O Cordeiro de Deus - A Agonia e o Sofrimento de Jesus

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CHARLES R. SWINDOLL

O Cordeiro de Deus A agonia e o sofrimento de Jesus

S達o Paulo / 2012

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Pr贸logo

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Eis aqui o homem! Pôncio Pilatos gritou essas palavras perante uma multidão sedenta de sangue na fortaleza de Antonia, situada em ­Je­rusalém, no mês de abril de 33 d.C. Um homem permaneceu, fraco e resignado, perante a rude e rancorosa multidão. Espancado e quase irreconhecível, com o sangue escorrendo da cabeça até os pés, com espinhos cravados em sua fronte, com partes de carne expostas de seu corpo dilacerado, o carpinteiro de Nazaré, Jesus, esperava sua sentença. “Crucifiquem-no! Crucifiquem-no!” Ele estava muito longe da manjedoura de Belém. Muito longe das ferramentas na oficina de José. Os dias passados no mar da Galileia com seu grupo itinerante de discípulos pareciam muito distantes – quando permanecia ouvindo o barulho da batida das ondas contra o barco, assando o peixe na praia ao entardecer, contando histórias ao redor da fogueira. Em sua mente, seus rostos ainda recentes da noite anterior, reclinados sobre uma mesa para a última refeição. Marcado para morrer! 9

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Visto que você está lendo este livro, as chances são de que encontre o homem que sofreu um castigo que poucos poderiam imaginar, muito menos suportar. Talvez tenha ouvido a história muito tempo atrás, mas, com o tempo, os detalhes desapareceram. Talvez tenha visto recentemente uma apresentação dramática dos eventos. Mas lá no íntimo se pergunta sobre o que realmente aconteceu. O que ocorreu naquele dia, há dois mil anos, que ainda perdura como se tivesse acontecido ontem? Enquanto está lendo este livro, você se encontrará fazendo a si mesmo a única pergunta que realmente importa: “Por quê?”. Por que desejaria um homem inocente caminhar deliberadamente para um horrível fim? Por que ele deveria aceitar tal tratamento atroz? Para entender estas perguntas, é necessário que se faça a mesma jornada dolorosa que aquele homem fez. Você e eu chegaremos o mais perto possível, mas somente ele pôde lidar com tudo o que isso inclui. O caminho que Jesus percorreu em suas últimas 24 horas, comumente chamadas de “a Paixão”, começou com a Ceia. Então, os fatos se desenrolam em meio a profundas orações e acordos feitos no escuro. O caminho foi feito através de tribunais carentes de justiça e inescrupulosos administradores destituídos de poder. Nele, Jesus parou para sofrer pancadas e torturas e caminhar penosamente até um local chamado Calvário. Entretanto, como descobriremos, foi o caminho que ele escolheu, antes mesmo que lhe fosse imposto por alguém. Acredito que enquanto lê, você estará face a face com Ele... e a sua vida será transformada. E isso pode acontecer se parar o suficiente para olhar... para pensar... e para imaginar. 10

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Quando fizer isso, quando acreditar verdadeiramente que este homem foi marcado para morrer, você nunca mais será o mesmo. Foi acidente ou era a sua missão? Quem deu crédito à nossa pregação? E a quem se mani­ festou o braço do Senhor? Porque foi subindo como renovo perante ele, e como raiz de uma terra seca; não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, ho­ mem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum. Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermida­ des, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moí­ do por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo seu caminho; mas o Senhor fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos. Ele foi oprimido e afligido, mas não abriu a sua boca; como um cordeiro foi levado ao matadouro, e como a ovelha muda perante os seus tosquiadores, assim ele não abriu a sua boca. Da opressão e do juízo foi tirado; e quem contará o tempo da sua vida? Porquanto foi cortado da terra dos viventes; pela transgressão do meu povo ele foi atingido. 11

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E puseram a sua sepultura com os ímpios, e com o rico na sua morte; ainda que nunca cometeu injustiça, nem houve engano na sua boca. Todavia, ao Senhor agradou moê-lo, fazendo-o enfer­ mar; quando a sua alma se puser por expiação do pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias; e o bom prazer do Senhor prosperará na sua mão. Ele verá o fruto do trabalho da sua alma, e ficará satisfeito; com o seu conhecimento o meu servo, o justo, justificará a muitos; porque as iniquidades deles levará sobre si. Por isso lhe darei a parte de muitos, e com os poderosos repartirá ele o despojo; porquanto derramou a sua alma na morte, e foi contado com os transgressores; mas ele ­levou sobre si o pecado de muitos, e intercedeu pelos trans­ gressores. (Is 53:1-12)

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1. O cálice do sacrifício

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Uma noite antes de ser crucificado, ele reuniu seus doze amigos em volta de uma mesa... e comeram. Participei de bonitas e deliciosas refeições durante a minha vida. Elas alcançam os extremos, do sublime ao sensacional, do mais primitivo ao mais formal, moderno e ­elegante. Tenho sido convidado para banquetes em mansões de governantes e tenho sentado à mesa de capitães em transatlânticos. Também comi em casebres nos campos missionários e ao redor da fogueira com minha família, apreciando o delicioso peixe pescado na hora, e já tentei engolir comida de hospital. Nessas minhas mais de seis décadas de existência, posso lhe assegurar que, se tivesse de escolher, preferiria um lugar pequeno e íntimo, em vez de uma grande e ­impessoal reunião. De maneira trivial, quanto mais estudo o Novo Testamento e examino como as pessoas daquele tempo tinham suas refeições, mais acredito que me sentiria em casa com elas, especialmente com Jesus e seus discípulos. Quase sem exceção, eles faziam simples refeições e mantinham o grupo pequeno. Não faziam grandes festas, nem elegantes banquetes com decorações ofuscantes. Também não tinham um protocolo 15

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sofisticado e formal. Em nenhum lugar isso se torna mais evidente do que quando comeram a refeição da Páscoa. Séculos se passaram desde aquela noite em que Jesus se sentou no cenáculo e compartilhou a última e simples refeição com seus discípulos. Era simples, mas extremamente importante. Durante esses séculos, a refeição tem tomado um grande significado. De maneira infeliz, tem caído nas armadilhas da religião – os “excessos” de rituais complicados e de distinções denominacionais. Ao fazer assim, acredito, tem se perdido a profunda simplicidade que cercava a mesa na qual Jesus e seus homens se reuniram para a ceia naquela noite final. Em primeiro lugar, vamos considerar por que eles estavam reunidos. Estava, pois, perto a festa dos ázimos, chamada a Páscoa. E os principais dos sacerdotes, e os escribas, andavam procurando como o matariam; porque temiam o povo. Chegou, porém, o dia dos ázimos, em que importava sa­ crificar a Páscoa. E mandou a Pedro e a João, dizendo: Ide, preparai-nos a Páscoa, para que a comamos. (Lc 22:1-2; 7-8) Todo ano, na quarta quinta-feira do mês de novembro, muitos norte-americanos preparam uma farta refeição. Convi­damos nossos mais próximos e queridos – familiares e amigos – e celebramos a refeição do dia de Ação de ­Graças. Esse é o meu feriado favorito durante todo o ano. É um tempo em que nos reunimos por duas simples razões: ter uma refeição e relembrar. A Páscoa pode ser considerada a celebração do dia de Ação de Graças dos judeus. Não é um dia de ação de graças 16

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com perus, enfeites e peregrinações, mas um tempo de lembrar de alguma coisa muito mais significativa. Quando os hebreus estavam no Egito, Deus chamou Moisés para tirá-los da escravidão e levá-los para a Terra Prometida. Na noite do grande êxodo, Deus disse ao Seu servo: E falou o Senhor a Moisés e a Arão na terra do Egito, dizendo: Este mesmo mês vos será o princípio dos meses; este vos será o primeiro dos meses do ano. Falai a toda a congregação de Israel, dizendo: Aos dez deste mês tome cada um para si um cordeiro, segundo as casas dos pais, um cordeiro para cada família. Mas se a família for pequena para um cordeiro, então tome um só com seu vizinho perto de sua casa, conforme o número das almas; cada um conforme ao seu comer, fareis a conta conforme ao cordeiro. O cordeiro, ou cabrito, será sem mácula, um macho de um ano, o qual tomareis das ovelhas ou das cabras. E o guardareis até ao décimo quarto dia deste mês, e todo o ajuntamento da congregação de Israel o sacrificará à tarde. E tomarão do sangue, e pô-lo-ão em ambas as ombreiras, e na verga da porta, nas casas em que o comerem. E naquela noite comerão a carne assada no fogo, com pães ázimos; com ervas amargosas a comerão. Não comereis dele cru, nem cozido em água, senão assado no fogo, a sua cabeça com os seus pés e com a sua fressura. E nada dele deixareis até amanhã; mas o que dele ficar até amanhã, queimareis no fogo. 17

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Assim pois o comereis: Os vossos lombos cingidos, os vos­ sos sapatos nos pés, e o vosso cajado na mão; e o comereis apressadamente; esta é a Páscoa do Senhor. E eu passarei pela terra do Egito esta noite, e ferirei todo o primogênito na terra do Egito, desde os homens até aos animais; e em todos os deuses do Egito farei juízos. Eu sou o Senhor. E aquele sangue vos será por sinal nas casas em que esti­ verdes; vendo eu sangue, passarei por cima de vós, e não haverá entre vós praga de mortandade, quando eu ferir a terra do Egito. E este dia vos será por memória, e celebrá-lo-eis por festa ao Senhor; nas vossas gerações o celebrareis por es­ tatuto perpétuo. Sete dias comereis pães ázimos; ao primeiro dia tirareis o fermento das vossas casas; porque qualquer que comer pão levedado, desde o primeiro até ao sétimo dia, aquela alma será cortada de Israel. E ao primeiro dia haverá santa convocação; também ao sétimo dia tereis santa convocação; nenhuma obra se fará neles, senão o que cada alma houver de comer; isso so­ mente aprontareis para vós. Guardai pois a festa dos pães ázimos, porque naquele mesmo dia tirei vossos exércitos da terra do Egito; pelo que guardareis a este dia nas vossas gerações por estatuto perpétuo. No primeiro mês, aos catorze dias do mês, à tarde, come­ reis pães ázimos até vinte e um do mês à tarde. Por sete dias não se ache nenhum fermento nas vossas casas; porque qualquer que comer pão levedado, aquela 18

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alma será cortada da congregação de Israel, assim o es­ trangeiro como o natural da terra. Nenhuma coisa levedada comereis; em todas as vossas habitações comereis pães ázimos. Chamou pois Moisés a todos os anciãos de Israel, e disse­ -lhes: Escolhei e tomai vós cordeiros para vossas famílias, e sacrificai a Páscoa. Então tomai um molho de hissopo, e molhai-o no san­ gue que estiver na bacia, e passai-o na verga da porta, e em ambas as ombreiras, do sangue que estiver na bacia; porém nenhum de vós saia da porta da sua casa até à manhã. Porque o Senhor passará para ferir aos egípcios, porém quando vir o sangue na verga da porta, e em ambas as ombreiras, o Senhor passará aquela porta, e não deixará o destruidor entrar em vossas casas, para vos ferir. Portanto guardai isto por estatuto para vós, e para vossos filhos para sempre. E acontecerá que, quando entrardes na terra que o ­Senhor vos dará, como tem dito, guardareis este culto. E acontecerá que, quando vossos filhos vos disserem: Que culto é este? Então direis: Este é o sacrifício da Páscoa ao Senhor, que passou as casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu aos egípcios, e livrou as nossas casas. Então o povo inclinou-se, e adorou. E foram os filhos de Israel, e fizeram isso como o Senhor ordenara a Moisés e a Arão, assim fizeram. E aconteceu, à meia noite, que o Senhor feriu a todos os primogênitos na terra do Egito, desde o primogênito de Faraó, que se sentava em seu trono, até ao primogênito 19

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do cativo que estava no cárcere, e todos os primogêni­tos dos animais. (Êx 12:1-29) Isso iniciou a mais simples e mais importante de todas as práticas judias. Apropriadamente, é chamada de “Páscoa”. Deus tornou claro que eles deveriam lembrar o período daquela noite em diante; e quando o fizessem, deveriam explicar o significado aos seus filhos. A refeição se tornou a mais importante celebração dos judeus. Na sua última noite com os discípulos, Jesus celebrou a Páscoa, como os devotados judeus tinham feito durante séculos. De maneira apropriada, ele usou aquela refeição como lembrança para levar a atenção deles para a sua morte que se aproximava.

O cardápio E, indo eles, acharam como lhes havia sido dito; e prepa­ raram a Páscoa. (Lc 22:13) Enquanto os judeus celebravam sua Páscoa anual de lembrança e agradecimento, os ingredientes necessários daquela festa eram passados de geração em geração, nos ensinos tradicionais das 613 leis da Torá. Isso incluía o sacrifício e preparação do “Cordeiro pascal” (Êx 12:6), a obrigação de comer o cordeiro pascal – que é participar na Páscoa judaica (Êx 12:8); a preparação adequada do cordeiro – ele deve ser assado ao fogo (Êx 12:9); a proibição contra deixar qualquer sobra do cordeiro (Êx 12:10); a exigência de comer o ­matzah (pão ázimo, sem fermento) durante a Páscoa (Êx 12:18). 20

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O dever de ensinar ao filho a história da libertação do Egito (Êx 13:8). Essas são apenas algumas das instruções específicas da Torá concernentes à Páscoa. Nada muito complicado, mas o que foi colocado era para ser cumprido rigorosamente. A festa da Páscoa estava centralizada em torno de três itens: o cordeiro assado, as ervas amargas e o pão ázimo. O cordeiro assado era o principal item. Servia para lembrar-lhes do sacrifício do cordeiro imaculado e do sangue espalhado nas ombreiras e nos vergais das portas das casas dos fiéis hebreus. As ervas amargas eram uma mistura de alface, chicória, raízes, hortelã e dente-de-leão. Quando o sabor picante daquelas ervas alcançava a língua, elas ofereciam uma lembrança dos anos difíceis que os ancestrais hebreus tinham passado na escravidão. O pão ázimo servia para lembrar-lhes da pressa com que os hebreus tinham de se preparar para deixar o cativeiro com Moisés, seu libertador. Mas, nessa noite, Jesus criou uma nova tradição: ele transformou alimentos familiares em símbolos de coisas desagradáveis.

A refeição E, chegada a hora, pôs-se à mesa, e com ele os doze após­ tolos. (Lc 22:14) Corro o risco de perder a simpatia daqueles que são apreciadores dos grandes trabalhos dos artistas, mas preciso dizer uma coisa que alguns não apreciarão, e que é isto: o pintor Leonardo da Vinci fez um grande desserviço ao cristianismo com o quadro A última ceia. Não ao mundo da arte, 21

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