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PARTE INTEGRANTE DE VEJA ANO 48 - NO 44 NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE

4 de novembro de 2015

Vaivém no subsolo: 3 865 toneladas de explosivos para abrir caminho

A MAIOR OBRA DO PAÍS Quase 10 000 operários se revezam 24 horas por dia para concluir até o fim do ano a escavação da Linha 4 do metrô, projeto de 8,7 bilhões de reais


Cidade

Nas profunde A construção da Linha 4 do metrô carioca, a maior obra de infraestrutura Sofia Cerqueira 24

Veja Rio 4 de novembro, 2015


Operários na Estação Nossa Senhora da Paz: 24 horas de trabalho contínuo

FELIPE FITTIPALDI

zas do Rio em andamento no país, entra em sua reta final

Veja Rio 4 de novembro, 2015

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Os números da cidade subterrânea Confira as cifras das obras da Linha 4 do metrô

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Veja Rio 4 de novembro, 2015

FOTOS FELIPE FITTIPALDI

E

nquanto boa parte dos cariocas já está em casa ou dormindo, o vaivém por trás dos tapumes da Linha 4 do metrô continua incessante. Às 23 horas, na cozinha industrial montada na área do Jardim de Alah, espécie de QG da empreitada na Zona Sul, começa a ser feito o almoço do dia seguinte. Os cozinheiros e ajudantes se dividem entre a sala de lavagem de legumes, as câmaras frigoríficas, o açougue e a padaria instalados no local. Sete horas mais tarde, a refeição, preparada em gigantescos caldeirões, está pronta para ser armazenada em boxes térmicos e levada para as 22 frentes de trabalho. Ao mesmo tempo, são assados 10 000 pães para o café da manhã. Por mês, o consumo nos canteiros de obras chega a 236 toneladas de alimentos. Essa é só uma amostra de quão complexa é a engrenagem que move a cidade subterrânea escavada entre Ipanema e Barra da Tijuca. Na reta final, as obras do metrô vivem o pico de atividade, com 9 717 operários revezando-se à frente de máquinas e ferramentas 24 horas por dia. Para que os 16 quilômetros da nova linha estejam em plena operação em 1º de julho, um mês antes da Olimpíada, o ritmo é frenético. “Estamos num momento crucial, que junta trechos de obra civil pesada com grandes áreas em acabamento”, diz o governador Luiz Fernando Pezão. “As pessoas não têm ideia da efervescência que existe embaixo da terra”, completa. O que acontece sob os pés dos cariocas impressiona. Ali, desenrola-se a maior obra de infraestrutura em andamento no país — e na América Latina. Quase todo o trabalho ocorre entre 16 e 22 metros abaixo do nível da rua. A oito meses da data de entrega, boa parte da rede de túneis perfurados do Maciço do

Detalhes de uma obra gigantesca: a cozinha onde são preparadas as refeições, a imagem de Santa Bárbara na boca do túnel da Barra, a área de lazer do canteiro no Leblon e a padaria no Jardim de Alah

Cantagalo, em Ipanema, à Barra ostenta aparência bem próxima da que o público verá na inauguração. Dos 32 quilômetros de trilhos (considerando ida e volta), 18 já estão instalados. Nas futuras estações, o movimento de trabalhadores também fervilha. Das seis paradas da nova linha, as do Jardim Oceânico,

16

8,79

é a extensão do novo trecho

de reais é o custo da construção

quilômetros

bilhões

15 trens foram comprados na China para o sistema

de São Conrado e da Praça Nossa Senhora da Paz são as mais avançadas. Nas três, as escadas rolantes estão montadas, os guarda-corpos instalados e o piso de granito e as paredes de pastilhas em fase de finalização. Na Barra, por exemplo, os pontos de iluminação natural no teto, que lembram um céu estrela-

22

é o número de canteiros de obras

300 000 9 717 novos usuários

serão beneficiados

pessoas

trabalham atualmente na empreitada


do, estão à mostra. Embora a Linha 4 do metrô esteja com 83% das perfurações concluídas, o último trecho, com 1,2 quilômetro, é alvo de muita expectativa. Até o fim de dezembro deve ocorrer a junção entre o túnel da Barra e o da Zona Sul. Para isso, a tunnel boring machine, conhecida como tatu-

zão, equipamento que escava e reveste as paredes de concreto, deve passar pela estação da Antero de Quental nos próximos dias, cruzar o canal da Rua Visconde de Albuquerque por baixo e conectar-se ao restante da linha no Alto Leblon. “É uma obra desafiadora, que exige atenção do início ao último dia”,

ressalta o secretário estadual de Transportes, Carlos Roberto Osório. Tirar a Linha 4 do papel não foi tarefa fácil. O primeiro desafio é o próprio solo carioca, com trechos de rocha e outros arenosos e encharcados, junto à orla. Por isso, foi preciso lançar mão de recursos bastante diversos entre si. No eixo do Leblon à Barra, que passa sob o Dois Irmãos, o Maciço da Tijuca e a Pedra da Gávea, optou-se por detonações. Só ali foram usadas 3 865 toneladas de explosivos, o suficiente para sustentar 161 queimas de fogos do réveillon de Copacabana. Na Zona Sul, densamente povoada, a expansão seria inviável sem o tatuzão, equipamento alemão largamente usado em intervenções similares na Europa. O gigante subterrâneo — 120 metros de comprimento — não evitou, porém, momentos de apreensão. Ao chegar à Rua Barão da Torre, em maio de 2014, abriram-se crateras na via e garagens de prédios tiveram paredes rachadas. Após o reforço na fundação dos edifícios e seis meses de atraso, a máquina começou a operar em velocidade recorde, percorrendo até 32 metros por dia. A sua passagem pelo Jardim de Alah, cruzando o canal que liga a Lagoa ao mar, também gerou tensão, mas ocorreu sem maiores sustos. Orçada em 8,79 bilhões de reais, a obra, que foi iniciada em 2010 e beneficiará 300 000 pessoas por dia, tem só um trecho em superfície, a ponte estaiada da Barra, sobre o Canal de Marapendi. “Tenho orgulho de fazer parte de uma obra desse tamanho”, diz o encarregado de solda Antônio Pereira da Silva, 56 anos. Ele, que deu o chute inicial no jogo de reinauguração do Maracanã, onde trabalhou, sonha participar também da festa da Linha 4. No labirinto subterrâneo escavado entre as zonas Sul e Oeste, o ruído dos equipamentos se funde a inúmeros sota-

17 200 10 000 236 toneladas 2,4 milhões 654 000 refeições

são preparadas por dia na cozinha da obra

pães

são assados diariamente

de alimentos, entre arroz, feijão, legumes, frutas e carnes, são consumidas pelos operários por mês

de metros cúbicos

de areia e rocha foram retirados nas escavações

metros cúbicos

de concreto já foram usados na expansão

8 550

detonações ocorreram no trajeto

365

caminhões são utilizados na empreitada

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OPERADOR DE TATUZÃO

A rota dos trilhos

O português Paulo Nunes, 51 anos, tem vasta experiência com a máquina que perfura o solo do Rio. Já trabalhou em escavações semelhantes na Islândia, na Holanda e na Espanha. “Essa obra é especial, pois fica na cidade onde meus filhos vão crescer”, diz.

A Linha 4 acrescentará 16 quilômetros aos 41,9 já existentes no metrô carioca Pavuna

Vicente de Carvalho São Cristóvão

Linha 1 Linha 2 Linha 4

LUTADOR DE JIU-JÍTSU

Cidade Nova Central

Del Castilho

Carioca Estácio Largo do Machado

Uruguai

Botafogo

MAPA VITOR MARTINEZ

General Osório São Conrado Jardim Oceânico

ques. Como uma cidade recheada de oportunidades, a obra atraiu operários de todo o país e até do exterior. Segundo pesquisa dos consórcios responsáveis pela linha, 40% deles vieram de outras regiões e há representantes de 23 dos 26 estados brasileiros. “Já morei no meio do mato e agora estou no céu. Passo o dia no buraco, mas posso andar na praia no fim da tarde”, conta o encarregado de escavação Edson Lopes, 43 anos, um paranaense que trabalhou em cinco hidrelétricas. Hoje, ele mora no alojamento do metrô, no Leblon. A vida oculta pelos tapumes surpreende. Em todos os canteiros, na superfície, foram criadas áreas especiais para o lazer dos funcionários, onde, após as refeições, é possível jogar totó, pingue-pongue e ver TV. Várias delas têm biblioteca. Mas é no

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Praça N. S. da Paz Jardim de Alah Antero de Quental

FOTOS FELIPE FITTIPALDI

Gávea

subsolo que não faltam curiosidades. A cada entrada de túnel, por exemplo, fica uma imagem de Santa Bárbara, padroeira das escavações. Para que os trabalhadores não percam a noção de sua localização, há placas nas paredes escavadas com o nome das ruas situadas acima. E, como forma de enfrentarem o desconforto lá debaixo, onde a temperatura chega a 38 graus, foram instalados ventiladores gigantes, além de bebedouros e banheiros junto às estações — são 533 sanitários na obra. “É cansativo, mas não reclamo. Vim tentar a sorte e agora participo da história do Rio”, diz o paraibano Marco Polo Barbosa, 44 anos, que antes trabalhou como encarregado de pedreiro na Cidade das Artes e no Maracanã. Não há dúvida de que a chegada do metrô à Barra é um alento no deficitário

Wallace Mesquita, 31 anos, ostenta um currículo incomum para um carpinteiro. Ele foi campeão mundial de jiu-jítsu, categoria pena, em 2013. O metrô do Rio é sua primeira grande obra. “O jiu-jítsu não está na Olimpíada, mas vou deixar minha marca nos Jogos do Rio”, afirma.

transporte de massa da cidade. O que está sendo realizado em seis anos — 16 000 metros de linha subterrânea — é quase igual ao que foi feito em 35 anos. O metrô carioca, inaugurado em 1979, tem 41,9 quilômetros de extensão, dos quais só 17 foram projetados como túnel — os demais trilhos ficam na superfície. O avanço da rede metroviária é ínfimo, se comparado ao de cidades como Xangai. A metrópole chinesa, que até 1993 nem sequer contava com esse meio de transporte, tem hoje o maior sistema de metrô do mundo, com 500 quilômetros de linhas. Nas últimas duas décadas, foram inauguradas no Rio apenas doze estações. A atual expansão só saiu do papel graças a uma conjunção de fatores, dos quais o mais vistoso é a realização dos Jogos Olímpicos na cidade. Desde o


VETERANA DE GRANDES OBRAS

A nutricionista Jeruza Souza, 34 anos, é especialista em cozinhar para multidões. Atuou na construção de hidrelétricas e na reforma do Maracanã. “Não é qualquer um que faz 17 000 refeições por dia, com cada prato de comida pesando mais de 1 quilo”, conta.

início, sabia-se que a logística seria monumental. Só para se ter ideia, foi preciso abrir uma espécie de piscinão subterrâneo junto à General Osório para depositar o entulho das escavações. Diariamente, toda a terra removida é transportada até uma área de descarte em Senador Camará por caminhões que se concentram em locais como a Rua Tonelero, em Copacabana, o que volta e meia gera reclamações de moradores. Eles são parte de uma frota de quase 400 máquinas, entre elas tratores e escavadeiras, que circulam pelos canteiros. Um dos modelos, a pá carregadeira, tem como operadora Fátima da Conceição Silva, 52 anos. “No futuro, vou poder dizer aos meus filhos que ajudei a construir o metrô e que meu trabalho foi muito importante”, orgulha-se a motorista.

MOTORISTA DE TRATOR Ex-auxiliar de cozinha, Fátima da Conceição Silva, 52 anos, descobriu sua vocação profissional como operadora de pá carregadeira. Seu trabalho é abastecer as betoneiras com areia e brita. “Piloto muito melhor a máquina do que o fogão”, brinca.

A tão sonhada ligação entre Ipanema e a Barra por baixo da terra chega à reta final com quase cinquenta anos de atraso. Um plano metroviário de 1968, assinado por técnicos alemães contratados pelo então Estado da Guanabara, já previa um traçado para a Zona Oeste. No entanto, o primeiro estudo para esse transporte é de 1947, época em que a Light administrava os antigos bondes da cidade. Agora, o governo do estado se debruça sobre um plano diretor para o sistema metroviário com projeções até 2045. Diferentemente de obras anteriores, tanto a nova estação da Gávea, com abertura programada para o fim do próximo ano, quanto a do Jardim Oceânico foram construídas já prevendo expansões. Ou seja, não ficarão fechadas no caso de ampliações, como a da Praça General Osório em

2013. Entre as próximas intervenções, garante o governo estadual, está o aumento da Linha 2, entre Estácio e Praça XV, cujas obras devem iniciar-se em 2016. Também está sendo avaliada a obra da Linha 3, toda em superfície, de Niterói a São Gonçalo. Há ainda estudos para levar o metrô da Barra ao Recreio e Jacarepaguá e para conectar Gávea a Botafogo, pelo Jardim Botânico. Por enquanto, todos os esforços se concentram no cronograma da Linha 4. Após a junção dos túneis dos dois trechos, serão concluídas a instalação dos trilhos e a fase de acabamento. Em março devem começar os testes com trens. A linha passará a receber o público em junho, quando, então, os cariocas poderão ter a incrível experiência de ir de Ipanema à Barra em apenas treze minutos. ■

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