Gazeta das Coisas que Ocorreram no Fórum dos Numismatas e seus Eventos no Ano de Dois Mil e Quinze | Especial GALITOS
NÚMERO 07 2015
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Os Medalhões de Abuquir
Por António Carlos Diogo
ESPECIAL CLUBE GALITOS DE AVEIRO
Selos, Moedas e Amizade Parece distante o mês de Maio de 2011, data em que se iniciava a saudável Parceria do Fórum Numismatas com a Revista Selos & Moedas, o órgão informativo da Secção Filatélica e Numismática do Clube dos Galitos. Se há iniciativa de que nos orgulhamos, esta parceria com a Selos & Moedas, apadrinhada pelo amigo António Carlos Diogo, ocupa, sem dúvida, o primeiro lugar. É uma colaboração que muito nos honra e que encaramos como um reconhecimento do nosso esforço contínuo na divulgação da Numismática, tarefa que aqui repartimos com o Corpo Editorial Galitos. Quatro anos voltados somam-se 13 números publicados e 23 artigos Numismáticos, mantendo-se, de forma exemplar, o primor pela excelência gráfica e a qualidade dos conteúdos. Não é por acaso que a Revista recebeu importante distinção na “Europhilex LONDON 2015”. A equipa do Fórum Numismatas deixa aqui os mais sinceros parabéns à equipa da Revista “Selos & Moedas”, pelo galardão e pelo trabalho que tem desenvolvido desde o primeiro número, que remonta a Dezembro de 1962. Fazemos votos de que a publicação se mantenha por muitos anos. Lá estaremos para acompanhar a cruzada. A Equipa Numismatas
Em cima António Diogo na apresentação do seu Caderno Numismático, durante o encontro Galitos em 2014. À Direita Distinção “Europhilex LONDON 2015”, atribuída à Revista Selos&Moedas.
“Oxalá que a presente publicação venha a servir condignamente os fins, estimáveis, por nobilíssimos, do colecionamento puro - queremos dizer: daquele colecionamento que elege, para cotação das espécies, menos os preçários mercantis do comércio vulgar do que o mérito absoluto do documento amorosamente arquivado - mérito que tanto pode filiar-se na raridade do espécime, como na sua estética, como na lição que nos dá”. Dr. David Cristo | Selos & Moedas Nº1 | 1962
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Medalhões de Abuquir no Museu Calouste Gulbenkian Por António Carlos Diogo Assunto interessante e desconhecido da maioria dos numismatas, os onze medalhões de ouro provenientes de um tesouro descoberto no Egito em 1902 constituem um exemplo notável de arte da Antiguidade, bem como uma fonte em primeira mão de iconografia de Alexandre, o Grande. Alguns investigadores acreditaram que os medalhões seriam prémios destinados aos vencedores dos jogos olímpicos e píticos que na primeira metade do séc. III se realizaram em diversas cidades da Macedónia e da Ásia Menor, outros consideram que os medalhões foram usados como amuletos em uma época em que tinha renascido o culto por Alexandre. A atribuição à Ásia Menor destes medalhões é fundamentada por alguns autores na tipologia de algumas peças, semelhante com a de moedas de Pérgamo assim como na distribuição geográfica dos achados de Abuquir e de Tarso. Reparem neste Niketerion (um medalhão cunhado para celebrar uma vitória militar), semelhante ao do Cabinet des Médailles da Bibliothèque Nationale e comparem com o medalhão da Colecção Gulbenkian.
Niketerion de de Tarse, semenhante ao do Cabinet des Médailles. Fotografia, cortesia da Chayette & cheval, Leilão 14, lote 256.
A efígie é muito parecida com a de Filipe II da Macedónia, patente nas suas moedas. À semelhança dos medalhões de Abuquir, poderão ter sido produzidos em tempos de Severo Alexandre no entanto os autores dividem-se entre Gordiano III e Filipe I, ou mesmo Caracala (198217). Os autores da análise aos medalhões da Gulbenkian e do artigo “Análise não-destrutiva dos Medalhões
Medalhão com busto com couraça de Alexandre Magno ou Caracala. No reverso a legenda em grego Basileu Alexandre. Fotografia, cortesia FCG.
“Dos vinte medalhões do tesouro de Abuquir, onze estão em Lisboa” de Abuquir pertencentes à Colecção Calouste Gulbenkian”, consideram os principados de Macrino (217-218) e Heliogábalo (218-222) como cronologias possíveis para os medalhões. Repare-se que a maioria dos autores que se debruçaram sobre este tema não publicaram imagens, daí a importância do que vamos conseguindo encontrar, quer os de Abuquir, quer os de Tarso. Presumo que o medalhão do Cabinet des Medailles exibirá no reverso a legenda Basileu Filipe, daí a referência a Filipe II da Macedónia, pai de Alexandre Magno. A este propósito, onze dos medalhões de Abuquir, referem-se ao Basileu Alexandre e um ao Basileu Filipe. Dos vinte medalhões do tesouro de Abuquir como sabem, onze estão em Lisboa, cinco em Berlim, Tessalónica e Baltimore também têm algum exemplar mas ainda não posso precisar o número.
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Nas fotografias à direita, o primeiro medalhão apresenta busto com elmo que representará Alexandre Magno. No reverso a legenda em grego Basileu Alexandre. O segundo medalhão apresenta a cabeça idealizada de Alexandre. No reverso a legenda Basileu Alexandre. No terceiro medalhão apresenta-se o que parece ser o retrato de Olímpia. O quarto medalhão apresenta busto couraçado que parece ser a efígie de Caracala. No reverso a legenda em grego Basileu Alexandre.
“O uso de moedas e medalhas com a efígie de Alexandre como amuletos” O interesse pelo mito de Alexandre existiu em Roma desde a época republicana, mas atingiu o auge no período dos Severos. O imperador Caracala chegou a dirigir uma carta ao Senado a declarar que a alma de Alexandre tinha reincarnado nele - atitude que, aliás, permite incluir as peças com a sua imagem entre as relacionadas com o mito - e Severo Alexandre, antes de partir para a sua campanha no Próximo Oriente, foi apresentado, para fins propagandísticos, como um “Alexandre renascido”. A moda do uso de moedas e medalhas com a efígie de Alexandre como amuletos encontra-se bem documentada, em fontes escritas, não só para o séc. III, como para o séc. IV.
Alguns dos Medalhões de Abuquir da colecção da Fundação Gulbenkian. Fotografia, cortesia da Fundação Calouste Gulbenkian (www.gulbenkian.pt).
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A imagem da direita, representa a divinização de Alexandre, a cabeça idealizada dos seus sucessores. Efectivamente Alexandre visitou o templo de Ámon no oásis líbio de Siwah, daí também os númidas terem efigiado Ámon nas suas moedas. Gregos e romanos veneraram Ámon com o nome de Zeus (Júpiter) Ámon.
Por ter respeitado os antigos cultos aos deuses egípcios, Alexandre foi reconhecido no santuário de Siwah como filho de Ámon e sucessor dos faraós, a confirmá-lo, entre tantos outros elementos, os medalhões de Abuquir. O desejo de Alexandre era o de fundir numa estrutura unitária as partes europeias, oriental e asiática do seu império. Com a incorporação de elementos orientais, nasceu a cultura helenística ou helenismo. A propósito da marca de Alexandre e do helenismo, dizem alguns historiadores ser descendente de Alexandre Magno, ainda que o mesmo não tenha deixado descendentes. Alexandre, após ter vencido Dario III, rei dos Persas, entre os anos de 334-331 a. C., conquista de seguida o Egipto que era então uma satrapia persa, onde funda Alexandria, conquista seguidamente o Irão oriental e chega à Índia em 327-325 a. C. O ojectivo e o desejo de Alexandre eram os de fundir numa estrutura unitária as partes europeia, oriental e asiática do seu império.
Alexandre e o seu cavalo Bucéfalo, na Batalha de Isso. Mosaico encontrado em Pompeia, hoje no Museu Arqueológico Nacional, em Nápoles.
Alexandre promoveu casamentos em massa entre macedónios e mulheres persas e com a fundação de mais de 80 cidades, difundiram-se pela Ásia a cultura e língua gregas. Com a incorporação de elementos orientais, nasceu a Cultura Helenística ou helenismo.
Foi casado com Roxana, filha de um príncipe bactriano, de quem esperava um filho aquando da sua morte em 323 a. C., que logo foram assassinados pelos diádocos (generais de Alexandre que partilharam o império). Este exercício de retroceder no tempo tem como objectivo iniciar o percurso da História desde Alexandre até Azes II e assim podermos entender melhor este exemplar, produto do helenismo (esta cultura mista greco-oriental). A Báctria ou Bactriana, satrapia sob os Aqueménidas, foi incluída após a conquista por Alexandre, no império dos Selêucidas, separando-se c. 250 a. C. para vir a formar um reino independente irano-helénico, que ampliou as suas fronteiras até ao Turquestão e à Índia. Para terminar, e a propósito de Alexandre e Ámon descobri mais este texto e do qual transcrevo uma pequena parte, publicado na Super Interessante, edição especial 2012, p. 62 e com base no trabalho de Pérez-Accino, especialista em literatura e textos egípcios: “O jovem conquistador macedónio não era um faraó, mas sentia-se no direito de sê-lo. Se eles descendiam de Rá, segundo o seu título real, Alexandre considerava que era filho de Zéus: Filipe II da Macedónia não fora mais do que o seu pai terreno. Por esse motivo, quando conquistou o Egipto, em 331 a. C., decidiu ir consultar um orácuilo que se enconnumismatas.com
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“O jovem conquistador macedónio não era um faraó, mas sentia-se no direito de sê-lo” trava em Siwa, um oásis remoto para chegar ao qual era preciso atravessar o deserto da Líbia. Ali, adorava-se uma divindade que os gregos designavam, então, por Ámon, o Líbio, uma versão do tradicional deus de Tebas cujo culto conquistara grande popularidade em terras helénicas. ... Para Alexandre, ir a Siwa era visitar o deus no seu local de origem. Significava, também, um importante passo na operação de propaganda para conquistar a legitimidade perante os seus novos súbditos. ... O historiador Plutarco refere uma história segundo a qual o sumo sacerdote de Siwa o teria recebido com a saudação: “Oh, filho” (“Oh paidion”), mas pronunciou mal as palavras gregas e ouviu-se “Oh, filho de Zéus” (“Oh, paî Deus”), um erro que agradou bastante a Alexandre”.
BIBLIOGRAFIA CABRAL, J . M. Peixoto; ALVES, Luís C.; HIPÓLITO, M. Castro, “Análise não-destrutiva dos Medalhões de Abuquir pertencentes à Colecção Calouste Gulbenkian”, Homenagem a Mário Gomes Marques, pp. 401-417, Sintra, 2000. DAHMEN, Karsten, “Alexander in Gold and Silver: Reassessing Third century AD Medallions from Aboukir and Tarsos”, ANS, Londres, 2008. DAHMEN, Karsten, “Medalhões de Abuquir no Museu Calouste Gulbenkian”, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2013. “The J. Pierpont Morgan collection; Catalogue of the Greek and Roman coins, Abukir medallions…”, Edição Wayte Raymond, Nova Iorque, 1953. “Gulbenkian: The Abukir Medals”, disponível em: https://humidfruit.wordpress.com
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“Porticus Minucia”, Ámon existente na Cripta di Balbo, Roma.
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António Carlos Diogo ou “o Visigodo” António Carlos Fernandes Diogo nasceu no dia 19 de Agosto de 1963 em Idanha-a-Nova. Empresário na área da Química de Manutenção Industrial, casado e com dois filhos, foi Militar no cumprimento do SMO (Serviço Militar Obrigatório) na Força Aérea Portuguesa, onde concluí Estudos Franceses Modernos. Iniciou a docência no ano lectivo de 1986/87 no ensino oficial, onde permanece até ao ano lectivo de 2000/01, permanecendo actualmente como colaborador do ensino particular.
Um dos trabalhos de António Diogo, edição do Fórum Numismatas.
Colaborador/articulista de história monetária no Jornal Reconquista de Castelo Branco, Jornal Raiano de Idanha-a-Nova, Diário de Aveiro e Revista Selos e Moedas dos Galitos, todos estes artigos publicados incidem na moeda suevo-visigótica por excelência. Foi, sem margem para dúvida, o guia que nos abriu as portas para a proveitosa parceria Numismatas/Galitos de Aveiro, que o Fórum Numismatas mantém com grande satisfação. Sobre a paixão da Numismática deixa-nos estas inspiradoras palavras: “O ajuntamento de moedas ou melhor, o fascínio pelas moedas antigas despertou quando ainda miúdo achei um denário republicano romano, denário que nunca mais vi. Este episódio marcou-me de tal forma que só há pouco tempo adquiri um denário republicano para os meus tabuleiros. Gosto especialmente de descobrir emissões pouco ou nada divulgadas, embrenhar-me na história desses povos através do mais fidedigno documento histórico, a moeda. Da civilização grega, Império de Alexandre, o Grande, civilização romana, decadência do império romano do Ocidente, Império bizantino, Idade das Trevas Peninsular, invasão das tribos berbéres, moeda muçulmana, Alta e Baixa Idade Média, Moeda colonial de todos os estados europeus com especial incidência na Índia..., todas estas emissões me fascinam e me dão o maior prazer descobrir e partilhar com a comunidade numismática em Portugal e no Mundo.”
Alguns trabalhos desenvolvidos no Fórum Numismatas - Apontamentos para o Estudo da Moeda Visigoda - Apontamentos para o Estudo da Moeda Sueva - Os Croats e os Pacífics catalãos de Pere de Portugal - O maravedí alfonsí: Sua difusão nos est. cristãos - Subsídio para o Estudo da Moeda dos Vândalos - Os Medalhões de Abuquir da Fundação Calouste Gulbenkian - Subsídio p/ o estudo das emissões berberes (númidas) - Subsídio para o estudo da moeda Aragonesa - Subsídio para o estudo da moeda dos Capetos - Subsídio para o estudo da moeda Catalã - Subsídio para o estudo da moeda Castelhano-Leonesa - Subsídio para o estudo da moeda dos Lombardos - Subsídio p/ o est. da moeda de Merovíngios e Carolíngeos - Subsídio para o estudo da moeda dos Ostrogodos - Subsídio para o estudo da moeda dos Nabateus
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MEALHA Nº7 Gazeta das Coisas que Ocorreram no Fórum dos Numismatas e seus Eventos
EQUIPA Alberto Praça, Carlos Pernas, Luís Salgado, Miguel Soares, Paulo Carreira e Teresa Guimarães
PRODUÇÃO Numismatas
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