Opinião Especial - 1342

Page 1

Paulo Vaz, diretor-geral da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal

“Atingimos um recorde absoluto de 5,2 mil milhões de exportações” Pelo oitavo ano consecutivo, o setor da Indústria Têxtil e do Vestuário (ITV) português continua a crescer, o que faz dele um exemplo para o mundo. Num recorde absoluto, as exportações atingiram os 5,2 mil milhões de euros. Apesar de estarmos a viver um momento positivo, Paulo Vaz, diretor-geral da Associação do Têxtil Portugal (ATP) é muito claro. Pela frente há trabalho para fazer e as empresas têm de se diferenciar não pelo preço, mas sim pelos produtos, moda, design, inovação, intensidade de serviço, orientação ao cliente e apostar na internacionalização.

preço. O preço é importante, mas não é o foco, temos de diferenciar os produtos pela moda, design, inovação, intensidade de serviço, orientação ao cliente e mais esforço na internacionalização, participando em feiras e explorando novos mercados, de modo a que este trajeto positivo de crescimento se mantenha.

Sofia Abreu Silva OPINIÃO PÚBLICA: Qual o balanço que podemos fazer do ano passado em relação à Indústria Têxtil e do Vestuário? PAULO VAZ: Os números do ano passado ainda não estão fechados, mas a nossa estimativa aponta para 5,2 mil milhões de exportações, o que é um recorde absoluto em termos de vendas ao exterior deste setor, desde que há registos históricos. O melhor score tinha sido atingido em 2001, mas com o dobro dos trabalhadores e de empresas que hoje temos. Dezasseis anos depois superamos essa meta de forma muito clara e é um ano para celebrarmos. Em 2016, conseguimos antecipar, em quatro anos, a meta prevista no Plano Estratégico para 2020 ao atingirmos os 5 mil milhões de euros. Agora, em 2017, não só confirmamos esse mesmo score, como ainda o alargamos. É o oitavo ano, desde 2009, de permanente

recuperação e a fasquia está, cada vez, mais alta. Esta é a fase mais positiva de sempre, mas o setor não se pode acomodar… Claro. Não se pode achar que o trabalho está feito, porque nunca está. O setor tem de estar, permanentemente, em modernização e em adaptação à realidade do mercado. Deve antecipar tendências para poder beneficiar com isso. Os anos em que sofremos mais, entre 2001 e 2009, foram anos em que fomos apanhados pelo impacto da globalização, pela liberalização do comér-

Falou na questão da rentabilidade, esta é ainda uma indústria de salários baixos… Eu diria que a indústria, de uma maneira geral, foi sempre mais mal paga que os serviços. O que estamos a assistir hoje é a uma alteração de perfil, porque as indústrias vão ter cada vez menos mão-de-obra. Tínhamos muitas indústrias com muita mão de obra intensiva que estão a passar para indústrias de capital intensivo, o que significa que há menos pessoas a trabalhar, mas faz-se mais com menos. Este é um setor que vai ver, progressivamente, as suas remunerações subir, porque a falta de mão de obra determina a cio, pela abertura da Europa a Leste, subida dos salários. pela adoção do euro e, a menos esperada, crise económico-financeira Sente hoje que a moda portuguesa internacional, mas estes sinais esta- é muito acarinhada pelos portuguevam já no horizonte e muitas empre- ses? Hoje, temos hoje múltiplos prosas ou os ignoraram ou gramas na televisão sobre o têxtil, a minimizaram. Apesar de estarmos a moda e a costura... viver um momento bom, de clara re- Há um trabalho estratégico que a cuperação, há um trabalho que ATP lançou, há alguns, que passa ainda está por fazer que é ganhar por recolocar e revalorizar a imagem rentabilidade. O setor tem de ter do têxtil e do vestuário em Portugal. empresas a ganhar mais dinheiro e O setor nem sempre foi bem tratado, a fazer produtos com valor acrescen- muitas vezes pela classe política, tado mais significativo. O futuro é por alguns líderes de opinião e continuar a investir no valor e deixar orientadores de tendências que esde vez, como a maioria das empre- creviam sobre o assunto a partir do sas já o fizeram, a concorrência pelo conforto dos gabinetes da capital e

que nunca puseram os pés numa fábrica. Confundiam esta indústria de ponta, com alta incorporação tecnológica, com empresas de vão de escada. Esse preconceito passou também para alguma comunicação social. Também houve alguns responsáveis associativos, patronais e sindicais, que gravaram a imagem de um setor que parecia que estava sempre em dificuldade e sempre a pedir apoios e subsídios, com baixos salários e pouco atrativo para jovens profissionais e empreendedores. Hoje, felizmente, o discurso político quando quer citar setores que são exemplares falam no têxtil e no calçado. Eu tenho feito périplos, um pouco por todo o mundo, ao ser convidado por universidades, escolas de negócios, associações patronais, feiras industriais e palestras para explicar o case study da recuperação do têxtil e vestuário português. A indústria portuguesa é, então, um modelo? Há um reconhecimento, um pouco por todo o mundo, que esta indústria pode ser um exemplo a ser seguido por muitos países. É um país desenvolvido que teve capacidade para se reindustrializar naquilo que eram as suas indústrias mais tradicionais, pelos drives da inovação, da moda, do design, do serviço. Tudo isso somado tem vindo a promover uma imagem melhor do setor em que a intenção é internamente atrair novos valores e talentos, seja como profissionais e empreendedores; e externamente posicionar-nos superiormente para que o setor possa vender cada vez mais e melhor. »»»»»continua pub


20

ESPECIAL

opiniãopública: 25 de janeiro de 2018

»»»»continuação Quais são os principais mercados a que chegam os nossos têxteis? O nosso principal mercado continua a ser Europa, é o mercado charneira e vai continuar a sê-lo durante muito tempo, porque nos compra 80% de tudo o que vendemos. É na Europa que também se concentra a maior parte do negócio de moda no mundo, onde se criam as tendências, as ideias, os materiais e os modelos de negócio. A China tem uma parte importante do negócio, que é a produção, e os Estados Unidos uma parte do consumo. Temos conseguido consolidar mercados na Europa, mas também fora, como é o caso dos Estados Unidos, que é o quinto destino das nossas exportações e pode estar, daqui a alguns anos, no pódio dos nossos melhores compradores. Temos também apostado em mercados noutras geografias, que muitas vezes são de nichos, como por exemplo na Colômbia, que funcionará como plataforma para a América Central e para América do Sul. Além disso, temos trabalhado as relações com os mercados do Norte de África, não tanto como consumidor de produto final, mas de matérias intermediárias e primas. Também a Ásia não pode ser subestimada e a China, apesar de ser um mercado difícil, tem segmentos para todo o tipo de produtos, designadamente têxteis de natureza mais inovadora e técnica. De resto, temos uma grande expetativa com o Acordo Económico e Comercial Global (CETA) que foi celebrado entre a União Europeia e o Canadá, e que pode fazer disparar este importante mercado. Hoje, temos empresas têxteis que criaram a sua própria marca para não ficarem tão dependentes das encomendas das marcas. Isso é um bom sinal? É um bom sinal, mas é preciso colocar as coisas em perspetiva. Temos de perceber que o negócio da marca não é igual ao negócio da indústria, nem pode ser para uma coisa salvar

O setor nem sempre foi bem tratado, muitas vezes pela classe política, por alguns líderes de opinião e orientadores de tendências que escreviam sobre o assunto a partir do conforto dos gabinetes da capital, mas que nunca puseram os pés numa fábrica. Confundiam esta indústria de ponta, com alta incorporação tecnológica, com empresas de vão de escada.

a outra. Os casos conhecidos em que esse é o objetivo, acabam os dois por se afundar. São negócios com lógicas completamente diferentes que exigem, naturalmente, empresas, profissionais e estratégias diferentes. Portanto, não devemos criar uma marca só por criar. Temos de perceber se o que eu faço é tão diferente do que os outros fazem que merece ter uma estratégia desenvolvida como uma marca. Porque criar uma marca não é criar uma etiqueta, o problema é construir o conceito. Temos de fazer grandes investimentos em tempo e energia para impor essa marca e isso custa muito dinheiro. Hoje, existem outros instrumentos, como o comércio eletrónico, mas também não se pode esperar que numa página da web haja logo 200 mil clientes, porque aqui também é necessário fazer muito investimento para que isso seja possível. Estão a aparecer novas marcas bem construídas do ponto de vista do conceito, de marketing, de comunicação, mas é preciso ponderação, porque o histórico, infelizmente,

é que para uma vingar dez empresas ficam pelo caminho. A ATP funciona junto ao Citeve. Este tem sido um trabalho de parceria? Nós viemos do Porto em 2007 para o edifício do Citeve, porque consideramos que Famalicão é o epicentro da ITV portuguesa. A partir daqui, num raio de 50 quilómetros, tocamos praticamente 85% das empresas que o setor tem, o que é uma vantagem competitiva enorme, porque significa que há aqui uma organização em cluster. São empresas complementares enquanto fileira, que são ativas e sinérgicas entre si e que têm um sistema científico e tecnológico que as apoia, nomeadamente as universidades, os centros tecnológicos e de formação. Temos com o Citeve um conjunto de projetos e um trabalho muito próximo naquilo que é a industrialização, na participação em feiras e, sobretudo, nas áreas mais específicas ao nível técnico e tecnológico. Fazemo-lo em

conjunto com o Citeve para beneficiar do seu conhecimento e do seu know-how. Temos um trabalho de cooperação e de alinhamento estratégico, porque só assim é que se conseguem resultados. E como será o futuro do setor? O nosso papel é que o futuro seja tão próximo daquilo que quanto desejamos. Acho que é uma vantagem que o setor tenha um Plano Estratégico, que serve como uma espécie de orientação para as empresas alinharem as suas estratégias. Ao termos um plano e ao evitarmos dispersões, sobreposições e desperdício de recursos, estamos mais organizados e focados para que as coisas sucedem como nós desejamos. A nossa perspetiva é que o setor possa continuar a crescer e isso passa por termos, eventualmente, mais serviços e menos indústria. Não quer dizer que a indústria não seja importante, pois ela é muitíssimo importante, porque dá-nos a capacidade de inovar constantemente, mas vamos ter de capturar valor àquilo que é a terceirização que está nos serviços, na inovação, no design, no serviço ao cliente, em mais participação em feiras e internacionalização. No setor, há também algumas ameaças, que passam pela falta de mão de obra qualificada, o que significa que temos de melhorar, significativamente, os nossos níveis de produtividade e começar a pensar em atrair talentos profissionais de outros países para trabalhar, além de desenvolver um conjunto de competências que nos permitam ir procurar fora do país as partes que não são suficientes dentro da fileira para a completar. Ou seja, se nos faltarem empresas de confeção em Portugal, temos de ir à procura de empresas no Leste Europeu e no Norte de Africa para fechar o ciclo. O importante é que o centro de decisões e o valor acrescentado permaneçam em Portugal. O que nunca podemos fazer é deixar fugir o cliente. pub


opiniãopública: 25 de janeiro de 2018

PUBLICIDADE

21


22

ESPECIAL

opiniãopública: 25 de janeiro de 2018 pub

O que se vai usar em 2018 No arranque de mais um ano, é importante saber quais serão as tendências de moda. Mas, não se esqueça que o mais importante é usar aquilo que lhe mais favorece.

pub

Desportivo: as peças inspiradas no mood desportivo voltam a marcar presença neste ano. Desde looks completos a acessórios, as apostas vão para o veludo e para as bolsas de cintura. É verdade, as bolas de cintura, dos anos 90, estão na moda. Brilhos: eles vieram para ficar. De apenas um tom ou de vários, as peças com brilhos são algo em que deve apostar neste ano. Maxi-brincos: à semelhança do que já vimos, os brincos querem-se para este ano em tamanho maxi e repletos de pérolas e detalhes. Franjas: elas estão em todo o lado, com diferentes texturas, materiais e cores. As franjas também ganham novas cores esta estação. Podem surgir em sapatos, carteiras, brincos e colares. Vinil: O vinil e o PVC voltam com tudo neste ano. As propostas são várias e são também vários os designers que já se renderam a estes materiais. Macacões: estão a ganhar cada vez mais destaque nos armários femininos. Agora chegam em modelos como o boiler, um estilo mais relacionado com os uniformes, e em tecidos como a ganga, sarja, seda, entre outros. Ultra Violet: é a cor do ano de 2018 e este tom de roxo promete ser o preferido das mulheres. Comece já a apostar nesta cor e e mantenha-se na moda. Xadrez: é sem dúvida o padrão com mais destaque para 2018. Aposte nele em peças como blazers ou calças, são ideais para ter no armário. Cores ácidas: a próxima primavera vai ser feita de cores fortes, do amarelo-sol ao encarnado mais quente e ao verde, cor de laranja e cor-de-rosa. Podemos misturar tonalidades com leveza porque quanto mais criativos conseguirmos ser, melhor, e todas as combinações são válidas e possíveis. Saia-lápis: continuam femininas, a lembrar os anos 50. Em 2018, a saia-lápis pisa outros terrenos, surge em materiais surpreendentes como o plástico ou a lã e coordena-se com peças menos formais do que o aborrecido cliché da camisa branca. Ganga: Com 2018 volta a viragem do milénio e volta a ser cool vestir ganga dos pés à cabeça, desde que a lavagem seja a mais escura. Fonte: www.sapo.pt


opiniãopública: 25 de janeiro de 2018

ESPECIAL

23

Diretor do Citeve diz que há mais jovens interessados numa carreira nos têxteis e no vestuário

“Temos uma das melhores indústrias do mundo” Sofia Abreu Silva “O céu é o limite”. A resposta é de Braz Costa, diretor-geral do Citeve, o Centro Tecnológico das Indústrias Têxtil e do Vestuário de Portugal, quando questionado sobre até onde se pode ir na tecnologia aplicada aos têxteis. Hoje, quando se fala de têxteis não se fala só de roupa. Porque, de facto, a aplicação dos materiais têxteis não se resume a vestuário e têxteis-lar como no passado. “A designação de têxteis técnicos aplica-se exatamente aos que se destinam a uma aplicação diferente, como por exemplo nos automóveis, nos aviões, na construção e arquitetura, nos processos industriais, entre outros”, explica Braz Costa, que refere que os têxteis são hoje usados como base de substitutos de materiais como os metálicos, pelo facto de permitir “performances muito elevadas sendo, contudo, muito mais leves”. A título de exemplo dessa evolução, temos hoje a utilização de materiais de base têxtil na construção aeronáutica. “Há cerca de três décadas, os materiais de base têxtil constituíam cerca de 15% dos materiais das aeronaves, tendo esse valor atingido os 55% nos dias de

Braz Costa, diretor-geral do Citeve

hoje”, indica. Apostando na aplicação de têxteis técnicos nas áreas do automóvel, da proteção individual, do desporto, da saúde e do habitat, o centro tecnológico é hoje procurado sobretudo pela indústria têxtil, essencialmente nacional, mas também de países estrangeiros. “Nos últimos anos, cerca de 20% dos serviços que prestamos foi para clientes estrangeiros”, refere, subli-

nhando que o trabalho é feito também com centros de investigação europeus, numa rede que é, atualmente, presidida pelo Citeve. Num olhar à indústria portuguesa, o diretor-geral do Citeve não tem dúvidas de que esta “é uma das melhores do mundo, que se destaca no nível de serviço associado aos produtos que vende, na capacidade de resposta rápida e flexível, ainda no capítulo da quali-

dade do que produz”. Mas não é só. “É notória a capacidade inovadora, nomeadamente ao nível tecnológico, na sustentabilidade e responsabilidade social, bem como na fiabilidade das relações de negócio”, considera. Sobre o facto da indústria têxtil e do vestuário estar associada a salários baixos, Braz Costa tem uma visão mais moderada. “Os salários desta indústria são baixos ou altos consoante o ponto de vista. Do ponto visto dos colaboradores serão sempre baixos, do ponto de vista da competitividade das empresas, face à concorrência de países de salários muito baixos, os salários praticados são muito altos”, compara. Hoje em dia, afirma o diretorgeral do Citeve, a indústria portuguesa não pode trabalhar produtos de baixa especificação ou de baixa qualidade necessitando, portanto, cada vez mais, de mão de obra e decabeça-de-obra muito especializadas. “O setor emprega cerca de 20% dos trabalhadores da indústria nacional. É, portanto, compreensível que tenha de competir com outros setores na atração de recursos humanos, quer ao nível de operadores, quer ao nível de quadros”, sustenta.

Braz Costa admite, porém, que a má imagem do setor, difundida durante anos, dificulta a atração de talentos, mas ressalva que nos últimos tempos, “há mais jovens interessados em trilhar carreira nos têxteis e no vestuário, à medida que vão constatando os desafios e oportunidades que são propostos”. Ainda assim, afirma, “o saldo é verdadeiramente negativo, o que constitui um entrave ao desenvolvimento do setor a prazo”. Sobre Famalicão em concreto, Braz Costa diz que Famalicão tem uma presença significativa no “cluster têxtil: tecnologia e moda”. “Contudo, a clusterização é um processo que não é conduzido apenas por critérios geográficos, mas de agregação económica”, refere o diretor-geral do Citeve, explicando que Portugal é um país pequeno, à escala mundial, e o setor está muito concentrado em dois espaços territoriais concretos, com especial destaque para a região norte litoral. “Se é verdade que a importância do têxtil português depende da importância do têxtil famalicense, é igualmente verdade que a expressão do têxtil em Famalicão depende das formas como as empresas do concelho se integram no contexto português”. pub


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.