EDIÇÃO PDF Directora Graça Franco
Segunda-feira, 27-04-2015 Edição às 08h30
Editor Raul Santos
Mais de três mil mortos no Nepal. Um milhão de crianças afectadas pelo terramoto Castelo Branco. Oito reclusos hospitalizados em estado grave Ensino artístico em asfixia financeira
Mais de 26 mil pessoas passaram pelos Dias da Música
Papa “estará em As pulsações do Os media e as casa”, diz Cardeal Benfica-Porto. “pessoas como Patriarca de Lisboa Ligámos os adeptos à máquina nós” (literalmente) MANUEL PINTO
O comandante que defendeu eleições quando todos se calavam
Estreia de filme inédito de Manoel de Oliveira já tem data marcada
Jornalista investiga mistério do navio “Angoche” mais de 40 anos depois
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Mais de três mil mortos no Nepal. Um milhão de crianças afectadas pelo terramoto
segundo abalo, de intensidade 6.7, foi sentido no domingo e provocou uma nova avalanche. Para já, o balanço conhecido é de 17 vítimas mortais entre os alpinistas.
Ensino artístico em asfixia financeira Verbas do Fundo Social Europeu só chegaram até Novembro. “Só estamos a laborar porque temos a boa compreensão de todos os funcionários”.
UNICEF está preocupada com as condições sanitárias das crianças. Foto: Narendra Shrestha/EPA
No Nepal, o número de vítimas foi actualizado nas últimas horas, elevando para 3.218 os mortos e mais de 6.500 os feridos. As operações de busca e salvamento prosseguem e a Katmandu começaram já a chegar aviões com ajuda humanitária. Além dos medicamentos, alimentos e roupas, levaram equipas médicas e de busca e socorro dos Estados Unidos, da Índia, da Bélgica, do Japão e de França. Segundo a agência Reuters, milhares de pessoas passaram a noite amontoadas debaixo de tendas ou ao relento com medo de novas réplicas. Parte delas procura comida e medicamentos. A mesma agência noticiosa adianta que a chegada de ajuda internacional tem sido prejudicada pelas réplicas do primeiro abalo. E, no terreno, as equipas de resgate dão já sinais de cansaço, depois de dois dias de trabalho ininterrupto. Além disso, o sistema de saúde começa a ceder, pressionado pela necessidade de prestar auxílio a milhares de pessoas. Nas últimas horas, a Comissão Europeia disponibilizou três milhões de euros para ajudar o Nepal. O mecanismo europeu de protecção civil foi activado. Um milhão de crianças em situação severa A UNICEF revela esta segunda-feira que perto de um milhão de crianças vive nas zonas mais afectadas pelo terramoto de sábado e que estão a ser afectadas por más condições sanitárias e água potável. Segundo a agência das Nações Unidas para as Crianças, a preocupação é agora prevenir doenças. No sábado, o Nepal foi abalado por um sismo de 7.9 na escala de Richter. É considerado o pior tremor de terra no país desde 1934, quando morreram 8.5400 pessoas. O terramoto atingiu, sobretudo, a capital, Kathmadu, mas também países vizinhos, como a Índia. Desencadeou também uma avalanche no Monte Evereste, onde se encontravam muitos alpinistas. Um
Foto: DR
O ensino artístico está no limite. A asfixia financeira está a impedir o pagamento de salários a três mil professores nas 79 escolas de ensino artístico especializado, espalhadas pelo país. Auxiliares e administrativos também não recebem. O cenário repete-se em mais de 75% dos conservatórios de música do país, que estão desde Dezembro sem receber qualquer verba do Fundo Social Europeu, que lhes chega através do Estado. “Como deve compreender, isto causa constrangimentos enormes à liquidez das escolas”, diz à Renascença Pedro Rovira, director administrativo de três escolas do centro: Coimbra, Figueira da Foz e Pombal. “Neste momento, só estamos a laborar porque temos a boa compreensão de todos. No nosso caso, estamos a falar em mais de 100 pessoas que têm sido inexcedíveis, profissionais de mão cheia. Não fosse isso, não conseguiríamos estar abertos”, acrescenta. Os salários estão em atraso desde Março. Com excepção das escolas de Lisboa e Vale do Tejo e Algarve, a maioria teme fechar portas e, face à falta de resposta por parte do Ministério da Educação, preparam-se para um dia de protesto, marcado para quinta-feira.
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Mais de 26 mil pessoas passaram pelos Dias da Música Na edição do próximo ano os Dias da Música vão "dar a volta ao mundo em 80 concertos", anuncia a organização.
Estreia de filme inédito de Manoel de Oliveira já tem data marcada "Visita ou memórias e confissões" vai ser exibido publicamente na Cinemateca de Lisboa.
Foto: Tiago Petinga/Lusa (arquivo)
Os concertos da nona edição de os Dias da Música, no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, tiveram uma taxa de ocupação de 89%, tendo cerca de metade tido lotação esgotada, anunciou a organização. Durante os três dias da iniciativa, que começou na sexta-feira e este ano foi dedicada ao cinema, dos 64 concertos em sala, 35 tiveram lotação esgotada, tendo sido até às 17h00 de deste domingo emitidos 26.646 dos 30.182 bilhetes disponíveis. Além dos concertos em sala, fizeram também parte da programação 11 concertos informais, realizados no Coreto e num palco de música ao ar livre, seis conferências e realizaram-se 19 sessões no Espaço Cinema. Nesta edição, com o mote "Luzes, Câmara... Música!" e com um orçamento de 500 mil euros, participaram cerca de 1.700 músicos. O cartaz da nona edição de os Dias da Música incluiu entre outros, a Big Band Júnior, o pianista Mário Laginha, a Camerata Atlântica, o violinista Bruno Monteiro, acompanhado pelo pianista João Paulo Santos, o Ensemble Darcos, os acordeonistas Gonçalo Pescada e Paulo Jorge Ferreira, o Grupo Vocal Olisipo. Os Dias da Música têm também iniciativas dedicadas às crianças, como o Mini Dias da Música, no âmbito do qual mais de 600 crianças assistiram a sete concertos, nos quais actuaram 186 alunos de música. Na próxima edição, os Dias da Música vão "dar a volta ao mundo em 80 concertos", anuncia a organização do evento.
Foto: Lusa
O filme inédito de Manoel de Oliveira, "Visita ou memórias e confissões", rodado em 1982 para ser mostrado publicamente só após a sua morte, vai ser exibido a 5 de Maio, na Cinemateca Portuguesa, em Lisboa. De acordo com a programação da Cinemateca para Maio, o filme, de 68 minutos, com texto da escritora Agustina Bessa-Luís e vozes de Diogo Dória e Teresa Madruga, será exibido às 21h30. O realizador Manoel de Oliveira faleceu a 2 de Abril, aos 106 anos, em sua casa, no Porto. De acordo com a programação da Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema, "Visita ou memórias e confissões" permaneceu inédito durante mais de 30 anos, conservado e preservado nos cofres da instituição, embora tivesse havido algumas "muito estritas excepções", respeitantes a exibições privadas. Entre elas, conta-se uma projecção na Cinemateca em 1993, no contexto do Ciclo "Oliveira: O Culto e o Oculto", numa apresentação restrita, especialmente autorizada por Manoel de Oliveira. A Cinemateca refere ainda que o interdito de exibição mais alargada ao público manteve-se, "motivada por razões ligadas ao pudor envolvido na exposição autobiográfica". No dia da morte do cineasta, José Manuel Costa, director da Cinemateca Portuguesa, em declarações à agência Lusa, revelou que o filme "começa por ser uma referência à casa onde vivia, que teve de deixar por vicissitudes da sua vida". "Tem um carácter pessoal que, devido a isso, ele pediu para só ser divulgado amplamente depois do seu falecimento", referiu José Manuel Costa. Segundo o responsável, Manoel de Oliveira quis reservar a exibição para depois da morte, não porque quisesse ocultar qualquer facto, mas porque tem a ver com a vida dele. "É uma memória pessoal".
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A RTP2 também anunciou esta sexta-feira que vai prestar homenagem "ao mestre do cinema português", através de uma programação especial a que deu o nome "Celebrar Manoel de Oliveira", a decorrer na próxima semana, de 30 de Abril a 3 de Maio, ao final da noite. Foi anunciada a exibição dos filmes "O Passado e o Presente", "Os Canibais", "Vale Abraão", "Um Filme Falado", antecedidos por depoimentos de produtores e atores ligados ao realizador, como Paulo Branco, Luís Miguel Cintra, Catarina Wallenstein e Ricardo Trêpa.
Castelo Branco. Oito reclusos hospitalizados em estado grave
MANUEL PINTO
Os media e as “pessoas como nós” Os meios de informação têm enorme dificuldade em passar uma ideia aprofundada do que se está a passar. Dãonos fragmentos e casos dramáticos que se sucedem a um ritmo cada vez mais intenso, mas não as chaves que fazem esses fragmentos adquirirem sentido.
Presos internados com sintomas de intoxicação. Autoridades suspeitam de quetamina, uma substância psicadélica. Oito reclusos do Estabelecimento Prisional de Castelo Branco foram este domingo hospitalizados com sintomas de intoxicação. Fonte do Comando Distrital de Operações de Socorro (CDOS) disse à Renascença que se encontram em estado grave. Os reclusos em perigo de vida foram transportados para o hospital Amato Lusitano de Castelo Branco, depois de, alegadamente, terem consumido quetamina, uma droga psicadélica também conhecida como "Special K". O alerta foi dado às 13h25 e foram deslocados para a prisão de Castelo Branco oito veículos e 15 elementos do corpo local de bombeiros, agentes da PSP e uma equipa do hospital albicastrense, com uma viatura médica de emergência e reanimação (VMER). A Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) já anunciou a abertura de uma investigação. "A ocorrência será objecto de averiguação por parte desta direcção-geral e será comunicada ao Ministério Público, para apuramento do tipo e modo de entrada no estabelecimento, da substância ilícita que afectou o estado de saúde dos reclusos que a consumiram", refere a DGRSP, em comunicado. Segundo a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, o Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) foi chamado ao Estabelecimento Prisional de Castelo Branco, ao princípio da tarde, e transportou oito reclusos, "que apresentavam sinais de doença súbita, resultante do consumo de uma substância ilícita, presumivelmente `ketamina`". [notícia actualizada às 20h13]
Nos anos 90, um telefilme creio que da BBC, intitulado ‘A Marcha’, retratava um movimento de população esfomeada a atravessar o deserto do Sahara na mira de alcançar a Europa. Quando os telejornais começaram a prestar atenção ao assunto, a Comissão Europeia reuniu de emergência e encarregou a comissária para as questões humanitárias de tentar deter a multidão, dispensando-lhe alimentos. Tarde de mais. A dado momento, quando, já no Mediterrâneo, os famintos de pão e de futuro, em centenas de barcos, vislumbravam ao longe terras europeias, depararam com uma muralha de vasos de guerra a vedar a passagem. No diálogo que se trava entre o comandante das forças e o líder dos invasores, este, sereno, diz algo como isto: “vocês podem usar a força para travar a nossa marcha, mas esquecem-se de uma coisa: nós não estamos só em frente de vós, já estamos atrás de vós”. À luz da actualidade, esse interessante filme dava, todavia, uma visão distorcida dos imigrantes, mostrados como corpo homogéneo nas motivações (a fome em África) e nos propósitos, com a sua determinação e a sua liderança. Hoje sabemos que quem ‘lidera’ estes 500 mil a um milhão que se calcula aguardarem a sua vez em terras líbias são traficantes de gente, os ‘negreiros’ dos nossos dias. Os meios de informação têm enorme dificuldade em passar uma ideia aprofundada do que se está a passar. Dão-nos fragmentos e casos dramáticos que se sucedem a um ritmo cada vez mais intenso, mas não as chaves que fazem esses fragmentos adquirirem sentido. Às imagens televisivas de gente exausta ou já sem vida a dar à costa e das dezenas e dezenas de caixões de pessoas sem nome, alinhados nos hangares de Lampedusa, falta-lhes qualquer coisa de essencial que o jornalismo não diz: que há, às nossas portas, um vulcão em atividade crescente, cuja energia reside em
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milhões de pessoas que preferem arriscar uma vez a vida a atravessar o Mediterrâneo, a arriscá-la todos os dias na Síria, na Eritreia ou no norte do Iraque. Ou seja, nesses infernos que também nós ajudamos a criar (e para onde, sintomaticamente, se encaminham milhares dos nossos adolescentes, igualmente sedentos de sentido e de futuro). O conceito de facto e de acontecimento com que, em geral, trabalham as redacções é estreito para dar conta da complexidade e grandeza daquilo que aqui está em jogo. Cobrir e monitorizar um vulcão em actividade exige estudo, criatividade e tempo para reunir toda a informação relevante. E essa deve procurar-se, antes de mais, nas histórias dos que chegam ou anseiam chegar e, também, entre os cidadãos europeus, incluindo imigrantes, que tanto pesam sobre a tibieza de políticos de horizontes curtos. Bem pode o Papa Francisco clamar que esses que chegam de Alepo ou do Sudão do Sul são “homens e mulheres como nós, famintos, perseguidos, feridos e explorados”. Os media só pelos números grandiosos se interessam por homens e mulheres comuns.
António Costa. PSD e CDS "casaram" para "disfarçar as conveniências" Partidos da actual maioria governamental "não tem novas políticas", afirma líder do PS.
O secretário-geral do PS, António Costa, considera que a coligação anunciada entre o PSD e o CDS-PP é um "casamento" para "disfarçar as conveniências" e que demonstra que o Governo "nada de novo tem para dar". "Tivemos ontem [sábado] a melhor demonstração de que mesmo nada de novo o Governo tem para dar. Não tem novas políticas a propor e aquilo que ontem vieram fazer era mais do mesmo", disse o líder socialista, este domingo, durante um almoço-debate em Reguengos de Monsaraz. Segundo António Costa, para terem "alguma coisa de novo", o PSD e o CDS-PP escolheram o 25 de Abril para anunciar que vão concorrer coligados às próximas eleições legislativas, mas esse anúncio não passou de um "não acontecimento". "E a coisa tão extraordinária de falta de novidade na
celebração da coligação é que quiseram escolher o dia 25 de Abril para ser a novidade do não acontecimento que é manter o casamento de quem já está casado e que remédio tem se não manter-se casado, para disfarçar as conveniências", ironizou. Os líderes do PSD e do CDS-PP, Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, respectivamente, assinaram no sábado à noite um compromisso para uma coligação préeleitoral entre os dois partidos para as próximas legislativas, que se realizarão entre 14 de Setembro e 14 de Outubro. O compromisso prevê a elaboração de listas conjuntas com base nos resultados das últimas legislativas e que os dois partidos dialoguem para, após as legislativas, apoiarem um candidato presidencial. No almoço-debate hoje realizado em Reguengos de Monsaraz, com "sala cheia", no Pavilhão Multiusos do parque de exposições local, o secretário-geral do PS aludiu ao facto de o anúncio deste compromisso ter sido feito no 25 de Abril. "Aqui entre nós, há muitas datas que podem entrar na História, há muitas datas que já estão na História e o 25 de Abril é, seguramente, uma data que está na História", afirmou. Trata-se de uma data que, continuou, "está na História pela madrugada libertadora e original do 25 de Abril de 74" e por, "há 40 anos, ter sido o 25 de Abril de 75, esse momento mágico das primeiras eleições livres, democráticas e universais, em que os portugueses acorreram às urnas". Mas "há uma coisa" pela qual "o 25 de Abril não ficará na História, é pela coligação entre o Dr. Portas e o Dr. Passos Coelho", porque, acerca disso, "não há história para contar", argumentou. Perante os autarcas, militantes e simpatizantes que participaram no almoço, no qual marcou ainda presença Guillermo Vara, líder do PSOE na Estremadura espanhola, António Costa acusou o PSD e o CDS-PP de "terem estado juntos a afundar o país" e de, agora, quererem "estar juntos a continuar a política que têm seguido". Mas, para o líder socialista, o Governo "falhou" e "nada de novo tem a propor" para as legislativas: "É um Governo falhado e um Governo fracassado". "Eles falharam naquilo que disseram antes das eleições, mas eles falharam também no que disseram depois das eleições", insistiu, exemplificando que o crescimento é hoje "inferior àquele que se propunham ter", enquanto o desemprego "é maior do que aquele que se propunham ter", tal como o défice e a dívida.
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"Coligação não foi uma coisa muito preparada" Se as eleições legislativas do final do Verão não resultarem numa maioria absoluta, Marcelo Rebelo de Sousa acredita que "há espaço para conversações entre PS e PSD".
As pulsações do Benfica-Porto. Ligámos os adeptos à máquina (literalmente) Podia ser o jogo do título. Esperava-se um “jogo de nervos”, uma partida “imprópria para cardíacos”. Foi mesmo assim? A Renascença fez a experiência com dois adeptos e um cardiologista. Por Carlos Calaveiras (texto) e Inês Rocha (vídeo)
A coligação eleitoral entre PSD e CDS não foi muito preparada, na opinião do comentador Marcelo Rebelo de Sousa. “Foi uma coisa muito preparada? Acho que não. Esta nova versão de que esteve semanas a ser preparada… Isto foi uma coisa de muito pouco tempo”, afirma o antigo líder social-democrata, no seu habitual espaço de comentário na TVI. Marcelo Rebelo de Sousa diz que, quem ler a declaração assinada entre Pedro Passos Coelho e Paulo Portas e que conhecer a política, “percebe que é uma coisa feita na ponta final, em 48 horas”. “É muito vaga e seguiu um sistema que não é habitual. Habitualmente, vai órgãos dos partidos e depois celebra-se. Aqui foi celebrada e vai aos órgãos dos partidos para celebração”, sublinha. “Há espaço para conversações entre PS e PSD” Se as eleições legislativas do final do Verão não resultarem numa maioria absoluta, Marcelo Rebelo de Sousa acredita que PSD e PS podem sentar-se à mesa e negociar. “Há pontos comuns, não é por acaso que estes partidos estão no arco da governação, que é: o respeito pela União Europeia, por muito que haja visões diferentes, a preocupação com o défice e com a dívida pública.” Para o comentador, os dois partidos trilham “dois caminhos diferentes”, mas “têm em comum o facto de, se o resultado das eleições apontaram para não haver uma maioria absoluta “Isso faz com que haja dois caminhos diferentes, mas que têm em comum o facto de, se o resultado das eleições apontaram para não haver uma maioria absoluta, há espaço para conversações entre PS e PSD”, defende Marcelo Rebelo de Sousa.
É um lugar-comum futebolístico: diz-se que um jogo com os condimentos do Benfica-FC Porto deste domingo é “impróprio para cardíacos”. Será? Fizemos a experiência: pusemos dois adeptos, um cardiologista e acompanhamos os parâmetros cardíacos durante todo o jogo. O cenário foi montado: dois amigos, de clubes diferentes, juntos, na sala de estar da Renascença – um habitat onde ambos jogam em casa. André Henriques está habitualmente no “Café da Manhã”, da RFM, e é do Benfica. Daniel Fontoura, portista, comanda as “Mega Manhãs”, da Mega Hits, outra rádio do grupo Renascença Comunicação Multimédia. “Num jogo como este, ‘impróprio para cardíacos’, há grandes libertações de adrenalina que alteram os parâmetros cardíacos. Os nossos dois adeptos vão ser monitorizados permanentemente à frequência cardíaca e à tensão arterial, que vai ser medida de 15 em 15 minutos e depois de algum lance de perigo”, explica, antes do jogo, o cardiologista Nuno Cardim, da Corclinica. A poucos minutos do início da partida, o ambiente estava mais ou menos sereno em estúdio. Os adeptos estavam confiantes na vitória (2-0, dizia o benfiquista André; 1-3, prognosticava Daniel). “Não estou minimamente nervoso”, dizia André, que não esqueceu a goleada de Munique para “picar” Daniel. O dragão não se ficou: “Já não há Bayern para ninguém, temos uma equipa pronta para ganhar”. Ligados “à máquina” pela primeira vez, os adeptos convidados confirmam que costumam enervar-se, especialmente nos chamados “jogos grandes”. Mas tudo “é pior” no estádio, admitem. Um benfiquista “acelerado” Começa o jogo e são do portista de serviço os primeiros apartes: “Só tenho medo do Maicon. Não estamos em 4-3-3 [como habitualmente] porque vocês [o Benfica] eram mais fortes a meio-campo”. Aos dez minutos de jogo, Nuno Cardim constata: “O benfiquista está mais acelerado”. A troca de bolas dentro das quatro linhas estava morna, mas os adeptos aqueciam o “bate-boca”. Daniel: “O FC Porto está a jogar diferente”. Réplica irónica de André: “Realmente, na Alemanha foi mais rápido”. Tréplica ácida: “É, parecia Vigo” (os míticos 7-0, a maior derrota
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de sempre do Benfica na Europa). Aos 30 minutos, o encarnado André continua a achar o jogo “aborrecido”. Daniel anima-se quando ouve mais de três mil dragões nas bancadas a gritar “Porto”. Foi o sinal para o que vinha aí poucos segundos depois: aos 34 minutos, uma grande oportunidade para o FC Porto – Jackson Martínez a aproveitar um ressalto e a rematar, já dentro da área, por cima da baliza de Júlio César. Nuno Cardim notou “uma grande subida de tensão arterial, quer do André, quer do Daniel, para os 14-9, e também uma subida substancial da frequência cardíaca, em ambos, acima das 100 pulsações por minuto”. Aos 43 minutos, a bola chegou mesmo a entrar na baliza de Júlio César, mas nem sequer chegou a haver ‘frisson’ no estúdio. Maicon, que até já marcou na Luz noutros tempos, estava fora de jogo. Nervosismo sem golos Ao intervalo, 0-0. As cascas de amendoim e tremoços já se acumulavam em cima da mesa. A pausa fez bem e os adeptos acalmaram-se, especialmente o do Benfica. “Como o tempo e o resultado jogam a favor do André, ele está mais calmo do que o Daniel, que está neste momento com uma frequência cardíaca mais rápida de 83. O André tem 78, quando no princípio do jogo andava nos 100”, explica o cardiologista. Recomeça o jogo e o primeiro coração a acelerar foi o de André. Após um remate de Talisca, o adepto do Benfica entusiasma-se: “Esta segunda parte promete muito”. Daniel parece mais calmo e acredita num certo minuto: “Basta marcar um golo aos 92 minutos para ganhar”. “O Benfica está a dominar o jogo”, diz André, poucos minutos antes de Talisca voltar a aparecer, agora de cabeça, com a bola a passar pouco ao lado da baliza do experiente Helton. Aos 59 minutos, o FC Porto responde com uma cabeçada de Jackson por cima. “Luisão zerinho”, ataca Daniel. Um minuto depois, Quaresma, acabado de entrar, leva amarelo por falta sobre o defesa-esquerdo encarnado. “Óscar para o Eliseu”, reage o portista. O jogo parece um pouco mais animado e Pizzi faz subir a tensão arterial a André com um remate de longe. “Ai Jesus!”, grita o benfiquista. Helton defende com segurança. Era a melhor fase do Benfica. André toca no braço do adversário de ocasião: “Vocês estão todos nervosos”. Julen Lopetegui troca Evandro por Hernani. Daniel apoia: “É arriscar tudo”. Por esta altura, Quaresma é o principal alvo do benfiquista: “Está nervoso o Quaresma. Não consegue fazer nada”. Pouco depois, Lima remata muito torto e Daniel não perdoa: “Está um gajo agora no Colombo a cabecear esta bola”. André não se fica: “Estás a sentir a tua equipa a baixar? Daqui a bocado está o Helton a ponta-delança”. Fejsa faz falta sobre Danilo. “Ai os 30 milhões”, atira Daniel, lembrando o preço que o Real Madrid acordou para a transferência do lateral na próxima época. Aos 84 minutos, o médio sérvio assina a segunda grande oportunidade do jogo, a primeira do Benfica, tirada a papel químico da de Jackson na primeira parte. Após um ressalto, o camisola cinco das águias rematou muito por cima bem no centro da área.
À espera de Kelvin O jogo estava perto do fim e Daniel ainda acredita. “Até aos 92 ainda dá”. E a verdade é que ao minuto 92 o adepto portista ainda teve esperança quando Quaresma cruzou para Hernâni. O jovem extremo chegou atrasado. “Mete o Kelvin”, ainda gritou, mas nada. Só aí a fé fugiu ao portista: “Esta porcaria vai acabar empatada”. André sentencia: “Estofo de campeão não te assenta esta época. Não fizeste nada [para ganhar o jogo]”. “Vocês estão a fazer tempo para o jogo acabar”, diz um desalentado Fontoura. E o jogo acabou mesmo. Nem o bate-boca entre treinadores suscitou grande emoção. “Foi uma pena o jogo ter sido assim”, diz André. “De qualquer forma, senti o meu amigo do Porto a sofrer um bocadinho mais que eu”. Daniel responde: “Foi um jogo morno de parte a parte com uma oportunidade clara de parte a parte”. E a máquina incomodou? “Não, de todo, esqueces por completo que estás ligado”, diz o adepto encarnado. “Tirando de 15 em 15 minutos quando aquilo faz ‘vuuuuuuuuuuuhhhhh’ e começa a apertar”, completa Daniel. O stress no final E agora? “Não acredito que o FC Porto depois da derrota de Munique e do empate na Luz vá ter grande vontade de partir com mais força. Por isso, se isto correr como tem de correr, vamos ser campeões”, diz André. Daniel faz contas e admite que a vida está difícil para o FC Porto. Mas “é futebol, tudo pode acontecer. Se o Benfica perde com o Gil Vicente…” O médico Nuno Cardim faz o balanço: “Foi um jogo morno, mas há algumas conclusões interessantes que se podem tirar. A frequência cardíaca normal oscila entre 60 e 100. Os nossos dois adeptos durante o jogo andaram sempre entre os 90 e os 100, com um nível de adrenalina basal elevado. Quando o jogo acabou, a frequência cardíaca de ambos baixou para os 60/70”. “O André tinha frequência cardíaca mais elevada no início 105/110 e com o desenrolar do jogo foi baixando, ao contrário do Daniel, especialmente no último quarto de hora, que ultrapassou os níveis do André”, acrescentou. O cardiologista não teve dúvidas no diagnóstico: “Os dois adeptos estão em forma e tiveram um comportamento normal em relação ao stress”. No entanto, reconhece entre sorrisos: “Este jogo não foi o ideal. Será preciso repetir a experiência com um jogo mais ‘hot’”.
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Coordenador de doenças oncológicas nega assimetrias regionais Nuno Miranda diz que Portugal está bem preparado para combater o cancro num futuro em que se estima que uma em cada duas pessoas venha a sofrer da doença. O coordenador nacional das doenças oncológicas não concorda que haja assimetrias regionais no tratamento do cancro em Portugal. Apesar de não conhecer o inquérito desenvolvido pela Sociedade Portuguesa de Oncologia, divulgado esta sexta-feira, Nuno Miranda diz que "a assimetria do acesso não é um problema essencial". "Não temos diferenças significativas ao longo do país até porque a maioria dos doentes é tratada em grandes centros. Tanto os tratamentos cirúrgicos como os tratamentos complementares, na maioria dos casos, são feitos em grandes centros e serão mais ou menos iguais ao longo do país", elabora. O oncologista do IPO de Lisboa concorda que há problemas na forma como estamos preparados para tratar o cancro no futuro: "Obviamente que sim. Porque é uma doença com uma incidência crescente e temos de estar preparados para ter cada vez mais doentes. O que está previsto é que em 2030 uma em cada duas pessoas irá ter cancro". Face a este cenário o coordenador da rede nacional de oncologia adianta que "obviamente é necessário fazer tudo o que podemos para diminuir esta epidemia e, como tal, investir essencialmente na prevenção, que é a única forma de diminuir a incidência da doença". Sobre a quantidade de oncologistas em Portugal, que, segundo o inquérito serão insuficientes, Nuno Miranda também não concorda. "No curto prazo são suficientes, ou seja, o número de médicos em formação na especialidade de oncologia médica é razoável e, dentro de dois três anos, teremos o número de profissionais necessários para ter uma cobertura razoável no país".
Vão diminuir locais para fumadores, mas há excepções O secretário de Estado Adjunto da Saúde falou sobre tabaco e álcool no “Em Nome da Lei” da Renascença. O número de locais públicos onde os fumadores poderão continuar a fumar será muito menor, a partir de 2020, mas há excepções. Em alguns estabelecimentos, como casinos e salas de congressos, poderá haver salas de fumo, embora sem
direito a qualquer tipo de serviço, para proteger os trabalhadores. Quanto aos hotéis, podem continuar a ter 40% dos quartos para fumadores. A proposta de lei que o Governo aprovou esta semana para diminuir o consumo do tabaco prevê medidas de apoio do Serviço Nacional de Saúde a quem queira deixar o vício. Leal da Costa anuncia a abertura para 31 de Maio de uma linha de saúde 24 para tabagistas. Respondendo às denúncias feitas profissionais de saúde ligados às doenças oncológicas, Leal da Costa admite que ao nível do rastreio do cancro há falhas, sobretudo na zona da grande Lisboa. Estas declarações ao programa da Renascença, “Em Nome da Lei”, que este sábado debateu as alterações à lei do tabaco e à lei do álcool. Precisamente sobre álcool, a nova lei proíbe a venda de bebidas a menores de 18 anos, mas não o consumo, esclarece o secretário de Estado Adjunto da Saúde, Fernando Leal da Costa. "Em alguns países há proibição de consumo. Em Portugal, por uma questão de coerência legislativa, entendemos que deveríamos ter apenas a proibição de venda e disponibilização a menores", afirmou Fernando Leal da Costa.
Pouca chuva neste começo de semana Agitação marítima forte fecha barra de Esposende. Outras três estão condicionadas.
As nuvens continuam a marcar presença esta semana. Foto: DR
É no Norte do país e nos Açores que devem cair, esta segunda-feira, alguns aguaceiros. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) prevê céu com períodos de muita nebulosidade, tornando-se geralmente pouco nublado a partir do final da tarde. Está também prevista uma pequena descida da temperatura mínima e subida da máxima nas regiões Centro e Sul. Em Lisboa, as temperaturas vão oscilar entre 10 e 20 graus, no Porto entre 11 e 17, em Bragança entre 6 e 17, na Guarda entre 7 e 19, em Évora entre 10 e 20, em Beja entre 12 e 21, em Faro entre 14 e 21, em Coimbra entre 10 e 18 e em Setúbal entre 12 e 18. Na terça-feira, as previsões são de um dia muito semelhante. Agitação marítima condiciona barras A barra de Esposende está esta segunda-feira fechada
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a toda a navegação e outras três estão condicionadas, devido à previsão de agitação marítima forte. De acordo com a Marinha portuguesa, as barras de Póvoa de Varzim, Vila do Conde e São Martinho do Porto estão condicionadas. Em Vila do Conde, aconselha-se as embarcações até 12 metros de comprimento e/ou calado inferior a dois metros a praticarem-na no período compreendido entre as duas horas antes e duas horas após a preiamar. As embarcações com comprimento superior a 12 metros e/ou calado superior a dois metros, apenas podem praticar a barra de Vila do Conde no período da preia-mar. A barra marítima da Póvoa do Varzim está aberta a embarcações com calado superior a dois metros, duas horas antes e duas horas depois da preia-mar, devido à previsão de agitação marítima. Também a barra de São Martinho do Porto está condicionada por assoreamento, aconselhando a Marinha a uma navegação prudente e apenas na preiamar. O IPMA prevê ondas de oeste-noroeste com 1,5 a 2 metros na costa ocidental, sendo de 2 a 2,5 metros a sul do Cabo Carvoeiro até ao final da manhã. Na costa sul prevê-se ondas de sudoeste com 1 a 2 metros.
Este é um ponto crucial, porque poderemos conceber as melhores políticas do mundo, mas nada funcionará se não tivermos um Estado eficaz para as concretizar e que não seja capturado pelos interesses que com ele se relacionam. Há dias a Dr.ª Teodora Cardoso manifestou-se preocupada com a quebra de qualidade da nossa Administração Pública, tendência agravada pelos cortes salariais impostos pelo programa de ajustamento. A reforma do Estado implica revalorizar a função pública. Por muito que se exija – e bem – contenção nas despesas públicas. GRAÇA FRANCO
Cavaco perde uma boa oportunidade O último discurso do actual presidente da Republica no 25 de Abril foi, na sua quase inocuidade, uma oportunidade perdida. É pena.
FRANCISCO SARSFIELD CABRAL
Revalorizar a função pública Poderemos conceber as melhores políticas do mundo, mas nada funcionará se não tivermos um Estado eficaz para as concretizar.
Por Francisco Sarsfield Cabral
O discurso do Presidente da República no 25 de Abril foi alvo de apreciações por dezenas de políticos, jornalistas e comentadores. Mas gostaria de chamar a atenção para um ponto que passou despercebido, talvez por serem muitos os assuntos importantes daquele discurso. Disse Cavaco Silva: “A Administração Pública tem de ser competitiva no mercado de trabalho, de modo a recrutar, motivar e manter nos seus quadros os recursos humanos aptos a desempenhar as funções de grande responsabilidade que lhe são exigidas”.
Por Graça Franco
Cavaco Silva será o Presidente ainda em exercício (embora já com poderes limitados) nos próximos oito meses e poderá vir a ser chamado a uma acção decisiva na procura do desejável consenso interpartidário que tanto lhe é caro. Um consenso que poderá tornar-se essencial para o encontro de um novo Governo maioritário, caso ele não resulte directamente do próximo acto eleitoral. Não é preciso recordar sequer as palavras avisadas de Trigo Pereira, quinta-feira, no último “Conselho de Directores” aqui, na Renascença: sem estabilidade governativa o projecto de programa do Partido Socialista não será sequer “exequível”. Idem para a estratégia subjacente ao Plano de Estabilidade apresentado pela actual coligação. Mesmo reeleitos, PS e PSD, dificilmente conseguirão maioria absoluta. Não por acaso, o Governo que se caracterizou por ignorar o valor do diálogo social (até em sede de concertação), durante anos, fez agora da palavra consenso uma espécie de “chavão” de forma a colocar no PS o ónus de não vir a jogo. A necessidade de vir a conseguir, em clima póseleitoral, os vários entendimentos possíveis (à esquerda ou à direita) essenciais à formação de uma nova maioria estável aconselhava a preservação da voz presidencial acima dos partidos. Precisava-se mesmo
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de uma influência reforçada dessa voz radicada numa nova retórica de esperança mobilizadora. Infelizmente, Cavaco Silva não o conseguiu, não tanto por culpa própria, como por mérito alheio. No caso, o mérito resulta de uma estratégia da maioria de captura sistemática das palavras presidenciais numa indiferença total às críticas que lhe são dirigidas directas ou indirectas (da incapacidade de retenção dos jovens mais qualificados, à necessidade de uma administração pública com capacidade para recrutar os melhores entre tantos outros). A cada remoque, a cada recado, PSD e CDS reagem sistematicamente, num aplauso febril como se de elogio se tratasse. A estratégia do aplauso continuado a Cavaco não é nova. Não sei exactamente quando começou, mas, no discurso do 5 de Outubro, foi ainda mais ostensiva. Não sei já se remonta mesmo a 2013, quando o presidente falou da evidência da “fadiga de austeridade” e da necessidade de um combate prioritário ao desemprego com múltiplas referências críticas ao desenrolar do programa de austeridade visto como pouco ajustado à realidade. Este bruá de fundo, não torna o pensamento menos crítico mas assegura que as suas palavras surgem menos audíveis a toda a oposição. Num regime semipresidencialista como o português, quando um presidente deixa de se fazer ouvir para quase metade do hemiciclo é a própria democracia que surge empobrecida. E, contudo, Cavaco Silva falou, numa espécie de apanhado ou balanço de mais de uma dúzia de discursos presidenciais de temas importantes: da necessidade de retomar políticas que combatam a queda da necessidade, às políticas de atracção e regresso de jovens emigrantes altamente qualificados ou de integração activa de imigrantes. Voltou a falar do Mar como área de aposta no futuro (que o PS na voz de Miranda Calha lamentara, uns minutos antes, ter ficado abandonado nas últimas décadas) e de uma nova política de Justiça que permita que o sector deixe de ser um entrave à competitividade da economia. Falou da necessidade de um debate sério sobre a sustentabilidade do Estado Social (destaque para o pedido de um verdadeiro pacto político para o futuro do Serviço Nacional de Saúde sugerindo para base o trabalho já feito pela Fundação Champalimaud). Falou da urgência do combate à corrupção que faz grassar a ideia de que os políticos não são movidos pelo interesse comum e “abre a porta” aos populismos e às falsas demagogias. Frisou, mais uma vez, que “ninguém pode estar acima da lei”. Evitando a crispação e o conflito como lhe é tão caro, Cavaco disse. Mas porque “disse” as suas palavras dificilmente são de “alerta”, “reparo”, “proposta”, “incentivo”, “denúncia”... Falou, sem dúvida, mas nunca “exigiu”, “impôs”, “obrigou”. Limitou-se a falar de tantas coisas importantes que é difícil escolher uma única. Aquela que apontasse para o futuro, numa nova direcção de esperança e indicasse a rota a seguir. Ao homem do leme, exigem-se poucas palavras, mas tão claras que não possam deixar de ser ouvidas. Para isso, talvez Cavaco não pudesse ser tão cordato e consensual. O presidente mais uma vez “disse”, mas a
questão pertinente é sobre quem o ouviu? António Costa, seguramente não.
O comandante que defendeu eleições quando todos se calavam Luís Costa Correia, oficial reformado da Marinha, conta como foi indirectamente responsável pela concretização das primeira eleições livres em Portugal, há 40 anos. Por Matilde Torres Pereira
No dia em que se celebra os 40 anos das primeiras eleições para a Assembleia Constituinte, a 25 de Abril de 1975, o comandante Luís Costa Correia, oficial reformado da Marinha, conta como foi indirectamente responsável pela concretização dessas eleições, como levantou a voz contra aqueles que julgavam que os portugueses não estariam preparados para votar e como depois regressou tranquilamente à sua unidade da Marinha quando percebeu que os destinos do país estariam já bem encaminhados. Uma entrevista-testemunho de alguém que nunca quis ser "herói". Depois do 11 de Março houve agitação e vozes a pôr em causa a realização de eleições. Foi uma das pessoas que as defendia e que dizia que os portugueses estariam preparados para votar. Porquê? Sempre pensei que o regime para o qual deveríamos evoluir, ultrapassado aquele período de estado ditatorial, não havia alternativa que não fosse virarmonos mais para a Europa e procurarmos um regime político que fosse saudável, em que as pessoas fossem tratadas por igual. E nada melhor que eleições para poder instituir um regime desses. Há poucas semanas houve eleições na Madeira e confusão na contagem dos votos. Isto fez-lhe lembrar alguma coisa? Não. O que se passou na Madeira foi relacionado com a organização do sistema de recenseamento. A partir de 2008, o recenseamento passou a ser automatizado; isto é, cada cidadão que obtinha ou que tinha um Cartão de Cidadão ou equivalente automaticamente passou a ser inscrito nos cadernos eleitorais. Isto teve como consequência um aumento muito grande do universo de recenseados, como é natural. E, por isso, surgiu o agravamento dos chamados "eleitores fantasma", uma expressão muito conhecida, mas que não corresponde bem à realidade. Se olharmos para os resultados quantitativos das eleições, constatamos que, depois do entusiasmo inicial das eleições de 75, em que votou quase 95% da população recenseada, verificamos que houve uma estabilização à volta dos cinco milhões de eleitores. O número de pessoas que votam habitualmente situa-se entre os cinco milhões e os cinco milhões e 500 mil. Essa variação é que importa considerar quando se fala em abstenções, mais do que as percentagens.
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Isso é interessante porque quando olhamos as eleições agora, e estamos prestes a tê-las, aquilo que é noticiado são aquelas percentagens brutais, 50, 60% de abstenção. O que explica estes níveis de abstenção? É algum desencanto com o funcionamento do sistema político. O sistema está muito baseado nos partidos políticos, num sistema comummente conhecido como "o menos mau de todos", mas o facto é que tem havido pouca osmose, pouca interacção entre partidos políticos e os cidadãos eleitores. A única maneira de ultrapassar isso não é com os famosos ciclos uninominais, mas sim com um aumento das atribuições e competências ao poder local, que seria a base natural para o refrescamento dos partidos políticos. Se as pessoas sentirem que os órgãos autárquicos são capazes de resolver mais directamente os problemas que mais directamente os afligem, por outro lado, comunicar mais com eles, automaticamente as pessoas vêem quem é que se interessa mais pelos seus problemas e naturalmente isso levaria a melhores escolhas dentro dos partidos políticos e no seu próprio funcionamento. Não parece haver grande espaço para os partidos pequenos chegarem à Assembleia da República. As eleições de 75 acabaram por definir um universo eleitoral baseado em quatro grandes correntes. E elas têm persistido, não tem havido grandes alterações. Talvez o exemplo do que se passa em Espanha, e talvez um pouco em Itália, venha suceder em Portugal. Esse desencanto com o funcionamento do sistema político foi aumentando. Acabarão por surgir alternativas, mas até agora todas as tentativas débeis que têm ocorrido para além desses quatro grandes sectores não têm tido sucesso, embora se pressinta que agora há mais condições para isso. Provavelmente haverá mais votos brancos, mais votos nulos, mais abstenção e também o perfilar de novos partidos no horizonte. Voltando aos anos 70. Porque é que a esquerda militar não era a favor das eleições? Teriam medo de que as suas posições afinal se revelassem minoritárias? Poderia ser. Os militares que ocuparam o poder em 74 não tinham, na sua maioria, umas grandes preparações políticas. Deixaram-se conquistar pelo endeusamento que à volta deles se criou. E isso acaba por não dar margem a que se pense, a que se veja quais são as alternativas melhores e, principalmente, à criação de um regime em que eles não tivessem uma voz muito activa. A própria Assembleia Constituinte, eleita em 75, tinha um mandato restrito na medida em que era obrigada, por acordo com os militares, a integrar os militares no sistema constitucional. E isso ainda ocorreu um pouco em 75, porque o Conselho da Revolução acabou por continuar a existir até 82, e só nessa ocasião se foi entrando numa normalidade clássica. E porque é que o comandante se colocava à parte deste grupo tão grande e tão influente? Entre os militares, a maioria, ao fim e ao cabo, estaria mais de acordo com aquilo que eu defendia, simplesmente não tinha os meios para se expressar. Havia muita gente que se alheava daquilo que se passava, ou não tinha muito à vontade para intervir, na medida em que se considerava que quem tinha alguma legitimidade para falar naquelas ocasiões e a quem o povo ouvia mais eram as pessoas que estavam à frente
do poder militar. Na Assembleia Militar que ocorreu de 11 para 12 de Março, respondi, talvez isolado, a opinião que os militares deviam retirar-se da vida política e ajudar a realizar as eleições o tão cedo quando possível. Não me pronunciei sobre aquele aspecto do programa negociado com os partidos incluir a presença militar nos órgãos constitucionais porque, para já, o mais importante era realizar umas eleições livres. Mas era uma voz relativamente solitária. Julgo que o general Costa Gomes se tenha aproveitado dessa minha intervenção, escutada aliás em silêncio por toda a Assembleia, para levar a Assembleia a votar pela realização das eleições no mês seguinte. Isso torna-o um protagonista da nossa democracia, embora não com os devidos créditos... O importante era que as eleições se realizassem. Não havia propriamente nada que levasse a que as pessoas considerassem fulano, sicrano ou beltrano os grandes heróis disto ou aquilo. Há muitos exageros nessas classificações. Um ano mais tarde participa, aí sim, mais activamente na preparação e realização das eleições em 76, o que no fundo acaba por preparar o caminho para a sua carreira no STAPE, e o grande trabalho da sua vida foi precisamente o acompanhamento das eleições em Portugal. Passados estes anos todos, que balanço faz do acompanhamento desse processo? O STAPE foi criado para as eleições de 75 e depois a seguir, na sequência de uma recusa de um convite para ir para o Governo pelo almirante Pinheiro de Azevedo – imagine bem – queria que fosse ministro da Administração Interna ou ministro da Comunicação Social, era uma espécie de totoloto...(risos)…Fui parar ao STAPE precisamente por indicação da pessoa que sugeri ao almirante Pinheiro de Azevedo que ocupasse a pasta da Administração Interna, o então comandante Almeida e Costa que nunca se apercebeu bem de que tinha sido eu que tinha feito a sugestão. Só ao fim de muitos anos ele me perguntou e eu disse que sim. É a sua marca, trabalhar nos bastidores? Respondo quando me perguntam, não é? Não vou fazer propaganda. Naquele ano, foi realmente muito trabalhoso. Ocorreram quatro eleições: as legislativas para a Assembleia, as presidenciais, as primeiras eleições regionais nas regiões autónomas e as eleições para as autarquias locais. Todas elas incumbiu-me dirigir um grupo de trabalho composto por ilustres jurisconsultos dos principais partidos políticos – curiosamente o CDS nunca foi convidado para esse trabalho. Essas leis foram as leis eleitorais que perduraram algum tempo. A estrutura ainda permanece a mesma, estão desactualizadas é quando aos prazos para a sua realização. Outro tema, a rendição da PIDE a 11 de Março. Essa história foi interessante porque foi uma questão de curiosidade. Nessa data e por essa hora estava numa reunião no Estado Maior, mas que não tinha nada a ver com as minhas funções. Depois de ter participado no golpe militar e nos primeiros dois meses de preparação para a extinção da PIDE-DGS, tinha regressado à Marinha, à minha unidade, porque entendia que era esse o meu dever. Assim como o fiz quando, depois da concretização das eleições, voltei para a Marinha, porque o problema passava a ser dos portugueses que,
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através dos órgãos legitimamente eleitos, tinham que conduzir os destinos do país, e não tenho nem devo imiscuir-me nisso. No que diz respeito ao 11 de Março, tinha estado numa reunião, e as mulheres de oficiais e alguns camaradas nossos que moravam perto do regimento de artilharia ligeira começaram a telefonar a dizer que havia bombardeamentos, e achámos que era boa ideia regressarmos às nossas unidades e aguardar instruções. Simplesmente, a minha unidade era do outro lado do Tejo e àquela hora não haveria nada para fazer a não ser almoçar. A curiosidade impeliu-me, então pus-me em traje civil e desloquei-me às imediações onde acabei por chegar à fala com os dois principais actores dos movimentos militares que lá se realizavam. Aqui tem, foi a curiosidade. Aliás, eu depois sugeri que talvez devessem procurar ver diante dos responsáveis onde é que as comunicações se transformam. E realmente os responsáveis do golpe, participantes naquela cena, respectivamente o tenente Miguel de Almeida e o major Mensurado, pelos paraquedistas, foram ao gabinete do general Mendes Dias e começaram a fazer telefonemas para os seus responsáveis a perguntar o que é que se passava. Chegaram à conclusão que não havia acordo nessa ocasião, já tinha lá chegado um oficial da Marinha enviado pelo brigadeiro Otelo Saraiva de Carvalho, que tinha instruções para prender o oficial da Força Aérea se ele decidisse continuar as hostilidades. Face àquela ameaça, o major Mensurado contactou com o seu responsável e chegaram à conclusão que não havia condições para continuar a guerra. Que idade tem? 60 mais IVA (risos). E se ocorresse uma situação semelhante hoje, faria a mesma coisa? Nunca se fazem as mesmas coisas olhando para o passado. Há princípios que nos norteiam. Esses princípios são indicativos de como provavelmente uma pessoa poderá reagir. Tenho alguns apontamentos que permitem reconstituir isto e aquilo, e tenho quase a certeza que se voltasse atrás... No que diz respeito à maior participação da Marinha da conspiração é algo que seria talvez diferente, e naturalmente, mais alguma pressão no sentido de que o sistema político que saiu das eleições de 75 e da sua Constituição, tivesse dado uma maior solidez ao poder local no sentido de este poder ser a base de rejuvenescimento e reorganização do sistema político.
Ajuda europeia a África. "Uma luta permanente sem resultados ao virar da esquina" Os comentadores do programa "Fora da Caixa" debatem os desafios das ajudas ao desenvolvimento dirigidas a África. Um trabalho marcado por vários obstáculos internos na União Europeia, à margem das respostas a tragédias como a do Mediterrâneo. A "ponte" entre Europa e África continua com problemas de sustentação, apesar da recente cimeira entre os executivos das Uniões dos dois continentes, afirma o antigo comissário europeu António Vitorino no programa “Fora da Caixa” da Renascença, emitido às sextas-feiras à noite, em parceria com a Euranet Rede Europeia de Rádios. "O facto de haver uma cimeira entre a União Africana e a Comissão Europeia é positivo porque, com o alargamento a leste, África perdeu algum peso relativo nas prioridades da União Europeia. É graças ao empenhamento de países como Portugal, Espanha, Itália, a própria França, que África continua a ter visibilidade. Se for ao Centro e Norte da Europa verá que África não está no topo das prioridades destes países. É uma luta permanente para países como Portugal manter Africa como um dos grandes objectivos", assinala António Vitorino. O antigo ministro socialista sublinha que as respostas de longo prazo não substituem a necessidade de respostas imediatas a desastres humanitários. "Uma agenda para o desenvolvimento económico é de muito longo prazo. Não produz resultados ao virar da esquina. Estamos então confrontados com crises humanitárias. O Papa disse-o recentemente, há uma dimensão de sofrimento humano a que não podemos ser alheios. Não podemos dizer que o sofrimento se resolve, prometendo-lhes que dentro de 20 anos África terá um desenvolvimento espantoso. Por isso, o investimento em desenvolvimento económico é imprescindível. Isso está neste momento na agenda política europeia. Mas tenhamos consciência que não é por essa via que resolvemos as dramáticas crise humanitárias", adverte António Vitorino. Desperdício e desconfianças Pedro Santana Lopes ensaia o desenho de algumas prioridades na ajuda ao desenvolvimento dirigida a África. "Em primeiro lugar, a continuação na assistência na saúde. [Depois] incrementar a área da acção social", aconselha o antigo primeiro-ministro. Santana Lopes identifica ainda problemas nos apoios canalizados para África. “São geralmente pouco organizados, muito avulsos. Mais poderia ser feito se
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[for] de modo concertado em varias zonas de África, nomeadamente por parte dos antigos países colonizadores, que têm grandes responsabilidades nessa matéria. À imaginação, acrescentaria que é necessário organização na ajuda a que se destina. E é preciso determinação. Que os governos de África sejam mais receptivos a encarar a boa vontade do lado de cá, que, por vezes, se não é mais organizada, não é por mal. Há desconfianças", conclui Santana Lopes. António Vitorino considera que o tipo de ajuda ao desenvolvimento europeu é muito controverso. "Há grande desperdício . Há cálculos verdadeiramente aterradores [que mostram] que só uma percentagem ínfima daquilo que é despendido pelos países europeus chega aos efectivos destinatários da ajuda ao desenvolvimento. E não se diga que é só no circuito de autocracias corruptas de Africa. Há também um conjunto de negócios de organizações da sociedade civil sediadas na Europa que beneficia muito desse tipo de transferências, com as quais se financia. Nesses casos, o dinheiro não chega aos seus destinatários". Tragédias como as que se passam no Mediterrâneo colocam o foco nos problemas de África, conclui Vitorino. "Toda a gente repara que Africa existe na situação em que se encontra. Os refugiados e mesmo os 'emigrantes económicos' que se dirigem para a Europa são apenas uma pequena parte das pessoas que estão deslocadas no continente africano. São milhões de pessoas que vivem em condições miseráveis, debaixo da ameaça das alterações climáticas, das doenças e dos grupos de bandidos e piratas que existem em várias zonas de África". O programa “Fora da Caixa” é uma parceria da Renascença com a Euranet, que pode ouvir às sextasfeiras depois das 23h00.
"Temos de redobrar os gestos de solidariedade" Ninguém pode ficar indiferente à tragédia dos migrantes no Mediterrâneo, diz o Cardeal Patriarca de Lisboa.
mar Mediterrâneo na expectativa de um futuro melhor. Em declarações este domingo, em Cascais, o Cardeal Patriarca de Lisboa lembrou a iniciativa "somos todos pessoas" de oração e afirmou que é preciso rezar por aqueles que são também irmãos. “Todos temos de ter uma outra solidariedade, porque tratando deles também tratamos de nós. É uma realidade: quando integramos os outros também nos sabemos integrar melhor a nós próprios. É gente que chega aqui com uma enorme dificuldade, vinda às vezes de milhares de quilómetros, com percursos terríveis e também bastante explorados por quem ainda beneficia com o mal dos outros e, por isso, todos nós temos de redobrar em gestos de solidariedade e em atitudes. Esta intenção de rezar por isso significa pôr o nosso coração onde acreditamos que está o coração de Deus, ou seja, no meio de todos e sobretudo daqueles que mais precisam ser acompanhados.” A iniciativa "Todos somos pessoas" foi lançada por várias organizações portuguesas ligadas à Igreja Católica, entre as quais a Renascença. D. Manuel Clemente falava à margem de um encontro que juntou, em Cascais, oito mil escuteiros da região de lisboa, que celebravam o dia do seu padroeiro, São Jorge. Para o Cardeal Patriarca de Lisboa, "os escuteiros são a igreja acampada". D. Manuel Clemente destaca a importância da aprendizagem dos escuteiros na preparação para a vida.
Ainda faz sentido a Igreja ter uma diocese para os militares? Bispo das Forças Armadas e de Segurança considera que a assistência religiosa aos militares continua a ser indispensável num mundo que precisa de consolidar a paz e a harmonia social. E espera concretizar o sonho de ver alguns seminaristas formados para serem capelães. Por Ângela Roque
Foto: Paulo Cunha/Lusa
É preciso redobrar os gestos de solidariedade. É este o desafio lançado por D. Manuel Clemente sobre a forma de ver a situação dos migrantes que se aventuram no
O Ordinariato Castrense em Portugal foi criado em Maio de 1966, ainda o país estava envolvido na guerra colonial. Hoje, os militares são chamados, sobretudo, a participar em missões de manutenção de paz. Mas, para o bispo das Forças Armadas e de Segurança, isso não retira importância à diocese. Pelo contrário: “Estou convencido de que para os militares é muito útil e para nós, Igreja, também”. D. Manuel Linda lembra que “quem presta assistência religiosa aos militares tem de lhes formar a consciência” e que hoje “não se entende o militarismo no sentido de um amor à violência, mas cada vez se
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exige mais um sentido de defesa e de responsabilidade perante os irmãos que sofrem”. “Valores como a paz, a tranquilidade e a boa harmonia social, são hoje fundamentais. As estruturas de segurança e as forças armadas o que prevêem é com a sua presença, se possível sem precisarem de actuação, dissuadirem os possíveis malfeitores, para que a tranquilidade e a ordem social sejam preservadas”, afirma. “Por isso, mais do que nunca hoje é indispensável este serviço”. Para além disso, recorda, “em todos os países membros da NATO onde a percentagem de católicos é razoável existe uma estrutura destas. Até em Inglaterra, onde a maioria é anglicana, há um Ordinariato Castrense, o que prova que esta é uma aposta da Igreja”. D. Manuel Linda, que como padre chegou a ser assistente religioso no Regimento de Infantaria de Vila Real, diz que a grande dificuldade que tem como bispo é conseguir chegar a todas as unidades, porque a diocese abarca o país todo, ilhas incluídas. Quase todos os dias visita uma unidade e celebra “os sacramentos da iniciação cristã, baptismo e crisma”. Há menos de um ano e meio em funções, o prelado diz que “não esperava encontrar um ambiente de tanta simpatia e abertura à fé”. A dificuldade é “conseguir alguma coordenação pastoral no todo nacional, e que tenham todos os mesmos critérios de actuação”, até porque os capelães, que são 37, “foram formados em contextos, dioceses ou ordens religiosas diferentes”. D. Manuel Linda gostava, por isso, de “instituir um seminário. Não é mais uma casa para a formação de padres, mas mediante o contrato com uma diocese haver alguns candidatos ao sacerdócio que sejam formados num dos seminários que já existem, mas que se soubesse ‘estes vão pertencer ao Ordinariato Castrense de Portugal’. “É o meu sonho, se vou conseguir ou não realizá-lo, só Deus o dirá”, sublinha o bispo das Forças Armadas e da Segurança. A entrevista a D. Manuel Linda foi transmitida no programa “Princípio e Fim” na Renascença, no domingo, às 23h30.
Papa “estará em casa”, diz Cardeal Patriarca de Lisboa Francisco confirmou no sábado a sua vontade de vir a Fátima celebrar o centenário das Aparições.
D. Manuel Clemente (na foto quando foi feito Cardeal) mostra-se feliz com a vinda do Papa. Foto: Claudio Peri/EPA
É com grande satisfação que D. Manuel Clemente fala da vinda do Papa ao Santuário de Fátima em 2017, por ocasião do centenário das aparições. O Cardeal Patriarca de Lisboa não tem dúvidas: Francisco estará em casa. “A ligação do Papa a Fátima é de origem e 100 anos depois continua, sobretudo porque entretanto vieram cá vários Papas. Francisco está em casa”, disse este domingo à Renascença, à margem de um encontro que juntou em Cascais oito mil escuteiros da região de Lisboa. A intenção do Papa foi transmitida pelo próprio ao bispo de Leiria-Fátima, D. António Marto, durante uma audiência privada no Vaticano. Uma alegria para D. Manuel Clemente, que vê na visita de Francisco uma oportunidade para Portugal e os portugueses levantarem o espírito. “Confirmou-se e vai ser uma grande festa para todos nós, que bem precisamos de algo que nos levante o espírito para enfrentar os combates do presente e construirmos um futuro bonito”, afirmou.
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“Que fazes aí fechada?” A curiosa história das vocações femininas em Portugal São oito entrevistas com sete freiras portuguesas e uma albanesa a viver em Portugal. Filipe d’Avillez quer desmistificar os conceitos em torno da vida de freira, num livro sobre a liberdade que quer contar “a história de amor com Jesus”.
Por Matilde Torres Pereira
“Que faz uma rapariga como tu num sítio como este?” A pergunta serve de título para um livro espanhol que reúne um conjunto de entrevistas com freiras, mulheres que decidiram dedicar-se a Jesus. O jornalista da Renascença Filipe d’Avillez pegou na ideia e transformou-a, adaptando-a para a situação portuguesa, e o resultado é um livro chamado “O que fazes aí fechada”, da Aletheia Editores, lançado esta segunda-feira, no Convento dos Cardaes, em Lisboa. Filipe d’Avillez conta como surgiu o projecto. “Foi uma proposta. Recebi um telefonema da Zita Seabra, que me falou de um livro que existe já no mercado espanhol. E o conceito é muito engraçado. Um livro de entrevistas não é a coisa mais original do mundo, mas este tem por objectivo o desmistificar uma serie de preconceitos que existem à volta da vida consagrada feminina”, conta o autor. “Eu aceitei e, a partir daí, foi cerca de um ano de trabalho de campo, a tentar conciliar entre a família e o trabalho. Decidimos fazer com freiras, com sete freiras portuguesas e com uma albanesa a viver em Portugal”, acrescenta. Sobre as entrevistas que o marcaram mais, Filipe d’Avillez conta que “todas tiveram, pelo menos, um ou outro momento. Nós entramos sempre nestas entrevistas em que não conhecemos a pessoa a pensar, 'bem, se calhar isto vai ser uma monumental chatice e esta pessoa não tem história nenhuma para contar'. Mas todas elas acabaram por ter momentos em que nós percebemos que toda a entrevista vale a pena”. Houve, claro, algumas mais fortes que outras. Um caso
muito procurado pelo autor prendia-se com o trabalho que a Congregação das Irmãs Adoradoras faz em Coimbra, a Irmã Martinha. “Não procurei especificamente a irmã Martinha. Escrevi para a Superiora e disse que estava à procura de uma freira relativamente nova, para fazer um livro para desmistificar. Disse ‘eu sei que vocês fazem um trabalho no terreno com prostitutas e é uma área que gostava muito de explorar'”. “Responderam-me logo: 'quem você quer é a irmã Martinha'. Foi uma entrevista fortíssima, porque é um trabalho extraordinariamente difícil que elas fazem”, acrescenta. “Se há secção da sociedade que é quase ‘legitimamente’ desprezada”, continua Filipe d’Avillez, “que as pessoas não têm qualquer medo em desprezar e de ter preconceitos, são as prostitutas. São as periferias de que o Papa Francisco tanto fala, e estas mulheres estão laáno meio delas a tentar resgatá-las”. Têem uma taxa de sucesso minúscula, tendo em conta a dimensão do problema. São milhares de mulheres que passam e as freiras conseguiram, até hoje, tirar seis ou sete, mas “o objectivo é sempre tirá-las desta vida”. Quem fala com freiras sabe que elas emanam uma aura de profunda serenidade, alegria e até sabedoria. “E uma grande liberdade”, diz Filipe d’Avillez, “que é uma coisa que faz confusão às pessoas”. “O nome do livro vem daí, embora, de todas as freiras com quem falei, só duas estão em clausura. As outras estão muito no mundo. E eu perguntei às que estavam fechadas: ‘Sente-se livre?’. Houve uma, a irmã Lúcia, na entrevista que abre o livro, que disse de forma muito engraçada ‘Ah, eu estou perfeitamente livre. As chaves estão do lado de dentro’”. A dedicatória do livro é feita para as duas filhas do autor e para as suas duas afilhadas. Uma sugestão para forma como gostava que encarassem a vida vocacional? “O que eu quero, para todos os meus filhos, neste caso para as raparigas, porque é um livro sobre vocações femininas, é que sintam que esta é uma possibilidade", explica. “Mas, mais importante que isto, é que sejam amigas de Jesus. Numa linguagem mais infantil, falamos da amizade, mas que nós queremos que se transforme numa paixão, numa relação de amor com Jesus”, descreve Filipe d’Avillez. “E o que digo, depois, na minha introdução, também é isso, que todas estas histórias são histórias de amor”, continua. “Eu noto imensos paralelos com a relação com a minha história pessoal de amor com a minha mulher. Senti-me privilegiadíssimo por poder ter conhecimento destas histórias e por elas as terem partilhado comigo”, conclui.
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RIBEIRO CRISTÓVÃO
REVISTA DA IMPRENSA DESPORTIVA
Trair a expectativa
Clássico em destaque
Aquilo a que foi possível assistir ontem nada teve a ver com um grande jogo, que pudesse acrescentar prestígio ao campeonato português.
Por Ribeiro Cristóvão
Os 63.000 espectadores que encheram ontem o estádio da Luz para assistir ao tão ansiado clássico protagonizado pelo Benfica e Futebol Clube do Porto saíram de cabeça baixa no termo de noventa minutos de um jogo de fraca qualidade, incapaz de justificar a categoria de um bom punhado de jogadores que ali estiveram em representação de dois emblemas diferentes. Um jogo aguardado há meses com enorme expectativa, que poderia, inclusivé, contribuir decisivamente para a definição do título de campeão, foi afinal o espelho da qualidade do futebol português, que apenas exibições pontuais em competições europeias conseguem salvaguardar. Num campeonato em que o interesse se centra num escasso número de desafios, quando, nas actuais circunstâncias, Benfica e Porto se defrontam, as atenções quase não dão importância ao resto do calendário. E foi isso que voltou a acontecer desta vez. Só que aquilo a que foi possível assistir ontem nada teve a ver com um grande jogo, que pudesse acrescentar prestígio ao campeonato português. Num desafio sem golos – não poderia, afinal, ser outra forma – o Benfica somou maiores proveitos, mantendo os portistas a uma distância confortável e enfrentando agora um calendário que não lhe acarreta grandes preocupações. Com quatro jogos para disputar, dos quais dois em Barcelos e em Guimarães, a equipa de Jorge Jesus apenas terá de se munir de todas as cautelas para assim evitar percalços desagradáveis. Quanto aos portistas, caminham para um final de época vazio de conquistas, contrariando aquilo que se previu quando o grupo avançou, em Agosto, para as diversas competições servido por um plantel de muita qualidade. Há aqui matéria para longa e séria reflexão, à qual os responsáveis não vão seguramente furtar-se, como sempre tem acontecido.
"Força de bloqueio", em O Jogo. "A vitória do zero", em A Bola. "Título mais perto", no Record. Os diários desportivos destacam o nulo no Benfica-FC Porto e o facto de o resultado servir os interesses do Benfica. O Jogo dá algum espaço ao Sporting, destacando: "Marco evita garantir que fica". Em todos os jornais, espaço para o hóquei em patins com a vitória do Sporting na taça CERS.
Paços e Nacional na luta pela Europa "Castores" foram ganhar a Arouca. Madeirenses afundaram mais o Penafiel no fundo da tabela.
Jogadores do Paços festejam golo de Bruno Moreira: Foto: José Coelho/Lusa
O Paços de Ferreira e o Nacional ganharam este domingo e estão na luta por uma vaga nas competições europeias da próxima temporada. O Paços venceu em Arouca, por 3-1, em partida da 30.ª jornada do campeonato, resultado que deixa os “castores” a apenas um ponto do sexto lugar da prova. Bruno Moreira, aos 30 e 81 minutos, e Hurtado, aos 84, foram os autores dos tentos da equipa pacense, tendo Rui Sampaio, aos 61, ainda dado alguma esperança ao Arouca, quando empatou a partida a 1-1. A vitória permite ao Paços de Ferreira subir ao sétimo
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lugar com 42 pontos, apenas menos um do que o Belenenses, cujo sexto lugar ainda pode dar acesso à próxima edição da Liga Europa. O Arouca ocupa a 15.ª posição com 26 pontos e detém agora apenas três pontos de vantagem para o Gil Vicente, a primeira equipa situada abaixo da linha de despromoção. O Nacional derrotou este domingo em casa o Penafiel, por 2-0, golos de Zainadine e Soares. A equipa madeirense ascendeu à sétima posição. O Penafiel, que somou o oitavo jogo seguido sem ganhar, mantém-se no último lugar, com 18 pontos, mas agora mais longe do penúltimo, o Gil Vicente, que bateu a Académica no sábado, e alargou a diferença para cinco pontos. O Vitória de Setúbal, primeiro acima da zona de despromoção, empatou na deslocação ao Boavista, 00, e passa a somar 25 pontos. Os “axadrezados” estão no 13.º lugar, com 30 pontos em outras tantas jornadas. A 30ª jornada encerra esta segunda-feira, com o Moreirense - Sporting, às 20h00.
Slimani fora dos convocados do Sporting
comentar reuniões. Não podemos fazer tanta publicidade de uma reunião. Tenho contrato com o Sporting, trabalho com uma paixão enorme", rematou. O Sporting, terceiro classificado, com 63 pontos, e o Moreirense, 11.º, com 36, defrontam-se esta segundafeira a partir das 20h00 de Moreira de Cónegos, em jogo que terá arbitragem de Vasco Santos, do Porto. Lista de convocados do Sporting Guarda-redes: Rui Patrício e Marcelo Boeck Defesas: Cédric, Miguel Lopes, Paulo Oliveira, Ewerton, Naby Sarr e Jefferson Médios: William Carvalho, Oriol Rosell, Adrien, João Mário e André Martins Avançados: Carrillo, Carlos Mané, Nani, Capel, Montero, Tanaka e Diego Rubio.
Bayern de Munique campeão no sofá Equipa de Pep Guardiola conquista 25º campeonato.
Diego Rubio chamada para a vaga do atacante argelino.
Argelino tem uma mialgia. Foto: Lusa
O avançado Islam Slimani não faz parte da lista de convocados do Sporting para deslocação a Moreira de Cónegos. "Slimani estará fora dos convocados. Tem uma mialgia na coxa esquerda. Os outros estão disponíveis. Segunda-feira iremos olhar e ver se faremos mais alguma alteração na equipa. Diego Rubio foi convocado e viaja para Moreira de Cónegos", disse o treinador Marco Silva, em conferência de imprensa. Quando faltam cinco jornadas para o final do campeonato, Marco Silva não dá como certa a continuidade no Sporting na próxima temporada, nem considera importante a começar a prepará-la desde já. "Seria um erro começar a preparar o quer que se seja. Temos a obrigação de dar tudo pelo clube cada vez que vestimos esta camisola. Ainda há muita coisa em jogo. Nem confirmo, nem deixo de confirmar a minha continuidade. Da minha parte nunca vão ouvir
O Bayern de Munique conquistou este domingo o 25º quinto campeonato do seu historial, beneficiando da derrota do segundo classificado. A equipa de Pep Guardiola venceu no sábado o Hertha de Berlim, por 1-0, e precisava de um “tropeção” do Wolfsburgo, o que veio a acontecer. Os “lobos” perderam este domingo na deslocação ao terreno do Borussia Moenchengladbach, por 1-0, e entregaram o título ao Bayern a quatro jornadas para o final da Bundesliga. A equipa de Munique conquista o terceiro campeonato consecutivo. Em 30 jornadas concedeu apenas duas derrotas e quatro empates. Sofreu 13 golos e marcou 77.
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UEFA Futsal Cup. Sporting despede-se com vitória
Sporting conquista Taça CERS em hóquei em patins
Leões ficaram no terceiro lugar. Equipa do Cazaquistão sagrou-se campeã europeia.
Leões não venciam esta competição europeia há mais de 30 anos.
Jogadores do Sporting agradecem apoio dos adeptos. Foto: Mário Cruz/Lusa
O Sporting venceu este domingo o Dina de Moscovo e ficou no terceiro lugar da UEFA Futsal Cup. Os leões golearam a formação russa, por 8-3, para satisfação dos milhares de adeptos que marcaram presença na MEO Arena, em Lisboa. Destaque para Alex, que marcou quatro golos. Os restantes golos equipa portuguesa foram apontados por João Matos, Marcelinho, Diogo e Cristiano. O Sporting, finalista vencido em 2010/2011, alcançou a sua segunda melhor classificação de sempre na principal competição europeia de clubes. Na final, também disputada este domingo, os cazaques do Kairat Almaty conquistaram o título europeu de futsal, ao vencer os espanhóis do FC Barcelona, por 32. Humberto (17 minutos), o ex-leão Divanei (19’) e Igor (32’) assinaram os tentos da formação do Cazaquistão, que reeditou o sucesso de 2012/2013, enquanto Saad (30’) e Lin (32’) reduziram para os catalães, vencedores da competição em 2011/2012 e 2013/2014.
Foto: DR
O Sporting conquistou este domingo a Taça CERS de hóquei em patins. Os leões bateram na final a equipa espanhola do Reus, em jogo disputado em Igualada, na Catalunha. A vitória do Sporting foi conseguida no desempate por grandes penalidades, com dois remates certeiros para o Sporting e apenas um para o Reus, após 2-2 no tempo regulamentar e prolongamento. Tiago Losna adiantou o Sporting, aos quatro minutos, o Reus virou o resultado, com Marc Coy (37) e Xavi Costa (41), mas João Pinto ainda fez o 2-2 aos 46 minutos, obrigando a prolongamento. O Sporting não conquistava a Taça CERS desde 1984.
Jornalista investiga mistério do navio “Angoche” mais de 40 anos depois Embarcação portuguesa, carregada de armamento, desapareceu ao largo de Moçambique a 23 de Abril de 1971. Foi encontrada três dias depois, em chamas, não havendo sinal da tripulação. O jornalista e escritor Rui Araújo investiga o caso do navio português “Angoche” que há 44 anos desapareceu ao largo de Moçambique, carregada de armamento. Em declarações à Renascença, Rui Araújo descreve os factos conhecidos: “O navio parte do porto de Nacala, cerca das 17h00, numa sexta-feira, com destino a Porto Amélia onde nunca chegou. Acaba por ser encontrado, em chamas, por um petroleiro e a
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tripulação apenas detecta a presença de um cão e de um gato a bordo. Os 23 tripulantes do ‘Angoche’, esses, desapareceram”. As especulações em torno do caso são muitas, incluindo um suposto envolvimento da Frelimo, de movimentos próximos do Partido Comunista Português e, até, da Marinha soviética. Algumas teses sugerem que a tripulação foi levada para a Tanzânia, onde teria sido assassinada. Até hoje ninguém reivindicou o ataque e, no essencial, o mistério continua por desvendar. Perante as dúvidas e especulações, Rui Araújo decidiu investigar o caso, começando por reunir documentos. “São 10 mil folhas de origens várias, entre os quais os serviços de informações, do Estado português, da polícia”, descreve. O escritor acredita que o seu livro poderá fornecer algumas respostas. CONVERSAS CRUZADAS
Há "pensamento mágico" no plano do PS? "Duvido que a Comissão Europeia aceite metas", diz Santos Almeida. Já Caldeira Cabral defende estudo macroeconómico que ajudou a elaborar e Daniel Bessa alerta para "facas afiadas no PS" contra o plano.
Cenário macroeconómico socialista esteve em debate no prorama "Conversas Cruzadas" da Renascença Por José Bastos
“O Partido Socialista tem de dar alguma coisa para ganhar as eleições dentro da sua opção ideológica legítima”, sustenta Daniel Bessa na análise do programa macroeconómico do PS. O antigo ministro da Economia defende, no “Conversas Cruzadas” da Renascença, que agora, finalmente, “estamos a falar de política”. “O PS necessita de dar aos portugueses a indicação de que tem mais dinheiro para distribuir e esse dinheiro está nos salários da Função Pública, está, por exemplo, na redução da TSU e não apenas para as empresas”, afirma Daniel Bessa. “Falta saber se esse suplemento de rendimento vai tão a consumo como por vezes se antecipa. A minha dúvida é mais saber se este aumento de rendimento que aqui
se está a deixar, nomeadamente nas famílias, porque é nas empresas não nas empresas vai tão a consumo quanto isso.” “Porque vai ser um slogan ideológico: ‘famílias não empresas!’. Receio que haja aqui um pouquinho de optimismo.” Álvaro Santos Almeida tonifica a argumentação defendida por Daniel Bessa visando mais longe. “Mais que isso”, diz o economista. “É que o modelo assume que o consumo cresce mais que o próprio rendimento disponível, porque a taxa de poupança cai de 9 para 6%. Portanto, não só assume que é tudo gasto em consumo como vai além”, observa. “Obviamente, parece-me que há aqui algum optimismo na capacidade da Comissão Europeia aceitar este tipo de metas para o défice. Não está previsto no documento mas, nas minhas contas, o défice estrutural aumenta o que vai contra os princípios do Tratado Orçamental”, nota Álvaro Santos Almeida. “Uma vez que Portugal não tem um défice controlado o saldo estrutural tem que diminuir e aqui aumenta. Vai no sentido contrário. Duvido que a Comissão Europeia aceite este tipo de metas”, antecipa o professor de Economia da Universidade do Porto. Num ângulo mais político, Álvaro Santos Almeida saúda a apresentação do estudo macroeconómico elaborado por 12 economistas próximos da área socialista. “Apesar de ser um documento de continuidade a partir de um tronco comum, é um documento que corporiza uma alternativa. Tem políticas diferentes daquelas que estão no Pacto de Estabilidade e Crescimento. É o tal aspecto que é muito positivo neste documento no sentido em que permite o debate”, defende. “Dentro de um quadro comum, tomando em consideração o contexto em que a economia portuguesa se insere, apresenta alternativas que podem ser comparadas e discutidas”, nota. Álvaro Santos Almeida: “Agora vai resultar?” “A grande diferença entre o Pacto de Estabilidade apresentado e este documento do PS é que, enquanto o Governo assenta a estratégia de crescimento na competitividade externa e nas exportações, este relatório assenta o crescimento no mercado interno e no aumento da procura interna. “É uma diferença qualitativa importante”, assinala Álvaro Santos Almeida, interpelando directamente Manuel Caldeira Cabral, um dos autores do documento e convidado especial desta edição de “Conversas Cruzadas”. “O que pergunto ao professor Caldeira Cabral é porque é que o grupo de trabalho acha que uma estratégia assente no consumo interno e endividamento, a usada na década passada com resultados já vistos, desta vez irá terá um resultado diferente?”, é a questão de Álvaro Santos Almeida. Manuel Caldeira Cabral repele os pressupostos da pergunta. “Claramente a nossa estratégia não é nem centrada no endividamento nem é centrada apenas no consumo interno”, afirma. “É centrada numa ideia diferente de que para ter um salto no crescimento e ter uma retoma a sério – estancando a perda da actividade económica em que estamos – são precisas, em simultâneo, medidas do lado da procura e do lado da oferta”, explica. “A diferença aqui é que as medidas do lado da oferta
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são radicalmente diferentes das que têm sido seguidas pelo actual Governo”, sustenta Manuel Caldeira Cabral. “O Governo tem assentado a ideia da competitividade externa na compressão da procura interna, porque é por estas compressão que se mantêm baixos salários e baixos factores de produção”, observa o economista. Álvaro Santos Almeida robustece a dúvida. “O programa do PS também tem salários baixos. Nesse aspecto não é diferente”, nota. Já Caldeira Cabral amplia o enunciado. “A ideia da remuneração por trabalhador cair tem a ver com o crescimento do emprego ser, em grande medida, previsto tendo em conta as condições do mercado”. “Não é os salários caírem – prevemos que os salários de quem já está empregado cresçam ao ritmo da inflação, mas não mais - é os novos empregos continuarem a estar com salários abaixo da média”, defende. “Ou seja, o aumento do emprego gera uma diminuição do salário médio. É essa a ideia que está no modelo para ser realista. Não acho que se deva ter grandes aventuras de grandes aumentos salariais, poria em causa a competitividade, mas a ideia de que a competitividade vem apenas da compressão salarial é uma ideia que a própria realidade desmente”, sustenta Manuel Caldeira Cabral Manuel Caldeira Cabral: “Veja-se a indústria do calçado” “Veja-se o caso da indústria de calçado. Não deu a volta por esmagar salários. Nos últimos dois anos até teve aumentos. Deu a volta porque teve uma estratégia sectorial integrada”, afirma Manuel Caldeira Cabral. O economista que integrou a equipa dos 12 peritos convidados do PS recentra argumentos numa das sugestões chave do documento. “O que acelera o crescimento no curto prazo são muito mais as medidas do lado da procura. Isso é óbvio que sim”, reconhece. “Agora o que dá consistência ao exercício que fizemos é ter também medidas do lado da oferta que garantem densidade e estabilidade de médio e longo prazo. Por isso é que prevemos que, por exemplo, o saldo externo não tenha uma evolução tão positiva como no Programa de Estabilidade e Crescimento”, alerta. Daniel Bessa retoma a visão “grande angular” do programa económico do PS. “A análise tem sido muito feita sobre a maior aposta no consumo interno por contraposição às exportações, mas acho que isso é consequência de uma opção ideológica dos autores”, sustenta o antigo ministro da Economia. “Ou seja: é o resultado a que se chegou pela vontade de melhorar de imediato o rendimento disponível interno. Por isso é uma alternativa política que decorre de uma opção ideológica”, sublinha Daniel Bessa. “Gostava de saudar a qualidade do exercício. E vou sobretudo prestar o meu público respeito a três pessoas que fazem parte dos doze envolvidos. Dispenso títulos: são o Mário Centeno, o Manuel Caldeira Cabral e o Paulo Trigo Pereira”, identifica. “São três pessoas que muito respeito a quem eu, seguramente, compraria um carro em segunda mão. Tenho a melhor opinião sobre estes três colegas”, ratifica o director-geral da Cotec Portugal. “Em segundo lugar, sublinho que o estudo respeita a ‘ordem europeia’. Do meu ponto de vista estão, no essencial, respeitadas as grandes orientações da
política europeia. Trata-se de uma alternativa de política interna muito saudável. Posso gostar mais ou menos, mas isso é outra opção. O importante é existir a alternativa”, faz notar Daniel Bessa. “Os socialistas são, às vezes acusados pela direita – que, às vezes, tem umas expressões mais irónicas - de pensamento mágico. A direita gosta muito de acusar o PS de pensamento mágico”, diz . “Por exemplo esta tese de que gasta mais e depois vai haver também mais receita. Ou de que se começa por cobrar menos impostos e depois se vai crescer. É o tema dos multiplicadores. É muito técnico, não quero ir por aí”, nota. “Mas acho que há aqui uma pitadinha de optimismo, talvez um excesso de confiança nos resultados finais do crescimento da economia e, sobretudo, no emprego”, afirma Daniel Bessa. Daniel Bessa: “No PS já há facas afiadas para tratar da vida a ‘idiotas úteis’” “Por último a minha dificuldade maior: já não é a primeira vez que o Partido Socialista se envolve em exercícios destes. Chamar um grupo de independentes e pô-los a fazer um trabalho. Eu próprio conheço esse filme. Já estive metido nisso”, recorda Daniel Bessa. “Só não fiz tão bem feito, porque os meios eram outros”, diz. “Agora há uma ‘comissão de frente’ excelente. Vi o Mário Centeno, temos aqui connosco o Manuel Caldeira Cabral. Agora não sei quanto tempo vai durar esta ‘comissão de frente’”, afirma Bessa numa alusão tácita às reservas de sectores do PS ao despedimento “conciliatório” e aos cortes das pensões para compensar baixa na TSU. “Era muito importante que estes colegas em quem eu acredito viessem dizer que a proposta é mesmo aquela no seu todo. Não é para, depois, fazer a metade de que gostamos e deitar fora a metade de que não gostamos. Isso é terrível”, alerta Daniel Bessa completando o desafio aos 12 economistas. “No PS há muitas facas afiadas para tratar da vida a estes ‘idiotas úteis’. É o risco maior que correm. Fizeram este exercício com a qualidade que tem, dão a cara por ele e espero que depois o partido não os trate como tratou outros no passado”, remata Daniel Bessa num traço autobiográfico com sabor irónico. Manuel Caldeira Cabral não recusa o repto. “Idiotas úteis? Concordo ser esse – sempre - o risco de quem se envolve nestas coisas. É uma pessoa fazer o seu melhor, colocar as coisas em cima da mesa e ter uma esperança legítima e razoável de serem aplicáveis. Todos nós insistimos muito – o Mário Centeno também – na ideia da coerência do documento.” “Há uma consistência no documento que deve ser avaliada e aplicada no seu conjunto. O que não quer dizer que não haja espaço de escrutínio e debate.” “Uma coisa não é contraditória com a outra. Há definições de evolução de políticas de contas públicas que são consistentes com, depois, outras opções de detalhe e de políticas importantes dentro de cada área”, alerta Manuel Caldeira Cabral. “Não são é definições consistentes com dezenas de opções que sejam de aumento de despesa ou outras”, remata.
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