Locarno volta a abraçar o cinema português [PT]

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Cultura 2 Julho 2021 9:52 Francisco Ferreira

Mário Coelho, Rafaela Jacinto e Mariana Monteiro em “Pathos Ethos Logos”, de Joaquim Pinto e Nuno Leonel

Joaquim Pinto e Nuno Leonel regressam ao festival suíço com dez horas de cinema no tríptico “Pathos Ethos Logos”. “A Távola de Rocha”, documentário de Samuel G. Barbosa, aborda a vida e a obra de Paulo Rocha. Em competição, Salomé Lamas mostra a curta “Hotel Royal”. A 74.ª edição de Locarno vai decorrer entre 4 e 14 de agosto com novos filmes a concurso de Abel Ferrara, Axelle Ropert ou Bertrand Mandico; a atriz portuguesa Leonor Silveira faz parte do júri Depois de um ano sem filmes, sem público e de uma edição que se resumiu a atividades pontuais online, Locarno anunciou esta quinta-feira o aguardado regresso. É suposto que a Piazza Grande, ex-libris da cidade e do festival (é o maior ecrã a céu aberto da Europa e serve de plateia a 10 mil pessoas) vá funcionar com 2/3 da sua atividade, anunciou Giona A. Nazzaro, novo diretor artístico do festival suíço após a sua passagem pela Semana da Crítica de Veneza.

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Rafaela Jacinto em “Pathos Ethos Logos”

E como de costume, o festival que mais tem apostado no cinema português ao longo da última década não o esqueceu em período difícil. Destaca-se – até pela sua duração – a nova longa-metragem de Joaquim Pinto e Nuno Leonel “Pathos Ethos Logos”, que é na verdade um tríptico com duração total de 641 minutos - refere o comunicado de imprensa da Avant-Guerre, nova produtora dos cineastas. Em 2013, Pinto trouxe de Locarno um Prémio Especial do Júri pelo magnífico “E Agora? Lembra-me”.

“Pathos Ethos Logos” começou a ser idealizado logo depois, tem vindo a formar-se e a amadurecer ao longo destes anos, à medida dos encontros entre quem filma e foi filmado, resultado de um longo processo de trabalho em que participaram, entre outros, Rafaela Jacinto, Ângela Cerveira, Fabiana Silva, Sofia Marques, Hugo Tourita e Luís Miguel Cintra.

“Há muito tempo que não me sentia tão pequeno perante uma obra de arte”, escreveu Cintra numa nota de apresentação do mesmo comunicado. “De repente, o Joaquim e o Nuno, de quem evidentemente já espero tudo, muito por razões afetivas, com a alegria displicente que só conseguem os sobreviventes, atiram-me com um calhamaço, que tudo vem mudar: são 10 horas de cinema em que navego como na minha alma, mas que me deixam interdito: o que é isto?”

A trilogia decorre em tempos distintos: 2017, 2028 e 2037. “Três mulheres de diferentes gerações e origens, cujos caminhos se cruzam, nas suas tentativas de existir plenamente.

Fragmentos de histórias que recuperam experiências e eventos da vida real para o núcleo de cada personagem.” É esta a sinopse – e, no mínimo, é prometedora. O filme será exibido fora de concurso.

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Ana Moreira em “Hotel Royal”, curta-metragem de Salomé Lamas no concurso Corti d'autore

Salomé Lamas, também ela repetente em Locarno, concorre na secção Corti d'autore (Curtas de autor) com uma nova ficção em que Ana Moreira tem o papel principal, “Hotel Royal”, produção da O Som e a Fúria. É a história da “camareira temporária de um grande hotel à beira mar que, incapaz de se relacionar, vive através de uma rígida metodologia de análise sobre o exterior e de um quotidiano ritualizado, até que o incontrolável vem perturbar esta dinâmica”, diz a Agência da CurtaMetragem.

Paulo Rocha em “A Távola de Rocha”, documentário de Samuel G. Barbosa

Já “A Távola de Rocha”, documentário produzido pela Bando à Parte, é um documentário que incide na vida e obra de Paulo Rocha (1935-2012) e chega em momento oportuno, num período em que se aguarda a dupla edição DVD de “A Ilha dos Amores” e de “A Ilha de Moraes” (Midas Filmes).

Em estreia na realização, Samuel G. Barbosa, que trabalhou com o cineasta do Porto, juntou ao que filmou excertos de filmes do autor que homenageia, materiais de arquivo inéditos, esteve aliás no país do sol nascente para falar com quem conheceu Rocha no tempo da rodagem de “A Ilha Dos Amores” (1978-1982). E 3/4

registou depoimentos de alguns dos seus mais próximos colaboradores, Luís Miguel Cintra, Regina Guimarães ou a indispensável Isabel Ruth - atriz de sete filmes de Rocha, entre “Os Verdes Anos” (1963) e o póstumo “Se Eu Fosse Ladrão Roubava...” (2013) – assim como de familiares, Jorge Rocha, irmão do cineasta. Será exibido em Locarno na secção História(s) do Cinema.

A grande retrospetiva a que Locarno habitualmente se dedica incide este ano na obra extensa, hoje injustamente esquecida (isto face à polémica que gerou em tempos idos) de Alberto Lattuada (1914-2005), um dos maiores cineastas italianos do pós-guerra, autor de “Anna” (com Silvana Mangano), “Guendalina”, “Mafioso” (com Alberto Sordi), entre muitos outros.

LEOPARDO DE OURO E por fim, há o concurso que mais importa, o do Leopardo de Ouro que coroará esta 74ª edição. Sem surpresas, e num ano em que se descobriu particularmente 'encurralado' entre Cannes e Veneza, Locarno voltou-se para o cinema independente e para uma programação de descobertas – e ainda assim estão lá Abel Ferrara (“Zeros and Ones”), os franceses Bertrand Mandico (“Paradis Sale”) e Axelle Ropert (“Petite Solange”), ou o indonésio Edwin, autor de estima, com “Vengeance Is Mine, All Others Pay Cash”. A norte-americana Eliza Hittman (realizadora do ótimo “Never Rarely Sometimes Always”, outro filme travado em 2020 pela pandemia) preside ao júri do qual também fará parte a atriz portuguesa Leonor Silveira.

O festival abre com “Beckett”, do italiano Ferdinando Cito Filomarino, produzido para a Netflix por Luca Guadagnino, com John David Washington e Alicia Vikander no papel principal. Na Piazza passarão ainda em cópias restauradas várias pérolas dos anos 80 como “Heat” (Mann), “Exterminador Implacável” (Cameron) e também “A República dos Cucos”, de John Landis, que será homenageado com um Leopardo de Honra à carreira.

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