abcdefghij klmnopq rstuvwxyz abcdefghij klmnopq rstuvwxyz Ricardo Esteves Gomes
Maryam
um novo deeno tipográfco
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal do Espírito Santo,
Departamento de Desenho Industrial, como exigência parcial para a obtenção do grau
de Bacharel em Desenho Industrial, sob
orientação do professor Ms. Mauro Pinheiro Rodrigues.
VITÓRIA, 2005
Maryam
Ricardo Esteves Gomes
um novo deeno tipográfco
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal do Espírito Santo, como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Desenho Industrial. Aprovado em
de
de 2005
COMISSÃO EXAMINADORA
___________________________________________________
Prof. Ms. Mauro Pinheiro Rodrigues Universidade Federal do Espírito Santo Orientador
___________________________________________________
Profa. Ms. Ana Claudia Berwanger Universidade Federal do Espírito Santo
___________________________________________________
Prof. Dr. Rogério Câmara Universidade Federal do Espírito Santo
AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, pelo apoio, pelas contribuições efetivas para a melhoria deste projeto e pela confiança que depositou no meu potencial desde o início. À Profa. Ana Claudia Berwanger, pela enorme paciência, pelos comentários, pelas produtivas conversas regadas a café e pelos livros emprestados. Ao Prof. Rogério Câmara, pelos comentários. A Fábio Lopez e Rodolfo Capeto, pelas conversas por email. Ao Jarbas, pelas dicas de fontographer. À Dani, pela força que me deu para iniciar este projeto. Valeu, ok!!! Aos reikianos e yogues Sidarah, Loren e Flávio pela força espiritual. À Sueli, pelo despertar da fala. Aos meus pais, pelo apoio emocional e material. À Jana, indefinível… A todos aqueles que eu possa ter eventualmente esquecido.
“…Eu não espero pelo dia em que todos os homens concordem Apenas sei de diversas harmonias bonitas possíveis sem juízo final Alguma coisa está fora da ordem Fora da nova ordem mundial…”
Caetano Veloso
Resumo
Este trabalho de conclusão de curso fala um pouco sobre a evolução no desenho das letras e algumas de suas diferentes facetas ao longo da história. Mostra também alguns estilos caligráficos e, por fim, descreve o processo de construção de uma família tipográfica manuscrita, desde seus primeiros esboços desenhados com pena, passando pela tradução dos desenhos dos caracteres para o computador, trabalhando as relações entre letras e a posterior aplicação do tipo em massas de texto impressas. Por fim, fala sobre algumas possibilidades que as novas tecnologias podem oferecer para a melhor exploração da expressão caligráfica em um desenho tipográfico.
Abstract
This monograph describes a little of the letterform evolution and some of its historical diferent faces. It also shows some calligraphic styles. After that, it describes the process of a handwritting typeface construction, performing the first pen draws ever been developed, working the relationship there is from pen letter designs to computer letter designs; the relations between different letter combinations and the aplication of the designed typeface into a text on a printed page. Finally, it talks about some possibilities that the new technologies can offer for a better exploration of the calligraphic expression in a typographic design.
Palavras-chave
Tipografia, Caligrafia, História da Escrita, Design, Comunicação Visual.
Sumário
I.
II.
UMA INTRODUÇÃO
• 10
A E V O L U Ç Ã O H I S T Ó R I C A N O________ DESENHO DAS LETRAS
• 12
A origem da escrita latina • 12 A evolução histórica da letra tipográfica latina • 17 1. As letras romanas na Renascença • 17 2. As letras itálicas na Renascença • 20 3. As letras maneiristas • 22 4. As letras barrocas • 23 5. As letras rococó • 24 6. As letras neoclássicas • 25 7. As letras românticas • 27 8. As letras realistas • 29 9. As letras modernistas geométricas • 30 10. As letras modernistas líricas • 32 11. As letras expressionistas • 34 12. As letras pós-modernas • 34
III.
ALGUMA CALIGRAFIA
• 38
As primeiras formas do livro • 39 As primeiras penas • 41 As antigas letras manuscritas romanas • 42
1. As letras maiúsculas quadratas • 43 2. As letras maiúsculas rústicas • 44 3. As letras unciais • 47 As letras cursivas romanas • 51 Algumas letras anglo-saxônicas • 53 Algumas outras escritas cursivas • 55
IV.
M A R Y A M – U M N O V O _______
PROJETO TIPOGRÁFICO
• 60
Iniciando pela caligrafia • 62 Desenhos vetoriais dos caracteres • 65 1. Letra a • 65 2. Letra c • 68 3. Letra d • 70 4. Letra e • 72 5. Letra g • 73 6. Letra h • 74 7. Letra j • 75 8. Letra k • 77 9. Letras m, n e u • 78 10. Letra q • 80 11. Letra r • 82 12. Letra s • 83 13. Letra x • 85 14. Letra z • 86 15. Letra A • 88 16. Letra C • 89 17. Letra H • 91 18. Letra J • 92 19. Letra K • 93
20. Letras M e W • 94 21. Letra Q • 96 22. Letra R • 97 23. Letra Y • 98 24. Exclamação ! • 99 25. Interrogação ? • 100 26. A relação entre pontos üi.:; • 101 27. Os números 1234567890 • 102 28. Uma variação para a letra s • 104 29. Últimos ajustes na letra d • 105 Algumas ligaturas • 106 1. Ligaturas lh e lt • 107 2. Ligaturas ch e nh • 108 3. Ligaturas as, às, es, is e us • 109 4. Ligaturas st e sc • 110 5. Ligaturas fi, fl e ft • 111 6. Ligatura rr • 113 Testando as texturas • 114
V.
VI.
ALGUMAS CONCLUSÕES
• 121
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
• 127
Livros, revistas e dissertações • 127 Referências da Internet • 129
VII.
GLOSSÁRIO
VIII.
APÊNDICE
• 131
• 134
Uma introdução
Este trabalho é uma tentativa de resgate da expressão caligráfica na tipografia, para aplicação em massas de texto. Aqui, veremos a construção de uma nova fonte tipográfica, preocupada com seus aspectos estéticos e funcionais, observando o desenho individual das letras, sinais de pontuação e outros caracteres não-alfabéticos e suas diversas sutilezas. Passaremos também pela relação entre cada par de caracteres, onde serão observadas suas relações espaciais individuais e onde serão desenvolvidas algumas ligaturas para, finalmente, observarmos sua aplicação em corpo reduzido, levando em conta, essencialmente, sua legibilidade, leveza e textura.
Segundo Bringhust,
[…] a tipografia precisa freqüentemente chamar a atenção para si própria antes de ser lida. Para que ela seja lida, precisa contudo abdicar da mesma atenção que despertou. A tipografia que tem algo a dizer aspira, portanto, a ser uma espécie de estátua transparente. Outra de suas metas tradicionais é a durabilidade – não uma imunidade à mudança, mas uma clara superioridade em relação à moda. A melhor tipografia é uma forma visual que liga a atemporalidade ao tempo (BRINGHUST, 2005, p 23).
Para atingir essas metas, sentimos uma profunda necessidade de estudar um pouco do que já foi produzido, tanto em termos de tipografia quanto de caligrafia, a fim de conhecer elementos de
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construção formal que poderiam nos auxiliar no desenvolvimento do nosso alfabeto. Foi observando manuscritos que iniciamos a pesquisa e logo vimos que poderíamos desenvolver uma fonte caligráfica adaptada ao formato digital dos computadores pessoais, que mantivesse uma leitura satisfatória.
No primeiro capítulo, veremos um pouco da evolução histórica no desenho das letras, desde suas primeiras formas latinas, gravadas em pedra, passando por diferentes abordagens até desembocar no pós-modernismo e sua liberdade de associações históricas diversas em uma mesmo produto tipográfico.
Assim como acontece com outras artes, a tipografia se alimenta de seu próprio passado. Ela pode fazê-lo com a insensibilidade de um saqueador de túmulos ou com a piedade da adoração cega dos antigos. Também pode fazê-lo de maneira sagaz, iluminada e profundamente criativa (BRINGHUST, 2005, p 110).
Parece-nos ser esse o grande desafio deste projeto e da tipografia pós-moderna de uma maneira geral: desenvolver um desenho de tipo buscando referências do passado, trazendo-as à tona em forma de releitura, criando assim elementos novos para a cultura visual do presente.
No segundo capítulo, veremos um apanhado de desenhos caligráficos que, de alguma forma, influenciaram na construção deste projeto. Finalmente, no terceiro capítulo, veremos o processo criativo da fonte que chamamos de Maryam, enfatizando, principalmente, as questões e decisões projetuais com que nos deparamos ao longo de sua construção.
Boa leitura.
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A evolução histórica no desenho das letras
A ORIGEM DA ESCRITA LATINA
Nosso atual alfabeto latino surgiu de vários alfabetos distintos. Os primeiros deles tiveram origem nas antigas letras maiúsculas romanas gravadas em pedra. Inicialmente eram esculpidas com traços finos, com uma grande predominância de linhas retas. No caso das letras com curvas, essas tinham uma grande abertura, para que fosse possível a execução do talhamento na pedra. Inicialmente não tinham nenhuma serifa e já não apresentavam nenhum vestígio de traços deixados por uma escrita contínua. Com o tempo, os romanos passaram a utilizar o modelo deixado pelo império grego, agora com letras (ainda maiúsculas) de traços mais encorpados, com serifas e curvas mais fechadas. Um grande exemplo histórico dessa nova escrita se encontrava na colunaTrajana, erguida em Roma em torno do ano de 113 d.C.
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Ali, já era possível observar claras questões de projeto de design, tendo em vista as limitações tecnológicas disponíveis no momento. As letras eram primeiramente desenhadas com um pincel chato, com ângulo do traço de direção noroeste-sudeste, semelhante a uma pena. Depois eram esculpidas na pedra, deixando um desenho de letra com traço modulado e serifas bem aparentes. É bem provável que grande parte das serifas tenha se originado desses desenhos, uma vez que a ferramenta de talhamento em pedra deixava seus vestígios nas entradas e saídas das linhas – ruídos um pouco diferentes dos que são deixados por uma pena caligráfica, por exemplo.
As maiúsculas romanas foram ainda utilizadas muitos séculos depois pelos escribas monásticos da Alta Idade Média e da Baixa Renascença. Tinham uso predominantemente em títulos e iniciais, mas, no caso de texto corrido, eram utilizadas as escritas mais novas e mais compactas. Desse legado, foram gerados basicamente dois gêneros de letras: as maiúsculas ou caixa-alta (grandes, solenes e pomposas) e as minúsculas ou caixa-baixa (pequenas, despojadas, modestas).
Muitas das antigas convenções dos escribas sobrevivem na composição tipográfica de hoje. Os títulos ainda são compostos em letras grandes e formais; grandes iniciais marcam o começo de capítulos ou seções; maiúsculas pequenas marcam uma frase de abertura. A página bem-feita é hoje o que era então: uma janela para a história, para a linguagem e para a mente; um mapa daquilo que é dito e um retrato da voz que fala silenciosamente (BRINGHURST, 2005, p 135).
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Os diferentes tipos estavam inicialmente gravados apenas na mente dos escribas, que utilizavam diferentes formas de letras, de acordo com o contexto dos documentos, escrituras sagradas e cartas. Os escribas eram, portanto, verdadeiros bancos de dados vivos, pois continham virtualmente em suas memórias e em suas habilidades manuais as diferentes formas de letras e suas variações, que podiam ser atualizadas no momento da escrita. Esse é um tipo de habilidade, até hoje, de fundamental importância no treinamento de um calígrafo, pois, além das questões observadas no desenho de cada caractere individualmente, é necessário desenvolver alfabetos onde as letras tenham coerência formal entre si, resultando num conjunto coeso. O que hoje podemos fazer, de certa forma, com os computadores pessoais e as mais sofisticadas tecnologias de impressão, tinha que ser feito apenas pelo homem e sua relação entre a mente e o braço, utilizando as ferramentas de escrita. Essa relação – muitas vezes perdida pelos projetistas na sua relação com suas ferramentas de trabalho digitais – é algo que tentamos resgatar neste projeto.
Com o desenvolvimento de diferentes famílias caligráficas, com a chegada da tecnologia dos tipos móveis à Europa, já havia um grande acervo de letras, de diferentes estilos e escolas, virtualmente disponíveis.
[…] Elas ainda permanecem conosco de alguma forma, mas a escrita humanista, baseada na minúscula carolíngia, tornou-se a forma central: é a caixa-baixa romana desdobrando-se em milhares de variações, mutações e híbridos, como a hera ou a rosa (BRINGHURST, 2005, p 135).
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Ou, segundo Smeijers,
Type came to be seen as separate from wtiting only after about 1500, and this happened mainly in Italy. Although the Italian humanists of that time still saw type as intimately bound up with writing, it is in their work that we can first see the idea of type. And this ‘idea’ we can call ‘design’: a strong consciousness of the forms of letters and their disposition on a page. […] The influence of these intelectuals on typography is often underestimated. The humanists were the users of print and they difined the premises and assumptions behind typography. These premises were however not much more than an intellectual fashion based on some mistakes. The principal, notorious mistake concerned the minuscule letters (‘lower case’ or small letters) wich they saw used in classical literature, and wich they took as a model and copied. […] but in fact this texts were medieval copies, written in what we call the Carolingian minuscule (SMEIJERS, 1996, p 43).
A tipografia começou a ser vista separada da escrita somente por volta de 1500, e isso aconteceu principalmente na Itália. Embora os humanistas italianos dessa época ainda vissem a tipografia intimamente ligada à escrita, é no trabalho deles que podemos ver pela primeira vez a idéia da tipografia. E essa “idéia” nós podemos chamar de “design”: uma forte consciência das formas das letras e de sua disposição em uma página. A influência desses intelectuais na tipografia é comumente subestimada. Os humanistas foram os usuários da imprensa e eles definiram as premissas e suposições por trás da
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tipografia. Essas premissas, todavia, não foram muito mais que uma moda intelectual baseada em alguns erros. O principal erro notório diz respeito às letras minúsculas (caixa-baixa) que eles viram usadas na literatura clássica, e que tomaram como um modelo e copiaram. Mas o fato é que esses textos eram cópias medievais, escritas no que chamamos de minúscula carolíngia (tradução nossa).
O modelo das letras para essas cópias medievais citadas por Smeijers foi criado no reinado do imperador Carlos Magno, no século 9, encomendado a um grande escriba da época, o anglosaxão Alcuin. As letras deveriam ter uma boa legibilidade e a fluidez da escrita caligráfica. Essa nova forma de escrita criada seria então usada em todos os escritos do seu reinado.
Mais uma vez, ficaria clara a questão projetual no desenho das letras, uma vez que a forma de cada letra seria criada e normatizada para a reprodução fiel pelos escribas que produziriam os documentos posteriormente.
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[…] O resultado foi a Minúscula Carolíngia (Carolus Magnus), talvez o primeiro trabalho de identidade visual encomendado na história das artes gráficas feito nos mesmos moldes das identidades visuais de hoje – todo um sistema gráfico foi planejado, letra, mancha e um controle rigoroso no desenho da letra manuscrita. Esse sistema facilita a datação dos documentos da era de Carlos Magno nos nossos dias (HORCADES, 2004, p 27).
A E V O L U Ç Ã O H I S T Ó R I C A DA L E T R A TIPOGRÁFICA LATINA
Uma vez que a intenção final deste projeto é produzir uma fonte digital a partir de um desenho caligráfico, antes de falar mais especificamente sobre a caligrafia, falaremos um pouco da evolução do desenho das letras, que influenciou diretamente a tipografia. O desenho de tipos evoluiu ao longo do tempo – assim como a pintura, a arquitetura e a música – de acordo com a técnica, os pensamentos e os movimentos artísticos vigentes em cada período histórico. Como acontece na história da arte, a história da tipografia também é dividida em diferentes etapas, na medida em que o fazer do desenho tipográfico se relaciona com outras atividades humanas como a política e a filosofia.
1. As letras romanas na Renascença
Foram desenvolvidas por eruditos e escribas nos séculos 14 e 15, tendo como principais características o traço modulado e o eixo humanista, como vemos no exemplo a seguir.
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O Renascimento foi uma época em que a visão sobre o papel do homem no mundo ganhava mais valor e isso, de certa maneira, refletia-se nas diferentes formas da arte, inclusive na tipografia. Pela primeira vez era feito um alfabeto completo como conhecemos hoje, combinando maiúsculas e minúsculas. O desenho das minúsculas foi bastante alterado, adicionando serifas e traços com eixo semelhante ao da escrita com pena, mas com proporções bastante diferentes das minúsculas carolíngias. Embora os humanistas tivessem preferência pelas proporções baseadas no homem, há controvérsias em relação à real “humanidade” de suas minúsculas.
Looking at the humanist manuscripts, they do look typographic. We wonder wich came first, these letters or the printed ones? […] These humanists letters are often made of bits and pieces glued together, with great pain. They balance on the border between writing and drawing. In his desire to rationalize even the minuscule into geometric form, the scribe had to do battle with the natural or bodily conditions of writing (SMEIJERS, 1996, p 47).
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Olhando para os manuscitos humanistas, eles parecem tipográficos. Nós nos perguntamos quem veio primeiro, essas letras ou as impressas? Essas letras humanistas eram feitas, comumente, de pedaços colados juntos, com um grande sofrimento. Elas ficam no limite entre a escrita e o desenho. No seu desejo de racionalizar até mesmo as minúsculas em formas geométricas, o escriba tinha que duelar com as condições naturais ou corporais da escrita (tradução nossa).
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De maneira geral, as principais características das letras romanas renascentistas são: hastes verticais; bojos que se aproximam da forma circular; traços modulados; eixo humanista; pouco contraste; pequena altura-x; serifas de topo inclinadas; terminais abruptos que sugerem o traço de pena, ou, a partir do século 16, em forma de gota; barra do “e” inclinada (fica horizontal também a partir de 1500).
Podemos dizer que, especialmente a observação sobre o desenho do e de alguns desses tipos – com um traço reto deixando uma ponta aparente antes da curva final, que também é possível observar na caligrafia carolíngia – influenciou-nos em alguns primeiros esboços e testes de possibilidades para essa letra, no nosso projeto de tipo caligráfico, como veremos no último capítulo deste trabalho.
2. As letras itálicas na Renascença
Os primeiros alfabetos itálicos foram gravados entre 1500 e 1540 e possuíam apenas as letras minúsculas. Eram comumente usadas junto de versais romanas eretas ou, ocasionalmente, junto de capitulares caudais. As principais características da letra itálica renascentista podem ser aglutinadas da seguinte forma: hastes verticais ou de inclinação regular; bojos elípticos; traço leve e modulado; eixo humanista; baixo contraste; pequena altura-x; formas cursivas; serifas oblíquas; descendentes serifadas dos dois lados ou não serifadas; terminais abruptos ou em forma de gota.
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Características dos tipos itálicos, como a forma caudal do f, a forma mais fluida do e, a forma quase caligráfica do n, os ésses horizontais da letra z, além da forma evidente de simulação do movimento da pena, foram alguns dos fatores que influenciaram bastante o desenvolvimento deste projeto.
Os itálicos do início do Renascimento são conhecidos como aldinos, em homenagem ao estudioso e editor Aldus Manutius, que encomendou o primeiro tipo itálico a Francesco Griffo em 1499. É estranho constatar que, em 2004, nem uma única reconstrução autêntica de um itálico aldino parecia estar disponível, fosse em metal ou em formato digital. A Monotype Bembo romana e a Monotype Poliphilus são baseadas no trabalho de Griffo, mas suas companheiras itálicas não – elas vêm de outra época. A itálica digital cujo desenho mais se aproxima de uma aldina é a Dante itálica, de Giovanni Mardersteig, mas mesmo nela as versais são inclinadas e não eretas (BRINGHURST, 2004, p 139).
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3. As letras maneiristas
A arte maneirista do século 16 era caracterizada pelo contraste, ambigüidade, pelo anti-naturalismo, pelo desproporcional e pela tensão. Não por acaso, os tipógrafos maneiristas foram os primeiros a trabalhar com tipos romanos e itálicos numa mesma página. Também pela primeira vez, versais romanas inclinadas eram adicionadas aos alfabetos, juntamente com as minúsculas itálicas.
A observação desses tipos também foi importante para este projeto, na medida em que ficam claras outras possibilidades de exploração do movimento da pena em ligaturas, ascendentes e descendentes virtuosas, que procuramos explorar de alguma maneira nas tentativas de desenvolvimento do b, h, k, G, Q e da ligatura sc, só para citar alguns exemplos que veremos adiante.
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4. As letras barrocas
No barroco, os alfabetos começavam a ganhar formas mais modeladas, seus traços já não tinham mais a angulação do eixo típica dos manuscritos, mas esta variava bastante entre uma letra e outra.
A tipografia barroca, assim como a pintura e a música barrocas, transpira atividade e delicia-se com o jogo dramático e incansável de formas contraditórias. […] As itálicas barrocas são ambidestras, ou seja, são escritas tanto com a mão direita como com a esquerda. Foi também durante o barroco que os tipógrafos criaram pela primeira vez o hábito de misturar romanas e itálicas na mesma linha (BRINGHURST, 2004, p 140, grifos do autor).
As letras barrocas, também conhecidas como garalde, old face ou old style, tiveram seu auge no século 17, sendo usadas ainda em boa parte do século 18. De uma maneira geral, elas diferem
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das letras renascentistas por possuir: eixo do traço bastante variável dentro de um mesmo alfabeto; maior inclinação média dos itálicos, que muitas vezes também varia dentro do mesmo alfabeto; maior contraste; maior altura-x; terminais tendendo ainda mais para a forma de gota.
No caso do nosso projeto, a variação de inclinação dentro do alfabeto é visível, não que sejamos ambidestro, mas porque não tivemos, intencionalmente, um controle rigoroso das inclinações entre uma letra e outra, uma vez que desenhávamos uma de cada vez, repetidamente, até achar a forma ideal – ou o mais próximo disso que conseguimos chegar dentro do nosso curto treinamento caligráfico – para aquele determinado caractere na relação entre o movimento da mão e a pena, no papel.
5. As letras rococó
O estilo rococó, como os anteriores, abrangeu todas as formas de arte. Predominou na Europa durante o século 18, como desenvolvimento natural do barroco, para se atenuar e finalmente desaparecer nas últimas duas décadas daquele século. Na tipografia, a maior parte dos alfabetos produzidos eram góticos e manuscritos, caracterizando-se esse estilo por uma abundância de ornamentos e decorativismos. Alguns tipos romanos e itálicos foram gravados em Amsterdã, Holanda, no final da quarta década do século 18, pelo puncionista alemão Michael Fleischman.
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6. As letras neoclássicas
Na segunda metade do século 18, começava a se desenvolver na Europa um movimento de oposição ao barroco e ao rococó, com a retomada de temas clássicos, o neoclassicismo. Eram retomados os modelos dos antigos gregos e romanos, aliados aos novos modelos estáticos racionalistas. Na tipografia, em contraste com as letras renascentistas e barrocas, as letras neoclássicas – também conhecidas como transicionais – passam a ser muito mais contidas. Segundo Bringhurst,
[…] Nelas ainda se pode observar um eco da pena, mas o ângulo natural da escrita é rotacionado até virar um eixo estritamente vertical ou racionalista. As letras têm contraste e abertura moderados, mas seu eixo é ditado por uma idéia, não pela verdade da anatomia humana. Elas são produto da era racionalista: formas freqüentemente belas e calmas, mas indiferentes à beleza mais complexa do fator orgânico. Se as letras barrocas são ambidestras, as letras neoclássicas são contidamente não-cursivas (BRINGHURST, 2004, p 143, grifo do autor).
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Não por acaso, o estilo neoclássico, especialmente na arquitetura, mas também na tipografia, teve profunda repercussão nos Estados Unidos. O estadista Benjamin Franklin, que também era impressor, tinha uma profunda empatia com seu contemporâneo inglês John Baskerville e seus tipos neoclássicos.
[…] Elas [as letras de Baskerville] são tão pura e imperturbavelmente neoclássicas quanto o prédio do Capitólio, a Casa Branca e muitos outros edifícios estatais e federais […] (BRINGHURST, 2004, p 143-144).
Podemos dizer que as letras neoclássicas diferem das barrocas por apresentar: eixo predominatenete vertical nos tipos romanos e também dos tipos itálicos; inclinação do itálico uniforme; serifas mais finas, achatadas e niveladas.
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Pode-se dizer que, a partir daqui, a tipografia começa a se distanciar cada vez mais de seus ancestrais caligráficos.
7. As letras românticas
Assim como as letras neoclássicas, as letras românticas ou didone, também possuem um eixo racionalista e um aspecto geral mais desenhado do que escrito. Apesar dessas semelhanças, é possível apontar algumas diferenças entre esses dois estilos no que diz respeito à tipografia: maior contraste; modulação abrupta dos traços; eixo vertical ainda mais intensificado; terminais em gota com forma mais rígida, tendendo para o círculo; menor abertura; serifas mais finas e abruptas. O romantismo reinou na história européia ao longo do século 18 e durante boa parte do século 19.
As mudanças que esse estilo trouxe, tiveram um paralelo com a mudança na escrita manual. A pena larga, que dava maior
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movimento manual visível ao traço, deixava de ser tão usada e dava lugar à pena pontuda e flexível, que permitia acentuar ou amenizar contrastes, de acordo com a pressão colocada no ato de escrever. Isso favorecia o estilo dramático e romântico na escrita, que também se refletia na tipografia.
No caso deste projeto, posso dizer que as letras românticas talvez não tenham tido tanta influência, ou, se tiveram, foi no sentido de “o que não quero fazer”. Desde o início tínhamos como objetivo desenvolver desenhos caligráficos de letras que poderiam ser utilizados depois como caracteres tipográficos em pequenos corpos. Fontes românticas que dariam início à evolução para o modernismo, como a Bodoni e a Didot – por possuírem grande contraste fino-grosso e mudanças abruptas em seus traços – , funcionavam como tipos móveis, mas acabam não funcionando bem hoje como tipos digitais, quando usadas em pequenos corpos. Os traços mais finos acabam sumindo, ou mesmo se tornando um “ruído” na leitura das palavras. Para evitar esse tipo de problema técnico com as atuais tecnologias de impressão, procuramos, neste projeto, desenvolver um alfabeto sem tanto contraste nos traços de cada caractere.
Segundo Bringhurst,
As letras românticas podem ser extraordinariamente belas, mas carecem do ritmo fluente e estável das formas renascentistas. É precisamente esse rítmo que convida o leitor a adentrar o texto, e prosseguir na leitura. Já as formas estatuárias das letras românticas convidam o leitor, ao contrário, a contemplá-las de fora (BRINGHURST, 2004, p 146).
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Nos séculos 19 e 20, surgiu uma grande variedade de movimentos artísticos que trouxeram alguma contribuição para a tipografia. O naturalismo, o realismo, o impressionismo, o art nouveau, o art déco, o cubismo, o expressinismo, o construtivismo, o pop art e o op art são alguns dos exemplos. No entanto, não entraremos aqui em muitos detalhes sobre cada um deles, detendo-nos apenas naqueles que apresentam uma visível ressonância no universo da tipografia até os dias atuais e que podem, de alguma maneira (construtiva ou desconstrutiva), ter influenciado na feitura do projeto do nosso tipo.
8. As letras realistas
Uma dessas vertentes que trouxe contribuições significativas para a tipografia foi o realismo tipográfico. De maneira geral, a grande característica que norteava os artistas realistas era a observação das coisas cotidianas, abandonando o modelo dos temas acadêmicos já consagrados. Designers de tipos como Alexander Phemister e Robert Besley seguiam esse espírito. Desenhavam letras simples e diretas, baseadas na observação da escrita popular. Podemos colocar como principais características da tipografia realista: o traço homogêneo; letras sem serifa ou com serifas egípcias; ausência, na maioria dos casos, de versaletes, algarismos de texto e outros sinais de elegância e sofisticação; abertura muito pequena; etc. Aqui, em tipos como a Akzidenz Groteskj (1898) – ancestral direta da famosa Helvetica (1952) – , já não se ouve sequer um mero suspiro do traço com pena. As letras tendem a suas formas básicas, que seriam posteriormente bastante exploradas pelos tipógrafos modernistas.
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9. As letras modernistas geométricas
O modernismo trouxe novos paradigmas para o campo da arte no início do século 20. Assim como na arquitetura, uma das alternativas encontradas para o desenho das letras foram as formas geométricas, embora não se restringindo somente a elas.
Em 1919 surgia na Alemanha a Bauhaus. Essa escola viria a ter uma procupação profunda com a produção e como implantar uma estética apropriada para a nova era industrial. A tipografia passaria a fazer parte da estrutura do curso a partir de 1925.
Segundo Gruszyski,
Embora a história da Bauhaus seja rica e interessante sob vários aspectos associados à comunicação visual e tenha passado, na sua história, por diversas mudanças, é relevante nessa reflexão a não-uniformidade e a heterogeneidade ideológica da escola […] [quanto às ênfases conceituais] : a primeira, ligada ao expressionismo tardo-romântico; a segunda, de forte influência construtivista e marcada pelo racionalismo;
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e a terceira, marcada pelo racionalismo técnico produtivista (GRUSZYNSKI, 2000, p 51).
Na década de 1950, surge o Estilo Internacional suíço, com ideais de ordem, limpeza, “forma seguindo a função”, “menos é mais” e outros mantras que foram sendo assimilados pela repetição. As noções funcionalistas trouxeram importantes paradigmas para o campo do design gráfico – e alguns elementos estruturantes para o nosso proejto – , como:
[…] Economia no uso de diferentes fontes tipográficas; utilização de um sistema de grid ou similar que assegure a ordenação racional do projeto de modo a garantir sua unidade; articulação de um repertório determinado de elementos gráficos que, repetindo-se, assegurem a identidade do projeto; legibilidade, clareza, hierarquia (ordenação) e facilidade de decodificação pela repetição sistemática dos signos utilizados, permitindo o rápido entendimento por parte do leitor / receptor; prioridade à comunicação, colocando os aspectos estéticos sob sua “subordinação” (sem ignorar, entretanto, o necessário apelo ao novo como fator de persuasão) (GRUSZYNSKI, 2000, p 53, grifos da autora).
De uma maneira geral, é possivel dizer que o projeto moderno tinha uma intenção de pureza e simplicidade nas suas formas, assim como a tentativa de construção de uma linguagem universal. Nas letras, o traço, assim como no caso dos seus predecessores realistas, era uniforme, sem nenhum contraste fino/grosso. Muitos dos alfabetos eram desenhados sem serifa e, quando essas apareciam, eram retas e sem distinção em relação ao traço principal da letra. Eram apreciadas as fórmulas
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matemáticas puras e mecanicistas como o retângulo e o círculo e, com isso, as letras já não faziam mais nenhuma referência ao gesto manual da escrita.
10. As letras modernistas líricas
Esse gesto manual ausente foi retomado, de certa forma, pelos que vieram logo em seguida: os modernistas líricos, também conhecidos como neo-humanistas. A regra humanista das fórmulas matemáticas para medir proporções nas letras era algo que também parecia cair muito bem no ideal funcionalista do modernismo.
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[…] Os pintores do século 20 redescobriram os prazeres físicos e sensoriais do ato de pintar e o desfrute das formas orgânicas em contraposição às mecânicas. Ao mesmo tempo, os designers de tipos estavam ocupados em redescobrir os prazeres das letras manuscritas, por oposição às desenhadas. Com a redescoberta da caligrafia veio a redescoberta da pena larga, do eixo e da escala humanistas das letras da Renascença. O modernismo tipográfico é fundamentalmente a reafirmação da forma renascentista. Não há fronteira rígida entre o design modernista e o revival renascentista (BRINGHURST, 2004, p 148-149, grifo do autor).
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11. As letras expressionistas
Nessa outra vertente modernista, a tipografia passa a ganhar formas mais concretas que abstratas, mais rudes e cruas do que finas e líricas. Para isso, os designers de tipos expressionistas usavam as mais inusitadas ferramentas e suportes, lapidando suas formas em metal, em madeira ou mesmo eletronicamente.
[…] Três de seus designers, Rudolf Koch, Vojtech Preissig e Oldrich Menhart, exploraram essa senda no início do século 20. De algum modo, eles são a contrapartida tipográfica de pintores expressionistas como Vincent van Gogh e Oskar Kokoschka. Pintores e designers de tipos mais recentes, tais como Zuzana Licko, provaram que o gênero é ainda bastante produtivo (BRINGHURST, 2004, p 149).
12. As letras pós-modernistas
O modernismo trouxe paradigmas que povoam o pensamento no universo da arte até hoje. Entretanto, alguns desses paradigmas foram se mostrando insuficientes, dando margem
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para o surgimento de novos movimentos durante as últimas décadas do século 20, que, por falta de nomenclatura mais adequada e por se afastarem do modernismo – embora muitas vezes se alimentado dele – , foram genericamente chamados pós-modernistas. Isso também foi, evidentemente, transferido para o campo da tipografia, que passava a revisitar nostalgicamente temas antigos, românticos, neoclássicos e outras fontes pré-modernas, em busca de elementos para reinterpretações, muitas vezes dotadas de um apurado senso de humor. Outras, nem tanto.
[…] Os designers pós-modernos – que muitas vezes também foram designers modernos – provaram que é possível infundir nas formas neoclássicas e românticas e no eixo racionalista uma genuína energia caligráfica (BRINGHURST, 2004, p 150).
Embora a fonte dessa genuína energia ainda não nos tenha sido revelada, sem dúvida alguma, os tipógrafos pós-modernos touxeram (e trazem) grandes contribuições para o design de tipos. A adoção de fórmulas modernistas como a da geometria é também bastante comum nas letras pós-modernistas. Entretanto, dificilmente vemos formas simples e puras, prevalecendo as formas livres e assimétricas. Com a facilidade tecnológica dos computadores pessoais (e os tipos digitais) e por não possuir definição clara, o design pós-moderno se torna livre para fazer novas associações, mostrando a grande riqueza cultural e vários dos paradoxos presentes nessa grande aldeia global.
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Assim como a arte neoclássica, a arte pós-moderna é acima de tudo uma arte da superfície: uma arte mais de reflexos do que de visões. Ela tem se locupletado no mundo raso da impressão offset e da alta velocidade do design digital , onde o modernismo vive à míngua. Mas o mundo dos escribas, no qual tem suas raízes o ofício do design de tipos, também era um mundo sem profundidade. Era o mundo dos pintores góticos, no qual tudo se fazia presente em um único plano […] (BRINGHURST, 2004, p 151, grifo do autor).
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Ao observar os diferentes estilos tipográficos ao longo da história, percebemos que, na maior parte das vezes, o que está por trás de desenhos aparentemente muito bem resolvidos do ponto de vista formal não é uma verdade maior e absoluta sobre as formas das letras, nem nenhuma fórmula universal – como pretendiam muitos dos modernistas – , mas cada caso e cada estilo foram resultado de uma série de fatores culturais de diferentes períodos históricos e de suas respectivas tendências estéticas. Feita essa observação, sentimo-nos livre para nos apropriar de diferentes elementos de cada estilo e utilizá-los quando assim forem convenientes em nossos desenhos tipográficos.
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Alguma caligrafia
Quando falamos aqui em caligrafia, referimo-nos à letra escrita com um certo tipo de projeto e de arte contida em si mesma – um sistema gerado na relação mente-braço-ferramenta-tintasuporte que determina a forma das letras.
Segundo Franco,
O punho, sendo orgam [sic] da transmissão das impulsões do ante-braço ao conjuncto “mãos e dedos”, é, ao mesmo tempo, o guia, dando a este conjuncto a inclinação necessaria [sic] para a formação das letras […] (FRANCO, p 27, 1935).
Em sua origem etimológica, a palavra cali advém do grego e significa belo. A palavra grafia, por sua vez, é sinônimo de escrita. Sendo assim, caligrafia seria a bela escrita. Antes da invenção da imprensa, por Gutenberg, e de outras tecnologias como a xilogravura, os livros eram escritos à mão e a leitura destes era um privilégio para poucos. É muito difícil dizer precisamente qual seria a origem dos sistemas de escrita. Com algum levantamento histórico é possível encontrar vestígios do que chamamos de caligrafia em diferentes civilizações e poderíamos dedicar um trabalho de graduação somente a isso. Como nosso objetivo não é esse, tentaremos aqui apenas colocar algumas informações e pequenos levantamentos que consideramos relevantes para esse recorte.
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AS PRIMEIRAS FORMAS DO LIVRO
É possível encontrar, ao longo da história, diferentes sinais e caracteres de escrita feitos sobre uma grande variedade de materiais: pedra, seda, peles, metais, barro, ossos, folhas, papel e madeira são só alguns dos exemplos. O couro já era utilizado no Egito antes de 2000 a.C., estando também presente nos escritos assírios e persas, sendo muito utilizado nos momentos em que o papiro se tornava escasso. Atécnica de fabricação do papel foi, mais tarde, criada pelos chineses, em torno do ano 100 d.C. No século 8º, os árabes viriam a aprender essa arte e a levariam à Espanha e à Itália, no século 12, quando finalmente se espalharia pelo resto da Europa.
[…] By the fourteenth century it [the paper] became the dominant medium for writing and vellum began its decline, though still used for books commissionated by wealthy Renaissance figures and for high proclamations issued by kings and emperors (ANDERSON, 1992, p 60).
No século 14, o papel se tornava o meio dominante de escrita e o couro começava a declinar, embora ainda fosse utilizado para livros comissionados por figuras ricas do Renascimento e para altas proclamações editadas por reis e imperadores (tradução nossa).
Acredita-se que o uso de peles para escrita foi conhecido pelos romanos por volta de 200 a.C., tendo sido, este material, já totalmente difundido e em uso no primeiro século d.C., porém sem ter substituído o uso do papiro. A partir do século 4° o uso do papiro declinou e as peles passaram a ser de uso
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predominate como suporte para a escrita. Quanto mais novo era o animal, melhor, e alguns tipos de pele seriam obtidos logo após o nascimento. O processamento de peles se tornaria uma indústria e logo já se utilizariam seus dois lados para a escrita.
[…] Vellum was expensive, since an animal contributes his skin but once, and this sacrifice provided but a few pages. This mundane economic factor affects style, since it forces a tendency toward more characters to the line, more lines to the page, and smaller letters. We cannot follow this tendency from one manscript to another, but we shall have to consider it seriously in the development of the cramped black letter. We see this factor at work today in newspaper headlines, where a vertical letter is used in order to get more words into a set horizontal format; and in newspaper want-ads, wich may be set 13 lines to the inch (ANDERSON, 1992, p 60).
O couro era caro, uma vez que cada animal contribuía com sua pele uma única vez, e esse sacrifício provia apenas algumas poucas páginas. Esse fator econômico mundano afeta o estilo, uma vez que isso forçava uma tendência para mais caracteres em uma linha, mais linhas em uma página e letras menores. Não podemos seguir essa tendência de um manuscrito para outro, mas devemos considerar seriamente esse fator no desenvolvimento das letras góticas. Vemos esse fator em ação hoje em títulos de jornais, onde uma letra vertical é usada para se obter mais palavras em um formato horizontal determinado; e em anúncios de classificados, onde deve haver 13 linhas em cada polegada (tradução nossa).
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A forma mais recente do nosso livro foi nomeada pela palavra romana caudex (mais tarde se tornaria codex), que seria derivada da expressão ‘da casca de uma árvore’. Nos tempos dos impérios grego e romano, duas ou mais placas de madeira escritas eram colocadas juntas e presas por correias ou anéis. A palavra codex seria então usada para descrever uma forma de comunicação através de séries de superfícies unidas, e se generalizou para classificar as formas mais complexas de construção do livro em páginas – em oposição à forma de rolo. Nas formas mais recentes do codex, quatro folhas de papel eram dobradas – o que resultaria hoje em desesseis páginas – , gerando assim o termo quatternio. O codex de vitela (de pele), entretanto, foi o principal método de produção de livros na Idade Média. O papiro não estava totalmente fora da cena, mas acabou desaparecendo completamente quando o papel apareceu na Europa, no início do século 12.
AS PRIMEIRAS PENAS
Os escribas da civilização egípcia já usavam penas feitas a partir de plantas. As hastes sólidas de algumas plantas podiam ser usadas como pincéis, quando cortadas suas fibras finais, produzindo uma ponta. Essas hastes, quando afiadas em forma de uma cunha, se tornavam ferramentas de desenho. Nos estágios tardios dessa civilização, os escribas começaram a usar penas feitas a partir das lâminas ocas da planta Phragmites Aegyptia, que eram cortadas com uma régua e produziam contrastes de fino/grosso bem definidos. Acredita-se que a introdução dessa lâmina oca nos manuscritos egípcios se tenha dado por volta de 600 a.C. Os escritores latinos teriam começado a utilizar a pena em forma de lâmina por volta de 200 a.C.
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[…] Museums exhibit metal pens used in Roman times, and some of this derive from occupation of Britain. The experiment with metal pens did not survive […] The quill pen was the principal writing tool of the great manuscripts of the Middle Ages, though there is very little literature on this introduction (ANDERSON, 1992, p 61).
Museus exibem penas de metal usadas nos tempos romanos, e algumas delas derivam da ocupação britânica. Os experimentos com penas de metal não sobreviveram. A pena de asas de pássaros foi a principal ferramenta de escrita nos grandes manuscritos da Idade Média, embora exista muito pouca literatura sobre essa introdução (tradução nossa).
As penas de eixo oco eram feitas a partir das grandes penas de vôo das asas de diferentes pássaros. Ocas e resistentes, esses eixos asemelham-se com as penas egípcias. A principal diferença é que as tintas solúveis não penetravam nesse material (das hastes das penas de pássaros) como penetravam nas fibras vegetais.
AS ANTIGAS LETRAS MANUSCRITAS ROMANAS
Existem três famosos estilos de letras manuscritas advindos dos desenvolvimentos do Império Romano que de alguma forma ainda influenciam o estilo no desenho de letras. São elas: A maiúscula quadrata (square capital), a maúscula rústica (rustic capital) e a uncial.
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1. as letras maiúsculas quadratas
Se observarmos o exemplo abaixo, veremos que as maiúsculas quadratas parecem uma transcrição direta do desenho das letras maiúsculas romanas gravadas em pedra para a letra desenhada com pena. Essas letras não eram de fácil execução. Eram montadas cuidadosamente com a atenção voltada para reproduzir fielmente as serifas (das letras em larga escala) para o formato em tamanho reduzido dos manuscritos.
A inclinação principal da pena ia da vertical para ligeiramente à esquerda da vertical. As linhas finas – que vêm na direção nordeste-sudoeste – são mais finas do que se esperaria de um movimento normal da pena, o que significa que o escriba rotacionava sua mão à esquerda para desenhar as linhas inclinadas. Era, sem dúvida, um trabalho minucioso que gerava, do ponto de vista estético, uma página com “dignidade” – algo que parece realmente importante.
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As a book hand square capital is actually something of an anomaly: there is no existing precedent for it, nor are there any descendant styles. In fact, the fame of the style rest principally on just two manuscripts, one at St. Gall and the other in the Vatican (ANDERSON, 1992, p 61).
Como uma caligrafia, as maiúsculas quadratas são, atualmente, algum tipo de anomalia: não há precedentes para ela, nem sequer estilos descendentes. Na verdade, a fama desse estilo se encontra principalmente em apenas dois manuscritos, um em St. Gall e o outro no Vaticano (tradução nossa).
Segundo Horcades,
[…] [a quadrata] era usada para livros públicos, documentos importantes, em situações mais formais […] Sua escrita era lenta e trabalhosa, não havia espacejamento entre palavras […] (HORCADES, 2004, p 25).
2. as letras maiúsculas rústicas
O que marca esse estilo em relação ao anterior é a intensa mudança na inclinação da pena pelo escriba. Nas maiúsculas rústicas as linhas verticais são finas e as linhas horizontais são grossas. Nosso alfabeto romano atual é geralmente baseado numa inclinação de pena mais moderada, e por esse motivo as maiúsculas rústicas podem parecer estranhas aos nossos olhos.
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No primeiro exemplo é possível observar um escriba mais contido. Muito pouco de sua personalidade vem à tona, mas a pena e a superfície parecem se encontrar em harmonia. Na segunda imagem é possivel ver que o escriba adiciona mais sofisticação e graça aos traços, que se aproximam da forma cursiva. É possível observar isso nas linha grossas e inclinadas do A, do V, do M e do R, que se aproximam da forma de S invertido. Esse gesto é quase automático para a mão, quando livre para mostrar sua verdadeira natureza de movimento, funcionando em sinergia os músculos e as articulações dos dedos, do pulso e do antebraço. A mesma forma é possível ser observada nas linhas grossas horizontais. É como se a forma
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caligráfica tivesse uma tendência natural às linhas curvas onduladas, em oposição às linhas retas – que se mostram mais presentes nas linhas finas, quando a mão não tem tanta liberdade de movimento, devido à posição desfavorável do bico da pena. Na realidade a linha reta é um conceito abstrato criado pelo homem. Os físicos sabem que mesmo elementos como a luz e o som se propagam através de ondas. É possível ver isso nas formas da natureza, no movimento do mar. Até mesmo o vento, que é algo que não vemos, apenas sentimos, geralmente tendemos a abstrair como a forma de uma onda, que sobe e desce continuamente.
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Voltando às letras maiúsculas rústicas, segundo Anderson,
Unless there still are undiscovered manuscripts, the rustic-capital style enjoyed no continuity into the centuries after de fifth; but it was known and revived for subtitles in the Carolingian Renaissance, around the end of the eighth century. It is seen in the title function in subsequent centuries (ANDERSON, 1992, p 62).
Embora ainda existam manuscritos não descobertos, o estilo da maiúscula rústica não teve continuidade após o século 5º; mas foi conhecido e revivido em subtítulos no Renascimento Carolíngio, ao final do século 8º. Esse estilo ainda é visto na função de título nos séculos subseqüentes (tradução nossa).
3. as letras unciais
O estilo de letras latinas unciais tem uma tradição de uso maior do que as maiúsculas quadratas e as maiúsculas rústicas. As letras unciais foram usadas do século 4º ao século 9º em vários centros de escrita europeus. Aqui, podemos ver o surgimento de um desenho de letras bem diferente dos anteriores, a princípio advindo das maiúsculas romanas, mas que abandona as antigas elaborações na construção das serifas.
[…] The saquare-tipped pen and its movements begin to dominate the letter form. Then too, there is a principle of economy of movement at work in the formation of the uncial style. A comes closer to a two-stroke letter, L is executed in one stroke, and so on. D is a new form, E and M become curved and
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are essentially new forms. In uncial there is also the beginning of what we call ascenders (parts rising above the line) and descenders (parts dropping below the line) […] (ANDERSON, 1992, p 64, grifos do autor).
A pena de ponta quadrada e seus movimentos começam a dominar a forma das letras. Então há também um princípio de economia do movimento funcionando na formação do estilo uncial. A letra A se aproxima de um desenho de dois traços, o L é executado em um só traço. A letra D ganha uma nova forma, o E e o M se tornam curvados e são essencialmente uma nova forma. O estilo uncial inaugura também o que chamamos de ascendentes (partes crescendo sobre a letra) e descendentes (partes caindo sob a letra) (tradução nossa).
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É possível fazer algumas suposições quanto a esse princípio de economia de movimento na escrita, embora nenhuma delas possa ser provada. Acreditamos que por trás dessa economia formal é possível que estivessem sendo levadas em conta outros desdobramentos econômicos, como a economia do tempo, ou mesmo a economia da quantidade de tinta gasta. Dizemos isso baseado em nossa própria experiência prática com o fazer caligráfico, onde pudemos observar que um traço contínuo e rápido tende a jogar um menor volume de tinta no suporte do que traços lentos e constantemente interrompidos.
Quanto às ascendentes e descendentes, podemos até ver um ensaio sobre o tema em algumas letras nos estilos anteriores, mas no estilo uncial essa prática se torna mais constante. Houve mudanças no estilo unical ao longo do tempo, mas em centenas de manuscritos existentes essas tendências permaneceram fixas.
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É possível observar ascendentes nas letras H, L e D, enquanto as descendentes aparecem nas letras I, F, N, P, Q e R. Nesse conjunto de formas prolongadas acima e abaixo da altura normal, podemos ver um grande antecessor da nossa minúscula, que certamente teve influência no posterior desenvolvimento do alfabeto carolíngio.
If there is any secret to the formation of the early uncial style, it resides in the large quantity of white space captured inside the letters. N is wider than high in recogniction of this fact, and often C and G follow the same pattern. Then too the round qualities of the letter must be maintained. In the entire page these large, captured white spaces alternate with vertical strokes, and the result is a texture of grace and dignity […] (ANDERSON, 1992, p 64-65, grifos do autor).
Se existe algum segredo para a formação dos primeiros estilos unciais, esse reside na grande quantidade de espaço branco presente no interior das letras. O N é mais largo que alto e, comumente, o C e o G seguem esse mesmo padrão. As qualidades redondas da letra também devem ser mantidas. Em toda página elas são longas, capturando espaços brancos alternados com traços verticais, e o resultado é uma textura que transmite graça e dignidade (tradução nossa).
Desse estilo ainda se derivou a letra meia-uncial, que apresentaria ascendentes e descendentes cada vez mais assumidas, aproximando-se ainda mais da forma estrutural das minúsculas que temos hoje, como podemos ver no exemplo a seguir.
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AS LETRAS CURSIVAS ROMANAS
Quando falamos em letras cursivas, muitas vezes é difícil dividilas em estilos claramente definidos. A escrita cursiva, por si só, já tem um caráter muito mais pessoal do que as letras desenhadas, sendo que cada estilo acaba sendo gerado individualmente pela própria expressão pessoal do artista. Ater-nos-emos aqui mais a mostrar exemplos de alguns estilos já desenvolvidos no passado – que puderam, de alguma forma, ter influenciado nos nossos desenvolvimentos caligráficos pessoais – e menos a tentar enquadrá-los em qualquer tipo de cânone da caligrafia.
Em paralelo com as letras romanas já vistas, a cursiva romana teve seu desenvolvimento próprio ao longo dos primeiros séculos de nossa era. Criou suas próprias formas de letras, envolvendo curvas, loops e ligaturas. As letras nunca eram
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estáticas, ou sequer enquadradas em qualquer tipo de padrão rígido de construção, como o das maiúsculas rústicas.
Thus Roman cursive lived in its own way for a time, leaving mark on official writing at least a thousand years beyond the fall of Rome. Ans in the streets of Europe cursive writing continued in the same carefree way in which it had started in the old towns of Italy. […] Never easy to read, Roman cursive became more complicated and illegible and was finally banned in thirteenth-century decrees by Frederick II of Germany (ANDERSON, 1992, p 71).
Essas letras romanas cursivas viveram da sua própria maneira por um tempo, deixando marcas na escrita oficial pelo menos mil anos além da queda de Roma. Nas ruas da Europa, a escrita cursiva continuou no mesmo modo livre no qual ela começou nas velhas
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cidades da Itália. Nunca fácil de ler, a cursiva romana se tornou mais complicada e ilegível, até que foi banida no século 13 por decreto de Frederick II da Alemanha (tradução nossa).
ALGUMAS LETRAS ANGLO-SAXÔNICAS
Alguns outros tipos de letras manuscritas certamente influenciaram no desenho de nossa fonte. Uma delas é a minúscula irlandesa desenvolvida por escribas do século 7º. Nelas a linha de escrita parece elástica, com longos prolongamentos, ascendentes e descendentes, como vemos no exemplo abaixo.
Um desenho também bastante peculiar, que achamos interessante, foi um outro estilo anglo-saxônico de minúsculas,
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desenvolvido no século 10. A aparência distinta e elegante da página pode ser vista pelas serifas grossas bastante marcadas e descendentes finas, além de alguns interessantes prolongamentos de letras.
Várias dessas letras viriam a influenciar o desenvolvimento do alfabeto carolíngio – como vimos no capítulo anterior – no final do século 8º. Este seria um desdobramento racional da caligrafia – um ensaio para o que seria a tipografia, com um projeto rígido determinado para o desenho de cada letra.
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ALGUMAS OUTRAS ESCRITAS CURSIVAS O escriba monástico foi o calígrafo-estrela da Idade Média. Nos seus últimos séculos, a arte da escrita começava a ganhar força além dos modelos canônicos estabelecidos, e a grafia pessoal começava a ganhar valor comercial. Por esse motivo, as variações da escrita foram muito numerosas e de difícil classificação. Selecionamos algumas escritas cursivas interessantes que encontramos durante a pesquisa, que incrementaram nosso repertório visual para o desenvolvimento do alfabeto Maryam.
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Achamos interessante observar como, na medida em que a letra ganha uma forma mais fluida e cursiva, ela se torna cada vez mais ilegível. As letras passam a ser um traçado contínuo – marcas deixadas pelo movimento quase ininterrupto da mão em sua expressão cada vez mais emocionada na escrita. A mancha de texto se torna um belo desenho, mas tende a fazer cada vez menos distinção entre uma letra e outra. A caligrafia parece atingir seu extremo emotivo.
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Maryam um novo projeto tipográfico
Quando iniciamos este projeto, não víamos com muita clareza ainda em que ele iria resultar. Sabíamos que queríamos desenvolver um desenho de uma fonte, mas constantemente nos perguntávamos: Com tantos alfabetos já feitos e com desenhos tão bem resolvidos, por que deveríamos fazer mais um? Na nossa mente iludida com análises superficiais, não conseguíamos ver que nem todos os desenhos de letras são tão bem resolvidos assim, a ponto de suprirem todas as necessidades de comunicação humana através da escrita. Novos tipos sempre serão criados, talvez porque a tipografia tenha uma estreita relação com o campo da arte. Mesmo muitos séculos antes de se ouvir a palavra design, a tipografia já existia, e antes dela ainda, a caligrafia.
Na medida em que fomos estudando um pouco da história da tipografia e da caligrafia, vimos que, hoje, com um olhar já não tão preso a pretensões de funcionalidade universal, nossa visão foi se transformando. Percebemos que cada estilo de letras ao longo da história sempre esteve intimamente ligado aos modelos de pensamento de cada época, que, como já foi dito anteriormente, foram influenciados por fatores culturais, econômicos e políticos. Entretanto, os desenhos de letras mais interessantes que existiram só foram possíveis devido à necessidade de expressão criativa de tipógrafos e calígrafos. Assim, vemos sentido em desenvolver mais um tipo, pela nossa própria
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necessidade de expressão pessoal e exploração de um tema tão vasto e importante hoje na atividade do design gráfico.
Para isso, tentamos buscar na caligrafia a fonte de energia para o desenvolvimento de um novo desenho tipográfico. Nossa intenção foi desenvolver o que hoje podemos chamar de fonte manuscrita. Entretanto, nosso foco não foi tão livre como, a princípio, é possível imaginar, pois tivemos a intenção de criar um desenho de letra que pudesse ser utilizado em pequenos textos contínuos, em pequenos corpos. Uma fonte manuscrita que funcionasse na diagramação de textos, e não só mais uma fonte display que pretendesse explorar o puro exercício de expressão formal.
Sempre tivemos em mente que, para conseguir compreender determinados aspectos do desenho tipográfico, precisaríamos entender alguns aspectos do desenho caligráfico, pois sabíamos que esse último deixou notórias heranças formais para seus sucessores impressos. Muitos dos elementos que vemos hoje nos desenhos tipográficos não dizem respeito a nenhuma verdade última da linguagem da tipografia, mas alguns desses elementos podemos ver claramente como uma verdade natural da caligrafia, na medida em que ela é a expressão direta do homem através da escrita utilizando uma ferramenta em sua mão.
Segundo Veríssimo,
O que distingue o homem dos primatas não é, como você sempre pensou, a alma, ou a capacidade de cantar a quatro vozes. É o dedão. Sem o polegar o homem não teria uma história. Jamais teria desenvolvido qualquer técnica mais avançada do que o
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bolinho de barro. Ainda andaria de quatro sem desfrutar das maravilhas do mundo moderno, como a poluição, a bomba de nêutron e o baixo fender. No momento em que pôde juntar as pontas do dedão e do indicador com delicada precisão, para segurar uma borboleta ou esmagar um piolho, o homem passou a integrar uma ordem mais alta de mamíferos. Começou a andar sobre as patas de trás para deixar as mãos livres. Pôde começar a fazer coisas em vez de apenas descobri-las (Disponível em: <http://www.objetiva.com.br/releases/cinco_dedos.htm>.
Acessado em: 18 set. 2005).
INICIANDO PELA CALIGRAFIA
Foi então, estudando e experimentando os elementos da caligrafia, que começamos a desenvolver nosso raciocínio projetual. Primeiramente testamos diferentes penas de várias formas e espessuras, até encontrar uma que me trouxesse a possibilidade de um traço safisfatório para essa nossa caligrafia.
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Procurávamos uma pena de ponta chata que nos oferecesse um traço com algum contraste fino/grosso, mas que esse não fosse demasiadamente acentuado. Com uma letra desenhada com uma modulação pequena, ficaria mais fácil reduzi-la, posteriormente, a um corpo pequeno – quando esta se tornasse desenho tipográfico – , sem a perda dos traços mais finos, mantendo sua legibilidade. A eleita para tal tarefa foi a Speedball C-4, que, após alguns testes, percebemos ser a melhor pena disponível no escasso mercado de Vitória que se ajustou às nossas necessidades colocadas acima.
Escolhida a ferramenta, partiríamos então para a caligrafia de cada letra individualmente. Utilizamos papel milimetrado para manter as letras dentro de um diagrama mínimo, que ficaria mais visível na marcação da altura-x do nosso alfabeto. A caligrafia em si já é algo que possui por natureza uma certa fluidez, mas como sabíamos que as letras caligrafadas não seriam um fim, mas sim um meio para a construção de uma
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fonte, sentimos essa necessidade de trabalhar com linhas-guia desde o início, no processo manual. Assim, enquanto escrevíamos letras, sabíamos que não estávamos fazendo isso apenas para explorar a beleza do traço caligráfico, mas sim para criar um ideal para cada letra, que pudesse ser digitalizado posteriormente e se tornar um caractere que teria uma ligação direta ou indireta com o caractere posterior dentro de um texto. Foi necessário exercício de meditação constante para repetir inúmeras vezes o desenho de uma determinada letra numa folha de papel, e depois a letra seguinte, e assim passar vários dias tentando manter uma unidade formal entre as diferentes letras do meu alfabeto. Repetíamos exaustivamente o desenho de cada letra, como quem recita um mantra sagrado até atingir um estado desperto da mente, quando o movimento de desenho da letra já acontece naturalmente, como o movimento da respiração.
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Após caligrafadas todas as letras minúsculas, maiúsculas, números e sinais de pontuação, partiríamos então para a fase de digitalização das letras. Uma etapa muito mais racional, de ajustes finos de cada letra em seus desenhos vetoriais. Ater-nosemos aqui a descrever apenas os casos (ou os caracteres) que apresentaram questões claras de projeto e que, por esse motivo, merecem espaço nesta breve reflexão.
DESENHOS VETORIAIS DOS CARACTERES
1. letra a
Por uma escolha totalmente arbitrária, decidimos desenhar as letras na ordem alfabética, começando pelas caixas-baixas. Sendo assim, a letra a foi a primeira a ser reinterpretada para o computador a partir do desenho manuscrito. Já observávamos que, embora nem todos os caracteres tivessem ligação direta da forma com o caractere seguinte, nossa fonte teria um certo ritmo de escrita cursiva. Isso implicaria uma questão projetual no desenho de cada letra, pois, aquelas que tivessem uma terminação que sugerisse continuidade do traço, teriam que fazer uma transição suave para a letra seguinte. Deparamo-nos com essa questão logo na primeira letra desenhada, e isso implicou uma modificação considerável na inclinação do seu traço terminal, como vemos a seguir.
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Esse caso se repetiu em várias outras letras, quando a inclinação original do último traço do caractere na caligrafia teve que ser modificado, aproximando-se mais da vertical, tornando-se paralelo à inclinação principal do alfabeto (cerca de 21º com a vertical). Outra vantagem de encurtar o terminal foi a possibilidade de as letras se tornarem um pouco mais condensadas, o que resultaria em uma maior quantidade de caracteres numa mesma linha quando essa fonte fosse utilizada em um texto contínuo, ou mesmo em um título.
A letra a ainda sofreu algumas modificações posteriores em sua forma. Uma delas foi um pequeno aumento de intensidade no contraste fino/grosso, que julgamos ter omitido demais nos primeiros esboços vetoriais, já pensando no que seria o peso do alfabeto como um todo. Esses pequenos ajustes de peso tiveram que ser feitos letra a letra, uma vez que a caligrafia foi feita uma letra de cada vez – e não como um texto contínuo caligrafado.
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Isso resultaria, na caligrafia, em pequenas diferenças de peso entre as letras, visto que em letras mais curtas e lentas, como o i, por exemplo, a tendência da pena era jogar um pouco mais de tinta no papel do que em letras mais rápidas e longas como l, h, g, e j, que ficariam mais finas.
Na letra a, ainda, houve outra questão polêmica que foi a ponta entre a subida e a descida terminal da letra, que talvez possamos chamar de serifa. Essa pequena ponta acabou se revelando muito pequena quando o texto era reduzido, o que fazia com que ela desaparecesse no papel e o desenho da letra não mantivesse sua fidelidade na redução. Essa “serifa” do a acabou sendo modificada, tornando-se mais encorpada e harmônica com o todo na composição da letra.
Outra questão pertinente para o desenho do a, que também diz respeito ao seu traço terminal, foi como desenhar a ponta dessa terminação. Os primeiros desenhos foram feitos com a ponta afiada, como vemos no exemplo acima à esquerda, mas tivemos
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sérias dúvidas se essa seria a melhor solução. Como isso se comportaria em uma redução em corpo pequeno? O desenho ficaria sempre preservado? Para evitar esse tipo de problema técnico, assim como para manter uma maior unidade visual no conjunto da letra, preferimos desenhar essa terminação com uma ponta redonda, como vemos no exemplo acima à direita. O mesmo princípio se aplicou a todas as letras do alfabeto que possuíam algum tipo de traço terminando em ponta, como as letras c, d, e, g, h, i, j, k, l, m, n… enfim, quase todas.
2. letra c
Na letra c, pudemos observar uma peculiaridade interessante. Uma dessas coisas que já estamos tão acostumados a ver que, normalmente, nem nos perguntamos de onde vieram. Enquanto caligrafávamos essa letra, percebíamos que o próprio movimento de semi-círculo que temos que fazer com a pena, davalhe a forma que costumamos ver, começando em gota ou um ensaio do que seria uma serifa, engrossando seu traço mais abaixo e terminando em ponta. A própria angulação da pena, que fica na direção sudeste-noroeste, dá o eixo da letra, não só no c, mas em todas as letras em que a pena fique nessa posição.
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Mas a peculiaridade que achamos mais curiosa foi essa pequena gota no início do traço. Enquanto repetíamos inúmeras vezes o desenho da letra, percebíamos que no ataque – primeiro contato da pena com o papel – derramava-se um pouco de tinta, que ali ficava acumulada. Com a continuação do traço, a tinta escorria para o restante da letra, terminando em ponta, no movimento rápido de retirada da pena do papel, ainda em movimento. Achamos interessante observar como a velocidade e o atrito da pena com o papel são determinantes para a construção da forma das letras, e, no caso do c, por possuir um só traço em curva, isso pode se revelar com bastante clareza.
Já no desenho vetorial, foram feitos alguns ajustes na forma para que a letra entrasse na angulação principal do alfabeto e se comunicasse em harmonia com seus pares – anterior e posterior – , como vemos no exemplo abaixo. Nessa última relação, o que foi determinante, mais uma vez, foi a forma e angulação em que a letra acaba.
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3. letra d
Testamos algumas formas distintas para a letra d durante o processo caligráfico. No fim, estivemos em dúvida entre o movimento mais comum do d na escrita cursiva que conhecemos e o movimento da letra com haste em forma de s, que chamamos, respectivamente, de d1 e d2.
Fizemos a escolha pela letra d2, por motivo meramente exploratório das formas. De tanto observar manuscritos antigos, cremos que essa configuração do d2 ficou em nossa mente com mais força do que o próprio d1, que costumamos escrever corriqueiramente. Como podemos observar no exemplo abaixo, esse movimento básico de traço ininterrupto do d2 teve origem visivelmente nas escritas unciais, ganhando mais força e naturalidade nos escritos em minúsculas, na Irlanda do século 7º , quando a forma de s na ascendente se torna mais visível.
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A forma do nosso d, entĂŁo, se concretizava em desenho vetorial, procurando manter unidade formal com as letras jĂĄ desenhadas no alfabeto.
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4. letra e
A letra e foi testada inicialmente, na caligrafia, em diferentes formas. Uma delas foi a letra com uma barra ascendente perpendicular ao eixo do traço, muito comum em tipos romanos renascentistas. Essa ascendente foi exagerada, com a intenção de ficar bastante aparente, mas por fim acabamos concluindo que, para os nossos olhos não muito acostumados com essa forma do e, isso acabaria gerando um ruído na leitura da letra. Outra versão romana, mais convencional, foi feita como segunda alternativa e, por fim, uma versão da letra na forma itálica. Como nosso alfabeto, de maneira geral, acabaria tendo uma forma próxima à escrita cursiva, elegemos essa terceira possibilidade formal ao desenvolver o desenho vetorial da letra. Diminuímos um pouco seu olho, mantendo uma abertura suficiente para que este não sumisse em uma situação de corpo reduzido.
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5. letra g
Elegemos a forma da letra g em cauda, terminando em ponta para trás e para cima. É possível dizer que essa mesma estrutura caudal se repetiria em outras letras do alfabeto como o j e o y. Essa característica de terminais em ponta acabou se tornando uma das principais que singularizam nosso alfabeto. No caso do g, algumas modificações foram feitas a partir da caligrafia original. Nela, com uma cauda ainda tímida, a letra tendia a, sozinha, se confundir com um 9. Para evitar esse tipo de problema, decidimos aumentar o tamanho da cauda, assumindo-a como um longo rastro deixado pela pena que se diverte ao explorar a potencialidade de uma linha descendente em curva. O olho da letra também foi modificado, tornando-se mais arredondado e, assim, enquadrando-se melhor na identidade geral do alfabeto.
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6. letra h
Ao observarmos as caligrafias da letra h, ocorria mais uma questão formal, que poderia ser problemática para a distinção entre as letras. Assim como o g, que teve que ser ligeiramente alterado para se diferenciar do 9, a letra h também apresentava questão semelhante, por poder ser facilmente confundida com o número 2, devido à sua ascendente demasiadamente longa e curva, como vemos abaixo. O desenho foi alterado de modo a caracterizar melhor a letra e se aproximar do traço da letra b (já desenhada anteriormente) e, assim, se integrar melhor ao conjunto do alfabeto. Também foram ajustados a inclinação da letra, aproximando-se mais da vertical, e o traço terminal, que seguiria a mesma lógica de angulação das letras anteriores.
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7. letra j
Esta letra foi um caso à parte dentro do alfabeto Maryam, por possuir um só traço que não diferencia claramente o que é altura-x e o que é descendente. Essa foi a grande dificuldade ao desenvolver seu desenho, pois a letra j parece conter em si mesma uma fluidez que extrapola os limites estabelecidos pelos diagramas e suas tentativas de enquadramento racionalista. Para resolver essa questão, desenvolvemos um desenho de letra que mudaria constantemente sua curva ao longo do traço, começando na linha de topo da altura-x e levemente fluindo para o desenho de uma cauda terminada em ponta fina. A inclinação da letra foi alterada para ficar em harmonia com o restante do alfabeto, e o desenho de sua cauda foi ajustado para ficar com estrutura semelhante à letra g.
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Assim, a letra j foi toda reestruturada, a partir de sua caligrafia original, sem grande comprometimento com o todo, para uma forma enquadrada dentro do diagrama e do estilo tipográfico, que começava a ganhar nitidez e vida própria. O pingo do j, assim como o pingo do i, foi desenhado como uma marca não muito regular, porém precisa, deixada pela ponta da pena tocando o papel.
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8. letra k
Na letra k foi acrescentada uma descendente em forma de traço terminal prolongado, pouco vista nos alfabetos em geral, mas que vimos como uma possibilidade natural de exploração da caligrafia. A letra original caligrafada foi inteiramente ajustada para o desenho tipográfico, tendo sua inclinação ligeiramente modificada e ascendente com forma semelhante às letras b e h, já feitas anteriomente. A altura-x também foi ajustada para que ficasse em harmonia com as demais letras, algo que só foi realmente possível através do desenho vetorial, pois na caligrafia isso se mostrava de difícil controle. Preferimos usar o segundo traço sem ligação direta e contínua com a barra ascendente, para que essa letra não pudesse ser eventualmente confundida com o R.
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9. letras m, n e u
Aqui começamos a quebrar a ordem alfabética na construção das letras. No momento do desenho vetorial, a letra n foi constituída como uma derivada reduzida da letra m. Já a letra u seguiu seu próprio modelo caligrafado, no momento da tradução para o computador.
A letra u apresentava uma curva mais suave, enquanto as letras m e n, curvas mais agudas. Todas elas iniciavam com um traço arredondado, como uma marca deixada pelo contínuo movimento ondular. Esse movimento, na letra u isolada, funcionava bem. Mas, quando foi colocada em combinação com seus pares, acabou gerando uma certa confusão de leitura. As letras u e n, combinadas, poderiam ser facilmente confundidas com um w, como vemos a seguir.
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Também percebíamos que a letra u, desenhada dessa maneira, funcionava muito bem como inicial de uma palavra, mas, quando conectada com outra letra anterior de terminação cursiva, gerava um traço contínuo que não dizia muita coisa sobre o movimento corriqueiro da mão nesse tipo de escrita.
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Dessa maneira, logo percebemos que o problema maior estaria realmente na letra u, que foi alterada, tendo sua curva inicial acentuada substituída por uma curva suave, quase reta.
10. letra q
A letra q foi outro caso bastante particular dentro do alfabeto Maryam. A forma escolhida foi inspirada no q da fonte manuscrita Zapfino, de Hermann Zapf, onde o traço descendente da letra faz uma curva ininterrupta, subindo até a ligação com a letra seguinte.
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A letra q do nosso alfabeto foi desenhada para ter uma ligação direta e suave com a letra u, uma vez que essa combinação de letras, tanto em português quanto em inglês, acontece em quase todos os casos em que o q aparece numa palavra. Assim, ela pode ser trabalhada quase como uma ligatura dividida em dois caracteres independentes. Assim como a letra g, o q também sofreu ajustes na forma de seu olho, a fim de entrar em sintonia com o alfabeto, que já possuía caracteres suficientes para se verificar uma linha identitária própria.
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11. letra r
Na letra r observamos mais uma peculiaridade semelhante à presente na letra c. O traço da letra se mostrou de difícil execução na caligrafia, pois, dependendo de como era feito, a letra poderia se confundir com um Y ou um n. Teria que ser uma letra contida e cuidadosamente calculada. Para se diferenciar do Y, a angulação de abertura entre a haste e o traço de fuga do r tinha que ser feito bem fechado. Ao mesmo tempo, esse último traço não poderia se prolongar à vontade, para não se aproximar demais do desenho do n. Essa preocupação trouxe visivelmente uma característica própria da letra herdada da caligrafia, que é a sua terminação em gota. Isso acontece no momento em que a mão pára repentinamente no papel, interrompendo o fluxo natural que geraria um n. Nessa parada repentina, a pena joga um pouco mais de tinta no papel, que fica acumulada em forma de gota na ponta do r, dando-lhe sua forma característica que vemos comumente em tipos diversos.
“Sempre é pouco quando não é demais.” Arnaldo Antunes
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A letra ainda foi alterada no seu desenho vetorial, tendo sua linha de fuga ligeiramente encurtada para entrar em conformidade com a letra que viria a seguir em uma palavra, mantendo um espaçamento oticamente regular, sem que a gota invadisse a letra seguinte.
12. letra s
Mais uma observação semelhante sobre a natureza da caligrafia foi feita no caso da letra s. No movimento de ataque, em que se dava o primeiro contato da pena com o papel, era deixada uma serifa, que talvez fosse um rastro deixado em uma fração de segundo na qual a ferramenta se acomoda no suporte, jogando a primeira gota de tinta, para depois deslizar suavemente pelo restante da letra s, até finalmente ser retirada. Essa marca foi transposta para o desenho vetorial. Nesse momento, ainda foi acrescentada mais uma serifa no traço de fuga da pena do papel, como vemos a seguir.
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Essa segunda serifa foi criada pensando na combinação do s com seus pares anteriores, especialmente aqueles terminados em ponta de ligação cursiva. Nesses casos, a relação entre a serifa inferior e a linha de fuga dos caracteres anteriores sugere uma continuidade visual, especialmente quando colocados em textos em corpo pequeno.
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13. letra x
Desde sua caligrafia, a letra x seguiu um modelo com o primeiro traço em forma de s invertido e o segundo traço prolongado, gerando uma descendente. Podemos observar esse modelo da letra na escrita meia-uncial do século 6º e em diferentes escritas anglo-saxônicas dos séculos 7º ao 10º, como vemos abaixo.
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Na nossa letra, de maneira paradoxal, o x ainda ganhou uma pequena ascendente, e assim o traço inclinado não começa exatamente na linha de topo da chamada altura-x. Esse traço ainda recebeu o desenho de gotas nos pontos de ataque e fuga da pena, geradas também pelo pequeno acúmulo de tinta no papel, no momento da caligrafia.
14. letra z
Quando caligrafada repetida e solitariamente, a letra z tendia a uma forma alongada no sentido horizontal. Por algum motivo que ainda desconhecemos, essa foi uma letra que proporcionou enorme prazer e regozijo no momento da caligrafia (talvez por ser a última). Em conseqüência disso, teve sua forma um pouco exagerada. Um pequena correção foi feita no momento do desenho vetorial, deixando-a mais condensada e em conformidade com seus pares alfabéticos.
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15. letra A
Começaríamos, então, a fazer os desenhos vetoriais das letras maiúsculas. Por uma decisão arbitrária, estas seguiriam uma altura regular, proporcional a duas vezes a altura-x normal do alfabeto. Assim como nas minúsculas, algumas mudanças ocorreram ao transpor o desenho caligrafado das maiúsculas para o desenho digital em curvas. Na caligrafia, como dito anteriormente, nem sempre foi possível ser mantida uma inclinação regular, pois, como foi feita em vários dias distintos, dependendo do nosso estado mental em cada dia, as letras poderiam ser feitas de forma mais rápida e inclinada, ou mais lenta e tendendo à vertical. Essas pequenas mudanças tiveram que ser corrigidas para que o alfabeto tivesse uma unidade de expressão formal. A letra A foi o primeiro caso em que algumas mudanças sutis tiveram que ser feitas, alterando sua inclinação e alguns pequenos detalhes da forma. As maiúsculas também deveriam ter o mesmo peso das minúsculas e, para isso, seus traços tiveram que ser ajustados cuidadosamente.
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16. letra C
A letra C, no nosso alfabeto, acabou assumindo duas formas distintas que poderiam ser utilizadas num texto. Uma delas – a forma do C convencional – foi feita a partir de nossas primeiras caligrafias e apenas foi traduzida para o desenho vetorial, tendo seu traço de fuga ajustado para se encaixar em harmonia com a letra seguinte, mantendo a expressão cursiva da fonte tipográfica. Outra versão do C foi feita a partir da observação de antigos manuscritos dos séculos 15 e 16, que utilizavam a abertura da letra se encaixando com seu par posterior. A letra manteria sua mesma estrutura formal, mas começaria seu traço um pouco abaixo da altura normal das maiúsculas e ganharia uma descendente, tornando-se um pouco mais alongada, como veremos a seguir.
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17. letra H
A letra H acabou possuindo um desenho peculiar desde sua caligrafia, pelo prolongamento do seu segundo traço vertical, produzindo uma linha descendente. Isso também aconteceu com a letra G, mas a diferença básica entre os dois casos é que a curvatura do traço do H, no desenho vetorial, foi elaborada pensando em sua combinação harmônica com a letra seguinte,
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que acompanharia o traço de fuga arredondado da letra, como podemos ver no exemplo abaixo.
18. letra J
Esse foi mais um caso particular de projeto. A letra J teve que ser feita pensando essencialmente em não ser confundida com a letra I, uma vez que a primeira poderia ser facilmente percebida como uma das versões do I em escrita cursiva – que não estaria presente no nosso alfabeto. Quando colocadas juntas numa mesma sentença, essas duas letras se diferenciariam com facilidade, mas caso o J estivesse solitário num texto, poderia facilmente ser lido de forma equivocada. Para resolver esse problema, decidimos prolongar o traço final da letra J, assumindo-o como uma cauda tendendo para baixo e para a esquerda. Assim, essa letra se tornaria visivelmente mais expandida que as demais maiúsculas.
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19. letra K
A letra K, por sua vez, tem seu desenho totalmente modificado a partir de sua caligrafia. Sua haste se constrói a partir das já desenhadas letras H e I, começando a criar, assim, uma identidade visual entre as maiúsculas, típica da linguagem da tipografia. Seu traço de fuga, por sua vez, é alongado, criando uma pequena descendente que, assim como no H, adapta-se ao desenho das minúsculas posteriores.
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20. letras M e W
Essas duas letras tiveram estruturas e correções semelhantes em seu desenho vetorial. Na caligrafia original, o M tendia a ficar mais inclinado que o padrão do alfabeto, enquanto o W apresentava inclinação menor. Essas pequenas alterações tiveram que ser feitas para que as duas letras entrassem em conformação com o restante do alfabeto. Além disso, a letra M, em particular, se tornou mais larga e seu traço de fuga ganhou uma angulação que sugerisse o movimento de continuidade cursiva, quando aliada a uma vogal minúscula.
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Ao testar a letra W em um texto, percebemos um conflito que ocorreria com um par bastante comum na língua inglesa, o h. Para evitar uma sobreposição de traços – que poderia gerar um ruído de leitura –, decidimos encurtar a linha terminal do W.
21. letra Q
Na letra Q, procurei explorar um pouco da linguagem da caligrafia, deixando um longo traço prolongado à direita, como vemos a seguir. Seu traço original, entretanto, se fosse desenhado seguindo fielmente o modelo caligrafado, iria comprometer a leitura das letras posteriores. Para evitar esse conflito e para criar uma combinação harmônica com seus pares, modificamos o desenho da letra, criando um traço mais baixo que sublinharia as letras posteriores, mantendo uma distância adequada, abaixo da linha de base das letras minúsculas. A parte circular da letra Q seguiria o modelo feito anteriormente para a letra O.
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22. letra R
Seu desenho foi feito como uma fusão das letras P e K. A letra P possuía parte de seu desenho semelhante à letra B, que foi transferido ao R. A letra K, por sua vez, apresentava seu último traço ligeiramente prolongado para baixo e essa característica também foi aproveitada na construção da letra R.
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23. letra Y
Desde sua caligrafia, a letra Y teve que ser feita pensando fundamentalmente em não ser confundida com a letra r nem com a letra V. Com uma abertura fechada demais, poderia ser confundida com a primeira, mas acreditamos que só a diferença de escala já garante a diferenciação entre o Y e o r. Se fosse feita muito aberta, entretanto, poderia se confundir com um V e isso teve que ser observado com cuidado no momento do desenho vetorial.
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24. exclamação !
O sinal de exclamação foi feito com o início de seu traço ligeiramente mais pesado que os demais caracteres. Sua altura também ultrapassa o limite da linha de topo padrão das maiúsculas, terminando com um ponto certeiro. A idéia é que esse sinal realmente “grite” dentro de uma massa de texto.
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25. interrogação ?
Procuramos, na pontuação, traduzir um pouco do que o texto diz, em pequenos detalhes das formas dos caracteres. O sinal de interrogação foi desenhado com altura semelhante às letras maiúsculas e com largura um pouco menor. Seu ponto foi feito como uma marca rápida deixada pela pena no papel. Não é um ponto preciso e denso como os demais pontos do alfabeto, mas uma marca imprecisa, irregular e questionadora.
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26. a relação entre pontos üi.:;
Uma questão com que nos deparamos ao projetar o alfabeto foi: Que tamanho dar para cada ponto? Ao observar vários outros tipos já construídos, pudemos observar que existe uma ordem crescente visível entre o trema, o pingo do i ou do j e o ponto simples. A explicação nos pareceu bastante racional. Os dois pontos da trema têm que ocupar um espaço muito pequeno acima da letra, e, no caso do ü (única manifestação na língua portuguesa), deve também não ser confundido com duas letras i. Talvez por esse motivo, os pontos do trema são menores e ficam a uma altura ligeiramente menor que o pingo do i. O ponto simples (e suas variações como : , ; e …), por sua vez, tem um diâmetro ligeiramente maior do que o pingo do i. É provável que isso aconteça porque o ponto tem uma natureza bastante diferente dos demais pingos – serve para separar sentenças e por isso deve ser bem marcado e aparente. Procuramos seguir essa ordem de escala, especialmente porque ela nos pareceu bastante lógica e funcional (no melhor sentido da palavra).
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27. os números 1234567890
Os numerais foram outro ponto à parte em nosso alfabeto. A primeira escolha que tivemos que fazer foi definir qual sistema de algarismos arábicos utilzaríamos e como aliá-los, em harmonia, aos demais caracteres já desenhados.
Segundo Bringhurst,
Quando os algarismos arábicos se uniram ao alfabeto romano, também receberam formas maiúsculas e minúsculas. Os tipógrafos chamam os primeiros de algarismos de texto ou elzevirianos e fazem questão de utilizá-los sempre que o texto circundante for composto em caixa-baixa ou em versaletes. Suas formas alternativas são chamadas de algarismos titulares ou alinhados, porque se alinham entre si com as maiúsculas. […] Durante boa parte dos séculos 19 e 20, os algarismos alinhados foram amplamente chamados de “modernos”; já os algarismos de texto eram chamados de “old-style” [ estilo antigo]. Pregava-se o modernismo como um dever sagrado e os números eram de certo modo endeusados. […] Não obstante, a civilização tipográfica parece determinada a prosseguir. Os algarismos de texto voltaram ao cotidiano do design de tipos, e ademais podem ser supridos retroativamente às fontes às quais foram prematuramente negados. Por mais comum que seja, o uso de algarismos alinhados em textos corridos é uma atitude ignorante, que rejeita violentamente a verdade das letras (BRINGHURST, 2005, p 55-57, grifos do autor).
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Como mnossa pretensão, neste projeto, é desenvolver um estilo tipográfico que possa ser utilizado em pequenos textos contínuos, achamos mais interessante (como profetiza Bringhurst), utilizar algarismos elzevirianos. Nesse sistema, os algarismos 0, 1 e 2 têm altura igual a altura-x normal do alfabeto, enquanto 3, 4, 5, 7 e 9 possuem descendentes e 6 e 8 possuem ascendentes.
Outra decisão importante foi em relação à largura dos algarismos. Queríamos diferenciá-los claramente das letras, embora devessem ter características formais que os unificasse ao estilo. Resolvemos a primeira questão utilizando uma largura média intermediária entre a largura das letras maiúsculas (maior) e a largura das minúsculas (menor). Qunato à segunda questão, decidimos utilizar a mesma modulação fino/grosso, a mesma inclinação média, e alguns pequenos elementos formais que já haviam aparecido no desenho das letras, como: a forma do traço final das hastes em gota, presente no I e H, que foi transferida para os números 4, 6, 7 e 9 e a forma circular do o, que foi ligeiramente alargada e aplicada nos números 0, 6 e 9.
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28. uma variação para a letra s
Com todos os principais caracteres do alfabeto já desenhados, começaríamos a pensar em meios que trouxessem à Maryam um pouco mais da linguagem da caligrafia. A tipografia tende a restringir cada letra a um só desenho que se repete a cada vez que aparece em um texto. Algumas variações então começariam a ser pensadas. Como já vimos no caso da letra C, a letra s também ganhou uma versão alternativa mais alongada, que poderia ser utilizada livremente pelo editor, no texto.
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29. últimos ajustes na letra d Algumas combinações de letras se mostraram problemáticas no alfabeto Maryam. Em alguns casos, certos conflitos se resolveram através de ajustes de kerning; em outros, através da elaboração de ligaturas. No caso da combinação ld, ocorria um conflito entre as duas hastes, que se sobrepunham. Com o aumento do espaço entre esse par de letras, separando as hastes, o espaço interno entre uma e outra acabaria ficando demasiadamente grande, o que geraria uma contraforma estranha aos olhos, no momento da leitura contínua. Para resolver esse problema, decidimos fazer uma ligeira modificação no desenho da letra d, deixando-a com sua haste um pouco mais inclinada.
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ALGUMAS LIGATURAS
Para uma melhor emulação da expressão caligráfica dentro da tipografia, sentimos a necessidade de ainda desenvolver algumas ligaturas, que poderiam ser colocadas manualmente pelo editor, ou programadas para serem substituídas automaticamente, por softwares de editoração eletrônica. Algumas das ligaturas foram feitas para resolver problemas semelhantes ao da combinação
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ld; outros, para simplesmente gerar variações de escrita – típicas da caligrafia – e uma maior expressão cursiva dentro do texto na página impressa. A idéia é que esses recursos comecem a diminuir o efeito “flores de plástico” provocado pela repetição idêntica de caracteres de simulação manuscrita.
1. ligaturas lh e lt Essas duas ligaturas foram feitas especialmente para resolver mais alguns problemas concretos da fonte. As combinações lh e lt foram mais duas que causaram ruído, pelo fato de suas hastes ficarem sobrepostas, gerando um desenho interno estranho aos olhos e indesejável para a leitura, como vemos no exemplo abaixo.
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2. ligaturas ch e nh Vale lembrar aqui que as ligaturas projetadas no nosso alfabeto foram escolhidas pensando essencialmente em textos compostos na língua portuguesa. Na língua inglesa ou em outras línguas estrangeiras, mais algumas combinações se mostrariam interessantes para a composição de ligaturas, como as sequências ff, ffi, ffl e tt. Mas, neste pequeno recorte projetual, preferimos enfatizar nossa língua nativa. Assim como o lh, as combinações ch e nh são bastante recorrentes no português. Aproveitando a nova possibilidade de desenho feita para a letra h, na primeira ligatura, decidimos repetir sua estrutura em mais esses dois pares, agora já não tão preocupado com questões de ruído na leitura, mas com uma melhor simulação da fluência cursiva na composição do texto.
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3. ligaturas as, às, es, is e us A combinação de vogais com a letra s também é bastante recorrente na língua portuguesa. No caso da fonte Maryam, sentimos que as letras terminadas em linha cursiva ainda não estariam fazendo uma ligação totalmente fluida com o s. Para uma melhor aparência cursiva, percebemos que os traços terminais dessas vogais teriam que se ligar, nesse caso, com o topo de seu par posterior. Assim, foram elaboradas algumas ligaturas para suprimir mais essa deficiência de variação formal dos caracteres. Demos ênfase às vogais sem acento, mas todo o conjunto de caracteres derivados poderiam ser feitos posteriormente, como: ãs, ás, és, ês, ós, ôs, õs e ús. Uma exceção à regra foi a combinação às, que é por si só uma palavra bastante empregada em textos na nossa língua, e por isso, sentimos a necessidade de disponibilizá-la entre as ligaturas desenhadas.
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4. ligaturas st e sc Outras combinações em que a letra s se faz presente também foram feitas. Nesse momento, já começaríamos a desenhar algumas ligaturas totalmente “decorativas”, sem nenhuma função de resolver qualquer tipo de problema no texto, mas apenas para acrescentar mais possibilidades de elementos caligráficos na composição de textos na família Maryam. A primeira delas foi o par st – uma ligatura bastante comum em tipos romanos e itálicos diversos. Sua ligatura convencional ligaria o topo da letra s com o topo da letra t. No nosso alfabeto, entretanto, pelo fato de a letra t possuir altura igual aos demais caracteres com hastes ascendentes, a ligatura não ficaria bem construída se feita dessa forma. Preferimos ligar a letra s com o traço “horizontal” do t, criando, assim, um gesto manual com maior naturalidade. A ligatura sc, por sua vez, não faz parte de nenhum cânone tipográfico ou caligráfico. Criamos esse par pelo fato ser uma combinação de letras também bastante comum na língua portuguesa. Sua função é somente criar um efeito do gesto manuscrito na composição das palavras, sem, contudo, prejudicar sua leitura.
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5. ligaturas fi, fl e ft Essas três ligaturas são muito comuns em alfabetos diversos, sendo que as duas primeiras já são praticamente obrigatórias para boas fontes digitais de qualquer natureza. É bastante comum vermos pequenos conflitos em desenhos de famílias tipográficas, onde as letras f e i, por exemplo, colidem, gerando um ruído na leitura. Normalmente, em alfabetos romanos e itálicos, esse conflito ocorre quando o traço superior da haste ascendente do f se choca com o pingo do i. No caso da fonte Maryam, esse conflito não ocorreu, mas mesmo assim sentimos necessidade de disponibilizar a ligatura fi, assim como suas parentes, fl e ft. Nesses últimos dois pares, ocorriam conflitos concretos que geraram ruídos de leitura. Com um espaçamento normal, as hastes se chocavam. Assim como no caso ld, ajustes de kerning nas combinações fl e ft melhoravam um pouco a situação, mas não resolviam totalmente o problema. Dessa forma, a construção dessas últimas duas ligaturas se fazia necesária para a composição de um texto harmonioso, com a naturalidade do gesto caligráfico.
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6. ligatura rr Não temos conhecimento de nenhum alfabeto que tenha utilizado essa ligatura anteriormente. A combinação rr é bastante comum na língua portuguesa e, por isso, achamos interessante criar um caractere especial que sugerisse a construção dessas duas letras em um só movimento contínuo. Assim como o sc, o rr seria uma ligatura opcional, que poderia ser utilizada ou não, no texto, de acordo com o nível de coragem do editor. Como uma forma isolada, essa ligatura poderia ser estranha aos olhos e de difícil identificação. Mas no contexto de uma palavra, pode ser facilmente lida. Esperamos um dia descobrir se estamos sendo um inovador, ou apenas um grande mal-informado.
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TESTANDO AS TEXTURAS
Com as ligaturas prontas, partiríamos, finalmente, para alguns testes com massas de texto diagramadas. Pelo fato de a fonte Maryam ter ascendentes e descendentes longas, sua entrelinha normal apresentaria um grande espaço branco entre as principais letras que não possuem hastes. Segundo Martins, Os escribas, desde o Egito dos Faraós, perseguem a página ideal, uniforme na letra e na linha, e que resulta em uma textura. Daí surge o conceito de “texto” (MARTINS, p 5, 2003).
Assim, começaríamos a perceber que a textura de Maryam possui uma linha bem marcada pela altura-x das letras, com pequenos fios que parecem saltar da linha. Estes são gerados pelas longas hastes curvas, caudas e voltas que se movem inquietas ao longo da página impressa, como vemos na simulação a seguir.
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Com a ligatura ligatur prontas pronta , começaria ffnalmente nalmente a partir para alguns tteeteste com massssa de texto diagramada mas diagramadas. Pelo fato de mina nnaa fonte ter aammendent mendente endente e ddecendente cendent longa,, sua entreli entrelinnnaa normal apr apreeentaria um grande eesespaço spaço branco entre aass principa letra principai letr que não popossssuem suem hahaoe oe. Segundo Martin Martins, os ecriba,, ddede o Egito dos Faraó Faraós, perseguem a página ideal, uniforme na letra e na lilinnna,a, e que rreudaddaa em uma textura. Daí surge o conceito de “texto”. AAssssim, sim, avaliando a textura da fonte Maryam, começaria a perceber que ela pos possui uma lilinnnaa bem marcada pela adura-x ddura-x ura-x regular das letr letraa, com pequeno pequenoss ffosos que parecem sadar d dar da lilinnna.a. Est Estee são gerados pel pela longas longa ha h tet amamendent mendente endente e ddecendentes cendente curva curv , cauda e voda que se movem inquieta caudas inquietas ao longo da página impr impresa, como vemos n te texto corido. ne rrido. ido. Foram ddeeen ennados, ados, ao todo, 26 minúscul minúsculaa, o mmemo número de maiú maiúmmul mula ula, 2 caractere caracteress eepecia peciai de variação sobre uma mmema letra iisolada, peciai 15 ligatur ligatura de par pare de caractere caracteres e vários sina sinai de pontuação, que já perdi a conta. CCom o joo de ligatur ligatura, a idéia é que o texto se torne um pouco mais ggúido úido e meno menoss monotônico – uma caracterí característica típica da tipogra tipografffa.a. A rreeitência da formas da formas à redução também é algo importante, poi permite que a palavra palavr sejam lidlida com clareza. Quando isoo acontece todos ffcam cam feliz felizee, não é mmemo amiguinos?Maryam nnos?Maryam é um nome próprio feminino de origem árabe. Decidi por esee nome após algun alguns comentários de colega colegas que, vendo os primeiros tteteste de impre impressssão, são, aacccaram aram que a mmaasa de texto sugeria algo semelante l b ememrit lante mrita rita do oriente médio. Controvérsia Controvérsias à parte, eessssese foi o rreeudado dado ffnal. dado nal. DDeede sesej primeiros eeoooudos, udos, o alfabeto papassssou sou por vária etapa etap , sendo que o proc proceso todo de criação, ddede memej primeiros tetestet com pena caligrá caligráfffca,ca, foi de Jullo a Novembro de 2005. Então a coreria rreria acaba, e podemos sjsjpirar aliviados!
The wounds are vicioj and deep, a rraaahh of mmarlet arlet spots on the back and thigh thighss or face, the shard shards of shrapnel from the clcljter bombs buried an inincc or more in the ggesh. esh. The wards of the Hillah teateacccing ing hohossspital pital are proof that something illegal – something quite outoutside the Geneva Conventions – occu occurrreded in the village around the city once known as Babylon. The wailing ccildren, the young villages women with brebreat and leg wound wounds, the 10 patients upon whom doctors had to perform brain surgery to remove metal from their heads, talk of the days and night nights when the explosiv explosivee fell “like grape grapesss”” from the sky. ClCljjter bombs, the doctor doctors say – and the detrit detritj of the air raids around the hamlets of Nadr and Akramin and Mahawil and Mohand Mohandein and Hail Askeri shows that they are right. Were they American or Brit Britiiihh aircraft that showered ththeee village villages with one of the moo lethal weapons of modern warfare? The 61 dead who have ppased through the Hillah hospital since Saturday night cannot tell j.. Nor can the survivor survivors who, in many ccae, were sitting in their home homes when the white cani caniooer oersers opened high above their village, spilling thou thousands of bomblets into the sky, exploding in the air, soaring oaring through windows and doorways to bur buroo indoors or bouncing ofofff the roofs of the concrete hut huts to blow up later in the roadways. Rahed Hakem remember rememberss that it was 10:30am on Sunday when she wawas sitting in her home in Nadr, that sheshe heard “the voice of explo explosions” and looked out aahhherer the door to see “the ssky raining ffre”. Mohamed Mojsaa dedemmmribed ribed the clcljjters of “little box boxe” that fell out of the sky. IIf you should go skating on the thin ice of modern life, dragging behind you the silent reproa reproacc of a million tear stained eye,, don’t be surpri surprised, when a crack in the ice appear appears under your feet. You slip out of your depth and out of your mind, with your fear ggoing oing out behind you, a you clow the thin ice.
Gobierno y comunidad comunidade comenzarán a negociar en enero la ffnanciación nanciación autonómica. José Lu Lui Rodríguez Zapatero ha anunciado hoy los trtree ejes que guiarán la política autonómica del Ejecutivo aprove aprovecccando ando el inicio del debate sobre el etado de lla autonomía autonomí en el Senado. El prpreidente ha anunciado que la reforma de la ffnanciación nanciación autonómica se iniciará en enero con el propó propóssito de que cada administración – central, autonómica y local – recaude y gestione sj propios impu impuetos. En segundo lugar, el Gobierno creará una ponencia con participación de las Comunidade Comunidad omunidade Autónoma Autónom para reformar el Senado y convertirlo en una auténtica cámara de repr repreentación teterrritorial itorial y, por úddimo, imo, en el seno de la Conferencia de PrPreidentes idente se creará un órgano permanente para el diálogo entre el EEoooado ado y las autonomí autonomía. Zapatero ha anunciado que el próximo mme de enero y en el seno del Consejo de Política FFical y Financiera – donde participan los mini miniooorosros de Economía y de Admin Adminitracione tracion Pública Pública y todos los repre repressentante entant autonómicos autonómico – se deberá comenzar a concretar “los principios” de la reforma de la fnanciación fnanciación autonómica. EEoooaa reforma, según Zapatero, se baará ará en la susuffciencia fciencia ffnanciera nanciera de las comunidad comunidadee y del Estado, de forma que ééoa oa aumenten sjj facuddades pero que la Admini Adminioooración ración central mantenga como propios aquello aquelloss impue impu tos que con constituyan el “tronco común” del sitema tema fm fmalal y garanticen la unidad de la economía y de lla rerepon epons ponsabilidade abilidade y deber deberee con los ciudadanos. En eeooeoe sentido, entido, el prpreidente ha aaegurado egurado que los eeooatuto oatutos atutos de autonomía “pueden intervenir en ete ámbito”, pero la “cononf onfguración fguración del sisioooema ema se realiza en una ley etatal” tatal” y trtra haber realizado una “concertación” con lalas C CAA en el Con Consejsejo de Política FiFimmmalal y Financiera. No Cons obooante, obo ante, y con el ffnn de incrementar llaa capacidade capacidad de actuación de las CCCC AA, el Ejecutivo “avanzará fórmula fórmulas deo deoinad oinada inada a coregir rregir egir lalass diddifuncion ifuncione funcione que padecen..
É interessante observar que, dependendo do idioma em que o texto é composto, sua textura muda. Em português – como foi dito – , vemos uma mancha mais contida, com a altura-x bastante aparente e alguns traços se prolongando pelas entrelinhas, como fios de cabelo que se projetam pelo espaço branco da página. Na língua espanhola, podemos ver uma quantidade ligeiramente maior de fios, devido à presença da letra y no texto. No inglês, por sua vez, vemos uma quantidade visivelmente maior desses traços, gerando uma mancha mais densa e “barulhenta”. Isso acontece devido à presença constante das letras y e k e de uma maior frequência da letra f e da combinação th.
Nas páginas seguintes, podemos ver como ficaram, ao final do projeto, os principais caracteres desenhados para a família tipográfica Maryam.
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Aa Bb CCCCCcc Dd Ee F f Gg Hh Ii Jj Kk Ll Mm Nn Oo PPpp Qq Rr SsSsss T t Uu Vv Ww Xx Yy Zz 1234567890
Àà Áá Ââ Ãã Éé Êê Íí Óó Ôô Õõ Úú Üü Çç Ññ b aeijcnl d o m f g h r */ !?.:,;“” ’&() -–—
Algumas conclusões
Neste trabalho tivemos a oportunidade de aprender um pouco sobre duas naturezas que, embora muitas vezes se alimentem uma da outra, são distintas. São elas: as naturezas da caligrafia e da tipografia. A primeira, por ser uma relação direta do homem com um suporte físico, utilizando uma ferramenta de escrita, tem uma linguagem própria, onde duas letras nunca de repetem exatamente da mesma forma e a precupação estéticoprojetual acaba sendo focada na página de texto e sua mancha gráfica, como um objeto que vai tomando vida própria no próprio processo da caligrafia. Algumas alternâncias, prolongamentos de letras e ligaturas são feitas empiricamente no momento da escrita em si, na passagem de tempo em que se dá o gesto do desenho das palavras, de acordo com a intuição e com o domínio das formas já estudadas anteriormente pelo calígrafo. A tipografia, por sua vez, tem uma natureza distinta, pois funciona através de letras que se repetem através da reprodução seriada dos caracteres, seja por tecnologias antigas como a composição em linotipo ou em fotocomposição, seja pelas novas tecnologias e os tipos digitais que podem ser impressos através de impressoras caseiras ou em impressoras offset. A família tipográfica é projetada em uma etapa muito anterior à impressão em si da tinta no papel, o que permite ajustes minuciosos em cada letra, espaçamento e combinações de letras possíveis. A junção dessas duas linguagens distintas, é sem dúvida, algo paradoxal. Mas foi justamente das contradições entre esses dois meios que nos apropriamos para desenvolver esse projeto.
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Segundo o designer Fábio Lopez, que trabalha com projetos tipográficos, especialmente para o meio digital,
[…] as tipografias de origem caligráfica são as fontes geralmente nascidas a bico de pena ou desenho livre cujos desenhos são apropriadamente transformados em caracteres tipográficos. Devido a características positivas de balanço e ritmo, projetos dessa natureza muitas vezes funcionam como excelentes fontes para composição de textos longos, com grande resistência a reduções e alto grau de legibilidade. Pra chegar nesse ponto entretanto, passam durante a fase de vetorização por um longo processo de ajustes e regularizações, incluindo uma reavaliação quase total do desenho de sua estrutura. De caligráfico nesse caso resta apenas o espírito da tipografia, composto basicamente por características visuais indiretas: contraste interno da fonte, eixo de inclinação das hastes, terminações, serifas, ligaturas, proporções tradicionais e outros detalhes de acabamento (LOPEZ, F. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <ricardogomes@hotmail.com> em 31 out. 2005).
E sobre a fonte Maryam, em sua versão anterior à existência de ligaturas, continua, Acho que seu projeto está num nível intermediário um pouco perigoso, onde os caracteres são desenhados demais para compor um texto regular, e mecânicos demais para funcionar como uma boa emulação caligráfica (LOPEZ, F. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <ricardogomes@hotmail.com> em 31 out. 2005).
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Como amante do perigo e de emoções fortes, hoje nos perguntamos: De que maneira podemos tranferir a expressão caligráfica e suas inúmeras variações e sutilezas para um meio frio, mecânico e previamente calculado como a tipografia? Quais possibilidades a tecnologia dos computadores pessoais e os softwares de editoração digital poderiam nos oferecer para uma melhor exploração das variações possíveis na caligrafia, dentro de um projeto tipográfico? Os computadores, hoje, especialmente graças ao formato opentype, parecem conter em si o potencial para tais variações, como algumas relatadas no final do capítulo anterior. Pares de letras já podem ser substituídos automaticamente por ligaturas previamente desenhadas. A fonte caligráfica Zapfino, de Hermann Zapf, já conta com esse recurso, onde existem quatro versões de desenho diferentes para cada letra, que estão programadas para serem sorteadas randomicamente por softwares de editoração digital. Assim, cada caractere pode ter inúmeros desenhos distintos com pequenas variações (típicas da caligrafia) que poderiam ser combinados de maneira completamente inesperada. Ainda vemos como recursos potenciais, que poderiam ser aprimorados pela tecnologia: Finais de linha que poderiam ter seus últimos caracteres alongados pela margem da página, ligaturas que poderiam ser feitas de um caractere da linha superior para um caractere da linha inferior… Enfim, são inúmeras as possibilidades que o meio digital poderia oferecer para o refinamento da expressão caligráfica dentro da tipografia. Isso, sem dúvida, jamais substituiria o talento manual de domínio das formas manuscritas dos calígrafos – como a princípio é possível, ingenuamente, imaginar – , mas acrescentaria novas possibilidades tecnológicas para a exploração da comunicação visual, através do desenho tipográfico e de sua composição na página impressa.
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O designer e tipógrafo Rodolfo Capeto, também sobre a versão da Maryam ainda sem muitas variações de letras e ligaturas, comenta:
[…] Certamente seu tipo tem características de um tipo “escritural”, mas bastante pessoal – sendo que esse tipos não foram desenhados para “massas de texto”. […] A Maryam, na minha opinião, não é um tipo apropriado para textos contínuos em geral, mas pode ser apropriado para certos gêneros de texto mais curto. […] Acho que está bem desenhado. Esse tipo de desenho é difícil, porque as extensões tem que dar impressão de movimento e variedade e se combinar com elegância. O que torna esse tipo de letra fraco diante de um original caligráfico são os elementos sempre iguais. A jogada da Zapfino é que há variantes para cada letra (CAPETO, R. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <ricardogomes@hotmail.com> em 10 nov. 2005).
Fazer um projeto de uma família tipográfica foi interessante, pois pudemos trabalhar com diversos elementos da comunicação visual, como: a forma, o contraste, a composição. Também percebemos a relação entre os elementos gráficos na construção de uma mensagem escrita – de que maneira a forma das letras se relaciona na construção de sentidos, tanto objetivos, quanto subjetivos. Olhando para a fonte Maryam, vemos um longo caminho percorrido. Ao mesmo tempo, vemos um texto que parece estar no limite entre a tecnologia tipográfica e a expressão manual da caligrafia e sua relação emocionada com a escrita. Descobrimos também uma nova forma de meditação, através da caligrafia, na qual é preciso ter atenção constante e mente centrada para realizar a execução da escrita. Resgatamos nossa relação direta e material com a tinta e
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o papel e observamos como essa interação produz formas que, até hoje, mesmo com as tecnologias digitais, refletem-se no desenho das letras. Sobre o projeto tipográfico, percebemos que um bom desenho jamais termina, pois sempre haverá detalhes a corrigir ou aperfeiçoar, espaçamentos a ajustar e novas possibilidades de formas a desenhar. Um bom tipo é aquele que está inacabado, aberto a melhorias futuras e entregue ao infinito exercício do olhar.
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[â&#x20AC;Ś] And we should never forget that the human eye is still the best critic and judge. Our eyes are not different at all from the eyes of five hundred years ago, of Gutenbergsâ&#x20AC;&#x2122;s time (ZAPF, p 33, 1985).
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Referências bibliográficas
LIVROS, REVISTAS E DISSERTAÇÕES
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Glossário
Altura-x – Distância entre a linha de base e a linha mediana de um alfabeto, que normalmente corresponde à altura aproximada das letras minúsculas sem extensores.
Ascendente – Parte da letra que se prolonga acima da altura-x, em forma de haste ou de loop.
Ataque – Termo utilizado por calígrafos para determinar a marca de entrada da pena. Movimento onde acontece o primeiro contato da pena com o papel no desenho de uma letra.
Bojo – Formas geralmente redondas ou elípticas que definem o formato básico de letras como C, G, O na caixa-alta e b, c, e, o, p e d na caixa-baixa. Também chamado de olho ou barriga.
Contraste – Na análise das formas tipográficas, esse termo normalmente se refere ao grau de diferença entre os traços grossos e finos de uma determinada letra. Em fontes românticas como a Didot e a Bodoni o contraste é alto. Já em fontes nãomoduladas, tais como a Gill Sans e a Futura, ele é baixo ou inexistente.
Descendente – Parte da letra que se prolonga abaixo da linha de base, em forma de haste ou de cauda.
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Fuga – Termo utilizado por calígrafos para determinar o movimento de retirada da pena do papel, onde a letra termina. Traço terminal da letra manuscrita.
Grid – Grade de construção modulada que auxilia no desenho das letras, para que estas mantenham proporções regulares entre si.
Haste – Traço principal mais ou menos retilíneo, que não faz parte do bojo.
Kern ou kerning – Parte de uma letra que invade o espaço de outra. O verbo inglês to kern significa alterar o espacejamento de certas combinações de letras.
Ligatura – Duas ou mais letras costuradas em um único caractere.
Linha de base – Seja escrito à mão ou composto tipograficamente, o alfabeto latino minúsculo traz implícito um contingente composto por pelo menos quatro linhas: linha de topo, linha média, linha de base e linha de fundo. A linha de topo é aquela alcançada pelas ascendentes de letras como b, d, h, k. A linha mediana marca o topo de letras como a, c, e, m, e o topo do torso de letras como b, d, h. A linha de base é aquela sobre a qual todas as letras repousam. A linha de fundo é aquela alcançada pelas descendentes de letras como p e q. A linha de versal, que marca o topo de letras maiúsculas tais como H, não coincide necessariamente com a linha de topo das minúsculas.
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Loop – Giro que uma letra faz sobre si mesma, em forma de laço, retornando ao ponto inicial.
Olho – Sinônimo de bojo na caixa-baixa. Um olho grande significa uma grande altura-x. Um olho aberto significa uma grande abertura.
Serifa – Traço adicionado ao início ou ao fim dos traços principais de uma letra.
Versal – letra maiúscula ou caixa-alta.
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Apêndice
Seguem aqui, nas próximas páginas, algumas imagens de testes desenvolvivos durante o processo de criação da fonte Maryam. Não há ordem cronológica para as imagens. São apenas um pequeno registro de exercícios feitos a partir da caligrafia e de impressões feitas para averiguar possíveis problemas a serem corrigidos no tipo.
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Maryam
é um projeto tipográfico desenvolvido por Ricardo Esteves Gomes (ricardogomes@hotmail.com), na disciplina de Projeto de Graduação 2 do curso de Desenho Industrial da Universidade Federal do Espírito Santo. O texto deste trabalho foi composto na fonte Sabon (projetada originalmente por Jan Tschichold), em suas versões roman, italic, bold e bold italic. Primavera de 2005