Países irmãos, Portugal e Brasil dividem não só a história e a cultura em comum, como também desafios importantes no âmbito do desenvolvimento, da inclusão social e da busca pelo bem-estar da população.
A realidade de cada país partilha de dilemas que lhes são próprios e exige soluções que aumentem a capacidade de construir um futuro, cujo desenvolvimento saudável possa abrigar as gerações atuais e futuras. Por isso, as duas nações têm feito investimentos importantes para enfrentar as necessidades das suas populações.
Se no Brasil a agenda política e económica tem promovido desenvolvimento, com o crescimento do PIB e o incentivo para o investimento externo, Portugal tem cumprido um programa de destaque no que diz respeito ao avanço de modernos parques industriais e tecnológicos e ao impulsionamento dos setores de serviços e tecnologia. Ainda assim, as demandas são muitas e urgentes, como a necessidade de ampliar o desenvolvimento económico, que permite novas oportunidades a regiões que possuem um grande potencial de crescimento. Não é difícil notar as semelhanças que nos unem. Tenha-se como exemplo o Nordeste brasileiro ou a região das Beiras portuguesas. Ambas são regiões com uma riqueza cultural impressionante, com um grande capital humano e um potencial enorme de crescimento
represado. Crescimento esse que será destravado com os investimentos certos, de forma a trazer um novo ciclo de desenvolvimento e a reposicionar o seu papel nas respectivas economias nacionais.
Nesta publicação, “Conexões”, contamos um pouco dessa história comum, dos cenários que já estão a ser construídos e daquilo que pode vir a ser. O caderno é elaborado pelo O POVO, um veículo de comunicação sediado no Ceará, Estado do Nordeste brasileiro que, não por acaso, mantém uma forte relação com Portugal.
A publicação Conexões, editada pelo jornal O POVO, não é apenas um lugar para registrar ideias. Ela pode ser, sim, considerada uma obra em si mesma.
A estética modernista portuguesa, com seus traços retos e minimalistas, foi a base da inspiração para o projeto gráfico. Assim como em um edifício modernista, Conexões foi concebido livre de ornamentos
desnecessários: curvas e desenhos que distraem a atenção. A paleta de cores tem a sobriedade e a elegância do preto e branco, que contrastam com toques de azul claro e amarelo, que representam luz e modernidade.
A tipografia moderna e equilibrada, aliada ao layout simples e organizado dos textos garantem uma leitura fluida e legível do conteúdo.
“E neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra, isto é, primeiramente d’um grande monte, mui alto e redondo, e d’outras serras mais baixas a sul dele e de terra chã com grandes arvoredos, ao qual monte alto o capitão pôs nome o Monte Pascoal e à terra a Terra de Vera Cruz.
O trecho acima é da “carta a el-Rei Dom Manoel sobre o achamento do Brasil”. Foi redigida a bico de pena pelo escriba Pero Vaz de Caminha, em 1º de maio, uma semana após a quarta-feira anterior, 22 de abril de 1500, quando os navegadores liderados por Pedro Álvares Cabral pisaram na areia de Porto Seguro, na Bahia.
Naqueles tempos, o Brasil e Portugal estavam separados por um Atlântico. Agora, existem várias pontes: pelo mar, pelo ar, pelo conhecimento, pela tecnologia... E também pelas
O plano económico comum – em torno da sustentabilidade, das energias renováveis e da economia azul – ganhou força nos últimos anos. Por isso, o Ceará passou a abrigar uma em cada quatro empresas portuguesas abertas no Brasil, de acordo com os dados mais recentes da Federação das Câmaras Portuguesas de Comércio no Brasil (FCPCB). Isto torna-o no Estado brasileiro que mais tem recebido investimento direto português.
Ao longo dos seus 96 anos, O POVO tem acompanhado nas suas várias plataformas essa aproximação e o que pode vir a surgir a partir dela. É o compromisso com um jornalismo global e de qualidade que revela como Portugal segue os passos da reinvenção e transformação, com o intuito de incrementar negócios, atrair novos investimentos, e desenvolver ações para ampliar parcerias com outros países. O Brasil, e o Ceará especificamente, fazem parte dessa rota de crescimento. Bem-vindos ao “Conexões”.
afinidades dos costumes, língua, religiosidade, nos pratos à mesa, nos marcos arquitetónicos, nos investimentos, turismo, oportunidades em estudos, empregos, em quem parte ou chega para empreender, na nova vida dos que se deslocam daqui para lá, de lá para cá. Cada vez mais.
Atualmente, existem cerca de 400 mil brasileiros que vivem oficialmente em Portugal. Sem contar com quem tem nacionalidade dupla. Dados estes do Ministério das Relações Exteriores do Brasil (MRE) que condizem com o que apontava, até agosto de 2023, o Serviço Português de Estrangeiros e Fronteiras, que indicava 392.757 brasileiros espalhados legalmente por Portugal. É a segunda maior comunidade de brasileiros no mundo (a maior está nos EUA).
Segundo a Embaixada de Portugal no Brasil, há 661.721
DEPARTAMENTO
portugueses inscritos nos postos consulares, “dos quais 334.311 com residência comprovada no Brasil, conforme registro de Cartão de Cidadão”. Só no Ceará, são cerca de 5 mil lusitanos instalados, segundo a Embaixada. De 200 a 300 desses moram no Piauí, estado que faz parte do mesmo posto consular.
“No caso do Ceará, eu diria que há logo uma conexão geográfica. Fortaleza é a capital brasileira mais próxima da Europa. Há grande interesse dos portugueses pelo Brasil em geral, Nordeste e Ceará. Creio que os portugueses são o principal contingente de turistas estrangeiros no Ceará”, destaca o cônsul Rui Almeida, chefe do vice-consulado de Portugal em Fortaleza. Os números comprovam isso. A pesquisa da Secretaria do Turismo do Ceará (Setur), realizada entre dezembro de 2022 e
Mais do que uma escolha estética, a releitura da memória arquitetônica portuguesa é uma homenagem à tradição inovadora do país. Álvaro Siza, Fernando Távora e Manuel Aires Mateus são alguns dos grandes nomes que influenciaram o design desta publicação.
Com essa estética, Conexões busca contribuir para a valorização da cultura portuguesa e para a difusão de ideias inovadoras num fluxo cuja travessia mantém, em caráter contínuo, trocas históricas, culturais e econômicas entre os dois países.
GIL DICELLI Editor-chefe de Designfevereiro de 2023, indicou que quase um quarto (22,9%) dos turistas internacionais vieram de Portugal. Mais que italianos (17,17%), franceses (16,16%) e argentinos (7,41%).
Romeu Duarte, professor do Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Design da Universidade Federal do Ceará (UFC), aponta para as linhas da arquitetura e do urbanismo, além da língua e dos costumes, também como marcas portuguesas. Elas delinearam a característica de uma sociedade e permanecem influentes. Mas ele destaca a adaptação dos modelos arquitetónicos vindos de Portugal, usados em sobrados ou igrejas, com a tecnologia e os materiais locais. “Quando, por exemplo, vais ao Icó, a Sobral, a Aracati, a Viçosa, a Tauá e outras cidades cearenses que datam do século XVIII, vês esse tipo de coisa a
ESPECIAL PORTUGAL
acontecer. É uma arquitetura portuguesa levantada com tijolo do rio Salgado, com carnaúba, com telha de barro ali das olarias do Salgado, com pouca condição de pintura, com madeiras para fazer estrutura também de carnaúba para os pavimentos de sobrados, tijoleiras, os pisos externos”, descreve. Nas adaptações, as edificações pensadas lá em Portugal precisaram de ser projetadas de forma mais arejada, ventilada, para reduzir o calor dominante no Ceará.
O português Virgílio Nogueiro Gomes, gastrónomo, professor, escritor e pesquisador do património alimentar do seu país, relaciona a primeira conexão pelo mar também para o que comemos. “Através da ligação marítima começou primeiro o intercâmbio de produtos e depois as formas de os confeccionar, o que deu origem ao que hoje
chamamos de ‘cozinha de fusão’”. Ele afirma que esta ponte ainda está em construção, num processo longo e que tem acontecido naturalmente. “Veja o caso do frango. Quando Cabral chegou em 1500 não havia galinhas. Hoje o Brasil é o maior exportador mundial de frango”.
Nogueiro destaca que a carta de Caminha é o principal documento para o estudo sobre a culinária do primeiro Brasil. “(A carta) estabelece algumas comparações, mas tem pequenos erros próprios da época. Por exemplo, confunde mandioca com inhame! Percebe-se que não havia doces quando os índios cuspiram as ‘fartes’ (doces), que hoje ainda se fazem em Sobral (concelho do distrito do Ceará)”, destaca. O cônsul português em Fortaleza, Rui Almeida, confirma: “Os dois países têm laços que sempre existiram”.
DE MARCA E COMUNICAÇÃO / LISBOA Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, engenheiro Carlos MoedasCarlos Manuel Félix Moedas nasceu em Beja, no Alentejo, em 1970, e cresceu no período pós-revolução do 25 de abril de 1974, ano que marcou o início da vida democrática em Portugal.
Desde cedo, o menino aprendeu as dificuldades financeiras da família. Neto de um sapateiro e de um operário da sala das máquinas do Diário do Alentejo, muitas vezes viu a mãe costureira esconder, num envelope na gaveta, algumas notas, para salvar os últimos dias do mês.
Já que o salário de jornalista do marido José Moedas, um comunista convicto e muito respeitado na cidade, era muitas vezes apertado.
A infância foi difícil, mas feliz. Aluno aplicado e de boas notas, Carlos Moedas alimentou, ao longo dos anos, o sonho de voar alto e ganhar o mundo, conhecer o que havia para lá das terras alentejanas. Em Lisboa, na faculdade de engenharia civil, dormia num quarto pequeno e o dinheiro era contado para o almoço e o jantar, na cantina estudantil.
No último ano do curso, candidatou-se ao Programa Erasmus e foi para Paris, França, onde, finalmente, mergulhou no mundo distante e diferente, com o qual sonhara. Num café parisiense, conheceu também o amor pela então estudante de economia e gestão, Céline Abecassis, filha de pai marroquino e mãe tunisiana, com quem é casado há 22 anos e têm 3 filhos.
Entre Paris, Londres e Harvard (Estados Unidos), passaram-se 11 anos no estrangeiro. No regresso a Portugal, Moedas trouxe mais diplomas nas mãos e uma experiência profissional já consolidada. Estava preparado para abraçar novos desafios. Já foi deputado pelo Partido Social Democrata (PSD) e, entre outras coisas, participou na equipe que negociou com a UE-FMI-BCE o programa de ajuste económico e financeiro para Portugal. Também voou para Bruxelas, como representante europeu. Em 2021, aos 52 anos de idade, o filho caçula de Zé Moedas assumiu a presidência da Câmara de Lisboa.
No novo gabinete, Moedas colou na parede uma grande fotografia do emblemático elétrico de Lisboa. Mas, a cidade que passeia diariamente centenas de turistas nos seus elétricos, a deslizar pelos carris e a abrir caminho nas ruas tortuosas e estreitas, tem duas faces. Por um lado, é a cidade aclamada por visitantes, nómades digitais e investidores, com o seu casario de varandas e águas-furtadas, movimentada durante o dia pelo tráfego difícil, e palpitante à noite, com suas casas de fado, bares com mesas nas calçadas, restaurantes para todos os gostos e carteiras e terraços com vistas inesquecíveis.
Por outro lado, é também uma Lisboa pressionada, empurrada para fora do centro, para dar espaço ao frenesim da primeira. Nos últimos tempos, não tão silenciosa assim. Nas ruas, ecoam em protestos algumas demandas urgentes. A principal é o pesadelo da habitação acessível na capital portuguesa. Como pagar os aluguéis, que se tornaram demasiado elevados, com o salário do país? O quebra-cabeças da habitação e reabilitação urbana têm preocupado o autarca. Pelo menos 66 mil pessoas - o equivalente a 10% da população da cidade - vivem em bairros municipais. Em toda a região metropolitana, são 2 milhões e 301 mil e 904 residentes. Moedas é pragmático. Trabalha para equilibrar e apaziguar as duas Lisboas. No contacto direto com as pessoas nas ruas, sempre que pode, tenta sentir a temperatura da cidade, nas suas demandas e frustrações. Pode ser na pausa de um café curto no Campo de Ourique, onde mora, um dos bairros de preferência da comunidade francesa que se instalou na cidade. Ou nos grandes eventos que movimentam a cidade –
como a Jornada Mundial da Juventude, em agosto de 2023. Para ele, a solução para este equilíbrio difícil está na inovação. Lisboa precisa reinventar-se, tornar-se um polo de destaque tecnológico e de desenvolvimento. Ser a “capital do sonho”. E, à frente deste comboio já em marcha, está o menino alentejano Carlos Moedas, de Beja, sempre a olhar mais para além, para mais longe, no horizonte. A entrevista com o Presidente da Câmara da montra de Portugal, que já vai em mais da metade do mandato, mostra como Lisboa pode mudar e crescer, tornar-se uma referência entre as capitais europeias.
O POVO - Lisboa e Fortaleza têm em comum o facto de se tornarem cidades que se destacam pela modernidade e investimentos em tecnologia e inovação. Para si, como a tecnologia e a inovação podem contribuir para que uma cidade possa desenvolver-se económica e socialmente, mas sempre a preservar os seus aspectos culturais e históricos?
Carlos Moedas - A inovação é o segredo de uma sociedade mais justa. Sem inovação, as empresas tornam-se menos competitivas e por consequência menos capazes de pagar bons salários e de oferecer melhores oportunidades de emprego à população. É o antídoto certo contra a pobreza porque promove a autonomia de cada um.
Essa é a razão pela qual eu defini a inovação como uma das principais prioridades em Lisboa. Foi uma aposta que nos permitiu criar emprego e atrair empresas de todo o mundo para Lisboa, incluindo empresas brasileiras.
Recentemente, a União Europeia reconheceu Lisboa como Capital Europeia da Inovação pelo nosso trabalho em criar condições para que os empreendedores possam crescer os seus negócios a partir de Lisboa para o mundo.
OP - Em relação à preservação da memória, Fortaleza e Lisboa também têm aspectos em comum. Como é que Lisboa tem encontrado estratégias para garantir a preservação de um dos seus principais ativos económicos e culturais, que é a memória da cidade?
Carlos Moedas - Lisboa é uma cidade em constante diálogo com o seu passado. Tem um património e uma herança inigualáveis, e um Presidente de Câmara ou Perfeito deve ser um guardião dessa herança. Acredito que a melhor forma de honrarmos o passado é aprendermos com ele e fazermos coisas novas. Investimos muito em manter vivas as tradições das cidades – como as famosas “Marchas Populares”. Mas procuramos também investir em novos espaços onde as pessoas possam entrar em contacto com a nossa história, como o novo Museu do Tesouro
Real que foi construído no Palácio da Ajuda. Queremos também trabalhar a memória comum com outras cidades, povos e religiões, muitos deles que fazem também parte da nossa sociedade. O futuro Museu Judaico que será construído em Belém é um exemplo disso mesmo.
OP - Metrópoles como
Lisboa vivem desafios entre o crescimento e o desenvolvimento e enfrentam questões como migrações, custo de vida, por exemplo, que pressionam as estruturas da cidade. Como é que a gestão do senhor Carlos Moedas lida com essas questões?
Carlos Moedas - Uma cidade é um espaço de equilíbrios. O crescimento económico é algo necessário e positivo, e para o qual a imigração tem um contributo fundamental. Lisboa precisa de imigração. O desafio está muitas vezes em criar condições para as que pessoas que escolhem Lisboa como sua nova cidade possam ter condições dignas, encontrar um trabalho, uma casa, uma escola para os filhos, entre outros serviços essenciais.
E para isso, é importante termos melhores políticas de imigração, capazes de enquadrar quem nos escolhe e de lhes dar as condições para que possam também contribuir para a nossa sociedade, como já tantos imigrantes fazem em Portugal.
Quanto ao desafio das desigualdades, eu acredito que por cada euro que investimos em inovação e políticas económicas, temos de investir 100 ou 200 vezes mais em políticas sociais, mesmo quando fogem às competências tradicionalmente atraídas às cidades em Portugal, como por exemplo a educação e a saúde.
Acredito que as cidades podem fazem mais para promover um equilíbrio e bem-estar sociais. Em Lisboa lançámos iniciativas muito originais, como o seguro de saúde gratuito para idosos, os transportes públicos gratuitos para os jovens ou um novo plano para as pessoas em situação de sem-abrigo.
OP - Lisboa é uma cidade cosmopolita que atrai investidores do Brasil e de vários países europeus. Lisboa tem investimentos preferenciais, quando recebe esses investidores? O que mais interessa hoje à cidade?
Carlos Moedas - Lisboa tem áreas onde procura posicionarse como uma cidade competitiva a nível internacional. São sobretudo áreas tecnológicas e com elevado valor acrescentado, onde procuramos atrair empresas que instalem aqui os seus centros de investigação, as suas equipas de inovação ou pequenos escritórios.
Nas novas tecnologias, destaco as áreas de Web 3, Inteligência Artificial e Gaming, onde estamos a desenvolver projetos de incubação e aceleração de novas empresas em parceria com a
Microsoft, a Fortis Games e outras grandes tecnológicas. Destaco também as áreas da saúde digital e da sustentabilidade, onde queremos fomentar novos negócios aproveitando o apoio de grandes empresas do setor.
OP - Lisboa tornou-se o sonho de muitas pessoas pelo mundo fora. Morar em Lisboa é desejado por muita gente. O que considera que mais atrai as pessoas para Lisboa?
Carlos Moedas - Tradicionalmente, aquilo que mais atraia as pessoas para Lisboa eram argumentos que não dependiam exatamente de nós: o bom tempo, a qualidade de vida, a história, os preços baixos. Hoje, acredito que conseguimos distanciar-nos dessa imagem turística da cidade e convencer as pessoas a vir pela qualidade das nossas empresas, pelas oportunidades profissionais, a capacidade de inovação e o nosso dinamismo económico. Temos muitos empreendedores que vêm de São Francisco, Londres ou Berlim e que sentem que aqui encontram as condições certas para crescer os seus negócios.
OP - Quais são os seus grandes desafios e conquistas na sua gestão? O que o senhor quer deixar como legado?
Carlos Moedas - O meu foco todos os dias é em criar uma cidade onde todos têm lugar e podem viver, criar família, estudar, trabalhar e envelhecer com dignidade.
Instalada nos edifícios renovados do antigo complexo fabril do exército português, no Beato, a Fábrica de Unicórnios de Lisboa prepara-se para expandir-se e lançar uma rede de hubs de inovação pela cidade. Em parcerias que estão a ser feitas, dois bairros lisboetas foram já escolhidos para sediar estes centros colaborativos, que vão reunir, num mesmo espaço físico, e no mesmo espírito de comunidade, players que até então estavam dispersos.
O desafio de Gil Azevedo, diretor da Start-up Lisboa e da Fábrica de Unicórnios, é chamar startups, investidores, especialistas e o mundo académico para pensarem na criação de produtos e modelos de negócios disruptivos, em segmentos específicos. Na linguagem de negócios, são os verticais. Saldanha e Alvalade são os dois primeiros pólos e já estão a formar comunidades focadas na área de Inteligência Artificial, Gaming, Web3, Welltech e tecnologias em extended reality (XR). Mas o plano é de que a rede de hubs se espalhe para outras áreas da capital, “criando um ecossistema de inovação
percurso de aprendizagem de oito meses, as scale-ups selecionadas percorrem um currículo prático e imersivo, onde desenvolvem competências críticas de liderança, aceleram o crescimento em Portugal e planejam a expansão para outros mercados.
“Ao todo, estas empresas já representam algo em torno de 55 milhões de euros”, acrescenta Gil Azevedo. Entre startups e scale-ups, já são mais de 220 empresas a participarem dos programas da Fábrica de Unicórnios, com parceiros que incluem gigantes tecnológicas como Google e Microsoft.
À medida que atrai investimentos em inovação e novos talentos para aumentar a rede de hubs de Lisboa, a Fábrica de Unicórnios lança as suas pontes para ecossistemas semelhantes, em outras partes do mundo que são cultural ou fisicamente próximas de Portugal. “Neste trabalho em conjunto, olhamos para o Brasil como um mercado que pode trazer sinergias positivas para ambos os lados”, diz. Segundo ele, start-ups portuguesas, que querem crescer para a América Latina, têm no Brasil uma primeira porta de entrada. Por outro lado, empresas brasileiras, que desejam expandir-se na Europa, têm em Lisboa e em Portugal o seu por-
No Brasil, a Fábrica de Unicórnios participa em grandes eventos tecnológicos e, em Portugal, recebe delegações. “Estamos a falar com uma série de empresas e organizações, de forma a criar laços, para cada um apoiar um outro lado, e ser vantajoso para todos”, explica
Na opinião do diretor-executivo, temos de aproveitar as nossas parecenças culturais e as nossas sinergias para trocarmos experiências e apoios, e fazermos estas redes se expandirem cá e lá”. A criação destas pontes resultou em duas scale-ups, que lançaram operações no Brasil.
As pontes lançadas pela Start-up Lisboa e pela Fábrica de Unicórnios trouxeram, este ano para Lisboa, o título de Capital Europeia da Inovação. O prémio de 1 milhão de Euros, atribuído pela Comissão Europeia, vai ser usado em áreas sociais e é uma forma, segundo Gil Azevedo, do empreendedor contribuir para uma Lisboa mais justa e solidária. “Vamos fazer com que a tecnologia venha a beneficiar a vida das pessoas, já de imediato. E isto acontecerá com um programa que vai funcionar em uma nova ala na Fábrica de Unicórnios, para levarmos inovação para setores desafiantes, como saúde, educação e integração de imigrantes”.
Para Azevedo e Moedas, este é o reconhecimento pelo trabalho que está a ser feito, com a criação de ecossistemas de inovação. Com baixos custos operacionais em comparação com grandes centros como Londres e Berlim, bons índices de qualidade de vida, distâncias acessíveis a viagens curtas, e a quarta melhor rede de fibra óptica do mundo, Lisboa tem como ambição competir com os grandes centros tecnológicos a nível internacional, em um movimento que pode vir a ser replicado em outras regiões portuguesas.
“As empresas internacionais estão, cada vez mais, a olhar para o programa como uma oportunidade para ajudá-los no movimento de expansão. E a nossa capacidade de gerar empregos, de gerar riquezas e investimentos superou as expectativas”, conclui Gil Azevedo.
robert frans/especial para o povoNa serra da Gardunha, o sino da igreja de Janeiro de Cima bate alto, os fornos a lenha assam broas de milho e carne de cabra, as mulheres matracam os pedais dos teares e as águas turbulentas e frias do rio Zêzere passam, por assim dizer, nos quintais. Pela situação geográfica e identidade coletiva tão particulares, Janeiro de Cima é uma das 27 Aldeias do Xisto. Bruno Ramos, coordenador da AdxTur, explica que, há tempos, estas cidades estavam em ruínas. As casas, grande parte feitas com pedras de xisto, desabavam, uma a seguir à outra. E as pessoas, ao verem o abandono do poder central e os mais jovens a irem-se embora, andavam com baixa autoestima.
“Percebeu-se que havia nestas aldeias uma forma de vida muito particular, uma identidade cultural e coletiva, com uma relação estreita com a natureza”, diz. Segundo Bruno Ramos, dentro de uma política pública de desenvolvimento, e a partir dos fundos europeus, surge o projeto Aldeias do Xisto, que utiliza o turismo como ferramenta para dinamizar a região. “Não é uma experiência turística qualquer”, acrescenta. “É uma imersão consciente e um contato profundo com a natureza e com as comunidades”.
A primeira medida foi
recuperar o património arquitetónico e formar uma rede de pequenos negócios, tanto no turismo como noutros, para que, juntos, tivessem a capacidade de competir num mercado aberto. O trabalho da AdxTur é coordenar todos estes lados, formar uma rede solidária e atender à procura turística. Argumentos para atrair turistas não faltam. “A vida nas aldeias é ligada à terra, aos sentidos, à sustentabilidade, à economia circular, ao modo de vida mais brando e consciente”, acrescenta. Para ele, é importante atrair pessoas, negócios, projetos que venham para as aldeias, no respeito à natureza e tenham um efeito de propagação positivo. Aos poucos, pessoas e projetos estão a chegar e a fazer a diferença “Na restauração, na animação turística, no alojamento, que tem crescido todos os anos”. Uma das vertentes em crescimento é o desporto, com passeios pedestres, canoagem, escaladas, rotas para bicicletas, e também as tradições locais do queijo, da gastronomia, das tradições religiosas. E, claro, as praias fluviais que, todos os verões, animam as margens do Zêzere. “As aldeias são tradicionais, mas abertas ao mundo. Essa é a atitude experimental, de abertura de novos caminhos”, conclui.
Nas aldeias do xisto, estava-se a perder um dos saberes tradicionais, o de manusear os teares para o fabrico de linhos. Com os fundos sociais europeus, uma casa em ruínas em Janeiro de Cima foi completamente recuperada para dar lugar à Casa das Tecedeiras, onde jovens tecedeiras são formadas e aprendem a inovar, em termos de têxteis. Sónia Latado frequentou as aulas e cuida há 14 anos da casa que, além do xisto da serra, recebeu também, na
construção dos muros, o seixo rolado vindo do rio Zêzere. Para estudantes e visitas, que chegam de outras partes do país, ela mostra como se manipulam os pedais e como a trama passa entre os fios longitudinais. O resultado de um destes encontros, na Casa das Tecedeiras, com alunos adolescentes da Escola Profissional e Artística António Arroios, é um painel feito em trama de linho, exposto na sala. “Uma obra de arte”, diz.
Bruno Martins, de 41 anos, estudou hotelaria, cozinha e gestão em Coimbra, e em 2012 resolveu voltar às raízes, à pequena aldeia do xisto Janeiro de Cima. Abriu o restaurante Fiado e atualmente anima as aldeias de xisto com os seus pratos típicos, como a chanfana de cabra velha, um dos grandes ícones da gastronomia do Centro de Portugal. A cabra velha, feita à base de vinho, é cozida em fornos a lenha por mais de 3 horas.
“Quase todas as casas aqui têm forno a lenha e nós pegamos emprestado, para fazer um dos pratos mais pedidos da casa”, diz o dono do restaurante. Como filho da região, Bruno Martins preparase, entretanto, para ter o seu próprio forno a lenha, à porta do Fiado, que, segundo espera, servirá a comunidade toda de Janeiro de Cima. “Numa relação solidária, quem quiser utilizar, pode fazê-lo”.
Os fundos europeus têm provocado transformações inegáveis no interior de Portugal. Transferidos para os municípios através da assinatura de contratos entre as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) e as Comunidades Intermunicipais (CIM), o dinheiro vai para prioridades como educação, saúde, proteção civil, mobilidade, melhorias na qualidade de vida das populações, eficiência energética e tecnologias. A verba pode parecer curta para tantas coisas, mas é bem-vinda. Para a região centro do país, já estão a chegar 900 milhões de euros, o que corresponde a 42% da dotação total do Programa Centro 2030. Com os cheques nas mãos, Isabel Damasceno, a presidente da CCDR-Centro, explica a cada uma das 8 CIM da região, que não se trata apenas de uma distribuição de verbas, mas sim de um contrato de confiança “baseado no princípio da descentralização”. Ou seja, com o dinheiro mais próximo os projetos são melhor executados. Segundo ela, na lógica da confiança e da transparência, os municípios comprometem-se a cumprir o que se propõem e a dar bom uso ao dinheiro, dentro do plano de desenvolvimento da região. “Estou certa de que a região sabe o que quer e está preparada para fazer isso”. Entre o périplo de encontros com a CIM da região central, Isabel Damasceno conta que, num território tão vasto,
as cidades do interior têm um papel determinante no futuro do território do Centro. Como desafios apresentam-se, a baixa densidade populacional, um processo de envelhecimento acelerado e uma dinâmica económica ainda muito ancorada em atividades tradicionais, nomeadamente na agricultura e florestas. “As cidades do interior têm de afirmar ainda mais o seu papel enquanto pólos de desenvolvimento e dinamismo económico”, explica. Isso passa, segundo Isabel Damasceno, por formar recursos humanos qualificados, atrair investidores e investimentos em atividades industriais e de serviços. “Atividades intensivas em conhecimentos, competitivas nos mercados internacionais e que permitam oferecer melhores empregos e remuneração, para reter e atrair jovens talentos”, diz. Para ela, esta rede de cidades apresenta um conjunto de fatores competitivos, face a Lisboa e ao Porto, como a presença de instituições de ensino superior, com estudantes de outros países e continentes, unidades de saúde públicas e privadas e um património histórico de elevada qualidade, “muitos deles reconhecidos pela Unesco”.
“Além disso”, completa a presidente do CCDR-Centro, “há comunidades culturalmente ricas, que criam ambientes criativos e atraentes, com condições para viver,
estudar, trabalhar, investir, tudo isso rivaliza com Lisboa e Porto”, acrescenta. Somamse à lista, os produtos endógenos, como o vinho – com 5 denominações de origem. Os recursos endógenos que são atualmente, segundo ela, a base de várias dinâmicas de inovação. Isabel Damasceno menciona como exemplos a rede das Aldeias do Xisto, a rede das Aldeias Históricas, a rede das Aldeias de Montanha.
“Experiências de inovação ao nível de organização de parcerias e processos de colaboração entre os atores locais”.
“São dinâmicas como estas, que envolvem comunidades locais em processos de desenvolvimento, no apoio ao microempreendedorismo, ou modelos de marketing territorial, que os fundos europeus também financiam”, explica. “Agora”, diz, “resta aos municípios apresentarem boas candidaturas, dando provas de maturidade nos projetos, de forma que provoquem transformações na região”.
Isabel Damasceno lembra que estas transformações e inovações esperadas são regras impostas pela União Europeia, de onde vêm os fundos. “Bons projetos sempre terão bons financiamentos”, conclui.
O jornal O POVO foi ao Centro de Portugal, conhecer in loco a realidade de algumas comunidades intermunicipais (CIM), numa região onde os desafios são tão grandes quanto o despovoamento e o envelhecimento populacional.
No Centro, existem 8 comunidades intermunicipais que trabalham arduamente na promoção, desenvolvimento económico e social dos blocos de municípios associados.
Entre elas, a CIM Beira Baixa, com 8 cidades, a CIM Beiras e Serra da Estrela, com 15, e a CIM Viseu-Dão-Lafões, com 14. Entre montanhas, vales e planícies de beleza natural digna de postal, a reportagem seguiu o curso contrário do rio Zêzere, para alcançar as aldeias da Serra da Gardunha e da Serra da Estrela. Também atravessou a região dos rios Dão e Mondego, entre subidas, estradas sinuosas e curvas fechadas, para perceber o que faz a identidade das Beiras e como elas se organizam atualmente.
Se olharmos de Norte a Sul de Portugal, contamos 21 comunidades intermunicipais, conhecidas no país pela abreviação CIM, que ocupam um espaço intermédio entre as organizações regionais e as câmaras municipais. Criadas há dez anos, elas têm um papel importante no processo de descentralização do poder político e na administração territorial. Na última década, com mais ou menos dificuldade, todas tiveram de se reinventar.
Por exemplo, buscar técnicos, em quantidade e qualidade, para atender às novas e complexas competências que foram aterrando na mesa, e foram atribuídas às recém-criadas entidades. O tempo mostrou, no entanto, que esta nova forma de organização do país tem sido um sucesso. O maior deles, a cooperação entre municípios. Mesmo que ainda existam desafios pela frente.
Assumindo áreas cada vez mais relevantes para o território nacional, as CIM articulam-se e colaboram com as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional
conjunto com a CCDR-Centro, sediada em Coimbra. É a ela que prestam contas, sobre a aplicação dos recursos investidos em projetos que beneficiem a todos os municípios agregados. Segundo o presidente da CIM Beiras e Serra da Estrela (CIMBSE), e também presidente da Câmara de Gouveia, Luís Manuel Tadeu Marques, o arranjo das CIM não é definitivo e está sempre em aberto. Para ele, há muitas vezes toques ou atritos entre uma e outra CIM, o que indica que, talvez no futuro, haja fusões e rearranjos. Tadeu Marques dá como exemplo o caso da CIMBSE, olhando em especial para a cidade de Gouveia, cujo fluxo quotidiano da população é mais para Viseu que para a Guarda, como seria
“Vai depender dos próximos eleitos decidirem se, em determinado momento, irão aprofundar ainda mais a relação na comunidade ou se se associam a outra comunidade, com maior conexão”, diz. Isso quer dizer que, um município sair de uma CIM para integrar uma outra, vai depender da evolução das próprias comunidades. “Em termos de como os movimentos populacionais são drenados e do sentimento estreito entre cidades”. Como estruturas sub-regionais fortes, as comunidades intermunicipais têm um papel importante no desenvolvimento das regiões que representam, desenvolvendo projetos de interesse comum. Tanto no trabalho com os municípios, como também de olho em outras oportunidades fora do território de atuação. Participar de feiras e eventos no Brasil e em outros países, por exemplo, faz parte desta articulação mais alargada. E trabalhar para que os produtos da região tenham visibilidade pela Europa, com selos DOP (Denominação de Origem Protegida) e sejam valorizados internacionalmente.
Joao
Na parede da sala da CIM Beira Baixa, um orgulho local, ou melhor, regional, o motivo floral de um imenso bordado albicastrense. Uma arte secular que teve o seu auge no século XVIII e agora deu a Castelo Branco o seleto passaporte para a Rede de Cidades Criativas da Unesco.
“As cidades são ecossistemas que devem dialogar em rede, com o objetivo de promover e desenvolver o seu desenvolvimento integrado, onde a criatividade humana aparece como principal motor”, diz Hélder Henriques, vice-presidente do município de Castelo Branco, idealizador da candidatura junto à Unicef e ex-secretário-executivo da CIM Beira Baixo.
O cargo é hoje ocupado por outro adepto incondicional dos elementos agregadores da Beira Baixa, o engenheiro João Carvalhinho. Orgulhoso de ter o bordado exposto na sala de reuniões da CIMBB, ele lista os pontos positivos da região. “Somos um território com forte segurança energética, por exemplo. Uma estrutura moderna e forte, que garante qualidade de serviço para as empresas que aqui se instalam”, diz.
Segundo ele, embora a Beira Baixa não tenha um componente industrial forte, tem um setor primário em forte modernização. E isso tem a ver também com uma empresa brasileira que se instalou na região, a Veracruz. Com 5 propriedades em Idanha-a-Nova e no Fundão, a empresa transforma variedades mediterrâneas de amêndoas em óleos, manteiga, bebida vegetal e outros produtos derivados. O investimento é em Smart Farming, que utiliza tecnologias, como drones, para uma agricultura de precisão. “Temos também, na múltipla dimensão,
as florestas e estamos em busca do melhor modelo de negócio para financiar isto”, explica. Para o diretor-executivo, a Beira Baixa é produtora de energia e garante importantes reservas de água. “A água que o lisboeta bebe vem da Serra da Estrela para baixo”, explica.
Segundo ele, são as florestas das Beiras que controlam as emissões de carbono de outros territórios mais desenvolvidos, urbanizados e industrializados.
“A questão é como ser ressarcido por isso?”, pergunta.
Segundo João Carvalhinho, “a Beira Baixa tem essa força e a fraqueza de não poder apresentar uma conta”. Para ele, num território reconhecido como de grande valor natural, que traz vantagens para o turismo natural, não é possível ter apenas isso, até porque a atividade turística pode ter efeitos sobre a depreciação do valor natural.
Esta preocupação não é, sem dúvida, a mais importante na Beira Baixa, onde o problema demográfico se agrava, ano após ano. “O desafio passa por atrair e fixar talentos, muitos vindos da imigração”, acrescenta. Com o exemplo de Idanha-aNova na ponta da língua, município com altos índices de perda populacional (-14,7%, em 2018), Carvalhinho constatou, numa visita à escola da Raia, que mais de metade dos alunos são provenientes dos países de fala portuguesa, especialmente São Tomé e Cabo Verde.
Os brasileiros também constituem hoje uma força de trabalho na região. O desafio de contrariar esse cenário exige medidas pragmáticas e urgentes. “Temos que qualificar estas pessoas e dar-lhes argumentos de inclusão, para que fiquem na Beira Baixa”, enfatiza o diretor -executivo.
O empresário Leonel Barata, 43 anos, nasceu no Fundão e os avós eram de Janeiro de Cima, uma das Aldeias de Xisto, com o rio Zêzere, a bem dizer, à porta de casa. Como os pais tinham um restaurante, cresceu entre sabores e práticas tradicionais, que misturam peixes pescados no rio, panelas e tachos. Com 20 anos de experiência profissional em hotelaria e turismo gastronômico, foi em busca das suas raízes e das técnicas ancestrais da Beira Interior, para abrir o seu próprio negócio, o Bem Amanhado.
A empresa desenvolve conservas de peixe do rio, o que ele chama de iguarias. No menu das conservas, temos carpa grelhada, escabeche de lucioperca, sável frito, truta abafada, fataça estufada, savelha confitada, um risoto de carpa ou uma caldeta de barbo. Todas receitas recuperadas do registo do património cultural português. O escabeche de lucioperca, por exemplo, é uma adaptação de uma tradição da transumância, quando os pastores das Beiras
levavam os rebanhos para as montanhas, durante o verão. Do Zêzere, do Guadiana, do Mondego, do Tejo, do Minho, do Douro. De todos os rios portugueses chegam os peixes para as conservas de Leonel Barata. Mas, não são peixes quaisquer. Com pesca artesanal e sustentável, a marca aposta em espécies invasoras. “A óptica é de equilíbrio da biodiversidade dos ecossistemas dulçaquícolas não só de Portugal, mas da Península Ibérica”, explica. Alguns dos peixes de rio que caem nos vidros e latas da Bem Amanhado, como o lucioperca, o achigã e a carpa, são peixes selvagens e exóticos, no topo da pirâmide. Invasores, mas ricos em ácidos gordos e excelentes para a saúde humana. Estão melhor no escabeche da Bem Amanhado – cozido em fogo lento, à lenha, e com o detalhe de uma baga de zimbro - que nas águas destes rios. Nesta ligação com o fluxo dos rios, e depois de alguns prémios por inovação na área, a produção das conservas faz-se de novembro a maio, por respeito aos ciclos de vida, nas águas doces.
Num histórico colégio de jesuítas do século XVIII, que tempos depois foi tribunal e prisão pública, Luís Manuel Tadeu Marques, presidente da Câmara de Gouveia e tam bém presidente da CIM Beiras e Serra da Estrela, trabalha para trazer turismo e negócios novos para a região. Um turismo, aliás, de aldeias e rural, onde o visitante absorve as sensações do lugar. Seja ao degustar um copo de vinho ou o melhor queijo do mundo, como ele enfatiza. “Mexer com a economia local”, e dar-lhe “um dinamismo”.
Luís Marques explica que a época das grandes fábricas da região já passou. Hoje a realidade volta-se mais para os negócios de nichos, que aproveitam o que a região tem para trazer uma nova imagem. A Burel Factory, por exemplo, que em Manteigas, tem dado novos usos a uma técnica ancestral e a um produto tradicional das montanhas, a lã. Os empresários resgataram da insolvência uma antiga fábrica de lã, que já foi a mais importante da Serra da Estrela, resgataram o espólio de teares, cardas e maquinaria ancestral, e deram uma reviravolta nos usos da lã.
Na moda, na decoração de interiores, mas também para a construção civil e arquitetura, com materiais para a acústica e proteção térmica de casas. Luís Marques destaca que os novos usos dados ao burel, produto final originado da lã das ovelhas da Serra da Estrela, são de grande importância não só para a vida nas montanhas - frias no inverno e quentes no verão -, mas tem reacendido a economia do Centro. “E precisamos disso, mexer com a economia, gerar empregos, novos negócios”. Para impulsionar este movimento na economia local, a CIMBSE faz o que pode e, “às vezes, não pode muito”, diz o Presidente da Câmara. “Precisamos de gente, de mão de obra e em todos os sectores”, diz, repetindo a fala de empresários e presidentes das CIM, do Centro de Portugal. Isto porque a tendência de despovoamento do interior do país é evidente, embora a Serra da Estrela tenha, no Censo de 2021, registado 2 exceções, justamente em Gouveia. Na Rota das Aldeias Históricas, Figueiró da Serra e Freixo da Serra, duas cidades
de Gouveia, conseguiram resultados positivos, em termos demográficos, contrariando uma tendência alarmante, nas aldeias vizinhas. A explicação pode estar na instalação da rede de fibras ópticas em 2019, que reforçou a atratividade do lugar, permitindo que as pessoas se instalem e trabalhem remotamente. Mas, passa também por um esforço conjunto das duas aldeias. Com o passado de minas de volfrâmio – ou tungsténio, metal usado no fabrico de filamentos de lâmpadas incandescentes -, moinhos e lagares, as duas aldeias têm conseguido fixar jovens e atrair o interesse de novos moradores, portugueses e estrangeiros. Os projetos de agricultura familiar, o sentimento de comunidade e as belezas naturais e arquitetónicas têm também um papel. Com custos mais baixos, o território tem ainda muito espaço para atrair novos negócios, diz Luís Marques. “Na robótica e novas tecnologias, por exemplo, que desejem se fixar e se desenvolverem aqui”.
O prémio da Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios foi para o “Conde de Vinhó”, um queijo de cabra de cura prolongada, feito artesanalmente pela Queijaria da Caramuja, e um dos orgulhos da cidade de Gouveia. Paulo Mota, que trabalha também, entre outras coisas, com ovos biológicos, azeite e vinho, numa quinta na Serra da Estrela, produz cerca de 70 queijos por dia, com a sua equipa de 13 funcionários. Paulo Mota comprou a queijaria há apenas um ano e envia os seus queijos frescos de leite de cabra, DOP e não-DOP, para o Luxemburgo e a Suíça. A distância dos grandes mercados, como Lisboa, dificulta um pouco a vida do responsável pela empresa, no sentido que os produtos são perecíveis. “Mas a qualidade de vida na região conta mais”, diz Mota, que não prescinde de viver na serra. Agora a ideia é partir para novos nichos, como o kefir de leite de cabra.
Numa colaboração com um mestre chocolateiro Flávio Silva, andam os dois a rechear bombons de chocolate com queijo fresco de cabra, com uma pitada final de flor de sal. Feitos à mão, os bombons ainda
estão em fase de teste e de desenho final da embalagem, mas Paulo Mota acredita que o mercado vai apreciar a novidade. Afinal, a produção da casa não é feita de leite de cabras ou ovelhas quaisquer. À sombra das árvores, no terreno contíguo à queijaria, descansa um rebanho de Bordaleiras, com sua lã crespa e negra. É a raça de ovelhas da Serra da Estrela, originária de um cruzamento de ovelhas típicas da Península Ibérica e de uma raça de origem africana, trazida pelos muçulmanos. São delas e da cabra Serrana, de pelo negro e liso, o leite inconfundível que dá sabor, textura e fama aos queijos da Serra da Estrela.
Nos dois casos, tanto as ovelhas Bordaleiras como as cabras Serranas, originárias da Serra da Estrela, estão em risco de extinção. Para Paulo Mota, trabalhar com a produção de queijos locais implica também preservar estas 2 espécies e aumentar o rebanho. “Queremos dobrar o número de animais”, diz. Mota tem razão, pois preservar esta cultura do leite de cabras e ovelhas autóctones é garantir muitos anos e prémios para os queijos da Serra da Estrela.
De mãos dadas com o município da Covilhã e com a Universidade da Beira Interior, o Parque de Ciências e Tecnologia da Covilhã (Parkurbis) atingiu 95% da capacidade máxima, com 40 empresas instaladas. Como a procura por parte de grandes empresas de serviços tecnológicos não pára de crescer, o Parkurbis expande-se agora para os territórios envolventes. Para abrigar grandes projetos, mas também para a incubação de startups e laboratórios para estudantes, na experimentação de trabalhos tecnológicos inovadores e prototipagem eletrônica.
O que significa que há muito que fazer e muito a esperar do futuro. Com os preparativos da chegada da Lightningplace, um empreendimento de capital indiano que vai fabricar diamantes artificiais na Covilhã, a expectativa é de um efeito positivo de contágio, na geração de outras atividades associadas. Para Jorge Patrão, Presidente do conselho administrativo do Parkurbis, o impacto será promissor não só para a Beira Interior, mas para Portugal. Segundo ele, será o primeiro empreendimento deste gênero no país e o segundo na Europa – já que há apenas uma unidade na Bélgica. O volume de negócios previsto é de 300 milhões de euros por ano.
“Estamos a criar um cluster tecnológico na Covilhã, com produtos inovadores e de grande credibilidade nos mercados internacionais”, diz. O resultado deste esforço conjunto é visível nos números do município. A exportação cresceu 3 vezes mais do que a importação. O trabalho de construir pontes entre os empresários e o conhecimento científico já rendeu ao Parkurbis, inclusive, um lugar privilegiado no Top 10 das melhores incubadoras da Europa associadas a universidades. “Para que estas empresas trabalhem, desenvolvam produtos, reatores como os que serão necessários para a produção dos diamantes artificiais, é muito importante ter a colaboração dos técnicos universitários”.
Como parceira, a proximidade com a Universidade da Beira Interior (UBI) é uma mais-valia preciosa. A universidade está entre as melhores do mundo, segundo o ranking mundial de universidades do Times Higher Education
(THE). Em Portugal, é a 6ª melhor, entre 17 do país. E o número de alunos tem batido recordes, ano após ano. Em 2023, a UBI recebeu mais de 9 mil alunos e a expectativa é de que, em 2030, o número chegue a 12 mil. Importa dizer que 22% dos alunos são estrangeiros, muitos deles rasileiros.
“Isto conduz a um enriquecimento cultural que a Beira Interior necessita”, explica Jorge Patrão, ao mencionar a decadência demográfica no interior do país.
Para ele, seja nos bancos da universidade, seja como mão de obra para as empresas que se instalam no Parkurbis, os estrangeiros que têm chegado na Covilhã integram-se a este esforço comum, seja no conhecimento científico, seja para trabalhar ou investir. “Trazem alma nova, outras mentalidades e tolerâncias. Quando há investimentos, a cidade cresce e aumenta a reabilitação urbana dos edifícios. Por exemplo, velhas indústrias abandonadas estão a ser reaproveitadas em novas funções”, acrescenta. Com quase 20 anos de existência, o Parkurbis tem acompanhado o desenvolvimento do município. No passado, a Covilhã foi um dos principais centros europeus de lanifícios. Uma indústria de lã que absorvia praticamente toda a população da região, na manipulação exaustiva e cotidiana dos teares. “Hoje, ao invés de uma mão de obra intensiva, temos tecnologia e capital intensivos”, diz Jorge Patrão. Segundo ele, no tempo das primeiras manufaturas, as fábricas trabalhavam, por exemplo, para os fardamentos dos exércitos portugueses. “Hoje, empresas de alta tecnologia vestem hospedeiras das companhias aéreas do Médio Oriente, produzem fardas da polícia e dos bombeiros franceses e pilotos de helicópteros”. Da secretária do gabinete onde trabalha, Jorge Patrão mostra do outro lado da rua, no imenso espaço do Parkurbis, as instalações modernas da Mepisurfaces que, com 500 funcionários, muitos no âmbito tecnológico, galvaniza metais preciosos para grandes marcas internacionais, no mercado de luxo. “São francosuíços e criaram aqui a fábrica modelo do grupo mundial”. Segundo ele, é importante lembrarmos dos teares de lã e das fábricas de lanifícios que fizeram o passado da cidade, mas guardar deste tempo apenas o espírito de inovação. “É este o espírito que desenvolveu a cidade e que se deseja manter vivo. Mas, adaptados aos tempos de hoje, com o objetivo de exportar, qualificar jovens e produzir riquezas para a região”.
Com origem tupi-guarani, Cayowaa, significa homem (povo) da floresta. Em português, o nome foi escolhido para apresentar uma empresa que representa uma comunidade criativa, que constrói ferramentas e projetos que impactam a economia, a educação e a cultura de uma região.
A Cayowaa é um bom exemplo de empresa que faz a ponte entre Portugal e o Brasil. No Brasil, a empresa localiza-se em São Paulo e especializou-se na criação de guias, documentários, revistas, plataformas digitais, publicações técnicas e cursos de educação à distância na América Latina. Além disso, concebe e realiza eventos e outras soluções na área da educomunicação.
A semente desse know how na área da educação vem da Fundação Demócrito Rocha (FDR), uma instituição cearense sem fins lucrativos criada pelo Jornal O POVO. A FDR atua há 40 anos na área da educação, e é parceira da Cayowaa na realização de novos voos, especialmente na área do desenvolvimento económico.
Em Portugal, a Cayowaa instalou-se no ParkUrbis, na Covilhã, sob o nome de Cayowaa
Internacional. A nova empresa, genuinamente portuguesa, tem o propósito de elaborar conteúdos, criar soluções editoriais e estratégicas em torno do desenvolvimento económico sustentável.
Indo muito além de compartilharem a mesma língua, os países irmãos, que possuem ligações históricas e fraternas, favorecem essa nova relação, na visão do Diretor-Executivo da Cayowaa, Cliff Villar.
“A atuação na comunidade dos países de língua portuguesa é uma expansão natural e a escolha de Portugal como centro desta grande família de nações vai além das afinidades culturais, que por si só já seriam muito importantes. Portugal é, atualmente, um dos conjuntos mais interessantes de oportunidades na Europa. Portugal fala com toda a Europa, ao ser um membro de destaque da União Europeia. Portugal fala também com toda a África portuguesa e com o Brasil”, destaca o executivo.
A Cayowaa Internacional possui uma estrutura própria na Covilhã, na comunidade intermunicipal de Castelo Branco, e com profissionais portugueses na sua equipa. “O intuíto é gerar oportunidades e atrair investimentos para a região”, enfatiza Villar.
AurÉlio Alves AurÉlio AlvesUm grupo de professores universitários e executivos da Covilhã andava inquieto com o pouco conhecimento da região Centro como zona de oportunidades empresariais. “Algo pode melhorar”, pensaram. Juntaramse e fundaram o e-DNA, uma associação sem fins lucrativos que reúne a academia, com formação altamente especializada, análise de oportunidades de inovação tecnológica e a parte científica dos projetos, o poder público e o lado empresarial, com a parte prática e de aplicação.
Na visão de Ernesto Vilar, professor associado da Universidade da Beira Interior (UBI), o foco do e-DNA é fixar mão de obra jovem e qualificada, ao mesmo tempo que se promove a inovação do tecido empresarial nacional. “Ações que reduzem a fuga de talentos para o estrangeiro, atraem famílias com filhos e, em consequência, combatem a desertificação demográfica”, acrescenta.
No caso da Covilhã, dos cerca de 40 mil habitantes, pelo menos 1/4 são estudantes e, uma grande parte, apenas estuda na cidade. “Não adianta só formar estudantes, temos de fixá-los. E isso acontece com a chegada de investidores, de bons empregos e melhorias para o território”.
Segundo Rhaxwell Nascimento, CEO do e-DNA, as “empresas instaladas nesta região prioritária têm acesso a apoios e a fundos da União Europeia, que já não são concedidos a outras regiões de Portugal”. Nascimento afirma que as contas são claras: instalar um negócio no Centro de Portugal custa significativamente menos do que em Lisboa. “Existem outras vantagens importantes, como a proximidade com as fronteiras de Espanha e o bom acesso rodoviário e ferroviário aos grandes polos de Portugal (Lisboa e Porto)”.
Para Ernesto Vilar, a região é uma das que mais reúne
oportunidades de investimento, mas que precisam ser descortinadas a investidores nacionais e internacionais. “A parceria com a Cayowaa Internacional em torno do Guia de Investimento vem neste sentido”.
Para Rhaxwell Nascimento, o Guia de Investimentos da região Centro vai levantar, pela primeira vez, os pontos de interesse e, assim, identificar investidores em potencial e incentivá-los a aportar os recursos na região.
“Com o ParkUrbis, braço do mercado, a expertise do e-DNA e o know-how da Cayowaa Internacional, vamos apostar na criação de um ecossistema que traga investidores e desenvolvimento para o interior”, diz. Também com o apoio das câmaras municipais, CIM e associações empresariais da região das Beiras. “O guia posicionará definitivamente a região do Centro de Portugal na vitrine do mundo”. (Ariadne Araújo)
Os municípios dos distritos de Castelo Branco, Guarda e Viseu terão os diferenciais e potencialidades em destaque no Guia de Investimentos de Portugal, uma plataforma que disponibilizará dados técnicos com linguagem jornalística para atrair investidores para a região.
As Beiras, por terem uma temperatura climática fria e estável, são adequadas, por exemplo, para receber um datacenter ou sediar um polo de tecnologia. Outra iniciativa é a extração da Tetrahidrocanabinol (THC) da Cannabis para uso medicinal, atividade já regulamentada em Portugal, que representa um investimento de milhões de euros. Sem falar ainda no enorme potencial para o turismo e para a logística.
O projeto de realização do Guia está a ser desenvolvido pela empresa Cayowaa Internacional, sediada no Parkubis da Covilhã, e conta com a consultoria da associação sem fins lucrativos e-DNA, que reúne académicos e executivos. Na visão do Presidente da Cayowaa Internacional, João Dummar Neto, alguns locais em Portugal têm oportunidades específicas de potencializar a atração de investimentos, como é o caso das comunidades intermunicipais de Castelo Branco, Guarda e Viseu. Dummar Neto, que também é Presidente do Jornal O POVO, lembra que a atração de investimentos para determinadas regiões é uma política já existente na Comunidade Europeia. Por isso, é preciso elaborar um material que mostre o potencial da região das Beiras.
O projeto contempla quatro fases. A primeira consiste na realização de uma pesquisa técnica de campo para aferir e analisar os potenciais das 55 comunidades intermunicipais das regiões. Este material será a base de dados para alimentar o conteúdo da publicação do Guia e o escopo do processo formativo.
A segunda etapa do trabalho será composta pela formação de gestores e técnicos das câmaras, uma inovação do projeto. Todos os participantes serão certificados. “Esse é um diferencial do projeto, pois até então finalizávamos a ação quando colocávamos o investidor na porta do investimento”, destaca Cliff Villar, Diretor-Executivo da Cayowaa Internacional.
Villar refere-se às experiências anteriores da empresa com guias de investimento em outras regiões do mundo.
A Cayowaa já desenvolveu produtos semelhantes em São Paulo, Salvador e Ceará, no Brasil; e também em El Salvador. Em nenhum deles, no entanto, houve trabalho formativo complementar. “No caso
de Portugal, essa fase nasce com o compromisso da efetividade do investimento, pois iremos promover um ambiente receptivo favorável para que se concretize o investimento atraído”, destaca Villar.
Já a terceira fase contempla a entrega do conteúdo, do Guia propriamente dito, nas suas versões impressa e online. Nas publicações, é possível encontrar os dados e todas as informações sobre as oportunidades de investimento, com linguagem jornalística de referência internacional e códigos QR com direcionamento para a plataforma online”, explica o executivo. A última fase do projeto consiste num evento de lançamento do Guia impresso para todos os envolvidos no projeto, o que é também uma oportunidade para projetar a região para investidores. “Existe uma motivação para começarmos o nosso processo de expansão na Europa, através das Beiras. Porque as Beiras são o coração da Península Ibérica, uma região de grande potencial e com muitas possibilidades logísticas. O Guia é uma ferramenta importante de conversão desse potencial em realidade concreta”, completa Villar. Dummar Neto destaca a experiência da Cayowaa na produção desse tipo de conteúdo técnico com linguagem jornalística, destinada ao público de investidores e empresários com interesses em informações específicas para tomada de decisão.
“A nossa habilidade de contar e analisar notícias no dia-a-dia deu-nos a capacidade técnica de interpretar factos, sejam eles da área política, cultural ou económica, e a decodificar informações para a sociedade ou para um público-alvo específico, com linguagem jornalística, nestes 96 anos de jornal O POVO. Essa experiência permitiu-nos desenvolver diversos projetos e plataformas de investimentos, e que nos capacita para construir produtos semelhantes em Portugal”, analisa. Devido às relações históricas entre Brasil e Portugal e da proximidade proporcionada pela língua-mãe, o executivo acredita que é possível estabelecer parcerias para a criação de projetos em conjunto. “Com muito respeito, podemos fazer isso juntos a partir da nossa expertise. Este é um projeto de Portugal para Portugal, com uma empresa com sede no País, mas que tem experiência internacional para conduzi-lo”, diz.
O Diretor de Negócios da Cayowaa, Alexandre Medina Neri, informa que a internacionalização da marca já é uma realidade. “Esse movimento começou com o Sistema Multiplataforma de Atração de Investimentos El Salvador, utilizado na Expo Dubai, além dos projetos no Brasil. Esse sistema possibilitou abrir portas para projetos articulados em Angola, na África”, explica.
O ano de 2024 marca os 50 anos da Revolução dos Cravos, que derrubou a ditadura de António Salazar e iniciou um período de estabilidade democrática no país, que balizou a reforma das suas bases económicas. Após décadas de transformações Portugal apresentase ao mundo como inovador.
Um ponto preponderante para o início deste processo foi a adesão à União Europeia (UE) em 1999, que permitiu uma maior previsibilidade da situação macroeconómica do país. Houve uma série de avanços em termos de infraestrutura e de qualidade de vida, o que atraiu investimentos em sectores como o da energia, logística, tecnologia e comércio.
Apesar de contar com uma indústria tradicional forte e modernizada, como a farmacêutica, eletrónica e de tecnologia da informação e comunicação (TIC), a sua participação diminuiu na economia portuguesa. Em 2018, o sector primário representava 2,7% do valor adicionado bruto (VAB) na economia e 5,8% dos empregos.
No mesmo período, o sector secundário correspondia a 21,9% do VAB e 24,1% do emprego, já os serviços contribuíram com 75,3% para o VAB e representaram 70,1% do emprego. O mercado português chega à terceira década do século XXI focado nos serviços, o que tem mudado a realidade económica do país.
Entre 2003 e 2012, a economia portuguesa apresentou um déficit real no Produto Interno Bruto (PIB) de 1,04%. Já entre 2013 e 2023 a economia de Portugal deu um salto de 19,27%.
O turismo em Portugal tem uma presença sólida, mas o movimento acontece apoiado num forte crescimento dos investimentos e das exportações, e destacam-se as vendas de serviços de alto valor agregado ao Exterior, principalmente no setor de TIC.
Esse processo de exportação de serviços acontece quando uma empresa vende a sua expertise para um cliente no Exterior e o produto final é um serviço, geralmente por meio de canais digitais.
Conforme dados da balança comercial portuguesa, o resultado de 2023 foi o primeiro sem déficit desde a pandemia, em 2020, e muito se deve às exportações de serviços, que geraram 51,69 bilhões de euros em negócios.
Desde 2020, esse mercado vive um “boom”. O crescimento acumulado no volume de exportações de serviços chegou a 131% ao fim de 2023. Um dos impulsionadores da internacionalização da economia portuguesa é a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP).
Ao analisar os principais parceiros de Portugal na exportação de serviços, é notável que o novo “além mar” ocorre através das fronteiras digitais e tem sotaque saxônico.
Com 7,81 bilhões de euros e crescimento de 35,1% na procura de serviços no espaço de um ano, quem mais contratou serviços portugueses em 2023 foi o Reino Unido, seguido da Alemanha, que aumentou as contratações e chegou a 5,8 bilhões de euros. No mesmo período, o maior crescimento por procura veio dos Estados Unidos (+79,2%).
Numa publicação recente da Portugal Global, produzida pela AICEP, o Presidente do Conselho de Administração da agência,
Filipe Santos Costa, destacou as perspectivas para a economia portuguesa em 2024, onde as previsões para o PIB são modestas, mas a queda da inflação deve ser positiva. Para o Presidente do Conselho, Filipe Santos, o princípio do ano é, para as empresas, tempo de começar projetos, de pensar em novos produtos ou mercados. O foco obrigatório, avalia, deve ser sempre “sustentabilidade, inovação e crescimento.”
Entre os projetos da AICEP está a empresa de tecnologia portuguesa Framedrop.ai, que lançou recentemente uma solução dirigida a criadores de conteúdos, editores de vídeo e grupos de mídia, que promete diminuir o tempo e ampliar a qualidade das edições da indústria de podcasts, videocasts, streamings e demais tipos de conteúdos falados.
O produto funciona baseado em inteligência artificial e tem como alvo os mercados dos Estados Unidos, Reino Unido e Europa. A Framedrop.ai é uma startup que já foi apontada como uma das dez mais promissoras de Portugal pela EU-Startups, publicação especializada europeia. A ferramenta já processou, desde que foi lançada, em junho do ano passado, 3 milhões de minutos, 16 mil vídeos, 304 mil destaques e tem 10 mil utilizadores na plataforma. Em novembro de 2022, a startup nascida em Coimbra pelo trabalho dos fundadores João Diogo Costa e Mário Tarouca captou cerca de 1,1 milhão de euros na fase preseed, e angariou financiamento de grandes parceiros como as portuguesas Indico, Shilling, Banco Português de Fomento, Clever Advertising e Subvisual, e a norte-americana Accel.ana Accel.
A abertura do mercado português para investimentos de estrangeiros tem aumentado nos últimos anos. No mercado imobiliário, por exemplo, regiões como o Algarve estão repletas de estrangeiros a investirem no país. Também se observam investidores do Exterior em sectores tradicionais, como o de produção de vinhos.
Eles são dos Estados Unidos, da China e de outros países europeus. Mas em sectores, como o de tecnologia da informação, a diversidade de nacionalidades tem sido ainda maior.
Atualmente, por estar integrada à União Europeia, que possui economias mais robustas, muitos jovens talentos portugueses sentem-se atraídos por oportunidades que surgem em países como a Alemanha e a Inglaterra.
Assim, abrem-se oportunidades para profissionais de outros países, especialmente de países africanos, como de Angola, e sul americanos, como do Brasil.
Com relação à atração de negócios, o Presidente da Câmara de Comércio Brasil Portugal do Ceará, Raul dos Santos Neto, afirma que Portugal notabiliza relações sempre positivas com as ex-colônias.
“Portugal sempre dialogou bem a nível de mercado e de influência de internacionalização junto dos países de língua portuguesa. Na África, no Brasil e
nalgumas outras regiões, como a de Macau, na China, Portugal sempre busca um caminho”, diz.
Raul também destaca a grande influência dos portugueses nos negócios no Brasil, com destaque recente para o Ceará, onde grandes negócios do sector de turismo, com o Vila Galé, e de energia, com a EDP, chamam a atenção e marcam a presença portuguesa na região.
No sentido oposto, com a recente abertura de Portugal à imigração, há um aumento da entrada de descendentes de portugueses que nasceram no Brasil que vão para o país. Raul lembra que no começo dos anos 1900 e nos períodos das guerras mundiais, muitos portugueses saíram do país com destino a países como o Brasil.
“Acho que Portugal serve de exemplo como país que se internacionalizou bem. Portugal interage muito bem dentro da União Europeia, com os seus pares internacionais, ainda que tenha uma economia relativamente pequena em relação ao Brasil”, aponta.
E completa: “Diria, então, para quem pensa em investir em Portugal que não pense apenas no mercado português, mas também no europeu, que tem um público consumidor de 500 milhões de pessoas com renda média superior, mas com um quadro de competitividade maior”.
DivulgaçãoO Cônsul Rui Almeida, do Vice-Consulado de Portugal em Fortaleza, afirma que o aniversário de 50 anos da Revolução dos Cravos é um marco importante porque o país assumiu um triplo compromisso para se modernizar: “Democratizar, Descolonizar e Desenvolver”.
Segundo ele, Portugal tornou-se no último meio século um país “democrático, mais livre, mais justo, mais inclusivo, e com menos desigualdade e pobreza”. Estes aspectos unidos ao facto do país apresentar um alto nível de educação e baixos índices de criminalidade, tornaram Portugal atraente para investidores estrangeiros. Nesta entrevista, Rui Almeida aborda ainda sobre o desenvolvimento e internacionalização da economia lusitana.
O POVO - O ano de 2024 marca os 50 anos da Revolução dos Cravos. De que forma avalia este momento como um marco para a história de Portugal?
Rui Almeida - A Revolução de 25 de abril de 1974 é o momento fundador do Portugal moderno, um marco que abriu caminho a transformações profundas. O programa do Movimento das Forças Armadas, que derrubou a ditadura, pode ser sumarizado nos chamados “3 D”: Democratizar, Descolonizar e Desenvolver. Portugal tornou-se um país democrático, mais livre, mais justo, mais inclusivo, e com menos desigualdade e pobreza. Os direitos fundamentais ficaram consagrados na Constituição de 1976. Garantiu-se o acesso universal à educação e a serviços de saúde, entre outros direitos sociais.
Fez-se a descolonização, pôs-se fim à guerra colonial que durava há já 13 anos, concedeu-se a independência a cinco países africanos (Timor-Leste, numa conjuntura diferente e muito complexa só se tornou independente em 2002). O fim do Império colonial não significou a quebra dos laços que nos unem a esses povos. Pelo contrário, a cultura e a língua que nos unem permitiram um novo relacionamento baseado no respeito e na igualdade, que se tem vindo a aprofundar, designadamente no quadro da CPLP, que inclui, obviamente, o Brasil.
O desenvolvimento de Portugal, sobretudo depois da adesão às Comunidades Europeias (atual União Europeia), tem sido notável e criou condições para a melhoria muito significativa das condições de vida em Portugal. O desenvolvimento, assim como a democracia e o relacionamento com os países lusófonos não são processos terminados, estão em evolução permanente, é preciso aperfeiçoá-los e darlhes continuidade.
OP - A economia de Portugal passou por grandes transformações nos últimos anos, a atrair muitos negócios para o país e na liderança de sectores como a tecnologia da informação e comunicação e energias renováveis. Como vê este movimento positivo do país?
Rui Almeida - Há muitas razões que explicam porque é que Portugal se tornou nos últimos anos tão atrativo para as empresas e investidores estrangeiros. Entre outras, destaco um quadro jurídico favorável ao investimento, nomeadamente o estrangeiro, a existência de excelentes infraestruturas de transportes e comunicações, tranquilidade social, baixo nível de criminalidade, mão de obra qualificada, ensino de qualidade e a integração no mercado europeu, um mercado de 450 milhões de consumidores com alto poder aquisitivo. O clima ameno e a afabilidade dos portugueses em geral são também fatores a ter em conta. Portugal tem sido bem posicionado pelas agências internacionais nos rankings relativos ao fornecimento de serviços tecnológicos, a instituições de investigação, designadamente universitárias, e ao sistema dinâmico e empreendedor de start-ups, incubadoras e centros tecnológicos.
sua área geográfica e no apoio a empresas. Devo sublinhar a importância das Câmaras de Comércio em todo este processo. Prestam um apoio valioso às empresas, sobretudo médias e pequenas, nos seus esforços de internacionalização, colocando-as em contacto com potenciais parceiros económicos.
Reflexo de tudo isto, é o facto de Portugal ser, desde 2016, a sede da Websummit, a maior cimeira tecnológica a nível mundial, que teve na última edição mais de 70.000 visitantes. Merece também referência a expertise que Portugal adquiriu no domínio das energias renováveis, tornando-se um dos países europeus líderes nesta área, o que está a permitir que Portugal atinja os objetivos que fixou para descarbonizar
OP - A internacionalização da economia portuguesa é um processo contínuo que ficou mais forte nos últimos anos. Qual a sua visão relativamente a esse processo e ao papel das representações portuguesas pelo mundo, como ViceConsulado em Fortaleza?
A economia portuguesa caracteriza-se por uma grande abertura ao exterior. Desde logo porque faz parte do mercado europeu, no qual circulam livremente mercadorias e capitais. Mas a abertura não se resume à Europa.
O Brasil, os Estados Unidos ou a China, por exemplo, estão entre os principais parceiros comerciais de Portugal. Em 2022 as exportações de bens e serviços ultrapassaram os 50% do PIB nacional, três anos antes da meta que tinha sido estabeEsta abertura reforça a competitividade e a sustentabilidade das empresas a longo prazo e é um fator decisivo para o crescimento
Portugal tem uma estratégia de internacionalização, apoiando as empresas portuguesas no estrangeiro e incentivando o investimento estrangeiro em Portugal. A concretização deste desígnio passa, naturalmente, pelo envolvimento dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros (Embaixadas e Postos Consulares) em colaboração com a Agência para o Investimento e o Comércio Externo de Portugal (AICEP), através do que tem sido designado por “diplomacia económica”. Os Postos Consulares, em coordenação com as respetivas Embaixadas e a AICEP, têm um papel na promoção da imagem do nosso país, na sensibilização da comunidade portuguesa residente na sua área de jurisdição para as oportunidades de negócios em Portugal, na identificação de oportunidades na
Aqui, em Fortaleza, temos a Câmara de Comércio e Indústria Brasil Portugal do Ceará, sempre muito empenhada no apoio às empresas e na promoção da imagem de Portugal e que constitui para este vice-consulado um parceiro da maior importância na prossecução destes interesses comuns.
OP - Recentemente assumiu a posição de Cônsul no Vice-Consulado em Fortaleza. Como analisa a realidade local, como está a ser a relação com os cidadãos portugueses e com os seus descendentes e quais as perspectivas para o futuro próximo?
Rui Almeida - O número de imigrantes portugueses residentes no Ceará tem vindo a baixar ao longo das últimas décadas. De facto, os grandes fluxos migratórios em direção ao Brasil terminaram há mais de 50 anos. A comunidade portuguesa no Ceará é hoje constituída maioritariamente por filhos, netos, bisnetos ou outros descendentes de imigrantes portugueses que vieram para o Brasil até meados do século passado. Nota-se o crescimento do interesse por parte de filhos e netos de portugueses na atribuição da cidadania portuguesa. Há também um número crescente de pessoas que receberam a nacionalidade por aquisição, nomeadamente descendentes de judeus sefarditas. São, na sua maioria, pessoas nascidas no Brasil, com dupla nacionalidade, mas que mantêm laços fortes com Portugal. A comunidade portuguesa é por isso um elemento de ligação e de aproximação entre os dois países. Por outro lado, há cada vez mais cearenses que escolhem Portugal para trabalhar e estudar. A procura por vistos teve um forte aumento a partir de 2022 e mantém-se em níveis muito elevados.
O Ceará tem grandes potencialidades, nomeadamente no setor do turismo e das energias renováveis. Há empresas e investidores portugueses atentos a esta realidade presentes, contribuindo para o reforço das relações económicas do Ceará com o nosso país e também para o desenvolvimento local.
Refiro, a título de exemplo, a importância da companhia aérea portuguesa, a TAP, que já faz nove voos regulares por semana para Fortaleza, para o desenvolvimento do turismo no Ceará. Ou da EDP (Eletricidade de Portugal) que no ano passado inaugurou, no Ceará, uma unidade de produção de hidrogénio verde.
Estes desenvolvimentos deixam antever que, no futuro próximo, se mantenha esta tendência para o reforço das relações entre o Ceará e Portugal
Rui Almeida, Cônsul do Vice-Consulado de Portugal em Fortaleza, no CearáA Universidade, em particular a Universidade da Beira Interior, é ou deve ser uma porta aberta ao mundo. Nos grandes centros urbanos, a Universidade funciona como uma aceleradora da dinâmica social, económica e empresarial. No interior, a Universidade funciona primeiro como uma spino��, depois como uma incubadora e, finalmente, como aceleradora. É um longo caminho até atingir a plenitude da sua função.
A visão de instalar a Universidade da Beira Interior (UBI) na Covilhã,
conhecida por “Manchester portuguesa”, no interior de Portugal, em plena crise da indústria têxtil nos anos 70/80 foi audaz. As antigas fábricas têxteis deram lugar, literalmente, aos departamentos e às faculdades da UBI. A UBI é capaz de atrair cada vez mais alunos (são hoje 9.000), mas não é tão eficaz em fixá-los na região. Para fixá-los é preciso criar empregos qualificados. Para criar empregos é preciso criar mais empresas ou atrair empresas que estejam dispostas a fixar-se na Covilhã. Mas como fazer isto?
Isso faz-se com uma estratégia para a investigação e a inovação (ou investigação aplicada), suportada pela missão de
criar spino��s e startups na própria universidade através de centros de inovação (i.e., incubadoras e aceleradoras). A inovação permite criar um ecossistema de conhecimento sustentado nos desafios colocados por problemas concretos das pessoas, das empresas, e da sociedade em geral, quiçá pelos grandes problemas que hoje a humanidade enfrenta. É o talento (dos investigadores, dos professores e dos seus estudantes) para abordar estes desafios e para gerar mais conhecimento que atrairá mais empresas nacionais e multinacionais. É, por isso, que a Universidade é talvez a spino�� mais desejada de qualquer região.
Rómulo Alexandre Soares
Advogado, mestre em Negócios Internacionais e Especialista em Direito Internacional e Direito do Mar. Foi Presidente da Federação das Câmaras de Comércio Portuguesas no Brasil (2007 a 2011)
Para além da língua e da ancestralidade comum, existe um Oceano que interliga os países de língua portuguesa, a expressão de quase 250 milhões de pessoas que falam o mesmo idioma distribuídas pelos quatro cantos da Terra. Numa década em que o Oceano ganha destaque global como elemento central para o desenvolvimento sustentável, essa vantagem competitiva é relevante.
Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor -Leste e, em certa medida, Macau, constituem este arquipélago linguístico que se estende por ambos os hemisférios. Ligarse através do português, neste vasto espaço oceânico, significa abrir portas para uma cooperação económica singular, onde o mar não é a fronteira, mas o caminho para o desenvolvimento.
O Oceano, neste contexto, é uma via de acesso a mercados globais, impulsionando a economia do mar e expandindo a economia desses países. O setor marítimo é vital para a economia do Brasil e o recente
desenvolvimento da economia do mar mostra-se uma importante alavanca para o desenvolvimento nacional equilibrado.
A indústria brasileira de petróleo e gás, localizada maioritariamente o��shore, e, mais recentemente, a aposta na geração de energia no “mar territorial” brasileiro, é um exemplo da importância económica do mar para o país.
Em Portugal, a posição geográfica tem sido um vetor estratégico para o desenvolvimento económico, com a sua vasta zona económica exclusiva a ser fundamental para a pesca, turismo e energias renováveis, como a eólica o��shore.
Angola e Moçambique, com as suas costas voltadas para o Atlântico e o Índico, respetivamente, possuem potenciais expressivos em termos de recursos marítimos e ligações comerciais. Os pequenos arquipélagos de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Guiné-Bissau, apesar de menores em tamanho e população, têm no mar um recurso inestimável, seja através da pesca, turismo ou da sua posição estratégica para o transporte marítimo.
Não menos importante, Macau, enquanto região administrativa especial chinesa,
encontrou uma vocação de conexão da China com os países de língua portuguesa.
Para além das ligações comerciais e culturais, os países lusófonos estão interligados por uma infraestrutura vital no mundo moderno: os cabos submarinos de fibra ótica, proporcionando a espinha dorsal para a comunicação e o comércio eletrónico, essenciais para a economia global contemporânea. Um exemplo notável é o cabo submarino que liga o Brasil a Portugal, estabelecendo um canal direto de comunicação digital entre a América do Sul e a Europa.
Da mesma forma, o cabo que conecta Angola ao Brasil reforça as relações económicas e culturais entre África e América do Sul. Esta conexão não só melhora a qualidade e a velocidade da comunicação digital entre os dois países, mas também abre novas avenidas para a cooperação em tecnologia, educação e negócios.
Juntos, estes oito países permitem projetar um Oceano lusófono.
Rómulo Alexandre Soares, Advogado, mestre em Negócios Internacionais e Especialista em Direito Internacional e Direito do Mar. Foi Presidente da Federação das Câmaras de Comércio Portuguesas no Brasil (2007 a 2011)
Professor catedrático da Universidade da Beira Interior e co-fundador da e-DNA Abel J. P. Gomes