Vigiados – Uma História sobre Anjos e Demônios

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Fabio Bentes

Vigiados Uma Hist贸ria Sobre Anjos e Dem么nios

S茫o Paulo 2012

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Copyright © 2012 by Fabio Bentes Coordenação Editorial Mateus Duque Erthal Diagramação Oika Serviços Editoriais Capa Monalisa Morato Preparação de Texto Equipe Novo Século Revisão Lílian Moreira Mendes Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Bentes, Fabio Vigiados / Fabio Bentes. -- São Paulo : Ágape, 2012. 1. Ficção brasileira 2. Ficção cristã I. Título. 12-10020

CDD-869.93

Índices para catálogo sistemático: 1. Ficção cristã : Literatura brasileira 869.93

2012 Publicado com autorização. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida sem a devida autorização da Editora. Impresso no Brasil Printed in Brazil EDITORA ÁGAPE Alameda Araguaia, 2.190 – Conj. 1112 CEP: 06455-000 – Barueri – SP Tel. (11) 2321-5080 – Fax (11) 2321-5099 www.agape.com.br

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Para Gisela e Antonella.

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Sumário

Capítulo 1............................................................. 11 O Desejo de Orlando................................................... 11 O Desejo de Helena.................................................... 19 O Desejo de Nice....................................................... 25 O Desejo de Juan........................................................ 29 O Desejo de Renato.................................................... 38

Capítulo 2............................................................. 57 Semana Nova, Gente Nova............................................ 57 Quem é Vivo Sempre Aparece........................................ 63 Causas Impossíveis...................................................... 68 Todos Contra o Garoto................................................. 72 Um Bico Para Juan...................................................... 76

Capítulo 3............................................................. 87 Só Amigos................................................................ 87 Uma Agradável Surpresa............................................... 96 Uma Joia Rara..........................................................104

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De Joelhos...............................................................109 Missão Impossível......................................................115

Capítulo 4............................................................127 Alguém Especial........................................................127 A Menina da Classe ao Lado..........................................133 Um Sinal.................................................................142 Um Sinal Confiável....................................................147 A Hora das Trevas......................................................151

Capítulo 5............................................................159 Pessoas Especiais........................................................159 Falando a Verdade......................................................169 Peça a Jesus!.............................................................173 Mudanças Drásticas....................................................178 Contra-Ataque..........................................................185 Invasão de Privacidade.................................................198 Prelúdio de um Pesadelo..............................................204

Capítulo 6............................................................217 Livros Certos...........................................................217 Que Dia É Hoje?.......................................................224 Sonho ou Realidade?...................................................236 Tem Que Pedir!.........................................................244 Uma Simples Oração..................................................257 Impossibilitado..........................................................259

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Contagem Regressiva..................................................261 Oração de Criança.....................................................263 Traição...................................................................280

Capítulo 7............................................................293 Com Fome...............................................................293 Tudo Novo...............................................................311 As Prioridades do Professor..........................................322 Mais Uma Chance......................................................335 Todos Contra o Professor.............................................344 Dia de Colheita.........................................................359

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Capítulo 1

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O Desejo de Orlando Orlando Lobato não precisava de alarme para despertar. O organismo do homem era um relógio e o sujeito acordava às 6h30 da manhã todos os dias. Naquele domingo não foi diferente. Os primeiros raios do sol da manhã sequer tinham forças para atravessar o tecido da cortina, mas Orlando já tinha despertado. No escuro, ele olhou para o lado e viu a esposa, Nice, dormindo na outra extremidade da cama. Orlando percebeu que ele mesmo tinha dormido quase no limite do colchão e que havia mais de um metro entre ele e sua companheira. Já fazia muito tempo que o casamento deles existia apenas na aparência. A relação vinha se degenerando nos últimos anos e os reflexos daquele processo eram muito evidentes. Marido e mulher estavam separados por um abismo emocional. Os diálogos entre os dois aconteciam somente na medida do necessário e era raro vê‑los conversando normalmente sobre algum assunto. Só se falavam quando precisavam tomar alguma decisão­ importante ou tratar de algum assunto relativo aos filhos. O silêncio predominava em quase todas as outras ocasiões. Orlando jogou as pernas para fora da cama, sentou-se e coçou a cabeça por alguns instantes. Depois, o homem olhou para o chão e forçou a vista para tentar enxergar onde estavam seus chinelos, mas sua busca foi vã, pois eles não estavam ali. O silêncio daquele momento escondia uma verdade que era desconhecida de Orlando. O homem não sabia, mas estava sendo observado naquele exato momento.

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Arazabu estava ali perto, em frente ao armário, contemplando o casal naqueles primeiros minutos da manhã. Arazabu era um demônio. Ele passava horas e horas observando Orlando e Nice. Aquele espírito conhecia o casal muito bem e acompanhava de perto cada momento da vida dos dois. Conhecia seus hábitos e suas fraquezas. Nem Orlando nem Nice sabiam que eram objeto de estudo daquele demônio. E nem poderia ser diferente, pois Arazabu era um ser espiritual – invisível aos olhos humanos. O marido e a mulher não desconfiavam que aquele espírito maligno os acompanhava dia e noite. Eles não tinham ciência de que havia uma entidade demoníaca trabalhando pelo desgaste da relação e achavam que os repetidos desentendimentos que tinham eram simplesmente fruto da rotina. A história do envolvimento entre Arazabu e aqueles dois começou da seguinte forma: alguns anos antes, Orlando e Nice eram como qualquer outro casal – concordavam sobre alguns assuntos e discordavam sobre outros. Viviam momentos de paz e de conflito. Nessa época, o demônio ainda estava procurando brechas para agir, rodeando a relação, buscando oportunidades de colocar um cônjuge contra o outro. Arazabu notou que as brigas entre Orlando e Nice eram constantes e percebeu que seriam elas as vias por onde ele chegaria ao coração dos dois. De qualquer forma, o demônio precisava de algo que lhe conferisse autoridade – um ato ou uma palavra – para poder tomar as rédeas da relação e comandá-la. Por fim, a espera acabou sendo recompensada e o espírito recebeu a chance que tanto desejava. Em uma determinada ocasião, houve uma briga entre Orlando e Nice. Mas não foi uma briga comum; foi um quebra-pau. No auge da discussão – em meio a gritos e ameaças – o marido disse à esposa que a odiava. A esposa foi recíproca ao responder, dizendo que também odiava o marido. E foi exatamente essa ocasião que deu a Arazabu a autoridade tão desejada. Ele era um espírito que gostava de trabalhar promovendo o ódio entre as pessoas, e as palavras que saíram da boca de Orlando e Nice foram o convite que o demônio estava esperando. A participação do espírito maligno naquele laço conjugal deixou de ser somente de influência e passou a ser de domínio. Ele dominava os dois. E o demônio não desgrudou mais de seus dominados. Acompanhava o casal em cada momento em que eles estavam juntos. Quando os dois compartilhavam o mesmo ambiente, Arazabu estava ali, ao lado deles, procurando promover confusões. Todas as madrugadas, o demônio plantava uma semente de desgosto na mente dos dois, de

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forma que eles já acordavam insatisfeitos com o casamento. E naquela manhã de domingo a história se repetiu: Orlando acordou, sentou na cama, olhou para a esposa e teve dificuldades em definir o que era pior: o pesadelo ou a realidade. Depois de perceber que seus chinelos não estavam próximos à cama, o homem se lembrou de que os tinha deixado perto do banheiro. Ele se levantou cuidadosamente, caminhou em silêncio até onde eles estavam e os calçou. Orlando manteve a discrição para atravessar todo o dormitório e sair pela porta, pois não queria acordar Nice. Quanto menos contato eles tivessem, melhor seria. Arazabu, por sua vez, ficou no quarto, esperando Nice acordar. Ele não costumava atacar o marido ou a esposa quando eles estavam sozinhos. Fazia isso raramente. Suas ações – na maioria das vezes – eram praticadas quando os dois estavam juntos. Nessas horas, o demônio aproveitava os diálogos e as conversas do casal para gerar discussões entre eles. Do lado de fora do quarto, Orlando seguiu andando pelo corredor e passou em frente aos quartos de Helena, Juan e Renato – seus três filhos. O homem teve o cuidado de manter silêncio para não acordar nenhum deles. Ainda era cedo e ele sabia que qualquer ruído poderia atrapalhá-los. O escritório de Orlando ficava no fim do corredor. O homem entrou ali, foi até o canto onde ficava sua mesa, puxou sua cadeira e se sentou. Ele lecionava Filosofia em uma universidade renomada, de prestígio internacional. O próprio Orlando era um professor muito respeitado – com destaque até mesmo entre os especialistas. Ele sempre havia sido uma pessoa dedicada ao trabalho, mas os últimos meses estavam exigindo uma dedicação ainda maior. Orlando estava chefiando uma pesquisa que envolvia equipes das maiores faculdades do país e andava bastante ocupado. Mas, ao contrário do que se poderia imaginar, o excesso de serviço não estava lhe causando incômodo algum, pois o sujeito usava a profissão como válvula de escape para os muitos problemas que enfrentava em sua rotina doméstica. E havia um evento muito especial que vinha motivando Orlando naqueles tempos. Era o Encontro de Filosofia Contemporânea que seria promovido dali a poucas semanas, no auditório da universidade onde ele dava aula. Este encontro era anual e acontecia sempre na mesma época.Várias autoridades em Filosofia – do cenário mundial – se encontrariam para debater assuntos ligados ao saber e às questões existenciais da vida humana. O congresso era a coisa que o professor mais aguardava durante o ano. Mas, além do congresso, havia um outro encontro que também ocupava um lugar especial no coração do homem. Era o Jantar dos Amigos. Orlando e seus colegas de

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formatura eram muito chegados e criaram um vínculo que permaneceu firme mesmo após o término do curso. O grupo tinha cultivado uma afinidade mútua e manteve‑se unido nas décadas seguintes. A turma era pequena – com mais ou menos dez pessoas – e costumava sair para jantar poucos dias antes do Encontro de Filosofia Contemporânea. De qualquer forma, Orlando seria obrigado a conter a própria ansiedade, pois aqueles eventos só iriam acontecer dentro de alguns dias. Até lá, o professor teria de se satisfazer com a própria rotina enfadonha e cheia de conflitos domésticos. Durante esse tempo de espera, sua biblioteca – no escritório – seria sua companheira. Ainda de pijama, o professor abriu alguns dos livros que estavam sobre a própria mesa e passou algumas horas lendo e estudando seus textos prediletos. Passado esse tempo, o homem foi abordado pelo filho mais novo – Renato. O menino entrou pela porta e cumprimentou o pai: – E aí, pai... – Bom dia, filho. Dormiu bem? – Dormi. Eu já acordei faz tempo, mas fiquei jogando video­game no quarto. Eu já estou quase terminando a última fase... Orlando colocou um marcador na página onde havia interrompido sua leitura, fechou o livro e deu mais atenção ao filho: – Ah é? Mas este jogo não é novo? Como é que você já está terminando a última fase? – O homem ficou curioso. O garoto chegou perto do pai e confidenciou: – É que eu entro na Internet e leio os macetes... Orlando ficou preocupado quando escutou aquilo, pois sabia que o filho iria querer comprar um jogo novo logo que conseguisse terminar aquele. – Mas me diga uma coisa, filho: como é que você consegue achar estas coisas na Internet? O moleque fez cara de deboche e disparou: – No Google!!! O pai deu uma gargalhada e ficou pensando em como o tempo havia passado rápido. Poucos dias atrás, Renato era uma criança que mal conseguia alcançar seus brinquedos nas prateleiras do quarto. De repente, o menino já estava encontrando novidades na Internet, fazendo pesquisas e realizando novas descobertas. Orlando teve de reconhecer que os anos haviam passado bem depressa!

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Em meio àqueles momentos agradáveis, o homem sentiu seu estômago reclamar. Ele percebeu que já tinha dedicado bastante tempo aos próprios estudos e que precisava tomar um lanche. Assim, o professor desencostou da cadeira, cutucou a barriga do filho com o dedo indicador e perguntou: – Você já tomou café da manhã? Renato acenou positivamente com a cabeça e o pai arrematou: – Pois eu ainda não. Quer ir até a cozinha comigo? – Não... Eu vou continuar jogando videogame no meu quarto! Depois a gente se fala... – o filho se despediu do pai e voltou para o quarto. Orlando foi até a cozinha e começou a mexer nos armários – procurando alguma coisa para comer. De repente, ele escutou Nice entrando pela porta. Mas ela não entrou sozinha ali. Arazabu entrou junto. O demônio ficou esperando que a mulher acordasse para tentar criar alguma confusão entre os cônjuges. O espírito maligno se posicionou ao lado da mesa e ficou ali parado, incógnito, camuflado. A cena era curiosa, pois Arazabu era um ser enorme e monstruoso – mas invisível. Ele era um espírito e só podia ser enxergado por outros seres espirituais – anjos ou demônios. O demônio ficou prestando atenção aos atos e às palavras de Nice e de Orlando, identificando uma boa oportunidade para provocá-los. – Você tem que levar o Renatinho até a casa do Mateus. – Nice já foi dando ordens ao marido antes mesmo de lhe dizer bom-dia. – Eu dormi muito bem! – Orlando rebateu com ironia. – Agradeço a tua preocupação... Nice fingiu não ter ouvido o comentário do esposo e continuou: – Já são 9h e eu disse para a Laura que o Renatinho iria chegar às 9h30. Você tem meia hora pra levá-lo até lá. Arazabu percebeu que não precisaria se esforçar muito. A situa­ção já lhe era bastante favorável. Ele imaginou que o marido e a mulher fossem continuar com aquelas pequenas provocações até que um deles perdesse a paciência. Mas, de qualquer forma, ele saiu de onde estava, chegou bem perto de Orlando – por trás dos ombros – e começou a exercer suas influências sobre o homem. Sua intenção era fazer com que o marido se sentisse ofendido com aquela postura autoritária da esposa e lhe desse uma resposta atravessada – do tipo quem você pensa que é para me dar ordens?. Atrás de Orlando, Arazabu ficava fazendo gestos e mais gestos, como se estivesse agredindo o homem. De punhos cerrados, ele fazia movimentos na direção de Orlando,

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como quem desfere golpes contra um adversário. De fato, o professor não sentia fisicamente os golpes, mas eles lhe causavam avarias no campo espiritual. O ódio do demônio ia penetrando na mente do sujeito – como água que cai na areia. Mas houve um imprevisto que acabou frustrando as intenções do demônio. O papo que Orlando tinha tido com Renatinho no escritório havia feito muito bem ao homem – e ele decidiu que não iria estragar o dia do filho caçula. O sujeito pensou duas vezes antes de dar uma resposta que estivesse à altura das provocações de Nice e acabou optando pelo silêncio. Assim, ele resolveu ignorar a esposa e foi para o próprio quarto, pois precisava trocar de roupa para levar o filho mais novo à casa do amigo. Arazabu se deu conta de que suas iniciativas não tinham surtido efeito nenhum e ficou zangado. Orlando havia resistido à sua investida e preferiu não rebater a provocação da esposa. O demônio achou aquilo bastante estranho, pois tanto o marido como a mulher costumavam obedecer às suas sugestões – principalmente na parte da manhã, quando ambos estavam mal-humorados. De qualquer forma, o espírito só conseguiu lamentar o fato, pois o homem já havia deixado a cozinha. Dentro do quarto, Orlando olhou no relógio e percebeu que não havia tempo suficiente para tomar banho antes de levar Renato. Ele teria de correr para chegar à casa do Mateus no horário combinado e só conseguiria tomar uma ducha depois que voltasse. O sujeito foi até a poltrona que ficava no canto do dormitório, vestiu a roupa do dia anterior e caminhou até o quarto do filho caçula para ver se ele já estava pronto. Quando chegou ao quarto do menino, ele colocou meio corpo para dentro da porta e perguntou: – E aí, Renatinho? Já se arrumou? Renato estava em frente ao aparelho de televisão, de controle remoto na mão, jogando videogame: – Minhas coisas já estão arrumadas desde ontem, pai... Posso terminar esta fase? – o menino pediu. – Nada feito. Nós estamos atrasados. Deixar os outros esperando é falta de educação... Pegue suas coisas e vamos embora – o homem esclareceu. Renato atendeu prontamente à ordem do pai, desligou o aparelho, pegou sua mochila e foi até a cozinha para se despedir da mãe. Depois, ele saiu correndo e foi até a garagem – onde Orlando o esperava. Durante o percurso, os dois permaneceram quietos. Havia uma música tocando no som do carro e ambos ficaram em silêncio. Renato estava feliz e ansioso, pois o

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Mateus era um de seus melhores amigos e eles sempre se divertiam muito quando estavam juntos. A família do Mateus morava em um condomínio legal, com quadra de esportes, piscina e salão de jogos. Renato já tinha estado na casa do amigo várias vezes, e os domingos que eles passavam juntos eram bastante legais. Eles nadavam, jogavam bola e assistiam à TV. Já Orlando não era tão simpático à amizade que existia entre os dois. Mateus e toda a família eram cristãos. Orlando, por sua vez, era ateu convicto e repudiava a religiosidade em geral. O homem cresceu em uma família de católicos não-praticantes que mal sabiam explicar os princípios em que acreditavam e só compareciam a alguma missa quando alguém morria. Depois, na juventude, Orlando entrou para a faculdade de Filosofia e acabou tendo contato com algumas teorias sobre a origem da religião. Alguns dos filósofos afirmavam que o Homem havia inventado Deus com a finalidade de tornar a vida menos difícil. Diziam que o ser humano tinha criado as divindades – todas elas – na tentativa de experimentar alguma esperança em meio aos muitos problemas. Orlando acabou abraçando aquilo como verdade e passou a cultivar uma aversão profunda por todo e qualquer tipo de manifestação religiosa. Ele entendia que a religiosidade humana era uma fuga em massa – coisa de gente fraca. Vários dos amigos mais próximos de Orlando compartilhavam daquela opinião. Aquele grupo de colegas que se encontrava anualmente para o Jantar dos Amigos era todo constituído de ateus. Os colegas de Orlando tinham ideias bastante parecidas acerca da religião e nenhum deles – sem exceção – acreditava na existência de um Deus. Todos eles tinham feito um voto coletivo chamado Pacto de Lealdade quando ainda estavam na faculdade. O pacto se apresentava nos seguintes termos: nenhum deles – em hipótese alguma – iria se render aos enganos da religião. Eles deveriam se manter ateus pelo resto de suas vidas. Quando eles se reuniam na semana anterior ao Encontro de Filosofia Contemporânea, era para comer, beber, matar as saudades e reafirmar suas convicções – de que Deus não existia. Era por causa dessa sua opinião contrária à existência de Deus que Orlando ficava preocupado com a convivência entre seu filho e a família do Mateus. A real culpada por aquela leve antipatia que o homem tinha por aquela família não era a família em si – e sim a crença que eles tinham. O homem não gostaria que seu filho fosse condicionado a tirar conclusões sobre qualquer assunto religioso antes de poder fazer suas próprias análises e desenvolver suas próprias opiniões. Orlando tinha ciência de que a família

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do Mateus frequentava a igreja aos domingos e que Renato iria ao culto com eles naquela noite. Assim, sua esperança era de que Renatinho aproveitasse o lado social daquela visita e descartasse todas as implicações religiosas às quais estaria exposto durante aquele tempo. – Pronto, filho. – O pai estacionou em frente à casa do Mateus. – A gente se encontra de novo à noite. O garoto se inclinou para o banco do motorista, deu um abraço em Orlando, abriu a porta e saiu do carro. O homem ainda viu quando o menino atravessou o portão do prédio e foi correndo em direção ao hall do elevador. Só depois de perder o filho de vista foi que Orlando engatou a marcha do carro e saiu dirigindo. O homem desligou a música que estava tocando no interior do veículo e ficou calado durante o trajeto da volta. No silêncio, ele ficou pensando que teria de ficar o dia inteiro com Nice – e julgava ser esta uma missão quase impossível. Durante a semana não havia muitos problemas, pois Orlando voltava tarde da universidade e quase não encontrava a esposa. Nos finais de semana, porém, a coisa se complicava, pois o professor não tinha como escapar do convívio direto com a mulher. Assim, o homem voltou para casa desgostoso e desanimado. Quando entrou no apartamento, Orlando escutou alguma movimentação na cozinha. Ele imaginou que Nice estivesse ali e procurou fazer silêncio – para não chamar a atenção da esposa. O homem passou pelo corredor sem fazer barulho algum e seguiu direto para o próprio escritório. Chegando ali, o professor deixou seus pertences sobre a estante e sentou-se em sua cadeira. Ele apoiou as pernas sobre a mesa, reclinou-se e ficou olhando para o alto, pensando na vida. Ele e Nice viviam a pior fase do casamento – algo sem precedentes. O homem quase não podia mais suportar. Também havia a questão dos filhos. Orlando sempre havia se esforçado muito para dar a eles algum futuro. Neste sentido, só Renato – o filho mais novo – dava alguma esperança ao pai. Os outros dois só davam trabalho. Helena – a filha mais velha – tinha arranjado um namorado que era um cafajeste. Juan – o do meio – era um vagabundo que dormia durante o dia e farreava durante a noite. Por tudo isso, Orlando estava em seu limite psicológico. Os problemas eram tantos que ele tinha vontade de sumir. A voz em seu peito dizia: Parem o mundo que eu quero descer!

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A única coisa que trazia algum ânimo ao homem era pensar nos encontros que aconteceriam nas semanas seguintes. Primeiro viria o Jantar dos Amigos. Ele poderia rever a turma e esquecer os problemas familiares – nem que fosse por uma única noite. Depois viria o Encontro de Filosofia Contemporânea. O jantar e o congresso motivavam o professor e ainda o ajudavam a esquecer os problemas ligados à própria família.

O Desejo de Helena Orlando ainda estava reclinado na poltrona e olhando para o teto quando escutou sua esposa gritar à porta: – Orlando... Venha até a sala para me ajudar. A Helena está chorando e você precisa conversar com ela... O sujeito escutou aquilo e ouviu sua própria consciência lhe dizer que ele tinha razão: sua família era uma confusão sem tamanho. Ele até tentava fugir dos problemas, mas eles pareciam multiplicar-se à sua frente. Orlando colocou as mãos sobre o rosto, resmungou um pouco e foi até a sala para ver o que estava acontecendo com Helena. Quando chegou ali, o sujeito deu de cara com a filha. Ela era uma moça bonita e alegre. Cursava a faculdade de Relações Públicas e trabalhava na Assessoria de Imprensa de uma grande multinacional. A moça estava deitada no sofá, chorando, com os olhos bastante vermelhos. Ao seu lado estavam o telefone e uma caixa de lenços de papel. – O que aconteceu, Helena? – Orlando perguntou. Nice estava na cozinha e escutou quando o marido fez a pergunta para a filha. Antes que a moça pudesse responder, a mulher veio até a sala e já foi explicando: – Ela brigou com o Sandro de novo... – Só pra variar um pouco... – o homem disse sem paciência. – O que houve desta vez? – Ah, pai... – Helena falou com voz de choro. – Prefiro nem falar... A vontade do pai era responder: "OK... Então não fale! Fique aí com os seus problemas enquanto eu fico aqui com os meus". Mas o homem não poderia ser insensível a tal ponto. Tinha de dar atenção à filha. Assim, o cara foi até o sofá onde a menina estava deitada, afastou o telefone, sentou perto dos pés da moça e perguntou: – Vocês brigaram de novo? Enquanto a menina soluçava, Nice atravessou a conversa novamente:

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– A Helena estava toda feliz porque hoje o dia está bonito, com sol forte e céu aberto. Aí ela ligou para o Sandro e sugeriu que eles fossem ao parque jogar tênis. O Sandro disse que não ia dar, pois ele já tinha um compromisso marcado. – Mas, Helena... – Orlando interrompeu a esposa e se virou para a filha. – Isso acontece! Se o Sandro já tinha um compromisso marcado, não há razão para você chorar. Vocês podem ir ao parque na semana que vem! Não seja tão mimada... A menina ficou sem jeito, esfregou o nariz e explicou para Orlando: – É o seguinte, pai... – ela dizia com a voz trêmula. – O compromisso dele é o churrasco de aniversário da ex-namorada... Orlando escutou aquilo, ficou quieto por alguns segundos e finalmente perguntou: – Que comentário você quer que eu faça sobre isso? Que tipo de sujeito se nega a passear com a namorada para se encontrar com a ex? Na sequência, ele se levantou do sofá e aumentou o volume da voz: – Eu já te perguntei isto um milhão de vezes, Helena, mas vou perguntar novamente: você acha que este cara serve pra você? Você acha que ele presta pra alguma coisa? Nice, que tinha voltado para a cozinha, escutou a conversa dos dois e gritou em direção à sala: – Calma... Ainda não terminou. Escute o resto da história! Orlando ouviu o comentário da esposa e pediu esclarecimentos à filha: – E tem mais? – Tem, pai... – Helena dizia sem jeito. – Eu chorei, reclamei e fiz um escândalo... Mas o Sandro desconversou e mudou de assunto. Aí eu disse a ele que não me importava que ele fosse ao churrasco da ex-namorada, porém, eu chamaria o pessoal da faculdade para jogar tênis comigo no parque, pois o dia está lindo e eu não queria ficar dentro de casa. Orlando permaneceu em silêncio e ela terminou de contar o que tinha acontecido: – O Sandro disse que não aceitava que eu saísse sozinha, pois eu sou uma moça comprometida. Falou que não era conveniente eu sair sem a companhia dele e que o caso dele é muito diferente do meu, pois ele é homem e eu sou mulher. Disse ainda que o compromisso dele já estava marcado há muito tempo e que eu estava querendo sair com o povo da faculdade só para provocá-lo – a moça concluiu sua história e se calou. Orlando percebeu que Helena não tinha mais nada a dizer e perguntou:

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– E qual foi o final da história? Ele foi para o churrasco e você ficou em casa? É isso? Helena, sem olhar nos olhos do pai, concordou com a cabeça. Nice, da cozinha, gritou mais uma vez: – Dá pra acreditar, Orlando? O homem cruzou os braços, fez cara de reprovação e disse algumas poucas palavras: – Veja, Helena. Você é uma moça instruída, estudada e inteligente. Tenho certeza de que você é capaz de perceber por si mesma que esta situação é ridícula; que este sujeito não gosta de você e que ele é um palhaço. Eu me recuso a dizer qualquer coisa a este respeito, pois não posso acreditar que minha filha aceite ser humilhada desta forma. A moça começou a chorar e fez um comentário que tornou a situação ainda pior: – Mas eu gosto dele... Depois daquela declaração, Orlando saiu caminhando em direção ao corredor e resmungou: – Quer saber, Helena: você merece que ele faça isto com você... O comentário do pai foi uma punhalada no peito da filha. A segunda do dia. O namorado já tinha feito a menina sofrer naquela manhã, e as verdades ditas pelo pai fizeram com que o sofrimento aumentasse. A moça deitou-se novamente no sofá, agarrou uma almofada e voltou a chorar. Helena se sentiu completamente desamparada naquele instante, pois sabia que tanto o pai como a mãe reprovavam seu relacionamento com Sandro. Por conta disso, ela resolveu que iria terminar de derramar suas lágrimas no próprio quarto. A garota concluiu que não poderia ficar ali na sala, chorando por causa do rapaz, pois mostraria aos pais que eles estavam certos – e ela não queria dar a eles o gostinho da razão. Assim, a menina se levantou, pegou a caixa de lenços e foi para o quarto. Já no quarto, a moça fechou a porta, deu alguns passos em direção à cama e atirou-se sobre o colchão. Ela ficou ali, triste, chorosa, lamentando o comportamento de seu amado. Tudo aquilo estava sendo um dissabor para Helena; um nocaute sentimental. A moça, assim como o resto da família, estava experimentando muita desordem nos últimos tempos. Apesar de tirar boas notas na faculdade e de ter boas perspectivas na empresa, ela sofria com as mancadas do namorado e com os problemas de relacionamento dos pais. A menina até tentava encontrar meios para superar aquelas dificuldades, mas faltava-lhe a força na maioria das vezes.

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Chateada, ela ficou refletindo sobre o próprio namoro. Ela e Sandro tinham se conhecido em uma festa promovida pelo pessoal da faculdade. Os dois ficaram, trocaram telefones e descobriram que frequentavam o mesmo curso. Helena estava no terceiro ano de Relações Públicas e Sandro no quarto. Bastaram alguns dias para que o interesse se tornasse mais evidente a ambos. O envolvimento superficial e sem compromisso que eles tiveram na festa acabou se transformando em um relacionamento sério e Helena levou Sandro até a casa dos pais para apresentá-lo como seu namorado. Mas, com o tempo, as dificuldades começaram a surgir. Sandro gostava de Helena, mas não estava muito disposto a deixar algumas das práticas da vida de solteiro. O cara sumia aos finais de semana, marcava compromissos com os amigos sem avisar a moça e vivia deixando a namorada de lado. Todas aquelas atitudes do rapaz acabavam por trazer decepção a Helena, pois ela se sentia humilhada e desprezada. A garota sabia que não deveria tolerar determinadas condutas do namorado e fazia exigências para que houvesse condições de eles permanecerem juntos. Mas Sandro parecia ignorar todas elas e continuava tendo o mesmo tipo de comportamento. O tempo passava e ele continuava vivendo como se não tivesse namorada. A moça também já tinha considerado a possibilidade de terminar o namoro, mas não estava certa se queria mesmo colocar um ponto final na relação. Ela nunca tinha tido um namorado antes de se relacionar com Sandro e achava que ele era o último bombom da caixinha. Helena achava que nenhum outro moço de sua idade iria querer algo sério, com compromisso. Ela já tinha ficado com outros caras em festas e baladas, mas nunca tinha experimentado uma relação mais duradoura – como aquela que tinha com Sandro. A menina tinha medo de terminar o namoro e ficar só. Mas, apesar das decepções, a garota ainda conservava uma reserva de esperança no coração. Helena tinha confiança de que seu namoro poderia tomar novos rumos e se transformar em algo alegre e saudável. O Dia dos Namorados estava chegando, e a moça gostaria de estar vivendo um bom momento com Sandro – de paz e harmonia. Ela era romântica e acreditava que o moço iria aproveitar a ocasião para corresponder a seu romantismo. Aquele seria o primeiro Dia dos Namorados que eles passariam juntos, e Helena gostaria que a data fosse absolutamente inesquecível. Para manter suas esperanças, Helena procurava se valer de alguns amuletos que tinha no próprio quarto. Ela era uma garota bastante supersticiosa e gostava de colecionar artigos esotéricos de toda sorte. A menina tinha uma bancada onde deixava seus objetos

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místicos: pirâmides, bruxinhas, elefantes, cristais, duendes, fadas, gnomos, etc. Quando era mais nova, a moça ridicularizava pessoas que acreditavam naquele tipo de superstição. Porém, o tempo havia feito com que Helena mudasse de ideia e ela tinha uma firme convicção de que seus amuletos poderiam causar interferências positivas em sua vida. Por causa da briga que tinha tido naquela manhã com Sandro, Helena resolveu dar uma olhada em seus brinquedos. Sua intenção era ver se algum deles poderia lhe dar sorte especial em seu relacionamento, ajudando-a nas questões sentimentais. Assim, a menina pulou da cama e foi caminhando em direção à bancada onde ficavam seus objetos místicos. Domarinu e Grabaru ficaram bastante animados quando perceberam que a moça estava se aproximando da bancada, pois aquele território pertencia aos dois. Eles eram espíritos que gostavam de trabalhar levando as pessoas ao engano e faziam uso constante daqueles itens para preservar Helena em confusão espiritual. Os dois habitavam aquela bancada junto com muitos outros espíritos malignos e todos eles trabalhavam unidos para que a menina continuasse longe de Deus e da verdade. Helena passou os olhos pelos próprios amuletos, analisando cada um deles com cuidado. Ela precisava de sorte no amor e foi verificar se havia algo em sua bancada que pudesse lhe proporcionar aquilo. A moça observou e observou seus bonecos, mas não sabia exatamente como deveria proceder para contar com o favor daqueles objetos. Ela deveria fazer uma reza? Deveria fazer uma simpatia? Estava bastante perdida! Mas os demônios a ajudaram a tomar uma decisão. Domarinu e Grabaru chegaram mais perto de Helena e lançaram suas influências sobre a garota. Helena atendeu à sugestão dos espíritos malignos e repousou seu olhar sobre uma pirâmide que ficava bem no canto da bancada. Ela nunca tinha dado muita atenção àquela pirâmide, mas sentiu um desejo estranho de pegá-la com as mãos. A moça hesitou em obedecer, mas Domarinu tratou de tomar uma providência. Ele chamou mais alguns demônios e todos eles trabalharam próximos às mãos de Helena – de forma que a moça se sentiu incentivada a estender a mão para agarrar o item. A pirâmide era pesada, feita de um mineral nobre e raro. Havia sido comprada em uma loja refinada do centro da cidade. Mas, apesar de ser um item bastante exclusivo, aquele presente não pertencia ao grupo dos favoritos de Helena. Ela gostava mais dos bonecos – fadas, duendes, gnomos e bruxas – pois eram mais pessoais. A pirâmide não tinha rosto e nem nome.

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Helena nunca tinha dado real atenção àquele artigo e não lembrava exatamente qual tipo de proteção aquele item poderia lhe oferecer. Depois de examinar a pirâmide, Helena encontrou um adesivo na parte de baixo do objeto. O selo tinha uma breve explicação sobre as capacidades místicas da pirâmide. A menina começou a ler o texto e ficou bastante animada, pois a mensagem dizia que aquele artefato tinha o poder de harmonizar tudo o que acontecia ao seu redor. Aquela era a Pirâmide da Harmonia. O adesivo ainda explicava que o objeto era capaz de concentrar forças energéticas positivas que traziam paz e ordem a tudo o que estava em suas proximidades. – Puxa vida... Uma Pirâmide da Harmonia! – Helena exclamou com um sorriso no rosto. – De todos os objetos deste móvel eu acabei pegando uma Pirâmide da Harmonia... Nada é por acaso!!! Quando Helena disse aquilo, todos os demônios que estavam ali começaram a dar risada, pois era verdade que nada daquilo tinha acontecido por acaso. Tinha acontecido porque eles trabalharam para que acontecesse daquele jeito! Helena ficou pensando sobre as capacidades daquele objeto, ligou as partes e chegou à seguinte conclusão: seu relacionamento com Sandro estava um caos, e o que ela mais precisava naquele momento era a harmonia prometida por aquele amuleto. A pirâmide tinha tudo a ver com suas necessidades! Assim, a moça correu até a cômoda – do outro lado do quarto – e pegou uma fotografia em que estava com Sandro. Ela tirou a foto do porta-retratos e voltou para a bancada onde estavam seus amuletos. A menina abriu um pequeno espaço ao redor da pirâmide e posicionou a foto bem ali. A intenção da moça era harmonizar seu namoro com Sandro, afastar as confusões e conseguir um pouco de paz. E Helena acreditava que seria bem-sucedida, pois o selo que estava grudado no fundo da pirâmide dizia que ela era capaz de concentrar forças positivas altamente poderosas. A moça se convenceu de que valia a pena recorrer àquelas forças para melhorar sua vida sentimental e deixou o retrato ali, ao lado da Pirâmide da Harmonia. Olhando aquilo, Domarinu, Grabaru e os outros demônios que rondavam aquele lugar sentiram-se satisfeitos. Eles eram espertos e estavam sempre aproveitando as aberturas que Helena lhes dava. E naquele dia não foi diferente: a moça foi consultar os próprios amuletos e eles não precisaram se esforçar para enganá-la. Helena, por sua vez, sentia que seu desejo por paz seria atendido e ficava torcendo para que aquela sua iniciativa desse resultado. Ela queria muito que seu próprio relacionamento fosse legal e que seu primeiro Dia dos Namorados fosse inesquecível.

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O Desejo de Nice Nice estava na cozinha separando ingredientes para preparar o almoço quando escutou o marido entrar ali. O homem tinha tido uma conversa séria com Helena sobre o relacionamento da moça, mas o resultado do bate-papo não tinha sido muito animador. A menina parecia estar apaixonada pelo namorado cafajeste e tudo iria continuar exatamente como estava: o moço pintava e bordava enquanto a menina chorava e sofria. Orlando se aproximou da esposa e comentou: – Este namorado da Helena é mesmo um idiota, hein! Eu não sei como ela se submete a uma situação absurda destas... Que coisa mais ridícula! Aquele parecia ser um comentário normal, sem margem para brigas ou confusões. Mas Arazabu estava ali com eles e tentaria aproveitar as palavras de Orlando para plantar alguma desordem. O demônio já tinha tentado instalar uma confusão no início da manhã, mas o homem não tinha retribuído a falta de educação da esposa e a confusão acabou não acontecendo. De qualquer forma, Arazabu tinha permanecido na cozinha e aproveitou o comentário do professor para atacar o casal. O espírito maligno parou em frente a Nice – olho no olho – e deu um grito no rosto dela. A descarga de ódio gerada pelo demônio atingiu a mulher em cheio e ela disparou: – Você fala do namoro da Helena como se fosse um expert em relacionamentos.Você acha que tem moral pra dizer alguma coisa sobre a vida dos outros? Se seu casamento não fosse um fracasso você até poderia dar palpites sobre o namoro da sua filha... Arazabu percebeu que sua influência tinha surtido efeito e continuou a trabalhar. Em uma fração de segundo, ele saiu de perto de Nice, estacionou bem na frente de Orlando e repetiu o ritual que já tinha dado certo com a mulher: olhou para o homem e deu o maior grito que conseguiu. A descarga de ódio que Arazabu conseguiu produzir desta segunda vez foi ainda maior e o resultado veio em seguida. Orlando olhou para a esposa e resmungou: – E quem é você para dizer isso pra mim? Você só abre a boca pra falar bobagens... Ao ouvir aquilo, o demônio sorriu e viu que tudo já estava encaminhado. Estavam ambos em suas mãos. O pontapé inicial já havia sido dado e o resultado natural seria a baixaria. Tanto o marido como a mulher haviam cedido às investidas do demônio e ele assistia à discussão como um artista que contempla a própria obra recém-concluída. O clima foi ficando mais tenso e a discussão começou a ficar mais séria. Marido e mulher começaram a se ofender mutuamente e Arazabu observava tudo em segredo. De

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repente, o demônio resolveu deixar as coisas piores do que já estavam. Para isso, ele fez o seguinte: encontrou um lugar entre Orlando e Nice e se posicionou ali. Depois, fez um gesto na direção de Orlando – como se estivesse agarrando o homem pelo pescoço. Em seguida, olhou para o outro lado e fez o mesmo gesto na direção de Nice – como se estivesse agarrando a garganta da mulher. Depois, o espírito começou a apertar os dois com força – como se estivesse estrangulando ambos. O resultado daquele ato simbólico foi que marido e mulher começaram a discutir em voz alta – de forma que o condomínio inteiro podia ouvi-los. Aos olhos humanos, aquela parecia ser uma cena normal: um casal de esquentadinhos estava fazendo um acerto de contas. Mas havia ali também uma cena espiritual, invisível, que estava acontecendo em outra dimensão. Entre Orlando e Nice havia um espírito maligno, promovendo o ódio entre os dois. Nesse instante, Helena entrou na cozinha. De dentro do quarto ela havia escutado a discussão dos pais e correu para tentar acalmar a situação. A moça percebeu que ambos já estavam bastante exaltados e se posicionou entre eles. Curiosamente, o lugar que Helena ocupou era quase o mesmo em que Arazabu estava. A diferença era que a moça estava no mundo físico – enquanto o demônio estava no mundo espiritual. Mas ambos estavam lá, entre Orlando e Nice. A moça também estava com os braços esticados em direções opostas – da mesma maneira que o espírito maligno – mas sua intenção era diferente. O demônio estava apertando o pescoço dos dois, esforçando-se para que a briga se tornasse ainda mais intensa. A moça, por sua vez, dizia palavras de conciliação: – Mãe... Pai... Parem com isso! Mas Orlando já estava tomado de ódio. Seu sangue já tinha subido à cabeça e seu rosto já estava completamente vermelho. O homem tinha permanecido calado no primeiro diálogo da manhã – quando a esposa ficou lhe dando ordens – mas não conseguiu suportar uma segunda provocação. Ele ignorou as palavras da filha e continuou a gritar com a esposa: – Você sabe por que nosso casamento é um fracasso? Porque você é uma fracassada... Deveria calar a boca e nos poupar de suas bobagens... – Pai... Pare com isso... Por favor! Fique calmo... – Helena pedia em vão. Nice percebeu que não conseguiria gritar mais alto do que o marido e se deu por vencida. Ela percebeu que Orlando estava começando a ficar ainda mais agressivo e decidiu não revidar. A mulher também ficou preocupada com a situação da filha, pois não queria que Helena tivesse mais chateações do que aquelas já impostas pelo namorado.

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– Está bem, Orlando... – ela disse. – Você tem razão... Você sempre tem razão!!! Pare de dar escândalo na frente da sua filha... Orlando ignorou aquela palavra de ordem e continuou gritando impropérios. O homem saiu da cozinha, seguiu pelo corredor e foi direto para o escritório. De lá, ele disse mais meia dúzia de palavrões e bateu a porta. Helena saiu da cozinha e pensou em ir até o escritório do pai para acalmá-lo. Porém, a garota mudou de ideia no meio do caminho e voltou para o próprio quarto. Já tinha problemas suficientes e não iria ficar se intrometendo na vida dos outros. Sozinha na cozinha, Nice permaneceu em silêncio – como se nada tivesse acontecido. Era esta a forma como ela costumava lidar com os problemas: fingindo que eles não existiam. No entanto, o desconforto era tão grande que Nice deixou de lado as panelas, sentou-se à mesa e começou a lamentar o evento circense que ela e o marido tinham acabado de protagonizar. Aquilo tudo era muito vergonhoso. Ela não imaginava que sua relação com Orlando – que havia se iniciado com amor e cumplicidade – poderia se transformar naquele inferno. Assim, Nice perguntava para si mesma: como eles tinham permitido que as coisas atingissem aquele nível? Onde estava aquela família alegre e unida que eles desejavam construir? De fato, o processo de decomposição da relação não havia sido claro e distinto. Ao contrário! Havia sido imperceptível e lento. Nenhum dos cônjuges tinha conseguido enxergar o rumo que as coisas haviam tomado, pois um deles poderia ter tomado providências e evitado aquela desgraça. A situação dos filhos também a incomodava. Renatinho não dava trabalho algum. Pelo contrário! O garoto era fundamental para que houvesse condições de convivência na casa. O menino era obediente, organizado e alegre. Era bom filho e bom aluno. Helena ocupava uma posição intermediária entre os três filhos do casal. Ela não era problemática, mas também não era bem resolvida. Era metade menina e metade mulher. O único aspecto da vida da filha mais velha que trazia preocupações à mãe era o relacionamento com o namorado. Nem Orlando e nem Nice gostavam de Sandro. O namoro já tinha quase um ano, mas sempre foi cercado por brigas, discussões e lágrimas. Parecia algo sem conserto. Dos três filhos, o que inspirava reais preocupações era – sem dúvidas – Juan. O filho do meio era um suplício; a expressão máxima da rebeldia. Nice já tinha perdido todas as esperanças em relação ao rapaz, pois ele parecia mesmo ser irrecuperável. Todas essas questões tomaram o pensamento de Nice nos instantes seguintes à briga com Orlando e ela resolveu que iria rezar. A mulher tinha uma imagem em uma

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prateleira que ficava ao lado da geladeira e costumava passar vários e vários minutos conversando com sua estátua. A história que ligava Nice àquela estátua era muito interessante. Em uma determinada ocasião, toda a família tinha feito uma viagem para o litoral. Um dos lugares que eles visitaram foi a feira de artesanato que era montada no calçadão da praia. Visitando as barracas dos expositores, Nice viu aquela estátua e ficou impressionada com os detalhes do objeto. Deslumbrada, a mulher comprou a estátua, levou o objeto para casa e o colocou na prateleira que ficava ao lado da geladeira. E foi para lá que ela olhou quando começou a levantar suas preces. Nice se virou para a estátua e começou a levantar seus clamores: – Ah, minha santa... É tanto problema que eu nem sei por onde começar... – ela dizia. – Você sabe... As coisas não andam nada bem entre mim e Orlando. Na verdade, estão bem ruins. E o pior de tudo é que eu não vejo perspectivas de melhoras. A coisa está preta mesmo. Nós nos descuidamos mais do que poderíamos... Por razões óbvias, a estátua não escutava nada do que Nice dizia. Em contrapartida, havia um espírito maligno ali e ele ouvia cada palavra proferida pela mulher. Seu nome era Belzeredu e ele era um espírito que gostava de incitar as pessoas ao engano da idolatria. E era justamente isso o que Belzeredu estava fazendo naquele instante: enquanto Nice se lamuriava diante da estátua, ele ficava ouvindo as preces da mulher e levando-a a crer que a imagem realmente escutava suas palavras. Belzeredu tinha se associado àquela estátua quando o artigo ainda estava sendo confeccionado. O objeto havia sido esculpido na marcenaria de um homem idoso, e o demônio acompanhou pacientemente todo o processo de manufatura da imagem. Quando o homem concluiu o trabalho, o espírito maligno associou-se ao objeto esperando poder agir livremente na vida da pessoa que comprasse aquela estátua. E foi exatamente o que aconteceu quando Nice levou a imagem para casa: o espírito maligno começou a agir em sua vida com bastante liberdade. E havia ainda um fato bem interessante na maneira como Belzeredu trabalhava na vida de Nice: o demônio havia colocado uma venda nos olhos espirituais da mulher de forma que ela se tornou espiritualmente cega. Nice era incapaz de perceber que sua estátua não escutava nada do que ela dizia, pois seus olhos espirituais estavam cobertos pela venda colocada por Belzeredu. E naquele dia, as coisas estavam acontecendo como de costume: Nice conversava com a estátua enquanto Belzeredu ouvia cada detalhe do monólogo:

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– Minha santa... Também estou preocupada com meus filhos. Você sabe... com o Renato eu não tenho problemas. Ele é bonzinho, educado... Uma joia de criança. Meu medo está mesmo ligado aos outros dois... Helena e Juan. E ela explicou à estátua suas preocupações: – A Helena é uma moça muito esforçada, mas arranjou um namorado que é um traste... Já o Juan não quer saber de estudar, trabalhar ou fazer qualquer outra coisa... Por isso, minha santa, eu quero te fazer um pedido... – Ela fechou os olhos para concluir sua reza. – Eu quero uma família feliz! É só isso... Uma família feliz! É esta a minha petição! Belzeredu percebeu que Nice tinha chegado ao fim de sua prece e começou a trabalhar para mantê-la em idolatria. Ele precisava fazer com que a mulher acreditasse que aquela estátua realmente estava escutando suas petições. Assim, o demônio se aproximou de Nice e disse algumas palavras de incentivo em seu coração – enchendo-a de esperança e confiança. E o resultado foi imediato! Nice imaginou que aquele sentimento fosse uma resposta de sua santa e sentiu-se muito encorajada. Emocionada e com os olhos cheios d’água, ela cochichou para si mesma: – Eu sabia que você não iria me abandonar, minha santa... Eu sinto, no fundo do meu coração, que você me escutou e vai me conceder esta graça. Belzeredu ouviu aquilo e começou a dar risada, pois percebeu que suas sugestões haviam sido aceitas sem restrição alguma. E nem poderia ser diferente, pois Nice já estava dominada por aquele engano. O demônio iludia a mulher com frequência e não teve problema algum para fazê-lo novamente. Depois de terminar sua reza, Nice se apressou para concluir o almoço. Na sequência, ela foi até o corredor chamar Helena para a refeição. Não iria chamar Orlando – por causa da briga – e nem Juan, pois o rapaz ainda estava dormindo e não gostava de ser acordado.

O Desejo de Juan Já era fim de tarde e Orlando estava cochilando no escritório quando percebeu que Juan – seu filho do meio – estava saindo do quarto. O rapaz tinha passado o dia inteiro trancado ali, sem conversar com ninguém, livre de qualquer contato com o resto da família. Era sempre assim: Juan não gostava de estar com seus pais ou com seus irmãos. Por conta disso, o moço vivia trancado. Não saía do quarto para encontrar com ninguém – e não gostava que ninguém fosse até ali para incomodá-lo. Nice e Orlando sempre

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deram liberdade aos filhos para que eles cuidassem de suas próprias coisas e tivessem alguma privacidade, mas Juan abusava da liberdade dada pelos pais e mantinha seu quarto trancado durante todo o tempo. Nem a moça da limpeza entrava ali. Não importava se Juan estivesse em casa ou se ele estivesse fora. O quarto estava sempre trancado. O rapaz era cheio de segredos e não gostava que ninguém entrasse no lugar – somente pessoas convidadas. E o quarto do moço era mesmo bastante diferente do restante da casa. À primeira vista, aquele parecia ser somente o quarto de um jovem rebelde. Mas quem entrava no lugar tinha uma sensação ruim quase que imediata. Os objetos espalhados ali eram intimidantes e pareciam estar carregados de forças negativas. Uma das paredes do quarto era tomada por pôsteres de bandas de metal. As ilustrações dos cartazes eram mórbidas, com rostos de demônios e símbolos de magia negra. Alguns desses pôsteres mostravam fotos dos integrantes das tais bandas – pessoas que se pareciam com cadáveres saídos do cemitério. Do outro lado do quarto – perto da janela – Juan tinha uma coleção de espadas e facas de caça. Todas elas ficavam apoiadas em suportes fixados na parede. Os pais do jovem achavam aquilo muito agressivo, mas o rapaz adorava aqueles objetos. As espadas eram o seu xodó! O próprio Juan apresentava um aspecto bastante agressivo. O rapaz tinha um semblante fechado, andava sempre cabisbaixo e quase nunca sorria. Tinha um cabelo liso, escuro, que chegava quase à altura da cintura. Quem olhava o moço de costas tinha a impressão de que ele havia saído de uma propaganda de xampu. Quanto às roupas, Juan estava sempre vestido com peças escuras e com um longo casaco preto – fosse inverno ou verão. No peito, ele trazia um pingente no formato de uma caveira, feito de prata. O adereço era grande, brilhante e fazia contraste com as roupas escuras que o moço usava. O objeto era capaz de chamar a atenção de qualquer pessoa que estivesse perto do rapaz. Apesar de todo o trabalho que Juan dava aos pais, Orlando não gostava de impor sua autoridade paterna. Ele preferia conversar com o filho, procurando levá-lo à reflexão. Não gostava de ficar dando ordens e impondo regras ao jovem. O problema era que Juan não correspondia às expectativas. O rapaz não tinha respeito pelos pais, não se dava bem com os irmãos, ia mal nos estudos e não tinha nenhum objetivo na vida. Seu negócio era dormir durante o dia e ficar com os amigos durante a noite. Com os irmãos a coisa era parecida. Juan mal olhava na cara da irmã mais velha – Helena – e vivia

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dizendo que ela era uma metida. Em relação a Renato, a coisa não era muito diferente. Juan levava os amigos para casa e usava seu irmão mais novo como objeto de gozação da turma. Ele e os colegas aproveitavam a ingenuidade de Renato para pregar-lhe peças e fazê-lo de bobo. Quanto aos estudos, Juan era uma desgraça. O cara já tinha repetido o primeiro ano do colegial por dois anos consecutivos. A falta de compromisso de Juan acabou fazendo com que Orlando o tirasse da escola particular para matriculá-lo em uma escola pública. Nesses dois anos perdidos pelo filho, Orlando gastou o valor equivalente ao de um carro novo. Uma grana preta! Na transição da escola particular para a pública, Juan passou a estudar no período noturno – o único período disponível para alunos novos. Orlando e Nice tinham esperança de que o rapaz utilizasse o restante do dia para conseguir um emprego. Mas não foi isso o que aconteceu. Juan passava o dia inteiro dormindo e acordava no fim da tarde – antes de ir para o colégio. E pior: ele saía da escola e ficava na rua, com gente desconhecida. O rapaz passava a madrugada inteira fora de casa, sem dar satisfações ao pai ou à mãe, voltando somente quando o sol já estava para nascer. Quando ouviu Juan abrir a porta do quarto, Orlando saiu do escritório e foi até lá para conversar com o rapaz. Ele queria tentar bater um papo com o jovem, por isso puxou assunto com o filho: – E aí, filhão? Como andam as coisas? Juan ficou quieto e não respondeu à pergunta de Orlando. Ele estava guardando a carteira no bolso e sequer deu atenção ao que o pai perguntou. Orlando, por sua vez, viu que o filho não estava com vontade de conversar, mas arriscou uma segunda tentativa: – Você vai sair? A reação de Juan foi exatamente a mesma. O moço permaneceu em silêncio e mexeu em mais algumas coisas que estavam dentro do armário. O pai notou que seu filho não iria lhe responder e fez uma última pergunta ao moço: – Você sabe que horas vai voltar pra casa? – Não sei... – Juan esbravejou. – Mas pode deixar que eu me viro sozinho... Não preciso de babá... Depois de ouvir aquela resposta do moço, Orlando fez um comentário para tentar mostrar ao filho que ele não era tão autossuficiente e independente como pensava: – Não é bem assim, filho... Se você soubesse se virar sozinho tão bem não precisaria morar aqui na nossa casa...

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Juan apelou para a agressividade e disparou em voz alta: – Se quiser que eu vá embora daqui é só me avisar. Eu vou na mesma hora! Não vai faltar lugar para eu ir morar... O pai ficou chateado com aquela postura do rapaz e percebeu que sua tentativa de se aproximar já tinha naufragado. Enquanto Orlando e Juan dialogavam, uma enorme plateia os observava. Nenhum dos dois sabia, mas havia um enorme grupo de espíritos malignos assistindo àquela pequena discussão. Eram os demônios que agiam na vida de Juan. O jovem era acompanhado de perto por demônios de toda sorte e eles cercavam o rapaz por todos os lados. Na vida do moço, havia três grupos de demônios agindo. O primeiro era chefiado por Hurudu e trabalhava para que Juan se tornasse uma pessoa ainda mais violenta do que já era. Hurudu parecia ser muito forte e carregava consigo armas de todo tipo. Sua couraça metálica era cheia de cintos e apetrechos onde as armas ficavam penduradas. Juan sempre havia sido encrenqueiro e dado a confusões, mas houve um episódio específico que deu a Hurudu autoridade sobre Juan. Uma vez, quando estava com alguns amigos, o moço se envolveu em uma briga de rua. Juan estava com seus colegas da escola e eles tiveram um desentendimento com alguns caras de um colégio que ficava no bairro vizinho. Durante a briga, o grupo adversário percebeu-se ameaçado e seus integrantes começaram a fugir. Entre eles, houve um infeliz que tropeçou e acabou ficando para trás. Seus colegas de bando não notaram sua ausência e ele foi alcançado por Juan e por seus amigos. Eles chegaram até esse sujeito e começaram a bater nele. O rapaz estava no chão, sangrando e indefeso, mas todos continuavam a agredi-lo sem dó. Juan ainda não tinha desferido nenhum golpe e ficou olhando aquele ato de crueldade com algumas reservas. Ele estava vendo o sofrimento do moço e acreditava que nada daquilo era realmente necessário. Achava que alguns safanões já seriam suficientes para intimidar o sujeito. Mas Hurudu estava ali e olhava de perto toda aquela confusão, ansioso, aguardando um momento para dar seu bote. Ele já tinha algum poder de persuasão na vida de Juan, mas gostaria de tomar a mente do moço e consolidar seu domínio sobre aquela vida. De repente, pela sugestão de Hurudu, Juan começou a sentir um curioso desejo de entrar naquela confusão e dar sua contribuição. Ele ficou imaginando como seria agredir uma pessoa sem que ela apresentasse resistência. Juan pensava consigo mesmo: será que tinha forças para mandar alguém para o hospital? Será que tinha forças para matar alguém? Em

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meio àqueles muitos pensamentos, ele tomou uma decisão: sem mais nem menos, o rapaz correu até o sujeito que estava caído e deu-lhe um chute na boca do estômago com toda a força. Foi essa a ocasião que deu a abertura que Hurudu desejava. Antes desse evento, o demônio ficava rodeando Juan, sugerindo que ele tomasse parte nas brigas da escola. Depois do linchamento, Hurudu tomou a mente de Juan e passou a ter controle sobre sua vida. Era por essa razão que Juan gostava tanto de espadas, facas e coisas do tipo. Outro grupo presente no quarto de Juan era o grupo que incitava Juan à prostituição. O chefe imediato desses espíritos era Iemandu. Ele havia sido o primeiro a agir na vida de Juan e tinha chamado muitos outros para que se juntassem a ele naquele trabalho – de levar o rapaz à devassidão. Iemandu tinha mais de trinta espíritos sob sua autoridade e todos eles viviam sugerindo a Juan comportamentos impróprios. A aproximação entre Juan e esses espíritos malignos começou quando o moço ganhou um computador. O rapaz vivia acessando sites de conteúdo pornográfico e baixando filmes de conteúdo adulto na Internet. Seu vício cresceu tanto que ele passou a gravar os filmes da Internet em DVD – montando um acervo próprio com mais de cinquenta títulos. Foi nessa ocasião que Iemandu conseguiu uma aproximação com Juan. O demônio percebeu que o moço era uma presa fácil e permaneceu por perto, rodeando, aguardando uma oportunidade de assumir o controle daquela vida. A cada filme assistido, diminuía a distância entre Juan e Iemandu. Mas o tempo passou e chegou a hora de o espírito maligno investir com mais veemência contra Juan. Ele não queria somente sugerir imagens e cenas de prostituição ao moço, queria dominar sua vida. Em um certo fim de semana, Juan saiu com os amigos. Eles estavam próximos do centro da cidade, em uma região perigosa, frequentada principalmente por traficantes e prostitutas. Os colegas decidiram fazer uma farra e resolveram se divertir com uma garota de programa. O grupo estava de carro e passou em uma esquina onde havia uma moça se oferecendo. Eles a trouxeram para dentro do carro e seguiram para uma rua com pouco movimento. Ali, os amigos mantiveram relações com a prostituta alternadamente. Enquanto um deles estava com a moça dentro do carro, os outros aguardavam do lado de fora. Foi nessa oportunidade que Iemandu tomou o coração de Juan. O ato no carro com a garota de programa foi a ocasião em que o demônio entrou na vida do jovem. Havia ainda um último grupo de demônios que agia na vida de Juan. Eles eram conduzidos por Jazanu e trabalhavam para plantar pensamentos de morte no coração de Juan

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de forma que ele vivesse em agonia permanente. Esses demônios rodeavam o moço dia e noite, buscando uma oportunidade para tomar em definitivo seus pensamentos. O aspecto de Jazanu denunciava bem a sua casta. Ele vestia uma longa capa negra, com um capuz que cobria completamente seu rosto. Não havia uma única parte do corpo de Jazanu que ficasse à mostra – nem mesmo suas mãos. Tudo ficava escondido sob a capa preta que ele usava. A principal via de contato entre Juan e Jazanu era o tipo de música que o rapaz escutava. Todo o universo musical apreciado por ele estava mergulhado na morte. A morte estava nos temas das canções, nos nomes das bandas, na feição dos integrantes e nos símbolos dos grupos musicais. Era morte por todo lado. A aproximação entre o rapaz e Jazanu aconteceu de forma bastante natural. Juan mostrava toda a sua devoção àquelas bandas espalhando cartazes pelo quarto e vestindo roupas de cor preta. Todo o estilo de vida do jovem era altamente favorável à aproximação daqueles espíritos, e foi exatamente o que aconteceu: Jazanu e seus colaboradores viviam ao redor do moço. De qualquer forma, o demônio ainda não tinha achado uma brecha suficientemente grande para entrar no coração do jovem e tomar sua mente. Àquela altura, Jazanu só estava próximo de Juan, agindo em sua vida e procurando uma chance de dominá-lo. E todos esses espíritos – Hurudu, Iemandu e Jazanu – estavam olhando para o rapaz enquanto ele conversava com o pai à porta do quarto. Eles estavam satisfeitos pela forma como Juan tratava Orlando e o restante da família. O coração do moço estava duro e ele estava emocionalmente isolado dos próprios familiares. Depois de ignorar a aproximação de Orlando, Juan saiu de casa e seguiu para o lugar onde seus colegas o esperavam. Ele e seus amigos tinham combinado de se encontrar no Parque das Samambaias, que ficava bem perto dali. O parque era um lugar bonito, bem frequentado, cheio de árvores e de chafarizes. O lugar também era ponto de encontro das diferentes tribos: esportistas, hippies, famílias, metaleiros, idosos, religiosos e skatistas. Juan entrou no parque e já foi logo para o ponto de encontro. Eles costumavam se reunir perto do bosque, onde o movimento era menor. Não gostavam de ficar com o resto das pessoas por causa do barulho e da agitação. Juan foi até ali e viu os amigos sentados no chão, espalhados pelo gramado. Todos eles – sem exceção – usavam roupas pretas. O cabelo comprido também era comum à maioria deles. As latas de cerveja e os cigarros passavam aleatoriamente de mão em mão.

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Juan chegou perto da turma e saudou a rapaziada: – E aí, pessoal? Tudo tranquilo? O pessoal devolveu a saudação e o jovem se aproximou de um moço que estava sentado ali perto. Ele deu um tapinha no ombro do rapaz e o cumprimentou: – E aí, Salsicha? Beleza? O Salsicha era um rapaz alto, bem magrinho, com cabelo tão longo quanto o de Juan. A camisa do cara era preta e mostrava o nome de uma banda de metal na altura do peito. Logo abaixo do nome da banda havia um símbolo satânico – uma estrela de cinco pontas conhecida como pentagrama. – E aí, Juan? Tudo certinho? Preparado para hoje? – Preparadíssimo! – Juan respondeu. O Salsicha apontou para uma moça que estava do outro lado do grupo e falou: – A Cibele trouxe as coisas. Já está tudo na mochila dela... Juan olhou na direção da Cibele e a moça fez um sinal de positivo, confirmando a informação passada pelo Salsicha. Já estava tudo com ela. O rapaz devolveu o sinal de positivo, sentou-se ao lado do Salsicha e eles continuaram a conversar: – Pois é, Salsicha... infelizmente eu não pude trazer nada. Da próxima vez eu prometo que trago alguma coisa para ajudar o pessoal. É que você já sabe: meus pais estão cada vez mais chatos e eu não tenho grana pra quase nada. Tive sorte de conseguir vir pra cá hoje. Meu pai me pegou quando eu estava saindo do quarto e eu achei que ele fosse passar um sermão em mim. Ainda bem que ele está vivendo uma fase “paizão” e não tem pegado muito no meu pé. Mas eu nem tinha como pedir grana pra ele... O Salsicha devolveu o tapinha que o amigo lhe deu no ombro e tratou de confortá-lo: – Fica frio, Juan. Você sabe que entre nós não tem esse tipo de coisa. Cada um ajuda como pode... Não fique chateado não. Juan agradeceu a compreensão do Salsicha e lhe fez uma pergunta: – Me diz uma coisa, Salsicha: de quem foi a ideia de passar a madrugada no cemitério? Eu nunca fiz isso antes, mas gostei da parada! Acho que vai ser uma loucura... – Juan dizia sorrindo. – A ideia foi da Ingrid – o Salsicha explicou. – A Ingrid tem uns amigos que costumam visitar o cemitério na madrugada. Ela achou a ideia interessante e sugeriu ao pessoal que nós fizéssemos a mesma coisa. A galera concordou e nós combinamos de ir até lá hoje, passar a madrugada.

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– Pois é... – Juan retomou a palavra. – Eu já tinha lido sobre isso, mas nunca achei que o pessoal fosse curtir. Eu curti pra caramba! E foi dela a ideia de levar vinho? – Sim, foi dela também. – Que legal! – Juan se empolgou. – Isso parece coisa de vampiro... Tomar vinho no cemitério – ele falava enquanto dava risada. O Salsicha também deu risada e, subitamente, mudou de assunto: – Por falar em vampiro... – O cara ficou sério. – Você já está sabendo que vai ter show do 666 daqui a algumas semanas? O coração de Juan ficou acelerado quando ele escutou aquela informação, pois o 666 era a sua banda favorita! O cara arregalou os olhos e pediu mais detalhes ao amigo: – Mas onde você ouviu isso, Salsicha? Quem te contou sobre o show? – Eu vi no site oficial dos caras. Dá uma conferida na Internet. Já saíram as datas da nova turnê, e o primeiro show vai ser aqui... O rapaz ficou empolgadíssimo com aquilo, mas lembrou que estava curto de grana e passou da euforia à preocupação em uma fração de segundo: – Caramba... bem que o show poderia ser no mês que vem. Assim, eu teria tempo para juntar algum dinheiro. Acho que não vou conseguir juntar o suficiente para comprar um ingresso pra mim. O Salsicha escutou aquilo e sugeriu: – Por que você não fala com o Pitaco? Acho que ele pode dar um jeito nessa sua falta de grana... Todos que estavam ali conheciam o Pitaco. Ele era um cara mais velho que tinha uma boa relação com aquele grupo de garotos. O cara comandava um ponto de drogas perto do colégio onde Juan estudava e costumava vender maconha para o pessoal da escola. De vez em quando o Pitaco pedia algum favor aos moleques que estudavam ali e eles o ajudavam. Geralmente, o cara pedia que eles levassem droga a algum lugar em troca de dinheiro. – É... o Pitaco é uma boa ideia. Será que ele tem algum trabalho pra me passar nos próximos dias? – Juan perguntou. – Ele sempre tem... o Pitaco conhece muita gente – o Salsicha dizia confiante. – Ele sempre está precisando de alguma coisa. Pode ter certeza que ele vai te arranjar um bico... – Mas tem que ser um trabalho bom! – Juan ponderou. – Que me dê uma grana legal. Senão eu não tenho como ir ao show...

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– Aí já não tem como ter certeza. Você tem que torcer para o trabalho ser complicado. Quanto mais complicado o trabalho, maior a grana... – o Salsicha arrematou. Enquanto eles terminavam de conversar sobre aquele assunto, o grupo foi surpreendido pela chegada do segurança do parque. Já estava começando a anoitecer e o parque iria fechar as portas. Todos os visitantes deveriam deixar o local – que só seria aberto novamente no dia seguinte. – Pessoal, está na hora de ir pra casa... – o segurança dizia com educação. O pessoal já conhecia aquele guardinha, sabiam que ele era gente boa e atenderam ao pedido do sujeito. Todos começaram a se levantar de seus lugares e a Cibele explicou para o cara que eles não pretendiam voltar para casa: – Pra casa não, tio... Nós vamos para o cemitério... – a moça dizia. O pessoal se juntou à amiga na animação e todos começaram a dizer em voz alta: – É isso aí, tio... Nós vamos para o cemitério! Quer ir com a gente? O sujeito fez cara de reprovação e disse com ar sério: – Tomem jeito, garotos! Tomem cuidado... Não vão se meter em encrenca, hein!!! Sem dar ouvidos ao guarda, a molecada foi se preparando para deixar o parque. Eles pegaram suas respectivas mochilas e recolheram as latas de cerveja vazias que estavam por ali. Depois, foram seguindo pela pista do parque, em direção à saída. Já na rua, o grupo ia caminhando pela calçada, falando alto e provocando as pessoas que encontravam pelo caminho. O trecho até o cemitério era longo, pois o lugar ficava do outro lado da cidade. Mas nenhum deles parecia estar com pressa. A noite era uma criança e nenhum dos garotos teria compromissos no dia seguinte. E mesmo que tivessem, todos pareciam animados com a ideia de passar a noite em claro, bebendo vinho no cemitério. Aquilo seria loucura para uma pessoa em sã consciência, mas era diversão pura para aquele grupo de adolescentes. No meio daquele grupo agitado, Juan permanecia quieto. Nada tomava tanto seu pensamento quanto o show que aconteceria nas próximas semanas. Ele era fã incondicional daquela banda e não queria perder o evento por nada. O único problema era que ele não tinha dinheiro. Tinha alguns trocados na carteira, mas aquilo estava longe de ser o suficiente. Ele precisava de muito mais. Nesse sentido, toda a esperança de Juan estava depositada no Pitaco. O rapaz estava confiante de que o traficante iria lhe arranjar algum bico que lhe permitisse levantar a grana necessária para comprar um ingresso. Juan nunca tinha trabalhado com o Pitaco

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antes, mas vários dos seus amigos já tinham – e haviam sido bem sucedidos. Por conta disso, Juan caminhava pensativo. Antes de chegar ao parque, ele estava ansioso por passar a noite no cemitério. Depois de saber da apresentação do 666, tudo se tornou secundário, pois este passou a ser o desejo do seu coração: ele queria ir ao show.

O Desejo de Renato Já era início de noite e Renato estava na sala da casa do Mateus. Os dois estavam com os olhos grudados na tela da televisão, concentrados na partida de videogame que estavam jogando. Renato estava ensinando o amigo a chegar à última fase do jogo. Eles já tinham brincado o dia inteiro e estavam exaustos de tanto pular e correr. Tinham jogado futebol, nadado na piscina e feito outras artes. Os meninos estavam absolutamente entretidos com o jogo quando a Laura – mãe do Mateus – parou por ali e perguntou: – E aí? Estão se divertindo bastante? – Depois a gente conversa, mãe... – o Mateus deu uma bronca na mãe. – O Renato está me mostrando como chegar à última fase. Renatinho contrariou o amigo, aproveitou que a mulher estava ali e fez uma pergunta que deixou a tia Laura totalmente surpresa: – Tia... nós não vamos à igreja? A Laura achou estranha aquela vontade de Renato. Ela sabia que nem Nice nem Orlando costumavam frequentar a igreja e não entendeu direito aquele interesse do menino. – Por que você está perguntando isso, Renato? Você quer ir ao culto? – ela perguntou para o garotinho. O moleque abriu um sorriso, largou o controle remoto no chão e respondeu com entusiasmo: – Quero sim! O Mateus escutou aquele pedido do amigo e mostrou que tinha outros planos: – Ah não, Renato... Vamos ficar aqui jogando. A gente já está quase terminando! A mulher cruzou os braços e fez uma rápida observação: – Olha, Renatinho... eu vou ver com o tio Nilson se nós vamos à igreja hoje. Parece que vai chover...

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O menino achou estranho aquele comentário e não teve cerimônias para perguntar: – Ué, tia... mas vocês não têm carro? A tia Laura quase caiu de costas quando ouviu a réplica do garoto. Pressionada, ela tentou dar uma explicação ao questionamento do menino: – Sim, Renatinho... a gente tem carro. Mas é que fica meio ruim de ir ao culto quando chove, entende? Fica mais difícil... O trânsito se torna lento... Tudo é mais complicado... Renatinho não ficou satisfeito com a resposta e fez outro comentário: – Mas, tia... domingo não tem trânsito! É só durante a semana que a chuva atrapalha o trânsito... A mulher percebeu que aquela conversa não teria fim e que não daria certo ficar inventando desculpas. Ela viu que suas respostas iriam piorar a situação e resolveu dar outra solução para a questão: – OK, Renato... Vamos fazer assim: eu vou falar com o tio Nilson. Depois eu venho aqui dizer pra vocês se nós vamos ou não à igreja. – Tomara que o tio Nilson mude de ideia! – o menino falou enquanto pegava de volta o controle remoto que estava no chão. A mulher foi até o quarto e contou o caso ao marido. O Nilson – pai do Mateus – estava um pouco desanimado para ir à igreja naquela noite, mas percebeu que não poderia perder a oportunidade de levar Renatinho para o culto uma vez que o garoto estava tão empolgado. Assim, ele se dirigiu para o quarto onde as crianças brincavam e perguntou para os dois: – Quer dizer então que o Renatinho quer ir ao culto? Renatinho largou o controle pela segunda vez e respondeu para o homem: – Sim, tio... eu quero muito ir ao culto. Eu só fui à igreja uma vez e gostaria de ir de novo! – Então... – o Nilson fez um sinal de positivo com as mãos. – Hoje você é o nosso convidado. Todos prontos em quinze minutos... Escovem os dentes e me esperem na porta! Quando ouviram aquilo, os meninos tiveram reações bastante diferentes. Renato deu um pulo e correu para o banheiro. Ele estava louco de vontade de ir ao culto e já foi logo obedecendo à ordem do tio Nilson. Mateus, por sua vez, levantou reclamando e seguiu cabisbaixo até a prateleira onde estava o videogame para desligá-lo. O anfitrião foi

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vencido por seu convidado, e seus planos de chegar à última fase daquele jogo ficariam para uma outra ocasião. O povo da casa nem tinha terminado de se arrumar quando Renato foi para a porta. Ele havia estado na igreja uma única vez, mas tinha boas recordações daquela ocasião. Lembrava bem das histórias que haviam sido contadas, do lanche que tinha sido servido e das músicas que tinham sido tocadas. O garoto tinha a expectativa de que esta segunda visita fosse ainda melhor do que a primeira. Durante o caminho, cada um deles se comportou de maneira diferente. Renato estava em silêncio, mas ostentava um baita sorriso no rosto. Ele tinha esperado por aquele momento durante todo o dia. Qualquer criança de sua idade iria querer ficar brincando na casa do Mateus, comendo guloseimas e bebendo refrigerante. Mas ele não! A vontade que ele tinha de participar do culto era bem maior do que a vontade de ficar jogando videogame. Os pais do Mateus, por sua vez, cantarolavam os cânticos que tocavam no som do carro. Já o Mateus estava mais consolado quanto ao fato de ter de ir à igreja com os pais. Aquele desânimo que ele tinha experimentado em casa já tinha passado. Ele não gostava de interromper suas brincadeiras para ir ao culto, mas sempre mudava de ideia durante o caminho. O menino sabia que os momentos na igreja seriam tão legais quanto os que ele passava em casa. Eles chegaram, o Nilson achou uma vaga no estacionamento e todos foram caminhando até o templo. Renatinho olhava para o lugar totalmente entusiasmado, como se estivesse diante de um parque de diversões. Ele estava com vontade de sair correndo e entrar na igreja antes de todos, mas teve de esperar o Mateus e seus pais. De dentro do templo saía uma música contagiante e alegre. A atmosfera ao redor daquele lugar era serena, leve e tranquila. Parecia um pedaço do céu. Renato logo percebeu a enorme diferença que havia entre aquele ambiente e o ambiente da sua casa. Ali era bem melhor! Aquele lugar era muito mais gostoso. E não era para menos! O próprio Espírito de Deus estava visitando aquele espaço, pois ali o Senhor estava sendo adorado. A Paz do Eterno habitava aquele lugar e tudo ao redor daquele prédio era abençoado. Ao contrário do que haviam dito a Renato, não havia chuva nenhuma por chegar. A noite estava belíssima e as estrelas estavam sobre a cabeça de todos os que vinham cultuar. Mas não eram só as estrelas que estavam ali. Josiel e Pariel eram anjos de Deus e também estavam sobre aquele templo, movimentando-se de um lado para o outro. Eles ficavam ali, guardando o lugar de culto, trabalhando em favor da harmonia e da paz

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que habitavam aquele local. Suas responsabilidades estavam ligadas à proteção daquele espaço, impedindo o acesso de qualquer espírito maligno que tentasse atrapalhar a celebração. Aqueles anjos eram os guardiões daquele lugar. Renatinho e Mateus entraram e já foram direto para a sala onde acontecia o culto infantil. Chegando lá, eles foram cumprimentados pela professora: – Olá, meninos... boa noite! – a mulher disse com enorme simpatia. Os dois responderam ao mesmo tempo, e a professora percebeu que Renato não pertencia ao grupo que normalmente frequentava aquela classe. Ela se dirigiu ao Mateus e lhe perguntou: – Você não vai nos apresentar seu amigo, Mateus? Antes que o Mateus pudesse responder, Renato tratou de se adiantar: – Boa noite, pessoal. Meu nome é Renato e eu sou amigo do Mateus! A professora achou graça da espontaneidade do menino e o elogiou: – Você parece ser bem simpático, hein Renato... O moleque sorriu e respondeu sem titubear: – Pois é... todo mundo diz que eu sou simpático!!! A mulher achou ainda mais graça do comentário do menino e percebeu que ele realmente era muito espirituoso. Qualquer criança se intimidaria diante de um grupo de pessoas desconhecidas, mas aquele tal Renato parecia estar bastante à vontade! Poucos minutos depois, a professora se levantou para dar início às atividades daquela noite de domingo. Ela foi até uma prateleira onde estavam alguns livros e pegou um que era enorme – com figuras igualmente enormes. A moça abriu o livro bem no meio, folheou algumas páginas e fez uma pergunta para a meninada: – Vocês conhecem a história do menino que ajudou Jesus com cinco pães e dois peixinhos? A criançada foi unânime em responder que sim, mas havia alguém que nunca tinha escutado aquela história. Renato levantou a mão no meio de todos e disse com a maior naturalidade do mundo: – Eu nunca ouvi essa história... As outras crianças foram implacáveis e começaram a gargalhar, como se Renatinho fosse um alienígena. Como é que ele nunca tinha ouvido a história do menino que ajudou Jesus? – Não façam assim... – a professora ponderou. – O Renato é um visitante e não tem a obrigação de saber tudo o que vocês já sabem.

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Renatinho concordou com a professora, olhou para um moleque de óculos que estava ao seu lado e esbravejou: – É isso mesmo! Eu sou um visitante! As crianças foram se acalmando aos poucos e a professora encontrou novamente o silêncio de que precisava para continuar a aula. Ela virou o livro na direção das crianças, mostrou a figura a todos e começou a falar: – Mesmo as crianças que já conhecem a história devem prestar atenção, pois ela ensina uma coisa muito importante para nós... Esta história nos ensina que nós devemos obedecer a Jesus e que ele pode fazer muito mais do que nós podemos imaginar! – Ela fez uma pausa e continuou seu raciocínio: – Vejam só este menino: ele tinha cinco pães e dois peixes. Jesus pediu o que o garoto tinha nas mãos e ele entregou. Cristo multiplicou aquele lanche e conseguiu dar comida a muitas e muitas pessoas... Uma menininha que estava próxima à porta levantou a mão e nem esperou autorização para fazer sua pergunta: – Quer dizer então que, se eu pedir, Jesus pode multiplicar o lanche que eu levo para a escola? Algumas crianças riram e outras olharam para a professora interessadas em saber se Cristo poderia fazer aquilo. A professora olhou bem para a menininha e respondeu: – Jesus tem poder para isso! – ela esclareceu. – Mas o que a história nos ensina é que nós devemos obedecer ao que Jesus manda e confiar que ele pode nos atender em tudo. O menino que deu seu lanche para Jesus acreditou que ele iria ajudá-lo e sabia que Jesus poderia lhe dar muito mais... Depois daquela explicação, a criançada começou a conversar e a levantar suas próprias teorias sobre o assunto. Renato olhava fixamente para a professora, pois a mulher parecia estar concluindo a história e o garoto não gostaria de perder nenhum detalhe: – Por isso, crianças, quando nós formos pedir algo a alguém, devemos pedir para quem? – ela perguntou. – PARA JESUS! – a criançada respondeu em coro. A professora colocou o livro sobre a mesa e fez mais algumas perguntas: – Vocês conhecem alguém que pede as coisas para outra pessoa que não seja Jesus? Renato sabia que sua mãe tinha uma estátua na cozinha, mas preferiu não se manifestar. As crianças já tinham dado risada dele poucos minutos antes e ele não estava

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disposto a aturar mais gozações. Sua simpatia tinha limites! De repente, no fundo da classe, um menino falou em voz alta: – Quando a minha mãe precisa de dinheiro, ela pede para o meu pai... Todas as crianças começaram a se manifestar e a professora teve de aumentar o volume da voz para ser escutada: – Sim... isso acontece na casa de um monte de gente. Mas eu estou falando das orações. Vocês conhecem alguém que faz orações para outra pessoa que não seja Jesus? Mais uma vez, houve silêncio na sala. Aquela não era a realidade da maioria das crianças ali reunidas. O único que tinha alguma experiência daquela natureza para contar era Renatinho – e ele já havia optado pelo silêncio. Como não houve nenhuma manifestação, a professora fez sua conclusão: – Muito bem... então vocês já aprenderam que não devemos fazer orações para ninguém... Só para Jesus. As crianças concordaram com aquela palavra, a professora notou que o recado estava dado e passou para o momento do lanche. Todos se sentaram nas mesinhas que estavam espalhadas pelo lugar e ficaram aguardando pela distribuição do suco e da bolacha. Depois que o lanche foi distribuído, elas oraram e agradeceram o alimento. Passado algum tempo, a professora notou a presença de alguns pais na porta. O culto já tinha acabado e ela deveria dispensar os alunos. Assim, a moça foi até a porta e começou a chamar as crianças cujos pais vinham até ali. Renato percebeu que a tia Laura e o tio Nilson estavam demorando e resolveu tirar uma dúvida com a professora. Ele tinha ficado intrigado com aquela história de pedir as coisas a alguém que não fosse Jesus. O menino sabia que a estátua da sua mãe se encaixava perfeitamente naquele exemplo, mas ficou com vergonha de perguntar sobre aquele assunto na frente das outras crianças. Assim, ele esperou a classe ficar mais vazia e foi conversar com a professora: – Olha, professora... a minha mãe tem uma estátua na cozinha e ela sempre faz suas rezas para essa santa... – ele disse com muita sinceridade e alguma vergonha. A professora agiu com naturalidade, pois sabia que Renato era um visitante. Não queria fazer com que ele se sentisse pior do que já tinha se sentido quando as outras crianças tinham tirado sarro de sua cara: – Veja, Renato: a Bíblia reprova quando alguém faz orações a estátuas ou a alguém que não seja o próprio Deus. Há muitos e muitos textos na Bíblia que ensinam este princípio e eu posso mostrar um deles a você!

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Renatinho mostrou as mãos vazias para a professora e explicou: – Mas eu não tenho uma Bíblia! – Você quer ganhar uma de presente? – a mulher perguntou enquanto oferecia ao menino o seu próprio exemplar. O coração do garotinho quase saiu pela boca quando ele escutou aquilo. Uma Bíblia seria a coisa mais maravilhosa que ele poderia ganhar. A tarde na casa do Mateus já tinha sido especial e a noite na igreja estava sendo melhor do que o esperado. Ganhar uma Bíblia de presente seria a cereja do bolo! Um presente para fechar o dia com chave de ouro! – É claro que eu quero! – ele falou sem esconder a ansiedade. A professora abriu o livro em uma determinada parte, pegou uma caneta marcatexto e fez uma anotação. Depois, deu a Bíblia para Renato e explicou para o menino o que significava aquele texto que ela havia colocado em destaque: – Este trecho pintado em amarelo diz que Deus não se agrada quando as pessoas fazem estátuas para adorá-las como se elas fossem Deus – ela dizia. O menino dobrou a pontinha da folha para poder encontrá-lo em uma ocasião futura e disse com os olhos arregalados: – OK, professora... Vou mostrar isso para a minha mãe. Poucos segundos depois, os pais do Mateus apareceram na porta. Os dois tinham demorado porque haviam encontrado um casal de amigos e acabaram gastando algum tempo conversando com eles. Só depois passaram no departamento infantil para buscar as crianças. Quase não havia mais ninguém na classe quando a Laura e o Nilson chegaram por ali. Renato e Mateus já estavam próximos à porta, impacientes, esperando que os adultos passassem ali para buscá-los. – Aleluia! Achei que não viriam mais buscar a gente... – o Mateus disse quando viu os pais na porta. O Nilson olhou para o filho, sorriu e fez uma proposta para compensar o tempo de espera: – Será que vocês nos perdoariam se nós fôssemos comer uma coxinha na cantina? Os dois se entreolharam com os olhos arregalados, mostrando que aquela proposta era realmente muito boa. Eles tinham acabado de comer algumas bolachas, mas não rejeitaram a oferta.

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Enquanto o Mateus saía da classe, Renatinho foi se despedir da professora. Ele chegou perto da moça e lhe disse algumas palavras de agradecimento por conta do presente que havia recebido: – Obrigado pela Bíblia, professora. Eu vou ler todos os dias! – ele dizia entusiasmado. A tia Laura viu aquela cena e se aproximou dos dois: – Que legal, Renato! Você ganhou uma Bíblia de presente? – Ganhei sim, tia... – o menino dizia enquanto abria o livro no trecho que havia sido assinalado com caneta marca-texto. – A professora me deu esta Bíblia e me mostrou que Deus não gosta de estátuas. Eu vou mostrar pra minha mãe, pois ela tem uma estátua na cozinha... A Laura agradeceu o presente que a professora tinha dado a Renato, despediu-se da mulher e levou os meninos até a cantina da igreja. Mateus e Renato ganharam as coxinhas que haviam sido prometidas e entraram na fila que dava acesso à saída do templo – pois havia chegado a hora de eles irem embora. Renato viu que havia um grupo na saída do templo sendo cumprimentado pelos fiéis que iam embora. Todos estavam de cabeça molhada, como se tivessem tomado banho poucos minutos antes. O menino ficou curioso e resolveu perguntar a razão de aquelas pessoas estarem ali: – Tia Laura... – Ele parou de comer a coxinha e se virou para a mulher. – Quem são aquelas pessoas com o cabelo molhado? – o moleque perguntou intrigado. – São as pessoas que entregaram a vida a Jesus. Elas estão com a cabeça molhada porque passaram pelo batismo no culto de hoje... Renato não sabia o que era batismo e continuou confuso: – E por que elas estão com o cabelo molhado? A Laura percebeu que precisava ser mais didática e esclareceu: – O batismo é uma ordem de Jesus; uma prática que existe nas igrejas... – ela dizia. – Toda pessoa que entrega sua vida a Jesus deve passar pelo batismo. Ela vai entrar em um tanque bem grande, com bastante água, como se fosse uma piscina de criança. Aí, o pastor vai afundá-la na água e tirá-la de volta em seguida. É rapidinho. Quase como um mergulho... Renato não sabia o papel da água em todo aquele ritual, mas sabia que a ideia de entregar a vida a Jesus o animava muito. Ele já tinha ficado empolgado com a história

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do menino que tinha entregado o lanche para Jesus e animou-se mais ainda com aquela possibilidade – de entregar a própria vida a Jesus. Mais alguns minutos se passaram e chegou a vez de eles saudarem os novos convertidos que estavam recebendo os cumprimentos à porta do templo. Renato fez questão de ser o primeiro. Ele deu um pulo se antecipando aos demais e já foi logo estendendo a mão à primeira pessoa que estava ali. Renato era esperto e já tinha prestado atenção ao tipo de saudação usada pelas pessoas que passavam por ali. Ele cumprimentou a primeira pessoa da fila repetindo a mesma frase que todos diziam: – Deus te abençoe! A primeira pessoa da fila era um senhor de baixa estatura e cabelos grisalhos. O homem ficou admirado com a desenvoltura de Renato e tentou responder com a mesma simpatia do menino: – Muito obrigado, rapazinho... O Nilson e a Laura acharam muito interessante a forma como Renato se dirigiu àquele idoso. Aquela era apenas a segunda vez que o menino tinha pisado em um templo de igreja, mas parecia um veterano. A expressão utilizada – Deus te abençoe – não fazia parte do dia a dia de Renato, mas soou de maneira absolutamente espontânea na boca do menino. E ele continuou sua conversa com o homem: – É verdade que o senhor entregou sua vida a Jesus? – o moleque perguntou com ar curioso. – Sim, é verdade! O rosto de Renato brilhou e ele disse algo que surpreendeu todas as pessoas que estavam ali: – Eu também quero entregar a minha vida para Jesus! Fez-se silêncio total. Até mesmo o pastor – que estava na ponta da fila – olhou para ver quem tinha dito aquilo. Todos ficaram admirados quando descobriram que aquele desejo tinha partido da boca de uma criança. Mas havia ali, naquele lugar, um grupo que não estava nem um pouco espantado com as palavras do menino. Ninguém os via, pois eles eram invisíveis e estavam bem próximos daquela fila de pessoas, observando tudo. Era o grupo de Missael.

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Missael era um anjo do Senhor e fazia parte de uma equipe enviada por Deus àquele lugar com a finalidade de proteger aqueles recém-convertidos. O Senhor sabia que aquelas crianças espirituais enfrentariam muitas lutas e sofreriam muitos ataques da parte de Satanás. Por isso, o Todo-Poderoso havia destacado Missael e seus companheiros para uma missão de cuidado. Eles deveriam permanecer próximos daquelas pessoas, acampando-se ao redor delas, concedendo livramento da parte do Altíssimo. Aquele grupo de anjos cooperadores era de número exatamente igual ao grupo de pessoas que estavam sendo batizadas naquele dia e cada um dos novos convertidos teria um anjo de prontidão, enviado pelo Senhor. Era esta a missão daqueles anjos: eles eram espíritos ministradores, enviados para servir os salvos. O homem que tinha recebido os cumprimentos de Renato ficou meio sem jeito depois de escutar o que o menino havia dito. Ele não sabia exatamente o que falar para Renatinho, mas resolveu ajudar da forma como seu coração mandou: – Bem, meu garoto... converse com os seus pais e diga a eles que você também quer entregar sua vida a Jesus – o homem dizia olhando para a tia Laura e o tio Nilson, pensando que eles fossem os pais de Renato. O pastor da igreja ouviu aquele início de conversa e resolveu intervir. O homem saiu da ponta da fila e foi até onde estava Renato. Ele conhecia o Nilson e a Laura, sabia que eles não eram os pais daquele menino e ficou com medo de que eles, por alguma razão, reprimissem o garoto. O pastor se aproximou, agachou-se, olhou nos olhos do menino e disse: – Veja, meu filho: você pode entregar sua vida a Jesus sim! – ele dizia no meio de todo aquele povo. – A Bíblia diz que há festa nos Céus quando uma pessoa entrega sua vida a Jesus. Os anjos que estavam ali perto concordaram com as palavras do pastor, pois elas eram verdadeiras. Assim, eles ficaram aguardando, ansiosos pela confissão de Renato, pois queriam comemorar a conversão de mais uma pessoa. O pastor, por sua vez, colocou uma das mãos no ombro do garoto e lhe fez uma pergunta: – Você tem certeza de que é isso mesmo que você quer? Tem certeza de que quer ser um seguidor de Jesus? O menino assentiu com a cabeça e respondeu:

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– Claro que eu tenho! Hoje a professora contou sobre o menino que entregou os pães e os peixes para Jesus multiplicar­. Ela ensinou que o menino foi muito obediente e que ele ­confiou no poder de Jesus. E eu quero ser igual àquele menino: quero ser obediente a Jesus! – Renato dizia entusiasmado. – Além disso – ele continuou. – Eu também ganhei da professora uma Bíblia de presente. Agora eu vou poder mostrar para a minha mãe que Deus não gosta da estátua que ela tem na cozinha. O povo que estava reunido ali ficou boquiaberto com a firmeza do garoto. Todos eles ficaram admirados com o discernimento apresentado por Renato enquanto falava sobre sua experiência na classe das crianças. Bom seria se todos os cristãos tivessem a convicção que aquele menino estava demonstrando! O tio Nilson e a tia Laura viram que o pastor estava dando bastante atenção às intenções de Renato e permaneceram calados. Eles não estavam totalmente seguros em relação ao desenrolar daquela situação, pois Renato era filho de um casal de amigos e só estava ali como visitante. Os dois não esperavam que aquela simples visita fosse culminar em algo tão sério. Mas o pastor sabia que havia sinceridade total no desejo do menino e que aquela sua intenção era verdadeira. Assim, ele passou algumas instruções a Renatinho: – Muito bem, garoto. Se você quer realmente entregar sua vida a Jesus, vamos fazer uma oração. Eu falo e você repete comigo, OK? Renatinho ficou sério, uniu as mãos na altura do peito – exatamente como o pastor estava fazendo – e fechou os olhos. O homem disse uma frase e Renatinho a repetiu com precisão: – Senhor Jesus: hoje eu entrego a minha vida a você.Venha morar no meu coração. Amém! Mais uma vez, o silêncio reinou entre os presentes. A cena da oração de Renato estava realmente sendo muito emocionante e todos se sentiram tocados. Os anjos – em compensação – tiveram uma reação mais efusiva. Animados pela conversão de Renato, eles começaram a cantar e a louvar a Deus em alta voz. Felizes, eles voavam em círculos sobre aquele local, fazendo movimentos sincronizados em uma manifestação comum de alegria. Eles começaram a anunciar em sua própria língua que mais uma pessoa tinha se voltado para Deus:

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– Santo é o Senhor! Toda a Terra lhe pertence! Mais um homem se volta para o seu Criador! Enquanto os seres angelicais davam seu espetáculo, a voz de Renato ecoou nas regiões espirituais próximas de onde eles estavam reunidos. Seu pedido atravessou diversas dimensões e chegou até os mais altos lugares celestiais. Havia uma música que acompanhava os dizeres do garoto, transformando a frase do menino em um cântico de louvor a Deus: – Senhor Jesus: hoje eu entrego a minha vida a você... Em seguida, houve uma manifestação de reciprocidade vinda dos céus. Um facho de luz veio brilhando das regiões celestiais e desceu na direção do templo da igreja. Este facho foi ficando mais fraco à medida que se aproximava dali e incidiu delicadamente sobre Renato. O menino estava, naquele exato instante, sendo iluminado por Deus. Aquela luz que repousou sobre o garotinho era a porção exata da glória de Deus que poderia vir sobre ele, na perfeita medida que Renato poderia suportar. Nem mais nem menos. Depois disso, surgiu no céu algo que se parecia com um relâmpago. Mas aquilo não era um relâmpago, era um anjo que se movimentava em altíssima velocidade. Ele foi se aproximando e se aproximando, até que diminuiu sua velocidade e se juntou aos anjos que estavam ali reunidos. Seu nome era Ressael e ele havia sido enviado por Deus para proteger Renatinho depois da experiência espiritual que o menino tinha tido. Ressael parou ao lado dos outros seres angelicais, foi cumprimentado por todos e voltou-se imediatamente para Renato. Ele manteria seus olhos continuamente sobre o garotinho, pois tinha sido enviado pelo Senhor justamente para guardá-lo. Mas nenhuma das pessoas que estavam ali – na porta da igreja – conseguiu enxergar esses fenômenos que ocorriam no mundo espiritual. Todos esses eventos eram invisíveis e aconteceram em uma fração de segundo. Enquanto tudo isso acontecia em oculto, o pastor dava os parabéns a Renatinho: – Parabéns, garotinho! A Bíblia diz que aquele que segue Jesus jamais andará em trevas. Agora você está no caminho da luz! É um seguidor de Cristo, exatamente como estas pessoas que estão aqui na fila... O menino sabia que estava no caminho da luz. Ele não tinha visto os anjos e nem a luz que havia descido dos céus, mas estava experimentando sensações que nunca tinha

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experimentado antes. Aquilo era muito bom! Ele não tinha dúvidas de que Jesus tinha escutado seu pedido. Mas, para novo espanto das pessoas reunidas ali, Renato fez uma nova pergunta – direta e bombástica: – OK, pastor... E quando eu poderei me batizar? Todos olharam para o pastor, atônitos, esperando que ele desse uma resposta para o menino. O homem demorou a responder e Renato teve tempo para completar seu raciocínio: – Se eu sou igual a estas pessoas, então eu também posso me batizar!!! O pastor sabia que o desejo do menino era totalmente legítimo, mas não sabia se Renato continuaria a frequentar os cultos. Assim, ele apontou para os anfitriões do garoto e disse: – Você tem de participar dos cultos com o tio Nilson e a tia Laura, para aprender mais histórias sobre Jesus. O próximo batismo vai acontecer daqui a poucas semanas. Se você estiver participando das programações da igreja eu acho que não vai haver problema algum! – Legal! – o menino falou. As pessoas que estavam ali começaram a se manifestar positivamente em relação ao batismo de Renato, pois viram o brilho nos olhos do garoto e sabiam que ele não estava dizendo aquelas coisas por empolgação. Ele tinha fé! Até mesmo o Nilson e a Laura – que tinham se assustado no início – tiveram de dar o braço a torcer: – Muito bem, Renato! – o Nilson falou. – Agora nós vamos pra casa e você vai contar para os seus pais que encontrou um novo amigo: Jesus! – Isso mesmo, garotinho... Esperamos você aqui na semana que vem! – uma das outras pessoas que tinha se batizado disse a Renato. O garoto ficou muito feliz com toda aquela receptividade e sentiu-se querido por aquelas pessoas. Mas não seria por causa delas que ele voltaria àquele lugar na semana seguinte. Seria por causa de Jesus. Ele gostaria de voltar ali para poder escutar mais histórias e aprender mais sobre seu novo amigo. O Nilson estendeu a mão para o pastor e se despediu do homem. Sua esposa o acompanhou e ambos agradeceram pelo cuidado e atenção dispensados por ele. Depois, eles seguiram para o estacionamento – onde o carro estava guardado. No caminho de volta, todos estavam bastante comovidos. A Laura ficou contente de saber que tinha tido alguma participação em tudo aquilo. A família tinha planos de

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permanecer em casa naquela noite, mas ela teve a sensibilidade de conversar com seu marido para que eles comparecessem ao culto e atendessem ao desejo de Renato. Se ficassem em casa, poderiam ter sepultado a única oportunidade que o menino teria de conhecer a mensagem de Cristo. Já o Nilson estava com a cabeça ocupada pelos problemas que Renatinho enfrentaria no futuro. Ele não sabia como Orlando e Nice receberiam aquele interesse do menino pelas coisas de Deus e se permitiriam que Renato voltasse à igreja com eles. Será que o garoto conseguiria manter aquela mesma motivação apresentada na porta da saída? O homem tinha medo de que Orlando e Nice reprimissem a vontade de Renato – e que o ânimo do menino fosse esfriado. A casa dos Lobato não era longe da igreja e o Nilson não levou muito tempo para chegar lá. O homem estacionou o carro na porta do prédio e todos puderam se despedir uns dos outros. – Tchau, gente. Muito obrigado por tudo! – Renato dizia. Todos se despediram do menino e ele desceu do carro. Depois fechou a porta e entrou correndo no prédio. Dentro do elevador, Renatinho ficava trazendo à mente todas as experiências vividas naquela noite. Tudo havia sido maravilhoso! O garoto mal conseguia enumerar as diferentes situações que lhe trouxeram alegria, pois elas eram muitas! Ele tinha aprendido uma história sobre Jesus, tinha ganhado uma Bíblia de presente e tinha entregado sua vida a Cristo. Todas aquelas coisas foram guardadas em um lugar especial do coração do menino e ele nunca mais as esqueceria. Eram situações que ocupariam um espaço privilegiado em suas memórias. Assim, Renato entrou em casa correndo e nem quis saber de ir para seu quarto brincar. Ele largou a Bíblia sobre a mesa da sala, passou direto pela cozinha e correu em direção ao quarto da mãe. No exato momento em que Renatinho entrou no apartamento, houve um alvoroço nos lugares espirituais da casa da família Lobato. Todos os demônios que costumavam trabalhar ali saíram de seus respectivos locais de atuação para ver o que estava acontecendo. Eles estavam espalhados pelos diversos cômodos quando foram subitamente incomodados pela presença de um Espírito mais poderoso e mais forte do que eles. Arazabu veio do quarto do casal para ver o que estava se passando. Belzeredu saiu de perto da estátua que ficava na cozinha para descobrir qual era a razão daquela sensação estranha que lhe incomodava. Domarinu, Grabaru e os outros espíritos que ficavam na

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bancada de Helena também compareceram. Hurudu, Iemandu e Jazanu – os demônios que agiam na vida de Juan – não estavam presentes ali, pois tinham saído daquele lugar para acompanhar o jovem em sua visita ao cemitério. De qualquer forma, eles haviam deixado ali alguns espiões – que também foram averiguar o que estava acontecendo. Todos esses espíritos foram olhar para ver quem era aquela pessoa que estava no corredor – que carregava dentro de si uma força tão superior à força deles. Todos ficaram impressionados quando descobriram que aquele garotinho era a razão da inquietação geral que havia ali. Mas não era só a vida que emanava de dentro de Renato que atormentava os espíritos presentes ali. Ressael também incomodava aqueles demônios das trevas, pois ele era um anjo de luz – e trabalhava sob a ordem do Pai das luzes. A presença de Ressael ali também deixava os demônios muito incomodados. Enfim, nenhum daqueles espíritos malignos tinha gostado de saber que a luz de Deus havia chegado àquele lugar. Eles trabalhavam dia e noite para manter os Lobato em trevas e estavam sendo bem sucedidos até então. O fato de Renato entrar ali como portador da luz divina era algo absolutamente ameaçador. A presença de Ressael também tornava o ambiente desconfortável às entidades demoníacas, pois elas não estavam acostumadas à presença de anjos. Cheios de ira e de ódio, os demônios ficaram olhando enquanto Renato entrava no quarto da mãe para lhe contar como havia sido seu dia: – Oi, mãe! – Oi, filho. Não faça muito barulho... Eu estou assistindo a um filme – a mãe alertou. – Como foi lá na casa do Mateus? – Foi tudo bem! – Renato disse sem fazer muito alarde. – Depois nós fomos à igreja. O culto também foi muito legal! – Que bom! – Nice falou sem mostrar real interesse. O filho viu que sua mãe não estava preocupada em saber como havia sido seu dia e desistiu de puxar assunto com ela. Renato sabia que seu pai estaria sozinho no escritório e que ele lhe daria atenção. O garoto saiu do quarto da mãe, atravessou o corredor e chegou à sala de estudo do pai. A porta estava fechada, mas Renato não teve receio nenhum de abri-la sem bater. – E aí, pai? Tudo bem? Orlando estava lendo um livro, mas deixou os estudos de lado para bater um papo com o filho: – Fala, filho... Como foi o seu dia? Você e o Mateus fizeram muita bagunça?

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O menino se aproximou do pai, sentou-se sobre a mesa e respondeu: – Nosso dia foi muito legal! Nós nadamos e jogamos bola. Depois a gente foi jogar videogame e eu fui ensinar o Mateus como chegar à última fase do jogo. – Ah é? – o pai mostrou-se interessado. – E o que mais vocês fizeram de bom? Os olhos de Renato brilharam e ele contou sobre aquilo que mais tinha lhe cativado entre as atividades do dia: – Nós fomos ao culto e eu escutei uma história sobre Jesus – ele dizia entusiasmado. – A história contava que um menino entregou seu lanche a Jesus, e que Jesus multiplicou aquilo para alimentar uma multidão. Já pensou, pai? Dar comida pra um montão de gente só com cinco pães e dois peixes? Orlando se ajeitou na cadeira e viu crescer dentro de si alguns de seus maiores medos. Será que seu filho iria se envolver com religião? O homem era um ateu convicto e rejeitava qualquer tipo de crença. Enxergava com desprezo todas aquelas histórias relatadas na Bíblia. Achava que elas eram como contos infantis – só que para adultos! Era por conta daquele tipo de situação que ele não era totalmente favorável à amizade que existia entre Renato e seu amiguinho. De qualquer forma, Orlando sabia que não havia alternativa. O que ele poderia fazer? Proibir seu filho de encontrar com o Mateus? Isso seria mais infantil do que acreditar nas histórias de Jesus. A única coisa que estava ao alcance do homem era alertar o filho, ensinando que o menino não deveria acreditar em tudo o que lhe ensinavam. E foi exatamente o que ele tentou fazer: – Veja só, Renato... Você deve tomar cuidado com essas histórias contadas na igreja. Nem todas elas são verdadeiras. Jesus foi um personagem histórico, mas essas histórias sobre milagres não são verdadeiras... É só imaginação das pessoas... – o homem disse. Na maior calma do mundo, Renato respondeu: – Mas esta história eu sei que é verdadeira, pai... Ela está na Bíblia... E eu acredito na Bíblia! – o menino dizia alegre. Orlando não quis estragar aquele momento agradável e resolveu que não iria ficar discutindo questões religiosas com o filho, pois Renato ainda era uma criança. O pai estava mais preocupado em ter um tempo gostoso com o garoto naquele fim de domingo do que em promover um debate sobre religião. Mas o homem percebeu que a coisa era ainda mais séria quando o moleque abriu a boca de novo: – E depois da minha aula, no fim do culto, eu entreguei minha vida para Jesus. Fiz uma oração e pedi para ele entrar no meu coração...

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O pai do menino fez silêncio por alguns instantes e quis saber mais sobre aquele episódio: – É mesmo? E como foi isso? – Foi assim: – Renato esclareceu. – Eu conversei com o pastor e nós fizemos uma oração juntos. Aí eu entreguei minha vida para Jesus. Orlando escutou aquilo e reafirmou a decisão de não discutir aquele assunto. Não achou que fosse adiantar alguma coisa. O próprio Orlando tinha sido induzido pelos pais quando era criança e sentiu-se enganado quando chegou à maturidade, pois tirou suas próprias conclusões quando já estava mais velho. Ele imaginou que a melhor alternativa seria deixar Renato crescer para que o garoto fizesse o mesmo. De repente, Renato deu um pulo e saiu de cima da mesa do pai. Ele sorriu e perguntou a Orlando: – Você quer ver a Bíblia que eu ganhei de presente? Orlando não tinha o menor interesse em ver a Bíblia que Renato tinha ganhado, mas concordou em ver o presente somente para não deixar o menino triste. O homem guardava um exemplar da Bíblia em sua prateleira, mas o fazia somente pelo valor histórico da obra. Ele desprezava por completo o valor espiritual que as pessoas ao redor do mundo atribuíam àqueles escritos. – OK, filho. Pegue a Bíblia e venha aqui me mostrar... – Orlando rendeu-se. O garoto correu até a sala, foi até a mesa, pegou o livro e o trouxe até o escritório do pai. Orlando pegou a Bíblia nas mãos e folheou algumas páginas – para fingir algum interesse e não deixar o menino desapontado. Depois, o homem devolveu o livro para o filho e explicou que precisava continuar seus estudos: – Filho... Eu ainda tenho coisas para fazer aqui no escritório. Podemos continuar nossa conversa amanhã? – o sujeito disse com a mão sobre a cabeça do garoto. Renatinho entendeu a necessidade do pai, deu um abraço no homem e foi para o próprio quarto. Ele sabia que Orlando precisava ficar sozinho para se concentrar e foi embora dali. Dentro do quarto, Renato foi até sua prateleira e encontrou um espaço para guardar sua Bíblia. Olhando para o livro, ele ficava pensando se iria conseguir participar do culto na semana seguinte. O garoto tinha muita vontade de voltar à igreja mais vezes e estava confiando na palavra da tia Laura. A mãe do Mateus havia prometido que conversaria com Nice, pedindo autorização para levá-lo ao culto nos domingos seguintes.

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Mas o grande desejo do menino – ainda maior do que o simples desejo de voltar à igreja – era o batismo. Ele gostaria de poder oficializar sua decisão. Todas aquelas pessoas que ele havia conhecido ao final do culto já tinham se batizado como manifestação externa de sua amizade com Cristo – e ele gostaria de fazer o mesmo. Era este o desejo de Renato: ele queria se batizar! Antes de ligar o videogame, o menino foi correndo até a beira da cama, ajoelhou-se e fez uma oração: – Senhor Jesus: eu já entreguei a minha vida a você. Agora eu quero me batizar. Amém! Aquela oração breve e objetiva feita por Renato foi prontamente escutada por Jesus. O garoto já tinha recebido o Espírito de Deus em seu coração e o Senhor já conhecia seus pedidos antes mesmo que eles chegassem à sua boca. Depois de fazer sua prece, o garotinho foi até o móvel onde ficava o videogame para ligá-lo. Ele botou o aparelho para funcionar e voltou para a cama, onde costumava ficar sentado enquanto jogava. Renato não sabia, mas Ressael estava ali ao seu lado, acompanhando tudo o que ele fazia. De vez em quando, o anjo saía dali e ia até o corredor, verificar o que estava acontecendo na casa, observando se havia algum tipo de ameaça. Ressael havia sido destacado por Deus para cuidar do menino e iria manter-se alerta dia e noite, guardando e protegendo aquele filho de Deus.

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