xik達o xik達o
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Todo retrato que um artista faz, diz a
No caso de Xikão, primeiro vem a auto-fotografia (com algo de um
gem, sua alma e sua essência; ele também procura aí a melhor amostra
um autor-personagem, um pintor quase-performer, que anuncia uma sé-
Sala de espelhos /
crítica, é um autorretrato. Através dele, o autor busca a sua melhor imade sua arte, seu ofício e seu fazer, no ato da própria prática daquela vida,
se rebatendo ali, em pleno fluxo enfim. Disposto a explorar esse reflexo
desde o início do seu trabalho, Xikão Xikão vem produzindo um jogo efetivo entre imagens de seu rosto, de seu corpo e de seu ser, através de peles gráfico-pictóricas e véus fotográficos, em uma obra de propriedades poéticas muito peculiares, em novos ciclos cada vez mais interessantes.
Essa sala de espelhos é cheia de possibilidades de humor ou horror, e
traz a chance de um trânsito livre entre interiorização e exteriorização, através de um trabalho – desenho, pintura, fotografia ou impressão –
tão antigo quanto novo, sempre muito intenso para quem o faz. Por isso mesmo é que essa força chega ao espectador com uma carga extra de
drama (tragédia, comédia, farsa), conforme se verifica nas imagens do
Shakespeare reduzido), pontuada por alguns adereços indiciais, criando rie de dualidades que se aprofundam adiante. Depois, ele faz as primeiras
pinturas, aguadas de pinceladas densas e cores sujas (ao contrário das
fotos, de superfícies bastante limpas), quando a beleza da duplicidade
já se estabelece, segue e não cessa mais. O artista nos conta em uma conversa sobre seu processo: “As vezes sou conduzido pelos materiais e
processos, mas geralmente há uma ideia prévia, um dialogo do ‘eu’ com o mundo; algumas, poucas, junto com o outro, com os outros (...) que co-
nectam masculino/feminino, criança/adulto, eu/outro, um artista/outro artista, etc; minhas dualidades (acredito) vem da minha forma de ver o
mundo (...) que enxergo de maneira agridoce; gosto muito da ideia de Yin/
Yang, pois sempre vejo dois lados, situações direita/esquerda, doce/salgado, azul/rosa, etc.”
artista. Como ele mesmo nos informa – ao escolher “Persona” como o
Aos meus olhos, “Vulnerável”, de 2011, é uma peça-chave para a compre-
uma máscara, aquilo que define e potencializa o personagem, um papel
nuas do criador/criatura representado na vertical, a aparência de sua
título da exposição – o termo vem do latim per sonare ou soar através de teatral, uma identidade ou um caráter assumido, através de versões de si mesmo.
ensão do lance que o artista cria no conjunto dessa mostra: nas costas própria pele já é a superfície da pintura, tal qual estamos sendo conduzidos a perceber, seja pelas variações das manchas coloridas, pelas pin-
celadas que vem de um lado e de outro ou ainda pelos volumes da carne
para que todo trabalho transmutado em fazer ativo salte de um plano
melhinhas no alto da figura ou no cinzas de sua cintura alargada, que se
faz sua arte. Isso tudo, também e ainda, faz o artista, o pintor-desenhista-
em suas reentrâncias, volumes e peso; ou também pelas erupções verlimita meio fora de lugar no corte do plano real. As fotografias, por outro
lado, permitem fusões quase espirituais entre figuras bastante diversas,
simplesmente visual para outro, emotivo e/ou mental, no qual a imagem fotógrafo-performer, como ele mesmo deseja, cria e atua.
que Xikão traz de volta para o desenho e habilmente leva para a estru-
Ainda podemos dialogar aqui com as têmperas de Pompéia, os autorre-
ecoam e se desdobram pela série “Dualidades” – em que a fatura ganha
delo de Picasso, as figuras icônicas de Andy Warhol e até mesmo com
turação do que vem a seguir. Pois, esse mesmo tema e seu tratamento
mais preciosismo – e crescem nos “Antiretratos” – em que o personagem está de frente, quase saindo da tela, pronto para nos socar – de tratamento mais cru.
Nesse patamar, as experiências de Xikão Xikão se estendem a outros
rumos, como nos registros/resquícios da performance “Gordura In/Saturada” (que parte voluntariamente da produção das “Antropometrias” de
Yves Klein) justapostos a palavras cifradas, na continuação desse trato com o próprio corpo-matéria, relacionadas ao seu embate direto com o mundo social (ao se sentir ora grande, ora pequeno no controle do peso
físico, nos microenfrentamentos pela aceitação, relacionados aos padrões de beleza vigentes, etc.). Tudo envolve uma corajosa movimentação que preenche as obras de uma força visível e inequívoca, essencial
tratos de Albrecht Dürer e Van Gogh, as várias versões de pintor & moo cinema de Stanley Kubrick (“A Laranja Mecânica” e “Barry Lyndon”) ou
Derek Jarman (“Caravaggio” e “Eduardo II”), lembrando ainda “O Retrato
de Dorian Gray”, de Oscar Wilde. Como Francisco Costa – o Xikão Xikão – e todos eles, cada qual inventor de seu próprio quebra-cabeça, imagino
a arte como um moto-perpétuo, um mecanismo contínuo e sistematicamente livre, capaz de funcionar eternamente, transformando em trabalho toda a energia recebida/produzida, fazendo algo que é aí – a coisa em reflexo com sua vida – fluir e continuar indefinidamente.
Mário Azevedo / Maio de 2015
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legendas 1
Dualidade 1, Acrílica sobre tela, 103 x 91 cm, 2012. Detalhe.
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Persona, Acrílica sobre tela, 104 x 63 cm, 2012.
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Persona, Fotografia digital, 20 x 30 cm, 2012. Persona, Fotografia digital, 20 x 30 cm, 2012.
Persona, Acrílica sobre tela, 60 x 40 cm, 2012. Persona, Fotografia digital, 20 x 30 cm, 2012.
Persona, Acrílica sobre papel, 50 x 35 cm, 2012.
Antirretrato 1, Acrílica sobre tela, 158 x 109 cm, 2013. Antirretrato 2 , Acrílica sobre tela, 138 x 93 cm, 2015 Dualidade 1, Acrílica sobre tela, 103 x 91 cm, 2012.
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Dualidade 2, Acrílica sobre papel, 96 x 65 cm, 2012.
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Dualidade 6, Pastel sobre papel, 30 x 21 cm, 2014.
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Dualidade 5, Pastel sobre papel, 30 x 21 cm, 2014. Dualidade 4, Acrílica sobre tela, 40 x 30 cm, 2012. 3 em 1, Grafite sobre papel, 96 x 48 cm , 2015. 3 em 1, Acrílica sobre tela, 75 x 90 cm, 2015 3 em 1, Fotografia digital, 42 x 27 cm , 2015.
Vulnerável, Acrílica sobre tela, 85 x 77 cm, 2011.
Dualidade 3, Óleo sobre tela , 60 x 40 cm, 2012.
Série Sobre Peso , Técnica Mista , 66 x 48 cm, 2015.1
Dualidade 1, Acrílica sobre tela, 103 x 91 cm, 2012. Detalhe.
Abertura : 02 de Junho de 2015 , 19h
Visitação : 03 a 30 de Junho de 2015. Centro Cultural de Contagem
Rua Dr. Cassiano, 130, Centro – Contagem/MG
(31) 3352 – 5347 / projetotudoaver@gmail.com
Realização : Fundação Cultural de Contagem (FUNDAC) Texto: Mário Azevedo
Catálogo : Samuel Wenceslau Expografia : Gilson Rodrigues
Comunicação : Diogo Tognolo
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