11/05/2012 Infosurhoy

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2012-05-11 | Panmela Castro: grafite e ativismo social

Por Daniela Oliveira para Inforsurhoy.com – 11/05/2012 RIO DE JANEIRO, Brasil – O que a presidente Dilma Rousseff, 65, e a grafiteira e ativista social Panmela Castro, 30, têm em comum?

Panmela Castro (de camiseta verde cla ro) com estudantes que participaram d e um sobre questões de gênero na Bro nx International High School, em Nova Y ork. (Cortesia de Anarkia Boladona)

Além de serem personalidades de destaque em áreas dominadas por homens, as duas foram as únicas brasileiras citadas na lista de 150 mulheres que abalam o mundo (http://www.thedailybeast.com/features/150-women-whoshake-the-world.html%20%20), publicada em março pela revista Newsweek e pelo site The Daily Beast.

Dilma e Panmela, que assina suas obras sob o pseudônimo Anarkia, aparecem na lista ao lado de mulheres como a secretária de estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, a primeira ministra da Alemanha, Angela Merkel, e personalidades como Oprah Winfrey e Angelina Jolie. A brasileira vem chamando a atenção por seus grafites femininos e feministas e pelo trabalho que faz com a ONG Nami Rede Feminista de Arte Urbana (http://www.redenami.com%20%20), ou simplesmente Rede Nami, da qual é idealizadora. A Rede Nami usa as artes urbanas para promover os direitos das mulheres. Panmela e suas parceiras dão workshops de grafite em favelas e bairros pobres do Rio de Janeiro para conscientizar as mulheres destas regiões sobre seus papéis na sociedade. “Por ser uma arte de rua, o grafite atinge a todos e tem poder para causar uma mudança social positiva. Por meio dele, vamos até as comunidades discutir com outras Clique para ver a apresentação de fotos mulheres questões de gênero, violência doméstica e psicológica e muito mais”, diz ela, que acaba de voltar de Istambul, onde participou de um fórum sobre os direitos das mulheres e o empoderamento feminino. “Se convidássemos apenas uma advogada para falar sobre a Lei Maria da Penha (http://dialogoamericas.com//pt/articles/saii/features/main/2011/10/12/feature-01) [que tenta coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher], não teria o mesmo apelo e muitas mulheres nem apareceriam.” Panmela se casou aos 21 anos. Dois anos mais tarde, ela começou a grafitar nas ruas do bairro da Penha, na Zona Norte do Rio de Janeiro. “Usava o grafite para colocar para fora um pouco das minhas angústias”, diz.


A grafiteira conta que era muito tímida e o grafite foi moldando, aos poucos, sua voz. Aos 24, seu casamento acabou. “Eu me dei conta de que algo mais tinha mudado”, diz ela. “Fui ficando mais politizada em relação aos direitos das mulheres e procurava passar isso em meus desenhos.” Evas, bruxas e libélulas Nos grafites de Panmela, há sempre Evas, bruxas e outros personagens míticos femininos, desenhados com cores quentes. Muitas vezes, palavras e frases fortes cobrem pedaços da obra e a pintura exprime alguma forma de dor – num deles, por exemplo, a personagem chora lágrimas de sangue. Mais recentemente, uma libélula tem aparecido com frequência nas pinturas. “Ela representa a liberdade feminina em ser o que se deseja e não o que a sociedade quer”, explica Panmela. Nas oficinas que Panmela e outras artistas da Rede Nami fazem nas comunidades do Rio, elas abrem o encontro com esquetes de teatro. Depois conversam sobre o tema escolhido. Por fim, incentivam as participantes a grafitarem o que foi abordado num mural coletivo, nos muros da favela. “Quando fazemos uma oficina de grafite cujo tema é violência doméstica, sempre falo das experiências próximas a mim, vividas por tias, primas e amigas. Elas não são diferentes dos relatos que ouvimos nas comunidades”, conta a grafiteira. “Muitas vezes, as vítimas têm vergonha de se expor e acham que devem ficar caladas ou que fizeram algo por merecer.” Só em 2011, mais de 1.000 mulheres de comunidades cariocas participaram das oficinas da Rede Nami. Muitas delas sofrem caladas até conhecerem Panmela Castro e sua turma, diz a vicepresidente da Rede Nami, Daniele Kitty, de 19 anos. “Uma mulher do Morro do Borel [na Zona Norte do Rio] denunciou o marido à Delegacia da Mulher depois de uma de nossas oficinas de grafite”, diz Daniele. “A Rede Nami ajuda essas mulheres a repensarem suas vidas. Nosso trabalho de campo é incrível e Panmela é um exemplo. Num meio dominado por homens, ela é uma das poucas grafiteiras expoentes.” As mentoras da Rede Nami também têm suas próprias oficinas. Recentemente, elas participaram de uma série de workshops e palestras que deram a elas mais material para abordar o tema da violência doméstica e outras questões de gênero nas favelas do Rio. Entre as mulheres que se apresentaram para o grupo, estavam a chefe de polícia civil do Rio, Martha Rocha, e a ativista Schuma Schumaher, uma das criadoras da primeira delegacia de atendimento às mulheres vítimas de violência no Brasil. Além das oficinas, Panmela é constantemente convidada para grafitar em muros de cidades como Nova York, Paris, Istambul, Berlim, Washington, Toronto, Praga e Johanesburgo. No início deste ano, ela participou de oficinas de grafite em escolas americanas. Mas, no Brasil, Panmela ainda é pouco conhecida. “Nosso trabalho está só começando. Tenho muito que mostrar e falar sobre os direitos das mulheres. Principalmente no nosso país”, diz ela, que é formada em artes plásticas pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e faz mestrado na mesma


área na Universidade do Estado do Rio (UERJ). Rio: 137 vítimas de violência contra a mulher por dia Segundo o Dossiê Mulher (http://urutau.proderj.rj.gov.br/isp_imagens/Uploads/DossieMulher2011.pdf%20%20),

estudo divulgado pelo Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro em 2011, a violência contra mulher é alarmante no estado. Em 2010, ano base do estudo, foram registradas 49.950 ameaças contra mulheres no Rio – cerca de 137 vítimas por dia. O mesmo estudo mostra que as mulheres são a a maioria das vítimas de estupro (81,2%), ameaça (65,4%) e lesão corporal dolosa (62,9%). Grande parte desses delitos ocorre no espaço doméstico e no âmbito de relações familiares. Uma casa no Complexo da Maré Dias depois da lista da Newsweek ser publicada, Panmela teve seu trabalho reconhecido ao ser uma das cinco premiadas no DFV Awards (http://www.dvf.com/inside/Article/inside-dvf-acticles/dvfawards-3), da fundação da estilista Diane von Furstenberg. O prêmio homenageia esforços para melhorar a situação social, econômica e política de mulheres no mundo todo e rendeu a ela US$ 50.000. “Com este dinheiro, a Rede Nami vai comprar uma casa no Complexo da Maré. Vamos trabalhar com as mulheres da região, que é uma das mais empobrecidas da cidade”, diz Panmela, que, em 2010, recebeu o prêmio Global Leadership, da organização Vital Voices, pelo seu trabalho na promoção dos direitos das mulheres, e foi reconhecida como grafiteira da década no prêmio Hutúz, no Brasil. “Tudo que tenho é coragem e vontade para mudar a realidade que vemos.”

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