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Digital 12• Ano 44.º Dezembro 2015
ESTAMOS PREPARADOS PARA AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS?
NOTA DE ABERTURA
SUMÁRIO É NECESSÁRIO UM ACORDO MUNDIAL NA COP 21
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T ESTAMOS PREPARADOS PARA AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS?
AMBIENTE 03 Sinais 2015 Estamos preparados para as alterações climáticas? 06 Bicicletas reclamam quota no transporte urbano. Será que conseguem?
em vindo a realizar-se, em Paris, uma grande conferência internacional (a COP 21), cuja agenda é chegar a um acordo global sobre mudanças climáticas, para entrar em vigor em 2020. Esse novo acordo deverá substituir o Protocolo de Kyoto, de 1997, que teve resultados decepcionantes. O objetivo do Protocolo de Kyoto era reduzir as emissões de gases de efeito estufa, responsáveis pelo aquecimento global e pelas mudanças climáticas. Mas adotou uma estratégia que não deu certo: os países em dias de desenvolvimento como o Brasil, a China e muitos outros, foram desobrigados de reduzir as suas emissões com a justificação de que fazê-lo prejudicaria o seu desenvolvimento. Além disso, os Estados Unidos ficaram de fora do protocolo. Como resultado, as emissões de gases de estufa, em lugar de decrescer, aumentaram cerca de 50% em relação a 1990. A presente Conferência tem como objectivo estabelecer um protocolo entre todos os países que permita impedir o aquecimento global de ultrapassar os 2 graus Celcius, o que a acontecer seria trágico para o nosso planeta.
CENTENÁRIO DO SOEMMM 08 1935/1936 - sinistros na costa portuguesa GESTÃO/ EMPREENDORISMO 10 A eficácia pessoal nas relações com os outros INOVAÇÃO 13 Materiais não-hermitianos: Os sólidos que a luz não vê 13 Estradas que carregam carros elétricos 14 As novas tintas especiais 16 Material mais preto já feito pelo homem
FICHA TÉCNICA PROPRIEDADE: Centro Cultural dos Oficiais e Engenheiros Maquinistas da Marinha Mercante - NIPC: 501081240 FUNDADOR: José dos Reis Quaresma DIRECTOR: Rogério Pinto EDITORES: Jorge Rocha e Jorge de Almeida REDACÇÃO E ADMIN.: Av. D. Carlos I, 101-1º Esq., 1200-648 Lisboa Portugal Telefs 213 961 775 / 213 952 797 E-MAIL opropulsor@soemmm.pt COLABORADORES: Artur Simões, Eduardo Alves, José Bento, J. Trindade Pinto, Chincho Macedo e Vanda Caetano. PAGINAÇÃO E DESIGN: Altodesign, Design Gráfico e Webdesign, lda Tel 218 035 747 / 912812834 E-MAIL geral@altodesign.pt
Todavia não tem sido fácil, porque cada país tende a olhar para o próprio “umbigo”, pensando nos aspectos económicos imediatos e recusando-se a ver que se o aquecimento global não for sustido os primeiros a sofrer serão os países mais baixos, mas todos acabarão por sentir os efeitos. São 195 países que estão presentes e a debater estes assuntos e é a eles a quem se exige, principalmente aos maiores poluidores, uma sã negociação e um resultado positivo para todos. Não se trata de um capricho de ambientalistas, que uma parte da sociedade ainda não vê com bons olhos, mas sim de uma necessidade do nosso mundo, uma necessidade dos nossos filhos e netos. Ban Ki-moon pediu aos representantes dos 195 países presentes na cimeira que não cedam às difíceis escolhas que enfrentam. “O mundo espera mais de vocês do que meias medidas e aproximações incrementais”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, reforçando que o foco deve ser um “acordo transformador”. Nós, cidadãos do mundo, temos de dar a nossa colaboração, no dia a dia, para que os representantes de cada país neste tipo de conferências se sintam obrigados a ter a nossa opinião em conta. Mas agora o que temos a fazer é gritar bem alto que é necessário um acordo mundial na COP 21!
Todos os artigos não assinados, publicados nesta edição, são da responsabilidade do Director e dos Editores. Imagens: Optidas na web
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O Director
Revista Técnica de Engenharia
AMBIENTE
SINAIS 2015
ESTAMOS PREPARADOS PARA AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS? O clima da Europa está a mudar
As alterações climáticas afetam de várias formas a nossa saúde, os ecossistemas e a economia. É provável que estes impactes se agravem nas próximas décadas e, se nada for feito, podem sair-nos muito caros, em termos de saúde, degradação dos ecossistemas e destruição de bens e infraestruturas. Na Europa, já estão em marcha muitos projetos de adaptação para enfrentar um clima em mudança.
O
ano de 2014 será recordado em todo o continente pelos seus fenómenos meteorológicos extremos. Em maio, um ciclone de baixa pressão atingiu o sudeste da Europa, causando grandes inundações e 2 000 deslizamentos de terras na zona dos Balcãs. Depois, no início de junho, o norte da Europa foi atingido por várias chuvas torrenciais e em julho, o continente já estava a braços com outro problema: o calor. A Europa Oriental e o Reino Unido foram assolados por uma onda de calor. Tanto os fenómenos meteorológicos extremos como as alterações graduais do clima — caso da subida do nível do mar e do aquecimento dos oceanos — irão continuar. De facto, prevê-se que eles se tornem mais frequentes e intensos no futuro. Mesmo que todos os países reduzissem hoje radicalmente as suas emissões de gases com efeito de estufa, a quantidade já emitida para a atmosfera continuaria a provocar um efeito de aquecimento no clima. Para além de reduzirem substancialmente essas emissões, é necessário que os países da Europa e do resto do mundo adotem políticas e medidas de adaptação às alterações climáticas.
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As alterações do clima afetarão quase todos os aspetos da nossa vida. A maior intensidade e frequência da precipitação em muitas regiões europeias implicará a ocorrência de cheias graves e frequentes, destruindo casas e afetando outras infraestruturas (por exemplo, de transporte e de energia) nas zonas de risco. Noutras regiões da Europa, nomeadamente no sul, as temperaturas mais elevadas e a menor precipitação poderão causar secas em muitas zonas. Gerar-se-á, assim, competição entre a agricultura, a indústria e as famílias por recursos hídricos escassos, além de se multiplicarem os problemas de saúde relacionados com o calor. As alterações climáticas também irão afetar os ecossistemas de todo o continente. Muitos sectores económicos dependem da saúde e da estabilidade dos ecossistemas, bem como dos diversos produtos e serviços que estes fornecem aos seres humanos. Por exemplo, as abelhas polinizam as culturas, enquanto as florestas absorvem gases com efeito de estufa. A alteração do equilíbrio das espécies e dos habitats nos ecossistemas pode ter um impacte enorme. A redução da precipitação no sul da Europa impossibilitará certas culturas e o aumento das temperaturas permitirá a eventual migração para norte de espécies exóticas invasoras ou transmissoras de doenças. O aquecimento dos oceanos já obriga várias espécies de peixes a deslocarem-se para norte, aumentando, por sua vez, a pressão sobre o sector das pescas. Por exemplo, a migração para norte das populações de sardas agravou o problema já existente de sobrepesca do arenque e da sarda no Atlântico Nordeste.
As alterações climáticas têm custos Os fenómenos meteorológicos extremos podem causar perda de vidas e a suspensão da atividade económica e social nas zonas afetadas. A reconstrução dos imóveis e infraestruturas destruídos exige, muitas vezes, financiamentos avultados. No entanto, a maior parte dos prejuízos causados por fenómenos meteorológicos extremos nas últimas décadas não podem ser exclusivamente atribuídos às alterações climáticas. O desenvolvimento socioeconómico e as decisões de expansão das cidades para as planícies aluviais são as principais causas desses danos acrescidos, mas, se não forem adotadas medidas de adaptação, é previsível que os seus custos e os de outros efeitos negativos aumentem, à medida que o nosso clima continua a mudar. As futuras alterações climáticas poderão ter custos muito elevados. Um estudo recente estima que, sem medidas de adaptação, o número de mortes causadas pelo calor pode chegar a cerca de 200 000 por ano na Europa em 2100, e
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AMBIENTE
o custo das cheias fluviais poderá ultrapassar 10 mil milhões de euros por ano. Caso as alterações climáticas sejam muito vastas e não sejam tomadas medidas de adaptação, os incêndios florestais poderão devastar uma área de aproximadamente 800 000 hectares por ano. O número de pessoas afetadas pelas secas também poderá multiplicar-se por sete, chegando a cerca de 150 milhões por ano, e os prejuízos económicos causados pela subida do nível do mar aumentariam para mais do triplo, atingindo 42 mil milhões de euros por ano. Embora das alterações climáticas se devam esperar sobretudo custos acrescidos para a sociedade, é possível que também criem um número limitado de novas oportunidades, muitas vezes acompanhadas de novos riscos. No norte da Europa, os invernos mais quentes poderão reduzir as necessidades de aquecimento. Em contrapartida, os verões mais quentes aumentam o consumo de energia para arrefecimento. A fusão do gelo marinho permitirá a eventual abertura de novas vias no Ártico para o transporte marítimo e a consequente diminuição dos custos de transporte. Porém, um transporte marítimo mais intenso poderá expor o Ártico à poluição, devendo ser regulamentado para assegurar que seja seguro e limpo. Independentemente dos impactes previstos, sejam eles o aumento da precipitação e da temperatura, ou a diminuição da água doce, os países europeus têm de adaptar a sua paisagem rural, as suas cidades e a sua economia a um clima em mudança, e de reduzir a nossa vulnerabilidade às alterações climáticas.
O que é a «adaptação às alterações climáticas»? O termo «adaptação» abrange uma vasta gama de atividades e políticas destinadas a preparar as sociedades para um clima em mudança. Quando aplicadas, as políticas de adaptação podem reduzir os impactes e os danos materiais resultantes das alterações climáticas e preparar as sociedades para prosperarem e se desenvolverem nas novas condições existentes. Algumas destas medidas têm custos relativamente baixos, como é o caso das campanhas de informação sobre formas de nos mantermos frescos em tempo quente ou do sistema de alerta rápido para as ondas de calor. Outras medidas de adaptação podem ser muito dispendiosas, como a construção de diques e defesas costeiras (obras de construção frequentemente designadas por «medidas de adaptação cinzentas»), a deslocalização de habitações para fora das planícies aluviais ou a expansão das bacias de retenção para fazer face às secas. Algumas medidas de adaptação utilizam métodos naturais para aumentar a resiliência de determinadas zonas às alterações climáticas. Entre essas «medidas de adaptação verdes» figuram a recuperação de dunas de areia para prevenir a erosão ou a plantação de árvores nas margens dos rios para reduzir as inundações. A cidade de Nijmegenen, nos Países Baixos, aplicou medidas de adaptação verdes deste tipo. O rio Waal circunda e estreita-se em torno de Nijmegen, sujeitando esta cidade costeira a cheias. Para evitar os danos
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consequentes, a câmara municipal está a construir um canal que dará ao rio mais espaço para circular, além de criar novos espaços naturais e de lazer. O programa holandês «Construir com a Natureza» é outro exemplo de uma boa conjugação de medidas de adaptação «cinzentas» e «verdes», tendo promovido a recuperação de zonas húmidas costeiras tais como pântanos, canaviais, sapais e lodaçais. Estas zonas húmidas ajudam a prevenir o aluimento dos solos graças às estruturas radiculares das suas plantas e ao evitarem aluimentos nas zonas costeiras, protegem as áreas circundantes das inundações. Outras medidas de adaptação consistem na utilização de leis, impostos, incentivos financeiros e campanhas de informação para reforçar a resiliência às alterações climáticas (as denominadas «medidas de adaptação ligeiras»). Uma campanha de informação realizada em Saragoça, Espanha, sensibilizou os 700 000 habitantes da cidade para a necessidade de utilizarem a água com parcimónia para sobreviverem às secas prolongadas que se preveem para esta região semiárida. Associado ao controlo das fugas da rede de distribuição de água, o projeto reduziu o consumo diário de água por habitante para quase metade do registado em 1980, e o consumo total de água da cidade diminuiu 30 % desde 1995.
A adaptação na União Europeia A União Europeia e os seus Estados Membros já estão a trabalhar na adaptação às alterações climáticas. Em 2013, a Comissão Europeia adotou a comunicação «Estratégia da UE para a adaptação às alterações climáticas», que visa auxiliar os países a planearem as suas atividades neste domínio. A estratégia também promove a criação e a partilha de conhecimentos, e procura reforçar a resiliência de sectores fundamentais através da utilização de fundos da UE. Mais de 20 países europeus adotaram já estratégias de adaptação que descrevem as medidas iniciais que irão tomar (por exemplo, avaliação e investigação das vulnerabilidades) e a forma como tencionam adaptar-se a um clima em mudança. Porém, em termos de ações concretas no terreno, muitos países ainda estão numa fase muito incipiente. Um inquérito da AEA sobre as medidas de adaptação revelou que a gestão da água é o sector prioritário para a maioria dos países, embora também canalizem recursos para fornecer informação aos seus cidadãos. Por exemplo, no âmbito dos seus esforços para reduzir a propagação de doenças transmitidas por insetos, a região de Emilia Romagna tem em curso uma campanha de sensibilização para os perigos da doença de Lyme, da febre de dengue e da febre do Nilo Ocidental. Muitos países criaram plataformas online de adaptação-conhecimento para facilitar a partilha de experiências e boas práticas a nível transnacional, nacional e local. O portal Climate-ADAPT, gerido pela Agência Europeia do Ambiente e pela Comissão Europeia, constitui uma plataforma europeia de partilha de experiências.
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A não adaptação não é uma opção viável Nas últimas décadas, os fenómenos meteorológicos extremos e as políticas da UE obrigaram os países europeus a darem mais prioridade às políticas e medidas de adaptação. No entanto, segundo um inquérito recente, muitos deles estão impedidos de tomar medidas por falta de recursos como tempo, dinheiro ou tecnologia. As «incertezas quanto à amplitude das futuras alterações climáticas» e as «responsabilidades pouco claras» também foram obstáculos apontados por um grande número de países. Os efeitos das alterações climáticas variam de região para região. Os decisores políticos também têm dificuldade em incorporar alterações futuras em termos de riqueza, infraestruturas e população nos seus planos de adaptação às alterações climáticas. De que necessitará uma população cada vez mais envelhecida e urbanizada em matéria de transportes, habitação, energia, serviços de saúde, ou de simples produção alimentar, num clima em mudança? A melhor forma de implementar as medidas de adaptação é integrá-las em todas as políticas públicas, em vez de a tratar como um domínio específico. No âmbito das suas estratégias de adaptação, os Estados Membros da UE e a própria União estão a procurar uma forma de integrar as preocupações que ela suscita em domínios como a agricultura, a saúde, a energia ou os transportes. Os fenómenos meteorológicos extremos, em particular, demonstram que a não adaptação é uma decisão que sai muito cara e não constitui uma opção viável no médio a longo
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prazo. Por exemplo, é frequente as infraestruturas de transportes ficarem gravemente danificadas quando há inundações e, sempre que a circulação de pessoas, bens ou serviços é impedida, os custos indiretos para a economia podem ser várias vezes superiores aos custos diretos desses danos. É claro que, à semelhança de muitos outros projetos de infraestruturas, a adaptação das infraestruturas de transportes é extremamente cara, além de poder ser dificultada devido ao sistema de transporte envolver diferentes grupos, que vão desde os fabricantes de veículos até aos gestores da infraestrutura e aos passageiros. Uma solução economicamente vantajosa é ter em conta as medidas de adaptação na própria construção ou renovação das infraestruturas, sendo que o orçamento da UE oferece diversas oportunidades de financiamento para projetos de infraestruturas. Uma solução eficaz exige que se adote uma perspetiva mais ampla e a mais longo prazo, e que se integrem as alterações climáticas nas diversas políticas de promoção da sustentabilidade. No caso da adaptação às alterações climáticas, essa integração suscita questões sobre a forma como devemos construir as nossas cidades, transportar pessoas e produtos, abastecer de energia os nossos lares e fábricas, produzir os nossos alimentos e gerir o nosso ambiente natural. É igualmente claro que uma combinação eficaz de medidas de adaptação e de mitigação pode contribuir para limitar os futuros impactes das alterações climáticas e assegurar que, quando eles chegarem, a Europa estará mais preparada e mais resiliente.
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BICICLETAS RECLAMAM QUOTA NO TRANSPORTE URBANO. SERÁ QUE CONSEGUEM?
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té há poucos anos, o uso de bicicletas para as pessoas se deslocarem num meio urbano do nosso país, tanto nas grandes cidades como nos meios mais pequenos, nomeadamente de casa para o trabalho e vice-versa era quase desprezível. Todavia a situação veio-se alterando e hoje são já alguns, ainda poucos, a remarem contra a maré e, em vez de irem de carro para onde quer que vão, deslocam-se a pé ou vão de bicicleta. Eu sei que estou a ser optimista, uma vez que ainda são muito poucos, aqueles que entendem que a deslocação apeada ou de bicicleta não só é boa para a saúde como para o ambiente, cada vez mais carregado com gases causadores do efeito de estufa, como também para a própria economia familiar. Normalmente considerem-se como principais factores desmotivantes de andar de bicicleta a perigosidade de circular no transito automóvel, ser difícil devido à morfologia das nossas cidades – muitos altos e baixos - e, não haver infraestruturas transitárias adequadas a esse fim. Apesar de já existirem algumas ciclovias, por esse país fora, de já terem sido tomadas medidas legislativas de protecção ao ciclista, ainda falta fazer muito mais para que a bicicleta possa ocupar o lugar que vem reclamando na escala de importância no transporte urbano. Há relativamente pouco tempo registámos dois acontecimentos que nos dão alguma esperança de que o caminho vai no sentido de dar maior importância às bicicletas e consequentemente aos ciclistas bem como à criação de condições para a sua circulação: a comissária europeia dos transportes, Violeta Bulc, declarou que as bicicletas são um método oficial de transporte na União Europeia e a Câmara de Lisboa lançou um concurso lançou o concurso público internacional para a implementação na cidade de um sistema de bicicletas públicas partilhadas. Ambas as notícias são boas e por isso damos delas nota mais abaixo.
A Bicicleta e o Novo Transporte Oficial da EU A Comissária Europeia dos Transportes, Violeta Bulc, anunciou que as “bicicletas são um método oficial de transporte” na União Europeia. Bulc, que falava durante uma reunião que teve como objetivo discutir a mobilidade ciclável nos Estados- Membros da EU, revelou que este setor pode contribuir diretamente “para o crescimento e surgimento de novos modelos de negócio”. No final da reunião foram ainda aprovados sete pontos que servirão para incentivar
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a utilização da bicicleta no espaço europeu, com particular destaque para o facto de a bicicleta passar obrigatoriamente a fazer parte dos Planos de Mobilidade Urbana Sustentáveis (SUMP) sendo ainda recomendada a promoção e o aumento de redes cicláveis de âmbito nacional e internacional.
Lisboa Lança Concurso para Sistema de “Bikesharing” A Câmara Municipal de Lisboa já lançou o concurso público internacional para a implementação na cidade de um Sistema de Bicicletas Públicas Partilhadas, também designado como “Bikesharing”. O caderno de encargos já se encontra na plataforma eletrónica para a contratação pública e o anúncio de procedimentos revela que este tem um valor base de cerca de 29 milhões de euros e um prazo de resposta de 120 dias. Recorde-se que o presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, já anunciou publicamente que pretende que o sistema de bikesharing esteja disponível no verão de 2016. Um dos potenciais interessados no concurso, revelou à Transportes em Revista, que o vencedor internacional “será responsável pelo fornecimento e instalação de 1400 bicicletas e 140 estações” que estarão espalhadas em zonas estratégicas da cidade. O contrato tem a duração de oito anos e a empresa concessionária terá a seu cargo toda a manutenção e logística operacional do sistema. Relativamente aos critérios de adjudicação, o anúncio do procedimento estabelece que o vencedor será aquele que apresentar a proposta económica mais vantajosa, tendo como principais critérios o preço (50%), experiência de utilização da bicicleta (30%), componentes funcionais da bicicleta (10%), e imagem (10%). O concurso deixa em aberto a hipótese de existir um sistema 100 por cento convencional, elétrico ou misto, cabendo essa decisão ao proponente. Por outro lado, os candidatos também terão de apresentar uma solução de bilhética para acesso ao sistema, não se colocando de parte a hipótese de este ser feito através de soluções móveis, como o smartphone. Já em relação ao planeamento da rede e tarifário do sistema, este ficará a cargo da Câmara Municipal de Lisboa e da EMEL. Revista Técnica de Engenharia
CENTENÁRIO DO SOEMMM
HISTÓRIA DO SOEMMM
1935/1936 - SINISTROS NA COSTA PORTUGUESA
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o período de um ano, que separou setembro de 1935 do mês homólogo do ano seguinte, as notícias publicadas nos jornais sobre a Marinha do Comércio, ou versaram sobre sinistros, ou sobre as tentativas sindicais para manterem alguma atitude reivindicativa no novo contexto suscitado pela doutrina corporativista do Estado Novo. A 5 de setembro de 1935 surge a notícia do salvamento de setecentos passageiros do paquete «Doric», que fora abalroado pelo «Formigny», cinquenta milhas ao largo de Aveiro. O nevoeiro fora a causa do sinistro, que causara tais danos no primeiro daqueles navios, que só a tripulação permaneceu a bordo, acautelando-se a vida dos passageiros através do recurso a dois outros navios, o «Drion» e o «Vice Roy of India», que acorreram ao SOS emitido. Na época vigorava uma legislação ma-
rítima internacional, que muito convinha a quem procedesse ao salvado dos navios sinistrados, pelo que logo compareceram em torno do «Doric» alguns interessados em socorre-lo, sem que o respetivo comandante lhes pedisse auxílio, decidindo-se a prosseguir viagem até Vigo, aonde já tinham, entretanto, desembarcado os passageiros resgatados. A 15 de novembro ocorre outro acidente na Barra do Douro, que consolidava a fama de sorvedouro de embarcações e vidas. Desta feita foi o vapor de carga alemão «Ceuta», que provinha de Roterdão e esperava recolher carga em Leixões com destino a Marrocos e às Canárias. Já com piloto a bordo, o navio esperou que entrasse o «S. Miguel» dos Carregadores Açoreanos para logo lhe seguir o rumo. “A manobra é sempre bastante difícil, visto que as embarcações têm de seguir por um estreito canal em forma
de S bastante apertado, para fugirem de estibordo à ponta do enorme cabedelo, e a bombordo aos enormes pedregulhos do cais do Marégrafo da Cantadeira. Sucedeu o barco guinar para o lado de terra, largando logo um ferro de estibordo para o endireitar, e como quer que o «Ceuta» tivesse encontrado pouca água, a ré pegou-se nos referidos pedregulhos, encalhando a poucos metros de terra. Após este incidente, a maré entrou de baixar, o que dificultou, desde logo, todas as tentativas para safar o barco.” A 26 de janeiro foi notícia o «Cunene», pertencente à Companhia União Fabril, que abalroou o navio inglês «Effra», quando ambos navegavam a cerca de duas milhas a noroeste de Flamborough Head. O navio português recolheu os tripulantes do outro, que ficou seriamente danificado e passou a constituir um enorme perigo para a navegação na zona, tanto mais que o persistente nevoeiro, que cau-
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sara o sinistro, continuou a manter-se. Quando se envolveu neste acidente, o «Cunene» vinha de Roterdão e dirigia-se a Rorthshield para grandes reparações nas caldeiras, prevendo-se até a substituição das fornalhas. A 4 de maio voltaram a surgir notícias do «Orania», que tinha naufragado ao largo de Leixões um ano e meio atrás e onde prosseguiam obras de recuperação. “ Desde que aquele monstro ali se encontra e que tão graves prejuízos tem causado, já várias vezes a vida dos pobres trabalhadores que ali são ocupados têm estado em sério risco por acidentes ali ocorridos, além das doenças que diariamente contraem, devido às emanações dos ácidos e ambiências corrosivas que lhes causam gravíssimas perturbações nos órgãos mais sensíveis, especialmente na vista.” Mas, desta feita, ainda aconteceu pior: uma explosão causou a morte de um engenheiro inglês e do eletricista de bordo, um português da Foz, que solicitara uma licença sem vencimento na empresa a que estava vinculado para encontrar melhor remuneração naquele trabalho. Os jornais trazem uma pormenorizada descrição do ocorrido: “Estava combinado que, hoje pela manhã, o engenheiro, o seu ajudante que era o Levindo, e mais cinco homens descessem ao deck 5 e aí procedessem
aos trabalhos preparatórios para mais tarde ser introduzido o ar em pressão. Por qualquer circunstância apenas desceram os dois, ficando os outros muito próximo. Por causa até agora desconhecida, mas que se supõe ter sido devido a um curto-circuito, deu-se uma terrível explosão. Há quem suponha também que o desastre foi motivado por uma emanação de gases desenvolvidos pelos ácidos da carga. O pânico que se seguiu foi indescritível. O engenheiro inglês e o Levindo ficaram quase irreconhecíveis.” Nas informações recolhidas pelos jornalistas surgiram outras curiosidades: um dos feridos fora motorista de dois presidentes da República (António José de Almeida e Bernardino Machado), vendo-se então sujeito a trabalhos tão precários para garantir a sobrevivência da família. E no momento da explosão, um remador que conduzia o seu pequeno barco a vinte metros do «Orania» foi atirado ao ar com a sua violência e quase se afogou. Mas o que motivou maior revolta nos jornalistas, que se deslocaram ao local, foi a reação violenta do sr. Cox, o responsável pelos trabalhos no navio e que chegou a vias de facto com alguns deles por os querer dali afastados. A 11 de maio o vapor de carga e passageiros «Oldenburg» foi encalhar em frente a Esposende, nuns penedos conhecidos como Cavalos de Fão.
Salvos os cinco passageiros alguns tripulantes ainda procuraram salvar o navio com a ajuda da traineira «Senhora do Carmo II», mas em vão: os danos causados no casco eram tantos, que o navio foi dado como perdido. Chegava-se ao verão e os sinistros sucessivos na costa portuguesa conheceriam uma trégua. A marinha mercante continuaria a ser notícia por razões bem diferentes: a 3 de junho uma comissão de delegados das classes marítimas, integrando o do nosso Sindicato, foi recebido no gabinete do Ministro para apresentar o seu caderno reivindicativo. Nele solicitava-se “a criação das agências de colocação dos respetivos sindicatos, em conformidade com o decreto-lei nº 23 712, e a realização dos contratos coletivos de trabalho das respetivas classes, a fim de se regularem de modo conveniente e equitativo todos os assuntos relativos a soldadas, horário de trabalho, licenças anuais, previdência e assistência, etc. de harmonia com as disposições do Estatuto do Trabalho Nacional.” A maior preocupação dos representantes dos vários sindicatos era, porém, outra: “a mesma comissão patenteou também o seu justificado alarme em face da grave situação da nossa marinha mercante, que dia a dia se acentua pois é constante a redução dos seus navios que não são substituídos, além da esmagadora concorrência que no tráfego internacional está sofrendo por parte das suas similares estrangeiras, apetrechadas e amparadas para este efeito.” Essa preocupação era tanto mais fundamentada, quanto era, entretanto, conhecido um relatório assinado por Carlos Tavares a propor a fusão das principais empresas de navegação com o que isso implicaria em redução de navios e de tripulações. Jorge Rocha, Eng. Maq. M.M.
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GESTÃO/EMPREENDEDORISMO
A EFICÁCIA PESSOAL NAS RELAÇÕES COM OS OUTROS
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urante este ano, em que passámos a apresentar a versão digital do «Propulsor», temos abordado - mesmo que de forma irregular - alguns dos principais conceitos, que conduzem a uma boa negociação. Questionar-se-ão alguns: para que é que um engenheiro precisa de saber negociar? Isso não diz apenas respeito aos vendedores? Nada mais falso! Na nossa classe desempenhamos funções muito diversificadas, que se situam no topo ou nos níveis intermédios das organizações - empresas, navios, associações - a que estamos vinculados. E em todas elas somos obrigados a negociar quotidianamente, quase que arriscaria a dizer, continuamente. Se somos donos da nossa empresa estamos em permanente negociação com os clientes, com os fornecedores, com os colaboradores, com a administração pública, com os sindicatos e sabe-se lá com quem mais, que torna possível a prossecução do nosso negócio. Se somos administradores ou diretores de uma empresa por conta dos respetivos acionistas, temos todas essas diferentes entidades com quem devemos de assegurar condições para a sua boa gestão e não podemos deixar de, permanentemente estar em negociação com quem nos nomeou e a quem devemos apresentar os resul-
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Dezembro 2015 - Digital 12
tados do que produzimos. Se andamos a bordo a negociação estende-se aos nossos colaboradores na casa das máquinas, mas também às demais classes marítimas com quem às vezes o relacionamento não é dos mais fáceis. E há que contar com os superintendentes a quem estamos interligados à distância, com os peritos das seguradoras e os representantes das sociedades classificadoras, os reparadores e as autoridades portuárias dos sítios que o navio vai escalando. Até é lícito pensar que, vivendo num ambiente familiar, todos os dias, desde que nos levantamos até nos deitarmos, estamos envolvidos num permanente ambiente negocial. Quer isto dizer que a negociação não significa «combater» com os nossos interlocutores, nem implica a necessidade de criar uma atmosfera gélida (embora possa ser uma tática viável em determinadas circunstâncias). O sucesso da negociação depende da nossa capacidade de persuadir os outros. O que seria fácil se tivéssemos o raro dom de criarmos a empatia à nossa volta. No nosso círculo de amizades e conhecidos há pessoas, qua classificaríamos de «irresistíveis» por conseguirem monopolizar a atenção e contarem com pessoas dispostas a ajudá-las, a partilhar as suas ideias, a segui-las e a fazerem o que querem. Têm carisma, um dom peculiar, que não abunda no
género humano, porque a maior parte de nós vemo-nos obrigados a viver sem ele. Uma das facetas da eficácia pessoal no que diz respeito aos negociadores é a utilização de um estilo de comunicação adequado. Concretamente todos utilizamos dois estilos nas nossas comunicações quotidianas: o estilo extrovertido, que é o que utilizamos quando queremos persuadir outra pessoa a fazer algo, dando-lhe um relevante número de informações, como se a quiséssemos empurrar para que adote uma determinada postura; o estilo indutivo que é o que tenta «empurrar» o oponente para que se aproxime da nossa postura de motu próprio e faça o que queremos. Trata-se de um procedimento manipulador e mais subtil do que o anterior. Quem recorre ao estilo extrovertido: • tem sempre a última palavra; • é uma fonte inesgotável de ideias e de sugestões; • tira prazer das discussões polémicas; • não se importa de agitar os ânimos durante a interação; • exprime os seus pensamentos mais íntimos sem reparos; • costuma levar a sua avante. Esse estilo tem também o lado negativo, suscetível de diminuir a sua eficácia, especialmente nas suas manifestações mais exageradas. Quando se trata de convencer os oponentes e não só forçá-los para que façam algo, é preferível refrear um pouco essas mesmas tendências, quando se tratar de uma pessoa que: • adota uma postura agressiva para com os outros; • gosta de chamar as coisas pelo seu nome; • envolve-se por completo na discussão; • não muda de opinião, uma vez essa expressa; • não poupa críticas aos outros; Revista Técnica de Engenharia
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• coloca sempre entraves e encontra inconvenientes nas novas ideias. É o estilo que dá melhor resultado a curto prazo, quando o negociador opera a partir de uma posição de força (ou seja, quando tem a faca e o queijo na mão) e num clima competitivo. No entanto, se a relação tiver de possuir uma continuidade baseada na confiança mútua é possível que a negociação neste estilo tenha baixado o amor-próprio do oponente, que irá utilizar táticas agressivas da próxima vez, ou proferirá conceder os seus «favores» a um terceiro se aparecer a oportunidade. Algumas personagens da escola tradicional que gozam da fama de negociadores fortes, com algum carisma na sua presença pessoal, são por isso muito respeitados e costumam ter importância nas organizações muito competitivas, assim como nas negociações orientadas para a venda. No entanto, é um estilo que nem sempre suporta uma mudança para ambientes não agressivos: o negociador chega a sofrer de isolamento devido à desaprovação dos seus próprios colaboradores, dos seus diretores, dos líderes sindicais ou inclusivamente da clientela. O estilo indutivo prefere sondar as atitudes e os argumentos dos interlocutores detetando-lhes os pontos fracos. Serão estes os que devem ser explorados para conseguir atrai-los às posições pretendidas. Isso implica: • garantir que o interlocutor se sinta cómodo através de um ambiente acolhedor e amistoso; • induzi-lo a expor as suas ideias o mais aprofundadamente possível;
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• ser capaz de desenvolver essas mesmas ideias e de generalizar sobre elas; • reconhecer os méritos alheios endereçando-lhes até elogios; • evitar observações ofensivas. Todos conhecemos pessoas com este talento de de atrair os interlocutores para as suas posições. E que utilizam sabiamente as capacidades para: • ouvirem com atenção o que dizem os outros; • verificarem amiúde a perceção do que dizem; • averiguarem sobre o que estão a falar. Este estilo pressupõe a formulação de muitas perguntas «em aberto» de acordo com a conhecida fórmula: o quê, quando, quem, porquê, onde e como. Um negociador intuitivo não tem qualquer problema em reconhecer um erro, em procurar a conciliação se surgir uma exaltação e em confessar as suas próprias fraquezas. Porque todas essas capacidades servirão para obter a informação necessária para melhor conduzir a negociação. Numa lógica de ganhos mútuos (win-win) as partes tenderão a concluir das vantagens de colaborarem entre si para melhor reagirem à concorrência. Expostos os dois estilos devemos concluir que nenhum deles é perfeito e válido para todas as situações, mas um vendedor tenderá a ser extrovertido para catalisar as muitas recusas com que deparará, enquanto o negociador de um contrato avultado para
a realização de uma obra ou para a prestação de um serviço ganhará em revelar-se mais intuitivo. Quando o interlocutor é por natureza extrovertido e possui um manancial de informações, que o fazem dominar a conversa, poderá enfadar quem o ouve. O tom da voz atenderá a subir e a gerar-se um conflito potencial. Pelo contrário se se reunirem dois negociadores mais intuitivos, as perguntas poderão surgir dos dois lados, criando uma maior equidade entre quem fala e quem ouve. Na prática, os negociadores tendem a utilizar uma combinação de ambos os estilos, alternando-os de acordo com as circunstâncias. Daí que, na realidade, será judicioso praticar nos dois estilos passando de um para outro consoante a evolução da negociação. É claro que essa capacidade de flexibilizar a estratégia negocial consoante o tipo de interlocutor, ainda se torna mais pertinente se ocorre com alguém de uma cultura diferente - o Japão, por exemplo - onde os costumes e valores são muito peculiares. Existe, pois, vantagem em conhecer o interlocutor junto do qual se pretende obter alguma vantagem. Se ele já for conhecido, poderão antecipar-se muitas das suas reações e preparar os argumentos a utilizar. Por isso qualquer reunião deverá ser objeto de uma reflexão sobre as necessidades do interlocutor, estabelecendo uma espécie de agenda oculta destinada a facilitar o desiderato pretendido. Faz todo o sentido invocar aqui a conhecida pirâmide de Abraham Maslow, que hierarquizou as necessidades
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humanas no atual momento profissional: Em linhas gerais, a pirâmide das necessidades explica-se postulando que todos temos como maior prioridade as necessidades de sobreviver, dando satisfação às carências fisiológicas primárias. Uma vez que as satisfaçamos, damos importância à segurança, que passa por garantir um alojamento adequado. Essas duas prioridades são obtidas através do exercício de uma atividade que nos garanta um rendimento, mas ela será tanto melhor desempenhada quanto nos faculte prestígio e sociabilidade. O modelo piramidal sugere que nem todos alcançam essas necessidades superiores, ficando agarrados à frustração por algumas delas insatisfeitas, quiçá conformando-se com a ideia de jamais as virem a alcançar. Residem aí os pontos fracos do seu interlocutor na negociação: será natural que um “bom garfo” se mostre bem mais assertivo na negociação depois de uma refeição opípara. Ou que alguém a contas com um ego carente, consiga na negociação o reconhecimento de um sucesso por que anda permanentemente à procura. Uma manipulação semelhante seria a do negociador que prevê uma mar-
gem de cedências através das quais irá fazer crer ao interlocutor que saiu vencedor de uma árdua negociação. O local da reunião é assim um fator importante, sobretudo se se quiser criar o efeito de comodidade ao interlocutor. Quando a negociação ocorre no nosso espaço temos a garantia de um melhor controlo da situação, a possibilidade de evitar interrupções e de orquestrar pausas e a disponibilidade para a prestação de informações complementares no imediato. Pelo contrário se vamos negociar ao espaço do interlocutor há a possibilidade de se observar por onde ele se move e pode-se pressioná-lo com a
ameaça de remeter o assunto para outro nível hierárquico superior. Na opção por um terreno neutro podem-se obter algumas vantagens se se souber de antemão da assiduidade do interlocutor naquele espaço, gerando-lhe o efeito de confortabilidade pretendido É, pois, possível influenciar o rumo de uma negociação se se acautelar previamente o estilo e o cenário da negociação, se se souber algo de pertinente sobre os interlocutores, mormente ao nível das suas expetativas. Nessas condições tudo tenderá a facilitar-se para que o resultado seja o pretendido.
O CCOEMM E A SUA REVISTA “ O PROPULSOR” DESEJAM AOS: “Amigos de O Propulsor”, Colaboradores, Anunciantes e seus Leitores
Feliz Natal e Próspero Ano Novo
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INOVAÇÃO/TECNOLOGIAS
MATERIAIS NÃO-HERMITIANOS: OS SÓLIDOS QUE A LUZ NÃO VÊ
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uando uma onda de luz penetra num material, ela é alterada drasticamente pela estrutura desse material. Fenómenos como a dispersão e a difração geram uma sobreposição de ondas, o que resulta num padrão complexo de pontos mais escuros e mais claros no interior do material. Mas não precisa ser assim. A exemplo do que já vem acontecendo com os meta-materiais, que manipulam as ondas eletromagnéticas do lado de fora dos materiais, é possível também manipulá-las lá dentro, abrindo um campo de aplicações completamente novo. Konstantinos Makris e Stefan Rotter, da Universidade de Tecnologia de Viena (Áustria) descobriram uma nova solução para a equação de ondas que mostra que é possível construir materiais artificiais, com estruturas internas cuidadosamente definidas, que poderão amplificar a luz - como um laser - ou absorver localmente a luz como os óculos de sol -, suprimindo completamente fenómenos como a dispersão e a difração. Isto significa manter a mesma intensidade da luz ao longo de todo o material, fazendo-a ser tão brilhante em cada ponto do espaço como se o objeto não estivesse lá. “Quando esses processos são possíveis, temos que empregar uma descri-
O que acontece com a luz quando entra em um material comum (em cima) e como será seu comportamento no novo material (embaixo). [Imagem: TU Wien]
As ondas têm intensidade constante ao longo de todo o material - as áreas vermelhas e azuis correspondem a zonas de perda e ganho da luz. [Imagem: K. G. Makris et al. 10.1038/ncomms8257]
ção matemática da onda de luz que é bastante diferente da que usamos para os materiais normais e transparentes,” explicou o professor Stefan Rotter. “Neste caso, falamos de mídias não-hermitianas.” - o termo é
uma referência ao matemático francês Charles Hermite. Assim como os metamateriais começaram como curiosidades matemáticas, e hoje já são candidatos a usos práticos – da identificação de vozes em uma festa à invisibilidade mecânica para engenharia e arquitetura -, esses novos materiais poderão ser úteis para uma infinidade de aplicações tecnológicas na óptica em geral, e na computação e na transmissão de dados em particular. Em certo sentido, o material fica completamente invisível para a onda, que não sofre nenhuma alteração, o que permite preservar qualquer informação que ela carregue. “O princípio dos nossos materiais não-hermitianos, no entanto, é bastante diferente [dos metamateriais],” comparou Rotter. “A onda de luz não é dobrada ao redor do objeto, mas penetra nele completamente. A forma como o material influencia a onda, contudo, é totalmente cancelada por uma interação cuidadosamente ajustada de amplificação e absorção.” O grupo anunciou que já está a trabalhar no desenvolvimento dos primeiros protótipos de materiais não-hermitianos. “Com o nosso trabalho abrimos uma porta, por trás da qual esperamos encontrar uma infinidade de novos insights interessantes,” disse Konstantinos Makris.
ESTRADAS QUE CARREGAM CARROS ELÉTRICOS
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Highways England está atualmente a testar estradas capazes de carregar carros elétricos em andamento, que significa que na prática poderá estar em causa a ideia de ter de parar em estações de carregamento. Revista Técnica de Engenharia
Recorrendo a este método, os carros teriam de ter uma tecnologia sem fios e a estrada o equipamento que gerasse um campo eletromagnético. De acordo com a Highways England, o projeto será testado durante 18 meses antes de ser tomada uma decisão para mover o projeto para estradas públicas.
“As tecnologias de veículos estão a avançar a um ritmo cada vez maior e estamos comprometidos em apoiar o crescimento de veículos com emissões ultrabaixas em estradas em Inglaterra,” declarou o engenheiro responsável pelo projeto Mike Wilson.
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INOVAÇÃO/TECNOLOGIAS
AS NOVAS TINTAS ESPECIAIS
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investigação científica não para de tentar encontrar novos materiais, produtos e equipamentos que possam facilitar-nos a vida, tornando-a mais agradável e menos trabalhosa. Nesta secção temos feito menção a alguns, poucos, desses muitos materiais, produtos e equipamentos que os investigadores por esse mundo fora nos vão dando conta. Neste artigo que hoje vos apresentamos damos conta da descoberta de uma tinta especial que aplicada a um encanamento, colocado ao sol, eleva a temperatura do fluido que nele circule para um valor que é quase o dobro do que seria antes da tinta aplicada. Falamos também da descoberta de que um metal que necessite de ser trabalhado, nomeadamente cortado, se for pintado com uma tinta comum passa a exigir apenas cerca de metade da energia que seria necessária para realizar o trabalho sem a pintura.
O Corte de um metal será mais fácil se o mesmo for pintado Engenheiros da Universidade Purdue, nos EUA, descobriram um tipo de deformação desconhecida até agora,
que ocorre nos metais quando eles são submetidos a stress, o que inclui operações de dobra e corte. O fenómeno, batizado de fluxo sinuoso, foi descoberto usando microfotografias de alta velocidade e simulações computadorizadas. Ao ser cortado, o metal deforma-se em dobras, contrariando as teorias anteriores, que afirmavam que o metal se cisalharia uniformemente - as dobras lembram as que ocorrem no mel sendo derramado em uma vasilha. “Quando o metal se rompe durante um processo de corte, ele forma essas dobras finamente espaçadas, que pudemos ver pela primeira vez somente por causa da observação direta em tempo real,” disse o professor Ho Yeung. A boa notícia é que a observação permitiu descobrir uma forma de evitar as dobraduras no metal. E a supressão desse fenómeno poderá aumentar a eficiência de todos os processos de trabalhar metais, do corte de chapas ao processamento em oficina, nomeadamente trabalho de torno. Além da melhor qualidade do processamento, haverá um ganho substancial no consumo de energia, uma redução drástica na força que deve ser
aplicada às peças e um menor tempo de processamento. As experiências mostraram que a força de corte - a força aplicada por uma prensa, por exemplo - pode ser reduzida em 50% simplesmente pintando a superfície metálica com uma tinta comum, o que, por razões ainda desconhecidas, suprime o fenómeno do fluxo sinuoso. Mais estranho ainda, a pintura deve ser feita não na superfície que está sendo trabalhada, mas no verso dela, no outro lado da chapa. “Isto pode soar estranho, até mesmo ridículo, para as pessoas da área, porque o corte não está acontecendo na superfície pintada, ele está ocorrendo a uma certa profundidade abaixo,” comentou o professor Koushik Viswanathan. Mas o importante é que funciona. Para tirar a prova, a equipa pintou apenas metade de uma chapa: quando a ferramenta de corte chegou à porção pintada, a força aplicada caiu imediatamente para a metade. A equipa afirma que poderá haver muitos ganhos adicionais quando o fluxo sinuoso for completamente compreendido - assim como sua supressão quase por mágica -, alcançando praticamente toda a indústria metalomecânica.
O fluxo sinuoso aparece destacado na imagem à esquerda. À direita, a redução repentina da força necessária ao corte quando a ferramenta chega à área pintada. [Imagem: Ho Yeung/Koushik Viswanathan/Purdue University]
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Tinta aquece água a 68ºc com energia solar Enquanto você ainda não consegue comprar um aquecedor instantâneo de água na loja mais próxima, talvez se possa ir safando com uma tinta que funciona como um aquecedor solar. A tinta eleva a temperatura da água a até 68º C, e custa 40% menos do que as tintas convencionais. A equipa demonstrou o desempenho da tinta trabalhando com um cano que, exposto ao Sol, alcançava uma temperatura de 40º C. “Se nós adicionarmos a tinta ‘supercondutora’ a temperatura aumenta 70% e alcança 68º C,” confirma Sandra Casillas Bolaños, do Instituto Tecnológico da Lagoa (ITL), no México. Ela explica que a tinta funciona como uma caldeira graças a nanopartículas ativadas pela energia solar, gerando o aumento da temperatura. O material básico da tinta é formado por três camadas. A primeira é uma nanopartícula magnética de titânio, responsável por aprisionar o calor. A segunda camada consiste em um revestimento
A tinta está em processo de patenteamento, e a equipe estima que ela poderá ser comercializada ao equivalente a US$40 por litro.[Imagem: Invdes/Divulgação]
de tungstênio, que os investigadores transformaram num nanossal com álcool polivinílico. Finalmente, a camada mais externa é feita com cobre. Um tratamento especial escurece o cobre, formando uma armadilha para reter o calor dentro das partículas. “Assim, o centro é aquecido mais intensamente: primeiro o titânio, em seguida, o tungstênio e, finalmente, o cobre,” explica Bolaños. A tinta foi aplicada na superfície de canos convencionais usados em sistemas
de aquecimento de água domésticos e foi testada para aquecer a piscina de um ginásio desportivo, onde dois milhões de metros cúbicos de água foram aquecidos de 26 para 37º C. A tinta está em processo de patenteamento, e a equipa estima que ela poderá ser comercializada ao equivalente a US$40 por litro, sendo necessário apenas um quarto de litro para cobrir os canos de um sistema de aquecimento doméstico, segundo Bolaños.
Corpos Gerentes e Funcionários do SOEMMM desejam aos Sócios e respectivas Famílias
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MATERIAL MAIS PRETO JÁ FEITO PELO HOMEM
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ma equipa da Universidade Rei Abdulla, na Arábia Saudita, desenvolveu o material mais preto já criado pelo homem. Curiosamente, eles foram buscar inspiração a um besouro quase perfeitamente branco - tanto que ele já inspirou a criação de papéis e tintas mais brancos. Os pesquisadores observaram que as escamas do besouro Cyphochilus formam um cristal fotónico, uma estrutura que reflete a luz de forma muito eficiente. Eles então inverteram a estrutura e usaram a ideia de captação de energia caótica para criar um material extremamente preto. Para inverter o que acontece na carapaça do besouro, Jianfeng Huang e seus colegas usaram nanotubos de carbono. O elemento básico do material é uma partícula formada por um
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Materiais de alta absorção óptica são importantes em diversas áreas, incluindo as células solares. [Imagem: Jianfeng Huang et al. - 10.1038/nnano.2015.228]
nanotubo apoiado numa esfera de apenas 30 nanômetros de diâmetro. O material resultante absorve entre 98 e 99% de toda a luz incidente na faixa de comprimentos de onda de 400 a 1.400 nanometros - o olho humano consegue captar a luz entre 390 e 700 nanometros. Para comparação, isto significa que o novo material absorve 26% mais luz do que qualquer outro material conhecido. O que é mais interessante para aplicações práticas é que essa absorção
funciona para todos os ângulos de incidência e para qualquer polarização da luz. A equipa destaca que, embora seja impossível criar um preto perfeito, capaz de absorver toda a energia que incidir sobre ele, passos nesse sentido são importantes porque esses materiais podem ajudar na criação de dispositivos melhores ou mais eficientes, de coletores solares a interconexões ópticas.
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