APERTAR O BOTÃO DA CAMERA, BASTA? João Luís van Tilburg
Algum as preliminares • Profissional "versus" não-profissional Há alguns anos, quando entidades de educação, sindicatos e associações de moradores começaram a produzir conjuntos de slides para uma maior politização do Movimento Popular, um profissional da área de comunicação afirmou:"Quandoalguém precisa sofrer uma intervenção cirúrgica, procura um médico competente, e não seu vizinho formado em Direito. Agora, todo mundo pensa que entende de comunicação e pode produzir o que bem entender." Por trás desse desabafo está, parece-me, escamoteada a ideologia profissional que exige para o exercício da profissão o diploma universitário, além do registro no respectivo órgão. Portanto, o desabafo não é algo tão fora de propósito assim, por visar à reserva de mercado de trabalho. Todavia, também está presente uma preocupação militante com a qualidade das produções simbólicas1 (vídeo, filme, audiovisual, jornalzinho, cartilha, etc.) produzidas, seja por sindicatos com1 Uso o concei.to " produção simbólica" por seu conteúdo fazer referência ao real; um vídeo, por exemplo, não é "o real" em virtude do enquadramento de um objeto pela imagem, que nega o que está fora dela.
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bativos, seja por entidades de Educação Popular. Essa preocupação, portanto, é extremamente legítima e exemplo há de sobra a sustentar esse desabafo. Não tenho notícias, para citar um exemplo, de que sindicalistas ou associados de uma associação de bairro reclamaram junto às suas d iretorias o atraso de seu bolet im ou jornal mensal, salvo em casos de greve e grandes man ifestações, situações atípicas que confirmam a reg ra, pois no dia-a-d ia do sindicato, da associação, · a procura do boletim ou jornal é praticamente nula . Ex iste, portanto, uma oferta sem procura . Produz-se algo sem estar garantido o consumo. Ev1uentemente, há várias expl icações para esse tipo de fenômeno. Entretanto, quero chamar a atenção para o seguinte fato: sobretudo os numeri camente grandes sindicatos, federações de associações de bairro e entidades de Educação Popular contrataram prufissionais da área de comunicação - portanto, pessoas com diploma, registro, e tudo o mais - para tratar dos boletins e jornais. Também nesse caso, existe a defasagem entre a produção e a procura. Conforme a lógica, a questão também não parece ser "o" profissional.