Suplemento, abril / 1984

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fase .


proposta -

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SISTEfvlATIZACAO , E ANALISES DE EXPERIENCIAS EM EDUCACAO , POPULAR

SUPLEMENTO SOBRE A SECA ABRIL/84

Edito ria 1

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Entrevistas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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Pronunciamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . • . . . . . . . . . • • .

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Documentos . • . . . . . .. . . . • • . . . . . . . • . . . • . . . . . . • • . . . . . . . . . . .

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Denúncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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Apresentação

PROPOSTA - Publicação de circulação interna da FASE-Federação de Orgãos para Assistência Social e Educacional Coordenador Nacional: Jorge Eduardo Saavedra Durão Coordenador Nacional Adjunto: Jean Pierre Leroy Secretária de Redação: Zilêa Reznik Equipe responsãvel:FASE/Fortaleza Capa: Reprodução do cartaz feito por Audifax para o "Ato Pu blico em Apoio as Vitimas da Seca 11 promovido pela Frente Sindical no dia 02/10/83 em Caninde-CE Impressão: Luiz Carlos de Souza


EDITORIAL

A violência da catástrofe não poderia deixar as equipes da FASE Nordeste sem um estudo sobre as causas e efeitos das periódicas secas que assolam a região. A amplitude do problema obrigava a que se fizesse uma coleta de dados e de informações a respeito,de modo que os leitores da Proposta e o próprio corpo 9e técnicos da instituição em todo o Pais pudessem, mais abalizadamente, refletir sobre o tema, e, com mais segurança, ex trair-lhes as conclusões. Foi assim que surgiu a ideia de um Suplemento ~special assumido pelo próprio Regional Nordeste, que, nao obstante viabilizado através da equipe de Fortaleza, refle tisse, na realidade, o pensamento de todas as equipes.No prelo da Revista, surgiram as primeiras copiosas chu vas, pouco a pouco caracterizando a estação invernosa. r com ela, a perspectiva de alguma produção de alimentos ja que a ausência simultânea de semente e de credito, impede que se configu re uma safra representativa do potencial agricola nordestino. A falta de terras, por sua vez, impede a democratização da pequena produção colhida, em desfavor, evidentemente das camadas rurais que dela mais necessitam. Não obstante, o assunto permanece de profundo interesse, ate porque nem de longe foram atacadas as causas ou mesmo os efeitos das secas, razão porque restou no Nordeste, agora de forma agravada, a continuidade da situa ção anterior. Espera, portanto, a Fase Nordeste, que tenha de alguma forma colaborado para a discussão do tema. Por isso sen te realizado seu objetivo.



VOZES DA SECA

Seu doutô os nordestinos tem muita gratidão pelo aux1lio dos sulistas nessa seca do sertão mas doutô uma esmola para um homem que é são ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão

B por isso que pedimo proteção a vosmicê home por nós escuido para as réidas do podê pois doutô dos 20 estado temos 8 sem chovêr veja bem quase a metade do Brasil tá sem comê.

Dê serviço a nosso povo encha o rio de barrage dê comida a preço bom não esqueça a açudage livre assim nós da esmola que no fim dessa estiage lhe pagamo até os juro sem gastar nossa corage.

Se o doutô fizer assim salva o povo do sertão se um dia a chuva vim que riqueza para a nação nunca mais nós pensa em seca vai dá tudo nesse chão cuma vê nosso destino mincê tem na vossa mão.



t

APRESENTACAO • NORDESTE SECO APONTAME NTOS DE SOLUÇOES A seca nordestina é, hoje, um assunto definiti vamente co!ocado 11a mesa de discussão do povo brasileiro. Tema de segu nda categoria até bem pouco, apresenta-se hoje, como o mais discutido e polémico fato da atualidade de no5so país, mesmo tendo que competir com outros igualmente gra ves, como a dívida ext erna, a recessão, o desemprego, a carestia, a legislação salarial, etc . etc. • Efetivamente o problema é por demais grave para passar desapercebido. Afinal, trata-se de uma imensa região o nde vi vem milhões de b;asileiros, os q uais por mais segregados que sejam não passam mais sem ser notados. E que a intensidade de sua dor recebeu a dimensâ'o de grave tragédia humana, imposs ível de ser absorvida com indiferença pelos demais povos. Basta que se diga que de cada 1.000 crianças que nascem na região, 250 morrem logo no primeiro ano de vida, enquanto q ue gra nde parte das sobreviventes f icam com lesões cerebrais irreversíveis. Sendo que no próximo ano o problema se agravará profundamente, devendo, segundo recente denúncia formulada por uma alta autoridade eclesiástica local, morrer--~- milhões de pessoas em todo o Nordeste, certamente um dos mais graves fatos da história contemporânea. Problema cíclico, a história tem demonstrado que a cada período a seca se apresenta com maior amplitude e rigor, destruindo cada vez mais intensamente o pouco que a natureza consegue restabelecer no per iodo verde imediatamente anterior. O fenômeno em sua edição atual foi bastante agravado pela semiparalisia econômica imposta pelo governo ao pa ís e especial mente ao próprio Nordeste, estagnado pela recessão e pelo desemprego generalizado, que obrigam as populações rurais a partir em busca de sobrevivên· cia nos grandes centros, hoje, todos eles sitiados pelas imensas. e miseráveis aglomerações humanas que ~s circundam. Porém, o que realmente deve ser feito para livrar o Nordeste do flagelo da Seca e de suas conseqüências? Qual a influência da organização fund iária no agravamento do problema? Os projetos oficiais têm consegu ido resolver a questão? A indústri<t da seca existe? Quais as reivin· dicações dos t rabalhadores rurais e de seu movi mento sindical? Essas preocupações estão, evidentemente, em todas as cabeças desse imenso país. E para ajudá-las a compreender o assu nto, a equipe FASE-Fortaleza tomou a iniciativa de preparar os presentes apontamentos, il ust rando seu trabalho com depoimentos de alguns protagonistas desse angustiante problema, entre eles, al g u n~ técnicos de reconhecida competência, representantes de associações prvússio nais, líderes sindi.'::ais e comunitários, parlamentares e autoridades eclesiais, todas contribu indo com sua visão para a discussão e resolução do problema. FALTA AGUA NO NO RDESTE? Muitos analisam a fo me nordwstina como conseqüência pura e simples da irregularidade pluviométrica. Para esses a situação não terá soluçâ'o, a não ser que a Providência Divina resolva revogar suas determinações de ma nte1· em eterno castigo os simplórios e crentes habitantes do lugar. Or::1, é evidente que não decorre unicamente da falta de chuvas, a fome nordestina, embora a seca agrave o problema, pois dimin ue ou faz cessar a produçao de alimentos, especialmente nos ciclos mais prolongados. Mas não somente aí reside o problema, pois se assim o fosse, não sentiriam fome as massas marginalizadas das demais regiões do país, onde o equilíbrio ecológico permite a queda regular das chuvas, e, em conseqüência, o desenvolvimento normal das ati· vidades agrícolas e pecuárias nas diversas estações do ano. Ao contrário, a fome resulta basicamente da ausência de um programa conven iente de combate às secas, entendido este como todo um conjunto de medidas agrárias, educacionais e econômicas de grande envergadura, capazes de atacar todos os angulos desse crôn ico problema. Efetivamente nunca houve, da parte das autoridades e das forças políticas que tem gover· nado o pa(s, a determinaçâ'o de resolver a situação, pois o caráter desse tipo e volume de investimento pressupõe que ele seja governado sob a ótica dos interesses nacionais e populares, o que evidentemente não é o caso. Encravado em país com regime político voltado prioritariamente para a manutençao dos interesses capitalistas, o nordest e teria necessariamente que se visto como o "primo pobre", em quem ninguém acredita e quer investir. Afinal1 muito mais seguro e lucrativo é o investimento em áreas de grande consumo, que no caso brasileiro correspondem ãs regiões com normalidade pluviométrica e com desempenho agrícola de retorno garantido. Onde a lucratividade seja progra-

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mada cientificamente e garantida pelos amplos recur:;os da mecaniz&ção e da automação, e conferida pelos sofisticados esquemas de micro e da macro-elstrônica. Com efeito, ao capitalista tanto faz produzir mJn'i:eiga no norte como canhões no sul, pois o seu único móvel é o lucro. Assim também na agricultura,como na pecuária ou em outra atividade mercantilista. O Nordeste, porém, nãu pode ser analisndo so b essa ótica, senão ::~través de determinação política de fundo social e humano, so m.:mtc e~ec; ·~ ívnl err. sist ema de governo comprometido com os interesses da população, aq:Jeles não dependentes das teorias econômicas que se centram na acumulação de capital. O investimento n::. região exig3 d~dsão baseada sobretudo na respon· sabilidade social e h umana, desprovida de interesses econômicos ind ividuais e imediatistas. Por outro lado, também r: '::o é v ,rdadeira a assertiva de que não há água na região nordestina. E certo que o ideal scri::J uma mécliz. d::: prtõ.cipitações mais elevé!das, mais esse m!o é o proble· ma, pois em tempos normais os invernos (época das chuvas ) são fa1·tos e as colheitas adequadas. No Ceará, por exempl o, chove em média 110 bi:hões de metros cúbicos por ano, ou 720 milfmetros em média, sendo que em Fortaleza , essa médiü é de 1.100 milímetros, em invernos normais. Dos 110 bilhõ es de mcltros cúbicc.s que caem 12;panas í6 bi lhões ficam armazenados, sendo 15 bilhões à su perfície e 1 bilhão, no lenpl subt errâneo, pela transpiração das árvores e pelo sugament o das f)hmtas , ou , ainda, pelo desperdício levé:do para o mar. Deve-se, segundo os t écnicos, procurar a rmazonar de 30 a 40 bilhões de metros cúbicos à superfície , para que se possa efetivamente suprir o Estado em suas necessidades de irrigar 600.000 hectares de terras, quando atualme nte irrigamos apenas 20.000 hectares. Quer dit:er, mesmo com a defasag_m pluvio métr ica no:-mal , não haveria maiores preju ízos, se as águas caídas fossem rigorosamente aproveit&das, e não rolassem inutilmente até a foz dos rios, perdendo -se no oceano. No Nordeste, por sua vez , cs-;:udos do r rojeto Radan indicaram a existência de reservas dágua na região pesqu isada (67% uo C;1amado Po ígo no rias Secas) de 200 trilhões de metros cúbicos por ano, sendo 74 t ri!hões ~m superfície e 126 em lençóis subterrâneos. Esse if!le.~_so potePciat mostra-se suficiente pa!'a manter em regime de produção normal (duas e até três safras/a no} milhões de hectares de terms úmidas dos vales dos grandes e pequenos rios, ou das chapadas e maci..;os serranos, _ estes ú!timos, segundo o mesmo estudo do Projeto Radan, mais férteis do que os melh ores solos vermelhus do Estado do Paraná (somente na região do Cariri-Ce são SOO mil hectares). Tudo isso, uma vez ccilvanientemente aproveitado permitiria o aproveitamento da mãode-obra de m i lhõe~. de t1a baa.<:clores, alim~nta; ia a economia regional , e, a inda, restauraria o equi· líbrio ecológico capaz ele fazf:r r&prodc:it a n~1turez:a e manter íntegras as condições naturais de reprodução humana e animal. Mas o que se vê são as rescrvê.> dág\..i~ senco u iliz;::das exclusivamente em benefício de poucos, e, no caso da pcrenizaçfc de alguns ríos, as águas que r.í correm (provenientes de grandes reservatórios) o fazem inutilrr.~nte, sem qua!Guer <:proveitamento . Para se ter uma idéia, de toda a água liberada pelo açude Orós (o mai o r do nordeste) para a perenízação do Rio Jaguaribe, apenas 3% é aproveitada ern irrig2ção, rolando , as 97% restantes.até o mar, onde criminosamente se perdem. O mesmo se dá com as águas dos rios perenes, como o São Francisco e o Parnaíba, especialmente este último . Como é fácil notar, o problema não resulta propriamente da a usência de água, que caem suficientemente, e podem ser represadas. No Ceará, por exemplo, a construção de mais seis grandes açudes e de 24 médios, conseguiria armazenar toda a água necessária às atividades agrícolas. E tudo isso, segundo o Dr . lpérides Macedo, Vice-Presidente da Associaçao Brasileira de Recursos Hídricos. poderia ser imp lantado com apenas 220 bi lhões de cruzeiros, 120 bilhões a menos do que o governo gastou até hoje com as obras dos chamados "bolsões da seca'· . Não obstante, a água represada não é colocada à disposição da população que dela necessita. Não há programas de irrigação, e quando os há, a eles não tem acesso o trabalhador rural, que não dispõe de terra para o p lantio. E mesmo aqueles que tem as terras, quando pequenos ou médios p roprietários , não podem fazê -las desenvolver, pois não têm acesso aos programas de crédito tão largamente propagandeadas pelo govern o. Assim, nota-se que a combinação terra -água-crédito é fu ndamental para que se possa resolver o problema. A terra , diga-se, em condições efeti vas de trabalho de bons resultados, isto é, aquela cuja produção não tenha que ser comercial izada a preços vis, terra livre da sanh~ dos grileiros e dos grandes proprietários, terra onde se possa desenvolve~ uma a~ricultura. li~re dos insu mos caríssimos, onde a comer:::ialização dos produtos seja protegtda dos mterme~tános e especuladores, terra para cujo trato e produção sejam destinados amplos e desbur~crattzados programas de crédito a juros mín imos, condições sem as quais não será possível produztr.

Pro esta 2


A POLfTfCA DOS GOVE RNOS PARA O NORDESTE Ao lon.go dos tempos os governos vêm sonegando uma resposta efetiva aos problemas do

N~r~este, particularmente a ques!ã'o "seca". No início do século foi criado o primeiro organismo

oftctal para o chamado combate as secas, posteriormente transformado em Departamento Nacional de Obras Contra as Secas - DNOCS. E~e órgão dipô~-se a implantar uma rede até significativa de agudagem, embora no pres~nte.pe~IOdo sec~ não tenha executado praticamente nenhuma obra de wlto, como se seus objetlvos Já ttvessem stdo alcançados. O ~roblema é. que o açude em si nã'o significa nada, senâ'o que tem ele que ser parte de . proJeto ma•.s amplo, 1sto é, para. que suas águas sejam aproveitadas por toda a regiã'o onde o mesmo se s1tua, .sob a forma de 1r~1gaçâ'o. No caso da açudagem nordestina, toda ela éf_gjta sem qualquer aprove 1t~mento de suas aguas, nem pelas populações que ficam às suas margens, nem ~r aqueles que ftcam às margens dos rios que perenizam (caso já mencionado do Rio Jaguaribe): São obras soltas no tempo e no espaço, sem qualquer função social. O DNOCS, em realidade, jamais poderia resolver o problema da seca, com a concepçâ'o s~b .a qual foi cria~ o •. isto é, sem competência institucional para promover a reestruturação fun~lárta nas áreas atmgtdas pelas águas que acumula, bem assim . naquelas terras às margens dos ~tos que ~o~na perenes. Apenas em alguns poucos milhares de hectares conseguiu implantar proJetas de tmgaçao onde obteve resultados razoavelmente aceitáveis, mas mesmo assim, submeten~o ~us c:olonos a violento regime de submissâ'o, de tal maneira que há, entre eles, profunda msat1sfaçao. ~lém ~e carecer de competência institucional, também não dispõe essa autarquia de recursos fmance1ros adequados para obra de maior envergadura, e, seus dirigentes não possuem qualquer autonomia para ·exigir-lhe um redimensionamento de propósitos. Bem ao nível dos órgãos públ icos componentes de um sistema autoritário de governo. Mais recentemente implantou-se a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste _.. SUDENE, que nâ'o obstante pretender por em marcha o desenvolvimento da região, naufragou totalmente, esprimida de um lado pela superveniencia de uma política de esvaziamento implantada pelos governos pós-64, e do outro pela difícil contradiçâ'o de ter que promover o desenvolviment o capitalista em região que não prescinde de investimentos de cunho eninente· mente social, e por isso mesmo de elevados custos econômico-financeiros. E tais empreendimen· tos, como é óbvio, somente são enfrentados por governos voltados priorita.riamente para os interesses das camadas populares. Assim é que a SUDENE não foi além de dar alguma organicidade e uniformidade aos investimentos carreados para a região, a partir princípalmente dos benefícios fiscais ofertados, gerindo-lhes as aplicações, determinadas, ressalte-se) nâ'o por força de uma política de planejamento industrial, agrícola e pecuária globalmente traçada e objeto de implantação centralizada, mas sim, ditadas pelas solic itações individuais dos grupos econômicos com interesses não necessariamente iguais aos da população local Especificamente na agropecuária1 os investimentos além de ínfimos vieram todos i em re· forço da estrutura fundiária e de dominação existente1 nem de longe atendendo aos anseios do conjunto das populações rurais. Por esta razão, até mesmo o incipiente progresso obtido pelas camadas médias e de trabalhadores das grandes cidades (onde se localizaram a grande maioria dos investimentos carreados para a região), como emprego fixo e algum acesso ao consumo, sequer chegou a ser sentido pelas massas trabalhadoras do campo, principalmente nas zonas do agreste e sertão, onde as relações de produção continuam sob regimes feudais de parceria agrícola e/ou pecuária. · Esse progresso nã'o só passou ao largo das populações rurais como um certo sentido lhes prejudicou, pois se obrigou ao uso de produtos industrializados de valores caríssimos, se comparados com os baixissimos preços dos produtos agrícolas que produzem. Afora esses, nenhum outro planejamento existe com a preocupaçâ'o de resgatar o Nor· deste da ~!Naçâ'o de abandono em que se encontra, isto é, para dotá-lo de infra-estrutura que lhe permita enfrentar sem grandes traumas as conseqü§ncias das estiagens periódicas, especialmente quando prolongadas. Assim, não obstante ser uma regiao viável, inclusive rica em minerais (se fosse um país seria membro da OPEP), seus dirigentes vivem a peregrinar pelos gabinetes dos segundos e terceiros escalões do governo federal, com pires na mão, à procura de quem se apiede do nordeste humilhado, sujeito até mesmo à caridade pública, como se seu povo, outrora valoroso e empreendedor, hoje fosse constituído de pobres e inúteis idiotas. O Programa de Emergência, inicialmente, e, agora o Programa Bolsões da Seca, não chegam propriamente a ser destinados a resolver a questão da "seca", mas tão somente servem de arremedo para enfrentar-lhe as violentas conseqüências. Através desses programas, os trabalhadores foram utilizados para a realização de benfeitorias nas propriedades particulares onde já trabalhavam, tudo por conta dos cofres públicos. E o governo, pagando um escorchante salário

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(atualmente Cr~ ! 5.200,00 pe r mêsi, mant eve o povo desmobilizado para a prát ica de atos de revolta, como seria natural er ca~os de extrema gravidade como o que ora se atravessa . · Assim, continua a região absolutamente sujeita aos mesmos sofrimentos e vexames quando do próximo ciclo de estiagem. Não obstante1 o governo mantem -se em pé, devidamente apoiado pela classe dominante local, cujas propriedades foram altamente valorizadas às custas do suor e da fome dos trabalhadores rurais, e dos dinheiros públicos . Nesse quadro, apenas o agricultor saiu perdendo, pois passou longos anos de agudo sofrimento, perdeu os poucos bens que possuía, ajudou a melhorar as fazendas do patrão, e, como conseqüência, no próximo inverno terá que plantar sob parceria mais desvantajosa1na medida em que receberá a terra já preparada e com benfeitorias. De todo o exposto, pode-se concluir que até o momento, toda a política de investimentos governamentais tem um único objetivo,que é reforçar a estrutura de dominação secularmente existente. As populações, bem , as populações são meros incidentes, nesse q uadro. A SECA ~ UMA TRAGEDIA No d ia 21.09.83 o Secretário de Agricultura do Estado do Ceará depunha na Assembléia Legislativa perante um plenário de deputados atentos, na maioria grandes proprietários rura is. Não fossem palavras de um severo homem de governo, pareceriam exaceros de algum "cont umaz agitador profissional, sempre a pregar catástrofes im inentes". Porém, como se tratava de uma autoridade insus;:>eita, todos ficaram ala rmados, dando-lhe, a im prensa, ç:ra•1de destaque nos dias subseqüentes. Disse repetida:; vez"s secretário, que o Estado do Ce~:-n en .~ ontra-~.a em situação do pré-convulsão social, com praticamente toda a populaçt o rural passando fome e sede, detendo um índice de mortalidade infa ntil não concebíveis num país que ~e diz tão rico, com tanto potencial e com tanta riqueza acümulada. Segundo ele, de cada 1.000 crianças que nascem, 250 morrem antes do primeiro aniversário, e que boa parte ci<:s sobrevive ntes ficam portando lesões cerebrais irreversíveis, qu3ndo o índice normal seria de apenas 20 criança-; para 1.000 nascimentos. Disse mais, o secretário, que o rebanho bovi no do F.stado est á praticamente dizimado e em extinção, pois o gado abatido no Frigorífico Industrial de Forta !~za - FRIFORT;oriundo do Estado, que norma lme nte se situa em torno de 30%1 já a!cançara 70% de s abates. 1sso in~.lca, . segundo ele, q ue as fu t uras gerações bovinas estarão comprometidas pelo abate indiscriminado das matrizes. E o que é mais grave, (,Ompletou, é com referê ncia à própria sobrevivência do homem, já que o st:l?rio diário de Cr$ 510,00 não permit e ao alistado com prar sequer meio quilo de feijão, hoje. Dias antes o ~ róprio governador do Estado afirmava à im;1rensa local, e, posteriormente, à imprensa do país c a est rangeira, que até o final do ano Fortaleza terá uma massa de favelados/fragelados da ordem de 700 mil pessoas, realmente uma situaçao preocupante. Verdadeiras as r-ala·Jras do governador, razão pela qua l instala-se na mente de todos os fortale zenses um pânico genera li:raclo, pois esses migra ntes não chegam à capital para passear, nem muito menos para olhur as belas vitrines, nem o rico visual de suas madames das classes altas. Ao contrário, etes vem para matar a fome. para comer, e certamente que o conseguirão de qualquer jeito. Ass:m , as ruas encontram-se repletas de crianças, de mulheres e de homens em estado do mais agudo sofrimento, a pedir a um e a outro alguma moeda ou alimento. Faml1ias inteiras, ãs centenas e centenas.., literalmente vivendo nas praças públicas, debaixo dos viadutos ou sob as marqu ises, com todbs os seus trapos e pertences, a mostrar aos transeuntes incomodados os retratos das vít iméls de uma das maiores t ragédias contemporiineas. Pelas estradns veem-se, também, as conseqüências da tragédia: milhares de pessoas vagando ã toa em busca de alimentos, estendendo às mãos( centenas ao mesmo tempo) a cada veículo que passa , ajoelhando-se nos acostamentos como sinal de que a indiferença dos viajantes significa a cumplicidrde com os responsáveis pela sua dor e provável morte, num espetácu lo . biafrense jama is imaginado num país com tanta riqueza acumulada e co m t anta sof~sticação em suas áreas ricas. Igualmente no t rabalho ( os bolsões da seca) o que se vê são agl omerados de corpos esqueléticos e esfomeados e.n rostos tristes e sem vida, à semelhança dos campos de trabalhos forçados dos nü:! ist éls, vistos em filmes que retratam a segun da guerra mund ial . Nas cidades interioranas todos estão na mais absoluta pobreza e fome . Da í a indignaçàb geral, embora todos se sintam impotentes diante de quad ro de tanta gravidade e irresponsabilidade governamental. indig nação externada, por exemplo, por milhares de pessoas que se aglomeravam ã frente do Fórum da cidade de Nova Russas-Ce1 por ocasião da audiência de interrogatório de dois trabalhadores rurais acusados de participar de saque ao comércio local com outros 1.500 trabalhadores, da religiosa Irmã Cleide Fontes (advogada e mem!Jro da CPT), e de vereador oposicionista, estes dois últimos acusados de insuflamento. Na ocasião, um dos trabalhadores acusados constrangeu de t <:l manei ra os presentes com

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seu aspecto esfomeado, com a 'Visível alienação de sua mente, com o desencontrado raciocínio que conseguia articutar, por causa da fome crônica, que quase o juiz e promotor pediam desculpas públicas pela difícil tarefa de conseguir julgar e condenar um pobre homem que havia praticado em furto femélico {1 kg de arroz e 3 ou 4kg de açúcar), ação que certamente não pode ser interpretada como tendo objetivos mais profundos, como por exemplo a "derrubada do governo democrático e a instalação de outro provavelmente sob o jugo de teorias exóticas e alienígenas". AS REIVINDIC~ÇOES DO MOVIMENTO SINDICAL O Movimento Sindical Rural tem incansavelmente clamado por soluções definitivas para o problema das secas periódicas. No entanto, o governo continua, do alto de sua tranqüila impunidade, inacreditavelmente despreocupado com o problema, provavelmente na certeza de que o sistema de dominação secularmente implantado garantir-lhe-á, de forma permanente, a infinita continuidade de sua consciente omissão. Assim é que milhares e milhares de reuniões foram real i· zadas, panfletos foram distribuídos, documentos foram preparados e encaminhados aos órgãos competentes, atos públicos de todas as formas e dimensões, ganhou-se a unanimidade da opinião pública nacional, mas a Reforma Agrária ainda dependerá de muita luta. Luta que também se trava na cidade de Fortaleza, onde os moradores de seus bairros e favelas, liderados pela F,ederação de Bairros e Favelas de Fortaleza, trabalham em prol da implantação das Frentes de Serviço na'capital (atacando o desemprego e realizando as obras que a comunidade entende necessárias), bem como pela Desapropriação e Legalizaçâo definitiva dos terrenos sob ocupação. EQUIPE FASE-FORTALEZA Dezembra/1983

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ENTREVISTAS

Entrevista com Dom Geraldo Nascimento Bispo Auxiliar de Fortaleza. '

PERGUNTA: Qual é a visão que a Igreja em Fortaleza tem sobre a seca? RESPOSTA: ~ uma alegria muito grande poder conversar um pouquinho sobre um problema que há tanto tempo aflige a tanta gente do nosso Nordeste, do nosso Ceará. Primeiramente, devo dizer que a visão que nós temos da seca, gente de Igreja, que a seca não é só falta de chuvas, não é por falta de chuvas que o Nordeste sofre, que o Ceará sofre. O problema fundamental da seca é realmente a estrutura polftica e económica do Nordeste. Entaõ é especialmente essa estrutura que vem enfrentando o problema da seca naõ como uma salda permanente" mas enfrentando assim, à parte,só de emergencias, só com planos emergenciais:-· ~- estes planos tem fortificado ainda mais a estrutura fundMría do Nordeste, gerando realmente os ricos, mais ricos, as custas dos pobres que estão ficando mais pobres. A gente, vendo agora esse trabalho do Bolsão da Seca, da forma como ele está organizado, como os trabalhos são feitos, onde que os trabalhos são feitos, geralmente nas propriedades maiores do Estado do Ceará ou do Nordeste. Isso vai fortificar muito mais a estrutura fundiária do Nordeste. Então a gente vê que o problema deve ser enfrentado de uma outra maneira para que apareça, as soluções permanentes que possam realmente indicar que existe possibilidades de se resolver o problema de uma maneira diferente. A gente vê pela história que há vários momentos de seca assim aqui no Nordeste e sempre foram enfrentados. Assim a seca está deixando o pessoal mais dependente, mais pobre, está aumentando a migração, nos últimos anos 15 milhões de pessoas tiveram que sair do campo para a periferia das grandes cidades. Isso então vai gerando uma pobreza muito maior. Então eu acho que é fundamentalmente isso. A gente está, vem insistindo muito, refletindo muito, que a seca não é só falta de chuvas, mas a seca é realmente um problema mais estrutural. ~a organização pol(. tica e econ()mica no Nordeste e no Ceará. PERGUNTA: Entaõ, Dom Geraldo, dentro dessa visão al, o Sr. como homem de Igreja, como Pastor e a própria Arquidiocese de Fortaleza, acham que o Nordeste é uma região viável? RESPOSTA: Então, a gente está notando que o Nordeste é realmente uma regiaõ viável. Isso é dito, também, pelos técnicos do governo, mostrando que existe a possibilidade do Nordeste ir mudando esse passado. Primeiramente, se o problema for enfrentado de maneira assim permanente para mudar um pouco essa estrutura fundiária do Nordeste a coisa vai se modificando; depois a gente sabe, também, que um pouco mais de água no Nordeste, um pouco mais de poços profund.os, um pouco mais de irrigação, a gente ia ter uma situação muito diferente, porque a terra no Nordeste embora seja chamada de semi-árida, é uma terra muito boa que com pouca chuva é capaz de produzir alguma coisa. Eu conheço nesse interior do sertão, aqui mesmo no Ceará, depois de 5 anos de seca, eu conheço lugares chamados mesmo no carrasco, onde há um pequeno poço profundo, ,que as pessoas ~m um verdadeiro pomar na sua casa.

Por exemplo: Até no Municlpio de Chorozinho que quando a gente chega lá parece que nem está no interior do Ceará. A gente encontra todo verde, a gente encontra as fruteiras todas produzindo e é um pouco só de água que é colocado, sobretudo, se é colocado com aquela irrigação que é feita através de potes, lá eu vi essa experiência, com pouca água se. consegue aquela umidade. Então isso é muito importante. Depois, a gente sabe também que o Nordeste por causa de toda essa estrutura que eu falei, económica e polftica, o Nordeste foi muito sugado pelo Sul. Isso af os governadores do Nordeste estão dizendo, o próprio governador do Ceará denunciou numa entrevista que aquilo que foi gasto nos últimos 20 ou 30 anos não corresponde a 10% do que foi gasto em ltaipu. Então a gente sabe que o Nordeste foi muito sugado. Sabemos, também, que o Nordeste produz petróleo, já bastante e não fica um tostão desse petróleo para o Nordeste. Até mesmo o próprio Ceará está produzindo alguns barris de petróleo por dia e não fica um tostão. Nós vamos entaõ comprar a gasolina do mesmo preço que os outros compram e não rende nada para o Nordeste. Então o Nordeste é muito sugado e a seca se tornou, realmente, uma indústria. Eu acho o Nordeste realmente muito viável e essa viabilidade devia partir de uma trasformação da estrutura. "insisto muito nisso, na estrutura econ()mica e politica, a partir mais da organização do nosso povo, que o povo vá se organizando e vá ent6o con· fiando mais, naqueles pequenos projetas que o povo pode realizar, um pequeno projeto de irrigação, certas coisas mais num estilo comunitário, para que o pessoal possa se livrar um pouco' mais dessa situação. Então eu acho o Nordeste realmente wável. E que realmente deve haver um esforço todo, principalmente dos pollticos do Nordeste, para mostrar essa possibilidade e, então, entrar um pouco nessa linha de trabalho, mudar um pouco essa situação. Então eu acho que é muito viável, mesmo havendo essa possibilidade de alguns anos sem chuva, como nós estamos passando agora, é possfvel se enfrentar a coisa de maneira diferente. De um modo mais permanente e não se ficar na emer~ncía. Então eu acho que é viável por causa da terra, por causa do povo que é trabalhador, por causa também das possibilidades que nós temos de criar uma estrutura muito melhor aqui no Nordeste. PERGUNTA: De uma certa forma a Igreja aqui, através de seu depoimento, aponta para uma proposta que viesse de fato de encontro dos anseios do povo, do trabalhador. Mas tentando concretizar mais, quais seriam as linhas mestras dessa proposta?

RESPOSTA: Então, partindo, primeiramente, de que a situação do Nordeste é causada por uma estrutura económica e política e nlo por falta de chuvas, e também considerando essa viabilidade que o Nordeste tem com recursos e com o próprio homem do Nordeste, que é um homem trabalhador, a Igreja, então, aponta principalmente a organização do povo, que o povo comece a se organizar e fortificar mais.

Proposta 6


as suas entidades, como por exemplo: passe a fortificar maís os sindicatos, as cooperativas. Que o povo fortifique mais, também, a sua organização comunitária. Então, a partir da/ a gente acha que o caminho seria que o povo comece a assumir mais o seu próprio trabalho, assumir mais a sua própria organização, as pequenas comunidades do interior, ou mesmo da periferia das cidades maiores do Nordeste e do Ceará. E, então, acreditando nisso, a Igreja de Fortaleza, dentro de sua missão pastoral. ela está procurando realmente organizar o povo, sobretudo nas comunidades eclesiais de base, e também procurando valorizar muito o trabalho do povo, através da Cáritas Arquidiocesana, que tem um trabalho na periferia de Fortaleza. Então a Cáritas está organizando pequenos projetos para valorizar o trabalho do povo, pequenas cacimbas, projetos para as costureiras, para as bordadeiras, também para os sapateiros, para a criação e construção de centros comunitários. Então, para que o povo assuma esse trabalho, viva um pouco mais desse trabalho, e possa então criar uma organização mais forte, diante desse sistema que nós temos a1: E para o interior nós temos uma equipe também, muito boa, que é a equipe de assessoria às comuni· dades rurais, o ex-MEB, que está funcionando mais no interior também organizando o povo, orientando pequenos projetas, sobretudo cisternas comunitárias, açudes. Foi feito um açude bastante grande na Vila São Marcos no Municlpio de Aracoiaba. Então, o povo mesmo fazendo esse trabalho, em mutiraõ, organizando seu trabalho, recebendo um pouco de ganho por isso e deixando uma coisa permanente para o bem de nosso povo. Então, nosso trabalho como Igreja, partindo de nossa opção preferencial pelos pobres, e organizar mais o nosso povo, valori· zar mais o seu trabalho e fortificar as suas organizações; associaçtJes para que o povo possa ser mais sujeito da história, possa ajudar a transformar um pouco a nossa realidade, que a estrutura fundiária vá mudando, que também a estrutura económica e

polltica vá mudando, não só ficando em favor de alguns, mas também sendo um bem comum para a maioria de nosso povo. Então o Nordeste é viável, acredito que tem uma saída e a Igreja vem dando aquilo que é possível dar nessa saída que é organizar o povo para realizar seu trabalho, fazer que ele caminhe por si mesmo. PERGUNTA: Então Dom Geraldo,nósestamos chegando ao final, a gente agradece ao Sr. e a Igreja e se o Senhor achar conveniente pode ainda dizer mais alguma coisa a respeito desse problema e de como está a ação governamental a1: se for o caso? RESPOSTA: Sim, eu gostaria, encerrando a conversa com você, João, agradecer ter podido coope· rar um pouco e dar aquela opinião que é mesmo mais a opinião da Igreja do Ceará, a Igreja que está aqui em Fortaleza. O nosso interesse é que a gente assuma a nossa missão diante do povo. Que a gente seja, como Igreja, fiel ao povo, fiel ao evangelho. E às vezes quando a gente tem que dizer que alguma coisa não está certa, tem que denu_nciar, e visando realmente cooperar, também, até com as autoridades Os Bispos do Ceará já fizeram só esse· ano umas duas comunicaçtJes, cartas para as autoridades, mostrando as irregularidádes existentes nos Bolsões da Seca. Que é que a gente quer com isso? Quer que a coisa funcione melhor, quer que o povo sofra menos, quer que as autoridades prestem atenção como é que as coisas funcionam, para que não haja tantos aproveitadores da seca, que a seca não seja mais indústria, que todos nós possamos juntos assumir uma solução, uma salda, e que a gente continue mais acreditando que o Nõféieste é viável e que não precisa ficar recebendo esmola do governo, esmola do Sul nós precisamos é de trabalho, nós precisamos é assumir mais, organizar mais e ver nossas possibilidades regionais por um crescimento da força económica do nosso povo. Entá'o acredito nisso, trabalhar muito. Então a gente quer ajudar. E queremos ajudar a partir das organizaçtJes· do nosso povo. Muito obrigado.

Entrevista com Antonia Maria de Souza Vitoriano -TainhaPresidente da Associação dos Moradores da Agua Fria, Favela do Dendê. PERGUNTA: Como a seca é vista pelos mora· dores desta localidade e que mal ela está causando para a. população trabalhadora aqui residente? Você poderia falar um pouco sobre isso? RESPOSTA: Bom, eu vejo por 2 (dois) caminhos. Eu vejo que a seca atinge os bairros da seguinte maneira: porque aumenta o número de desemprego, de vez que o povo vem para as favelas, às vezes fugindo do interior porque lá não tem trabalha. e quando chega aqui nos bairros também não existe trabalho. Af continua com a mesma situação que os companheiros dos bairros já v6m sofrendo. E a seca aumenta cada vez mais a violência nos bairros~devido a fome. Os pais desempregados, não têm alimentação para dar aos filhos,- não têm sobrevivência nenhuma. Por isso aumenta, cada vez mais, a violência; e aumenta, cada vez mais, o número de desempregados nas favelas de Fortaleza. O problema é sério: a situação que o povo enfrenta nas favelas é igual à situação que os nossos companheiros agricultores enfrentam no interior. Lá eles naõ tem como sobreviver por causa dos latifundiários donos das terras. Os trabalhadores nada têm. Vivem trabalhando para os lati-

fundiários. E quando chega essa situaçlio de seca eles ficam desesperados e vêm aJ!mentar o número de desempregados nas favelas. Pof!· outro lado, eu penso muito e vejo que a seca pode ser superada à medida em que os nossos governantes queiram enfrentar seriamente a situação da seca. Pelo seguinte: se não tem inverno, eles procurassem fazer aquelas .. eu nem sei dizer o nome, mas eu vi muito nos interiores de São Paulo ... são poços com aquelas máquinas imensas trabalhando, agoando imensidade de terras. Se os governos quisessem superar a crise, se eles estudassem mais um pouco, eles resolveriam o problema. Porque água nós temos debaixo de nossas terras. Se os ministros se preocupassem com a situação do povo, eles encontravam solução. Eles têm solução. Só que eles nlio se preocupam mesmo com a situação do povo, eles naõ se preocupam com o povo que está passando fome. Com o povo que está sofrendo. Ora, os governantes v6m se preocupar em pedir esmolas ao povo para resolver o problema do próprio povo. A gente sabe que a solução é uma coisa bem concreta: é a perfuração de poços profundos, construçaõ de açudes e a criação de empregos para os trabalhadores, para o povo.

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Entrevista com Pe. Eliézio dos Santos Diocese de Crateús

PERGUNTA: O entrevistado de hoje é o Pe. Eliézio dos Santos, que vai falar sobre a seca em nome da Diocese, em nome do Bispo daqui e em seu próprio nome, na qualidade de coordenador da Pastoral local. Então Pe. Eliézio, com base na vivência que a Diocese tem, na sua experiencia com o homem do campo, como é que se está vendo a questão da seca? RESPOSTA: Nós acabamos de realizar, na Diocese, um encontro para pensarmos a questão da seca e toda a relação pastoral que esse problema suscita. Tinham, no dia 10, aqui presentes, pessoas das várias equipes paroquiais da Diocese. Houve uma preparação, levantamento de dados para que se pudesse ter assim uma base coberta, uma base mais cientr'fica para realizar essa reflexão. A apresentação dos dados sobre a população, sobre o pessoal que está alistado nos bolsões da seca, sobre o pessoal que está aposentado, os programas de ajuda que estao acontecendo agora, por ocasião da seca, e depois de apresentado tudo isso, a gente tentou ampliar um pouco a discussão. A gente viu que estamos agora, aos cem anos daquela célebre frase de D. Pedro 11: "Venderei o último brilhante de minha coroa para que nenhum cearense morra de fomf]" e a partir de nossa experíencia, as diversas secas que a gente assistiu, a gente nota que o comportamento do governo em relação à seca não tem mudado nesses cem anos. A seca tem sido encarada como um problema de estômago, quer dizer, é a fome, um pouco da filosofia do ;.Fantástico~ Mostra o pessoal com fome, o pessoal magro, o pessoal com pele rachada, os animais/ as caveiras deles mais secas, morrendo. Então toda essa dramaticidade da seca, em cima da questão fome - que pouco distraí a gente da discussão de todas as circunstâncias nas quais se dá a fome. E, a resposta do governo, tem sido a mesma de D. Pedro /1: o máximo chegar a uma assistência caridosa; e a questão ser encarada de um modo superficial, de um modo paliativo, de modo que as rafzes da questão continuam intactas. Há quem diga que, a rigor, no Nordeste não há falta de água, como não há falta de terra. O que há é uma concentração de terra e uma concentraçaõ de água. O Ministro Andreazza dizia há poucos dias que o Nordeste tem 64 mil grandes açudes. Além do Rio São Francisco, que derrama por minuto vários bilhões de litros de água no mar, que já tem tanta água. Então há a discussão do problema da seca que tem sido tradicionalmente uma discussão em cima da questão da fome, encarando a seca como um problema estomacal e também em cima do problema do clima. Tanto o governo como a opinião pública generalizada acha que, se chover se acabam, se resolvem os problemas do Nordeste. O que não é verdade. Nós aqui, na nossa região, os anos 60 foram todos anos de bons invernos .. choveu muito. Quando foi 70, depois de 10 anos de chuvas de bons invernos, um ano só foi o suficiente para desorganizar aqui toda a região, o povo que vivia de cima para baixo, com os sacos nas costas ... quer dizer havia toda uma agressividade de uma situação que é permanente, quer chova ou faça sol.

Bom, então, há no Brasil, no Nordeste, sobretudo agora, uma tentativa de ver a questao do Nordeste, como uma questão política e a gente está experimentando isso. A gente está se sentindo como o próprio povo está agora, em vez de ficar com as mãos estendidas esperando uma ajuda de qualquer missão que seja, mas já começa a exigir, a reivindicar trabalho, água, fornecimento, emprego para mulheres e menores. São todas as coisas que o pessoal vai exigindo. Nesse munidpio de Crateús, que tinha no começo da emergência ficado fora porque se achava que não era caracterizada aqui um Bolsão de Seca, então graças a luta do povo, hoje 50% da população ativa está trabalhando, mas isso sabe como custou, como custou reivindicações, como custou repressaõ, como custou humilhações para esse povo que vai em frente, que está lutando. Então o próprio comportamento do povo está mudando com relação a questão dá seca. Já não há, apenas, um caráter seca-tradicional, mas já há a seca como se fosse uma escola de participação política, uma escola de reivindicaçaõ, uma escola de pressão social, que o povo faz pra com as autoridades que foram constitu/das pelo povo para encaminhar soluções desses problemas. Bom, penso que, resumindo essa questão, acho que nesse momento histórico do Nordeste há uma tendência bastante forte e que é cada vez mais a§§_U· mida por muitas pessoas, de deixar a perspectiva de seca/fome, seca/falta de chuva, para se encaminhar, essa tendência, para ver a seca como sendo uma questão ligada a outras questões: O Nordeste visto como um todo, no seu conjunto de problemas e tarr.bém esse problema, o problema da seca que a soluçaõ não é apenas dar comida, a solução não é apenas rezar para chover, mas a solução seria participar, forçar a participação nas decisões pol(ticas que venham a resolver o problema do Nordeste. PERGUNTA: Muito bem, quer dizer que do ponto de vista da Diocese, o Nordeste é uma região viável? RESPOSTA : O Nordeste precisa ser entendida como realmente é. Uma região do Brasil. Uma região integrada nesse pa(s. O Nordeste tem sua problemática, mas os problemas do Nordeste são os mesmos problemas do Brasil todo. Como sendo o mesmo País, o Nordeste reflete toda a problemática nacional. A problemática que é vivida aqui, que é vivida na Amazônia, no sul, em toda parte. Então a seca, que é um dos capftulos da vida do Nordeste, o Nordeste que passa por esses problemas, o problema da seca, teria que ser visto e analisado e estudado nesse alcance. Se o Nordeste fosse visto integrado junto com os outros Estados do Brasil integrado, inclusive, no conjunto das preocupações e das questões sérias que se discutem nesse Pafs, então o Nordeste seria uma prioridade. A partir do Nordeste poderia se pensar ... a partir da experiência do Nordeste, a partir da seca do Nordeste, a partir da desemprego do Nordeste, da concentraçaõ das terras do Nordeste, da concentração das águas do Nordeste, se poderia pensar no País todo e ver o Nordeste como prioridade, lugar do qual se pensa ta-

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bém o País, não só a regíaõ, mas o País todo. Seria o momento de balancear todas essas questões, todas as dificuldades, mas seria também o momento de balancear todas as possibilidades que tem esse País. E aí, visto sob esse prisma, de um Nordeste integrado no Pafs, o Nordeste que tem problemas, porque o Brasil também tem problemas, então, se o Brasil é viável, o Nordeste também é viável. PERGUNTA: Qual seria a resposta a ser formulada, ou até concretizada, para que o Nordeste deixasse de ser visto como uma coisa a parte, para que o Nordeste tivesse um tratamento justo, enfim, como é que a Diocese está vendo, qual a proposta que poderia ser trabalhada, operacionalizada e como? RESPOSTA: O nosso lugar na construção desse mundo, a nossa função, é uma função pastoral Não é uma função politica, propriamente, não é uma função sindical, é uma função pastoral. Estamos nessa por motivo evangélico, estamos nessa porque acreditamos que o homem foi promovido a dignidade de filho de Deus, graças ao mistério da encarnação, e que como filho de Deus cada um e todos os homens tem uma dignidade bastante grande para nós e que toda sociedade que não seja baseada nos princípios da justiça e da fraternidade são contrárias a este sonho de Deus, o sonho de que todos os homens formassem uma só famflia e que todos esses homens são sujeitos da história, são sujeitos da libertação, sujeitos da construção desse mundo novo e, por isso mesmo,depositários de uma dignidade muito grande. E como agentes de pastoral é nossa missaõ criar espaços de participação para que o povo1participando, seja ao nfvel de comunidade, ao nível de igreja, ao nível de organizações populares, ao nível politico, ao nlvel sindical, que nesses espaços o povo vá exprimindo o seu pensamento, a sua vontade.

NãoJsomente exprimindo , mas também realizando, sendo sujeito, não só de dizer, mas também de realizar o que seja essa nova sociedade - Entendemos que uma nova sociedade, entendemos que uma nova sociedade, justa e fraterna, questões como essa questão da seca, a ouestão do êxodo rural, a questão do desemprego, a questão da concentração das terras, que tudo isso trará um tratamento diferente. Será resolvido naõ a partir de decisões centralizadas, mas a partir de uma discussão ampla com a participação ampla do povo. Então para nós, a chave na qual a gente acredita muito é essa de participação.

Essa de que o povo seja tido e considerado, não apenas como objeto dos programas, mas como sujeito de verdade, sujeito efetivo e que esse povo que já durante tanto tempo, já começou a explicitar, dizer seu pensamento, a elaborar, a discutir junto com os outros as coisas, as comunidades, as suas organizações de classe, seus movimentos populares, esse povo seja escutado, seja ouvido, que essa participação leve à configuração de uma sociedade justa e fraterna, diferente daquela em que vive, na qual a distância entre aqueles que tem e os que não tem é tão grande. PERGUNTA: Uma outra questa-o que é colocada hoje, o Sr. antecipou, logo no inléio, é a questão da Reforma Agrária. Como é que a Diocese vê isso? RESPOSTA : Seguindo aquela mesma linha de raciocínio de que o fundamental para nós é a questão da participação, nós temos aqui na Diocese alguma experiência de reforma agrária de governo, mas o povo nunca foi perguntado se queria Reforma Agrária, o povo nunca foi perguntado de como deveria ser a Reforma Agrária. Nunca foi perguntado sobre de que forma se realizaria a Reforma Agrária; E chegou, então a Reforma Agrária fruto de uma decisão centralizada que consiste, exclusivamente, na distribuição de terras1 sem condições1 sem assessoria técnica nem financeira para que o povo possa realizar um trabalho de produção que venha a resolver os seus problemas. Hoje se fala muito em Reforma Agrária por toda parte, no governo, mas penso que faltaria se precisar mais o que se quer dizer, como é que se imagina essa Reforma Agrária. A nosso ver, toda e qualquer solução nessa linha teria que ser amplamente discutida com os agricultores. Os agricultores já tem seexprimido nas suas assembléias, tanto da CPT como nas assembléias do Sindicato, sobre a Reforma Agrária. Já tem havido discussões muito profundas, muito importantes, mas eu penso que esse processo poderia ser desencadeado de maneira mais ampla ainda. Cada comunidade, cada sindicato, cada organização popular deveria exprimir o seu pensamento sobre Reforma Agrária. - E qualquer sõlução deveria ser uma solução que respeitasse profundamente a decisão popular. E que essa participação do povo fosse, não apenas, na elaboração de idéia, mas fosse também .na execução do programa para que essa Reforma Agrária pudesse vir mesmo de encontro às necessidades reais do povo e pudesse incorporar na sua proposta, na sua forma, a composiçaõ efetiva de todo o povo que trabalha no campo, de todo o povo que conhece a terra, de todo o povo que quer bem a essa terra.

ENTREVISTA COM JOSE ALBERTO DE ALMEIDA - Presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil- IAB- Ceará P - Como você vê o quadro atual da cidade de Fortaleza, depois desses cinco anos consecutivos de seca? R - A cidade de Fortaleza, hoje, depois desses cinco anos de seca que assola o Estado do Ceará, sofre um processo violento de inchação, em função da aceleração dos fluxos migratórios do campo para a cidade. A seca não é um fenómeno, é uma coisa dcli.·ca, previsfvel- aliás, esta foi prevista pelo CTA' Centro Tecnológico da Aeronáutica, com ra· zoável margem de tempo, o que permitiria que algumas medidas fossem tomadas, e não foram. A seca é uma situaçaõ com a qual nós temos que conviver, temos que estar preparados para ela.

O que a seca mostrou na realidade foi o modelo económico brasileiro em toda sua plenitude, ou seja, um modelo económico concentrador, que requer que sejam feitos altos investimentos nas áreas de concentração urbana, desprezando as áreas rurais que estão vinculadas à produção de alimentos. Nestas áreas rurais é privilegiada a produção de matérias exportáveis, como soja e outras coisas, o que requer um alto grau de mecanização e que também contribui para que as populações migrem em direção aos grandes centros urbanos Hoje, Fortaleza, que já deve estar com seu milhão e meio de habitantes, está praticamente concentrando um terço da população do Estado, num

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flagrante esvaziamento do campo. Quando se pensa em Fortaléza, tem-se que pensar em primeiro lugar numa polltica de intervençaõ no campo, uma pol/tica rural na qual a reforma agrária pontifica como uma coisa extremamente necessária. P - O que voce chama de Reforma Agrária? R - Reforma Agrária não é a mesma coisa que reestruturaçaõ fundiária , é uma coisa muito mais ampla. Embora a questão da propriedade seja básica para uma verdadeira Reforma Agrária, ela tem que estar acompanhada de outros instrumentos que permitam a fixação do homem no campo. Não se trata de sair apenas dividindo a terra, se teria que paralelamente a isso, montar toda uma polltica de crédito, de comercialização e serviços que possibilitasse ao homem do campo produzir, comercializar sua produção, ter os créditos necessários para continuar produzindo e ter a infra-estrutura necessária para estocar e transportar, e fundamentalmente ter um mercado consumidor Para que esse mercado consumidor exista é necessário que se reveja, com urgência, o problema da distribuição de renda em nosso país. A continuar a população tendo seus salários cada vez mais comprimidos, é imposslvel se ter um mercado consumidor que venha de fato a absorver os produtos produzidos por estas populações localizadas no campo. Isso, fundamentalmente, teria . que estar embutido numa polltica de reversão do modelo econômico que, num processo de redistribuição de rendas, reativasse esse mercado interno. Teríamos que paralelamente, objetivar uma polltica industrial ligada aos interesses da população, ou seja, que se produzissem bens que fossem consumidos pela população de acordo com suas necessidades, e uma polftica agrária que propiciasse a consecução dos objetivos que já enumeramos aqui. Tudo isso deveria ser pensado numa ótica de distribuição das forças produtivas da produção no território nacional em função de suas potencialidades e das redes de cidades existentes. Tem áreas com potencialidade mineral, tem área com potencialidade agrfcola, pecuária, agropecuáría. Ter/amos que pensar em termos de conjunto : potencialidades do território e redes de cidades. E trabalhar no sentido de obter um certo balanceamento das redes de cidades em função da distribuição da população e do potencial que o espaço fSico dispõe em termos de explora7 ç;aÕ econômica. Isso é um projeto Brasil, que tem que ser pensado, no mmimo, em termos regionais. Isso significa basicamente o seguinte reversão do modelo econômico, no sentido de deixar de ser concentrador, exportador, privilegiador do grande capital e voltado para os grande investimentos. Ele teria que ser revertido no sentido de retomar o mercado interno, a nlvel de produção industrial. Significa dizer também que teríamos que dar prioridade às tecnologias adequadas ao nosso desenvolvimento, se contrapondo às tecnologias importadas e que favorecem ao sistema econ6mico internacional, na medida em que elas' são realidade subprodutos dos pafses centrais e que nos são impostas.. . O que se ~ aqui no Ceará, é o seguinte: as med1das que deveriam ter sido tomadas - a r eu não me refiro só aos cinco anos de seca, mas a uma questão secular - não foram. Então se tem que fazer p~r~lelamente duas coisas: tomar medidas emergenCJaJs e. tomar medidas de médio prazo, que seriam as med1das estruturais. As situações de crise encobertam e escondem as .verdadei~as ra!zes dos reais problemas Veja o seguinte: a Sltuaçao é de crise, o povo está passando

fome, sem comida, sem água, sem roupas nem medicamentos, qual é o primeiro impulso? t levar pra essa população uma ajuda, de alimentação, de remédios, e isso se transforma em uma bola de neve, que vai encobrindo as raízes do problema. Na verdade o povo está passando fome, não apenas porque está havendo uma adversidade climática, está passando fome, fundamentalmente, porque o sistema de propriedade é injusto, porque o modelo económico é injusto, porque a situação a que foi levado é de extrema penúria. As medidas emergenciais têm que ser vistas, naõ sob a ótica do paternalismo, da esmola, da sacolinha, do retratinho, teriam que ser meiddas emergenciais que desem ao cidadão a idéia de que ele está fazendo alguma coisa útil, fazendo jus a uma retribuição. O que tem acontecido é que o governo tem tomado medidas que não conduzem a coisa nenhuma. Construir açudes "Sonrizal" que se desmancham ao contado com a água não resolve absolutamente nada. A maior parte dessas obras que estão sendo feitas pelo Bolsão da Seca se localiza em propriedades particulares, e o cidadão que está construindo, participando da execução dessas obras, não vai usufruir do.s beneficias que elas possam vir a trazer. Em segundo lugar, acho, que a maioria dessas obras, em vez de trazer benefícios - principalmente esses açudecos, aguadas e algumas estradinhas, - traz problemas, porque é feita sem nenhum planejamento. Então, a primei ra chuvinha que vier vai provocar o arrombamento em cadeira de 1O, 15, açudes 'Sonrizal' , um atrás do outro. E, logo na primeira chuvinha, cria-se um problema sério para essas populações, como j á ocorreu em outras oportunidades. Ten10s que considerar também que isso está sendo feito com um caráter paternalista extremamente acachapante, está acabando com a dignidade do povo. O cidadão está perdendo a dignidade, ele está aceitando isso como um:J esmola em troca da qual faz uma tarefa, mas não está achando que faz um trabalho digno, que tem que ser rêmunerado dignamente. Isso poderá levar a uma situação desastrosa do ponto de vista da cultura do povo. Ainda falando em termos rurais, existem órgãos, aqui no Ceará, que possuem um razoável levantamento do potencial hídrico ainda existente no Estado, esses dados já existem na própria sudene, DNOCS, CEPA, SOEC. Ainda existem alguns açudes com água, alguns vales, então se poderia partir para um programa emergencial que distribuísse a população em p ontos estratégicos em função de disponibilidade de água, de solo, e de alguma infra-estrutura mlnima para que ela pudesse sobreviver. E essa mão-de-obra poderia ser utilizada na complementação desta infra-estrutura e construção de equipamentos públicos que tivessem um caráter durável Porque o que acontece é que no primeiro inverno, tudo que foi feito por frentes de serviço vai embora junto com a água. A coisa que mais irri ta o cidadão, principalmente as pessoas que se envolvem emodonalmente com a questão, é que o governo só quer ter solução pra hoje. Mas acontece que ontem já foi hoje. Cinco anos atrás era hoje e é ontem. Então, nessa seca, o Governo teve cinco anos pra pensar nisso e não fez nada, fez um Centro Administrativo no Cambeba, montou os Bolsães, onde os trabalhadores estão recebendo Cr$ 15.300,00 por mês. Mas poderia, paralelamente à existencia dos Bolsões ir elaborando estudos montados nas informações existentes nesses órgãos públicos e em algumas associaçÕflS, como é

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o · 1so qa ABRH - Associação Brasileira de Recursos his:Jricos. Acho que, dessa forma, à medida que fossem sendo identificadas, através desse estudo, áreas possfveis de ir absorvendo pessoal de uma forma mais produti va e mais digna, deveria ir tirando-o dos Bolsões e remanejando-o de forma mais racional. Mas o Go vemo só procura atuar de duas formas: ou peta obra faraônica, como a transposição de bacias {do rio S. Francisco para o rio Jaguaribe), cuja razão de ser está vinculada a interesses de grupos econômicos na área da construção ch,if, o que cada vez fica mais evidente. Ou então, o extremo oposto, que são obras do tipo emergencial, como o Bolsão da Seca, que enseja a corrupção e permite o controle pol/tico da população via paternalismo. A solução intermediária, que é a pofftica do pequeno poço, da cacimba, da pequena construção, da pequena coisa que tem caráter permanente, que fica, essa nunca é pensada, nunca é colocada em cima da mesa. E isso você também pode transpor para a realidade urbana. Essa situação emergencial, e a perspectiva das medidas que estão sendo tomadas pelo governo, levam a um desvio das verdadeiras que estaõ na raiz dessa situação. A partir do momento que as coisas se desanuviam, que começam a cair os primeiros pingos de chuva, tudo cai num esquecimento total Tem sido sempre assim. t: na grande seca, que se constrói o grande açude, é na grande seca que se cria a SUDENE, é na grande seca que se fazem os determinados programas emergenciais. Agora, isso tem também o reverso da moeda: é também na grande seca que surge a Aldeota, como bairro mais elegante, mais sofisticado, de poder aquisitivo mais alto, porque é na grande seca que a mão-de-obra fica mais barata, a disponibilidade de mão-de-obra fica maior e tem sido, inclusive, na grande seca que tem fio~ rescido a conhecida 'indústria da seca", com pessoas que se aproveitam criminosamente dessas campanhas de caráter social e filantrópico para o atendimento emergencial da população e enriquecem às custas disso. As possibilidades de desvios de doações é uma coisa constante. P - Em termos da cidade de Fortaleza, frente a toda essa situação, quais foram os problemas criados e que estamos enfrentando hoje aqui? R - No Ceará, existem 372.000 pequenos produtores que são responsáveis pela maioria da produção agrícola do Estado, desses 300.000 não têm a posse da terra e sâb os primeiros a migrar. Afinal de contas o homem está numa terra, que não tem água, naõ tem condições de subsistência, a terra não é dele - o que poderia ser uma coisa que o prendesse por lá, mesmo com toda adversidade - vai fazer o que? Vai sair em busca de situações mais favoráveis. E esta situação supostamente mais favorável, ele vai procurar na cidade. Isso vem envolvido por uma série de outros elementos que devem ser considerados, como o milagre das comunicações no Brasil uma coisa ,fantástica", o rádio, a televisão, essa coisa " maravilhosa", que mostra e continua a mostrar uma falsa imagem do que seja a reat;dade urbana. Entaõ duas coisas nos parecem graves, a primeira é a seguinte: quem vem pra cidade vem em busca de alguma fonte de sobreviv~ncia, vem procurar emprego. A segunda é que ele precisa de um lugar, encontrar a sua própria forma de se estabelecer, seja em baixo de uma árvore ou viaduto, ou num terreno desocupado, público ou privado, porque precisa de um ponto de referência, precisa de um lugar. E ess lugar precisa oferecer um m/nimo de condições de abrigo, mas, ao mesmo tempo, tem que estar vin -

cu/ado a uma proximidade com o que a gente chama de fontes de emprego ou fontes de referência de emprego. Entaõ essas duas coisas são fundamentais. Em Fortaleza, hoje, talvez 50% da população economicamente ativa esteja ligada ao mercado de trabalho formal. Metade da população está ligada ao mercado de trabalho informal, tipo camelô, biscateiro, vendedor de praia, prestando um serviço aqui outro acolá. Parte dessa população ingresssa na marginalidade social e depois vira assaltante, ladrão, criminoso, em função de que tem que sobreviver. A situação de Fortaleza, hoje, analisando do ponto de vista dos efeitos, é uma situação de extrema violência, que, a continuar, ev acredito que a gente vai sair da padaria com o pacote de pão e alguém vai pegar e sair correndo, o tipo de roubo famélico que não é considerado crime. Agora eu lhe digo o seguinte: Fortaleza naõ está isolado do contexto geral do Nordeste, do país e do próprio mundo. t: imposs/vel resolver o problema de Fortaleza sem uma ação no nfvel nacional ou no m/nimo regional. Porque nós temos fundamentalmente o problema de renda-emprego, que não pode ser resolvido no n lvef de Fortaleza, isso é politica nacional. Tem problemas de infra-estrutura, seja ela a nível de habitação, do saneamento básico, do transorte, para o atendimento dessa população que está se fixando em Fortaleza. Isso também é pol/tica nacional. Hoje se teria fundamentalmente que lutar pra reverter o modelo econ{}mico, lutar por uma Reforma Agrária, lutar por uma Reforma Urbana, lutar por uma • Reforma Tributária, lutar pela autonomia dos municlpios. E tudo isso de pouco vai adiantar se não se lutar pela democracia. P - Você fala em reforma urbana. Que tipo de medidas seria necessário para uma reforma urbana? R - A reforma urbana não pode ser dissociada da reforma agrária, é um contexto praticamente indissociável, na medida em que a gente sabe que grande parte dos problemas urbélnos tem sua origem no campo. Enquanto o problema do campo não for resolvido , ou pelo menos satisfatoriamente equaioonado, naõ há a menos possibilidade de se manter o crescimento urbano equilibrado. Quando se pensa numa reforma urbana, o primeiro ponto que se precisa discutir é a questão da propriedade imobiliária urbana. A exemplo da reforma agrária, é o ponto central da questaõ. A posse da terra é o elemento fundamental da ação da especulação imobiliária. Os problemas urbanos n§o os que são provocados pelos fluxos migratórios mas os que são intrínsecos à própria cidade, se baseiam . na total ausência de mecanismos que regulem a ação privada no meio urbano. Em uma cidade como Fortaleza, que possui 270.000 domicílios, dados de censo, se a gente juntar todos os terrenos desocupados, com mais de 10 ha., com infra-estrutura de transporte, alguns com água, energia elétrica, serviços, etc., se teriam condições de construir mais 159.000 novos domic/lios. Veja aí a irracionalidade do sistema. Uma cidade montada com infra-estrutura, tem condições de absorver mais dois terços do número de domicílios já existentes, sem onerar a infra-estrotura, no entanto os conjuntos habitacionais da COHAB são construldos em Pajuçara, Maracanaú, Caucaia, locais distantes das fontes de trabalho, com infra-estrutura deficiente, principalmente de serviços básicos. E porque existe essa terra estocada a espera de valorização? Porque não existe nenhum controle sobre isso . Estocar a terra é bom. Primeiro o cidadãq

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faz um investimento X na compra de um terreno, vem o Governo, com o dinheiro da comunidade e coloca a infra-estrutura, rua, água, luz, o terreno já passsou a valer dois X, e o cidadão não investiu um tostaõ, não gerou um só emprego, não fez nada, ficou sentado na sua cadeirinha. A partir da! chega um particular constrói, chega outro particular e constrói, o terreno passou a valer três X, e o especulador sem gastar um vintém, sem contar que o imposto territorial que ele paga é irrisório. Então ele já está lesando o fisco. Ele não investiu nada, o terreno supervalorizou-se, o imposto que ele está pagando é irrisório em relação à valorização do terreno, ele não empregou ninguém, isso mostra que o que de fato não existe é nenhum controle sobre esta maisvalia que é gerada em cima do terreno, a partir do investimento da comunidade, através do poder público, de terceiros, quartos, quintos, etc. Não existe nada melhor do que se ter esta terra acumulada, que a gente chama de terra de engorda, que é melhor que gado, porque não precisa dar ração, dar nada, ela sozinha engorda. A função social da propriedade, segundo a Constituição, seria a submissão do interesse privado ao interesse coletivo. Isso na teoria. Na prática é o contrário. A terra é uma reserva de valor e a cidade é o local onde algumas pessoas auferem lucros. Portanto essa é a primeira questão que se tem que discutir, que se tem que equacionar de alguma forma, que é o problema da propriedade imobiliária urbana como um entrave à ocupação racional da cidade. E quem paga essa irracionalidade? Quem paga é a comunidade. A infra-estrutura que é colocada tem um tJnus extremamente violento, e nunca houve uma predisposição do poder municipal de tomar algum tipo de medida, o que eu acho elementar. Porque não um imosto progressivo? Se o cidadaõ tem um lote, eu imagino que ele tenha aquele lote na expectativa de construir a sua casa, então ele paga um imposto X. Mas o cidadão que tem 50 lotes, eu não posso imaginar que ele· está guardando pra morar, mas sim para obter a valorização desse imóvel, a partir dos investimentos feitos pelo poder público e por terceiros. Então eu naõ acho justo que ele tendo 50 lotes pague 50 X de imposto, porque ele está agregando ao seu património um valor que não significou nenhum investimento. Ele tem que ser tributado por isso porque ele está provocando esse ânus. t extremamente injusto, aliás toda a nossa tributação é cheia de injustiças, na medida em que esse 6nus é distribufdo pela população inteira e é distribufdo tanto pela forma direta como indireta. Porque não é só o fato de que a população está pagando os metros de fio, os quilómetros de asfalto, os metros de cano, os postes, não é só isso, ela está se deslocando pra mais longe. A primeira questão é da propriedade, a segunda é a questão da distribuição dos equipamentos urbanos que provêm do poder público, os hospitais, as escolas, os serviços, etc. A distribuição deveria ser feita de acordo com as necessidades da população e não com o nfvel social e económico do bairro. RegitJes mais adensadas, população mais carente, mais gente, maiores necessidades, então essas áreas necessitam de mais serviços, mais escolas, mais unidades de assistência médica hospitalar. Mas se você pegar o mapa de Fortaleza e superpuser a esse o mapa dos equipamentos urbanos, você vai ver que a coisa não ocorre assim, mas exatarnente ao contrário. Os equipamentos públicos são geralmente colocados em áceas de alto valor imobiliário ou de expansão em ter-

de valorizaçaõ desse potencial imobiliário. Porque se coloca uma Imprensa Oficial lá na Agua Fria? Centro de ConvençtJes lá na Agua Fria? Porque localizar o Centro Administrativo léJ no Cambeba? Como? Oual o motivo? Qual a razão de ser? A gente não encontra nenhuma razão de ser senaõ a valorização de determinadas áreas. O equipamento, seja ele público ou privado tem um caráter inicial de valorização da zona porque ele leva a infra-estrutura água, luz, telefone, esgoto, ele começa a desbravar aquela fronteira imobiliária . Isso inicialmente, depois ele começa a se constituir em um problema, porque ele é elemento gerador de tráfego, e as vias não foram dimensionadas pra receber determinados equipamentos, isto apenas como um exemplo. Então, a partir da localização de um equipamento a área começa a se supervalorizar. O grande equipamento urbano direciona o crescimento da cidade. E no caso de Fortaleza isso fica bem marcado. Fortaleza tem uma zona rica, que é a zona leste, e uma zona pobre, que é a zona oeste, e tem uma periferia miserável. Então, os grandes equipamentos públicos ou privados estão sendo sempre direcionados pra zona leste, apesar de ser na zona oeste que a popupalão apresenta maiores necessidades desses equipamentos. O problema da localização dos equipamentos públicos é uma coisa que deve ser estudada em funçaõ da necessária democratização do ai:esso a esses equipamentos por parte do conjunto da população. Que a iniciativa privada faça isso, a gente entende, mas que o poder público faça a mesma coisa que a iniciativa privada, a gente também entende, mas naõ deveria fazer. Além disso, quanto aos equipamentos colocados em zonas periféricas, a maioria deles ll'em sempre com aquela conotação de coisa destinada à baixa renda. Cada vez mais estamos nos acostumando a que exista uma baixa renda, e que se tem que fazer coisas com as quais essa baixa renda se sinta em harmonia. E com isso se vai cristalizando as estruturas de classe e de dominação. Não seNa muito mais óbvio que ao invés de se ter programa habitacional pra baixa renda, programa de saúde pra baixa renda, programa de transporte pra baixa renda, programa de alimentação pra baixa renda, lazer pra baixa renda, ter um programa pra elevar a renda desta baixa renda? Um outro aspecto que se tem que enfocar numa posslvel reforma urbana é a autonomia dos municfpios. Autonomia municipal, não é só eleição de 4 em 4 anos. Se fosse, as cidades do interior estariam cheias de autonorr.ia. Autonomia municipal e· autonomia polltica, administrativa e financeira. Autonomia pol!'tica seria o munic(pio poder traçar sua própria atuação polftica, e isso passa inevitavelmente por um proresso de democratização do próprio poder, das próprias decistJes municipais. Portanto naõ é só eleição de 4 em 4 anos, porque pode ser que se eleja democraticamente um prefeito, que passe quatro anos administrando autoritariamente a cidade. Teria que se ter fundamentalmente, um incremento de participação da comunidade nos destinos da cidade. E isso não é nenhum bicho de sete cabeças, é apenas uma questão de se democratizar também as finanças e a administração. to poder municipal prestar contas de seus atas aos habitantes da cidade. t se ter franco acesso a tudo que está acontecendo na administraçaõ municipal e se ter mecanismos, a partir da informação, que nos permitam opinar e decidir sobre as questtJes que nos afetam diretamente. mos

Proposta 12


A autonomia municipal permitiria uma melhor aplicação dos investimentos municipais, e tomando como base a democratização do poder municipal levaria a um incremento da participação da população no processo decisório, e conseqüentemente a uma melhor distribuiçaõ dos equipamentos em toda a cidade. Essa questão da autonomia municipal, da democratização do poder municipal. da própria gestão democrática da cidade, é claro, está vinculada a todo um processo maior de conquistas democráticas. Isso não vai acontecer num pals de regime autoritário, evidentemente faz parte de um processo de conquistas democráticas pelas quais devemos lutar. E passa, também, a questaõ urbana, pela estruturação de uma política tributária que permita uma participaçaõ equânime das regiões e dos municlpios em termos de repartição do bolo nacional. Porque hoje, o que fica para o município é ínfimo e insignificante em relação ao que é produzido naquele município. Claro que tem que ser uma coisa pensada em termos nacionais. S evidente, a gente não pode deixar de registrar, que a cidade é a materialização do modelo económico vigente em qualquer pals do mundo. Seria muito ingénuo, até infantil, pensar que se pode ter uma reforma urbana no marco do atual modelo eco-

nômico, de caráter concentrador, porque este modelo precisa dessa situação como requisitos, dessa política concentracionista, da falta de autonomia dos municlpios, porque ele concentra todos os investi· mentos e controla tudo. O modelo é concentrador concentra economicamente, centraliza poli ticamente: centraliza administrativamente, portanto, dentro do modelo económico que está al é posslvel de pensar numa reforma urbana que realmente venha a atender de alguma forma, ou pelo menos minorar o sofrimento da grande massa urbana, hoje totalmente desvalida. Havendo essa reversão do modelo, nós chegaremos a um novo tipo de situação, com a reativação do mercado interno, com um processo de redistribuição de renda, tanto a nlvel regional como individual. Essa situação nova, do meu ponto de vista é intermediária. Não é esse o objetivo final, chegar a uma sociedade distributivista, que promova esse tipo de distribuição, de controle da propriedade, no sentido que ela se harmonize um pouco mais com as necessidades sociais. Isso seria um ponto de partida. Seria um mfnimo necessário para se começar realmente a mobilizar a população e trabalhar no sentido de obter conquistas maiores, porque essa reversão possibilitará, creio eu, uma condição de trabalho pol/tico qualitativamente superior ao que se tem hoje.

Entrevista com Francisco Afonso Pereira Lima Secretário Geral da União dos Moradores do Jardim Iracema- UMJIR Pergunta : Como o pessoal do Jardim Iracema está vendo essa questão da seca? Resposta: Pensando bem, a gente escuta e já sabe de frases antigas iguais a esta: "nem que eu tenha que vender as pedras de minha coroa o Nordeste será prioridade". O governo atual ratifica essa frase. Mas a gente nota que o NE cada vez está mais esquecido. A seca está virando o comércio da seca, a indústria da seca. O governo não liga para a seca, naõ toma atitudes reais porque não tem interesse em resolver isso. Primeiro, a seca é uma maneira dele tirar votos em época de eleição; segundo, a seca é também uma maneira de deixar o NE esquecido, lembrado só na hora de tirar recursos- porque o NE é uma grande máquina da qual se servem os governadores para obter recursos financeiros junto ao governo federal - e aqui chegados tais recursos os mesmos não são aplicados, nas suas verdadeiras fina lidades e sim nas propriedades de grandes po/lticos ou latifundiários ligados aos esquemas dos que têm o poder sob seu controle. Se a gente ver o NE, particularmente o Ceará, está at: 5 (cinco) anos de secacom perspectiva de mais 1 (um) ano. E a gente pergunta: o que o governo estadual está fazendo? E a resposta chega logo: nada, praticamente nada. Toma atitudes paliativas, dando um alimento aqui. outro ali, quando na verdade o povo está querendo é emprego; o povo está querendo é frentes de serviço na periferia de Fortaleza. Enquanto isso, o governo dá migalhas, enganando o povo novamente, pensando que o povo está indo nesse "papo". Já está havendo uma verdadeira conscientização nos bairros e nos sindicatos para que o povo exija frentes de trabalho, peça melhorias para os seus bairros e para suas famílias. Fortaleza, segundo as estatlsticas, está crescendo, mas o que a gente nota, a gente que mora em

bairro, é que Fortaleza está inchando. Fortaleza está inchada, cheia de favelas. Fortaleza tem hoje muito desemprego e bastante violência. Senão vejamos: as pessoas que moram no interior, estão vindo para a Capital atrás de emprego porque o que existe lá fica sempre a serviço dos grandes proprietários, colocado nas suas propriedades - bolsões da seca, perfuração de poços profundos, construção de açudes, etc. E esses senhores só distribuem aquelas verbas michadas pouca coisa mesmo, para os lavradores. E esse povo que só é lembrado na hora das campanhas pollticas está correndo para o centro de Fortaleza. E a gente nota que Fortaleza está inchando; é favela em todo canto. MultidtJes se aglomerando nas praças públicas; multidões saqueando; mas multid(Jes estão al sem um líder; multidões que precisam que o governo ligue para elas. E o governo está al discutindo se existe no Estado um governo paralelo, se o Governador Gonzaga Mota é paralelo, se o ViceGovernador Adauto Bezerra é paralelo. E esquece que o povo está passando fome. O governo federal é com pacotes e mais pacottJes. Coloca Ministros, tira Ministro. Faznedo queimas burocráticas. Quando a verdade é esta : se o Brasil perdeu sua soberania, o NE faz tempo que perdeu sua autonomia. O NE, desde D. Pedro, é prioridade. Prioridade só para seus "llderes" tirar recursos do poder central. Recursos esses via de regra não aplicados devidamente. A irrigação será a solução - desde que seja feita para o beneficio do povo, dos trabalhadores, nas comunidades e não nas grandes propriedades ou para beneficiar ao po/1 tico e ao latifundiário. O povo quer que as coisas sejam feitas nas suas comunidades para que ele tenha condiç(Jes dignas de vida e não mais venha a pedir cartaõzinhos a polfticos para poder comer uma vez por dia.

Proposta 13


Entrevista com Eurico Francisco de Sousa, Presidente da FETRAECE, Fed. dos Trab. na Agricultura do Est. do Ceará PERGUNTA: Eurico, nós gostaríamos de saber como é que você, como representante do movimento sindical rural, aqui, no Estado do Ceará, está vendo a situação do trabalhador rural depois desses 5 anos de seca consecutivos que a gente está vivendo? RESPOSTA: Companheiro, Sabemos nós que a seca no N E é uma coisa secular, conhecida em termos nacionais, ou melhor, até mundial. Os Governos são culpados dessa m1séria, dessa fome, que os traba~ lhadores rurais vem atravessando. Faz 18 anos que o Movimento Sindical reivindica Reforma Agrária para o NE, para o pa(s e, infelizmente, as autoridades não atenderam às nossas reivindicações. Está a( a fome, o desemprego, a miséria, trabalhadores morrendo de fome, trabalhadores morrendo de sede e, foi justamente a falta deSse atendimento a causa de tudo isso. Quando nós começamos o Movimento Sindical, nós era taxado de agitadores e subversivos pelas autoridades. Se os Governos tivessem atendido às nossas reivindicações, os trabalhadores rurais cearenses, os trabalhadores do N E não estavam passando a miséria que estão passando hoje porque a Reforma Agrária é o conjunto de medida que ia trazer riqueza para o NE, ia trazer riqueza para o país. Se o Governo tivesse feito maior tivesse desapropriado terra, tivesse desapropriado aquelas áreas úmidas na beira dos rios, do Rio Jaguaribe, Banabuiu, S. Luis do Guru, esses açudes que estão ai, Rio Acaraú e tivesse feito essas casas populares no meio rural não teria ocorrido, em conseqüência, esse desastre que hoje assistimos. Ao contrário, o governo não atendeu nossas reivindicaçiJes, não fez Reforma Agrária, não desapropriou as área~ úmidas, não fez maiores depósitos de águas. Estão a( as conseqü~ncias, está aí o desastre. Nós sabemos está a1 · o trabalhador, a falta de assistência médica, tudo falido, estaõ a1 . os trabalhadores rurais, a falta de terra, enfim, a situação se agravou de tal maneira que o Mov. Sindical não sabe mais o que fazer. Já fizemos Encontros, rios de Encontros; já fizemos reivindicações, rios de reivindicações e está a1 o problema mais sério do mundo. A gente viajando por esse mundo afora, agora fui na Aiuaba: acabei de ver gente despida, mãe de família, pai de família)não tem mais nem roupa para vestir, eu acredito que se o Governo não tomar as providt!ncias, se não mudar a estrutura, que nessa estrutura que está al não tem solução e a solução é mudar a estrutura. Sabemos nós, que o Mov. Sindical não é a soluçaõ, é o caminho da solução. Quem está com a soluça-o é o Governo e, se não mudar essa estrutura que o país tem, eu sinceramente não vejo soluçaõ. Vejo solução se mudar a estrutura dessa pafs. PERGUNTA: Nós temos ouvido, quase que diariamente pela grande imprensa, tanto através de jornais como através do rádio e da TV que o Gov. Federal está fazendo a Reforma Agrária no Brasil. Hd poucassernanas, o Governador do Estado do Ceará, em entrevista coletiva para o Jornal do Brasil falou que aqui no Ceará ele estava fazendo a R. Agrária através do /TERCE, distribuindo títulos de terras para os agricultores. Como é que você ~ essa colocação do Go v. em relação à R. Agrária quan.do você mesmo acaba de dizer que o Governo não

está fazendo? L f!E~POSTA: Até hoje, eu posso lhe dizer que nãQ_ fõt fetto Uf!? palmo de R. Agrária no NE e no pa(s. R. Agrária é diferente das coisas paliativas que estão ~ fazendo por al Sabemos nós 9ue as áreas, esses t1tulos de terras que estão dando at aos trabalhadores, estão diminuindo a terra de quem já tem; nós sabemos que estão dando título é nas terras devolutas .. Sabemos nós que essa terra naõ é de proprietário, nem é do Governo. Essa terra é de quem está aí em cima, segundo o Estatuto da Terra. Aquela terra é dos trabalhadores rurais. Apenas eles estão dando um tltu/o de terra para discriminar a área dos trabalhadores, entre um e outro, eles dizem que isso é R. Agrária. Eu desconheço que isso seja R. Agrária. Eles dizem que com esse título o trabalhador rural tem direito a fazer empréstimo. Ora, se nem os proprietários que tem seu documeniô registrado, donos de suas pequenas áreas de terra não tem acesso ao Banco, que se dirá do pobre do trabalhador rural com um papel desses na mão? A prova está a1: Ninguém consegue empréstimo. Eu desconheço R. Agrár~a feita no NE p~rque R. Agrária feita segundo a lei 4.504 naõ é 'dessa forma, não. R. Agrária é o conjunto de medidas que vem de desapropriar as terras gratuitamente para os trabalhadores rurais um conjunto de medidas que vem trazer emprésti~ mos, é um conjunto de medidas que vem trazer assistência técnica, é um conjunto de medidas que vem trazer assisMncia médica para o trabalhador e que até hoje naõ vi ainda. Eu pergunto, que é que esse pobre do trabalhador vai fazer com esse tltulo de terra discriminando esse pedacinho dessa área que ele tem~ Eu pergunto o que é que ele vai fazer se não tem nem água nem comida. O que é que ele vai fazer em cima dessa terra·- sêín ter acompanhamento, sem nada. Eu acho que a coisa se complica cada vez mais porque melhora não tem não. O problema está a l. . . os tra· balhadores rurais, o problema do DNOCS é um cativeiro . . . R. Agrária eu não conheço. tudo coisa paliativa. PERGUNTA : Essa situação de seca que o NE está passando o Governo tem tentado responder com a construção de açudes, obras que eles chamam comunitárias que, na prática, a gente sabe que essas obras vão embora com as primeiras chuvas O M. Sindical, pelo que a gente sabe, tem também urna proposta para resolver o problema - eu não digo para resolver o problema da seca, mas pelo menos- para resolver o problema da convivência do homem com a seca qlfe é uma coisa que está aí já provado que fJ previ~ stvel, então pode-se tomar medidas pará neutralizar os efeitos deiSa seca sobre o trabalhador rural princi· palmente. Qual é a proposta do M. Sindical Rural especificamente do N E e do Ceará, para resolver ~ problema do homem do campo que está constantemente aí sofrendo os efeitos dessa seca? RESPOSTA: Primeiro, é mudar a estrutura ~tá errad~·~bm essa estrutura que está al, como e~ iá disse, não tem nenhuma condição de resolver o prob~ema do trabalhador. Segundo, falando dos Bolsoes da Seca, a construção de barragens Eles estão fazendo al a barragem Sonrisal. Quando chover acaba.. E a maioria dessas barragens é feita em área;

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Proposta 14


'pnvadas dos patrões. E feita nas capoeiras. Na hora que terminar, que vier o governo, automaticamente os patrões dirão que acabou-se, que o trabalhador não tem direito a nada. Que nós sabemos que tem a Resolução n. 2 que disse que esse trabalho deve ser feito nas áreas de trabalho comunitário, obras públicas e fazendo trabalho comunitário. E até hoje, eu digo sinceramente, eu não vejo - pode existir - um trabalho comunitário, um trabalho de obras públicas mas sempre é feito em áreas privadas, de patrões. Eu acho que, a medida- como eu já disse - é a R. Agrária propriamen te dita, de imediato para sanar a situação dos trabalhadores rurais. Pelo contrário se um dia não sair a R. Agrária propriamente dita' não tem solução para o homem do campo. vodi veja lá, se um pobre de um trabalhador vai trabalhar terras alheias, planta de metade, ele broca, ele cerca, ele prepara, faz tudo e depois entrega a metade para o proprietário. Se o pequeno proprietário não tem nem mais condições de plantar, falta de credito, falta de tudo, que tem seu pedaço de terra, que vive em cima de sua terra. na sua casinha e o pobre do trabalhador rural que vai plantar as terras alheias de metade para os patrões, pelo amor de Deus, não tem nenhuma condição de fazer mais a riqueza de nosso país. Não existe, eu não vejo meio, porque o meio é mudar a estrutura, é fazer a R. Agrária, outro meio não tem não. Sou sincero a dizer, outro meio não tem não. Quanto ao problema da seca, até hoje o Governo só fez coisas paliativas. Sabemos nós que quem domina os bolsões da seca é a politicagem, é os políticos. Vem a GESCAP, vem a SUDENE com 300 vagas, com 500 vagas e e/tis dizem que quem arranjou foi eles e estão negociando com essa miséria que tem a( negociando cada um para as políticas deles, negociando a fome do trabalhador . . . que eu acho que esse é o maior crime do mundo, sinceramente para mim os bolsões da seca, eu tenho como o maior escândalo que eu já vi na minha vida. Eu vi as mulheres_, os meninos, lá em Coreaú, trabalhando as três horas da tarde, trabalhando para o proprietário, mulheres empurrando carrinho. Pelo amor de Deus, se a emergência é para amenizar a situação do t~/;>.Ê}hafl_or ajudar, enUio porque vem uma emergênCia para matar? Isso é que eu vejo em todo o Estado do Ceará, é o pessoal todo morrendo de fome e de sede, nós sabemos que vem um rombo de dinheiro para o N E, mas infelizmente a aplicação desse dinheiro, não é aplicado em benefício do trabalhador. Então eu pergunto, se vai resolver o problema do trabalhador? Cada vez vamos ver que milhões e milhõessão gastos e o trabalhador continua morrendo de fome . Onde está, que aplicação é essa, que estrutura é essa, que beneflcio é esse que sai para o NE? Pelo amor de Deus. PERGUNTA: O dep. estadual Fernando Mota tem se caracterizado na A. Legislativa apesar de se; do PDS, como um crítico severo da polltica do Governo, para o Nordeste e o Programa dos Bolsões da Seca, achando que são programas paliativos que na realidade não resolvem os problemas da região e dos trabalhadores. Essa preocupação dele é concordada também pelo M. Sindica}, conforme você acabou de ressaltar aqui, e os Partidos de oposição. Mas ele apresenta como proposta para resolver o problema do desemprego, o problema da seca, o problema do NE, principalmente aqui no Ceará, um programa de irrigação das propriedades localizadas nos vales que vocé já falou aí, que deveriam ser desapropriados para R. Agrária. Entaõ ao contrário essas propriedades com irrigação gerariam mui to emprego e resolveriam o

problema da mão,;ie-obra no campo. O que vocO acha da proposta dele? RESPOSTA: De minha parte, eu não concordo. Uma, que eu seu como é que esse pessoal do PDS diz que a coisa está errada, ele não é um legislado; deste Pa ls? do Estado? eles não tem um deputado federal que legisla nesse pa ís, porque é que não tenta mudar essa estrutura? Eu acho que isso a1: ao meu modo de ver é apenas propaganda politica para eles e,_'!ganar, inclusive eu acho que ele é da Comissão da :!!8ca da Assembléia e até hoje eu não sei como um deputado da Com1'ssão da Seca da Assembléia até hoje, quando a situação está se agravando, quan'do a Federação grita pelas irregularidades dos Bolsões da Seca por conta dos latifundiários por conta dos políticos de lá e de cá, botando pessoas que não são trabalhadores rurais, latifundiários, gente rica, comerciante, eu não vi nenhum pronunciamento dele a respeito disso. Eu não vi chegar na Assembléia, no Plenário e dizer eu não ouvi nenhum pronunciamento dele a respeito disto, eu não vi ele chegar no Plenário e gritar "tem que tirar todo mundõ que naõ é trabalhador rural". Então quem vai fazer as irregularidades é os próprios políticos. Eu não estou entendendo, eu digo sinceramente, eu acho, parece que é apenas uma coisa de pura propaganda, eu discordo eu vejo ele falar para lá e para cá, mas no fundo me~mo eu naõ vi um manifesto dizendo que existe polltica dos bolsões da seca, e tem que tirar todo mundo de lá. Então na hora, eu acho que a Comissão da Seca era o primeiro artigo ... PERGUNTA A proposta dele, em vez de discutir terra para' o trabalhador, é resolver o problema través da geração de emprego no campo, então se irriga as propriedades que j;J existem em vez de desapropriar, porque essas propriedades irrigadas vão gerar emprego. RESPOSTA: Olha, é o que eu acabei de dizer, é justamen te ele quem não quer desapropriar as áreas não quer que desapropriem as terras porque auto~ maticamente vai bulir com eles. Eles são latifundiários quer que apenas haja, como é que se diz, um trabalho em cima daquela terra para beneficiar eles, mas não beneficiar o trabalhador, que nós sabemos que é uma escravidão para o trabalhador. Trabalhador está trabalhando até para os patr&s, então, automaticamente, ainda é um passo que eles estão lutando para que sejam mais beneficiados ainda, pelos trabalhadores rurais, pelos bolsões da seca. Eu acho que está errado, que o ponto de vista doM. Sindical brasileiro é R. agrária propriamente dita; o que vem resolver o problema do trabalhador rural é R. Agrária no duro, de imediato, é o contrário da proposta dos proprietários: não se desapropriar terra, botar os trabalhadores rurais para trabalhar de graça, a troco de comida para preparar a terra e beneficiar as propriedades. Agora na hora que cortar o bolsão da seca, eles ficam com a terra toda beneficiada e o desgraçado está lascado novamente e sem um pedaço nem para plantar o feijão. AI é que é a escravid_ão! Foi para as terras do patrão, trabalhou mwto, trabalhou 6 meses 1 ano, então quando foi beneficiado, automaticafnente, toma os pés dele. Eu digo sinceramente, isso para mim é um crime. PERGUNTA: Eurico, a gente tem visto a Federação defender, como voce já falou aqui há pouco tempo, a desapropriação imediata das áreas ú,midas existentes no Estado, Vale do Jaguaribe, Vale do Acaraú, então você poãeria dizer, quantos hectares de terras existem hoje no Estado do Ceará e quantas

Proposta 15


farnl'lias poderiam ser assentadas, beneficiadas com essas áreas se o Governo resolvesse realmente desapropriar essas áreas e distribuir com os trabalhadores? RESPOSTA: Companheiro, nós sabemos que desapropriando as áreas úmidas não é a solução total dos trabalhadores do NE, então a gente queria apenas começar por al, e já seria um passo. Ora, o i(ale do Acaraú é 200km e se desapropriasse 1 km para um lado e 1 km para o outro lado, eu digo sinceramente, dava para agregarmilhares de fami1ias, quem sabe quinhentas mil famllias dava para botar. Var mos dizer o seguinte, o . açude Orós, também o açude Forquilha e outros açudes at: desapropriando essas terras, automaticamente, vai dando condições para que o homem plante, desde cedo, faça suas casas, faça casa popular, então já la, já era um passo dado. Já que a Reforma prooriamente dita não sai, então seria já começar por esse meio. Jaguaribe al, quantos milhões de terra, para se aguar Banabuiú, aquele outro de S. Luis do Curu, Frexeirinha, então eu acredito que essas áreas, todas essas áreas desapropriadas já agregavam muitos trabalhadores, muitas faml1ias que não iam morrer de fome. Eles iam plantar e vencer porque eu conheço o Ceará todo e digo sinceramente, eu não tenho assim um número aproximado, mas eu tenho certeza que dá terra para muitos pais de famflia, muitos e muitos pais de famllia, dá milhões de hectares de terra se fosse tudo isso desapropriado no Estado do Ceará, dá milhões de hectares de terra para ser desapropriada. Seria um passo para os trabalhadores rurais, tenho certeza que seria um passo, não é a solução, mas seria um passo para conseguir a R. Agrária total. PERGUNTA: Seria trocar o capim pelo feijão na beira dos vales ... RESPOSTA: E, trocar o homem pelo boi, então em vez de plantar milho e feijão, planta capim. Agora nós vlamos léguas e léguas de, capim e os pobres dos trabalhadores rurais se quiserem trabalhar plantando capim para os patrões e os patrões levando o capim, aguando, de domingo e de sAbado, todo dia, e o patrão dava o feijão para plantar de metade ainda, Zelando do capim do patrão todo dia e plantando o feijão de metade, um absurdo. PERGUNTA: Eurico, a gente sabe que há pouco tempo, foi realizado um Encontro das Federações e dos Sindiatos do NE em Teresina e eu estive lendo o Boletim da CONTAG e fala que uma das deliberaçãoes que foi tirada nesse Encontro foi tirar a última semana do mês, de 24 a 31 de outubro para fazer atívidades. Então você poderia dizer assim, qual é a programação que está prevista para essa semana de 24 ao 31 de outubro? RESPOSTA: Companheiro é o seguinte, nós estivemos reunidos em Teresina, saiu um documento e você sabe que o problema é tão diflcil, o problema da pobreza, que até a gente se movimentar para mobilizar os trablhadores rurais, para dar andamento a essas decisões nossas, fica difícil. A Federação vive dos Sindicatos, da taxa de filiação, os pobres dos Sindicatos estão doidos, os trabalhadores rurais estão do jeito que estão, então nós estamos passando uma fase muito diflcil. A gente vê que é necessário fazer aquilo, mas está ruim de estrutura, não temos condiçtJes par;J realizar a programação como era nosso desejo, mas mesmo assim a Federação do Ceará convocou seu Conselho para o dia 18, dia 19, inclusive convocou as autoridades para nós refletir o documento de Teresina, estão convocados todos eles e vamos ver no dia 19 em diante que caminho que nós vamos tomar em cima dessas decisões das Federações do

NE. Então nós estamos ainda com esperança que esses trabalhos, que esssas decisões nós vamos continuar a trabalhar em cima dessas desciões. Eu digo o seguinte, olha, R. Agrária, é a solução; liberar os trabalhares rurais no tempo de plantio é outra solução também e só aceitar trabalho feito nas obras públicas e comunitárias é outra solução. E tentar tirar a politicagem suja que está al nos bolsões da seca. Esses 4 itens é que nós vamos começar a discutir em cima desse documento de Teresina é que vamos começar a discutir nos dias 18 e 19, para isso as autoridades, Governo do Estado, deputados. senadores. INCRA, !TERCE, todos convocados para tomar posição e vamos levar o problema as autoridades. E dal por diante nós começaremos com os Sindicatos. Todos eles vão receber o documento de Teresina, e vai começar a fazer Assembléia com os trabalhadores rurais e a posição é aquela. PERGUNTA: Quais foram as formas de luta que foram propostas nesse Encontro para encaminhar essas reivindicações que foram levantadas, a gente sabe que as reivindicações são levantadas e encaminhadas. Agora, qual é a maneira como vocês vão encaminhar essas lutas a nlvel de cada Municfpio? RESPOSTA: Eu acabei de dizer o ~~in_t]l;. 1 Nós estamos levando esse documento a apreciação dos Sindicatos e do dia 20 em diante nós já teremos, nós temos que ouvir nosso Conselho, temos que ler o documento e ouvir o Conselho e os Sindicatos, e deixa que do dia 20 por diante os Sindicatos vão realizar Assembléias se preparando para que, se o Governo não atender as nossas reivindicaçtJes, todos os trabalhadores cearenses, se não liberarem os trabalhadores rurais, todo o mundo, vai.para e em cima dessas decisões das áreas úmidas é outra posição que o M. Sindical vai trabalhar com os associados faziirassembléias e não aceitar mais trabalho feito em terra de patrões e, sim, terras públicas e comunitárias. Para isso os Sindicatos vão se preparar, vão realizar Assembléias e a nossa luta é essa aí. E também, tentar tirar por todos os meios, a politicagem dos Bolsões da Seca. Então eu acho que os Sindi:catas do dia 20 por diante vai seguir esse caminho, essa luta que só pode ser feita através dos Sindicatos, através dos trabalhadores rurais. Porque até hoje nós sabemos que os Sindicatos do NE ~m sido fracos e devem fazer as suas assembléias e tomar decisões e sabemos que não é fácil não. A estrutura montada, tudo com medo de perder seu emprego. Não é muito fácil o trabalhador fazer manifesto, o trabalhador rural já vive tão humilhado que não tem nem condições de se manifestar por medo de perder o emprego, mas mesmo assim nós temos certeza que os Sindicatos vão tomar qualquer posição a respeito disso. PERGUNTA: A gente viu, há poucos dias. na imprensa o Governador do Estado do Mato Grosso do Sul oferecer para o Governador do Estado do Ceará mais de 3 mt1hões de hectares de teffa para 5 mil famllias aqui do Estado do Ceará. Você como trabalhador rural e como Presidente da Federação dos Trabalhadores Rurais, acredita que aqui no Cear.á e no NE o Governo possa fazer alguma coisa para garantir a sobrevivência do homem em condições normais sem ser preciso a transferência de famllias daqui para outras regiões do país? Acha que tem solução o problema do NE? RESPOSTA: Companheiro, no dia em qL/8 eu soube dessa notlica, fiz uma entrevista para Rádio Verdes Mares protestando essa idéia do Deputado Federal do Mato Grosso do Sul. Olha, você veja

Proposta 16


o seguinte : o pessoal do Sul do Pals está sofrendo também o problema do desemprego, muitos deles estão desempregados, por que é que esse Governo, esse Dep. Federal não emprega esse pessoal de lá? Quer levar do NE para acabar de matar, porque sabe que o pessoal de lá não são bobos, não vfo ser escravos, são mais ou menos esclareCidos. É!!.J.[o para o dia 19 nós estamos discutindo esse problema, nós estamos fazendo pressão em cima do Governo para que nós ná'o vamos aceitar, os Sindi· catas não vaõ aceitar esse tipo de coisa. · Porque você veja bem: disse que são 3 milhões. de hectares de terra, disse que é terra devoluta, pelo amor de Deus, terra devoluta aqui no NE, no Ceará tem demais, porque que não faz o trabalho, o Governo, os deputados do NE não faz uma proposta para botar os trabalhadores rurais para trabalhar nas terras devolutas, desapropriar as terras e botar os trabalhadores para trabalhar? fazer poços profundos? Então é preciso que o pessoal do NE deixe as terras devolutas do NE e vai trabalhar as terras devolutas do Sul, isso é um absurdo companheiro. Eu estive em Brast: lia e o Presidente do Sindicato de lá disse que muitos trabalhadores rurais, tinham voltado porque é a maior escravidão do mundo lá. Naõ aguentaram. E outra coisa que se deve refletir companheiro, como é, eu digo sinceramente, se este Governo fizer isto, eu não estou acreditando não. t melhor matar logo. Companheiro, isso é um absurdo, desacatar o pobre do nordestino, que está com sua casinha, que está junto com sua família e jogar para o Sul do país, sei lá, como um bicho, como um escravo de outrora, eu digo sinceramente, companheiro, é o tipo de coisa que o M. Sindical não vai aceitar de jeito nenhum; eu protesto a semana que vem, e os Sindicatos vão se manifestar e fazer Assembléias a respeito disso, porque companheiro, isso é um absurdo, pelo amor de Deus, isso naõ tem sentido (acaba a fita). PERGUNTA : Eurico, nós temos conhecimento através de dados do IBGE, que a populaçaõ de Fortaleza está sendo acrescida de uma população de 50 mil habitantes por mês, esse pessoal que está vindo, que está chegando aqui a Fortaleza, está vindo do interior, tangidos peloproblema da seca, tangidos pela fome, principalmente. A Federação está com uma programação, um monte de propostas, voltadas para o campo, e esses trabalhadores rurais que estão aqui agora, que vieram, chegaram do interior, e estão chegando diariamente aqui, aos milhares tangidos pela seca e andam perambulando pelas ruas. A Federação já fixou assim alguma reivindicaçaõ para o poder público para o atendimento dessas populações? RESPOSTA: to seguinte, as reivindicações que nós temos feito, a Federação, o M. Sindical . .. (inaudível) é R. Agrária, é desapropriaçaõ de terras no interior para que esse pessoal possa voltar para o interior. t dar condições para que esse homem do campo, e um melhor salário, para que ele não procure a cidade, isso já foi protesto nosso, do M. Sindical de anos atrás. Nós somos contra o êxodo rural. Acabei de dizer o seguinte: se o Governo tivesse atendido as reivindicações, se já tivesse feito a R. Agrária, construldo essas casas populares que faz aqui na cidade, se fizesse no campo eu acredito que esse trabalhador rural naõ estaria vindo aqui para a cidade, se ele ti-_ vesse condições no campo ele não vinha para a cidade. Coitados, eles vem, andam perambulando pela cidade a procura de algo para comer, procura emprego. Nós sabemos que todo mundo no campo está desempregado e quem é que pode dizer que tem emprego, é tudo mentira, ninguém tem emprego,

com meio-salário, isso não é emprego para ninguém, com uma inflaçaõ dessas. Então eu acho que quem está provocando isso é o próprio sistema que não faz a R. Agrária, que não dá condiçtJes no campo para que o homem naõ venha para a cidade, inclusive, as casas populares é um chama para o homem do campo. Está aí o desastre porque sabemos nós, companheiro, que se morrer o homem do campo, morre o da cidade. Anteriormente, quando o campo piorava o homem do campo procurava a cidade, ainda tinha um quebra-galho, uma ajudinha para sua famt1ia. Hoje a situação está de tal maneira com esse sistema, com essa estrutura que está af, que chegou a tal maneira que as cidades, estaõ igual ao campo. E tudo é gente procurando vir para a cidade. Entaõ eu acho que a Federação, o M. Sindical, já reivindicaram diversas vezes, claramente colocaram que era para fazer uma R. Agrária para que não aconteca o êxodo rural. Mas infelizmente esse sistema, eSsa estrutura que está al nunca atendeu nossa reivindicação. E o homem do campo vem para a cidade, chega na cidade, a cidade morrendo também que o homem está morrendo. São os alicerces do pais. Então as empresas não tem mais condições de empregar o pessoal. to desastre, o absurdo. Todo mundo pobre, al vem as doenças, a violência, está provocando a víolencia, está provocando tudo. Eu acredito que a pessoa com fome, faz violência mesmo. E eu acho que o único meio do M. Sindical é a R. Agrária com essas coisas construldas no campo. Seria a soluçaõ para o homem do campo. Se o Governo desse condições ao homem do campo, ninguém viria para a cidade, • antes, a cidade iria para o campo. O que está acontecendo é que está vindo gente do R. de Janeiro, de S. Paulo, que já foràm e dizem que não tem condições lá, que o desemprego lá está grande e estaõ voltando para o interior, para se inscrever no Bolsão da Seca. PERGUNTA: Nós vamos fazer a última pergunta para encerrar essa entrevista. A gente acompanha, através desses 20 anos de Governo autoritário que se implantou no país, a prioridade que se tem dado para outras regiões do Brasil em termos de aplicação dos recursos governamentais. Isso, em certo modo, induz o Nordestino a acreditar que o atraso do NE não tem solução. Você acredita que essa situação de atraso, não só aqui do Ceará, mas do NE inteiro, pode ter solução? RESPOSTA: Sabemos nós e essa pergunta deveria ser feita aos parlamentares, aos senadores e deputados, eles que são os legisladores do pals, eu acho qufi essa pergunta seria mais dirigida a eles porque é eles que têm dever de trazer isso para aqui, fazer com que as verbas venham para o N E, os recursos não sejam levados para o Sul do País, então eu acredito que os parlamentares do Sul do pals têm muito mais força do que os parlamentares do NE e parece que os parlamentares do NE, parece não, é certo, que só serve para bater palmas. Pelo amor de Deus, eu acho que poderia dar um tranco esses próprios deputados, esses próprios senadores esses próprios prefeitos, esses próprios governadores do NE podiam dar um tranco de uma vez nisso at: Então, o que vejo é o seguinte, deputados e senadores sem autonomia, sem autonomia para isso, então eu acho que, se eles tivessem autonomia, se eles fizessem o que prometeram, soubessem qual é o papel deles diante dessa classe pobre que os elegeu, que sabemos nós, companheiro, que o NE é classificado como NE-PDS. Infelizmente é classificado também como NE da miséria, da fome. Será que esses parlamentares

Proposta 17


não tim sentimento, de uma coisas dessas só ficam falando coisas de propaganda para não perder o nome, não perder seu valor politicamente, então , eu acho que aflOra com a reação das massas, você sabe os trabalhadores estão mais conscientizados, se agrupando, estão fazendo algumas greves, estão fazendo saques por af, estão se manifestando, então eles estaõ começando a sentir uma pressá'ozinha, você sabe, disso que o 2045, se fosse pelos senadores e deputados ele ia ser aprovado, mas deixa que a massa está fazendo pressá'o no sul do pa ls, no NE mesmo já tem feito pressá'o af, não é porque eles queiram, não, é a pressá'o que o M. Sindical está fazendo, que o trabalhador rural está fazendo para explicar para o trabalhador que isso é uma miséria.

negociar cpm o que é nosso, · pelo amor de Deus, esse decretg é unicamenre negociar o que é nosso. Eu pergunto, porque qt.}f! não tira do milionário. Eu acho que os únicos culpados disso, aos nossos recursos, as verbas do NE, nossos impostos irem para o Sul do Pals são os parlamentares, são os senadores os deputados estaduais e federais, governadores. E_u acho que eles são os culpados. Eu acho que eles tmham força para fazer pressão ao Governo e dizer: "A tE' agora carregaram para o Sul mas a partir de hoje naõ carregam mais, não". PERGUNTA : NE então tem solução? RESPOSTA : Claro que tem solução, agora com esses homens aue tem al . ..

Proposta 18


En»te.v-iÃt.a c..om PfW 6. Am~úc..o BaJUte.Vw Advogado; MurU.c..ipa.LLóta; e.x. - c_andidato a GoveJtnadott pel..o PT. PERGUNTA: Qual o quadro atual da seca no Nordeste e no Ceará? RESPOSTA: Os anos e os séculos não mudaram o inepto tratamento dado ao problema da seca no Nordeste e no Ceará em todos os governos passados e, p ior, no governo atual notoriamente mais incompetente e mesno comprometido com sua solução. O diagnóstico está a( conhecido, mas o tratamento é sempre emergencial, improvisado, insatisfatório, insuficiente, tudo premedi tadamente feito sem o mais remoto propósito resolutivo. A própria expressaõ "Bolsões da Seca" é de notória impropriedade, posto que "Bolsões" deveria significar manchas isoladas, descontinuas e distantes de segmentos de flagelo pontilhando o universo nordestino. E isto não é verdade. Por outro lado o caráter emergencial da polltica dos Bolsões agravou o que parecia o impossível: elevar o incrlvel desperd(cio dos dinheiros públicos em obras de nenhuma aproveitabilidade social e económica, obras imp.·ovisadas, sem durabilidade, sem seguração e sem efeitos reprodutivos na economia. Ao mesmo tempo não resolveu de imediato o problema da fome, não alcançou toda a população flagelada, aviltou mais ainda o homem, comprometendo não apenas sua liberdade, mas sua própria dignidade pessoal pela servidão abjeta a que pretende resuzi.fo. Por outro lado permitiu a degradação salarial, cada "atestado' ganhando menos de um terço do já ridléulo salário mfnimo regional, não corrigiu a roubalheira antiga e aumentou a corrupção generalizada. Milhões e milhões de homens, mulheres e crianças escavacando a terra para nada, como condenados ao castigo de trabalhos forçados, sem deixar no seu rastro uma só obra resolutiva, gastan do bilhões e bilhões de cruzeiros, num brutal desperdlcio, deixando na esteira do caminho sem destino e sei objetivo, o trágico saldo das cruzes sobre as covas dos que sucumbiram. L: isto a política dos 'Bolsões da Seca" do bem-posto, bem ensaboado, bem despenteado Ministro Mário David Andreazza PERGUNTA: Qual a solução? RESPOSTA : Soluçaõ existe. E é sabida. Não padece qualquer dúvida quanto à viabilidade do Nord8Ste. Se não houvesse a menor prova disto bastaria observar que esses cinco anos de seca implacável e a não menos implacável incompetência do atual governo o Ceará e o Nordeste sobrevivem. Imagine-se que fossem adotadas medidas racionais,já conhecidas. L: claro que há a solução definitiva, mas esta não se pode impor de repente. E necessário implantar as soluç{Jes intermediárias paulatinas. Há, como se sabe, vários nordestes dentro do Poligono das Secas. Desta evidência resulta a conclusão de que o tratamento dado a cada nordeste não deve, e não pode ser o mesmo! Diversas áreas nordestinas oferecem bons índices médios de pluviosidade. Outras apresentam satisfatórias condições de umidade, enaunto algumas podem ser irrigáveis.

Mais ainda: Quando existam as condiç{Jes ideais para a construção de barragens médias e grandes isto é, quando pré-existem uma bacia hidrográfica e a correspondente bacia hidráulica é, ao mesmo tempo, uma garganta onde erguer a barragem de grande porte abaixo da qual se estenda um vale fértil, passará a existir de irrigabilidade económica, produção de peixe e agricultura de vazantes em torno da bacia hidráulica. Uma barragem de médio porte por diante pode resistir de dois a quatro anos de seca. Resiste, produzindo, às crises dimáticas. Portanto as unidades fundiárias dotadas desse tipo de estrutura toma a população ali localizada menos vulnerável ao flagelo. A baixos custos, com a introdução de algumas medidas de proteçaõ do homem que mareja essas terras e de desest/mulo as rendas espoliativas, essas unidades rurais podem coexistir com a reforma agrária, exigência resolutiva do problema nordestino. Fazer reforma agrária com o Estatuto da Terra e através do Incra, do Projeto Sertanejo e da Sudene será programa para estar cumprido no fim do primeiro próximo milênio. Mas não se pode esquercer que uma retorma agrária tão ágt1 como a desejável naõ pode ser instantânea, pelos problemas colaterais que encerra, inclusive porque se tratando de um processo de mudança social profundo e induzido, reclamará um estágio preliminar de etapas intermediárias. A extrema vulnerabilidade da população cam ponesa do Nordeste, aos efeitos da seca, que constitue o grosso da população da área, não permite esperar a implementação total das medidas resolutivas sem recorrer a medidas emergenciais. Como se justificaria· deixar morrer de fome milhões de nordestinos se prosseguir, em 1984, o a tua/ ciclo de secas? Só que as medidas emergenciais devem 1 dirigidas em busca das soluções definitivas. O prejuízo financeiro de, talvez trilhões de cruzeiros, gastos na "emergência", Frentes de Serviços, " Bolsões" e outros paliativos, foram brutalmente desperdiçados nos últimos anos, sem que se tenha aproveitado uma miníma fração em medidas resolutivas. Se se somar a isto os prejuízos económicos resultantes da crise climática se poderia ter uma visaõ aproximada do crime cometido contra o homem e a regiaõ em nome da solidariedade humana e a caridade cristã. De seca e de inverno os investimentos devem, precisam, se dirigir às soluções, de modo a urgenciálos. Nada deve ser gasto fora do proposto de resolver o problema. PERGUNTA: Como viabilizar a solução? RESPOSTA : Foi dito acima que há solução. Não há como negar esta evif:Mncia. E solução definitiva a prazo relativamente curto. · Existem estudos bastante bons, inclusive de solos e mapeamentos de áreas, sobre aproveitamento agrícola, agropastoral, agroindurtial dos vários nordestes, segundo a vocação de cada um deles. Pode conviver no Nordeste, e comtiver uma agricultura muito exigente em umidade e pouco

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exigente de água. Pode-se fazer em certas áreas, uma agricultura que exige a um só tempo, muita água e muito sol. Noutras se pode fazer uma agricultura quase sem água. Pode-se fazer, em termos de pecuária, desde a intensiva à extensiva de certas raças, variedades e espécies. Pode-se obter, por via genética - como é conseguir através da experi~ncia empirica, acelerar o ciclo vegetativo de várias plantas e dos cereais, aumen· tando-lhes a resistência à insolação. Pode-se elevar, com medidas bastante simples, o (ndice de produtividade por um idade de área, elevando a baixos custos o volume ffsico da produção por unidade de produto. Pode-se · também, com medidas simples, em algun$. ·casos como mera aplicação da fegisiação exis- · tente, elevar o rendimento do trabalho agricola do produtor sem terra ou pequeno proprietário, permitindo-lhe melhorar o padrão de vida e realizar alguma ,POUPé!lJÇa financeira ou econtJmica. · Pode-se, ainda com decisões administrativas, financ~iras e.---técnicas, desencorajar as atuais rondas

espoliativas que hoje pesam sobre o camponês nordestino . Pode-se melhorar qualitativamente os produtos da agropecuária, mas uma ve~ se recorrer a métodos de alta sofisticação, elevando seu valor comercial e sua capacidade competitiva no mecado. E assim se teria, rápida e crescentemente, elevado as rendas financeiras do campesinato - hoje mero produto de subsistência -- provocando a conseqüência natural, e fatal, da expansão do mercado interno no estura do qual se gerariam novos empregos. Tudo isto nada tem de capitalista ou mágico. Paulatina e concom itante se iria procedendo agilmente a reforma agrária desestimulando o latifúndio imp;odutivo, mesmo sem a coletarização ou estatização de todo o património fundiário. Por que não se fez ainda? Por que naõ se faz agora? Simplesmente porque o regime, o sistema e as constituições vegetais se beneficiam e se locupletam com a exploração do homem e da área e, por isto, criam atestando à liberação de uma e da outra para o desenvJ!vimento e para a libertação econômica. Mas isto já será outro aspecto do problema ...

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ENTREVISTA COM O DR: HYPERIDES MACEDO Vice-Presidente da Associação Brasileira de Recursos Hfdricos -- ABRH- Regional Nordeste

P - Como se encontra hoje, o Ceará, em termos de recursos h ldricos? R - Até a década de 50 inicio de 60, o Ceará armazenou em torno de 13 bilhões de metros cúbicos de água, entre açudes públicos e particulares. Quem armazena 13 bilhões, numa hidrologia do semi-árido, só pode dispor de pelo menos um terço deste valor anual. Isto signiNca que nós dispomos de 3 bilhões de metros cúbicos por ano. No Ceará, para irrigarmos, 200 a 250.000ha, que seria o ideal. (hoje só temos 20.000ha. irrigados) precisaremos dispor de 6 bilhões de metros cúbicos 1/quidos, de água. Falar em líquido significa deduzir toda a evaporação dos rios e açudes a infiltração, o que se perde nas calhas dos rios. E para dispor dos 6 bilhões líquidos, o Ce~rá precisa armazenar 30 a 40 bilhões de metros cúbicos dágua. Significa que nós temos que dobrar nossa capacidade de armazenamen to . E isso não foi feito nesses últimos 20anos. A pol /tica seguida no Cear;i foi a mais exaustiva dos recursos h fdricos que é a política de irrigação desvincuada de um programa de armazenamento dágua. O programa de irrigação não poderia ter abandonado o programa de armazenamento dágua. O Ceará dispõe de potencial de execuçaõ de grandes reservatórios. Só para se ter uma idéia, a má distribuição desse armazenamento, em termos gerais, se refelete no seguinte: vale do Coreaú, um dos mais importantes do Estado, só foram aproveitados 8 por cento dos recursos hídricos; vale do Acaraú, uma das bacias mais importantes do Ceará, apenas 14 por cento; vale do Jaguaríbe, que foi mais desenvolvido, apesar dos açudes Orós e Banabuiú, somente 60 por cento. Isso significa que o Ceará, como um todo, só aproveitou 40 por cento do potencial armazená· vel dos seus recursos hídricos superficiais e, talvez, 25 por cento dos seus recursos subterràneos. de forma estimativa. Portanto, o Ceará, pode suplicar ou mais que isso - o armazenamento de seus recursos superficiais e quintuplicar seus recursos subterrâneos. l importante ressaltar que os recursos subterrâneos representam apenas 15 por cento do potencial h(drico do Estado, em relação aos recursos super. ficiais que representam 85 por cento. A políüca deve mais de açudes do que de poços. Foi um equívoco tentar desenvolver numa certa época, uma grande polftica de perfuraçaõ de poços. Na realidade, o poço é uma solução complementar e emergencial. A solução definitiva é a grande e média açudagem. P - Que outras medidas devem ser tomadas vinculadas à grande açudagem? R - O plano de irrigação do Nordeste, que incluiu o aproveitamento das várzeas do Banabuiú e do Jaguaribe de forma mais extensa, se iniciou na década de 70, no bojo do Estatuto da Terra, através de um instrumento chamado desapropriação por interesse social. Esse plano fazia parte do antigo plano da SUDENE, que foi resgatado pelo Governo Castelo Branco e intensificado até 75. Depois as verbas minguaram, não sei porque, e mais uma vez suspenderam o plano. O modelo básico do projeto de irrigação é a . desapropriação com o uso da chamada propriedade

familiar. Distribuição da terra em módulos compatíveis com a força de trabalho de uma famJ7ia, tendo como objetivo básico atender à população de baixa renda. Esse projeto continua, mas de forma incipiente, muito vagarosa. Isso porque a intervenção nas várzeas, regiões que possuem mais benfeitorías, criou politicamente uma re.açaõ contrária. Porém, existe um novo enfoque de irrigar os planaltos, os tabuleiros, não para fugir do problema politico, mas porque se sabe que os grande salas do Ceará não são várzeas, mas de planicies, a mancha de Paraipaba, o tabuleiro de Russas, saõ outros exemplos. Temos no Ceará, grande potencial de irrigar manchas onde não existe agricultura. Essas regiões poderiam servir de base para uma Reforma Agrária combinada com a irrigação, criação de empregos, de pólos de desenvolvimento, de agro-indústrias. Isso facilitaria a politica para a futura intervenção nas várzeas. Do ponto de vista social vejo o seguinte: no Nordeste irrigação e Reforma Agrária são inseparáveis. O Nordeste é semi-árido, não tem produtividade, portanto naõ acredito numa Reforma Agrária, sem irrigação, sem o incremento da produtividade. E isso é uma coisa que pouco se analisa. A gente sabe da má distribuição de terras. sabe da injustiça na r~laçãa de trabalho no campo entre trabalhadores e proprietários, mas acontece o seguinte: enquanto a irrigação produz 100 arrobas de algodão por hectare, a média da região do semiárido, sem irrigação é de 8 arrobas de algodão por hectare, o que significa dizer que a MEIA naõ dá nem para o trabalhador, nem para o proprietário. Se houver mais justiça para com o trabalhador, o que seria o ideal não haverá incentivo para o proprietário . porque 8 arrobas de algodão por hectare não compensa. Então, isso se chama "agricultura de subsistência", e nesse nfvel de subsistência só pode haver empobrecimento, desemprego, migraçaõ. Só há uma S.'lída para a fixação, para o crescimento e para o desenvolvimento como um todo que é a irrigação. Temos que romper o ciclo da agricultura de subsistência, e só se rompe com dois ingredientes . produtivos: o primeiro é a água, que é a irrigação e o segundo é a tecnologia. Tudo isso associado à Reforma Agrária. Eu acredito que, no caso do Nordeste, a irrigação é o único instrumento capaz de mexer na relação de trabalho no meio rural. A agricultura comum, o estatuto da terra, a lei, o direito do trabalha· dor, e talvez nem o fortalecimento do sindicato consiga alterar a relação de trabalho. Mas a irrigação sim, ela traz produtividade, traz crescimento, traz sobra. Não se pode pensar numa agricultura onde se trabalha 4 meses e os outros 8 o pessoal fica desempregado, esperando o próximo inverno, a irrigação emprega de janeiro a dezembro o que permitiria que essa população entrasse no mercado consumidor. Por outro lado a agricultura teria que adotar um processo de assalariamento, por parte das empresas, porque ninguém aceitaria mais a mei,1. A empresa que parti· cipar mais facilmente do processo produtivo, ela tem responsabilidade na comercialização, vai procurar as..çlariar o trabalhador, nem que adote um modelo de assalariamento mais alto, af talvez mudasse a re- .

Prposta

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laçaõ de trabalho. Para se ter uma idéia, no Ceará, nós temos água suficiente (desde que fosse armazenada) para irrigar 300 mil hectaes e com apenas 100 mil hectares irri· gados poderíamos produzir duas vezes e meia a produção de feijão que o Ceará precisa consumir. Então a AÇUDAGEM traz a chamada reserva estratégica de água, o estado e a I R RIGA ÇÃ O traz o que se pode chamar também de reserva estratégica de alimentos. Não que se vá comercializar apenas cultura de subsistência, porque a irrigação precisa comercializar, precisa ter produtividade, mas num período critico, como esses anos consecutivos de seca ela fun · cionaria como uma reserva de produção de alimentos. P - Na sua opinião porque foi suspensa essa política de irrigação e açudagem? R - O Programa não prosseguiu, acho eu, porque a abertura trouxe também a intensificação do prestigio da classe polftica, que no Nordeste, representa o pensamento das elites. Acho que foi a representação pai ítica do pensamento das e! ites que foi freiando o processo de irrigação e Reforma Agrária no Nordeste. Nossas elites sempre arranjaram uma maneira de transformar os recursos hidricos na valorização e na concentração da terra. E uma proposta socializada na região se não for protegida pelo Estado, será absorvida pelos interesses do grande capital. Vejamos este exemplo: nas décadas de 30 e 50 o DNOCS construiu um grande número de açudes públicos desapropriou as bacias hidráulicas e colonizou. E, como o Governo abandonou, praticamente, o apoio a essa colonização, o próprio dinamismo das forças pollticas e do capital ao redor, terminou transformando a colozação num arrendamento do grande capital, substituindo pouco a pouco a estrutura ali criada . Logicamente isso acontecerá - por sinal já está acontecendo - com os perfmetros irrigados, se naõ forem muito fortes. O grande capital, a grande influência agr(cola ao redor, começa a penetrar nos per/metros, começa a tirar algumas vantagens, sementes, mudas, o próprio adubo já estão vendendo para os proprietários ao redor. Então tem que haver um cuidado muito grande, por parte do Governo, em proteger esses pequenos bolsões de estruturas mais socializadas, que ele mesmo criou, para evitar que o capitalismo, que é muito dinâmico, engula por completo. O investimento público feito nessas áreas sem a proteção ao pequeno proprietário vai superva/orizando as terras vizinhas. E como agem as forças do capital? Vão adquirir até com propostas compensáveis as propriedades menores, e logo mais, no vale perenizado, se concentrou a terra, e o capital, valorizada a custa do investimento público, do imposto público e dos recursos hfdricos. Então, se não houver um objetivo social, se corre o risco de fazer investi· menta público para valorizar as terras para met~l dúzia.

P - Considerando todo esse quadro, que proposta você teria de solução? R - Falou-se muito em mudar o perfil da economia do Estado como se o Ceará fosse fazer só artesanato, fosse fazer uma indústria que criasse muito emprego na capital e fossse fazer mineração, como se mineração substituísse mão-de-obra agrfco/a. Nada substitui o grande contingente de mão-de-obra agricola. Nós temos que ser autosuficientes em ali-

mentos e temos que ter uma agricultura desenvolvida, essa é que é a verdade, e o que temos que fazer é mudar o perfil do meio rural. O problema da terra e da água que vinculam toda a problemática da seca só será resolvido com irrigação e reforma agrária, só assim se altera a componente social e estrutural do problema. Pode parecer um contrasenso, mas acredito que se deveria voltar um pouco ao raciocfnio da década de 50 em matéria de pol ftica de águas. Me refiro à primeira proposta da SUDENE, ainda no tempo de Celso Fur· tado e me refiro à politica do DNOCS também na década de 50. Enta-o seria: Fortalecimento da ação pública desses dois órgãos (DNOCS e SUDENE),Coordenaçaõ dos recursos da região,- P/anejamento e sua Execuçaõ obtendo firme posição polftica no Nordeste. Porque não se faz obras, não se implanta nada, não se faz programa nenhum sem uma solução politica, é ela que viabiliza. Temos que vender as idéias, fazer a pressaõ politica, que mexer, que agitar, que debater, que reclamar, o movimento sin· dica! tem que participar, senão não se faz nada. Ainda acho que a Reforma Agrária deve se pro· cessar nas chamadas manchas estratégicas. O Ceará tem importantes machas estratégicas para fazer a Reforma Agrária, essas áreas merecem a intervenção do Governo. As várzeas menos importantes não merecem investimento público, principalmente as que tem pequenas e médias propriedades, estas dedem ftcar com investimento privado, subsidiado pelo Estado. Portanto, não necessariamente se deve de· finir um modelo único para o Ceará, pode-se ter um modelo misto. A soluçaõ dada foi a de transformar o trabalho da emergência em benefício da propriedade parti· cu/ar, inclusive pagando muito mal. O que se ía fazer pagando um salárío normal; está se faznedo pagando um salário de fome . Essa é que é a verdade. Portanto essa soluçaõ não deve continuar. No mfnimo se aceitaria se fosse para construir obras públicas, grandes açudes e grandes projetas de irrigação. Os açudes que o Ceará tem foram fei tos no Governo de Juscelino, depois não se fez mais açudes. Esses barreiras frequentemente chamados de açudes "Sonrizal" que estão sendo feitos pelo Bolsaõ da Seca, além de não funcionarem, são tecnicamente muito perigosos. Um arrombamento em cadeia cria uma onda dágua que pode destruir acudes mais resistentes de porte médio. ·

Do ponto de vista de reservas dágua o Ceará tinha, em fins de 82, dois bilhões de metros cúbicos acredito que hoje ali1da exiata 1 bilhão e 200 milhões de metros cúbtcos dágua. E como, pela experiencia que temos, a evaporação vai aumentando à medida em que os açudes vão ficando mais rasos, talvez só possamos dispor até abril/maio de 84 de 600 mi· lhões de metros cúbicos. Conseqüentemente só tem uma sat'da que é chover no começo do ano. Se isso não acontecer vei ter que haver uma declaração de emergência mesmo. O Governo vai ter que mudar populações, vai ter que resuiaitar reservas dágua, vai ter que requisitar obras públicas como medida de segurança, vai ter que interditar algumas áreas. acredito até que vai ter que intervir na propriedade particular, vai ter uma economia de flUerra.

Pro osta 22


I

~

l

PRONUNCIAMENTOS

O FLAGELO CRONICO DO NORDESTE NAO SIGNIFICA CONFORMISMO Em todos os momentos e em todas as épocas o grito nordestino se 'fez ouvir por este Brasil continental

"Enquanto outras reg1oes do Brasil se orgulham de feitos antigos ou de riquezas modernas, a glória do Nordeste é como a dos santos e dos mártires, feita de provações e de dor"

"A Margem da História do Ceará'

"Tem se falado muito em açudes, medida que foi iniciada nos idos de 1833, sendo de lamentar que perto de 50 anos depois ainda seja necessário chamar atenção do nobre governo para esse meio de aliviar as secas do Ceani'~

Trecho do discurso pronunciado pelo Senador, e grande escritor brasileiro, José de Alencar em 1877.

Proposta 23


AS SECAS, A IMPREVID(NCIA E AS IMPROVISAÇOES "Falo, não com os passos vacilantes dos que não crêem, mas com a fé dos legendários defensores do Nordeste, que empreenderam longas jornadas em defesa de um povo castigado e oprimido. Venho dos campos estorricados de minha terra, onde se desencadeia calamitosa seca, ante os roçados abertos, na esperança das chuvas que não vêm, e clamam aos que ocupam um lugar na Câmara de Deputados e aos que sustentam o poder no desempenho de sua missão, disposições com maturidade da experiência. Ora, o que acontece --- e há de estarrecer - é que esta calamitosa seca foi prevista por equipes idóneas de cientistas, aos quais, mediante convênios, foi recomendada uma pesquisa. O trabalho, intitulado Prognóstico do Tempo a Longo Prazo, faz parte do relatório técnico ECA 6/78 e, como revela uma publicação do ano passado, foi conclu/do em dezembro de 1978, sendo uma pesquisa parcial do Projeto PROGMET, financiada em parte pela FINEP (convênio com o Ministério da Aeronáutica/FINEP n9 256/CT/75). Os cientistas, após enquadrarem os dados necessários e analisá-los matematicamente, conclu/ram que o Nordeste, no perfodo de 1979 a 1985, já entrada na faixa perigosa de um grande seca. Rotularam o trabalho com o timbre de Cinfidencial e o enviaram <is autoridades, para que tomassem providências relativamente ao desfecho da hecatombe. DIVIDIRAM O BOLO A seca, assim prevista, alcançou os l/deres da situação como no Festim de Baltazar. Começou-se, dia e noite, a· cuidar da sucessão, em dividir as fatias do bolo entre convivas, enquanto a imprevidência ia deixando para trás a problé'mática das secas do Nordeste, a preparação para resistir os sete anos das vacas magras .. como reza a Bfblia no sonho do Faraó. A história do Nordeste, especialmente a do Ceará, está pontilhada das preocupações dos seus estudiosos, que desde o Senador Pompeu, nos tempos do Império, a Guimarães Duque, nos tempos atuais, debruçados sobre os mapas das contingências geográficas, examinaram as causas e os efeitos das secas indicando sempre as alternativas de soluções. O famoso Senador Pompeu, o maior geógrafo do seu tempo, chegara no século passado, a examinar os indicadores das marchas solares, as causas telúricas ou extrate/úricas das secas e indicar providências de reflorestamento, a construção de açudes, do mesmo modo como na República; o Engenheiro Pompeu Sobrinho, cujo século d~ nascimento comemoramos. A esta altura, algumas perguntas pairam no ar como abominação da desolação contra os responsáveis da imprevidênda contra as secas, causas da miséria do povo : - Porque, sendo tão pequenas as áreas irrigáveis no Nordeste, em relação a dos outros pafses civilizados, não foram sequer construldos os canais de irrigação do maior açude do Ceará, o Orós, implantado graças à coragem imortal do Presidente Juscelino Kubitschek, restando os seus bilhões de águas armazenados na barragem como uma vergonha da imprevidência governa· mental, ante o suplicio de Tântalo do nosso povo? -- Por que, mesmo depois de prevista uma grande seca, como a atual, espera o Governo que a desgraça se desencadeie e seus Ministros em cada tempo e lugar, se desincumbam em romarias burocráticas para que a seca seja reconhecida não pela ciência, mas pela eofermiça e contumaz burocracia de retardados decretos? -- Por que não se acaba com a perversa indústria de projetas arquivados e sem execução, em que se gastaram montanhas de dinheiro, ou se recebeu assistência, em convênios, de pat'ses estrangeiros, a exemplo do Estudo Geral de Base da Vale do Jaguaribe, impresso em cerca de onze volumes e entregues às traças e cupins nos porões da SUDENE? Um deles, que, de modo competente e lúcido recomendava a construção de açudes, sob a epígrafe Polftica das Aguas, foi distribuldo em circulação restrita aos estudiosos como se quisesse esconder uma verdadeira ululante: a importância do açude e da irrigação? -- Por que o Ministério da Agricultura deixou de ser um órgão executivo do fomento agropecuário, abandonando campos_ fazendas. postos aggropecuários, deles se desfazendo, de tal modo que o setor público federal, assim como o estadual- das Secretarias de Agricultura deixaram até de registrar as propriedades agrárias do Governo no INCRA, tomando-as verdadeiros latifúndios por exploração? - Por que o Governo Federal, logo após a proclamada Revolução de 31 de março de 1964, fez, mediante pressão ao Congresso, retirar o dispositivo da Constituíçao democrática de 1946 que institucionalizara a aplicação de pelo menos 3% da renda tributária da União para o financiamento das obras contra as secas do Nordeste? Tal imposição se cumpriu, até mesmo contra a vontade do prestigiado Deputado Paulo Sarasate e do própdo Senador Afonso Arinos. que, defendendo a tese da continuidade da vinculação, e em apoio a Paulo Sarasate, de saudosa memória, profligou a investida contra o

Proposta 2 4


Nordeste, dizendo: "Não existe maior injustiça da que tratar igualmente situaçaes desiguais". .. Trecho da discursa pronunciada pela Oep Federal Paes de Andrade da PMDB na Câmara das Deputadas em 1980

Proposta 25


NORDESTE- GRITO DE AMOR E DENúNCIA "Mais uma vez, diante do descaso e insensibilidade da Nação e de seus governantes, repete-se o drama pungente das secas no Nordeste. O problema das secas periódicas não representa um fato isolado de per si, mas a mera exteriorização do quadro de subdesenvolvimento e miséria do Nordeste põe às claras, de modo amplificado, toda a dimensao da pobreza e do abandono que caracteriza a vida destes 36 milhões de brasileiros integrados polltica e geograficamente ao Pals, mas distante da sua integração econômico-social. A dependência, a fragilidade e a vulnerabilidade da estrutura econômica regional fazem com que os efeitos desorganizativos deste fenômeno climático sejam potencialmente muito mais dramáticos. Se avaliarmos o impacto da ocorrencia de secas, geadas e inundações sobre estruturas econômicas mais sólidas, como a do Paraná ou a convivência de áreas como o Arizona nos EUA, certas regiões do México, entre outras, sujeitas a condiçoes climáticas bem mais adversas, havemos de nos convencer de que nunca o Pals levou realmente a sério o problema das secas e do desenvolvimento regional. Apesar dos prejut'zos muito maiores das geadas do Paraná do que da atual seca do Nordeste, a economia daquele Estado não se desorganizou, o nlvel de emprego não caiu e toda a estrutura econômica já se recompôs. Ao passo que, no Nordeste, tais efeitos adversos ora são catastróficos e se pronunciarão e estenderão nos próximos dois anos, deixando marcas e sequelas profundas.

O CARA TER E OUTRO Em face do caráter emergencial, episódico e paliativo do processo de enfrentamento pelo Governo, nunca foi posslvel a região conviver com tal fenômeno como elemento intr/nseco ao nosso próprio desenvolvimento se os seus desastrosos efeitos. Na verdade, tais medidas tópicas, pouco abrangentes e superficiais, nada mais são do que a caracterização da natureza do processo econômico nacional, concentrado, desumano, elitista e punitivo às regioes mais deprimidas. Por outro lado, a própria forma de enfrentamento do problema busca consolidar um quadro polltico alienado e não participativo através do privilégio às oligarquias, que se utili· zam do próprio quadro de miséria para auferir ganhos diretos da exploraçao através das famigeradas frentes de serviços. O Nordeste é reconheCidamente uma região pouco industrializada, de comércio pobre - exceto nas tres grandes áreas metropolitanas - prejudicado pelo /CM, cujo total não ultrapassa 12,5% do arrecadado na Região Sudeste, debate-se com problemas e dificuldades que não são de hoje. Sentindo o drama nordestino e o desafiante problema da sua população, o inesquec(vel Presidente Juscelino Kubitschek, graças a sua alma de estadista e clarividência política e administrativa, cria a SUDENE, através da Lei nP 3.692, de dezembro de 1959. Aquele órgão tinha como atribuições básicas: estudar e propor diretrizes para o desenvolvimento do Nordeste, supervisionando, coordenando e controlando, quer na elaboraçao, quer na execuçáo, os projetas de interesse da região, bem como executar, inclusive, através de convênio, aqueles relativos à área. Hoje, essas atividades estão dilut'das, mercê de providências administrativas posteriores, que lhe dkninu(ram a importancia, os recursos e a competência. Atribulmos o despret(gio da SUDENE à ótica administrativa dos detentores do poder ditatorial destes últimos 15 anos que, desvirtuando os verdadeiros objetivos do órgão, a cada ano aumenta o violento processo de esvaziamento, tanto nos seus reais objetivos como na destinação de recursos para o seu programa e pulverização dos incentivos fiscais, hoje diluldos em outros programas regionais. Saliente-se que grande parte dos recursos são hoje destinados às grandes indústrias que, pela sua sofisticação, pouco absorvem a mão-de-obra nordestina. O mesmo acontece com os recursos destinados aos projetas agropecuários. Estes, ao invés de atenderem à grande população desempregada, colocam, substituindo o homem, modernas máquinas. Desta forma, continua intenso o êxodo rural dos nordestinos sem terra e sem trabalho, que, na esperança de melhores dias, se destinam ao Sudeste, formando ao redor dos grandes centros a triste paisagem das favelas urbanas. NÃO

E PRA

ENTENDER

Não entendemos. porque, enquanto o Nordeste necessita de maiores recursos para melhorar a vida sofrida de seus filhos, os Ga Lemos de após 1964 têm destinado - confessada-

Proposta

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mente, de acordo com informações prestadas pelos Ministros da Fazenda e da Secretaria de Planejamento da Presidência da República, na Administração passada - bilhões de cruzeiros ao setor financeiro, injetando-se em grupos falidos ou prestes a falir, em conseqüência da irresponsabilidade ou, mesmo, da desonestidade de alguns de seus diretores, fato denunciado sobretudo em 1977 da tribuna desta Casa por eminentes Deputados oposicionistas. As injeções foram imorais e se constitulram num atentado à pobreza do brasileiro-- em particular do nordestino - acossado por impostos sempre mais escorchantes e, ainda, responsáveis pelos danos causados pelas enchentes, fruto, em geral, da falta de regularização dos leitos dos rios por parte dos Governos estaduais e central todos atualmente indicados pelo poder revolucionário, conseqüentemente, distantes do povo. Os exemplos do Banco Independência, do Banco Hatles, do Banco Unüio Comercial, do Banco Ypiranga, do Grupo Aurea de Creditum, do Audi, dos Grupos Rio, Lutfalla e Ata/la, citados em março de 1977 pelo atual Líder do MDB, Freitas Nobre, e que, somados aos demais, podem chegar à casa dos 26 bilhões de cruzeiros valor na época, dizem bem do zelo com que o Governo vem tratando dos grupos financeiros e do desprezo que tem demonstrado ao Nordeste em particular, onde o seu órgão maior, a SUDENE, recebeu, incluindo os incentivos fiscais, a quantidade de vinte sete lnilltcruzeiros entre 1976 e 1979. Se comparamos que os 26 bilhões injetados, em grupos financeiros são totais de 1917, pela desvalorizaçao do cruzeiro, veremos logo que os ~bilhões recebidos pela SUDENE são menos do que as injeções imorais, tendo em vista que no total da SUDENE estão os recursos alocados até 1979. Temos outros dados irrefutáveis: De 1915 a 1955, em quarenta anos, portanto, o DNOCS recebeu da União 4,8 bilhões de cruzeiros, enquanto que só para a regularização do Rio Guatba, no Rio Grande do Sul, entre 1954 e 1957, a União destinou 4 bilhões de cruzeiros. O orçamento da SUDENE em 1976 atingiu 186 milhões de cruzeiros e só para a ponte Rio-Niterói e o aeroporto do Galeão foram gastos, no mesmo perlodo, 2,8 bilhões de cruzeiros, isto é, o correspondente ao orçamento da SUDENE durante 16 anos. Diante dos dados expostos, estão claras para a Nação as prioridades administrativas dos Governos da chamada Revolução. Para eles é mais importante investir 30 bilhões de dólares no programa Nuclear - comprovadamente uma energia mais cara e mais perigosa; e o povo brasileiro nem ao menos sabe o teor do respectivo contrato - do que aplicar essa fábula no desenvolvimento da agricultura, que, além de ampliar a produção de alimentos e desenvolver o mercado interno, daria ao homem sem terra a oportunidadde sonhada de participar da produção nacional. Por tudo isso, não vemos, através da SUDENE, como hoje ela se encontra, a sat'da para o Nordeste. O desenvolvimento daquela região torna-se difícil, tendo em vista a deliberada má vontade dos governantes em não colocá-/a como parte das áreas prioritárias nos seus programas e diretrizes. A ditadura sempre fechou os olhos ao processo espoliativo, do qual, historicamente, é vltíma a região. Faz parte da geopol/tica governista a dependência do Nordeste. E seu destino, pensam os detentores do poder, ser eterno fornecedor de matéria-prima para o Centro-Sul e exterior e ainda fornecer para os Estados mais desenvolvidos a mão-de-obra abundante e barata. A nlvet' da pol/tica central, continua sendo o sustentáculo pol/tico-parlamenta!:. ql!e, diJ.nte. do atraso e às custas do sofrimento daquele povo, suborna e corrompe a consctenc1a nordestma, transformando-a em objeto de manipulação pol/tíca e eleitoral. Assim, para o regime autoritário, são importantes a permanência e o fortalecimento de forças retrógradas do interior, hoje renovadas, numa época em que os donos do poder, humoristicamente, falam em desenvolvimento. O pior de tudo isso é que sempre aparecem homens do Governo, geralmente em época de seca com velhas e conhecidas promessas de melhora. Cumprindo o mesmo ritual, o Ministro Mário Ándreazza, na reunião da SUDENE, do dia 30 de março de 1979, lá apareceu. Diante do quadro desolador da região, foi levado a reconhecer a gravidade do problema das secas e a assumir o compromisso de efetivar um elenco de medidas". Trecho do discurso do Dep. Federal lranildo Pereira - PMDB - proferido em abril de 1981 na Câmara Federal.

Proposta 27


SECA: PROBLEMA QUE NINGU~M QUER RESOLVER Tornou -se pac/fico o conceito, hoje aceito no país inteiro, mesmo na área governamental, que não seria a seca que responde pela vulnerabilidade da economia do homem nordestino e pela baixa produção e reduzida produtividade da agropecuária. A responsabilidade estaria no Sistema Fundiário vigente e a solução seria a REFORMA AGRARIA. E bom lembrar que há não muitos.anos o regime vigente no pals que, sem modificações substanciais, foi sucedido pelo Estado de Força implantado em 1964, a expressa Reforma Agrária era prescrita do vocabulário nacional e referências públicas a ela dava espancamento, prisão e processo, como antes acontecera com a Luta pelo Petróleo. Dizia-se, na época, que Reforma Agrária era invenção simbólica do comunismo para espoliar a propriedade privada, garantida na Constituição, minar a fam/lia e desagregar a ordem social. Omitia-se, inclusive, que pa/ses capitalistas tanto da Europa como da própria América haviam implantado suas reformas agrárias, nacionais. Comc!ftormação do Governo refletia o poder do latifúndio, tanto no executivo, como no legislativo, o que ainda hoje perdura, mais atenuadamente, a lei procurou proteger exagerademente a propriedade privada, principalmente da terra, enquanto a ação executiva fazia vista grossa aos processos de grilagem e outros meios arbitrários de apropriaçaõ de terras e expansão latifundiária. No correr do tempo, por força da presença de fatores emergentes na economia brasileira, o próprio sistema fundiário sofreu pressões modificadoras, inclusive com a mecanização e a exploração mais racional de glebas nas áreas temperadas, mais desenvolvidas de São Paulo para baixo, por colónias estrangeiras de melhor n(vel cultural e maior tradição agnéola. Outra modificação se. deveu à presença das multinacionais na agropecuária, primeiro com os frigor/ficos e logo depois com sua interveniência na agricultura dos cereais, seu financiamento, comercialização e exportação. Todas estas mudanças, porérp, não afetaram o sistema fundiário das áreas tropiccais e, em geral, todas do Nordeste, onde o latifúndio se manteve estável, e até mesmo, se fortaleceu. Costuma-se classificar o latifúndio em duas grandes divisões: Latifúndio por extensão e Latifúndio por exploração. Mas não é a extensao ou a forma de exploração rve definem o latifúndio. . Uma grande área absolutamente inexplorada, onde não se produz nada, onde não habita ninguém, não é tecnicamente, um latifúndio, como uma grande área explorada empresarialmente segundo as regras capitalistas também não é um latifúndio. Não é, portanto a área que define o latifúndio, mas sim as relações de produção que se geram dentro de uma área que o caracteriza. Na propriedade privada da terra no Nordeste, em geral, a pecuária, notadamente a bovinocultura, era atividade do dono da terra, por ser mais remuneradora. Dizia-se que o boi mantinha os chifres acima da ondfl.inflacionária. A agricultura era a de subsistência, praticada pelo parceiro ou "morador" com papel definido na estrutura fundiária: o braço barato, quase gratuito, sem i-escravo, para assistir, vigiar, defender a propriedade. E notável e significativa a estrà/égia da localização da "casa do morador" nas fazendas. Nada tem de arbitrária ou casual. Uma fica no portão de entrada, para vigiar as cancelas e porteiras. Perto dos açudes para vigiar o uso da água e da pesca. Perto dos engenhos, casas de farinha e currais. Perto das passagens e das propriedades limltrofes, vinculando o uso da moradia a uma tarefa importante, embora gratuita. Quando a agricultura remunera, isto é, quando é lucrativa, é também agricultura do dono, como foi a da cana-de-açúcar, no Cariri e no Vale do Acarape e, mesmo, na Zona da Mata, agora se transferindo ao parceiro, na medida em que se vai tornando onerosa, o que também está acontecendo com outros produtos. Com o algodão sempre foi assim. Portanto o lati ifjndio gera uma relação de produção que transfere ao camponês os ónus das culturas que dão prejulzo . .J~to impede que o trabalhador agrlcola, sem terra, faça qualquer tipo de poupança, seja financeira, juntando dinheiro numa caderneta e/ou adquirindo bens móveis, imóveis ou semoventes, pelo que qualquer acidente na regularidade das chuvas, ou mera doença (e não apenas uma seca) o deixa sem meios de enfrentar o percalço. Se o acidente se agrava ou se prolon· ga sua vulnerabilidade o transforma em FLAGELADO. O latifúndio também não propicia os meios de tornar melhor a produtividade com A

Proposta 28


aplicação de defensivos adubos mqauinas, de vez que a falta de poupança impede investimentos. A falta de posse e titulação da terra, por seu lado, excluiu a possibilidade de garantia real a oferecer, pelo que o camponês fica fora da linha de financiamentos bancários, mesmo dos bancos oficiais. Os mercados compradores de produtos agrú:olas originados nos latifúndios impõem seus preços aos vendedores. Como estes, pela baixa produtividade e, de modo geral, pela inviabilidade de aplicação da boa tecnologia capaz de reduzir custos de produção, se obrigam a vender a preços abaixo do custo, o que não permite a fluição de lucros de que resulta o que ficou dito acima, isto é, a transferência de prejufzo, o que vale dizer que o resultado do trabalho agrfcola no latifúndio remunera menos do que o valor corrente nos dias de trabalho gastos para gerar o produto. Se o trabalhador de salário m(nimo não pode poupar como poderia fazê-lo quem ganhe menos do que o salário mlnimo. Mas por que agora, passados tantos anos são os próprios homens do regime, governantes, administradores, parlamentares, que reconsideram sua antiga posição para atribuir ao Sistema Fundiário a culpa da desgraça do Nordeste e, ao mesmo tempo anunciam que a redenção será a REFORMA AGRARIA? A Reforma Agrdria por si só não é nem pode ser a própria estratégia. Ela terá que ser precedida de uma atividade reformista e paulatinamente, de uma experiência reformista. Para sua adoção é indispensável pre-definir a política reformadora que exige, de entrada a escolha das áreas, determinação de sua vocação produtora, dimensionamento do mercado, estabelecimento das vias de escoamento. Há que se pre-avaliar onde produzir, o que produzir, para quem produzir, a que preço produzir, quanto produzir, qual o custo de produção e qual o preço (isto é, custo mais lucro) pelo qual o produto será aceito no mercado. A chamada revolução de 1964 institucionalizou a Reforma Agrária através do Estatuto da Terra, da Lei de Prioridade da Reforma Agrária no Ceará, da criação do Incra e outros diplomas legais; Isto já vai para a sua segunda década. Mas o que há mesmo de Reforma Agrária no Brasil? Dos 850 milhões de hectares de terras brasileiras nem mesmo 0,01% foram distribuídos. E esse mínimo distribuldo não foi implantado. Em que século, em que mi/enio se completaria, nesta andança, a cabulosa Reforma A~~? . O Ceará, área prioritária da Reforma, tem 15 milhões de hectares. Quantos foram d!Stribuídos7 nem 0,1%. ·>pode-se pretender que, algum dia, nesta marcha, se conlua a Reforma Agrária no Ceará? O que houve foi - isto sim - uma mudança de tática quanto ao problema. Agora é o latifúndio que se auto-condena como o ladrão da história, correndo na frente da pollcla gritando "pega o ladrão! Pega o ladrão!' _ . E a Reforma Agrária passou a ser reclamada exatamente por quem nao deseJa ve-la em prática. Quando se distribuem 100 ou 200 tltulos de pequenas propriedades (merios que uma gota dágua no oceano) a propaganda procede como se tivessem distribu/do TODAS AS !ERRAS. Mas, mesmo, porém, a essa inexpressiva fração infinitesimal do problema se nega o mats elementar da operacionalidade. não se lhe dá nada, absolutamente nadéf!. Este procedimento não é casual não é fruto da mco'!'petenc1a, da mef1c1ênpa. E, antes, um procedimento deliberado de causa pensada, para que strva de exemplo negattvo, d_esencorajador da solução, como quem diz: "Deu-se-lhes a terra, fez-se para eles a Reforma Agrána. E agora, que fizeram elas da terra, onde estão as benesses da decantada Reforma''? Não é outra coisa. Claro, clarfssimo e indiscut1vel é que o Sistema Fundiário responde como principal obstáculo à solução do problema da seca e Reforma Agrária é a resposta adequada para o começo da solução. Mas isto não pode ocorrer com o governo que está a1: com o Estatuto da Terra, com o Incra, com a Sudene, com o Projeto Sertanejo e com o General Venturiní. Só mudanças institucionais profundas com uma Assembléia Nacional Constituinte, com eleição direta para a Presidência da República, com a derrocada do modelo económico, com a libertação das peias do FMI será posslvel planejar com urgência e implantá-/o com a agilidade, independente de outras medidas também de caráter resolutivo paralelas, diretas ou indiretamente a ela ligadas. A

A

Trecho do discurso proferido pelo Deputado Barros Pinho, Vice-Líder do PMDB, na Assembléia Legislativa do Ceará, em outubro de 1983.

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DOCUNENlOS


XIII CONGRESSO BRASILEIRO DE AGRONOMIA A SECA E OS ENGENHEIROS AGRONOMOS As populações nordestinas vivem, no momento, uma situação de fome e miséria agravada pela estiagem que se abate sobre elas, desde 1979. São cinco anos de fenômeno climático que veio colocar a nu a situação de penúria, fome, miséria, carestia e péssimas condições de sobrevivência. A figura do flagelado, p resente no campo e na cidade, em situação de completo abandono e desespero, não é produto da seca como simples fenômeno, mas sim apenas um fato que mostra a situação de misé ria em que vive mais de 80 por cento da população nordestina, especialmente a população rural. A corrupção e a discriminação político-partidária presentes nas frentes de trabalho, planos de emergência e bolsões da séa, os saques das populações famintas, os baixíssimos salários pagos aos trabalhadores (metade do salário mínimo regional), a degradante condição de trabalho e a conivência de muitos com esta situação são também fatos que mostram o estado de miséria descrito . A identifciação das causas fundamentais desta situação vivida pela população nordestina, torna-se de alta relevância para que se proponha ações que devem ser desenvolvidas para erradicar a miséria em que vivem estas populações. Entre as causas desta situação, nós, Engenheiros Agrônomos, destaca mos as seguintes: a) as relações que se estabelecem historicamente entre os indivíduos pertencentes a diferentes grupos sociais e que definem e determinam não só a estrutura da produção, distribuição e consumo, como também a distribuição de bens de produção e de poder político que daí advém . No caso da agricultura, estas relações determinam não só à distribuição do bem de produção fundamental - que é a terra - como também a maneira como se organiza o processo de produção agríco la. A posse deste bem fundamental provoca uma divisão no seio da população entre aqueles que detêm parcela ponderável da terra e aqueles que a detêm em parcelas insignificantes ou não a detêm. A massa da população rural nordestina constituída pelos pequenos proprietários, pequenos arrendatários, parceiros, posseiros e assalariados é quem mais sofre as conseqüências da seca e da sua "indústria", esta montada para satisfazer os interesses dos latifúndios e dos intermediários comere ia is e financeiros. b) as decisões políticas tomadas ao nível do aparelho governamental são decorrência do poder pol ítico local exercido pela minoria e que faz suas pressões na tentativa de fazer valer seus interesses de classe; O apa relho governamental, comprometido que está com o poder local, e portanto, com os proprietários da terra - latifu ndiários - dirige sua atenção para a defesa dos interesses desta minoria que consegu iu capturar todas as instituições públicas. c) esta estrutura montada no tripé: relações entre indivíduos pertencentes a grupos sociais antagô nicos; na propriedade privada dos bens de produção, distribuição e consumo e na manipulação das decisões de política do Estado utiliza, para se manter, mecanismos que vão desde a força até o controle ideológico; d) o controle ideológico é o que se faz sentir mais de perto pela categoria dos Engenheiros Agrônomos quando a sua formação não lhe permite conhecer e atuar na realidade destas populações, devido ao fato de estar o ensino agrícola desvinculado da realidade e lhe faz crer ser um privilegiado e pertencente a uma elite cuja função é técnica, pretensamente neutra, e portanto, não deve se se identificar com os interesses da população. PROPOSIÇOES As questões da seca e da agricultura como um todo só podem ser resolvidas se houver mudanças substanciais ao nível da estrutura da sociedade. Por sua vez, as mudanças estruturais só ocorrerão na medida em que as questões específicas da seca e da agricultura sejam encaminha· das de acordo com os interesses da população. Os Engenheiros Agrônomos do Brasil, conscientes destes problemas levantados e reunidos no Xlll CBA, em Recife, posicionam -se favpráveis a que se atue nas causas fundamentais da miséria da população rural nordestina, e que esta atuação seja política, econômica, social e técnica. As soluções políticas, econômicas e sociais passam por uma reorganização da sociedade como um todo no sentido de se red~inir rumos e objetivos, cujo processo passa necessariamente

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• pelas seguintes etapas: - Reforma agrária ampla, massiva, com a participação dos trabalhadores rurais; - Participação da população em todas as decisões políticas e econômicas, no âmbito do aparelho de governo; - Desapropriação por interesse social e distribuição imediata das áreas ociosas e improdutivas dos latifundiários; - Desapropriação por interesse social e distribuição imediata das áreas aproveitáveis situadas nas imediações de obras públicas construídas e a serem construídas (açudes, linhas de eletrificação rural, estradas); - Desestímulo à exploração agrícola da monocultura de exportações que prejudica a produção de alimentos e aos programas governamentais que incentivam a monocultura e o consumo indiscriminado de insumos industriais; - Participação efetiva dos trabalhadores nas decisões referentes aos planos de emergência criados pelo Governo para atender às vítimas da seca, assim como a exigência do pagamento integral do salário mínimo nas frentes de serviços para os homens e mulheres; - Reorganização das Instituições Públicas de prestaç~o de serviços agrícolas para que não sejam discriminados os grupos sociais constituídos pelos pequenos produtores rurais. Quanto às soluções técnicas, os Engenheiros Agrônomos afirmam categoricamente que já existe em termos nacional e mundial um acervo de tecnologias e técnicas prontamente disponíveis, e que, se adequadamente utilizzadas de acordo com os interesses da população, poderão contribuir grandemente para resolver a situação de penúria em que se encontra a população nordestina. OLINDA/PE- 26 a 30 SETEMBR0/83

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OS TRABALHADORES RURAIS E O PROBLEMA DA SECA A seca que, nos últimos cinco anos, vem castigando o Nordeste, particularmente o Estado do Ceará, representa um desafio para os governantes de nosso país. Ela demonstra a ineficácia de todas as políticas adotadas até hoje para combater esse problema secular. Os grandes prejudicados com a seca são os que vivem do trabalho na terra. Todavia, até hoje, os trabalhadores rurais têm sido a última prioridade dos programas de "combate à seca". Nas duas últimas décadas, a política governamental para o Nordeste sofisticou-se. Ganhamos uma Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste. O combate à seca deixou de estar limitado às eventuais frentes de serviço. Além dos programas de emergência, o governo adotou uma política de incentivo e fortalecimento da pecuária, uma política de construções de barragens, uma política de irrigação. Só que os resultados foram ainda mais desastrosos. A expansão da pecuária tem provado a ocupação pelo gado das terras que mais se prestam à agricultura. As áreas úmidas estão tomadas pelo capim e pelas forrageiras, as margens dos rios e dos açudes estão cercadas, ficando os trabalhadores ainda mais sem defesa em época de seca. O resultado é a queda da produção de alimentos e a expulsão dos trabalhadores da terra. A atual política de construção de barragens também tem prejudicado os trabalhadores rurais. Na maioria das vezes, as áreas cobertas pelas águas são baixios férteis, próprios para a produção de alimentos. Uma vez construídas, as barragens acabam beneficiando apenas os latifundiários e grandes empresas que utilizam sua água para o desenvolvimento da pecuária ou da monocultura. As grandes barragens têm desalojado milhares de famílias de trabalhadores rurais, sem que sejam oferecidas indenizações justas e planos adequados de reassentamento. Os grandes projetas de irrigação, ao invés de criarem novos empregos e propiciarem melhores condições de trabalho para os trabalhadores rurais das áreas em que são implantados, expulsam mais trabalhadoraes do que assentam em seus perímetros. Os critérios de seleção adotados são inteiramente estranhos à realidade e excluem, de fato, os trabalhadores. Os programas de emergência, que são paliativos indispensáveis em momentos críticos como o que estamos vivendo, estão comprometidos pela raiz. As "obras públicas", que de públicas só têm o nome, constru(das em terras particulares, reforçam o poder dos grandes fazendeiros e dificultam ainda mais o acesso do trabalhador rural à terra e a água . Nesses últimos cinco anos, os programas de emergência têm mudado de nome, mas essa e outras distorções têm perma· necido. Alistamento restritivo salário insignifican te, atrasos no pagamento, descontos arbitrários no pagamento , jornada de trabalho exagerada,· arbitrariedades de encarregados, trabalhadores dos Bolsões postos a serviço de fazendeiros, são a realidade das frentes de serviço no Ceará de hoje. Uma das fontes dessas distorções é a influência de políticos que controlam o alistamento em boa parte das frentes, favorecendo pessoas não necessitadas que são apadrinhadas suas. Os trabalhadores rurais e dirigentes sindicais que ousam protestar são perseguidos, ameaçados e, algumas vezes, são v(timas de violência. Entendem os dirigentes sindicais do Ceará que as políticas governamentais de combate às secas não tocam no fundamental: a estrutura agrária. Se a seca agrava a situação de fome e miséria do trabalhador rural, a causa fundamental da fome e da miséria está na injusta distribuição da propriedade da terra. A falta de chuva é um fenômeno natural, mais a maior ou menor capaci· dadech trabalhador coexistir com a falta de chuva decorre da estrutura agrária e das políticas governamentais. Não há como negar que o sistema de posse e uso da terra em nosso Estado reduz a quase nada a possibilidade do trabalhador rural resistir a períodos prolongados de estiagem. Não há como negar que a política do Governo tem cont ribuído para reforçar a estrutura agrária existente. Há um conjunto de medidas que precisam ser tomadas desde já para que o rumo das coisas seja mudado. Os dirigentes das Federações de Trabalhadores Rurais do Nordeste, reunidos junto com a CONTAG e vários Sindicatos de Trabalhadores Rurais das áreas atingidas pela seca, em Teresina, em agosto último, apresentaram um conjunto de medidas de curto, médio e longo prazo que precisam ser adotadas para que, além do simples socorro na emergência, se chegue a uma solução definitiva do problema. No caso do Ceará, consideramos necesssário atacar o problema em várias frentes, conjugando algumas medidas de curto prazo com duas medidas de alcance mais amplo : a redefinição das obras a serem feitas e a reforma agrária. E necessário o imediato desatrelamento do programa de emergência dos interesses políticos partidários. Os critérios de alistamento e funcionamento 'das frentes de serviço devem ser unificados. Deve ser assegurado o salário m(nimo regional a todos os que trabalham nas frentes. Devem ser corrigidas todas as distorções referentes a alistamento, atraso de pagamento, jornada de trabalho, etc. Proposta 33·


Para que as atividades agrícolas sejam retomadas, é indispensável a liberação total do serviço nas fre ntes, sem preju(zo de seus salários, de todos os trabalhadores que dispõem de terra para trabalhar, a partir de novembro, para o preparo da terra e plantio, até a colheita ou à decretação de uma nova seca. Os demais trabalhadores devem ser mantidos normalmente nas obras. E também indispensável o fortalecimento gratuito, a partir de novembro, de sementes, de boa germinação, para, no momento certo, os trabalhadores terem o que plantar. As atuais "obras públicas" devem ser substituídas por obras de interes~e da comunidade, controladas pela comunidade e que contribuam para a solução defintitiva do problema da seca. Todas as áreas beneficiadas até agora por obras públ icas devem ser desapropriadas para que possam passar a servir ao interesse das comunidades. Toda obra deve ser feita em terra desapropriada pa ra esse fim. A transformação da atual estrutura agrária injusta, concentradora de terra e renda, através de uma Reforma Agrária massiva e imediata, com a participação dos primeiros interessados, os trabalhadores rurais, em todas as suas fases, é a principal reivindicação e luta do Movimento de Trabalhadores Rurais. Sem que haja extinção do latifúndio, com a distribuição das terras aos trabalhadores rurais, acompanhada de medidas de desenvolvimento agrícola voltadas para o interesse dos pequenos produtores, não se pode esperar a resolução definitiva dos problemas causados pela seca do Nordeste. A reforma agrária deve ser desencadeada através de um conjunto de medidas que possibilitem reduzir, de forma substancial e em prazo relativamente curto, os efeitos das secas sobre os trabalhadores rurais: a) desapropriação imediata, através de títulos da dívida agrária, das áreas úmidas e vazantes, distribuindo-se aos trabalhadores rurais, com assistência técnica e credit(cias, leva ndo-se em conta as neecessidades reais e aproveitando-se as práticas e experiências já desenvolvidas pelos trabalhadores rurais; b) desapropriação por interesse social de áreas litigiosas; c) assentamento imediato dos trabalhadores rurais nas áreas desapropriadas; d) titulação definitiva de todas as áreas já ocupadas pelos trabalhadores rurais; e) promoção do assentamento de trabalhadores rurais nas terras públicas, realizando obras que as tornem em plenas condições de ocupação. Desde 1979 que os- trabalhadores rurais do Ceará, através de seus sindicatos e de sua Federação, vêm manifestando seu ponto de vista sobre a questão da seca e exigindo das autoridades soluções definitivas para o problema. As medidas até agora adotadas ou foram ineficazes ou contribuíram para agravar o problema. Parece-nos, pois, que está na hora dos governnantes abrirem seus ouvidos às reivindicações dos trabalhadores rurais. A nossa proposta toca no que é fundamental: a terra e a água, monopolizadas por uma mino ria de grandes proprietários. Mas, por isso mesmo, ela exige dos que governam decisão e coragem. Decisão e coragem para resolver de vez problemas que castigam a grande maioria dos trabalhadores rurais, mas que não são apenas dos trabalhadores rurais, mas de toda a sociedade. Fortaleza, Ceará, 19 de outubro de 1983. ,-,:· ..

. :f .

FETRAECE

CONTAG

Proposta 34


I

DENUNCIAS

Proposta 35


CARTA

Sr. Editor, Solicitamos a publicação desta carta neste conceituado jornal de maior índice de leitura no Estado, para que os pedidos de muitos, que sofrem por não saber transmitir os seus sofrimentos, cheguem ao conhecimento dos homens de boa vontade. Serll:>r Governador: A Associação Comercial, Industrial e Agrícola de lguatu, a União Artística, a Loja Maçônica Deus e Liberdade n. 10, o Rotary Clube, o Clube dos Diretores Lojistas e o Lions Clube, após tomar conhecimento através de inúmeras denúncias de irregularida~es no funcionamento do Cedoo em nosso município, decidimos levar ao vosso conhecimento alguns destes fatos para que V. Exa. adote medidas corretivas com relação ao assunto. Detalharemos a seguir algumas destas irregularidades: 1a. - A maioria dos trabalhadores alistados nas frentes de serviços está sendo obrigada a dividir os seus salários com o dono da turma. Isto se deve ao fato de os mesmos não colocá-los nara trabalhar durante todo o horário recomendado e ter a desculpa para re•er P.m alguns casos até 50 por cento rlo salário; 1a. - Aqueles que não se submetem ao sistema são cortados sumariamente; 3a. - Existem intermediários durante os períodos de in&:rição que, por terem Iivre acesso ao escritório do Cedec, cobram por trabalhador que alistam Cr$ 5.000,00; 4a. - Alguns destes intermediários ai istam pessoas pobres, com a promessa dos mesmos só comprarem mercadorias em seu fornecimento a preços elevados, numa clara exploração do sofrimento e da miséria alheia· 5a. - Estes mesmos fornecedores con~ seguem comprar alimentos em postos do Governo, a preços mais baixos, e os rever-

tem aos pobres trabalhadores a preços de mercado, ou até mais altos; 6a. - Em dia de pagamento, dado o grande número de cheques a serem descontados em apenas uma agência bancária, a do B EC, a demora e as filas são grandes e isto força o trabalhador a negociar o valor do seu cheque com intermediário que possui dinheiro em espécie, perdendo assim mais dinheiro do seu miserável salário. Sr. Governador, este é o retrato fiel da situação dos nossos trabalhadores alistados nas frentes de serviços. Acreditamos que grande parte da culpa se deve ao próprio escritório do Cedec que não toma qualquer medida no sentido de evitar alguns destes abusos. O descaso é total .. Sugerimos a V. Ex a. que mande fazer. uma fiscalização rigorosa através de pessoas de vossa confiança e que essas fiscalizações não sejam divulgadas com antecedência, para que possam "flagrar" estes abusos. Sr. Governador, atualmente, neste município não há uma só pessoa que acredite no Plano de Emergência, com o objetivo para o qual foi criado. A população deste município está intranqüila, receosa de invasões, em face da pressão sofrida pelos trabalhadores rurais e do minguado salário que não dá mais para a sua sobrevivência e de sua família. Sr. Governador, fazemos este apelo a V. Exa., confiando na sua corage111. na sua juventude, no seu discernimento e na vontade de dirigir este Estado, tendo como meta maior a justiça. Respeitosas saudações, Assinam esta carta os presidentes da Associação Comercial, Industrial e Agrícola de lguatu, da União Artística lguatuen-! se, da Loja Maçônica Deus e Liberdade n. j 10, do Rotary Clube de lguatu, do Clube; dos Diretores Lojistas e do Lions Clube dej lguatu.

Proposta 36


DENúNCIAS DE IRREGULARIDADES E INTERFERENCIA DE POLITICOS NOS BOLSOES DA SECA ALCANATARAS : Alistal'l'ento de pessoas não necessitadas 1O minutos de atraso, o ponto é cortado - Apadrinhados de políticos não freqüen tam as obras e percebem o ponto QUIXERE : Delegado de Po lícia não fornece atestado de pobreza a trabalhador, e por este reclamar que fornecia a filhos de Comerciantes, foi preso Alistamento de pessoas indicadas pelo Prefeito Preso três trabalhadores porque estavam cortando madeiras em terras devolutas ' para carvão SOLONOPOLE: ·· STR não tem acesso ao escritório para dar sugestões - Horário de trabalho : Em umas obras ma ts e em outras menos SABOEIRO: O encarregado de Obra: Antônio Wilson dos Santos - Sítio Barrinha, recebe metade dos salários de determinados trabalhadores, para dispensarem suas presenças no trabalho JAGUARUANA: O DNOCS alistou, Motoristas, Comerc:.•antes etc. AQUI RAZ: Politicagem de Vereadores do PDS-2 - Alistados Moto ristas e Comerciantes - Pressão sobre o Trab. Rural por denunciar estes fatos. MORRINHOS: Trab. Rural tiveram o mês de agosto apo ntados e não receberam nada Pessoas que não vão as obras receberam normalmente o pagamento Presidente do STR reclamou das irregularidad es ao Coordenador do escritório e foi por este ameaçado de prisão Coordenador difama nome do Presidente e do Sindicato GROArRAS: Atraso no pagamento - Existe compra de cheques com 1O por cento de desconto (cheque entregue diretamente aos Comerciantes) NOVA RUSSAS: - Fornecedor ai istado - Ameaças de cortar aquele que não lhe comprar confiante na cobertura do escritório ASSARE: - Escritório corta trabalhador rural por denúncias vagas e sem a devida sindicância, sem pagar os dias trabalhados BREJO SANTO: Existem termos de servidão pública registrado em Cartório, mas na prática as obras ficam privadas pelos proprietários •

I

URUBURETAMA: - Alistados Comerciantes UMARI, JAGUARIBA, OUIXADA, CANIN DE E CATARINA: - Proprietários transferem tranbalhadores por não se fornecerem no seu barracão CASCAVEL: -· Trabalhadores rurais, brocando, roçando, moendo, cercando, servindo de garçom, para os proprietários CAUCAIA: Comerciantes, Estudantes, cambistas, proprietários de terras, proprietários de carros, motoristas, professores municipais, mulheres que moram em Fortaleza alistados ' Alistados dos bolsões tirando carnaubais fazendo tijolos, abrindo rumos de terras: para proprietários TAMBORIL: - Os políticos e proprietários decidem o ponto do Trab. Rural (determinam as obras no escritório) MONSENHOR TABOSA: - Políticos dominam o escritório - STR denunciou e foi ameaçado de levar uma surra IGUATU: - Alistamento de pessoas não necessitadas IRACEMA: Mesmo ao término do horário normal de trabalho o trabalhador tem que permanecer na obra esperando o feitor, pois caso contrário leva zero Pagamento atrasa até três meses Proprietários e políticos alistam quem bem entende, existindo casos de que até motoristas particulares estão alistados, e famílias de trabalhadores rurais com até cinco pessoas não tem nenhum ai iatado Trabalhador retirado da obra e colocado em serviço particular nas grandes propriedades para plantar capim, batata etc. Comerciantes alistados, como também funcioná rios públicos, acontecendo que : os mesmos nem sequer sabem onde ficam as obras CAMPOS SALES: Construção de barragens e açudes em propriedades privadas - Alistamento de comerciantes, marchantes, proprietários de terras e etc. ITAPAJE: Na localidade denominada "moreira" o Sr. Amaro Couro está construindo um açude em sua propriedade e agride constantemente os trabalhadores, moral e fisicamente, e diz sempre "a terra e a barragem são minhas, portanto faço o que bem entendo". URUOCA: Alistamento irregular - Comerciantes que fornecem aos trabalhadores estao alistados, como também outras que não tem a menor necessidade de tal ·


ITATIRA: - Comerciantes e fazendeiros alistados (os pr(lprios que fornecem as turmas) CARIUS: Ecritórios dominados por políticos Alistamentos irregulares Residência do Presidente do Sindicato foi alvejada a tiros em virtude do mesmo denunciar irregularidades MASSAPE: Ex-Prefeito controla o alistamento e diz que só devem ser ai istados os trabalhadores que votaram no PDS Obras em terras privadas desviando-se da coletividade COREAO: Prefeito é quem indica as pessoas a serem alistadas Muitos comerciantes e proprietários alistados Obras construídas em terras particulares e privadas O Vice-Prefeito -- Francisco Ximenes de Albuquerque, está construindo em sua propriedade lpueiras um açude O Sr. ~aimundo Gomes de Albuquerque, comerciante, aposentado pelo INPS com 20 salários, também está construindo um açude em sua propriedaqe denominada lpueiras, onde turmas de homens trabalham pela manhã e as mulheres na parte da tarde (propriedade cercada e privada) O Sr. Donizete Gomes - também está recuperando o seu açude na localidade Baixa Fria, dentro de cercado O Sr. Didi do Sérgio- constrói um açude em sua propriedade, todos com a mãode-obra gratuita BEBERIBE: Na localidade de Paripueira estão alistados pessoas tais como: comerciantes e outros que tem gado e dinheiro em banco, enquanto os trabalhadores passam fome JAGUARETAMA: CEDEC - O alistamento só é feito em benefício dos políticos

Os diretore:; do STR são ameaçado pelos políticos quando procuram defender os interesses dos trabalhadores As vagas quando aparecem são preenchidas com as determinações dos políticos as vezes a noite, sem o conhecimento dos trabalhadores Turmas fazendo roçados em terras particulares Alistamento de Comerciantes Motoristas Patrões, mesmo residentes em Fortaleza: como por exemplo o Sr. Durval Xavier Pinheiro, que possui um frigorífico em Pajuçara VIÇOSA DO CEARA: - Obras em propriedades particulares (interferência de políticos) OUIXADA: - Interferência de políticos (nas obras e no alistamento) MUCAMBO: Alistamento controlado pelo Prefeito Municipal, o qual não acieita que sejam alistados trabalhadores de outra ala política Obras constru idas em terras do Prefeito e seus correligionários BARRO: Os fiscais exigem que todos respondam a chamada em pé, pois se responderem sentados levam falta Os fiscais não admitem qualquer atraso, nem que seja de minuto AURORA: - Trabalhadores se deslocam das obras para trabalharem em terras de políticos ITAPIPOCA: A~istamento de qualquer pessoa, quer seja pobre ou rica, sendo que no último caso nem sequer sabem onde ficam as obras Obras em terras de particulares Interferência de políticos por ocasião do alistamento Trabalhadores são deslocados de suas obras para trabalharem em terras de particulares em qualquer serviço


AÇUDES Púi3L:CGS, GA,"'RAGt:NS E RIOS QUE PODERÃO SER APROVEITADOA ASSE ~JTAMENTO DE FAMfLIAS DE TRAPALHt\DORcv RURAIS, El\1 SUAS MARGENS UTILIZJ\1\:00-SE OS RECURSOS HfDRtCOS P::'\;IA PP.COUÇÃO DE ALIMEN TOS AÇ'JDES PÚBLICOS:

0 1. Santa • lar i<~ .. . ....... Sobral 02. r'\n:cati~~·~- ......... .So bral 03.

Forqt ·~!ha

..... .. ... .Sobral

04. J<. :barQ . . . . ........ . .Sobra~ 05. Am;-as .... . ......... Reriutaba 06. Orós Orós 07. Bnnabuiú . . .......... Ouixadá 08. Chorá-Limão . . . ...... Ouixadá G9. Pedras Brancas ........ Ouixadá 10. Ced ro ....... . ...... Ouixadá 11. G n<'ra l Sam;Jaio .... . .General Sampa io 12. V ·:-z::l da Volta . . . .. . )lloraújo 13. Pereira d::1 M iianda ..... Pentecoste 14. C2 ~dtoré ..... . ...... ltapajé 15. Ouixercmüb!m .... . .. Qui~ í~rãmo bim 1ô. Urr,;:. CiJm~·oJ .. . . ... . I cá 17. Brito ... .. ... ... . ... lcó 18. Poçn do Barre .. ... . .. Morada Nova 19. Acaraú-Mirim . . ..... .1\!!assapê 20. i"araíso ............ . Groaíras 21. Borr; Futuro .. . ...... Groaíras 22. Em3 (já desJpropriado) .Iracema 23. Vór:::ca do Boi ... .. .. .Tauá 24 . Aç. Dr. Joel Marques . .. Tauá 25. Gavico . . ........ . ... Pecatuba 26. Pró-Uruoca . . .. .. .... Uruocn 27. T utajuba ..... ... .. .. Santana do Carir i 28. Carnzú ba .... .... . .. .Jeti 29. Peço da Pedra ... ... .. Campos Sa les 30. T omaz Os crne c ; Alenc;>r . . ............ Crato :J1. Doqueirão (J.l dcsepropriado) .. ... ..... .. .So!0nó;)Qie 32. Oui.xabi nha ......... .Mauriti 33 . Angical .... . .. ... ...Jucás 34. Orien-te . ... . ..... . .. Novo Oriente 35 . Medeiros ........... Beberibe 35 . Tucunduba . .... . ... .S ~nad or Sá 37. Pa~os ..... .. .... .. .. Sobral 38. Juburu . ..... .. .. . ... U ajara 39. B<mínha e Bonito .... . lpu

c

RIOS: 01

P.CI \RAÚ Banhando 11 Mu nidp ios: Reriutaba, Santa Quitéria, Carirlêde, 't roalras, Mas:x:pô, Santana do AcJ~aú , Morrinhas, Marco, Bela Cruz, c Acara::t. 02 - Ji'.GU.L\RIBE - Banhando 12 Munic íplos : Orós, lcó, Jaguaribe, Jaguari~ara, Alto Santo, São João do Jaguaribe, Limoeiro do Norte, Ouixeré, Russas, .laÇJuaruana, itaiçaba e Aracati.

OJ - CU RLJ ·-· ·sanha 05 Municípios: General Sampaio, Apuiarés, Pentecoste, São Luís do Curu e Paracuru. 04 - JAIB /\!1AS - Banha o MuniCI'pio de Sobral, d o Açude Jaibaras até o Rio Acaraú , s~ndo assentadas algumas famílias, ficando a área restante para criaçê:o de g?do, prejudicando fam11ias que ai i poc:!criam trabalhar 05 - SANABU! ú - Banha 04 Municípios: Ou ixera.·.1ob!m, Ou ixadá , Jaguaretama e Morac:!a No•:a, onde emboca no Rio ..!aguaribe. 06. COREAO - Bai1ha 04 Municípios: Coreaú , ~:1 or~újo , Granja e Camocim, onde o mesmo desemboca no mar. .'-\tuntmcnte n~o é perene devido os cinco anos de seca, mas sendo constru Idos barragens para controle das águas será bem aproveitado. 07 - -SANGUE - No Município de Jaguaretama , t ambém atualmente sem água em co n:;eqü8ncia dos cinco anos de estiagt:m, pode ser bem aproveitado com represamento das águ as em tempo d:) invern o. 08 - CA:::As- No M un íclpio do Crato. 09 - BANANAL - Em Uruburetarr.a. 10 - f\.1UhiOt-\8 - Também no Município

c8 I) r• 1b • t rf'tn~na .

11 - SALGADO - Nos Mu nicípios de Lavras da Mangabeira e lcó. 12 - RIO SHORO - No Municl'pio de Batu rité. 13 - PACOTI - Em Aquiraz. 14 -SÃO GONÇ/\L O - No Munic_ípio de Viçosa do Ceará, distrito de Lambedouro. Além de outras ár::!as que poderão ser aproveitadas, como grandes Riachos que ficam no vale dos grandes Rios, Lagoas, Barragens, etc. RE L ACÃO DAS FAZENDAS E AREAS DE CONFLITOS E TENSÃO SOCIAL PARA F INS DE DESAPR OPR IAÇÃO JAGUARETAMA: -· Fazenda Favela - Latifú r,dio Improdutivo Alegre e Sítio Serrote do Mato Florísbela e Mundo Novo Conj unto Serrote Branco e Lul's Ferreira. REGIÃO DO CARIAI: CHAPA DO ARAR IPE o Que sejam cancelados os títulos que atingem r.;a is de um módulo o Conceder um título para cada família o A s!;entamento dos trabalhadores nas óreas fúteis que estão improdutivas · CASCAVEL: Fazenda Serra do Grito - ameaça de expu lsC8 d:.- 227 famílias (pelo Cel PM) Ref ormado,

Proposta 39


OUIXADA: · Fazenda Feijão - ameaça de expulsão dos trabalhadores rurais - Fazenda Califórnia 30 fammílias ~pressão para expulsar trabalhadores ru rais). SERRA DA IBIAPABA: - Titulação das terras devolutas TRAIR I: - Fazenda com pessoas de 20 a 80 anos - Pretensos donos pressionando no sentido de expulsar os trabalhadores LAVRAS DA MANGABEIRA: ·- Propriedade do Estado - Sítio Volta encontra-se improdutiva CAPISTRANO: Fazenda lpu -Conflitos 20 famílias Fazenda Boqueirão, EAN SOUSSI e ABELHA - apressar o assentamento de trabalhadores pois ambas já foram desapropriadas pelo INCRA VARZEA ALEGERE: - Fazenda Cajazeiras e Marupiara - desapropriar SOBRAL: Fazenda São Vicente (margens do Rio Ja ibaras) terras desapropriadas pelo DNOCS que se encontram improdutivas - assentar trabalhadores MORRINHOS: - Fazenda Junco Manço - de propriedade da Diocese de Sobral- 100 famílias MUCAMBO: - Fazenda Vaca Seca - propriedade Manuél Rodrigues Lopes- desapropriar HIDROLANDIA: - Fazenda Lageiro dos Patos- desapropriar ITATIRA: - Fazenda Mato Grosso- desapropriar

CANINDE: Fazen da Arirão e Todos os Santos -proprietário José de Sousa Jucá Fazendas Grossos e Suiça - expostas a venda - já comunicado ao INCRA, ITERCE etc. - que sejam adquiridas e repassadas para os trabalhadores IRACEMA : Perímetro Irrigado do DNOCS - 330 hectares - somente 12 famílias assenta· das ITAPIPOCA: Sítio Severino, Região de Aracatiara Fazenda Rajada, Varjota, Sítio Garapa - Região de Maceió, Escamado e Mocambo, - Moitas, Sítio Guaribuna, Lagoa da Cruz, Taboca, Salgado dos Nicolau, Vieira e Tijipió ALCANTARAS: - Desapropriação de todas as áreas da Serra da Meruoca VIÇOSA DO CEARA: Fazenda São José dos Coelhos, 1.100 hectares - Fazenda Passagem das Pedras - no distrito de General Tibúrcio COREAO: Fazenda Queimadas, no distrito de Ubaúna - onde registra -se conflitos de terras, o ITERCE já está com dados em mãos, faltando sua decisão, se é terras devolutas ou privadas, no caso, - assentamento das famílias ou desapropriação, se privada, com assentamento dos trabalhadores. FRECHEIRINHA: Levantamento da Serra da Penaduba e assentamento de trabalhadores.

Proposta

40


REGIONAL NORTE Escritório de Belém Rua Berna! do Couto 1329 66.000 - Belém - PA (091) 222-0318 Escritório de Abaetetuba Rua Siqueira Mendes n~ 1640 68.440- Abaetetuba- PA (091) 751 -1181 Escritório de Capanema Av . Presidente Medieis 1992 68700 - Capanema- PA (091) 821 -1716 Escritório de Imperatriz Rua Godofredo Viana 945 65.900 - Imperatriz - MA (098) 721-4474 Escritório de São Lu Is Rua das Hortas n~ 133 sala 28 65.000- São Lui's- MA. (098) 221-1175 Escritório de Manaus Av . Senador Alvaro Maia 1239- Boulevard 69.000- Manaus - AM (092) 234-6761

REGIONAL NORDESTE Escritório de Recife Rua Cedro n~ 52 Casa Amarela 50.000 - Recife - PE (081) 268-3242 Escr itório de Garanhuns Av . Júlio Brasileiro n~ 1152-A Heliópolis 55.300 - Garanhuns - PE (081) 761-0747 Escritório de Fortaleza Rua Professor João Bosco 73 Parque Araxá 60.000- Fortaleza- CE

REGIONAL SUDESTE/SUL Escritório do R i o de Janeiro Rua Senador Dantas n~ 117 grupo 1518 20.031 -Rio de Janeiro- RJ (021) 220-7198 Escritório de São Paulo Rua Loefgren n~ 1651 casa 6 Vila Clementino 04.040 -São Paulo - SP (011) 549-3888 Escritório de Vitória Rua General Osório, 83/710 29.000- Vitória - ES (027) 223-7436 Escritório de Porto Alegre Rua Gaspar Martins n~470 90.000 - ?orto Alegre - RS (0512) 25-0787



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