31 de Maio de 2021 O SETUBALENSE 9
Setúbal dedica semana à comunidade piscatória p10
OPINIÃO Viriato Soromenho-Marques
A verdade em tempos difíceis
A
ceitei com honra e sentido de responsabilidade o convite de Francisco Alves Rito, jornalista e dinâmico director de O SETUBALENSE, para ocupar o seu lugar numa próxima edição comemorativa da passagem do 166.º Aniversário deste periódico. Um jornal que se confunde com a história da cidade, e que hoje pretende ser um espaço de encontro e diálogo onde se podem trocar notícias, ideias e articular projectos que valorizem o mosaico distrital. O tema central da edição será o da verdade. Seria difícil encontrar um conceito mais forte e polissémico. Riquíssimo filosoficamente, mas ligado também à própria essência do jornalismo e das lutas cívicas pela liberdade de expressão, precursoras das modernas democracias constitucionais. A verdade importa por três motivos principais. Primeiro, porque o jornalismo enfrenta hoje a concorrência de muitas outras plataformas e suportes. O jornalismo já se inseriu, como é o caso deste jornal, na corrente da mudança tecnológica, combinando o papel com o digital. Contudo, a diferença reside na fidelidade do jornalismo ao compromisso deontológico de ser fiel à verdade factual e às regras deontológicas que ao longo de muitas décadas fizeram os leitores confiar na imprensa escrita. Os factos não dispensam a interpretação, contudo esta última não deve nem pode substituir-se aos primeiros. É nesse salto mortal que surgem as formas modernas de falsificação e manipulação (fake news, deep fake, etc.), modos bem antigos e perversos de destruir a informação, mas que com a tecnologia digital se aprimoraram no mal a níveis para além do alcance da imaginação do leigo.
A verdade factual importa, também e finalmente, como solo seguro para sermos capazes de um triplo exercício de avaliação das forças e fragilidades, dos riscos e oportunidades que se colocam à cidade e ao distrito
A verdade factual é indispensável, em segundo lugar, pelo período carregado de incertezas em que nos encontramos mergulhados, em todas as escalas, da região ao mundo, passando pelo país e pela Europa. Apesar do sucesso na redução das vítimas,
devido ao avanço da vacinação, a pandemia está longe de estar vencida. A desigualdade no acesso às vacinas, a nível mundial, irá garantir a sua continuidade por muito tempo. As consequências sociais e económicas profundas da pandemia, por outro lado, só agora começam a acentuar a sua sombra ameaçadora. Os danos que o terminar das moratórias bancárias irá provocar no emprego e nas empresas dependerão de factores que poderemos influenciar, mas não determinar. Tudo radicará da capacidade, ou não, de se mudarem as regras da zona euro que têm imposto a austeridade como política europeia. Serão mudadas as regras do tratado orçamental, ou pelo menos substancialmente atenuadas? Continuará o BCE a suportar a dívida pública dos Estados, aliviando as respectivas taxas de juro? Será a U.E. capaz de perante os comuns desafios
gigantescos - do ambiente e clima à saúde e segurança - assumir uma orientação mais coordenada e solidária, aproximando-se do modelo federal que há décadas tem sido sucessivamente adiado, com custos imensos para a confiança dos europeus na própria ideia de Europa? A verdade factual importa, também e finalmente, como solo seguro para sermos capazes de um triplo exercício de avaliação das forças e fragilidades, dos riscos e oportunidades que se colocam à cidade e ao distrito. Retrospectivamente, na reinterpretação da história regional onde repousa uma parte, tão importante como esquecida, da nossa cultura e modo de ser colectivo. Analiticamente, na consideração das possibilidades e sinergias que os actores distritais se preparam para dispor no terreno, no interior e para além do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Prospectivamente, na sondagem do nosso futuro colectivo, encarando com coragem as ameaças crescentes da degradação ambiental e climática, preparando desde já as estratégias de resposta que nos permitirão adaptar melhor aos impactos inevitáveis e duros das próximas décadas. Isso implica reformar as infra-estruturas, mudar os hábitos e os valores, equipar os territórios urbanos, rurais e marítimos para evitar disrupções que só por desmazelo e incúria permitiríamos que ocorressem sem adequados meios de mitigação. Sobre tudo isto se debruçará a nossa edição especial, em Julho próximo. Fica aqui, desde já, o aviso e o convite aos nossos leitores. Professor catedrático de Filosofia da Universidade de Lisboa
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