Edição 55, novembro / 1992

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Violência e marginalidade no complexo sucroalcooleiro: Alagoas e o Nordeste

Geovani Jacó de Freitas*

A construção da cidadania dos trabalhadores do complexo sucroalcooleiro do Nordeste tem nas lutas sociais de Alagoas um caso extremamente importante para análise, reflexão e ação educativa. O Estado de Alagoas continua dominado por oligarquias ligadas ao governo central que procuram perpetuar a apropriação privada dos fundos públicos e a total dominação política dos marginalizados, impondo-se pela violência. Para as entidades sindicais e as organizações não-governamentais, a democracia formal ainda é uma conquista a ser assegurada no mundo oligárquico dos canaviais alagoanos e nordestinos. Novas estratégias começam a ser formuladas pelos atores populares da sociedade civil, colocando . -., a questão do combate à v1- ~ olência e da luta pelos direitos humanos como indispensáveis à melhoria das condições econômico-sociais dos trabalhadores.

• Sociólogo, mestrando em Sociologia Rural na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), técnico da Equipe da FASE em Maceió (AL) e membro do Núcleo de Políticas Públicas e Poder Local da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Colaboraram na elaboração do artigo Orlando Falcão, coordenador regional Nordeste da FASE, e Josefa Alves Lopes de Barros, membro da Equipe da FASE em Maceió.

proposta niiSS novembro 1992

Salvando os privilegiados Desde a década de 1970, o setor sucroalcooleiro tem conhecido um acelerado processo jamais visto de con-

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centração e acumulação de capital, com apoio intensivo do Estado. Os impactos, processados ao longo destas últimas décadas, não só permitiram ao complexo agroindustrial canavieiro incorporar inovações tecnológicas e melhoria do processo de produção agrícola e industrial, como representou o próprio reordenamento do capital no setor, com a expansão das atividades agroindustriaisda cana para os

tabuleiros costeiros de todo o complexo canavieiro do Nordeste (SE, AL, PE, PB e RN), antes considerado tecnicamente inviável para a lavoura canavieira. Além desse aspecto, é importante observar que as áreas de atividade canavieira têm se expandido para o Centro-Oeste brasileiro e também para as áreas do Vale do Rio São Francisco. Esse reordenamento trouxe um novo mapa ao perfil do setor no Nordeste, configurado boje em dois segmentos: os mais descapitalizados -aqueles tradicionalmente produtores, situados na Zona da Mata, caracteristicamente de solos irregulares e com poucas possibilidades de incorporação de tecnologias modernas; e se tores modernos, situados nos tabuleiros costeiros, onde as inovações tecnológicas vieram para ficar, pela própria capacidade física da região adequada à mecanização e quimificação do processo produtivo, boje tendo, ao sul de Alagoas, o setor de ponta do complexo. Todo este processo de descapitalização de um segmento do setor, simultâneo a um processo de deslocamento e concentração de capital para um segmento de ponta, é o que podemos categorizar como a crise/reestruturação do complexo agroindustrial canavieiro. Este processo estratégico do capital tem configurado reações combinadas dos dois setores que, em bloco, têm pressionado o governo por recursos públicos para sua auto-sustentação, engendrando-se disto o já conhecido "discurso da crise canavieira", que, na verdade, termina por colocar a sociedade, através do governo central, financiando tanto o processo de reestruturação quanto a sobrevida dos setores tecnologicamente inviáveis para os novos padrões da modernização. Tudo isso representa uma tentativa de perpetuar.a "modernização conservadora". O exemplo dessa rapinagem foi o acordo fmnado entre o setor e o governo Collor, no primeiro semestre de 1992, que culminou com a liberação, pelo Banco do Brasil, de recursos na ordem de 31


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