Edição 53, maio / 1992

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1985; V. R . Loureiro, Os parceiros do mar: natureza e conflito na pesca da Amazônia, Belém, Museu Paraense Emílio

Os pescadores artesanais e a questão ambiental

• Antonio Carlos Diegues*

Os pescadores artesanais, espalhados pelos inúmeros rios, lagos, lagoas e pelo litoral brasileiro são diretamente afetados pela crescente degradação ambiental dos ecossistemas de cujos recursos retiram sua subsistência. A poluição desses ambientes aquáticos apresenta uma intensidade cada vez maior, particularmente a partir da década de 60, com a urbanização e industrialização do litoral . Efetivamente, até aquela década, a produção dos pequenos produtores litorâneos e fluviais representava cerca de 50% do total de pescado capturado no Brasil Aquele setor era portanto responsável por uma parte considerável da proteína consumida nos meios urbanos e rurais costeiros, e era uma fonte importante de emprego e renda para as populações locais. Inúmeros fatores foram responsáveis pela crescente desorgani zação das comu- ~

brepesca de espécies também capturadas pelos pescadores artesanais, como a lagosta. o camarão, a piramutaba (A. C. Diegues, Pescadores, camponeses, trabalhadoresdo mar, S.Paulo, Ática, 1983).

nidades litorâneas e fluviais, ir-;;

em várias regiões do Brasil, ~ • bem como pelo decréscimo da 0 produção gerada pelas --...ai unidades familiares dos pescadores artesanais. A ênfase dada à pesca industrial, através de maciços incentivos fiscais, levo u à criação de inúmeras empresas de pesca, responsáveis pela so-

• Coordenador do Programa de Áreas Úmidas no Brasil e professor da Esalq-USP.

proposta nQ 53 maio 1992

Apesar de sua importante contribuição ao setor pesqueiro, os pescadores artesanais foram quase inteiramente alijados desse processo de modernização, cujos efeitos perversos já foram analisados, por vários pesquisadores (ver Diegues, op. cit., 1983; A. F. B. Melo, A pesca sob o capital.Belém, Editora UFPa.

Goeldi/UFPa, 1985 ). A competição desigual dos grandes arrastões e parelhas não só acarretou um empobrecimento biológico das águas, como também das comunidades humanas que viviam de sua captura. No entanto, apesar do desastre que continua sendo provocado pelos grandes barcos da pesca empresarial, que freqüentemente resulta na destruição das pequenas redes e equipamentos dos pequenos pescadores artesanais, a rápida degradação dos habitats dos peixes parece ser boje o maior fator do empobrecimento das comunidades litorâneas. A especulação imobiliária tem sido a maior causa da destruição da impor- · tante vegetação de mangue em importantes áreas de reprodução de espécies de pescado, como a Bafa de Guanabara, a Baía de Todos os Santos, na Bafa de São José e São Marcos, e em inúmeros estuários do Nordeste e Sudeste do país. Mangues têm sido cortados para a implantação de complexos urbanísticos que privilegiam a classe média e a burguesia, como ocorreu na Coroa do Meio, em Aracaju, Sergipe. Inicialmente as comunidades de catadores de caranguejos ali residentes foram deslocados e o mangue totalmente cortado, o que provocou a invasão das águas do mar destruindo ruas e ameaçando as próprias construções. Importantes restingas e praias foram loteadas à exaustão, pondo em risco a própria existência desses importantes ecossistemas, como ocorreu na Ilha Comprida, em São Paulo. Além disso, inúmeras ilhas foram e estão sendo privatizadas como áreas de lazer e marinas, das quais foram afastados os pescadores artesanais. Além disso, portos e grandes complexos químicos e petroqufmicos foram instalados em ecossistemas de grande produtividade biológica e de grande valor cênico e turístico, como ocorreu na Lagoa Mundau e Manguaba, em Alagoas, na zona estuária de Suape, em Per31

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