OCIDENTE
N y di a N e g r o m onte
Central Galeria SP 2014
OCIDENTE de Nydia Negromonte Em latim, enquanto oriens significa sol nascente e guarda a ideia de tornar-se visível ou originarse, occidens é o sol poente, a queda, a perda. Se o oriente é iluminador, no ocidente anoitece, lugar do apagamento. Complementares, oriente e ocidente são binários geográficos que dão ritmo ao espaço-tempo da vida. Assim, aprendemos que o oriente orienta e notamos que o ocidente oxida a vista em lusco-fusco. A exposição OCIDENTE de Nydia Negromonte instala precisamente essa experiência do lusco-fusco: o que a vista não alcança no ato do declínio é recolhido, estudado, mesurado e posto a trabalhar num novo laboratório de sensibilidades. Na exposição, as táticas de orientação e desorientação no espaço podem ser vividas entre trabalhos que encarnam em seus corpos próprios a passagem inelutável do tempo. Esses trabalhos coreografam a fragilidade dos materiais vivos e testemunham o delírio dos materiais mortos. Aqui, oriente e ocidente por vezes trocam de lugar, o fim tornando-se vetor de possibilidades e o começo aparecendo como uma nova e promissora decadência. Para Nydia, a microscopia do cotidiano é justamente o palco de uma série de observações participantes que geram gestos, ações e processos que, por sua vez, podem vir a ser congelados, através de várias estratégias imagéticas, para que durem por mais tempo em nossa memória. Os atos da artista interferem nos objetos encontrados no cotidiano mumificando-os e desmumificando-os, soprando-lhes nova vida ou interrompendo o seu tempo natural. O fio da memória é assim desfeito e redesenhado. Podemos notar que a imagem é peça importante nesse novo laboratório criado, é reagente de momentos fugazes. Um diálogo inquisidor com o mundo-imagem de que falava Susan Sontag, no qual a realidade se define a partir do registro das imagens, “substitutas cobiçadas da experiência autêntica”. Segundo Sontag, a imagem fotográfica, com o seu imperativo de “máscara fúnebre” da realidade, formaria um “interminável dossiê” que comporia as memórias coletivas.
Em OCIDENTE, a memória fotográfica é matéria-prima que pode ser reconstruída, que pode sofrer interferências, que deve ser recongelada através de uma nova aderência matérica. A matéria – camada de inscrição, barro ou papel de arroz – luta por editar as imagens, esse arsenal mnemônico sempre tão poroso aos nossos vastos desejos. Em vez da imagem como documento, somos apresentados à imagem como artefato da memória, edição plástica. Somos protagonistas em vez de reféns do mundo-imagem discutido por Sontag. As fotografias exibidas são um construto elástico que encarna duas camadas de congelamento: uma anterior, ótica, e outra atual, tátil, a sua nova máscara fúnebre. Como uma segunda estratégia imagética para o congelamento de processos nascidos do cotidiano, nos é apresentado também um conjunto fotográfico seriado que captura instantes da morte-vida de formas tão familiares quanto estranhas. Frutas e legumes posam para a fotografia no ínterim de sua transformação, seres híbridos à procura de um desenho possível. São registros realizados em estúdio, deliberadamente apartados do seu mundo cotidiano originário e, com o clima da objetividade de um laboratório asséptico, negociam a sua singularidade classificatória num conjunto inesgotável. No seu percurso imagético, OCIDENTE nos surpreende com a presença súbita de objetos derivados das imagens ou que com elas travam um diálogo de reciprocidades. São flagrantes de corpos que se situam fantasmagoricamente entre a experiência fugaz e a escultura. São encarnações dos processos de tensão entre a visibilidade e a perda, entre o território do dia a dia e a eternidade atópica, entre o nascente e o poente. Operações matemáticas gravadas em mármore, covas perfuradas numa superfície de algodão, frascos de água fervente modelando formas e legumes esfaqueados fundidos em bronze dão concretude sutil à experiência de orientação e desorientação proposta por OCIDENTE. E, nesse horizonte estético, podemos avistar finalmente o planejamento de um cotidiano ao mesmo tempo trágico e prospectivo, pueril e heroico, íntimo e universal. [Renata Marquez]
Registro fotográfico processado integralmente em estúdio, realizado logo após a desmontagem da obra POSTA, apresentada na 30ª Bienal de São Paulo, 2012.
A série está composta de 500 imagens, que registram frutas, legumes e tubérculos
encapados com argila crua. Através de um campo de forças ali instalado, cada
indivíduo busca a força vital do elemento água. Ativados pela ação do tempo, corpos depositados sobre uma mesa de ar exibem, ora inércia, ora pulsão de vida e morte.
POSTA, 300 x 400 cm, 2012
Itinerância da Trigésima Bienal de São Paulo.
Grande Galeria do Palácio das Artes, Belo Horizonte
Post POSTA 2014
Impress達o com pigmento mineral sobre
papel de algod達o 305 g, 36,5 x 73 cm [cada]
Em 2012 a artista fez uma expedição em um pequeno
barco na Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte. Quatorze
amostras de água foram então coletadas fotograficamente, documentando os seus distintos graus de pureza e densidade.
Paralelamente, foram inventariadas inúmeras notas de
degustação, comumente presentes em rótulos de garrafas de vinhos. A série resulta do emparelhamento das amostras
de água em estreito diálogo com as notas de degustação. Na montagem, esse diálogo é encapsulado em estruturas de acrílico, potencializando transparência e brilho.
Vista parcial da exposição:
4 Ventos, Notas de Prova e Bússolas
NOTAS DE PROVA 2014
Impress達o com pigmento mineral sobre papel de algod達o 500 g 55 x 40 cm [cada]
VENTOSA [Ação-Instalação] 2004-2014 Cilindros de vidro variados, água fervente e filme PVC cristal, dimensões variáveis.
Água fervente é despejada dentro de cilindros de
vidro que, em seguida são vedados completamente com plástico filme pelas mãos da artista. Em poucos segundos, um campo de forças é ali instaurado.
Primeiramente, a película se dilata formando uma “cúpula” convexa. Pouco a pouco, o movimento segue
em sentido descente, causado pelo resfriamento da água, até sua total inversão, apresentando uma forma côncava situada dentro de cada recipiente.
Corpos sofrem a ação do calor, percorrendo percursos ora túrgidos, ora murchos. Os cilindros-estufas são dispostos aleatoriamente no piso da galeria, a formar
uma espécie de jardim, onde ciclos silenciosos da água têm lugar.
TOPOGRAFIA HIDRÓFILA [Instalação] 2014 Mangueira, água, óxido de ferro, 55 Kg
de algodão hidrófilo e palets de madeira, 15 x 270 x 510 cm
Instalação processual e sonora construída com mangueira transparente perfurada, formando
um circuito d’água. Tal ducto, está fixado em uma grade de ferro oxidado que, por sua vez,
está preso no teto e conectado a um reservatório
de água. Ao longo dos dias, 160 pingos caem sistematicamente sobre um grid pavimentado
com blocos de algodão, a querer marcar em ritmo cadente, a ação física do tempo.
BÚSSOLA [6 peças] 2014
Fundição em bronze com liga de cobre, dimensões variáveis.
Descascar, cortar, dividir, e fatiar, são atos corriqueiros, próprios
do preparo do alimento , presentes em qualquer
cozinha. Frutos e tubérculos variados, tais como manga, abacate, chuchu, batata doce e maracujá, sofrem a ação cotidiana do golpe de uma faca. Fundidos, formam um corpo sólido que, inertes, parecem querer indicar pontos de orientação espacial.
Uma paineira localizada em uma grande avenida, observa solenemente o fluxo frenético da cidade. Quatro faces distintas dessa mesma árvore foram então registradas, buscando nessa circularidade seus pontos cardeais: norte, sul, leste, oeste. O estatuto da imagem foi alterado a partir do depósito
de formas orgânicas que, tal como o ciclo vital da árvore, responde às estações e retém o espocar dos frutos, bem como seu fluxo de dispersão e vida.
QUATRO VENTOS 2014
Paina, papel de arroz 6 g e goma arábica sobre impressão com pigmento mineral sobre papel de algodão 310 g, 100 x 66 cm [cada]
QUATRO OPERAÇÕES 2014
Gravação a laser sobre placas de mármore e braúna, 55 x 40 x 4 cm [cada]
Apropriação de ilustrações extraídas de um livro didático
editado nos anos 60 que, juntas, demonstram as quatro operações: adição, subtração, multiplicação e divisão.
Nas imagens, cenas corriqueiras e bucólicas exibem
crianças e adultos compartilhando seus alimentos, estabelecendo trocas simbólicas de toda ordem.
Vista Geral da exposição
NYDIA NEGROMONTE, 1965, artista plástica, formada em Desenho pela Escola de Belas Artes da UFMG em 1989, com especialização em gravura em 1998: “La obra gráfica hoy: de la impronta grabada a la impronta digital”- Faculdade de Belas Artes, Universidade de Barcelona, Espanha. Contato Galeria: www.centralgaleriadearte.com R. Mourato Coelho 751 Pinheiros São Paulo SP T 11 2645 4480 Contato Artista: nydianegromonte@uol.com.br T 31 32272841 T 31 25105512 Belo Horizonte MG
Fotografia: Guilherme Tavares, Fabio Del Re, Marcelo Drummond
Entre os anos de 1999 e 2001 foi artista residente no Atelier HANGAR, Barcelona, Espanha, participando de importantes mostras: ARCO, Feria Internacional de Arte Contemporáneo, Madrid; “Corpo Seco”, Galeria Sicart, Barcelona; e “Urbild”, Galeria Antonio de Barnola, Barcelona. PRINCIPAIS INDIVIDUAIS: 2014, “Ocidente”, Central Galeria de Arte, São Paulo; 2011, “Lição de Coisas”, Fundação ECARTA, e Casa das Vitaminas no Parque Farroupilha, Porto Alegre; 2010, “Jasmim do Cabo”,, Instituto Undió, Belo Horizonte; 2004, “Pulmo”, Torreão, Porto Alegre; 2003, Centro Universitário Maria Antonia, São Paulo. PRINCIPAIS COLETIVAS: 2014, “Punto de Quiebre”, Beatriz Gil Galeria, Caracas, Venezuela; 2010, “Casa das Vitaminas”, Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte; 2006/2005, “Identificador”, Paço das Artes, São Paulo e Galeria de Arte da Cemig, Belo Horizonte; 2002, “Matéria Prima”, Novo Museu de Curitiba. Em 2012 realizou uma grande exposição individual, “Lição de Coisas” no Museu de Arte da Pampulha/MAP, Belo Horizonte e participou da Trigésima Bienal de São Paulo, “A Iminência das Poéticas”.