Margarida Vila-Nova: «Há coisas que o universo encarrega-se de resolver» c7nema.net/entrevista/item/50832-margarida-vila-nova-ha-coisas-que-o-tempo-e-o-universo-encarregase-de-resolver-e-empurrar-na-altura-certa.html Jorge Pereira
Foi há mais ou menos um ano que Margarida Vila-Nova, na altura a promover o filme Amor Amor, falou-nos da sua Maria, a protagonista de Hotel Império, filme de Ivo M. Ferreira, o realizador de Cartas da Guerra. Na obra, um thriller dramático com uma estética aprimorada, que estreia nos cinemas esta quinta-feira (9 de maio), seguimos Maria, a responsável pelo velho Hotel Império, agora acorrentada a dívidas e pressionada a vender o espaço. Uma história pessoal, muito ligada às memórias e ao legado, que se cruza com a História da própria Macau e da sua transição administrativa de Portugal para a China. "A Maria é uma sobrevivente. É filha de um português, uma personagem que fica amarrada ao seu passado, às suas memórias, à sua história, às suas raízes. É alguém que nasceu num ambiente muito particular, na pensão do pai, onde o jogo e a prostituição foram uma realidade que a acompanharam. Mas ela também torna-se incapaz de romper com o seu passado e de procurar o seu sonho e a sua verdadeira identidade", explicou Vila-Nova, acrescentando que esta é alguém profundamente triste: "É uma sobrevivente no sentido que o Hotel está penhorado e a sua grande luta é mantê-lo de pé, e todos aqueles que vivem dentro do Hotel e que a viram crescer. Não os deixar para trás. E a vida vai-lhe pregando partidas e surpresas que a vão transformando".
Recentemente, voltamos a falar com a atriz, que pela primeira vez tinha visto o filme acabado num grande ecrã. Nele, assistimos a uma Margarida raramente vista nos ecrãs nacionais. Ela canta, encanta e fala em cantonês praticamente durante todo o filme. Tínhamos falado há um ano da Maria e do Hotel Império, ficou satisfeita com o resultado final do filme? Há muito, muito tempo que não o via. Foi a primeira vez que o vi projetado numa sala grande e ainda hoje me surpreendeu.
É um filme que sempre que vê descobre novos elementos? Sim, encontrei novos detalhes, pormenores. Mesmo em relação ao meu trabalho, pois às vezes somos polícias de nós próprios, até porque não temos o distanciamento certo ao ver um filme, como um espectador tem. Gostei de ver o filme e senti um orgulho enorme no trabalho que fiz. Filmei-o há dois anos, dois anos se passaram. Ele também foi filmado numa época particular da minha vida.
Sim, se bem me lembro, disse-me que quando começou o processo de construção do filme a sua vida como atriz estava a ser ponderada. Sim, o que é surpreendente na vida é que a maturidade traz-nos isso. As transformações na vida e no mundo acontecem inevitavelmente (...) Este projeto passou por diversas fases, de financiamento, de filmagens, com outros filmes pelo meio, nomeadamente o Cartas da Guerra, Amor Amor, Equinócio e Na Escama do Dragão. [Houve muitas mudanças nestes anos] não só no lado profissional, mas também pessoal, como negócios paralelos, etc.
Ao ver o filme, e olhando para a personagem da Maria - que é o fio condutor deste Hotel Império - vemos a sua transformação e negação, o que acontece também na cidade de Macau, a transformar-se e a mudar. Acabou o filme e senti-me... apaziguada. As mudanças acontecem e temos de ver a forma como encaramos as cidades, o país, os tempos, e nós próprios; os nossos percursos profissionais, independentemente das dúvidas, a nossa vida pessoal, etc. Há filmes que nos fazem ver e perceber isso. Este filme tem também uma particularidade de ser quase todo falado em língua estrangeira (chinês, inglês). Isso dá-lhe um carácter de maior exportação. Tem a ambição, convites para trabalhar lá fora? Não coloco essa hipótese para aceitar este ou aquele projeto. Sim, falo cantonês o filme quase todo, e quando não estou a falar chinês estou a falar inglês. Creio que o filme pode, não só ser facilmente exportado, como abrir portas para mim no mercado internacional. Mas não tenho essa expetativa porque aquilo que o filme trouxer, é um bónus. O meu trabalho está concluído. Está feito e não há nada que eu possa mudar (risos). Mas acho importante trabalhar noutra língua, e claro que gostaria que surgisse a oportunidade [de trabalhar lá fora]. (risos)
Há um ano disse que gostaria de um dia experimentar a realização e na altura falou de um documentário, sobre Macau. Ainda está na sua mente esse trabalho? Pois foi (risos). Ainda bem que me lembra. Vou trabalhar nesse documentário (risos). Há coisas que o tempo e o universo encarrega-se de resolver e empurrar na altura certa. Neste momento estou dedicada a vários projetos que tenho "em cima da mesa", no teatro, na televisão, em formato série e telenovela. Estou entusiasmada com este ano. Há projetos a saírem da gaveta. Esse está guardado, mas é certo que o irei fazer. E desses projetos, pode falar um pouco sobre eles?
Uma série para a RTP, escrita pelo Edgar Medina e pelo Rui Cardoso Martins, um outro projeto em televisão [que não pode falar] e um no Teatro de Almada [a peça Reinar Depois de Morrer] no final do ano.