Ficha Catalográfica elaborada pela Bibliotecária da Biblioteca Pública Municipal Dom Daniel Hostin Rogéria Fernandes Albrecht – CRB 14/39 Gallasini, Robson, 1980 - 2012 História Ilustrada de Gaspar/Robson Gallassini. Blumenau: 3 de maio, 2013. 66p. 1. Secretaria Municipal de Educação – Gaspar (SC). 2. Gaspar (SC) – História. CD.981.642
Apoio e Organização
Prefeitura de Gaspar Secretaria Municipal de Educação
Autor
Robson Gallassini
Revisora
Claudia Kautzmann
Projeto Gráfico e Diagramação
Paulo Morelli | www.p1design.com.br
Ilustrações
Aldo dos Anjos Cassiano Pereira Viana Cezar Pereira Viana
Gaspar 2013
Para Robson Gallassini (in memoriam), que não teve a oportunidade de ver esta obra publicada. Tenho o Robson como um inesquecível parceiro e amigo, e lamento profundamente a sua ausência. Tenho uma eterna gratidão pelo incentivo e alegria contagiante passada por ele a todos ao seu redor. Essa era a marca registrada na sua convivência. Suas incansáveis pesquisas sempre visaram manter vivos na memória, dos cidadãos de Gaspar, os principais eventos históricos, que se tem notícia, para formar uma sociedade que conheça e respeite o seu passado. Fica em nossos corações um reconhecimento pela relevância da sua obra como historiador, e a saudade daquele ítalo-alemão brincalhão que gostava de esticar a conversa e dar boas risadas.
Aldo Maes dos Anjos
A pres e ntaç ão Com o objetivo de incentivar o gosto pela leitura e valorizar a história de Gaspar, com satisfação apoiamos e organizamos este livro ilustrado. A obra visa colocar em evidência temas do cotidiano da cidade, acompanhados com boxes informativos e ilustrados com fotografias, desenhos e demais recursos visuais. Que os leitores reflitam sobre a caminhada da nossa comunidade, da colonização até os dias atuais, para o planejamento dos percursos futuros. Deixamos aqui uma homenagem especial ao professor Robson Gallassini (in memoriam), por sua dedicação para a conclusão desta obra.
Neivaldo da Silva Secretário Municipal de Educação
Í nd ic e Capítulo I
A Bacia Hidrográfica do Itajaí 13 Capítulo I I
Xokleng: habitantes da região do Vale do Itajaí e Planalto Catarinense 17 Capítulo I I I
Da Europa ao Brasil: em busca de um novo lar 21 Capítulo IV
Gaspar e os primeiros colonizadores 25 Capítulo V
O rio era o caminho... dos imigrantes, do comércio e das cheias 29 Capítulo VI
Colonos versus Nativos: a disputa pelas terras 35 Capítulo VI I
As árvores que os imigrantes encontraram 39 Cap ítulo VI I I
Pe. Gattone e a Freguesia de São Pedro Apóstolo 43 Capítulo IX
A Imigração Italiana: a chegada ao Vale do Itajaí 47 Capítulo X
Os engenhos do Vale: farinha, açúcar e madeira 51 Capítulo X I
Uma história política 55 Capítulo X I I
Gaspar e a Estrada de Ferro Santa Catarina (EFSC) 59 Capítulo X I I I
Um breve histórico da economia do município 63 Capítulo X IV
Linha do tempo da História de Gaspar 69
Ca p í tul o I
A Bacia Hidrográfica do Itajaí
A cidade de Gaspar está localizada na região do Médio Vale do Itajaí. Limita-se ao norte com as cidades de Massaranduba, Luis Alves e Ilhota. Ao sul, com Brusque e Guabiruba. Ao leste, com Ilhota e Itajaí e, à oeste, com Blumenau.
Mapa da cidade de Gaspar. Arte de Aldo Maes dos Anjos
A história de Gaspar está ligada à história do rio desde seus primeiros dias, pois o rio Itajaí-Açu corta o município na sua área central. Por esse motivo, nosso ponto de partida será entender o que é uma Bacia Hidrográfica e qual a nossa relação com ela. 13
Você sabe o que é uma Bacia Hidrográfica? Uma BACIA HIDROGRáFICA é formada por uma determinada área para ArtedeAldoMaesdosAnjos onde corre toda a água da chuva caída naquele espaço. Existe um rio maior que recebe as águas de centenas de ribeirões menores e que por isso dá nome à bacia. No nosso caso, esse rio é o Itajaí-Açu. “A bacia hidrográfica do rio Itajaí é a mais extensa da vertente atlântica no Estado de Santa Catarina, sendo o rio Itajaí-Açu o mais importante desta bacia. Ela compreende uma área de 15.000 km2, distribuídos em 46 municípios e contando cerca de 800 mil habitantes”. *
Arte de Aldo Maes dos Anjos
Esta é a BACIA HIDROGRáFICA DO ItAjAí. O principal rio dessa bacia hidrográfica é o rio ItAjAí-AçU, formado pela junção dos rios Itajaí do Sul e Itajaí do Oeste, que acontece na cidade de Rio do Sul. Depois, ele recebe as águas do rio Itajaí do Norte em Ibirama. Na cidade de Indaial, Arte de Aldo Maes dos Anjos o Itajaí-Açu recebe as águas do rio Benedito e, quando chega próximo do mar, recebe as águas do rio Luis Alves e, depois, do rio Itajaí Mirim. Essa importante bacia hidrográfica, formada por centenas de pequenos afluentes que não aparecem nesse mapa, lança suas águas no Oceano Atlântico, dividindo as cidades de Itajaí e Navegantes. SISGA. Bacia hidrográfica do Vale do Itajaí. Disponível em: <http://campeche.inf.furb.br/sisga/educacao/ensino/baciaValeItajai.php>. Acesso em: 10 mar. 2012.
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Descubra aqui o significado da palavra Itajaí.
A palavra Itajaí se origina da junção de três ideias: ita, já e y que, respectivamente, significam “pedras”, “muitas” e “rio”. Assim, Itajaí significa “rio de muitas pedras” ou “rio pedregoso”. DELL´ANTONIO, Lino João. Etimologia do termo Itajaí. Blumenau em Cadernos, Blumenau, tomo XLV, n. 07/08, jul./ago. 2004.
As Barragens do Itajaí Ao longo da história, já ocorreram dezenas de enchentes no Vale do Itajaí. Por causa das frequentes cheias e suas consequências para as cidades localizadas na região, entre elas Gaspar, foram construídas três barragens nos afluentes do rio Itajaí-Açu para controlar o volume das águas nos tempos chuvosos na tentativa de diminuir os efeitos das enchentes ou mesmo evitá-las. As três barragens são: Barragem de Taió, que iniciou sua operação em 1973 controlando a vazão do rio Itajaí do Oeste. Seu reservatório possui a capacidade para 83 milhões de m3.
Barragem de Ituporanga, que iniciou sua operação em 1976 controlando a vazão do rio Itajaí do Sul. Seu reservatório possui a capacidade para 93,5 milhões m3.
Barragem de José Boiteux, que iniciou sua operação em 1992 controlando a vazão do rio Hercílio ou Itajaí do Norte. Seu reservatório possui a capacidade para 357 milhões m3. *
DEINFRA. Sobre as barragens de contenção de cheias de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.deinfra.sc.gov.br/barragens/sobre-as-barragens/>. Acesso em: 11 jan. 2012.
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O rio e o porto O Porto de Itajaí é um porto fluvial, ou seja, está localizado no curso de um rio. Já é utilizado desde o século 19 e foi através dele que os primeiros colonizadores chegaram à região do Vale do Itajaí. As embarcações que transportavam os imigrantes ancoravam na Vila de Itajaí e, a partir de então, a viagem até as terras da atual cidade de Gaspar e vizinhanças eram feitas em embarcações menores. O rio serviu como uma via de acesso (um caminho fluvial) para aqueles primeiros colonizadores, pois naquela época não havia estradas como conhecemos hoje em nossa região. A navegação era tão importante que o Dr. Hermann Bruno Otto Blumenau fundou a Colônia Blumenau, em 1850, no último ponto navegável do rio.
Vista do Porto de Itajaí em algum momento entre 1900 e 1920. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
Vista panorâmica do Porto de Itajaí. Fundação Genésio Mirinda Lins
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Ca p í tul o I I
Xokleng: habitantes da região do Vale do Itajaí e Planalto Catarinense Muito antes de serem construídas as cidades que conhecemos hoje, mesmo antes da chegada dos primeiros moradores brancos ao Vale do Itajaí e da construção das primeiras casas de tijolos, essas terras já eram povoadas pelos Xokleng, povo nômade de caçadores e coletores que nos meses de primavera e verão desciam a Serra e ocupavam as áreas de Mata Atlântica em busca de alimentos.
Conhecendo os Xokleng O povo Xokleng vivia da caça, pesca e da coleta de frutos e raízes. Como eram nômades, mudavam o local de moradia com frequência em busca de frutos e animais para se alimentarem. Por dependerem da caça e da coleta para sobreviverem, não podiam permanecer por muito tempo em um mesmo lugar, pois com o passar dos dias os animais disponíveis para a caça diminuíam, assim como os frutos. Possuíam poucos utensílios, somente o essencial para a sobrevivência. Imagine ter que mudar de lugar constantemente e ter que levar consigo uma enorme variedade de objetos. Difícil, não? Pois é, os Xokleng eram bem adaptados ao ambiente em que viviam.
Arte de Aldo Maes dos Anjos
Área aproximada da ocupação dos Xokleng em Santa Catarina.
Praticando a caça A caça era responsável por boa parte da alimentação dos Xokleng e era realizada pelos homens embora, quando necessário, as mulheres também a praticavam. Tinham a sua disposição diferentes tipos de animais como, por exemplo: antas, porcos do mato, cutias, coatis, mãos-peladas, iraras, lontras, furões, e também integrantes da família dos felinos como gato-do-mato, puma, jaguatiri17
O povo XOkLENG habitava um território enorme onde praticava suas atividades de caça/coleta e pesca. Como povo nômade, necessitavam de uma ampla área para poderem obter seus alimentos uma vez que, ficar restrito a um pequeno território, significaria a exaustão desses recursos. Daí a importância da migração sazonal (feita devido às estações do ano), e de um grande território para a sua sobrevivência.
ca e onça. Podiam caçar bugios, tatus, tamanduás, gambás, capivaras, jacarés, lagartos, etc, sem falar da pesca, pela qual capturavam traíras, cascudos, carás e jundiás. Entre as aves que poderiam ser abatidas estavam: tucanos, inhambus, macucos, marrecas, rolas, aracuãs, jacupemas, jacutingas, urus, frangos-d’água além de muitas outras.
Coletando frutos Ser um povo coletor exige que o grupo esteja em constante movimento na busca por frutos e raízes disponíveis. Na floresta de mata atlântica, os Xokleng realizavam a coleta de frutos como amoreira-do-mato, araçá-amarelo, bacupari, butiá-da-praia, figueira-do-mato, grumixama, ingás, palmito (euterpe edulis), guabiroba, jabuticaArte de Aldo Maes dos Anjos ba, pitanga entre outros. Nas áreas de floresta de pinhais, no planalto catarinense, o pinhão era o principal alimento. O pinhão poderia ser consumido com casca assado na brasa ou mesmo tostado ao fogo e triturado depois em pilões, reduzidos, assim, a uma massa com a qual preparavam um caldo cozido com água. Com a massa produzida da moagem dos pinhões, preparavam pequenos bolos, de forma redonda e chata, do tamanho de um pires, que eram assados sobre brasas. Além de realizarem a coleta do pinhão, que era abundante na região, ainda abatiam os animais que buscavam por essa fonte de alimento. Além dos frutos provenientes da coleta, tinham a sua disposição ovos, larvas e diversos tipos de insetos, como também o mel, que podia ser encontrado nas duas regiões praticamente o ano inteiro.
Grumixama Foto Reprodução Internet
Bacupari Foto Reprodução Internet
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Foto Elton de Souza
Nômade Termo utilizado para se referir a um povo que não possui moradia fixa, ou seja, que está em movimento constante dentro de um território. Os grupos nômades praticam a caça e a coleta, necessitando mudar de região de tempos em tempos. Nomadismo estacional que, segundo o pesquisador Rodrigo Lavina, estava baseado no deslocamento constante dentro do seu território e sendo determinado pelas estações do ano. Durante os meses de inverno, frequentavam as matas do planalto à procura dos frutos que estavam disponíveis naquela área e, nos meses de primavera e verão, desciam para a região litorânea e dos vales em busca dos alimentos aí disponíveis nessas estações. Traçado Xokleng
Foto de um Xokleng tirada em um estúdio em Florianópolis. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
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Os indígenas da foto foram levados por Eduardo de Lima e Silva Hoerhan (ao centro) para serem apresentados ao governador Hercílio Luz (década de 20). Foto feita em um estúdio. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
Bibliografia Consultada LAVINA, Rodrigo. Os Xokleng de Santa Catarina: uma etnohistória e sugestões para os arqueólogos. 1994. 176f. Dissertação (Mestrado) – Mestrado em História, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, 1994. SANTOS, Silvio Coelho dos. Os índios Xokleng: memória visual. Florianópolis: Ed. da UFSC, Ed. da Univali, 1997. SANTOS, Silvio Coelho. Índios e brancos no sul do Brasil: a dramática experiência dos Xokleng. Porto Alegre: Movimento, 1987.
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Ca p í tul o I I I
Da Europa ao Brasil: em busca de um novo lar
O Brasil e a imigração europeia A partir de 1850, o governo Imperial do Brasil, governado por D. Pedro II, intensificou o processo de colonização das terras do sul do país (SC e RS) com imigrantes europeus. Discutia-se, naquela época, sobre a substituição do trabalho escravo pelo trabalhador branco trazido da Europa. O governo do Império adotou uma política imigratória com o objetivo de substituir lentamente o trabalho escravo nas lavouras de café ao mesmo tempo em que procurou povoar áreas no sul do país com colonos europeus. Outro objetivo do governo do Brasil era criar e desenvolver o modelo agrícola da pequena propriedade policultora, mantida pelo trabalho familiar sem o uso de escravos. A cada família de imigrantes era vendido um lote de terras financiado pelo governo, cujo tamanho era entre 10 e 30 hectares. Assim, a família Este é D. Pedro II, imperador do Brasil. Go- (pai, mãe e filhos) produziria os alimentos para o seu consumo vernou o país até o novembro de 1889, como também comercializaria parte da produção, desenvolquando foi deposto. vendo a região. A pequena propriedade familiar, além de proporcionar o progresso da região, seria um impulso para acabar com a escravidão no país uma vez que não seria permitida posse de escravos nessas colônias.
Aguardando a hora do embarque:
“[…] As condições de viagem no século 19, em especial antes do surgimento do navio a vapor e do trem, eram longas e difíceis. A emigração ao Brasil durava muitos meses e, mesmo com a chegada do navio a vapor, levava mais de um mês até o sul do Brasil. Emigrar, em regra, representava uma despedida para sempre...” (Lothar Wieser, Alemanha) 21
Arquivo Município
Dia a Dia - Brusque
Enquanto isso, em muitos países da Europa, a falta de terras e a fome faziam suas vítimas. Milhares de europeus vieram ao Brasil em busca de terra, trabalho e melhores condições de vida. No sul do país, foram fundadas colônias para a instalação desses imigrantes, como por exemplo, a Colônia Blumenau, fundada em 1850, e a Colônia Itajahy, atual Brusque, fundada em 1860. Os primeiros imigrantes a serem instalados nas colônias em Santa Catarina a partir de 1850 foram imigran- ArtedeAldoMaesdosAnjos tes alemães, que buscavam escapar das precárias condições de vida existentes no país de origem. Imaginem que para enfrentar o frio durante o inverno, muitas famílias alemãs eram obrigadas a roubar lenha para poderem se aquecer. Só isso já basta para entendermos a situação em que viviam. O Brasil representava esperança: terra, trabalho e vida nova. Ao longo dos anos vieram imigrantes alemães, italianos, poloneses, suíços e pessoas de vários outros países da Europa.
Você sabia?
1 hectare corresponde a
uma área de 100 x 100 metros, um pouco maior do que um campo de futebol.
A família de Heinrich Pöpper, que se instalou em Brusque, foi influenciada pela propaganda a emigrar para o Brasil em 1869. “[…] Ainda me lembro que meu pai falava muitas vezes naqueles que emigraram, de modo que em breve pudemos notar que secretamente também ele se ocupava com projetos de tentar a sorte no Brasil. A vida na pátria já não mais lhe oferecia satisfação […]. Meu pai estava cheio de entusiasmo quando chegou em casa naquela noite. Tinha passado no escritório de emigração para se informar com o agente. Este lhe falou, falou e pintou a vida no Brasil com as mais belas cores. Meu pai contou tudo isso a minha mãe à noite, e eles chegaram à conclusão de que queriam se aventurar a fazer a grande viagem”. Texto adaptado. (Revista Notícias de Vicente Só, Nº 44). 22
Rota de emigração seguida por muitas das famílias europeias que se estabeleceram no Vale do Itajaí. Arte de Cassiano P. Viana
A vida na Europa A maior parte dos imigrantes que vieram ao Brasil eram agricultores em sua terra natal. Dedicavam-se ao trabalho na lavoura, plantando e colhendo conforme as estações do ano. Muitos não possuíam terras e trabalhavam como arrendatários* ou nas terras de um senhor. A maior parte da produção era voltada para o consumo da família e o excedente era comercializado. Nos pastos criavam alguns bois e vacas, às vezes ovelhas, das quais tiravam a lã para produção das roupas. A vida não era fácil, principalmente nos meses de inverno, quando a quantidade de alimento diminuía e a madeira disponível nem sempre era suficiente para aquecer o interior das casas, fato que obrigava muitos camponeses a roubarem a lenha para esquentarem seus lares. Essas difíceis condições de vida forçaram muitos alemães, italianos e outros a emigrarem para a América, e muitos deles vieram ao Brasil. * Arrendatário: Aquele que aluga uma área de terra mediante pagamento.
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descrição feita por um camponês alemão, em meados de 1850, sobre o dia a dia em um vilarejo:
“Por dois anos eu estive em Busloh. Dois anos que na minha lembrança parecem tão interessantes porque neles simplesmente não ocorreu nada, mas realmente nada que um ser comum pudesse conceber como um acontecimento fora do normal. A vida transcorria, eu apenas vivia e trabalhava. Nós trabalhávamos, comíamos, dormíamos e trabalhávamos de novo, bem assim como os cavalos de carga: “Hü”, “Hott” e “Prrr”. Longe da aldeia e da cidade, aqui um dia passava após o outro no ritmo eterno e uniforme de um moinho. De madrugada, às 4 horas, começava o trabalho e, no inverno, terminava às 18 horas, no verão, conforme as ordens, às 19, 20 ou 21 horas. Assim se passavam as coisas, entrava dia, saía dia, sem nenhuma variação que não aquela trazida pelo trabalho”. RENAUX, Maria Luiza. O outro lado da história: o papel da mulher no Vale do Itajaí 1850-1950. Blumenau: Ed. FURB, 1995. p. 22-23.
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Ca p í tul o I V
Gaspar e os primeiros colonizadores
O território que compõe a cidade de Gaspar foi um dos primeiros locais a ser povoado no Vale do Itajaí-Açu, depois de Itajaí. A ocupação dessas terras se deu através do rio Itajaí-Açu, único caminho confiável na época. Os primeiros moradores foram famílias que viviam no litoral onde as terras não eram muito férteis. Procuravam no Vale terras melhores para arrancar seu sustento. Depois vieram os imigrantes alemães. Esses também foram atraídos pelo mesmo motivo, as terras férteis. Abandonaram a Colônia São Pedro de Alcântara, onde as condições para o plantio eram difíceis. Com o passar do tempo, outros grupos se estabeleceram nessas terras, mas essa história é cheia de detalhes e nas próximas linhas iremos conhecê-la com mais cuidado.
ACriaçãodaColôniadoPocinho
A Colônia São Pedro de Alcântara foi instalada em 1 de março de 1929 e foi a primeira colônia de imigrantes alemães de Santa Catarina. A colônia foi instalada onde hoje está situado o município de São Pedro de Alcântara e sua população era formada por migrantes alemães, em sua maioria católica. Os colonos aí instalados migraram para outras regiões, alguns deles se instalaram às margens do rio Itajaí-Mirim e outros foram para o Vale do Itajaí-Açu, onde lançaram os fundamentos das povoações de Belchior e Pocinho – hoje município de Gaspar.
Por volta do ano de 1824, o comerciante Agostinho Alves Ramos, que vivia na cidade de Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis), veio morar às margens do rio Itajaí-Açu (atual cidade de Itajaí), onde montou uma casa comercial e passou a trabalhar. Ali, prosperou fazendo comércio com os habitantes locais. Percebeu que as terras ao longo do rio Itajaí-Açu eram férteis e boas para a prática da agricultura, local ideal para a criação de uma colônia. No ano de 1835, Agostinho Alves Ramos foi eleito Deputado da Província de Santa Catarina* e recebeu autorização do governo para criar uma colônia às margens do rio Itajaí-Açu e outra às margens do Itajaí-Mirim, cada uma delas com dois arraiais. Agostinho Alves Ramos criou a Colônia do Pocinho, no Itajaí-Açu, e a Colônia do Tabuleiro, no rio Itajaí-Mirim. Naquela época, existiam poucos moradores nessas terras e o governo desejava atrair mais famílias para povoá-las e explorá-las. A criação da Colônia do Pocinho foi a primeira ação oficial no sentido de criar e organizar uma colônia no rio Itajaí-Açu. A lei que criou a Colônia do Pocinho determinou que fossem medidas quinhentas braças em quadro para a sede dos arraiais, onde seriam construídas as habitações e prédios públicos da época. Os moradores que já viviam na região como posseiros (posseiro é aquela pessoa que vive em uma * Durante o período monárquico (1822 a 1889) os atuais Estados eram chamados de Províncias. Assim, no lugar de Estado de Santa Catarina, havia a Província de Santa Catarina.
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área sem possuir documento de propriedade, ou seja, ela vive e usa a terra, mas não é oficialmente o proprietário) foram reconhecidos como proprietários. Segundo a pesquisadora gasparense Leda M. Baptista, em 1836, já viviam nas terras de Gaspar cerca de 27 proprietários. Na lista encontramos nomes como: Lisandro Antonio da Rocha, José da Costa Passos, João Alves dos Santos, João José Pereira, Vicente Nunes Cordeiro entre muitos outros.
A Colônia do Pocinho A Colônia do Pocinho, criada em 1835, foi dividida em dois arraiais: Arraial do Pocinho e Arraial do Belchior. A partir daí, teve início o processo de ocupação oficial das terras do Itajaí-Açu onde hoje se encontra a cidade de Gaspar, embora já vivessem na região algumas famílias. Essas famílias eram de origem açoriana que viviam no litoral e que se estabeleceram às margens do Itajaí-Açu por causa das melhores terras para a agricultura. Também se estabeleceram em Gaspar colonos alemães que, primeiramente, tinham se estabelecido na Colônia São Pedro de Alcântara a partir de 1829 (essa foi a primeira colônia de imigrantes alemães em Santa Catarina). Esses colonos abandonaram aquelas terras para se estabelecerem ao longo do Itajaí-Açu, onde as condições para o plantio eram melhores. Vejamos alguns nomes: João Klocker, casado com Ana Maria Deschamps; Henrique Burhofer, casado com Catharina Müller; Matheo Schneider, casado com Eva Schneider; João Schneider, casado com Rita Simão (brasileira); Jacob Theis, casado com Gertrudes Goedert; Nicolau Deschamps, casado com Catharina Eich, entre outros. A lei que criou as colônias permitia o acesso de brasileiros, o que significava
No mapa é possível localizarmos os locais onde foram instalados os Arraiais do Pocinho e do Belchior. Arte de Cesar P. Viana
Modelo de uma colônia. Aqui, vê-se a casa, o rancho e a roça. Os alimentos consumidos eram produzidos pelos integrantes da família e parte da produção era comercializada. Arte de Cesar P. Viana
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que moradores de regiões próximas e quaisquer outros interessados poderiam ali se estabelecer a fim de exercerem o trabalho na lavoura. Permitia, inclusive, o acesso de estrangeiros à terra, tanto aqueles que já estivessem no país como a todos os outros que no futuro viessem a habitar na região.
Dificuldades e Objetivos
Agostinho Alves Ramos.Arte de Aldo Maes dos Anjos
Aos colonos interessados em se estabelecer na Colônia do Pocinho, a lei impunha uma condição: teria que cultivá-la. Caso não cultivassem a terra no período de 6 meses, perdiam o direito de adquiri-la. Essa medida era uma forma de forçar o estabelecimento dos colonos na terra e dar início à produção de alimentos, mesmo porque se evitava, assim, que muitos requeressem terras sem efetivamente povoá-las. Outra restrição imposta pelo governo era de que a terra não poderia ser vendida num prazo de 10 anos. Os primeiros colonos enfrentaram muitas dificuldades, uma delas foi o medo da presença dos indígenas. Por causa disso, muitas famílias abandonaram a região logo nos primeiros anos. Em 1837, moravam na colônia somente 8 pessoas. Com a instalação da Tropa de Pedestres, um pelotão formado por 15 soldados com o objetivo de proteger os colonos contra a presença indígena, a situação se inverteu e os colonos começaram a voltar.
No ano de 1838, o Presidente da Província de Santa Catarina, Carlos Pardal, anunciava a presença da Tropa de Pedestres na Colônia do Pocinho e seus resultados. “[…] hoje animados com a proteção que lhes oferece a Tropa de Pedestres, voltam às plantações abandonadas e que além destes, oitenta e sete indivíduos solicitaram e tem obtido concessões de terrenos nas colônias, somando 321 pessoas que com eles vão povoar. Sendo tão boa a fertilidade do solo em que estão situadas as colônias, grande impulso receberão com a chegada de povoadores, como tudo parece prometer. Considerável incremento terão no Estado a agricultura e seus produtos, a que devem adicionar-se as vantagens, não menos preciosas, de procurar-se, destarte, emprego a numerosos lavradores do Estado, que não têm terras próprias para que cultivem, e de arrancar-se ao domínio inútil e danoso dos selvagens, e apropriá-los à civilização esses sertões, que tantas riquezas encerram […].” DiscursodoPresidentedaProvínciadeSantaCatarina,CarlosPardal,em01demarçode1838.Disponívelem:<http://www.crl.edu/content/brazil/scat.htm>.Acessoem: 29 dez. 2010.
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Documentos da História
Memórias de Henrique Pedro Zimmermann “As famílias alemãs que vieram para Gaspar foram imigrantes alemães que deixaram a Alemanha em 1828 e, em começo de 1829, foram levadas de Desterro (Florianópolis) para a Colônia de São Pedro de Alcântara. De acordo com as tradições, chegaram a Gaspar em 1832, embora não existam documentos para comprovar essa data. Vários fatos, porém, indicam que foi naquele ano que elas vieram para Gaspar. O fato é que os colonos de Gaspar forneceram produtos da lavoura e outros gêneros alimentícios aos colonos de Blumenau, que vieram em 1850. Outro testemunho, que parece comprovar esta afirmação, é o do sr. Baungarten, que subiu o rio Itajaí, se não me falha a memória, no ano de 1856 e que falou das plantações, das pastagens povoadas de gado e dos bonitos laranjais dos colonos que povoavam a margem direita do rio desde Pocinho até Belchior”. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo X, n. 11, nov. 1969.
“... Conhecida a região, logo em seguida vieram mais ou menos vinte famílias, que se fixaram desde o Poço Grande até Belchior. Os Schramm e os Zimmermann fixaram-se no local onde hoje se situa a cidade de Gaspar. Os Deschamps foram mais além e fixaram-se no sítio de Belchior. No Poço Grande ficaram os Schmitt, Spengler e outros mais. Todas essas famílias possuíam, além de vários filhos, uma numerosa parentagem que as acompanhou ao novo local de residência. “... Nicolau Deschamps, no Belchior, montou serraria movida à água. […] a maioria dos proprietários só residiu em ranchos provisórios até dispor de madeira serrada para a construção de uma casa melhor. Também fizeram questão de cobrir as suas casas com telhas de barro, o que exigiu a instalação de uma olaria. Os Zimmermann foram pioneiros na fabricação de tijolos e telhas na região de Gaspar. Essas famílias, ao que tudo indica, vieram de São Pedro de Alcântara. Os primeiros, em 1832, e outros poucos, anos mais tarde […]”. “... As terras eram de grande fertilidade e produziam bem, o que possibilitou aos colonos vender muito de sua produção em Itajaí. Os artesãos logo copiaram os engenhos de farinha de mandioca e passaram a construí-los para os colonos de Gaspar. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo IX, n. 8, ago. 1968. Ilustração do retorno das famílias depois da instalação da Tropa de Pedestres no Arraial do Belchior. Arte de Cesar P. Viana
Bibliografia Consultada BAPTISTA, Leda Maria. Simplesmente Gaspar. Blumenau: Nova Letra, 1998. Relatório do Presidente da Província de Santa Catarina, José Mariano de Albuquerque Cavalcanti, cidade de Desterro, 05 de abril de 1836. Disponível em: <http://www.crl.edu/ content/brazil/scat.htm.>. Fala do Presidente da Província de Santa Catarina Machado de Oliveira, em 01 de março de 1837. Discurso do Presidente da Província de Santa Catarina, Carlos Pardal, em 01 de março de 1838. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo I, n. 4, fev. 1958. O CENTENÁRIO DE GASPAR. Tomo IV, n. 4 abr.1961. SÃO PEDRO APÓSTOLO DE GASPAR. Tomo IV, n. 5, maio 1961. CORREIA, Álvaro. Homens que fizeram história. Blumenau: Nova Letra, 2011.
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Ca p í tul o V
O rio era o caminho... dos imigrantes, do comércio e das cheias
Entrada do Porto de Itajaí na primeira metade do século 20. A barra do rio era o começo e o fim de muitas jornadas. Do porto, partiram, rio acima, os imigrantes. Ali chegavam os produtos da colônia para serem comercializados. Primeiro foi a madeira, depois os produtos agrícolas e, mais tarde, os produtos industrializados. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
A importância do rio Desde os primeiros anos da colonização das terras que hoje pertencem a Gaspar, o rio Itajaí-Açu serviu como uma importante via de acesso ao interior, um caminho fluvial, percorrido por pequenas embarcações. Foi seguindo o rio que os primeiros colonizadores chegaram a essas terras. Saindo da Vila de Itajaí, os colonos subiam o rio em embarcações em busca de boas terras para a agricultura. Como em 1835 não havia uma estrada ligando a região de Gaspar ao litoral, o rio era o caminho mais rápido e seguro. Na parte em que o rio corta o território gasparense, surgiram diversos portos onde os colonos embarcavam suas mercadorias, como também eles próprios tomavam a embarcação quando precisavam ir até Itajaí. Em 1856, o caminho pela margem direita do rio até Gaspar estava concluído, faltando apenas a ponte sobre o Gaspar Grande. Porém as condições da estrada representavam uma aventura aos viajantes. O rio funcionava como uma via de comércio. Os colonos transportavam sua produção até a Vila do Santíssimo Sacramento do Itajaí, atual cidade de Itajaí, onde realizavam seus negócios. Os colonos exportavam produtos como madeira, açúcar, cachaça, melaço, rapadura, farinha de mandioca, fumo em folha, milho, queijos, manteiga, banha, etc, e importavam produtos como farinha de trigo, carne seca, bebidas, tecidos, artigos de ferro, utensílios para a lavoura, óleo, sal, tintas entre outros. 29
A partir do ano de 1873, o vapor São Lourenço passou a subir mensalmente o rio Itajaí-Açu até Gaspar, porque daí pra cima somente era possível seguir com embarcações menores. O vapor fazia três viagens entre o porto da capital e a Colônia D. Francisca (atual Joinville), tocando nos portos intermediários de Porto Belo, Itajaí, Colônia Blumenau e São Francisco. A navegação no vale recebeu maior impulso com a criação da Companhia de Navegação Fluvial a Vapor Itajaí-Blumenau. A primeira emVapor Blumenau em um dia qualquer navegando as águas do barcação a vapor a realizar o trajeto recebeu o rio Itajaí-Açu. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva nome de ‘Progresso’ e chegou a Blumenau em meados de 1879, onde foi recebida com festa. Em 1895, o vapor Blumenau iniciou suas atividades, realizando três viagens semanais entre Blumenau e o porto de Itajaí. Gaspar era um dos pontos de parada.
Porto fluvial em território gasparense.Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
Este é o porto fluvial da ‘Casa Carlos Procópio Höschl Importação e Exportação’ fundada no ano de 1864 e que funcionou até 1943. Iniciou suas atividades comerciais próximo da confluência do ribeirão Gaspar Mirim com o Itajaí-Açu. O estabelecimento servia ainda de pousada aos viajantes que necessitavam aguardar a chegada da embarcação a fim de continuarem viagem.Arquivo Histórico José
Ferreira da Silva
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Vapor Blumenau em um dia qualquer navegando as águas do O pescador, a igreja e as casas. Arte de Cesar P. Viana rio Itajaí-Açu. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
Documentos da História
“O Porto de Gaspar, sito no início da Rua 17 de fevereiro, em terreno de Dona Mimi Hoeschl, foi, durante muitos anos, um dos pontos mais importantes e movimentados da nossa cidade. Servia à navegação então existente pelo rio Itajaí-Açu, entre as cidades de Blumenau, Gaspar e Itajaí. O rio era navegado por várias embarcações que faziam o transporte regular de passageiros e cargas. O pitoresco vaporzinho diariamente no porto da D. Mimi (como era chamada), deixando e levando dezenas de passageiros de todas as classes sociais da cidade do vale. Naqueles velhos e saudosos tempos, o tráfego rodoviário entre as duas referidas cidades era difícil, de maneira que os viajantes preferiam locomover-se pelo rio. Depois, dado ao constante progresso dos veículos automotores e à melhoria das estradas de rodagem, a navegação fluvial pelo Itajaí-Açu foi diminuindo até desaparecer...” Texto adaptado.Fragmentoretiradodojornal“VozdeGaspar”publicadoporMariaZileneCardosoemsuatesedemestradoGaspar,SéculoXIX:asdificuldadesparaoseupovoamento inicial e a desmitificação de uma dependência, p. 116. Florianópolis, 1991. AHJFS.
As enchentes A cidade de Gaspar nasceu e se desenvolveu às margens do rio Itajaí-Açu. Esse é um dos motivos de ter sido atingida por diversas enchentes ao longo de sua história. As enchentes no Vale do Itajaí sempre ocorreram, mas só passaram a ser um problema a partir do momento em que pessoas passaram a viver nas terras ao longo do rio, o que começou no início do século 19. Assim, conforme a população cresceu, os problemas aumentaram. De 1850 a 1992, ocorreram cerca de 68 enchentes, das quais 11 até 1900; 20, nos 50 anos seguintes, e 37 nos últimos 63 anos. Relatos históricos registram 9 m de elevação do rio Itajaí-Açu na enchente de 1862. As enchentes, apesar dos estragos que provocam, fazem parte de nossa história e temos que aprender a conviver com isso e encontrar soluções a fim de minimizar os estragos. Nos últimos anos a cidade foi atingida por duas outras enchentes, a de 2008 e a de 2011. 31
ArtedeAldoMaesdosAnjos
Documentos da História
Memórias de Henrique Pedro Zimmermann “[…] Estava chovendo há semanas. Chegavam notícias de que nas cabeceiras do rio as chuvas eram intensas. O volume das águas foi aumentando, e o rio tornou-se uma furiosa corrente líquida. Uma tragédia! Era meados de outubro de 1911 e a cidade estava inundada. Um dia, ao anoitecer, papai foi verificar o nível das águas. Voltou apressadamente e mandou que todos nós subíssemos ao sótão espaçoso de nossa casa e para lá foram transportadas algumas camas e colchões, alguns apetrechos caseiros e alguns alimentos. Mal tínhamos terminado estes afazeres já as águas estavam invadindo o terreiro de nossa casa. No dia seguinte, pela manhã, podíamos ver pelas janelas do sótão que estávamos rodeados de água por todos os lados […]. O que mais nos impressionou naqueles dias foi a visão que o rio nos oferecia. Estava, agora, transformado num grande mar em meio do qual se formou uma perigosa correnteza. Nela vinham rolando casas de madeira inteiras, estábulos e galinheiros e muita madeira. Cadáveres de animais afogados misturavam-se com caixas de mercadorias das casas comerciais de Blumenau. De Itajaí foram enviados dois navios em socorro da população de Blumenau. Ao chegarem a Gaspar, esses navios não conseguiram passar. A correnteza das águas ali era de tamanha força que os navios, quando pretendiam vencê-la, eram jogados de volta, sem obedecer à força de suas máquinas ou a seus lemes. À tarde daquele dia, após várias tentativas, voltaram para Itajaí […]”. Memórias de Henrique Pedro Zimmermann – In: MEMÓRIA GASPARENSE, n. 4, abr. 1995. textos adaptados.
Vejamos o que publicou o jornal Novidades, de Itajaí, sobre a enchente de 1911 e seus efeitos em Gaspar. A enchente ocorreu entre os dias 30 de setembro e 1 de outubro. “NO GASPAR, MONtANHAS DE tRANqUEIRAS. SALVADORES HEROICOS. No Gaspar, um dos mais florescentes povoados à margem do Itajaí-Açu, que ali se aperta entre barrancas altas, o rio apresenta, ao meio do leito, uma pequena ilhota que mais ainda o estreita. Ali as águas começaram a subir sensivelmente pela madrugada de domingo. O nível do Itajaí, que nesse lugar é caudaloso, subia a olhos vistos. Em pouco, galgara as barrancas onde, com o depósito de tranqueiras, ciscalho, atirado sobre os muros e as sebes densas, formou um tapume de maneira a estarem as águas em nível superior ao das ruas. De momento, porém, esse estranho brinquedo da torrente impetuosa caiu, como um castelo de cartas. A enxurrada, traiçoeira e temível, invadiu as ruas, cercou as casas, arrombou portas e janelas, tomando conta de seus novos domínios. 32
Tomada, assim, de surpresa, era natural que a população não pudesse se pôr a salvo facilmente. De fato, apesar dos heroicos esforços de muitos, dentre os quais é justo que destaquemos os nomes dos senhores Brandes e Dalfá, que para acudir aos desesperados chegaram a atirar-se a nado na tremenda corrente, só à tarde de segunda feira pôde dar-se por findo o trabalho de salvamento. A última pessoa que saiu de casa foi a Exma. Sra. D. Mimi Hoeschel, que deve sua vida à apostólica abnegação do sr. Brandes e de seu destemido companheiro.” “De Gaspar à Volta Grande: desolação Imensa Sem dúvida alguma, de todas as povoações ribeirinhas do Itajaí, as que relativamente mais sofreram com a cheia foram as localizadas no trecho entre Gaspar e Volta Grande. Aí a desgraça foi completa, a destruição, total, esmagadora e terrível. As pobres habitações, em sua quase totalidade construídas de madeira e taipa, não podiam resistir à força da corrente. A correnteza, com facilidade, as foi arrancando, para despedaçá-las, como criança mal educada a qualquer brinquedo. Dezenas de casas saíram, assim, rio abaixo. E não fica aí essa clamorosa catástrofe: sendo muito distantes os morros onde a população se pôde pôr à segurança, foi inteiramente impossível salvar gêneros e roupas para acudir às primeiras necessidades nos dias angustiosos pelos quais estavam atravessando. Criação, gêneros alimentícios, tudo o rio carregou para destruir.” Texto adaptado: jornal Novidades, de Itajaí, 1911.
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Colonos versus nativos: a disputa pelas terras
Osconflitos:XoklengversusImigrantesouImigrantesversusXokleng Com a ocupação do território ao longo do rio Itajaí-Açu pelos imigrantes e o crescente desmatamento para a prática da agricultura, as áreas de caça e coleta dos Xokleng foram reduzidas cada vez mais. Assim, o conflito entre os nativos e os colonos tornou-se uma realidade. Esses estavam relacionados a um ponto central: a posse de um território para uso e sobrevivência. Os nativos que habitavam estas terras já havia séculos estavam protegendo seu território dos invasores. Os imigrantes estavam lutando pela terra que lhes fora prometida pelo governo Imperial do Brasil e pelas empresas colonizadoras. A terra significava a esperança de sobrevivência para os dois grupos. O resultado foi um conflito que produziu muitas vítimas.
OsBugreiros:entreflechaseespingardas,algunssobreviventes Com o objetivo de expulsar os indígenas das áreas ocupadas pelos colonos, os governos locais contrataram os serviços dos bugreiros, homens que realizavam ataques aos Xokleng. Antes dos bugreiros, houve a ação da Tropa de Pedestres, que apresentou resultados insatisfatórios e por isso foi desativada em 1879. As tropas de bugreiros eram formadas, em regra, de 8 a 15 homens e atacavam os nativos em seus acampamentos, de surpresa. O mais conhecido bugreiro que atuou em Santa Catarina foi Martinho Marcelino de Jesus, conhecido por Martinho Bugreiro. Este caçador ‘de gente’ esteve a serviço das colônias no processo de expulsão e extermínio dos índios da região.
Tropa de bugreiros com os sobreviventes de um ataque realizado por volta de 1905. Repare que entre os sobreviventes estão somente mulheres e crianças. Arquivo da Fundação Genésio Miranda Lins
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ASAB
Este é Martinho Marcelino de Jesus, Registro de pessoas capturadas pelos bugreiros na região de Blumenau no início do um dos bugreiros que mais atuou na século XX. Na foto, duas mulheres e oito crianças Xokleng. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva região.AcervoParticulardeAloisiusCarlosLauth
Documentos da História
“... Quando os bugreiros eram chamados por colonos, pelos administradores das colônias ou pelo governo para realizarem expedições de afugentamento dos selvagens, eles se preparavam verdadeiramente para uma expedição de guerra. […] Infinitas precauções tomam, pois é preciso surpreender os índios nos seus ranchos quando entregues ao sono. Não levam cães. Seguem a picada dos índios, descobrem os ranchos e, sem conversarem, sem fumarem, aguardam a hora propícia. É quando o sol está para nascer que dão o assalto. O primeiro cuidado é cortar as cordas dos arcos. Depois atacam! […]”. Santos, Silvio Coelho dos. Índios e brancos no sul do Brasil: a dramática experiência dos Xokleng. Porto Alegre: Editora Movimento. p. 83, 1973.
Biografia Este é João Indaiá Schaefer. Ele foi capturado pelos bugreiros em 1905 quando tinha cerca de oito anos. Os bugreiros foram contratados pelo Superintendente do Município de Brusque, Vicente Schaefer, e liderados por Martinho Bugreiro. Atacaram sua tribo, na região do Ribeirão do Ouro, atual Botuverá. A criança foi adotada pelo próprio Vicente Schaefer. João cresceu no mundo dos brancos, separado de sua família biológica. Nos primeiros anos, João deve ter enfrentado problemas sérios de adaptação. As lembranças da chacina, os amigos e familiares mortos devem ter lhe povoado as lembranças. As alterações na alimentação, as novas vestimentas que teve que passar a usar; os novos hábitos e costumes que teve de aprender. Tinha na época em que foi capturado cerca de 8 anos, segundo julgavam seus captores. Mas como saber, não tinha certidão de nascimento e não entendia a fala dos brancos. Nessa nova sociedade aprendeu o falar o português, atuou no Coral São Luiz e foi 36
jogador do Sport Club Brusquense. Trabalhou na Fiação e Tecelagem Carlos Renaux durante muitos anos e depois no comércio local. Casou-se com Antônia Maria Benatti e juntos adotaram dois filhos. João faleceu no ano de 1961.
O fim dos Xokleng Depois de anos de conflitos, dos ataques da Tropa de Pedestres, dos bugreiros, da perda de seu território e das doenças, os Xokleng que sobreviveram foram colocados, a partir de 1914, no Posto Indígena Duque de Caxias, em Ibirama, administrado por Eduardo de Lima e Silva Hoerhann. No Posto Indígena de Duque de Caxias, os nativos deixaram de ser nômades para se tornarem sedentários. Isso causou muitos problemas, como o contato direto com as doenças do homem branco. Muitos morreram por causa da gripe, varíola e disenteria, entre outras doenças.
Bibliografia Consultada LAVINA, Rodrigo. Os Xokleng de Santa Catarina: uma etnohistória e sugestões para os arqueólogos. 1994. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 1994. PINSKY, Jaime. As primeiras civilizações. 16. ed. Ver. e ampl.[S. l.]: Atual, 1994. (Discutindo a História). SANTOS, Silvio Coelho. Índios e brancos no sul do Brasil: a dramática experiência dos Xokleng. Porto Alegre: Movimento, 1987. SANTOS, Silvio Coelho dos. Os Índios Xokleng: memória visual. Florianópolis: Ed. da UFSC, Ed. da Univali, 1997.
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As árvores que os imigrantes encontraram
A Mata Atlântica Antes da colonização, as terras que hoje compõem o território da cidade de Gaspar eram cobertas pela Mata Atlântica. Uma vegetação formada por uma grande diversidade de espécies com árvores de grande porte e com suas copas largas. Boa parte dessa área vegetal foi destruída pela exploração de madeira e abertura de áreas para a agricultura e criação de gado. Hoje, a Mata Atlântica é considerada uma das mais importantes florestas tropicais do mundo e abriga mais de 20 mil espécies de plantas, das quais 8 mil são endêmicas, ou seja, espécies que não existem em nenhum outro lugar do planeta. É a floresta mais rica do mundo em diversidade de árvores. Em seu interior é possível encontrar árvores como: cedro, peroba, canela sassafrás, figueira-mata-pau, canela-preta, pau-jacaré, maria-mole, imbuia, peroba, palmiteiro, ipê- roxo, ipê-amarelo, ticum, guabiroba, entre outras. A sua fauna é igualmente formada por diversas espécies de mamíferos, anfíbios, aves, insetos, peixes e répteis. Por possuir árvores de grande valor comercial, a mata sofreu com o desmatamento ao longo das décadas e muito de sua área original já não existe. Hoje, o crescimento populacional e a ocupação de novas áreas continuam causando prejuízos.
Acolonizaçãoeaexploraçãodamadeira nas terras de Gaspar A extração de madeira foi uma das principais atividades econômicas realizadas em Gaspar nos primeiros tempos de sua colonização. Não demorou muito para que os primeiros colonizadores passassem a explorar a mata com fins comerciais. Os colonos procuravam pelas melhores árvores, as mais altas, de tronco reto e de melhor qualidade comercial, como canela, pero39
FotosReproduçãoInternet
ba, óleo e cedro. Tratavam de derrubá-las para utilizarem sua madeira. Depois de muito trabalho, a mata ia cedendo lugar a uma clareira, que mais tarde daria lugar a um pasto ou plantação. Depois de derrubadas, as toras eram conduzidas rio abaixo, primeiro através dos ribeirões até o rio Itajaí-Açu com o auxílio de juntas de bois. Quando chegavam ao rio, as toras eram amarradas umas as outras formando uma enorme balsa, levada rio abaixo até o porto, onde eram comercializadas. Muitas árvores forneciam madeira própria para construção e reparo de embarcações e eram aproveitadas no Estaleiro das Naus, localizado nas proximidades da barra do Ribeirão Arraial. Segundo os pesquisadores, Bento Dias era carpinteiro à beira-mar. Construía barcos. Vinha para Belchior, subia os ribeirões e comprava a madeira em pé. Derrubava as árvores e as levava para seu estaleiro, onde os barcos eram construídos com madeira leve. Um dos ribeirões de Belchior era conhecido como Ribeirão do Bento.
“Em 1500, à época do descobrimento do Brasil, a Mata Atlântica cobria as áreas do litoral do país, do Rio Grande do Norte até o Rio Grande do Sul, numa área de 1.000.000 de Km do território nacional. A exploração descontrolada dos seus recursos naturais, os sucessivos ciclos econômicos (pau-brasil, cana, gado, café, carvão, etc.) e o processo de urbanização crescente destruíram a maior parte desse ecossistema. Atualmente, restam menos de 5% da Mata Atlântica original, localizada nos Estados do Sudeste e Sul, apesar de ser uma das florestas que detém a maior biodiversidade entre todas as demais do planeta. É considerada, atualmente, um dos mais importantes e ameaçados conjuntos de ecossistemas do planeta. Caracteriza-se por ser uma floresta densa com árvores frondosas que podem atingir de 25 a 30 metros e diversas outras espécies.” Textoadaptado.Fonte:Cartilhaambiental:ProjetoParqueEscola–adiversãoqueeduca.2000.p10.
Palmiteiro em perigo!
Em perigo de extinção... o Euterpe eduli, árvore antes abundante na Mata Atlântica, conhecido popularmente como ‘Palmiteiro’ ou ‘pé de Palmito’, apresenta um tronco único e pode atingir de 20 a 30 metros de altura na fase adulta. Essa planta é bastante cobiçada por seu palmito, retirado da parte superior do tronco, junto às folhas. A palmeira demora em torno de dez anos para que o palmito esteja “maduro”, sendo necessário derrubar a árvore para retirá-lo. Por esse motivo é uma árvore considerada em perigo de extinção. ArquivoMunicípioDiaaDia-Brusque
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O transporte da maderia era realizado através de balsas até o porto de Itajaí. Arte de Aldo Maes dos Anjos
Depois de derrubadas as toras eram levadas até o rio. Com elas construía-se uma balsa que era conduzida até o porto, onde eram vendidas. Arte de Aldo Maes dos Anjos
O comércio de madeira era um negócio lucrativo. Vemos aqui a serraria de Félix Busso Asseburg em Itajaí. No porto, amontoavam-se pilhas de tábuas e toras que chegavam em balsas pelo rio. Homens como Coronel Antônio Pereira Liberato, João Bauer, Nicolau Malburg Júnior e Guilherme Asseburg lucraram muito com esse comércio. O porto de Itajaí foi, durante muito tempo, um porto madeireiro. Arquivo da Fundação Genésio Miranda Lins – Itajaí
Homens trabalhando na derrubada da mata e produção de tábuas em plena mata. Serrar madeira exigia muito dos trabalhadores, além de ser uma atividade perigosa. Caso sofressem algum acidente, o socorro mais próximo estava a horasdedistância.ArquivoHistóricoJoséFerreiradaSilva
A caça era uma atividade comum no início do século 20.Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
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Os habitantes da Mata Atlântica Os animais que habitam a Mata Atlântica formam uma lista gigantesca, tão grande que é difícil decorar o nome de todos eles. É tanto bicho que a Mata Atlântica está entre as cinco regiões do mundo com maior quantidade de espécies animais. Quantos animais você conhece? Será que você consegue lembrar o nome de dez animais? Vamos ver. Você pode lembrar de animais como tatu, paca, onça, jaguatirica, tamanduá, bugio, macaco prego, cutia, quati, gambá, veado, jararaca, cobra-coral, gato-do-mato, gavião, coruja, jacu, nhambu... Esses são os mais conhecidos, mas ainda falta muito para completar a enorme e colorida lista de animais que vivem nesse habitat.
Acolonização:caçaedestruiçãodohabitat
Retrato de uma das árvores encontradas pelos colonizadores. Será que demorou muito para derrubá-la com o machado? Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
A destruição do habitat teve início com o processo de colonização da nossa região, por volta de 1835. Quando os primeiros colonizadores chegaram, tiveram que derrubar áreas de floresta para construírem suas casas e plantações. Com o aumento da população, a área de floresta foi diminuindo. O espaço natural para os animais ficou cada vez menor. Com o crescimento urbano das últimas décadas, a Mata Atlântica diminuiu mais ainda. As notícias mostram o desmatamento na Amazônia, o que nos deixa preocupados. Mas e o desmatamento do nosso quintal, a Mata Atlântica? A caça predatória foi outro fator que contribuiu e continua contribuindo para a extinção de espécies animais em nossa região. No início da colonização, a caça representava uma fonte de alimentos. A caça era feita com o objetivo de obter alimentos. Mas e hoje? Será que é preciso matar os animais da floresta para conseguir alimentos? Outro fator que contribui para a destruição da vida na floresta é o comércio ilegal de animais, pois os animais são retirados de seu Anta.ArquivoMunicípioDiaaDia-Brusque ambiente natural para viverem engaiolados. Com o objetivo de preservar as áreas de floresta e os animais que vivem nela, foram criadas diversas áreas de proteção, reservas ecológicas e parques. Cada um deles possui suas características, mas, no final, todos procuram preservar e garantir a proteção da floresta e seus moradores.
Para saber mais...
Mamíferos: A Mata Atlântica possui 261 espécies de mamíferos; Aves: cerca de 1020 espécies de aves, sendo 104 ameaçadas de extinção em virtude da destruição dos habitats, da caça predatória e do comércio ilegal; Anfíbios: cerca de 370 espécies de anfíbios; Répteis: possui 150 espécies de répteis; Peixes: são cerca de 350 espécies de peixes; Mais os insetos que formam o maior grupo de espécies.
REBOUÇAS,Fernando.FaunadaMataAtlântica.Disponívelem:<http://www.infoescola.com/biologia/fauna-da-mata-atlantica>.Acessoem:24jan.2012.
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Pe. Gattone e a Freguesia de São Pedro Apóstolo
Nos primeiros tempos, lá pelos idos de 1835 a 1860, a Colônia do Pocinho não contava com um padre que morasse no local. Os religiosos vinham, de tempos em tempos, das vilas existentes no litoral, como São Francisco do Sul e Freguesia do Santíssimo Sacramento (atual Itajaí). Realizavam suas visitas, cumpriam suas tarefas e retornavam, ficando a comunidade sem um representante da igreja entre eles. Para novo encontro teriam que aguardar algum tempo. Os colonos que viviam na região, quase todos católicos no início da colonização, aguardavam a vinda de um padre para realização das cerimônias religiosas, como a missa, a comunhão, a confissão e o batismo. Quando um religioso aparecia na região, a comunidade se organizava, preparava-se para a missa e para a realização das respectivas cerimônias.
Representação da visita de um padre à comunidade de Gaspar. Era comum receberem o religioso com tiros de espingardas disparados para o ar, em sinal de felicidade. Arte de Cesar P. Viana
Padre Francisco Alberto Gattone, vindo da Alemanha, foi o primeiro religioso a morar na região de Gaspar, estabelecendo-se em Belchior, no ano de 1860. Como não havia casa paroquial, pe. Gattone ficou hospedado em casa de Nicolau Deschamps até 1867. Uma de suas funções era prestar auxílio aos católicos que viviam na Colônia Itajahy (Brusque). O padre realizava cerca de duas visitas por ano, e sua viagem até lá era realizada a cavalo. Não é preciso dizer que o caminho era difícil e perigoso, já que era isolado e os viajantes poderiam ser alvos dos ataques dos indígenas. Igualmente atendia aos colonos católicos que viviam na Colônia Blumenau. 43
Uma das maiores lutas de pe. Gattone foi pela elevação do povoado de Gaspar à categoria de Freguesia, o que daria maior independência administrativa ao lugar. Para tanto, organizou a coleta de assinaturas dos moradores da região. O abaixo-assinado foi enviado para a Assembleia Legislativa, que ficava na cidade de Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis), capital da Província. No dia 25 de abril de 1861, a Assembleia aprovou o pedido e o povoado foi elevado à categoria de Freguesia, oficialmente instalada na data de 28 de julho do mesmo ano, na Capela do Belchior Baixo. Esta, inaugurada em 1850.
ArtedeAldoMaesdosAnjos
Com a elevação de Gaspar à categoria de Freguesia, em 25 de abril de 1861, a Colônia Blumenau passou a depender da Freguesia de São Pedro Apóstolo para realizar as eleições de vereadores e dos Juízes de Paz. Somente em 31 de julho de 1873 foi criada a Freguesia de São Paulo Apóstolo, na Colônia Blumenau, sendo desmembrada da Freguesia de São Pedro Apóstolo.
Documentos da História
“O colono Frederico Guilherme Schramm chegou à região em 1848, vindo da Alemanha. Comprou terras de outro colono já estabelecido, João Kerbach, acima do ribeirão Gaspar Grande, e lá fixou residência. Desde logo, em 28 de dezembro de 1848, Schramm começou a visitar as famílias, convidando-as para reuniões de culto. Os encontros eram realizados em três casas diferentes, sucessivamente, todos os domingos e dias santos. Schramm sugeriu a ideia de se construir uma capela e ela foi aceita com entusiasmo. Depois de discutirem sobre onde construir a capela, o local escolhido foi a margem esquerda do rio Itajaí, mais ou menos em frente à grande figueira na margem direita do rio, no caminho a Gaspar. A capela foi construída de madeira e barro e coberta com folhas de palmeira. Junto, ficava o cemitério. De sino, servia parte de lâmina de uma serra de madeira. O templo ficou pronto e foi inaugurado na quinta-feira santa de 1850. Lá se reunia o povo aos domingos e dias santos. Schramm lia a explicação do Evangelho e dirigia a reza e o canto.” textoadaptado:BAPtIStA,LedaMaria.SimplesmenteGaspar.Blumenau:Nova
Letra, 1998. p. 57-58.
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Biografia - Padre Francisco Maximiliano Alberto Gattone *9/10/1834 + 28/01/1891
Nasceu em 9 de outubro de 1834, em Schladen, na Alemanha. Aos 13 anos passou a frequentar Ginásio, em Hildesheim, por seis anos. Depois cursou por três anos Filosofia e Teologia, sendo, logo após, admitido no Seminário Diocesano, onde dedicou um ano à preparação do sacerdócio, ordenando-se padre em novembro de 1858. No ano de 1860, requereu autorização ao Vigário Geral para ser missionário no Brasil, em Santa Catarina. Chegou a Joinville ainda no ano de 1860, onde passou a auxiliar o Pe. Carlos Boersgerhausen. De Joinville, Padre Alberto Francisco Gattone mudou-se para Gaspar, nomeado vigário. Passou a morar na casa do Sr. Nicolau Deschamps ArtedeCesarP.Viana por algum tempo. Permaneceu em Gaspar até o ano de 1867, quando foi transferido para a Colônia Itajahy (atual Brusque), permanecendo até o ano de 1882. Em maio de 1881, Padre Gattone foi agraciado com a Ordem da Rosa, em reconhecimento aos trabalhos prestados durante a grande enchente de 1880. No ano de 1882, seguiu para o Rio de Janeiro. O padre faleceu no dia 28 de janeiro de 1891.
A construção da nova igreja Depois de instalada a Freguesia de São Pedro Apóstolo, em carta ao Presidente da Província, pe. Alberto Gattone enumerava as seguintes necessidades: a criação de uma escola; a construção de uma nova igreja matriz, pois a existente em Belchior era pequena demais para tantos fiéis; demarcação do limite da Freguesia com a Colônia Blumenau, entre outras. Sobre o local para construção da igreja, ocorreu uma divergência entre o pe. Gattone e o Dr. Blumenau. O padre defendia que a nova igreja fosse construída no topo do morro onde está a atual igreja matriz, já Dr. Blumenau pensava ser melhor construí-la em local plano em algum lugar entre os ribeirões Gaspar Grande e Gaspar Pequeno. Dr. Blumenau justificava sua escolha afirmando que o local em cima do morro seria de difícil acesso aos doentes e idosos. Registro da Igreja de São Pedro Apóstolo de Gaspar. Inaugurada em 1885, perEm meio às discussões, em 12 maneceu até o ano de 1942, quando foi demolida para dar lugar ao atual templo. Acervo particular de Aloisius Carlos Lauth
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de maio de 1863, José Henrique Flores e sua esposa Maria Clara da Silveira Flores, na expectativa de resolverem a disputa de forças entre os dois personagens citados (Dr. Blumenau e pe. Gattone), fazem a doação de um terreno no Poço Grande para que ali se construísse a Igreja Matriz e a casa paroquial, além de uma área para instalação do cemitério, com a observação de que, se não fossem construídos, a doação perderia o valor. Com essa atitude, Flores queria atrair a construção da nova igreja e, ao mesmo tempo, da sede da Freguesia para suas terras, como também atrair o crescimento urbano para mais próximo de suas propriedades, o que valorizaria e facilitaria a venda de lotes e aumentaria o comércio na localidade. A Igreja Matriz São Pedro Apóstolo foi construída sobre a elevação escolhida pelo pe. Gattone e inaugurada no dia de São Pedro, 29 de junho, no ano de 1867. Essa igreja foi substituída ainda em 1885 por outra que permaneceu até 1942, quando foi demolida para dar lugar ao atual templo. Detalhe da atual Igreja Matriz de São Pedro Apóstolo, em Gaspar. Bibliografia Consultada Álbum do 1º Centenário de Brusque (1860-1960). Edição da Sociedade Amigos de Brusque. CARDOSO, Maria Zilene. Gaspar, século XIX: as dificuldades para o seu povoamento inicial e a desmistificação de uma dependência. 1991. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-graduação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1991. Arquivo José Ferreira da Silva. BAPTISTA, Leda Maria. Simplesmente Gaspar. Blumenau: Nova Letra, 1998.
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A Imigração Italiana: a chegada ao Vale do Itajaí Os motivos da Imigração Italiana para o Brasil A partir de 1850, quando foi proibido o comércio de escravos entre Brasil e o continente africano, o governo brasileiro passou a discutir qual o melhor caminho para pôr um fim ao trabalho escravo. Concordavam que tinha de ser um processo lento e gradual. Optou-se pela substituição do trabalho escravo pelo trabalho do imigrante europeu. Assim, as autoridades imperiais incentivaram a vinda de imigrantes para o Brasil. Outro objetivo era povoar as terras da região sul do país com esses colonos europeus. Criar e desenvolver colônias com trabalhadores brancos e livres onde esses pudessem desenvolver a pequena propriedade policultora, mantida pelo trabalho familiar sem o uso de escravos. Se o Brasil precisava de “braços para a lavoura”, em várias regiões da Itália a miséria, falta de terras e trabalho era um problema sério. Milhares de famílias estavam emigrando em busca de melhores condições de vida, e muitas delas vieram ao sul do Brasil.
A Origem dos Imigrantes A maioria dos imigrantes italianos que povoaram a região do Vale do Itajaí vieram das regiões da Lombardia, Vêneto e Trentino Alto-Ádige (ver mapa) através das companhias de imigração, empresas que ganhavam dinheiro enviando emigrantes para o Brasil.
A maior parte dos imigrantes italianos que vieram para Santa Catarina eram das regiões da Lombardia, Vêneto e Trentino Alto-Ádige, no norte da Itália. Na época, o Trentino Alto-Ádige pertencia à Áustria e só mais tarde passou a fazer parte da Itália. Arte de Cesar P. Viana
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ArtedeCesarP.Viana
dos portos da Itália ao rio Itajaí
MuseuArquidi ocesanodomJo aquim
Os navios que traziam os imigrantes partiam dos portos de Trieste, Gênova e Veneza rumo ao Brasil. Depois de cruzar o Oceano Atlântico, faziam escala em Recife e depois Rio de Janeiro. Dali, as embarcações seguiam para Santos, onde algumas famílias que seguiriam para as fazendas de café desembarcavam. Do porto de Santos seguiam em direção ao sul, para o porto de Itajaí, onde nossos colonizadores italianos desembarcaram de “mala e cuia”. A viagem até o Brasil não era fácil. Demorava cerca de 45 dias em navios muitas vezes lotados. Atravessavam o Atlântico e faziam paradas nos principais portos do país até chegarem a Itajaí. Do porto até a colônia seguia-se pelo rio. Depois era aguardar no casarão de imigrantes a medição dos lotes e começar o trabalho. Derrubar a floresta, construir a casa, preparar a terra para plantar e iniciar o plantio. 48
Subindo o rio Itajaí A partir do ano de 1875, a região do Vale do Itajaí recebeu milhares de imigrantes, a maioria italianos. Para muitos, o Porto de Itajaí foi o fim de uma jornada e o início de outra, pois eram alojados no Barracão de Imigrantes até serem instalados em seus lotes. A viagem entre o Barracão de Imigrantes até Gaspar e Blumenau era feita pelo rio. Dali em diante a viagem era feita a pé, levando seus pertences nas costas ou em mulas. Os imigrantes que subiram o rio Itajaí-Açu foram instalados nas terras que deram origem, anos mais ArtedeCesarP.Viana tarde, a municípios como Rio dos Cedros, Timbó, Ascurra, Rodeio, entre outros. Muitas dessas famílias mudaram-se, anos depois, para Gaspar, onde iniciaram o plantio de arroz irrigado. A pesquisadora Leda M. Baptista nos apresenta o nome de algumas dessas famílias: Mondini, Moretto, Moser, Dalla-Rosa, Fachini, Testoni, Dagnoni, Venturi, Dalrolt, etc. Era muita gente em pouco tempo, e os agrimensores tinham dificuldades em demarcar tantos lotes em tão pouco tempo. Assim, esses eram alojados nos Barracões de Imigração até que os lotes estivessem demarcados.
ArtedeAldoMaesdosAnjos
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Barracão de Imigrantes
Abrigo construído para abrigar os imigrantes recém-chegados. O primeiro barracão onde eram instalados estava localizado na confluência do rio Itajaí-Mirim com o Itajaí-Açu. Nas colônias existiam outros barracões, nos quais os imigrantes aguardavam até os lotes estarem medidos e seus abrigos prontos. ArtedeCesarP.Viana
Os imigrantes que se estabeleceram na localidade do Barracão desembarcaram no porto de Itajaí e subiram o rio Itajaí-Mirim até o atual Óleo Grande e Barracão. Eram instalados no barracão de imigrantes que existia naquela localidade até que pudessem receber seus lotes de terras demarcados para poderem começar a derrubada da mata para plantio da roça e construção da moradia. Daí a origem do nome do bairro Barracão. Leda Maria Baptista apresenta o nome de diversas famílias de origem italiana que colonizaram a região, como: Andrietti, Benvenutti, Barbi, Beduschi, Bertoldi, Bolomini, Nicoletti, Ogliari, Poli, Zuchi, Melatto,Venturini, Prebianca, entres outras. A vida naqueles tempos não era fácil. A terra pouco fértil e a topografia acidentada, os caminhos de difícil acesso pelos quais as mercadorias eram transportadas em carros-de-boi, tornavam a situação mais desafiadora. A comunidade ali estabelecida praticava o boi-de-mamão e o terno de reis, como também festas nos salões locais.
Eram em baús como esses que os imigrantes traziam seus pertences. Museu Arquidiocesano dom
Joaquim
ArtedeCesarP.Viana
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Ca p í tul o X
Os engenhos do Vale: farinha, açúcar e madeira
Aprimeiraatividadeeconômica: procurando ouro Uma das primeiras atividades econômicas praticada na região de Gaspar, no início de seu povoamento, foi a extração de ouro. Documentos antigos registram a presença de aventureiros e exploradores à procura de ouro já no século 18, quando a população não indígena dessas terras mal contava algumas dezenas. Ao longo do tempo, alguns exploradores se aventuraram pelo rio Itajaí-Açu à procura de ouro e se estabelecerem próximos aos ribeirões, local Desenho de um colono com a bateia minerando um ribeirão. Arte de Cesar P. Viana onde procuravam pelo ouro de aluvião, que era encontrado misturado com a areia. Ali, passavam dias e mesmo semanas trabalhando na esperança de encontrarem o precioso metal. Por esse motivo, alguns lugares do município receberam nomes ligados a essa história, como por exemplo: Arraial do Ouro; Ribeirão das Minas; Minas; Coral das Minas.
A exploração da madeira A extração da madeira foi uma das principais atividades econômicas desde o tempo dos primeiros povoadores dessas terras que encontraram aqui uma floresta intocada, que possuía madeira de ótima qualidade. A qualidade e abundância da madeira existente logo deu origem a uma exploração com fins comerciais. A madeira extraída em Gaspar e demais regiões do Vale do Itajaí era utilizada pelos moradores na construção de suas casas e engenhos. Porém a maior parte era transportada até o porto de Itajaí onde era comercializada. Serraria de Félix Busso Asseburg em Itajaí. A madeira retirada na região de Gaspar tinha destino certo: o porto de Itajaí. Arquivo HisDepois de derrubarem as árvores, com auxílio tórico José Ferreira da Silva 51
de machados e serras manuais, os colonos tinham de arrastá-las até o rio Itajaí-Açu. Colocavam as toras dentro dos ribeirões e, utilizando juntas de bois, puxavam as toras até o rio. As toras eram amarradas umas as outras, formando uma enorme balsa, que era levada rio abaixo até o porto, onde eram comercializadas. A viagem era demorada, podia-se levar mais de um dia e esses homens ficaram conhecidos como balseiros. Com a exploração da madeira, boa parte da floEra assim que se retirava madeira do mato. A imaresta original do vale foi devastada, sobrando poucas gem mostra um grupo de homens serrando tábuas com machados e serras.Arquivo Histórico José Ferreira da Silva áreas da mata original.
O trabalho agrícola e os engenhos Os primeiros povoadores de Gaspar, ao longo do século 19, trabalhavam na terra, ou seja, eram agricultores. Trabalho manual que exigia a participação de toda a família. Alguns produtos receberam maior atenção pela possibilidade de serem comercializados, como a cana de açúcar e a mandioca, produtos que geravam algum dinheiro para a família. Logo, as plantações de mandioca e de cana-de-açúcar tomaram conta de grande parte das terras agricultáveis da região. Essa produção deu origem a um grande número de engenhos pelo interior de Gaspar. A partir da cana produzia-se açúcar mascavo, aguardente, melado, rapadura e caldo de cana. Da mandioca extraía-se o polvilho e a farinha. Além dos trabalhos no cultivo da cana e no engenho, as famílias mantinham suas roças para atenderem as suas necessidades diárias. A maior parte dos alimentos consumidos era produzida em casa, onde também eram criados animais que eram destinados ao abate, como porcos, galinhas, patos, gansos, marrecos e gado, a fim de terem leite, ovos e carne ao longo do ano. Em muitas terras se plantava mandioca para a produção de farinha, que além de comercializada era um complemento indispensável à alimentação diária dos colonos. Os engenhos eram movidos à força animal e construídos com madeira da região. Do começo de abril até meados de setembro, os trabalhos nos engenhos eram intensos, começavam de manhã e seguiam até à noite.
Um elemento presente na história de Gaspar foram os engenhos: engenhos de serrar madeira; engenhos de farinha, engenhos de açúcar e os seus alambiques, onde se produzia a cachaça.Arte de Cesar P. Viana
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Documentos da História
Memórias de Henrique Pedro Zimmermann “Em volume de produção, predominava o açúcar mascavo, seguido de aguardente. Houve uma época em que, em Gaspar, se contavam mais de seiscentos engenhos de açúcar e alambiques. Aliás, os alambiques sempre foram um complemento quase necessário para a exploração econômica dos engenhos de açúcar, pois a sua matéria-prima era quase exclusivamente o melaço que escoava do açúcar que, depois de condensado, era posto em grandes recipientes de madeira de fundo perfurado, donde vertia o melaço e escorria para os grandes cochos”. BLUMENAU EM CADERNOS: Reminiscências. Blumenau, tomo X, n. 3, mar. 1969. “De começo de Abril até o mês de Setembro, nos engenhos, reinava uma grande atividade. Primeiro era a mandioca que era transformada em farinha; logo em seguida iniciava-se a moagem da cana de açúcar. Era uma temporada de atividade incessante, pois o trabalho dos colonos iniciava-se normalmente às quatro horas da manhã e seguia até a noite. Mas era uma segura fonte de renda para todos que se entregavam a esta atividade, porque tanto o açúcar como a aguardente e a farinha de mandioca encontravam boa aceitação nos mercados consumidores. A farinha de mandioca era completamente indispensável à alimentação diária dos colonos. Havia colonos que fabricavam centenas de sacas de açúcar, milhares de litros de aguardente e, também, centenas de sacas de farinha de mandioca. Daí a prosperidade econômica da maioria deles”. Texto Adaptado: Fragmento retirado de BLUMENAU
EM CADERNOS: Reminiscências. Blumenau, tomo X, n. 3, mar. 1969.
O comércio dos produtos coloniais Os agricultores negociavam seus produtos, na maioria das vezes, nas vendas locais. Existiam, na cidade de Gaspar, duas casas comerciais de destaque, a Casa Comercial de Adolfo Altemburg e a Casa Comercial de Carlos Procópio Hoeschl. Esses pontos comerciais compravam a produção dos colonos e revendiam-na em mercados mais distantes, como Itajaí, chegando a negociar os produtos com empresas do Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e até do Uruguai e da Argentina, segundo o escritor gasparense Henrique Pedro Zimmermann. No início do século 20, quando se precisava comprar algum produto, ia-se até a venda, também chamada de armazém de secos e molhados. Nesses estabelecimentos, os moradores locais encontravam os produtos de que necessitavam. Ali, as mercadorias eram trocadas “in natura”, sem o uso de dinheiro. O vendeiro, como era chamado o dono do estabelecimento, adquiria os produtos dos agricultores e lhes fornecia em troca sal, pólvora, charque, ferramentas, pregos, corda, querosene, chumbo, louça, remédio, velas de sebo, tecidos, etc. Produtos que os colonos, na maioria das vezes, não produziam e precisavam adquirir junto ao comércio local.
A usina Com a chegada das usinas de açúcar, os pequenos produtores coloniais enfrentaram dificuldades ao encararem a concorrência e, aos poucos, foram abandonando a produção e dedicando-se a outras atividades. Grande parte dos engenhos domésticos desapareceu. Algumas famílias ainda preservam parte dos engenhos em seus sítios, mas não produzem mais. No ano de 1925, foi construída, no centro da cidade, a Usina de Açúcar São Pedro. Com grande capacidade de processamento de cana, passou a comprar as plantações de cana da região para a 53
produção do açúcar. A produção era trazida de várias partes do município por carroças e também pelo rio. Em meados de 1970, a usina deixou de funcionar e o seu prédio permaneceu de pé até o ano de 2003, quando foi demolido.
Usina de Açúcar São Pedro, em Gaspar, construída em 1925 por Eurico da Silva Fontes Foto Marcio Segio Marquete
Documentos da História
Memórias de Henrique Pedro Zimmermann “No tempo da farinhada também havia coisas boas, que atraíam os meninos do meu tempo aos engenhos. Era então o tempo em que se faziam os gostosos beijús de farinha de mandioca. Havia os salgados e os doces, ambos de sabor muito agradável, além de nutritivos. Quando chegávamos num engenho onde estavam fazendo beijús, podíamos comer quantos quiséssemos, mas também eram feitos por encomenda, em maior quantidade, que as famílias costumavam comprar e guardar em recipientes bem fechados para o consumo da casa. Como eram gostosos, esses beijús! Derretiam na boca, eram um suplemento bom para um café com leite e... custavam tão pouco. Os tempos, porém, mudaram e os costumes também. Os numerosos engenhos de açúcar deram lugar às grandes usinas e já ninguém mais gosta do saboroso açúcar mascavo, claro, loiro como ouro. ... A garapa das usinas também não é a mesma como a dos engenhos; não tem o mesmo sabor agradável, a mesma doçura macia... E as usinas não fazem rapadura e não distribuem melado...”. BLUMENAU EM CADERNOS: Reminiscências. Blumenau, tomo X, n. 3, mar. 1969.
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Ca p í tul o X I
Uma História Política
Gaspar nem sempre foi uma cidade com território e governo próprio. Conseguiu sua independência administrativa somente em 1934, quando deixou de pertencer ao município de Blumenau. Até então, era um Distrito de Blumenau, ou seja, fazia parte daquele município. Seus moradores participavam das eleições dos vereadores e prefeitos daquela cidade. Os impostos arrecadados pelos moradores do então Distrito de Gaspar eram enviados para Blumenau, que realizava a redistribuição conforme seus interesses. As obras realizadas aqui eram decididas pelo governo municipal que ficava em Blumenau. Enfim, até 18 de março de 1934, não existia o município de Gaspar.
Vejamos essa história com mais detalhes: Entre os anos de 1827 a 1832, o território de Gaspar pertenceu à administração de São Francisco do Sul. Parece estranho, mas devemos lembrar que o número de habitantes nessa época era pequeno. Mesmo na cidade de Itajaí, onde fica o porto, o número de habitantes era pequeno. Grande parte do território era coberto pela floresta onde, durante o verão, os Xokleng buscavam por comida. Outro fato é que a Colônia Itajaí (chamada também de Colônia do Pocinho), que deu origem a Gaspar, só seria criada em 1835.
ArquivohistóricoJoséFerreiradaSilva
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Depois, a região passou a pertencer ao município de Porto Belo (1832 a 1859). Para que um morador que vivesse em Gaspar chegasse até lá, deveria descer o rio até Itajaí e, ali, encontrar uma embarcação que fosse a Porto Belo. Era uma viagem demorada e lenta. No ano de 1859, Gaspar foi incorporado ao município de Itajaí, situação que permaneceu até 1880, quando passou a fazer parte de Blumenau. Entre os anos de 1880 a 1934, a cidade permaneceu na condição de Distrito de Blumenau.
1827 a 1832 1832 a 1859 1859 a 1880 1880 a 1934 18/03/1934
Gaspar pertenceu a São Francisco do Sul Gaspar pertenceu ao município de Porto Belo Gaspar pertenceu ao município de Itajaí Gaspar pertenceu ao município de Blumenau Gaspar foi emancipado
A partir de 1930, os gasparenses começaram a se organizar a fim de conseguirem a emancipação, que significava deixar de fazer parte de Blumenau e se tornar um município independente. Queriam ter o seu próprio governo. As lideranças políticas de Blumenau não aprovavam a separação, não queriam perder a parte do território que lhes rendiam uma boa parte dos impostos arrecadados. Em outras palavras, ao perder o distrito de Gaspar, o valor arrecadado seria menor. Grupos políticos se organizaram e tentaram impedir a separação. Escreviam na imprensa contra a emancipação do distrito; organizaram passeatas pela cidade. A luta foi tanta que alguns industriais chegaram a suspender o trabalho dos operários das fábricas para que participassem dessas passeatas. Fora criado, por esse tempo, em Blumenau, um movimento chamado de “Por Blumenau Unido”, que organizou passeatas e publicou notícias na imprensa expressando sua opinião contra a separação do distrito de Gaspar. Enquanto em Blumenau se tentava impedir a emancipação, em Gaspar se organizava lista de assinaturas a favor dela. Aqueles que eram a favor afirmavam que Gaspar possuía território, população, rendas suficientes e desenvolvimento econômico capaz para se constituir em município. Rebelião dos blumenauenses contra o desmembramento do município (21/02/1934). Apesar de todo empenho Movimento “Por um Blumenau unido”. Arquivo histórico José Ferreira da Silva 56
das lideranças blumenauenses, o cel. Aristiliano Ramos, Interventor Federal em Santa Catarina, assinou, em 17 de fevereiro de 1934, o decreto emancipando o município, que foi instalado no dia 18 de março. Dias antes, 05 de março, o interventor Aristiliano nomeou o 1º prefeito de Gaspar: Leopoldo Schramm, na condição de prefeito provisório. A partir de então, Gaspar passou a ser mais uma cidade catarinense.
Documentos da História
ArtedeAldoMaesdosAnjos
Decreto nº 499 O coronel Aristiliano Ramos, Interventor Federal no Estado de Santa Catarina, no uso de suas atribuições, e considerando que o atual distrito de Gaspar possui população, território e rendas suficientes e desenvolvimento econômico capaz de se constituir município; […] Considerando, ainda, que de longa data os habitantes do distrito em memoriais, petições e abaixo assinados, devidamente comprovados e documentados, têm procurado a sua emancipação; […] Art. 1 – Fica criado o município de Gaspar, cujo território, que é desmembrado de Blumenau […] Art. 2 – A sede do município será o povoado de Gaspar, que é elevado à categoria de Vila; Art. 4 – A instalação do município se procederá no dia 18 de março vindouro. Palácio do Governo em Florianópolis, 17 de fevereiro de 1934. Aristiliano Ramos Plácido Olímpio de Oliveira
Documentos da História
Jornal O Pharol – 17 de março de 1934 Será solenemente instalado, amanhã, o novo município de Gaspar, aviado por recente decreto do Governo Estadual. Como seu território é confinado com o nosso município, servindo-se no nosso porto escoamento dos seus produtos, com as suas atividades industriais e agrícolas unidas, por muitos laços, às nossas atividades, a população gasparense sempre foi olhada pelos itajaienses com a simpatia que inspiram os bons vizinhos. Essas razões constituem motivos suficientes para que o regozijo que inunda a alma dos habitantes daquele tradicional território, ao terem sua independência comunal assegurada no dia de amanhã, seja também compartilhada pelos itajaienses. O ato oficial da instalação se verificará às 10 horas (domingo), devendo ao mesmo comparecer o representante do Sr. Interventor Federal neste Estado, autoridades, alunos das escolas e associações locais incorporadas, etc. Após a instalação, terá início o programa dos festejos abrilhantados pela banda musical de Brusque. BAPTISTA,
Leda Maria. Memória Gasparense: emancipação política de Gaspar: 1934. n. 1, 18 mar. 1992. p. 13.
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Em outubro de 1930, o Brasil passou a ter um novo presidente: Getúlio Vargas. Assumiu o governo através de um Golpe Militar, ou seja, ocorreu uma luta armada contra o antigo presidente Washington Luís. Como o governador de Santa Catarina, Fúlvio Aducci, lutou a favor do presidente Washington Luís e contra Getúlio Vargas, o Estado de Santa Catarina, durante o governo de Getúlio Vargas, foi governado por um Interventor, que era um governante escolhido diretamente pelo presidente. Assim, o governador de Santa Catarina não era eleito, mas sim imposto pelo presidente, pois ele tinha medo que ocorressem revoltas contra seu governo. Em Gaspar, existiam políticos ligados ao partido do presidente Getúlio Vargas. Um deles era Leopoldo Schramm, membro do Partido Liberal Catarinense. No ano de 1934, o Estado de Santa Catarina era governado pelo interventor Aristiliano Ramos, homem escolhido por Getúlio Vargas. O Interventor assinou, em 17 de fevereiro, o Decreto Estadual nº 499, emancipando o município de Gaspar e, em 5 de março, nomeou Leopoldo Schramm para o cargo de prefeito provisório do município. No ano de 1936, Leopoldo Schramm foi eleito pelo voto popular para o cargo de prefeito. Seu mandato durou até 1946. Assim, permaneceu 12 anos como prefeito.
FotoReprodução
AristilianoRamos.FotoReprodução
Biografia
Leopoldo Schramm Nascido em 06/09/1890 no Distrito de Gaspar, filho de Luiz Schramm e Bertha Fricker (agricultores). Casou com Cecília Zimmermann em 25/09/1911. Fixou residência no Distrito de Gaspar em 1920 aproximadamente, exercendo a profissão de ferreiro. Em 1930, Leopoldo Schramm foi nomeado 2º tenente do 8º Batalhão de Reserva da Força Pública e participou ativamente na revolução comandada por Getúlio Vargas. Em 1933 foi nomeado pelo Prefeito provisório Antonio Cândido de Figueiredo, fiscal da Prefeitura de Blumenau. Em 18/03/1934, foi nomeado primeiro Prefeito do novo município, Gaspar, o qual administrou até 1946. Faleceu em 08/04/1948. 58
Leopoldo Schramm, primeiro prefeito de Gaspar. Foto Reprodução
Ca p í tul o X I I
Gaspar e a Estrada de Ferro Santa Catarina (EFSC)
Desde a fundação, cidades como Gaspar, Blumenau e Ilhota, sofreram com a falta de boas estradas que facilitassem o transporte dos seus produtos e o trânsito de pessoas, limitando seu crescimento. Com o objetivo de resolver parte desse problema, foi construída, em 1909, uma estrada de ferro, ligando Blumenau à comunidade do Warnow (Indaial). O trecho inicial foi inaugurado em 3 de maio de 1909, com a participação de autoridades e grande público. Mas os trilhos dessa ferrovia só chegaram a Gaspar no ano de 1954, cerca de 45 anos depois. Depois de pronta, a ferrovia li- Nesta imagem panorâmica da cidade de Gaspar pode-se identificar um dos trechos da Estrada de Ferro Santa Catarina que cortavam a cidade. Arquivo Histógava o porto de Itajaí à cidade de rico José Ferreira da Silva Trombudo Central, no Alto Vale. A construção da Estrada de Ferro Santa Catarina foi de grande importância para a economia regional, pois facilitava o transporte de mercadorias e pessoas, já que a viagem se tornava mais rápida e segura.
Neste mapa é possível identificar o trecho da ferrovia ligando o Porto de Itajaí à cidade de Trombudo Central. Arte de Cesar P. Viana
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Marcas do Passado Ao caminhar pela cidade, é possível identificar “marcas do passado” que nos chamam a atenção. São partes da ferrovia que um dia cortou o município, como a estação existente no bairro Figueira, por exemplo. No dia 18 de dezembro de 1954, a estação ferroviária de Gaspar foi inaugurada. A estação ficava nas proximidades de onde hoje está localizada a associação da Lince. O trem cortou a cidade durante os anos de 1954 até 1971. Com a abertura de novas estradas e o crescimento do número de carros e caminhões, a fer- Estação da Estrada de Ferro Santa Catarina. Foto de Anderson Rorovia foi desativada. No dia 12 de março de 1971, a drigues dos Santos “... locomotiva 331 e seus quatro vagões passaram pela última vez...” por Gaspar. Em 1975, terminaram os trabalhos de retirada dos últimos trilhos. Atualmente, alguns pontilhões e estações ainda podem ser vistos espalhados pela cidade. A estação de Gaspar foi inaugurada em 18 de dezembro de 1954. A partir de então, a estrada de ferro fazia a ligação com o porto de Itajaí, passando por Ilhota, atravessando a área central de Gaspar, seguindo até Blumenau. Dali, os trilhos seguiam até o alto vale. O objetivo da estrada era ligar o porto à outra estrada de ferro que cortava Santa Catarina na direção norte/sul, em Herval do Oeste. Mas isso não ocorreu. Antigo pontilhão da Estrada de Ferro Santa Catarina. Foto de A estação de Ilhota foi inaugurada com o prolon- Anderson Rodrigues dos Santos gamento da linha, de Blumenau até Itajaí, em 1954.
A estação de Gaspar foi inaugurada em 18 de dezembro de 1954. A partir de então, a estrada de ferro fazia a ligação com o porto de Itajaí, passando por Ilhota, pela área central de Gaspar, até Blumenau. Dali, os trilhos seguiam até o alto vale.
A estação de Ilhota foi inaugurada com o prolongamento da linha, de Blumenau até Itajaí, em 1954.
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ArtedeCesarP.Viana
EFSC - Trecho em construção (Blumenau-Gaspar 1944). Fonte Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
Documentos da História
Memória de Henrique Pedro Zimmermann sobre a inauguração da Ferrovia em 1909 “... A cidade de Gaspar ficou alvoroçada quando soube que alguns de seus homens, autoridades, comerciantes e outros mais haviam recebido convites para assistirem à inauguração da Estrada de Ferro Santa Catarina em 1909. Dois desses convites, um dirigido ao meu pai, o outro ao meu avô, chegaram a nossa casa. Eram cartões de cor vermelho-marrom, impressos a ouro, nos quais se lia que excelentíssimo senhor fulano de tal era convidado para participar da viagem inaugural do primeiro trem que, partindo de Blumenau no dia 3 de maio de 1909, viajaria até a estação de Warnow, donde retornaria a Blumenau. Os dois aceitaram o convite e seguiram de carro até Blumenau, onde, no dia 3 de maio, embarcaram na viagem inaugural da ferrovia, retornando à noite para Gaspar. O que, porém, mais os satisfez e que por muito tempo se comentava com outros convidados de Gaspar que também haviam participado da viagem inaugural, foi a mensagem contida nos discursos que na ocasião foram pronunciados: de que a linha da estrada de ferro passaria por Gaspar até o porto de Itajaí. Porém o trecho da ferrovia chegou à cidade somente 45 anos depois, em 1954”. Texto Adaptado:
BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo X, n. 8, ago. 1969.
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EFSC - Estrada de Ferro Santa Catarina
A Estrada de Ferro Santa Catarina cruzava o Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Quando foi inaugurada, em 1909, ligava Blumenau ao Warnow, em Indaial. Sua extensão máxima foi de 184 quilômetros. Construída no início do século passado por descendentes alemães, a E. F. Santa Catarina foi inaugurada em 03 de maio de 1909 e desativada em 1971, sendo que sua última utilização ocorreu na enchente de 1984 para atendimento às vítimas da catástrofe. Seu projeto original era ligar o Porto de Itajaí até a Argentina, e se encontraria com a linha Rio Negro - Vacaria em Ponte Alta (entre Curitibanos e Lages) e com a linha Itararé Uruguai em Herval d’Oeste, até alcançar a fronteira em Dionísio Cerqueira. Porém a linha jamais atingiu a Serra Geral, tendo Braço do Trombudo seu ponto final. Foi uma ferrovia isolada, partindo do litoral (Itajaí) no sentido do interior, buscando a ligação com as linhas que cortavam o interior do Estado, o que não aconteceu. Isolada da malha nacional (rede de trilhos que cortava o país), a ferrovia foi caindo em desuso. Com a abertura do asfalto da BR 470, a ferrovia perdeu ainda mais importância. Foi finalmente desativada em 1971. Logo em seguida os trilhos foram retirados, sob protestos da população. Texto adaptado: ESTRADA DE FERRO SANTA CATARINA. In: WIKIPÉDIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Estra-
da_de_Ferro_Santa_Catarina>. Acesso em: 26 jan. 2012.
ArtedeAldoMaesdosAnjos
Bibliografia Consultada GIESBRECHT, Ralph Mennucci. Estações ferroviárias do Brasil. Disponível em: <http://www.estacoesferroviarias.com.br/efsc/blumenau.htm>. Acesso em: 26 jan. 2012. ESTRADA DE FERRO SANTA CATARINA. In: WIKIPÉDIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Estrada_de_Ferro_Santa_Catarina>. Acesso em: 26 jan. 2012. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo X, n. 8, ago. 1969.
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Ca p í tul o X I I I
um breve histórico da economia do município
Ao longo de sua história, a cidade de Gaspar sofreu mudanças acentuadas em sua economia. Deixou de ser uma economia baseada somente na atividade agrícola e hoje apresenta o crescimento dos setores industrial e de serviços. Ao longo do século 19, a agricultura e a extração de madeira foram atividades dominantes. Praticamente não havia indústrias. A região contava com centenas de famílias que se dedicavam à pequena produção familiar, retirando da terra seu sustento. Havia os engenhos de farinha e de açúcar que beneficiavam os produtos produzidos pelos colonos. Nesses engenhos se produzia açúcar mascavo, melado, cachaça e farinha. Em suas propriedades, as famílias produziam grande parte dos alimentos necessários ao seu consumo, como arroz, feijão, batata, abóbora, milho, etc., como também mantinham em suas propriedades árvores frutíferas que lhes forneciam laranjas, jabuticabas, ameixas, bananas, araçás, goiabas, tangerinas que, além de serem consumidos in natura, eram utilizados para a produção de doces e geleias. Criavam, em seus terreiros, galinhas, patos, marrecos, gansos, além de porcos e gado. Da criação de animais saía ainda ovos, leite, queijos, nata, queijinho e carne. Assim, todos esses produtos não precisavam ser comprados, contribuindo para a economia familiar. Parte dessa produção era comercializada nas vendas locais, momento em que a família realizava a troca por produtos de que necessitava. Atualmente, os principais produtos agrícolas produzidos na cidade são: arroz irrigado, mandioca e milho. E uma produção agrícola de subsistência em menor escala. PRODUtOS
2001
2002
2003
2004
2005
Arroz Irrigado
24.000
29.440
31.280
31.280
33.320
Mandioca
4.000
2.400
2.400
2.400
2.400
Milho
690
555
555
555
555
Banana
546
546
546
546
546
Cana de Açúcar
20.000
10.500
10.500
12.250
17.500
Feijão
22
16
24
16
16
Fumo
20
15
15
8
8
Valores em toneladas. Fonte: Secretaria Municipal de Agricultura
Ainda conta com um rebanho de corte e leite aproximado de 16 mil cabeças e uma crescente produção de peixes. Existem, no município, cerca de 200 produtores de peixe (piscicultores) e 18 pesque-pague. 63
A tabela abaixo mostra a evolução nos principais rebanhos entre 2001 e 2005 em Gaspar. REBANHOS
2001
2002
2003
2004
2005
Bovinos
13.065
13.700
13.700
14.500
15.580
Ovinos
265
350
350
800
850
Suínos
4.470
4.220
4.220
4.550
4.548
Fonte:SecretariaMunicipaldeAgricultura
No setor secundário, que trata das indústrias, Gaspar é sede da BUNGE, empresa multinacional do ramo de alimentos. Destaca-se na área têxtil com dezenas de empresas que atuam no ramo e, entre elas, a LINHAS CíRCULO, fundada em 1938. Outra empresa de destaque na cidade é a PLASVALE, que atua na produção de utensílios plásticos. A cidade também possui diversas empresas de diferentes setores, gerando trabalho, renda e riquezas para o município.
Sede das Indústria de Linhas Círculo. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
SEtORES
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
Indústria
531
638
722
831
813
770
823
848
Comércio
825
1.008
1.040
1.017
925
825
869
901
Serviço
404
532
630
674
695
741
707
717
Agências Bancárias
5
5
5
5
5
8
8
9
Hotéis
2
2
2
2
2
6
5
7
Pousadas
-
-
4
4
4
2
2
-
Restaurantes
12
12
28
30
27
35
22
32
SecretariadeAdministração/Finanças(tributação)
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Principais Indústrias por Gêneros de Atividades
• Alimentício: Bunge Alimentos, Laticínios Terra Boa, Embutidos Schmitz, Coopergaspar • Diversos: Protótipo Estruturas Especiais, Tyresblu Pneus e Acessórios, Risschbieter Engenharia, TLA Capacitores • Editorial e Gráfica: Sulforms, Cromograf, Cromolaser, Graficart, Gráfica Futura • Madeireira: Madeiras Figueiredo, Madereira Werner, Serraria Rampelotti • Metalurgia: Metalúrgica Turbina, Metalúrgica Independência, Unifap, Companhia Brasileira de Alumínio – CBA, Metalúrgica Prada, Fundição Alumetaf • Moveleira: Móveis Gamba, Móveis Pereira, Móveis Estilo, Móveis Schmitz Ltda, Nova Móveis • Plásticas: Plasvale, Vineplast, Sacoplast, Tuboplast, Real Plastic • Têxtil: Indústria de Linhas Leopoldo Schmalz, Dicotone Têxtil, Isapatex, Class Malhas • Vestuário: Farfalla Têxtil, Confecções Schaffer, Majule Têxtil, Randa Mundu Confecções, Parolli Fonte: Secretaria Municipal de Indústria, Comércio e Turismo
No setor terciário a cidade apresenta diversas empresas que atuam na prestação de serviços, desde lojas a empresas hoteleiras, setor que emprega boa parte da população local. No setor turístico destaca-se o ecoturismo, com destaque para o “Roteiro das Águas” com diferentes parques aquáticos que atraem centenas de turistas para a cidade nos meses de verão. A estrutura hoteleira da cidade gira em torno de 1.100 leitos, além de apresentar potencial área para expansão do turismo rural e ecológico.
Gaspar Hoje A origem do nome “Gaspar”.
Sobre a origem do nome “Gaspar” não se tem certeza, mas tudo indica que surgiu em homenagem ao Rei Mago Gaspar, personagem das histórias bíblicas. Temos ainda o nome do Rei Mago Belchior, que dá nome a três bairros do município. É provável que o nome do terceiro rei mago, chamado Baltazar, tenha sido alterado ao longo do tempo. Vejamos o que escreve a pesquisadora Maria Zilene Cardoso sobre o assunto. “A origem do nome Gaspar é bastante controvertida. Uma das hipóteses sustentadas pelos antigos moradores é a de que o topônimo “Gaspar” provém do Santo Rei Mago, aludindo em testemunho da afirmação e existência no município do lugar denominado “Belchior”, nome pretensamente tirado do outro rei, que era “Melchior”. O “Baltazar” deveria ter sido o atual Gaspar Pequeno, ou então o Ribeirão do Arraial que tomou esse nome após a criação do Arraial do Pocinho”.
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A Origem dos nomes dos Bairros Bela Vista – recebeu essa denominação tendo em vista a localização, na região, de um clube com esse nome que, com o tempo, passou a ser utilizado para se referir ao bairro. Figueira – no caminho entre Gaspar e Blumenau havia uma figueira que abrigava os viajantes e servia de ponto de referência. Por fim, passou a denominar o nome do bairro. Coloninha – famílias residentes no centro da cidade tinham plantação e criação de gado nessa região e chamavam as propriedades de colônias, daí o nome Coloninha. Gaspar Grande – seu nome tem origem por ser essa área cortada pelo ribeirão Gaspar Grande. Gaspar Alto – seu nome tem ligação com sua localização, ou seja, por estar em uma região mais acidentada onde está a nascente do Ribeirão Gaspar Grande. Gasparinho – era chamado de Gaspar Pequeno, porque suas terras iam até o ribeirão Gaspar Mirim. Daí originou-se o bairro Gasparinho e o bairro Gaspar Mirim. Alto Gasparinho – seu nome tem ligação com sua localização, ou seja, por ser onde nasce o Ribeirão Gasparinho. Sete de Setembro – antiga rua do Caramujo, é uma homenagem à Independência do Brasil. Lagoa – nos primeiros tempos da colonização, era uma região inóspita, com áreas alagadas, com lagoas fundas cheias de jacarés. Arraial do Ouro – Arraial é denominação de lugar, e ouro por causa do minério encontrado na região. O bairro é cortado pelo ribeirão do Arraial. Belchior Baixo, Belchior Central e Belchior Alto – estão relacionados ao nome do Rei Mago Belchior, personagem bíblico. Foi onde teve início a colonização em 1835, quando da criação da Colônia do Pocinho. Santa Terezinha – leva esse nome em homenagem à Santa Terezinha. Margem Esquerda – por localizar-se à margem esquerda do rio. Barracão – No atual bairro Barracão fora construído um “Barracão de Imigrantes” para abrigar, temporariamente, os imigrantes italianos recém-chegados a partir de 1875, daí a origem do nome. Centro – leva esse nome pois é onde está o centro político e comercial da cidade. ArtedeCesarP.Viana
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Relação de Prefeitos Municipais de Gaspar 1934-1947 1947-1951 1951-1956 1956-1961 1961-1966 1966-1970 !970-1973 1973-1977 1977-1983 1983-1988 1989-1992 1993-1996 1997-2000 2001-2004 2005-2008 2009-2012
Sr. Leopoldo Schramm Sr. João dos Santos Sr. Júlio Schramm Sr. Dorval Rodolfo Pamplona Sr. Pedro Krauss Sr. Evaristo Francisco Spengler Sr. Paulo Wehmuth Sr. Osvaldo Schneider Sr. Luiz Fernando Polli Sr. Tarcísio Deschamps Sr Francisco Hostins Sr. Luiz Fernando Polli Sr. Bernardo Leonardo Spengler Sr. Pedro Celso Zuchi Sr. Adilson Luis Schmitt Sr. Pedro Celso Zuchi
Brasão do município O 1º Brasão de Armas de Gaspar foi criado em 1959 pelo Prefeito Dorval Rodolfo Pamplona. Significados dos símbolos: • Estrela: Gaspar é município autônomo • Arroz e cana: Principais produtos agrícolas. • Escudo verde: exuberância das matas e a abundância agrícola. • Faixa azul: O rio dividindo o território. • Chaves: lembram o padroeiro da paróquia São Pedro Apóstolo. • Ferramentas agrícolas: principal atividade econômica na época. • Listel vermelho - 1861: criação da Freguesia de São Pedro Apóstolo de Gaspar. • 1934: criação do município de Gaspar. 67
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Ca p í tul o X I V
Linha do tempo da História de Gaspar
1800 – nesse período o Vale do Itajaí é ocupado pelos Xokleng e por poucos moradores na área litorânea. 31 de março de 1824 – Criação do Curato do Santíssimo Sacramento de Itajaí. Provisão episcopal de Dom José Caetano da Silva Coutinho, Bispo do Rio de Janeiro, cria o Curato e provê como seu capelão curado o Revmo. Frei Pedro Antônio Agote. 12 de agosto de 1833 – Itajaí é elevado à categoria de Paróquia de Nossa Senhora da Conceição. 05 de maio de 1835 – o governo da Província de Santa Catarina, através da Lei Provincial nº 11, de 5 de maio de 1835, criou a Colônia do Pocinho, às margens do rio Itajaí-Açu. 31 de março 1842 – Chega a Itajaí Charles Van Lede em viagem de exploração ao Vale do Itajaí (1842). Van Lede funda a colônia Belga na localidade onde hoje se encontra o município de Ilhota em 27 de novembro de 1844. 02 setembro de 1850 – Dr. Hermann Bruno Otto Blumenau instala junto à foz do Ribeirão da Velha a Colônia Blumenau. 16 de julho de 1853 – Falecimento do Tenente Cel. Agostinho Alves Ramos, em Itajaí. 1854 – é extinta a Colônia do Pocinho, também conhecida pelo nome de Colônia Itajaí. 4 de abril de 1859 – a paróquia de Itajaí é elevada à Categoria de Vila e forma o município de Itajaí, instalado oficialmente em 15 de junho de 1860. A partir dessa data Gaspar passou a fazer parte desse município. 1860 – Pe. Francisco Alberto Gattone passa a residir em Belchior, permanecendo em Gaspar até 1867. 25 de abril de 1861 – criada a Freguesia de São Pedro Apóstolo de Gaspar, instalada oficialmente no dia 28 de julho de 1861. 69
23 de dezembro de 1861 – é nomeado Jeronymo Dürski professor de primeiras letras da Freguesia de São Pedro Apóstolo. 1864 – fundada a casa comercial de Carlos Procópio Höschl, a primeira casa de negócios do povoado de Gaspar. 1873 – a Freguesia de São Pedro Apóstolo de Gaspar passa a receber o vapor São Lourenço, dando maior impulso ao comércio. 1875 – nesse ano tem início a chegada dos primeiros imigrantes italianos a Gaspar e região.
1879 – o vapor “Progresso” passa a realizar a navegação no Itajaí-Açu, ligando Blumenau a Itajaí, com parada em Gaspar. 04 de fevereiro de 1880 – A Freguesia de São Pedro Apóstolo de Gaspar deixa de pertencer ao município de Itajaí e passa a fazer parte do recém-criado município de Blumenau. 29 de junho de 1885 – é inaugurada a Igreja Matriz de Gaspar, a segunda a ser construída no morro onde está o atual templo. 1885 – fundada em Gaspar a Primeira Escola Adventista da América Latina, na localidade de Gaspar Alto. 1895 – nesse ano o vapor Blumenau passou a realizar a navegação no Itajaí-Açu, parando nos portos de Gaspar. 1898 – criado o Coro Misto Santa Cecília, que continua em atividade nos dias de hoje. 07 de agosto de 1910 – inaugurada a Igreja Evangélica de Confissão Luterana de Gaspar. 01 de outubro de 1911 – Gaspar é atingido por uma grande enchente. 70
17 de fevereiro de 1934 – Interventor Aristiliano Ramos assina o decreto emancipando o Distrito de Gaspar. 05 de março de 1934 – Interventor Aristiliano Ramos nomeia, em caráter provisório, o 1º prefeito: Leopoldo Schramm. 18 de março de 1934 – é instalado oficialmente o município de Gaspar. 1938 – inaugurada a Praça Getúlio Vargas e plantada a figueira que ali está. 16 de junho de 1946 – fundada a Sociedade Clube Musical São Pedro. 1946 – inaugurada a primeira linha de ônibus diária para Blumenau. A viagem era feita por um ônibus movido a carvão de 24 assentos. 24 de outubro de 1948 – inauguração da Banda da Sociedade Clube Musical São Pedro. 1949 – fundado o jornal “O Gaspar” com circulação semanal. 15 de janeiro de 1952 – início do trabalho das Irmãs Franciscanas da Imaculada Conceição em Gaspar. Em 1953 é criado o Curso de Educação Infantil São José, atual Colégio Madre Francisca Lampel. 18 de dezembro de 1954 – inaugurado o trecho da Estrada de Ferro Santa Catarina ligando o porto de Itajaí a Blumenau, passando por Gaspar. 03 de maio de 1956 – inauguração da Igreja Matriz de Gaspar. 17 de maio de 1956 – entrava no ar oficialmente a Rádio Clube de Gaspar, atual Rádio Sentinela. Junho de 1960 – ocorreu a inauguração da Ponte Hercílio Deeke, iniciada em novembro de 1957, na gestão do prefeito Dorval R. Pamplona. 12 de março de 1971 – nesse dia ocorreu a última viagem do trem por Gaspar, pois a Estrada de Ferro Santa Catarina foi desativada. 25 de abril de 1961 – a Freguesia de São Pedro Apóstolo de Gaspar comemora seus 100 anos de criação.
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Bibliografia
Álbum do 1º Centenário de Brusque (1860-1960). Edição da Sociedade Amigos de Brusque. BAPTISTA, Leda Maria. Memória Gasparense: emancipação política de Gaspar: 1934. n. 1, 18 mar. 1992. p. 13. BAPTISTA, Leda Maria. Simplesmente Gaspar. Blumenau: Nova Letra, 1998. BLUMENAU EM CADERNOS: Reminiscências. Blumenau, tomo X, n. 3, mar. 1969. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo I, n. 4, fev. 1958. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo IX, n. 8, ago. 1968. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo X, n. 11, nov. 1969. BLUMENAU EM CADERNOS. Blumenau, tomo X, n. 8, ago. 1969. BONTUR – Bondinhos Aéreos. Projeto Parque Escola: A diversão que educa. Balneário Camboriú, 2000 (cartilha ambiental) CARDOSO, Maria Zilene. Gaspar, século XIX: as dificuldades para o seu povoamento inicial e a desmistificação de uma dependência. 1991. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-graduação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1991. Arquivo José Ferreira da Silva. CORREIA, Álvaro. Homens que fizeram história. Blumenau: Nova Letra, 2011. DEINFRA. Sobre as barragens de contenção de cheias de Santa Catarina. Disponível em: <http:// www.deinfra.sc.gov.br/barragens/sobre-as-barragens/>. Acesso em: 11 jan. 2012. DELL´ANTONIO, Lino João. Etimologia do termo Itajaí. Blumenau em Cadernos, Blumenau, tomo XLV, n. 07/08, jul./ago. 2004. ESTRADA DE FERRO SANTA CATARINA. In: WIKIPÉDIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/ Estrada_de_Ferro_Santa_Catarina>. Acesso em: 26 jan. 2012. GIESBRECHT, Ralph Mennucci. Estações ferroviárias do Brasil. Disponível em: <http://www.estacoesferroviarias.com.br/efsc/blumenau.htm>. Acesso em: 26 jan. 2012. LAVINA, Rodrigo. Os Xokleng de Santa Catarina: uma etnohistória e sugestões para os arqueólogos. 1994. 176f. Dissertação (Mestrado) – Mestrado em História, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, 1994. 73
MEMÓRIA GASPARENSE, n. 4, abr. 1995. O CENTENÁRIO DE GASPAR. Tomo IV, n. 4 abr.1961. PINSKY, Jaime. As primeiras civilizações. 16. ed. rev. e ampl.[S. l.]: Atual, 1994. (Discutindo a História). REBOUÇAS, Fernando. Fauna da Mata Atlântica. Disponível em: <http://www.infoescola.com/biologia/fauna-da-mata-atlantica>. Acesso em: 24 jan. 2012. RENAUX, Maria Luiza. O outro lado da história: o papel da mulher no Vale do Itajaí 185-1950. Blumenau: Ed. FURB, 1995. p. 22-23. SANTOS, Silvio Coelho dos. Índios e brancos no sul do Brasil: a dramática experiência dos Xokleng. Porto Alegre: Movimento, 1973. p. 83. SANTOS, Silvio Coelho dos. Os índios Xokleng: memória visual. Florianópolis: Ed. da UFSC, Ed. da Univali, 1997. SANTOS, Silvio Coelho. Índios e brancos no sul do Brasil: a dramática experiência dos Xokleng. Porto Alegre: Movimento, 1987. SÃO PEDRO APÓSTOLO DE GASPAR. Tomo IV, n. 5, maio 1961. SISGA. Bacia hidrográfica do Vale do Itajaí. Disponível em: <http://campeche.inf.furb.br/sisga/educacao/ensino/baciaValeItajai.php>. Acesso em: 10 mar. 2012.
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