lookatthist caderno de desenho e não só (ist - arquitectura - desenho)
Visita de Estudo a Cáceres e Mérida
lookatthist 4
Dez15
lookatthist caderno de desenho e não só (ist - arquitectura - desenho)
Lookatthist é um caderno virtual de divulgação de trabalhos realizados na disciplina de Desenho Arquitectónico do 1º Ano do Curso de Arquitectura do IST. O subtítulo «Caderno de desenho e não só», além de esclarecer ao que vimos, sugere a abertura a assuntos paralelos ao Desenho e à Arquitectura habitualmente abordados nas aulas. O quarto número do lookatthist reúne desenhos de viagem e fotografias efectuados numa Visita de Estudo a Cáceres e Mérida realizada nos dias 1 e 2 de Maio de 2015.
E duas pequenas notas laterais na rúbrica ...e não só, uma sobre pequenas e grandes voltas (grand tour) e outra sobre o Arq. Fernando Távora e a viagem.
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Índice Desenho (e fotografia) Nota introdutória, programa, mapa e desenhos On the road Cáceres
Estación de Autobuses em Casar
16
Embarcadero e Garage 2.0
30
Centro Histórico de Cáceres
58
Don Benito
Casa da Cultura
76
Mérida
MNAR
Teatro e Anfiteatro Romanos
100
Templo de Diana
110
Ponte Romana
114
Ponte Lusitânea
118
Centro de Congressos e Exposições
126
88
...e não só Uma Pequena Grande Volta
132
Fernando Távora e a Viagem
136 3
Nota Introdutória
Sair, Viajar, Desenhar On the Road, nms
Sair, viajar e desenhar, eis uma combinação perfeita. Pela descoberta, pela activação do olhar, pelo despertar dos sentidos, pela vivência do desenho no sítio, pela exaltação da atenção, pelo peso e leveza da bagagem adquirida em viagem. Sem sair não há descoberta. A invenção não carece disso, inventamos sem sair de um sítio, embrenhados numa questão. A descoberta pressupõe movimento e a maior parte das vezes somos nós que mudamos, o descoberto já lá estava, imutável, antes de nos darmos conta. O desenho assiste-nos na percepção das diferenças.
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Bruno Zevi dizia, não sem razão, que só pela imersão no espaço nos habilitamos verdadeiramente a vivenciar a arquitectura. Chegar perto do longe, directamente e sem mediação, é aceder ao conhecimento pelo lado dos sentidos e da emoção. Permite uma melhor apreensão do todo e das partes. E de coisas que não cabem num ecrã. (Vi)ver os ambientes. Olhar os olhos. Tactear os materiais. Talvez o desenho tenha isso em comum com a arquitectura, a possibilidade da experiência táctil, das mãos sujas, uma delícia que o virtual não conhece. Daí a sôfrega curiosidade por conhecer novas paragens, outras gentes, outros costumes. Vícios bons a incutir. Ganhar o hábito, a competência e o proveito do desenho de viagem. Seguir a peugada dos mestres, de todas as épocas. Coisa diferente da fotografia. O desenho necessariamente atento à forma, à estrutura e à essência do representado, a foto ficando-se pela pele e pela imagem. Não tem comparação a memória que se guarda do que se desenhou e do que se fotografou. Uma distância proporcional ao intervalo de tempo entre um desenho e um clic. Em Desenho Arquitectónico - do 1º Ano do curso de arquitectura do IST, procuramos sair todos os semestres, em Visitas de Estudo de dois a três dias. Para estudar e desenhar arquitectura directamente nos sítios e nas obras, para adquirir a prática dos desenhos de viagem, para conhecer exemplos históricos e contemporâneos de arquitectura e urbanismo e para contactar autores e intervenientes. Reunimos neste #4 do LOOKATTHIST, desenhos e fotos da Visita de Estudo que efectuamos a Cáceres e Mérida em 1 e 2 de Maio de 2015, com o programa detalhado na página seguinte.
5
Programa
Dia 1 Maio - CÁCERES
A Estação de Autobuses em Casar de Cáceres, do arquitecto Justo Garcia Rubio http://www.justogarcia.com/projects/1/top.htm Remodelação do Centro Cívico e Cultural Embarcadero de Cáceres, dos arquitectos Nieto y Sobejano http://www.nietosobejano.com/project.aspx?i=23&t=EMBARCADERO_ Centro Histórico de Cáceres. Património da Humanidade http://www.wikiwand.com/es/C%C3%A1ceres Museu de Cáceres / Palácio de las Veletas. Cisterna muçulmana (Aljibe) https://www.wikiwand.com/es/Museo_de_C%C3%A1ceres Atrio Restaurante Hotel, dos arquitectos Emilio Tuñón y Luis Mansilla http://mansilla-tunon-architects.blogspot.pt/2011/10/84-relaischateaux-atrio2005-2010.html. (acesso limitado) Centro de Artes Visuales Fundación Helga de Alvear. Novo edifício dos arquitectos Emilio Tuñón y Luis Mansilla (infelizmente fechado, à hora a que chegamos) http://fundacionhelgadealvear.es/el-centro/nuevo-edificio/
Dia 2 Maio 2015 - MÉRIDA
Casa de la Cultura, em Don Benito, do arquitecto Rafael Moneo. Museu Nacional de Ate Romana, do arquitecto Rafael Moneo. http://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Museo_Nacional_de_ Arte_Romano,_M%C3%A9rida http://museoarteromano.mcu.es/el_edificio.html Teatro e Anfiteatro Romano em Mérida. http://www.consorciomerida.org/conjunto/monumentos/teatro lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
A envolvente do Templo de Diana em Mérida, do arquitecto José María Sánchez García. http://www.jmsg.es/ROMAN-TEMPLE-OF-DIANA Ponte Lusitânia, sobre o Guadiana, em Mérida, do arq/eng Santiago Calatrava. http://www.wikiwand.com/es/Puente_Lusitania http://www.calatrava.com/#/Biography/Projects?mode=english Centro de Congressos e Exposições de Mérida, dos arquitectos Nieto y Sobejano. http://www.nietosobejano.com/project.aspx?i=5&t=AUDITORIUM_ AND_CONVENTION_CENTRE \
Exercícios Sobre este roteiro esboçamos os seguintes enunciados (aqui apenas os tópicos): Na Estação de Autobuses lançamos o repto de desenhos rápidos/ esquiços, em menos de 5 minutos. No Embarcadero de Cáceres pedimos projecções ortogonais/desenhos analíticos à mão levantada, antes de quaisquer outras vistas livres. No Centro Histórico de Cáceres desafiamos os participantes a desenharem com atenção à luz/sombra e texturas. Em D. Benito, em face do Centro Cultural, de Moneo, ao lado da Catedral, incentivamos a que os desenhos registassem o “diálogo” entre o antigo e o novo. Mérida, qua havia sido (estu)dada em História da Arquitectura Clássica e Medieval, outra cadeira do 1º Ano, entendeu-se como campo livre para uma selecção e expressão pessoal.
7
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
SĂŠrgio Costa
9
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Estremoz, On the road. nms
11
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Évora Monte, On the road. nms
13
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Évora Monte. Sérgio Costa
15
Estaci贸n de Autobuses em Casar de C谩ceres Arquitecto Justo Garcia Rubio
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Jo達o Ribeiro
17
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Nihal Izet
19
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
nms
21
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Filipa Gabriel
23
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Gonรงalo Sassetti
25
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Gonรงalo Sassetti
27
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
29
Remodelação do Embarcadero de Cáceres e Garage 2.0 Arquitectos Nieto y Sobejano
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
31
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Oana Matei
33
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Pedro Gouveia
35
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Nihal Izet
37
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Filipa Gabriel
39
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Nuno Andrade
41
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Jo達o Ribeiro
43
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Beatriz Faísca
45
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Lucas Ferreira
47
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Gonรงalo Sasseti
49
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Filipa Gabriel
51
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Luana Marques
53
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Luana Marques
55
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Nuno Matos Silva e um grupo de Alunos no Garage 2.0. nms
57
Centro Histórico de Cáceres
Ilustração da complementaridade do desenho e da fotografia para esclarecer a conformidade espacial da arquitectura ou espaço público. Plaza Mayor de Cáceres.
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Nihal Iset
Miguel Jarroca
59
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
nms
61
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
SĂŠrgio Costa
63
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
65
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
SĂŠrgio Costa
67
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
nms
69
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Lucas Ferreira
71
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Algibe, Miguel Jarroca
73
Igreja de Santa Maria, no dia da padroeira de Cรกceres, um lookatthist - caderno de desenho e nรฃo sรณ - ist-arquitectura-desenho
4
m g贸tico vivo e decorado
Miguel Jarroca
75
Casa de la Cultura Don Benito Arquitecto Rafael Moneo
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
77
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
nms
79
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Gonรงalo Sasseti
81
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Lucas Ferreira
83
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
InĂŞs Andrade
85
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Nihal Izet
87
Mérida Museu Nacional de Arte Romana (MNAR) Arquitecto Rafael Moneo
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Nihal Izet
89
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Lucas Ferreira
91
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
SĂŠrgio Costa
93
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
nms
95
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
97
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
99
Mérida Teatro Romano
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Filipa Gabriel
101
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
InĂŞs Andrade
103
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Gonรงalo Sasseti
105
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Lucas Ferreira
107
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Lucas Ferreira
109
Mérida Templo de Diana
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Nihal Izet
111
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
nms
113
Mérida Ponte Romana
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
115
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
117
Mérida Ponte Lusitania Arquitecto Santiago Calatrava
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
SĂŠrgio Costa
119
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Gonรงalo Sasseti
121
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
123
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Mariana Padr達o
125
Mérida Centro de Congressos e Exposições Arquitecto Nieto y Sobejano
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Mariana Padr達o
127
lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Miguel Jarroca
129
Giovanni Paolo Pannini, Itália, 1691-1765, de vistas de la Roma lookatthist - caderno de desenho e não só - Galería ist-arquitectura-desenho 4 Antiga, 1758
131
Desenho... e não só
Uma Pequena Grande Volta Reflexo do caracter generalista do Desenho e espelho da abertura prestada nas aulas a outras manifestações da cultura, aqui se evoca a (não tão) antiga tradição da “Grand Tour”
Piazza del Popolo, ca. 1750, Giovanni Battista Piranesi (Italian, 1720–1778)
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Nem grande nem média, esta Visita de Estudo a Cáceres e Mérida não passou de uma “tout petit tour” ou “volta pequenina”, contudo ofereceu pretexto para se falar das “Grand Tour” ou “Grande Volta”, colher um cheirinho de cultura clássica romana e admirar os bons hábitos de desenho e viagem praticados desde o Renascimento por arquitectos como Brunolleschi no Séc. XV ou Le Corbusier e Louis Kahn no Séc.XX. Toda a pessoa que se prese não deve tardar em sair e conhecer o mundo. Conhecer o mundo significava naturalmente partir ao encontro do centro, o lugar de onde irradiam as ideias e a noção de beleza. Para os mais ilustrados, Roma, herdeira de Atenas, constituiu o centro da civilização ocidental por um largo período de tempo, revigorado pelo cristianismo e pelo Renascimento, resultando o principal polo de atracção desde o Império Romano até ao séc. XVIII. Em tempos mais modernos, descentes dos bárbaros desenvolveram Londres e Berlim a níveis interessantes, mas foi Paris que se afirmou como novo centro do mundo, do séc. XIX até à II Guerra Mundial. De então até ao final do Séc. XX o centro do mundo passou para o outro lado do Atlântico, não se percebia nada do que se estava a passar sem conhecer Nova Iorque. Hoje o centro do mundo espalhou-se por todo por toda a Terra, tal como a Web. Mas não fica mal conhecer a evolução, cuidar das heranças, perceber o rumo, revisitar o berço. Foi deste desejo de conhecer “o centro do mundo” que nasceu o hábito da “Grand Tour” (Grande Volta), expressão pela qual ficaram conhecidas as demoradas viagem a Roma e a outros lugares da cultura clássica realizadas por jovens aristocratas ingleses no início da sua vida adulta e que tiveram o seu auge de meados do séc. XVII até ao início do séc. XIX. Desta sadia prática resultavam fabulosas colecções (… na origem da história da arte e das ciências) e empolgantes crónicas de viagem, muitas delas recheadas de desenhos de viagem, de paisagens e monumentos mediterrâneos.
133
Le Corbusier (Charles-Édouard Jeanneret), Desenho do Pártenon na Acrópole de Atenas Carnet du Voyage d’Orient n°3 p.115, 1911
Louis Kahn Desenho do interior do Pártenon na Acrópole de Atenas, 1951 Pastel sobre papel lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Muitos séculos depois este hábito era ainda seguido por arquitectos determinantes do séc. XX como Le Cobusier (CH/Fr) (1887-1965) e Louis Kahn (EUA) (1901-1974). Vendo as notas e os desenhos inscritos nos cadernos da “Voyage d’Orient” percebe-se a importância desta viagem na evolução da arquitectura de Le Corbusier, da escola decorativa (ligada á arte nova) à modernidade estrutural. Louis Kahn viajou por Itália e pelos desenhos de viagem repetidas vezes ao longo da sua vida. Notícias de semelhante enlevo chegaram-nos de Álvaro Siza, Alexandre Alves Costa e Eduardo Souto Moura ao relatarem o baptismo em mares egeus pela mão do recidivo Fernando Távora. A ruptura do moderno não foi contra o legado do passado mas contra o postiço da sua reprodução sem critério. O trabalho de Moneo em Mérida é eloquente na exaltação das virtudes de um e outro campo, cultura clássica e modernidade. Mérida proporciona um autêntico mergulho na cultura romana. Conimbriga vê-se de cima, Mérida vê-se de dentro. Irradiava civilidade quando a Norte havia pouco mais que embrionárias feitorias costeiras e receoso povoamento castrejo. Capital da província romana da Lusitânia, então um vasto território no sudoeste da península Ibérica atribuído aos reformados do exército em paga dos seus bons serviços nas legiões, exibe um nome que deriva do acolhimento a reformados ao serviço do imperador Augusto – EMÉRITA AUGUSTA (EMÉRITO - ainda hoje se usa para os veneráveis anciões). Marco de uma cultura de que nos julgamos herdeiros. Alvo de uma pequena grande volta, inspiradora de outros ousados passos.
135
Desenho... e não só
Fernando Távora e a Viagem
Página do “diário de bordo” de F. Távora A Catedral vista da rua onde está o Museu Nacional de Antropologia, Cidade do México, 23Abr1960 lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
Fernando Távora (1923-2005) foi um grande arquitecto e pedagogo do Porto, fortemente ligado à cultura da viagem e do desenho. Marcante no seu percurso foi uma volta ao mundo que realizou de Jan. a Fev. de 1960 como bolseiro da Gulbenkian, pelo México, E.U.A., Japão, Tailândia, Paquistão, Líbano, Egipto e Grécia, de que nos deixou largo rastro, ampla documentação e um “diário de bordo” que têm sido alvo de conferências, exposições e edições facsimile. Especialmente tocante é a descrição sua passagem por Taliesin, de Frank Lloyd Wright, um ano após a sua morte. Em sua homenagem a Ordem dos Arquitectos – Secção Regional do Norte (OASRN) promove anualmente o “Prémio Távora” o qual consiste numa bolsa de viagem … para a melhor proposta de viagem de investigação. Desde estudante e durante toda a sua vida, Fernando Távora viajou incessantemente para estudar “in loco” a arquitectura de todas as épocas em todos os continentes, utilizando-a desde 1958 até 2000, como conteúdo e método da sua actividade pedagógica. As suas aulas e a sua prática projectual consolidaram, em sucessivas gerações, em Portugal e no estrangeiro, a ideia de que o conhecimento da história e da cultura são indispensáveis para a produção da arquitectura contemporânea», (http://www.oasrn.org/premio.php?inf=premio)
137
Em Dezembro de 2009, por ocasião do 20º Aniversário do Dep. Arq da Universidade de Coimbra, Alexandre Alves Costa, outro destacado arquitecto e professor do Porto que com ele privou e viajou, junto com Siza e tantos outros discípulos de várias gerações, organizou uma Exposição e proferiu uma Conferência sob o título “A viagem”, à memória de Fernando Távora1, de onde extraímos as seguintes passagens: Fernando Távora Muitas vezes, questionado por questões construtivas ou formais, Távora dizia-lhes que fossem a janela porque aí, na cidade, encontrariam, pela positiva ou pela negativa, a resposta adequada. Mas não fosse ele a apontar o lugar da solução, ninguém o descortinava e eu pensei: de facto para ver o mundo da nossa janela é indispensável ter visto o Mundo. Para ver, mais do que olhar, usamos o desenho. Por isso viajamos, olhamos, desenhamos, vemos. Os desenhos não substituem o real, mas explicam-no melhor do que a nossa preguiçosa experiência directa, porque entre ela e a sua representação existe um olhar que decifra todos os seus enigmas. E registamos, mais do que no papel, na nossa memória, assim, transformados em matéria disponível para ser usada no complexo processo da criação. Os seus desenhos de viagem, extraordinário exemplo da sua inteligência e do seu talento, construído, dizia ele, de experiência acumulada de vida, os seus desenhos vão do registo mais ou menos impressionista, ao rigor da representação mesurada, da cidade ao mais ínfimo pormenor e é muito interessante percebermos como são, simultaneamente, aquisição de conhecimento e demonstração dele. São desenhos vagarosos, cultos na selecção, caso a caso, do que é essencial e na eliminação de tudo o que é supérfluo. (…)
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
O Desenho Para Fernando Távora, desenhar não é apenas adquirir conhecimento, é também investigar. Aquilo que ele desenhou despiu-se sobre os seus olhos, da névoa que funde tudo no todo e adquiriu a presença de uma identidade definida. O desenho manifestou muito rapidamente a sua utilidade em vários campos da aprendizagem da arquitectura, antes de mais na pesquiza da sua essência, a da natureza do espaço, através de um processo analítico de observação de casos, visando a composição, a proporção, a escala, a volumetria, a estrutura, os valores texturais, as relações com o contexto e mesmo alguns factores imateriais, como a luz e a cor. Desenhando arquitecturas visitáveis, percebemos que as ignorávamos. Os estudantes, convidados a viajar pela nossa terra, registam num caderno de viagem as observações que fazem nas suas visitas de estudo. Não com o objectivo de as conhecer, representar e posteriormente comunicar, como na tradição da arqueologia ou da etnografia, mas apenas com o objectivo de as conhecer. É o processo do conhecimento, cada um aprende individualmente com ele. Os alunos agradecem, em primeiro lugar, o pretexto para a viagem por Portugal, em segundo lugar, uma aprendizagem experimentada fisicamente, com gestos e acções directos, sem o intermediário da imagem reproduzida ou da leitura da sua descrição. Lê-se estas passagens e reitera-se a ideia que os grandes mestres de arquitectura e desenho são também excelentes guias de viagem.
139
Campos estrememnhos na Primavera lookatthist - caderno de desenho e n茫o s贸 - ist-arquitectura-desenho
4
Lucas Ferreira
141
lookatthist caderno de desenho e não só (ist - arquitectura - desenho)
Coordenação e textos:
Nuno Matos Silva
Desenhos: Alunos do 1º ano do curso de Arquitectura, 2014/2015 Design e paginação: NMS e Alice Rolão Data de publicação: Dezembro de 2015
lookatthist - caderno de desenho e não só - ist-arquitectura-desenho
4
143
lookatthist caderno de desenho e nĂŁo sĂł (ist - arquitectura - desenho) nĂşmero
4 Dezembro 2015