Amostra Histeria e Gênero

Page 1



Introdução


For here again, we come to a dilemma. Different though the sexes are, they intermix. In every human being a vacillation from one sex to the other takes place, and often it is only the clothes that keep the male or female likeness, while underneath the sex is the very opposite of what it is above. Virginia Woolf, Orlando

Conhece alguma coisa mais desoladora do que isto das haver dois sexos? Mario De Sa-Carneiro, em Carta a Fernando Pessoa


T

omada, rapidamente, a relação entre histeria e gênero pode parecer longínqua ou meramente contingente. Algumas pontuações podem, no entanto, lembrar a potencial pertinência e indissociabilidade entre os dois conceitos. Ainda que a ideia nos pareça distante, os diálogos entre psicanálise e o feminismo – ambos nascidos concomitantemente no fim do século XIX mostravam-se, então, mais íntimos do que se poderia imaginar a partir do cenário acadêmico brasileiro atual. À época, esta relação não era explicitamente teórica, mas transitava pelas cartas, ruas, divãs e diários das primeiras décadas do século XX. Sendo o feminismo europeu pós-sufragista compreendido como proteção e ampliação de direito das mulheres por um lado, e pela liberdade sexual de outro, o número e a importância de figuras que transitam entre os dois campos é digno de nota. Dois casos clínicos demonstram que a relação entre psicanálise e as questões de gênero não se resumem ao acordo ou desa-


Histeria e Gênero

cordo. Com efeito, é a figura da contradição que parece, antes de mais nada, marcar tal relação. Vejamos: um primeiro caso liga tristemente a psicanálise às questões de gênero; trata-se de Margarethe Csonka-Trautenegg, jovem atendida por Freud a pedido de seu pai para “curá-la” de sua paixão por uma mulher semimundana e que se tornaria, posteriormente, uma testemunha ímpar, mas incoercível, da perseguição durante o século XX à homossexualidade, como nos mostra sua instigante biografia (RIEDER; VOIGT, 2008). No entanto, a posição ambígua nos primórdios da psicanálise em relação ao tema nos fornece um contraexemplo. Basta lembrar a conhecida carta de resposta de Freud à mãe de um jovem homossexual, na qual o pai da psicanálise afirma que não poderia realizar tal atendimento por entender que se o rapaz não se encontrava em sofrimento, nada poderia ser feito já que sua condição não seria considerada, pela psicanálise, como uma patologia. Ampliemos nossa casuística aos primeiros casos de histeria para o exame da complexidade destas contradições. Se Anna O. é para a psicanálise sua histérica fundadora, Bertha Pappenheim – seu verdadeiro nome – entra para a história como pioneira da assistência social, escritora e feminista. Pappenheim, após o término abrupto de seu tratamento com Breuer, afasta-se definitivamente da psicanálise e até o fim da vida dedica-se a cuidar de um orfanato para crianças nascidas de jovens mães solteiras. Seriam os diferentes percursos de Margarethe Csonka-Trautenegg, Anna O. e Bertha Pappenheim um retrato de uma radical irredutibilidade entre a visão psicanalítica sobre a histeria e o feminismo? O caráter menos disruptivo da relação de Anaïs Nin com ambos os campos prova que não. Analisada por Otto Rank – que pouco depois seria um de seus inúmeros amores – Nin tornou-se, ela mesma, analista, tendo iniciado sua prática em uma breve estadia nos Estados Unidos. Em seus consagrados diários, confabulações acerca do masculino, do feminino e do erotismo dividem espaço com relatos breves de sessões de análise, discussões teóricas com Rank e questionamentos diversos sobre a natureza de seu desejo.

20


Introdução

Nin viveu a efervescência da primeira onda de escritoras anglo-saxãs expatriadas na rive gauche parisiense do entre guerras, que contava também com a presença de outra importante figura, Hilda Doolittle. A poetisa norte-americana empreendeu, entre 1933 e 1934, uma análise com Freud cujo motor principal, de acordo com Roudinesco, era sua homossexualidade (DOOLITTLE, 2012). Testemunhando o fim da moral vienense, as ambições de Freud e Doolittle aparentemente passaram longe de uma “cura”, como testemunha a vida posterior da escritora, que veio a se tornar um dos primeiros ícones gays e feministas, em especial depois da retomada de seus escritos, a partir de 1970. Enfim, a consideração de como a relação entre psicanálise e feminismo evoluiu na história do século XX mostra uma espécie de contradição entre a contingência de fatos, personalidades e uma lenta mutação conceitual de ambas as teorias. Em alguns momentos, o par se estreita; em outros, parece se afastar resolutamente. Assim, se até certo momento, em vez de gênero, falava-se de feminismo, o quadro tende a se alterar no pós-guerra. Foi a partir da proposição de um psicólogo, John Money, e de sua popularização através do psicanalista Robert Stoller, que o conceito de gênero sai do domínio da taxonomia e dá novo fôlego ao feminismo. Do lado da psicanálise, a hiperinflação do conceito de histeria, e sua sobreposição simples ao feminino, levará a uma dispersão diagnóstica cujos ecos serão sentidos de forma contundente alhures. Cabe aqui elencar mais um dos fatos históricos que interferiram nesta complexa trama: a verdadeira revolução conceitual que ocorreu no campo da psiquiatria a partir da descoberta e desenvolvimento dos primeiros medicamentos psicoativos eficazes nos anos 1950, e da consequente dependência da indústria farmacêutica e de sua lógica mercantil. Pela primeira vez, em sua história, a psiquiatria deixava de ser uma ciência meramente

21


Histeria e Gênero

teórica e descritiva para alcançar o estatuto de uma especialidade médica com uma clínica autônoma. Contudo, atendendo às pressões da lógica mercantil, a psiquiatria realiza uma surpreendente renúncia de sua própria tradição semiológica e busca alçar a clínica psiquiátrica a uma técnica puramente empírica, sem teoria. E nesse processo de veto a toda e qualquer especulação teórica que as sucessivas atualizações do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM), paulatinamente, excluiu as categorias oriundas da psicanálise, entre elas a histeria. E mesmo assim, trata-se de um movimento de exclusão recente na história da psiquiatria. Até os anos 1980, os grandes sistemas psiquiátricos em uso, o de Karl Jaspers e o de Henry Ey, reconheciam na histeria e em outras neuroses a causalidade isolada pela psicanálise. Esta amizade teórica esfria no DSM-III, em que a histeria desaparece e seus sintomas são agrupados em novas categorias como Distúrbios somatoformes e transtornos dissociativos. Em 1994, o DSM-IV retira definitivamente o termo “neurose” de seus quadros, visando fundar uma clínica psiquiátrica puramente organicista, com uma solução físico-química para cada sintoma isolado. Tal fragmentação é questionável e cobra um alto tributo à psiquiatria, pois, como apontam Alonso e Fuks (2004), ao retirar a subjetividade da psicopatologia psiquiátrica, abre-se também mão de uma organização imanente à pluralidade dos sintomas psíquicos. Não será então uma surpresa se a capacidade mimética e a multiplicidade de sintomas da histeria passarem a alimentar os quadros de outras psicopatologias, relativamente distantes de sua organização neurótica, como os transtornos alimentares, de personalidade ou de humor. A fragmentação das psicopatologias em seus sintomas, proposta pelo DSM-III, oferece ao mercado novos nomes, novos saberes sobre o corpo, o que se harmoniza bem com a conhecida ânsia por identidades da histeria. De um lado, um discurso que oferece aos sujeitos um saber sobre o corpo, de outro, sujeitos que gozam na medida em que provocam seu outro a decifrar o enigma sexual de um corpo.

22


Introdução

Assim, num estranho diálogo que gira incessantemente em torno da crença em certezas sobre o corpo, cabe notar que se a histeria é excluída da diagnóstica psiquiátrica atual, visando a uma descrição sintomática, estatística e ateórica, certas demandas ligadas ao gênero, oriundas do movimento gay, e mais recentemente de questões ligadas à transexualidade, têm sua relação marcada com o manual pelo viés de direitos civis. Ainda que, em ambos os casos, trate-se de não reconhecer o caráter patológico tanto da histeria como das questões colocadas pelo gênero e ligadas a identidades, práticas e reconhecimento de sofrimento subjetivo, a exclusão de resquícios psicanalíticos e a inclusão de patologias do gênero no DSM apontam para uma importante diferença entre a concepção de sujeito da psicanálise, num ponto, e a racionalidade diagnóstica do DSM e as teorias de gênero, em outro. Trata-se do caráter irredutível do inconsciente e da crítica radical à soberania de si, empreendida pela psicanálise, que a princípio colocaria questões tanto para o convencionalismo psicopatológico do DSM, como para as políticas de gênero que lutam pela liberdade identitária. Se analisarmos o que ocorre neste mesmo período com a homossexualidade, e com o que mais tarde viria a ser considerado como Transtorno de Identidade de Gênero, observamos um movimento que confirma a linha divisória que passa pela questão da soberania do indivíduo sobre si. A partir de pressões oriundas de movimentos sociais e, principalmente, de psiquiatras gays, a homossexualidade passa de um “Distúrbio Mental de Base Sexual”, em 1968, para um “Distúrbio de Orientação Sexual”, em 1973, já considerando como patológica não a dimensão da prática ou da identidade homossexual, mas antes o conflito que o indivíduo teria com sua orientação. Trata-se aqui – para desgosto dos psiquiatras mais conservadores – de uma classificação criada por voto (CUTLER, 2000). Em 1980, com a terceira edição do manual, encontramos a homossexualidade ego-distônica pela última vez. Nesta mesma edição, pela primeira vez, é utilizado o termo “gênero” ao se referir aos distúrbios de identidade de gênero, e aqui lembramos que John

23


Histeria e Gênero

Money participou da edição do DSM-III, tendo sido um dos responsáveis pela introdução das parafilias no manual. A consideração da soberania de si como fundamentalmente ilusória é, por sua vez, a forma pela qual a psicanálise visita novamente seus conceitos e descrições de patologias. Freud considerou, inicialmente, o recalcamento cultural da sexualidade como a principal causa das neuroses, e isto parece não mais se aplicar totalmente aos nossos hábitos eróticos. Em sua concepção sobre as neuroses em geral, Freud via na histeria, sobretudo, um estilo do recalcamento: diante de uma ideia ou pensamento de sentido sexual, incompatível com o eu do sujeito, a histeria realizaria uma conversão para o corpo do afeto retirado deste pensamento. Já a neurose obsessiva e a fobia desviariam esta carga afetiva para outras representações e conteúdos psíquicos sem relação aparente com o primeiro. Assim, o corpo na histeria seria uma espécie de diário erótico, escrito em uma língua ignorada pelo próprio autor. Neste sentido, os sintomas corporais histéricos seriam descritos por Freud como obedecendo a uma “anatomia fantasmática”, sem relação com a anatomia científica. Toda a riqueza cênica das “grandes histéricas” dependeria, assim, de um recalcamento da vida erótica ainda presente na extinta cultura vienense. Seria então a divisão do sujeito um efeito passageiro, dependente da história das moralidades nas culturas? Neste caso, a interpretação psicanalítica da histeria estaria fadada a um fim. Ao longo do século XX, a indústria cultural, tal como foi definida por Adorno e Horkheimer, produziu formas de satisfação fácil para os desejos; além disso, ela instaura uma relação tipicamente perversa com a proibição: nela são simultaneamente vigentes, de um lado, a proibição do objeto de desejo – pois este está sempre um pouco além das possibilidades de compra do consumidor e o calote ameaçaria o sistema – e, de outro, um verdadeiro imperativo para sua satisfação através da publicidade. Isto sem que estas contradições se configurem em um impasse. Nesta cultura de racionalidade cínica como avança Vla-

24


Introdução

dimir Safatle, em Cinismo e falência da crítica (2008), é a própria castração que se vê privada de investimento pulsional, afetando para além da histeria as neuroses como um todo. Deste modo, se a histeria fosse exclusivamente regulada pelo recalcamento, estaria com seus dias contados e seu conceito já ultrapassado. Entretanto, a partir dos anos 1920, Freud oferece novos instrumentos conceituais para a compreensão desta neurose. A histeria passa a ser articulada à fase fálica e ao complexo de castração. Na histeria feminina, uma problemática identificação ao gênero seria de algum modo utilizada como uma tentativa de oferecer uma solução à ferida narcísica da castração. Seu objeto de desejo seria escolhido no interior de uma estrutura triangular, em que o desejo de um homem indicaria cada vez o que deve desejar. Tal é o caso da famosa paciente de Freud, Dora, que busca uma resposta para a pergunta “o que é uma mulher?” através de um flerte com o marido da Sra. K; esta sim, seu verdadeiro objeto de interesse. E aqui, a psicanálise aproxima-se das teorias de gênero – ao contrário do que se poderia supor – a partir de uma lógica igualmente construcionista e desvinculada de substratos biológicos. Toda a gramática de identificações, que em última medida mostram-se fenomenologicamente fixas, é desmontada a partir da radicalidade do desejo. Em outras palavras, um trabalho analítico no campo da histeria pode levar o sujeito à sobreposição da pergunta inconsciente “o que quer uma mulher? “e “o que é uma mulher?”. Tal dicotomia teria como resultado uma terceira questão, de caráter central, tanto para o sujeito do inconsciente na histeria, quanto para o indivíduo contemporâneo que reconhece a artificialidade do gênero: “eu sou uma mulher?”, desta forma, a identidade passa a ser um efeito, um atributo do desejo, ainda que não aberto à consciência. Neste sentido, psicanálise e teorias de gênero estariam de acordo no que diz respeito ao caráter contingente da significação da diferença anatômica entre os sexos para a inserção do sujeito em um gênero.

25


Histeria e Gênero

A diferença entre as duas teorias parece estar na ideia de uma divisão fundamental do sujeito na psicanálise, e de uma identidade de base do sujeito consigo próprio, no caso de boa parte das teorias de gênero. A posição do sujeito do inconsciente seria radicalmente inacessível ao eu do sujeito para a psicanálise; ao passo que a escolha de um ou de nenhum gênero, na medida em que é pensada como um gesto performativo, deve ser acessível à deliberação do indivíduo. De certo modo, esta ilusória soberania sobre si seria a principal objeção da psicanálise às teorias de gênero. Não obstante, uma objeção que aqui poderia ser levantada contra a psicanálise parte do fato que em sua concepção de histeria, em sua metapsicologia e em seu tratamento, as operações continuariam a ser feitas em uma lógica binária, ainda que não biológica. Como, então, a psicanálise poderia se haver com as contribuições dos gender e queer studies, que mostram que a binariedade de gêneros é uma construção frágil, ocidental, centrista e radicalmente histórica? Mesmo em nossa cultura falocêntrica, já é possível encontrar indícios de que no domínio do gênero um é pouco, dois é pouco, três é pouco. Neste ponto algumas formulações lacanianas podem nos servir para recolocar tais problemas em outras bases conceituais. A partir da descrição freudiana, Lacan faz uma releitura estrutural onde a histeria passa a ser definida pela posição do sujeito histérico em relação ao desejo do outro. E isto, segundo uma dupla vertente: num ponto ele se coloca como passivo diante deste desejo, pois este é o que pode constituí-lo como fálico; no outro, a necessidade de manter o desejo do outro insatisfeito exige da histeria uma atividade constante, pois, há sempre o risco de que o outro satisfaça seu desejo e que abandone sua função na estrutura. A atividade se concentra na histeria na chave identificatória, pois, para conhecer o desejo do outro, a histeria deve identificar-se com ele. É comum a mulher histérica se apoiar nos clichês masculinos de objeto de desejo para tentar desvendar o segredo das grandes musas. Nesse sentido,

26


Introdução

se a posição homossexual é inerente à gramática histérica do desejo, deve-se notar que ela não é seu ponto final. Em tal estrutura, a ambivalência fundamental e irredutível da histeria funciona, na verdade, como uma espécie de motor crítico das identidades de gênero pensadas binariamente. Sendo assim, a releitura estruturalista da histeria operada por Lacan permite sua extensão a uma ampla gama de situações que, em certo sentido, compreendem a gramática desejante da histeria como um paradigma. Seja para nomear a posição de demanda do analisante no início de sua análise, seja para descrever o estilo metonímico de seu desejo no final desta. Lacan passa a compreender a histeria como uma estrutura discursiva que transcende seu uso como entidade psicopatológica. Destaca-se, contudo, aquela que foi, sem dúvida, a mais importante contribuição de Lacan para o conceito de histeria ao definir o discurso desta como uma das quatro modalidades de laço social, ao lado do discurso do mestre, do discurso universitário e do discurso do analista. O discurso da histérica permite compreender a lógica presente em cenas mais amplas da vida social, em que, por exemplo, posições de demanda, provocação ou sedução são encarnadas por indivíduos ou por grupos diante de representantes de saberes oficiais. É aqui, no nível da potencialidade política de seu funcionamento como laço social, que a atualidade do conceito de histeria propicia instigantes debates à psicanálise que deve posicionar-se diante de questões sociais e filosóficas. Em tais debates, uma ideia que aproxima novamente gênero e histeria, conhecida entre psicanalistas, costuma ser evocada: a feminilidade como cura da histeria. Evidentemente esta afirmação forte dá margens às mais diferentes interpretações. Se entendida a partir dos avanços de Lacan presentes no Seminário XX, no entanto, a feminilidade não se apresenta como essência da mulher, mas antes como uma lógica de posicionamento frente à lei simbólica. Mais especificamente, como uma não modalidade de posicionamento em relação a esta lei.

27


Histeria e Gênero

Trata-se aqui da noção de “não-todo”, de onde temos o conhecido aforismo “a mulher é não-toda”. De forma aplicada ao nosso caso, e resumidamente, se na histeria a questão orbita ao redor da posição do sujeito em relação ao falo, na feminilidade, a lógica do sujeito é pensada não necessariamente a partir da famigerada lei. Adicional e principalmente, do domínio do que aqui é compreendido como feminilidade, a binariedade não pode mais ser pensada enquanto fundamental, pois, é introduzida a dimensão do “gozo outro”, que não obedece à lógica que divide o mundo entre castrados e não castrados. Em outras palavras, as identificações e os objetos de desejo do homem e da mulher não são simétricos e nem complementares, eis a razão do recorrente aforismo lacaniano no: “A relação sexual não existe”. Pensando desta forma, o sentido do tratamento da histeria em direção à feminilidade ressignifica-se encontrando semelhanças interessantes junto aos movimentos feministas que defendem um simbólico feminino, ou mesmo aqueles cujo desconstrucionismo radical aponta para uma total implosão de categorias de gênero conhecidas. A histeria é, por excelência, uma modalidade de funcionamento na qual a identidade de gênero está sujeita a um horizonte permanente de questionamento radical de sua fixidez. E isso não diz respeito apenas ao indivíduo. Com base na proposição do discurso da histérica, lembremos outro traço distinto desta modalidade de laço social: o sujeito histérico tende a questionar e derrubar aquele ou aquilo que se coloca em posição de mestre, ou seja, igualmente no campo social e de demandas de minorias, a histeria assim compreendida também serve ao processo político de conquista de direitos. Dessa forma, se no surgimento da psicanálise, a partir da histeria e dos primeiros movimentos feministas estes debates parecem estar próximos, pretende-se, no presente livro, iniciar um mapeamento dos destinos que estes dois grandes temas tomaram. Procuramos

28


Introdução

na empreitada deste projeto montar um quadro que possibilitasse leituras e críticas diferentes, desde o posicionamento teórico e político de cada leitora ou leitor. O convite é para que se realize uma análise da pertinência e possibilidade de aproximação destas duas temáticas, partindo de um palimpsesto de concepções e ideias distintas de gênero, sexo, sexualidade, masculinidade, feminidade, homossexualidade etc., presentes em cada capítulo. Espera-se que, longe de se tratar de uma babel infrutífera, o debate iniciado apresente diversidade e riqueza conceituais suficientes para uma discussão atual da histeria e do gênero, ao colocar estes operadores frente a frente, testando sua pertinência recíproca. Esta ideia nasceu a partir das discussões realizadas no interior do Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise da Universidade de São Paulo. Neste contexto, instigantes debates germinaram a concepção deste trabalho e aqui agradecemos a todas as pesquisadoras e pesquisadores que dele fizeram ou fazem parte. Poucos serão os agradecimentos às autoras e autores que, de forma tão séria e gentil, aceitaram nosso convite, surpreendendo-nos com trabalhos de qualidade e desdobrando-se para cumprir prazos; estes sintomáticos motores da atual vida acadêmica. Impossível seria transformar um apanhado desconexo de documentos de word em um livro, não fosse o excelente trabalho realizado pela Editora nVersos, que desde o início apoiou nosso projeto. Por fim, agradecemos à FAPESP, cujo auxílio ao financiar a bolsa de mestrado de um dos organizadores - permitiu a organização do presente trabalho.

29


Histeria e Gênero

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALONSO, S.; FUKS, M. Histeria. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. CUTLER, B. The History of the DSM’s Classification of Sex. Arizona Power Exchange,

2000.

In:http://www.arizonapowerexchange.org/files/academic

DSM & Sex.pdf. DOOLITTLE, H. Por amor a Freud. Jorge Zahar, 2012 RIEDER, I.; VOIGT, D. Desejos secretos: a história de Sidonie C., a paciente homossexual de Freud. [S. 1.): Companhia das Letras, 2008. SAFATLE, V. Cinismo e Falência da Crítica. São Paulo: Boitempo, 2008

30


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.