs, destruí‑los e tomar a ordem desta Era, ele permanecera em silêncio, parecia ter medo de acordar as Bestas Aladas que lendas antigas acreditavam estarem adormecidas na Grande Montanha de Flanária. Entretanto, o Sombra tomara providências que os sepa‑ raram e fizera com que os Clãs Elementares permanecessem distantes uns dos outros por longas Eras. Tomou posse do perímetro que dividia os Quatro Ventos; ergueu seu covil nas terras sombrias, onde a estrela da manhã não podia iluminar, onde o brilho do luar que se estendia no crepúsculo não po‑ deria ser contemplado, onde o verde das florestas secava com o soprar do vento que trazia na brisa um fedor de dar ânsia, onde os rios não mais existiam e a escuridão reinara, eram as Montanhas de Baixo. Assim os Clãs Elementares permane‑ ceram isolados, por temerem atravessar o perímetro sombrio. Contudo, chegaria o momento de reverter a história que há muito conhecíamos, a hora de se desprender do medo es‑ tava mais próxima a cada novo ciclo, os anos passavam velo‑ zes transcendendo o tempo. Acreditávamos chegar breve o dia em que as Bestas Aladas se levantariam e nos contempla‑ riam com vosso poder, para então unirmos forças e devolver luz à escuridão. A arrogância do Sombra o cegou diante da crença dos Elementares e ele deixara algo importante passar como vulto nos seus conhecimentos, assinou desde então sua sentença para um futuro próximo. Esperávamos que as Bestas Aladas renasceriam das cinzas no primeiro Eclipse de Luz desta Era, 10
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quando a chama do vulcão acordará do sono profundo que se perdera no tempo. Mas isso eu lhes contarei em breve, meu nome é Nikolay Horayan e esta é a minha história!
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Capítulo 1
O último confronto
– Numa Era distante, tão distante quanto o número de
folhas que caem das árvores em época de inverno, quando as Bestas Aladas ainda habitavam e protegiam os Quatro Ven‑ tos, houve um confronto milenar, uma tentativa frustrante de evitar a ascensão do Sombra – começou a falar o Ancião. Era tempo de festa em Flanária e, ainda que vivêssemos na tormenta, tentávamos levar uma vida normal e esquecer a escuridão que nos rondava incansavelmente dias e noites, estávamos na época de comemorar o fim do ciclo de verão. Embora estivéssemos tristes por nos despedir da estação que agradava todos os Flanarianos, começara o outono e, em me‑ nos de sessenta dias, iniciaria a competição que nos apresen‑ taria o novo Senhor que guiaria nosso Clã. Estávamos reunidos, como de costume, nas festividades do vilarejo, ao redor da fogueira que meu pai, Baltazar, pro‑ videnciara para nos aquecer do breu que se alastrava ao cair da noite. Eu e algumas crianças da vila ouvíamos mais uma lenda de ouriçar os pelos que o Ancião gostava de relatar. Os Anciões costumavam ser os mais velhos e sábios mestres de guerra, que não confrontara nenhum exército nesta Era, mas treinara suas habilidades por longos e longos dias até que os calos das mãos não suportavam mais apanhar suas espadas, 13
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em cada Clã havia um ou mais Anciões. Ao menos fora isso que nos contara em histórias de outrora. – Eles se reuniram diante do covil do Sombra, cada exér‑ cito guiado por um Senhor, e cada Senhor com sua Besta Ala‑ da, criaturas radiantes que surgiram no início dos tempos para guardar os Elementos Naturais da devastação dos homens deslumbravam os olhos de cada mortal que pudera contemplá ‑los; davam aos Senhores o poder de controlar os elementos da natureza, o que no futuro os denominara Senhores Elementa‑ res – contara o velho Demétrio, meu querido avô. Os Senhores daquela época eram homens viris e encora‑ jados a guiar os exércitos de soldados destemidos que ergue‑ ra suas espadas em prol de viver e morrer por cada homem, mulher, velho ou criança que habitavam nossas terras. O que intitulava os Senhores como mestres de guerra e determinara quem lideraria cada um dos Clãs eram as competições, que existiram e perduraram até o fim das grandes batalhas, mas que estariam prestes a se perderem nas lembranças se não acreditássemos na aparição do Eclipse; segundo as crenças, após a queda das Bestas Aladas, chegaria a época em que o sol seria encoberto pela lua e a escuridão assistiria o renascer daqueles que estavam adormecidos, e isso nos remetera ao dever de nomear novos Senhores para liderarem os Clãs nos tempos sombrios que se aproximavam. Essas competições não se assemelhavam a chacinas e, tampouco, eram bárbaras, os Elementares eram sensatos e evoluídos, eles respeitavam uns aos outros, seus princípios e valores não deixavam que cometessem tais atrocidades, isso permitia que as competi‑ ções fossem ordeiras e pacíficas. – Primeiro mandamento de Flanária que por todos fora sempre honrado, respeitar nossos semelhantes como se 14
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fossem parte de nós mesmos – continuou Demétrio –, dessa forma, também evitávamos surgir nos corações de qualquer ser que habitava os Quatro Ventos uma única pontada de ódio ou revolta por não tomarem o poder, algo que víamos so‑ mente como uma hierarquia necessária, porém, que poderia de fato permitir crescer nos corações um sentimento hostil. Contudo, os Senhores nunca tiveram problemas nos tempos que se seguiram, eles se espelhavam em um mesmo propósito e o poder era somente algo conquistado por mérito, o qual todos poderiam almejar – concluiu. – A última grande competição em Flanária acontecera há algumas Eras, quando nos sentimos ameaçados pelo poder sombrio que se alastrava. Sabíamos que cada um dos Clãs de‑ veria ter um líder para encorajar os cavaleiros a confrontar com astúcia as hostes do inimigo. Fora durante um inverno selva‑ gem, muitos dos nossos não sobrevivera mesmo protegidos em suas cavernas escaldantes. Eles deliberaram e concordaram em manter como principal regra a realização das competições em época de imensa voracidade das estações que atingira cada Clã, desta maneira os Senhores que sobrevivessem à competição seriam de fato dignos a comandar um exército e ser domador da Besta Alada. E com certeza o soprar gélido do vento nos causava aversão, o inverno era a estação que mais temíamos – falou o Ancião, tinha as mãos mais calejadas comparadas com as do meu avô, as expressões da face se escondiam por detrás das rugas, o cabelo cacheado e comprido já não tinha mais cor e sempre levava consigo, por onde quer que fosse, um cajado que lhe servia de apoio, suas pernas já não tinham forças sufi‑ cientes para sustentá‑lo sozinhas. As crianças que me acompanhavam no círculo de fogo estavam atentas a cada palavra proferida, aquelas reuniões 15
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serviam de ensinamento e elas tinham ciência, embora muito jovens, de que breve seria o momento de participar da com‑ petição, e saber quais eram as regras estabelecidas era muito importante para conseguir alcançar a honra. Eu estava mais próximo desta tarefa, tinha vinte anos, e faltavam pouco me‑ nos de vinte dias para me tornar homem e competir junto aos meus irmãos de casta que alcançaram a maioridade ou a completariam antes da aurora de inverno. – Diga‑me, Nikolay, você, que a cada dia se aproxima da maioridade, anseia por uma vitória durante as competições ou deixará que os ventos soprem e mostrem a direção do seu destino? – indagou Salazar, o primeiro Ancião, com sua voz rouca e fraca. – Salazar, Guardião dos Mandamentos de Flanária – disse fazendo reverência –, pressinto que estou pronto para enfrentar qualquer obstáculo, e anseio pelo dia em que me tornarei homem, ainda que a mim não caiba o destino de ser Senhor deste Clã não me renderei às fraquezas diante da competição, honrarei minha casta, honrarei meu pai e mestre Baltazar, a quem tenho eterna gratidão por me aperfeiçoar com seus conhecimentos de grandes batalhas e serei justo guerreiro a confrontar meus irmãos nesta Era. Quando o pri‑ meiro floco de neve apontar o início do inverno no alvorecer, estarei a postos na colina e me apresentarei como o primeiro cavaleiro, não haverá ventania ou geada que me faça fraquejar – concluí com o peito estufado de orgulho, as palavras fluí‑ ram como cantiga aos meus ouvidos, eu falava em nome do meu povo e tive a certeza, naquele instante, de que o poder da Besta Alada ao renascer no Eclipse seria meu. A noite se estendeu por algumas longas horas, ouvimos relatos do Último Confronto, muitos se sacrificaram, outros 16
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relutaram na tentativa de se manterem vivos até cair o últi‑ mo inimigo, no entanto, o Sombra, obstinado e junto ao seu imenso exército, destruiu a última esperança do nosso povo. – Era grande o número de cavaleiros que guerrilhavam no Último Confronto, os Quatro Ventos somavam juntos pouco mais de quinhentos milhões de corajosos guerreiros… – falou Joseph do condado menor de Flanária, era mais novo comparado a meu avô e a Salazar, fora nomeado Paraninfo do Ancião por sua astúcia e conhecimento sobre as batalhas de outrora. Os Paraninfos eram como anjos de guarda e tinham o dever de proteger aqueles que governavam os Clãs. Contávamos os dias a cada amanhecer, o que nos dava uma noção de tempo. Nosso calendário era composto por 240 dias, o que não nos impedia de aguardar ansiosos o du‑ centésimo quadragésimo alvorecer, o dia em que a luz não iluminaria os cantos do mundo e, como num presságio, o luar cobriria a estrela da manhã, nos cegando e nos mantendo nas sombras. O dia em que as labaredas do vulcão voltariam a flamejar e as Bestas Aladas renasceriam, ao menos era nisso que acreditávamos. Cada estação demorara por volta de sessenta dias para se findar e ao completar quatro marcava‑se o último dia no Ca‑ lendário Elementar, embora esse em especial determinasse a aparição do primeiro Eclipse. Começávamos, há pouco tem‑ po, uma nova estação; em Flanária iniciara o outono, falta‑ vam menos de sessenta dias para as competições começarem e não duraria mais de sete para ter um fim, esse sempre fora o tempo médio calculado, muitos desistiam com medo de perderem a alma para a geada do inverno. O tempo passara e os Senhores de outrora já não caminhavam mais entre nós, precisávamos renovar a guarda e trazer esperança aos Clãs. 17
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– … Todos vestiam elmos e escudos que representavam de forma idônea os seus Clãs. No olhar dos cavaleiros só se enxergava esperança, os que ainda temiam uma derrota eram encorajados pela força dos outros companheiros. Eles luta‑ vam por uma causa, por um mundo, confrontavam o inimigo para trazer de volta a paz que um dia fora roubada. A chegada do Sombra só veio alastrar rancor e melancolia aos Quatro Ventos, não havia senão uma certeza, a derrota os faria pe‑ recer por mais algumas longas Eras longe dos vossos irmãos. Era lutar para vencer ou, ao menos, morrer com dignidade – completou Joseph. – Vistam os seus elmos cavaleiros, icem as suas espadas, não deixem a piedade gritar em vossos corações, pois eles não a terão por vocês. Guerrilhem por vossas esposas, filhos e os que aguardam impacientes o vosso retorno. Não serei eu, guerreiros, que os livra‑ rei de toda a discórdia deste mundo sombrio, não serei eu, cavalei‑ ros, que trarei luz às trevas, lutarei por mim, para poupar a mi‑ nha vida e até que corra sangue nas minhas veias e eu tenha força para erguer a minha espada, destruirei aqueles que derramaram a sombra em nosso mundo. Lutem como o fogo que se alastra com a ventania! – ordenou o Senhor que liderava o Clã de Flanária. – Avancem como o vento que corta as montanhas! – soou vo‑ raz o ordenar da Senhora de Soprãno. – Resistam como a força dos grandes rochedos! – Ouviu‑se estridente a voz do Senhor de Tristan. – Mostrem a eles a fúria das águas, adoradores dos mares! – falou com ira o Senhor de Acquária. – Ouvia‑se dos Quatro Ventos o tinir das espadas ao se chocarem, a terra trepidava abaixo dos pés, as flechas lança‑ das pelos arqueiros de Acquária atingiam os espíritos som‑ brios numa precisão impecável, um a um caíam diante dos 18
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cavaleiros e depois de longas horas lutando incansáveis sem se render, eles se aproximavam da vitória – continuou Joseph, relatando cada instante da batalha como se estivesse passan‑ do um filme em sua memória. – Mas então alguém, que até o momento não havia se mostrado à fortaleza de guerreiros, surgiu montado em uma criatura aterrorizante. Neste instante pude observar, nos pequeninos que pare‑ ciam imersos na história, um momento de apreensão e medo; os olhos questionavam o que acontecera, são tantas as lendas contadas, rumores que se perderam no tempo, e ainda que todos pudessem avistar ao longe, nas Montanhas de Baixo, as nuvens negras que encobriam aquele perímetro – a marca de que a escuridão e as trevas espalham medo aos nossos Clãs –, nada havia sido relatado até então com riqueza de detalhes sobre o dia em que os Elementares perderam a sua última oportunidade de viver em liberdade. – O Sombra carregava em seu semblante sem forma uma aura de ódio, era viril de aspecto rancoroso e sombrio. Sem proferir uma única palavra ou som, transmitia medo e angústia nos corações – falou Joseph com um tom mais baixo a cada palavra. Ele havia tomado frente à história, e me pareceu que Baltazar, Demétrio e Salazar não pensavam em interromper o Paraninfo. – A besta, por sua vez, deixa‑ va escapar, quase constantemente e a cada rasante, um som estridente e ensurdecedor, sua aparência lembrava a de uma águia gigante e suas penas eram negras e faiscantes como o chocar dos raios, tinha olhos saltados e penetrantes em um tom vermelho‑sangue. – Eram quatro as Bestas Aladas que os Senhores guia‑ vam; a primeira a Grande Mãe, por sua virilidade e aparên‑ cia radiante, pertencia ao Senhor de Flanária, suas penas 19
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mesclavam o amarelo e o laranja‑avermelhado, lembravam as chamas flamejantes do fogo, podíamos ver ardência em seus olhos, sua cauda dividia‑se em três e era imensa, capaz de emergir em ondas cintilantes no céu. – Tomara a frente Baltazar para relatar um pouco sobre as Bestas Aladas que os Elementares tinham em seu poder. – A segunda era o contraste encantador das chamas e ardência do fogo, tinha uma aparência esbranquiçada e sua pelagem mesclava um tom de dégradé em azul celestial, a le‑ veza das asas ao voar lembrava de forma sutil a calmaria dos mares ao cair do luar – falou Salazar. – Avermelhada como a terra ao banhar intenso do sol era a terceira, sua aparência era mais robusta comparada às duas anteriores, o que a tornara menos veloz, porém, de força ex‑ traordinária e indestrutível como uma avalanche em grandes montanhas e penhascos – emendou Demétrio. – A mais veloz cortava o vento e olhos comuns não pode‑ riam acompanhá‑la, suas penas eram de um tom esverdeado e possuía uma cauda mais extensa, embora menor comparada com a do Flanariano, os olhos eram serenos e sua aura trans‑ mitia tranquilidade e harmonia – concluiu Joseph. – E a guerra, como terminara o Último Confronto? – in‑ dagou impaciente um dos pequeninos. – Sem pressa, meu jovem, por aqui as lendas se comple‑ tarão e tudo que um dia já ouvira falar será esquecido – res‑ pondeu Salazar com um sorriso de canto, como quem achara graça da ansiedade do rapaz. – Ainda que o medo tenha passado a predominar nos corações daqueles guerreiros, nenhum ousara recuar, todos permaneceram lutando com bravura enquanto os Senho‑ res e suas Bestas usavam do poder Elementar para atacar 20
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incansavelmente o Sombra e sua fera – voltara a contar Jose‑ ph. – Ainda que fossem fortes e a luz predominasse nas trevas, não estava escrito na história do nosso povo que venceríamos aquele confronto e conquistaríamos nossa paz. O Senhor de Flanária dominava as chamas flamejantes das imensas tochas de fogo que os cavaleiros lançavam das catapultas, e em ten‑ tativas frustrantes procurava atingir a fera e derrubar o guer‑ reiro sombrio; a Senhora de Soprãno de maneira ponderada, sendo cautelosa ao dominar o ar, tentara com seus imensos redemoinhos desconcertar o tirano, mas de nada adiantara; as águas do governante de Acquária pareciam também não causar danos; o Senhor de Tristan tampouco poderia fazer, a não ser nos momentos em que o Sombra se aproximava do solo ou dos imensos rochedos em volta. – Ele parece estar protegido por um escudo impenetrável, a lua e a escuridão da noite o torna mais poderoso, devemos recuar e esperar o alvorecer para tentarmos derrubá‑lo – falou o Senhor de Tristan. – Não há tempo, o nosso exército, ainda que relutante, não resistirá por muito – retrucou a Senhora de Soprãno. – NÃO! – gritou instintivamente o Senhor de Acquária, quando percebeu que o Senhor de Flanária voou veloz numa ten‑ tativa suicida em direção ao Sombra. – Um flash de luz iluminou o perímetro e no mesmo ins‑ tante os olhares se voltaram ao céu, o tinir das espadas se calou e a terra não mais trepidava. Os habitantes dos Quatro Ventos tiveram a certeza naquele momento de que a sentença fora decretada – continuou Joseph. – Os Senhores de Tristan, Acquária e Soprãno pousaram suas Bestas Aladas quando elas, em sintonia, esvaeceram em cinzas. Distante, no pico mais alto que poderiam avistar, estava o Senhor de Flanária 21
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assistindo a Grande Mãe partir; as faíscas voejavam em dire‑ ção ao sol que ainda tímido começara a apontar no leste. Os demais cavaleiros recuaram na tentativa de pouparem suas vi‑ das, desde então nada mais fora contado nos Quatro Ventos e também não se ouviu falar dos quatro Senhores – completou. – Agora, distante dos nossos irmãos e separados pelas trevas, aguardamos o dia em que as Bestas Aladas renascerão e das cinzas ao fogo renovarão a esperança do nosso povo – concluiu Salazar, o Guardião dos Mandamentos.
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RODRIGO ROSANT
é paulistano, nascido em 1991. Entre 2010 e 2012 teve a oportunidade de estudar um pouco de Artes Cênicas e atuar em eventos temáticos como ator/caracterizador, onde pôde desenvolver personagens, criando histórias a partir de um enredo definido. Atualmente é graduando em Marketing. Contudo, nada conseguiu fazer com que ficasse longe do que mais o encantava, a literatura, e retomou o fôlego para concluir O herdeiro sombrio, primeiro livro da série “Das cinzas ao fogo”.
O HERDEIRO SOMBRIO - Capa e Verniz 1.indd 1-5
RODRIGO ROSANT
“Se você descobrisse que o herdeiro sombrio é o reflexo da sua alma, não hesitaria em tirar-lhe a vida?”
RO D R I G O RO S A N T
Em O herdeiro sombrio, seremos transportados a um universo onde quatro Clãs deverão se unir mais uma vez para confrontar as forças do Sombra, retomando uma batalha milenar que ficou perdida no tempo após o Último Confronto. Os Clãs Elementares aguardam o dia em que a profecia se concretizará, quando as labaredas do vulcão de Flanária voltarão a cintilar e as Bestas Aladas renascerão. Elas dão aos seus Senhores – governantes de cada um dos Quatro Ventos – o poder de dominar os quatro elementos e assim equilibrar a ordem; eles acreditam que as escórias das Bestas Aladas voltarão a queimar, se lançadas no vulcão, e que das cinzas ao fogo renascerá a esperança por dias melhores. Uma história que nos fará viajar por Tristan, Flanária, Acquária e Soprãno, desvendando suas crenças e nos apresentando criaturas jamais vistas.
DAS CINZAS AO FOGO
– Um flash de luz iluminou o perímetro e no mesmo instante os olhares se voltaram ao céu, o tinir das espadas se calou e a terra não mais trepidava. Os habitantes dos Quatro Ventos tiveram a certeza naquele momento de que a sentença fora decretada – continuou Joseph. – Os Senhores de Tristan, Acquária e Soprãno pousaram suas Bestas Aladas quando elas, em sintonia, esvaeceram em cinzas. Distante, no pico mais alto que poderiam avistar, estava o Senhor de Flanária assistindo à Grande Mãe partir; as faíscas voejavam em direção ao sol que, ainda tímido, começara a apontar no leste. Os demais cavaleiros recuaram na tentativa de pouparem suas vidas, desde então nada mais fora contado nos Quatro Ventos e também não se ouviu falar dos quatro Senhores – completou. – Agora, distante dos nossos irmãos e separados pelas trevas, aguardamos o dia em que as Bestas Aladas renascerão e das cinzas ao fogo renovarão a esperança do nosso povo – concluiu Salazar, o Guardião dos Mandamentos.
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