A LEITURA DA IMAGEM: o feminino nas obras de Frida Kahlo e Pablo Picasso AUTORA: Márcia Maria Lopes de Souza1 ORIENTADORA: Roberta Puccetti2. RESUMO: A participação no programa PDE oportunizou a reflexão teórica sobre arte, surdez, gênero, possibilitando novas práticas docentes ao abrir caminhos para ações pedagógicas significativas, que visam a superação dos constantes desafios em busca das possibilidades da arte na evolução crítica do nosso aluno. Espera-se que haja uma aprendizagem significativa, de acordo com os conteúdos selecionados para o ensino de arte e que, através da leitura da obra de arte, os alunos possam ressignificar a própria realidade, transformando seu cotidiano. E também que, analisando as obras de arte, nossos alunos possam superar o olhar que emite um julgamento moral e de senso comum, passando a um olhar mais crítico, independente, observador e perceptivo através da mediação. Em outras palavras, um olhar que possa, de fato, alcançar um melhor entendimento e compreensão da arte e do mundo à sua volta, mormente por parte dos alunos surdos.
PALAVRAS CHAVES: Ensino de Arte. Surdez. Gênero. Poética pessoal.
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Professora de Arte da rede pública de ensino do Estado do Paraná, atuando no Colégio Estadual do Iles em Londrina-PR, e participa do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) da SEED-PR. 2 Mestra e Doutora em Educação, docente do Departamento de Arte Visual da Universidade Estadual de Londrina e é orientadora no Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) da SEED-PR.
INTRODUÇÃO:
A elaboração do Projeto de Intervenção Pedagógica teve como objetivo trabalhar a leitura da imagem com os alunos do terceiro ano do Ensino Médio do Colégio Estadual do ILES, tendo como partida a representação do feminino nas obras contemporâneas de Frida Kahlo e Pablo Picasso. A escolha desse tema veio ao encontro da necessidade percebida desta unidade escolar constituída por alunos surdos. Assim, a finalidade é implementar um ensino voltado para o desenvolvimento de uma percepção ou leitura de imagem, que pretende-se isenta de um julgamento moral. Esta lógica buscará analisar não apenas os elementos formais, mas também questões subjetivas presentes em toda obra de arte e que, por diversos motivos, possam passar despercebidos aos olhos menos atentos aos aspectos sensíveis e pouco formais de uma obra de arte. Neste sentido, faz se necessária uma compreensão do universo do surdo, que se constitui numa realidade diferente do ouvinte, já que o aluno surdo possui uma condição específica de falante de uma língua visual espacial (libras). Esta língua confere a este estudante uma identidade, por isso, esta proposta buscou um desdobramento e um debate crítico que se somou às reflexões das questões de gênero a partir das artes visuais em sala de aula, associadas à aprendizagem de aspectos da história da arte junto à reflexão de gênero sobre as obras destes dois artistas contemporâneos: Frida Kahlo e Pablo Picasso, selecionados para a análise e as interações em sala de aula, nesta proposta pedagógica. O propósito deste artigo consiste em apresentar o resultado das atividades e das experiências acumuladas no decorrer do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, desenvolvido em quatro períodos ao longo de 2012 e 2013. O programa PDE favoreceu a reflexão teórica entre a disciplina de Arte e a Educação Bilíngue, oportunidade ímpar de aprofundar em novas abordagens da arte contemporânea, construindo uma rica troca de experiências ao longo de sua duração e promovendo um novo olhar sobre o aluno surdo, oportunizando a esse aluno uma experiência, onde ele foi protagonista na construção de seu conhecimento.
O ENSINO DE ARTE E SURDEZ, UM DIÁLOGO NECESSÁRIO
Para a elaboração deste trabalho, foram realizadas leituras e reflexões sobre o tema. Tema este que se alicerça nas seguintes referências bibliográficas com as autoras Ana Mae Barbosa, Paula Botelho, Anamélia Bueno Buoro, Mirian Celeste Martins, Analice Dutra Pillar, Maria Helena Wagner Rossi, entre outros. Consideramos que a Arte tem um papel fundamental para a sociedade, pois ao tempo em que a sua aprendizagem humaniza o indivíduo, também pode torná-lo um cidadão mais crítico e consciente. Essa forma de expressão humana, a Arte, tem um potencial de oportunizar um olhar mais sensível que amplia a percepção e a compreensão do mundo. A mediação dos conteúdos estético-formais buscou ampliar as ligações entre os alunos, estabelecendo um diálogo entre a arte e a realidade vivenciada por eles. Tendo o aluno surdo uma maior necessidade de comunicação através das imagens, a disciplina de arte muito contribui para sua aproximação dos valores sociais, propiciando uma forma bastante eficaz, crítica e sensível de comunicar-se com o mundo e expressar seu pensar, livre das amarras impostas pelas barreiras naturalizadas por distorções advindas de suas condições físicas ou biológicas. Nesta perspectiva, fez-se necessária, no desenvolvimento das propostas, a mediação dos conteúdos através das leituras das imagens, transformando os alunos em protagonistas no processo de aprendizagem. Desta forma, os estudantes surdos experimentaram e vivenciaram um processo criativo e de libertação. Segundo Ana Mae Barbosa em seu livro, Inquietações e Mudanças no Ensino da Arte: Por meio da arte é possível desenvolver a percepção e a imaginação, apreender a realidade do meio ambiente, desenvolver a capacidade crítica [...] permitindo ao indivíduo analisar a realidade percebida e desenvolver a criatividade de maneira a mudar a realidade que foi analisada. (BARBOSA, 2003, P.18).
Todo o conteúdo da disciplina foi mediado junto aos alunos através da linguagem de LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais, que são imagens do pensamento dos surdos e é responsável pelo seu processo de interação social, cultural e científico na comunidade surda brasileira, é uma língua visual-espacial.
Desta forma, toda a linguagem visual explorada na disciplina de arte, vai ao encontro das necessidades educacionais do aluno surdo, que diferentemente do ouvinte, percebe o mundo através de uma experiência visual. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, é direito do aluno surdo o acesso aos conteúdos em LIBRAS, que foi reconhecida como língua e oficializada no Brasil em 24 de abril de 2002 pela Lei nº. 10.436. Buoro assegura-nos e nos indica caminhos que se encontram com a Lei acima citada, quando em suas reflexões teóricas nos diz: É imperativo investir numa prática que transforme esses sujeitos em interlocutores, envolvidos em intenso e consistente diálogo com o mundo, estimulados para isso por conexões e informações que circulam entre verbalização e visibilidade. (BUORO, 2002, p. 34-35)
Já, Botelho reforça esse conjunto de ideias quando nos aponta que uma das defesas dos surdos face à opressão dos ouvintes é o silêncio. “[...] ainda que os surdos estejam rompendo com a dominação a que têm sido sujeitados [...] a cultura do silêncio ainda se mantém”. (2005, p. 99-100). Para Skliar (1999), ocorre um amordaçamento da língua surda! Percebemos que o desconhecimento da língua de sinais na sociedade colabora para perpetuar as diferenças no ambiente escolar, mantendo-se a lógica da discriminação dos diferentes, como parte de uma sociedade cada vez mais sectária, onde prevalece o conceito da eficiência sobre a existência da deficiência. Em se tratando do debate sobre a igualdade de gênero, podemos perceber, através de inúmeros recursos sociais e culturais, que ainda permanece uma prevalência do mando masculino. Desde o discurso jurídico e considerando-se as diversas esferas políticas e sociais, permanece ao longo da história da humanidade a lógica androcêntrica perversa, que confina mulheres até os nossos dias e, sobretudo, as pobres à segregação e discriminação nos diversos espaços da sociedade. Neste contexto, há que se pensar na potencialidade do ensino da arte como uma construção de conhecimento e relações necessárias para se refletir acerca dos diferentes papéis exercidos por diferentes mulheres sob uma perspectiva mais igualitária. Faz-se necessário considerar os diversos lugares e tempos da história da humanidade para, então, estabelecer relações de gênero a partir das considerações
acerca das possibilidades sócio/culturais apresentadas nas obras, numa perspectiva dos conceitos e igualdade de gênero.
A LEITURA DA IMAGEM Segundo Pillar, “[...] a leitura da obra de arte é de natureza diferente” (1999, p.15). Ler uma obra seria, então, perceber, compreender, interpretar a trama de cores, texturas, volumes, formas, linhas que constituem uma imagem. Perceber objetivamente os elementos presentes na imagem, sua temática, sua estrutura. (Pillar,1999, p.15). Cabe ao professor mediador promover uma sensibilização do olhar na leitura da obra de arte para além de sua estrutura básica e de seus elementos constitutivos e significantes. De acordo com a DCE –Diretrizes Curriculares do Paraná (2006), os conteúdos da disciplina devem abordar a Arte como linguagem, uma vez que esta foi considerada como fundamental no processo de conhecimento do mundo, nas interações sociais, nos quais indivíduo e linguagem constituem-se mutuamente. A Arte, enquanto linguagem, interpretação e representação do mundo, é parte deste movimento humano. Enquanto forma privilegiada dos processos de representação humana, é um instrumento essencial para o desenvolvimento da consciência, pois propicia ao homem contato consigo mesmo e com o universo... O conhecimento do meio é básico para a sobrevivência, e representá-lo faz parte do próprio processo pelo qual o ser humano amplia seu saber (BUORO, 2000, p. 71). Pensando nesta perspectiva, é premente que a leitura da obra de arte seja realizada com uma reflexão de conceitos de gênero, criando assim uma verdadeira trama, onde o nosso aluno possa explorar suas vivências, abrindo espaço para a criação das suas próprias histórias no futuro, ao descortinar o conceito da existência de sua poética pessoal.
DESPERTANDO PARA UM NOVO OLHAR
A proposta contou com a apresentação aos alunos do projeto PDE e explanação de como ele seria desenvolvido durante o primeiro semestre. Introduzimos sua principal linha temática, A Leitura da Imagem e suas principais
ramificações: O Feminino nas Obras Frida Kahlo e Pablo Picasso. Assim sendo, foram levantadas as informações que os alunos possuíam a respeito destes temas. Eles foram instigados a pensar sobre a participação da mulher na sociedade atual e os papéis nela ocupados por homens e mulheres. Essa reflexão foi importante, pois quando da apresentação da mulher como protagonista na arte, eles foram estimulados a lembrar nomes das mulheres produtoras em arte. Constatou-se a invisibilidade da mulher produtora de arte, pois as únicas artistas lembradas indiretamente foram Anita Malfatti e Tarsila do Amaral. A imagem que veio à cabeça de alguns alunos também não causou surpresa, devido, talvez aos contínuos reforços de algumas imagens da arte que são normalmente utilizadas em aulas de arte. Assim sendo, foram citadas as obras “Abaporu”, “O ovo” e “Operários”. Os alunos não lembraram os nomes das obras, mas conseguiram descrevê-las. Seguiu-se um debate a respeito da importância destas artistas para a arte brasileira. Na sequência, com o objetivo de dar forma ao contexto histórico, fizemos um relato do papel da mulher nos espaços públicos e privados. Os alunos contribuíram com colocações e, com a mediação docente, puderam tecer uma nova luz às suas ideias em relação tanto à forma da arte quanto nas questões do feminino que permeavam suas vidas, até aquele momento. Essa diligência foi ao encontro das atividades que estavam sendo promovidas e desenvolvidas no colégio em torno do Dia Internacional da Mulher e que, em uma ação interdisciplinar, envolvia as disciplinas de Libras, Arte, Sociologia, Filosofia, Língua Portuguesa e História.
ACRESCENTANDO NOVOS ARTISTAS
Fizemos uma breve reflexão sobre a importância, vida e obra das mulheres artistas: Artemísia Gentileschi, Mary Cassatt, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti e Frida Kahlo, artista escolhida para trabalhar neste projeto. Diante da necessidade de uma comunicação mais ágil, foi escolhido um sinal para Frida Kahlo. Os próprios alunos, depois de atenta observação junto a imagem da artista, que também renderam vários comentários sobre o buço e a sobrancelha avantajada de Frida, decidiram que seu sinal seria a letra “F” sinalizando na sobrancelha direita do interlocutor. Por ter sido uma discussão
coletiva, todos aprovaram o sinal. Durante estes debates, ficou clara uma forte reação de interesse na história sofrida da artista. Suas dores, amores, traições, superações, sua intensa luta pela vida e como tudo isso foi fundamental para seu processo criativo. O drama humano foi percebido neste projeto como uma das pontes que podem aproximar o aluno do rico universo da arte, e evidenciou-se como é forte a necessidade do professor de arte atuando como mediador desses processos. Alguns alunos relataram situações familiares que lembravam o sofrimento pessoal de Frida e reconheceram como a expressão através da arte poderia ser libertadora. O filme Frida foi levado a eles com recortes, objetivando dinamizar o tempo destinado para a exibição do filme, como também focar nos conteúdos mais pertinentes às ações da arte, desejadas e contempladas no projeto. Notou-se que mais alunos identificaram o sofrimento da artista e relacionaram sua vida à sua poética. Identificaram em seus quadros o sofrimento e as turbulências de sua vida. Os alunos puderam, assim, debater e questionar várias passagens do filme, como o acidente sofrido por Frida, seu relacionamento tumultuado com Diego Rivera, seus abortos e como tudo isso foi retratado em suas pinturas. Em nossas conversas, o debate artístico se tornava cada vez mais rico e os olhares mais atentos, frente às obras que agora povoavam o ambiente da sala de aula. Percebendo possíveis viagens em torno da artista, solicitei aos alunos que pesquisassem na internet as obras de Frida Kahlo, observando sua poética e também a representação feminina presente em seu fazer, em seu mundo e em seu discurso que se apresenta atemporal.
LENDO A POÉTICA DE FRIDA Após uma breve análise sobre a vida da artista, foi apresentada aos alunos a imagem : “As Duas Fridas” (1939 – Museu de Arte Moderna da Cidade do México). Solicitei assim, aos alunos a descrição visual, somada a elementos visuais da obra, mais observações pessoais, após isso responderam as seguintes questões: O que você vê na tela? Quais são os elementos visuais, você identifica na obra? Existem diferenças entre as figuras representadas? Quais as cores mais utilizadas na obra? Por que a tela intitula-se “As Duas Fridas”?
Que relação tem o nome da tela com a vida de Frida? Na tela, Frida representa o universo feminino? Quais pontos emocionais você percebe nesta obra? Estes emocionais dialogam de que maneira com a sua bagagem pessoal? Quais elementos da Arte Contemporânea você vê nesta obra? A artista Frida Kahlo usa elementos simbólicos nesta pintura? Cite dois elementos encontrados por você e os explique. Na sequência, objetivando uma possibilidade de expressão da poética pessoal dos alunos, que poderia naquele momento ser a forma textual entre outras formas próprias da arte, apresentei o poema escrito pela professora Dalva Molina Mansano, inspirado na obra de Frida Kahlo, “As Duas Fridas”. Os alunos foram conduzidos a verbalizar com muita naturalidade o que sentiam diante da obra. Desse sentimento por eles demonstrado, poderia sair um registro importante.
OS CORAÇÕES DE FRIDA “Por ser sozinha (em meu pintar distinto) e por ser o assunto que mais conheço, a mim mesma pinto.
Sob céu tempestuoso, meu coração posto a nu, mostra o que eu sinto.
Sangra ele pela artéria da que também sou eu e que a mim dilacera.
Levo na mão esquerda o que julgam ser o terceiro olho, talvez minha grande perda.
Ele extirpado, agora me conduzo, tenho dois olhares para o mesmo ponto, já libertos do obtuso.
Um coração partido, Sou duas em uma, sangrando no vestido.
Outro coração inteiro, porque não pinto sonhos em pluma, meu tema é verdadeiro.”
Os alunos fizeram uma interpretação do poema buscando desvendar signos que estavam presentes no texto. Algumas palavras eram desconhecidas pelos alunos, mas através da libras foi possível um entendimento da poética do texto. A aluna “K” reconheceu no primeiro verso do poema a frase de Frida, que já tinha ilustrado a nossa aula.
DO TEXTO À PRODUÇÃO VISUAL
Os alunos produziram um texto sobre Frida Kahlo e, a conduta normal dos alunos surdos é uma escrita que obedece uma estrutura de texto bastante particular, onde o texto é composto e construído por fragmentos de sentenças, nestes fragmentos, foi possível perceber o entendimento que eles tiveram sobre o tema estudado. A partir daí, na perspectiva do trabalho de mediação conduzido por mim, houve uma imersão no universo de Frida, onde os alunos produziram colagens, desenhos e pinturas sobre a artista, conforme se verifica nas figuras 1 à 6.
Figura 1
Figura 2
Figura 3
Figura 4
Figura 5
Figura 6
As alunas C e K, propuseram a construção de uma pintura em grandes dimensões, tendo como base uma das obras de Frida, conforme figuras de 7 a 9. Os alunos demonstraram nos desenhos e nas pinturas, toda a paixão e identificação com as obras de Frida Kahlo.
Figura 7
Figura 8
Figura 9
O CONTATO COM OS RETRATOS
Dando sequência aos trabalhos, os alunos foram levados a analisar a forma como mulheres e homens foram retratados. As seguintes questões propunham conduzir o debate artístico e um olhar mais atento e crítico a respeito da obra de arte. Vocês conseguem observar o que define um retrato? Vocês identificam a figura principal em um retrato? Existe diferença na forma como mulheres e homens foram retratados? Vocês identificaram-se com essas imagens? Como um artista pode produzir um autorretrato? Quais as expressões que vocês identificam nos retratos e autorretratos visualizados? A partir dos debates realizados em sala, onde cada um pode manifestar-se, não se perdendo em brincadeiras ou fugas de conteúdo típicas de adolescentes,
concluiu-se que os alunos conseguiram facilmente identificar retratos e autorretratos e fizeram observações relevantes sobre a “posição” (pose) das pessoas retratadas, pois alguns não desvinculavam a ideia do retrato a uma foto 3x4, onde a pessoa retratada está sempre numa pose estática e em um único plano. Diante destas falas, houve a necessidade de fazer um recorte onde questões pertinentes à arte moderna e contemporânea puderam vir à tona. Como ação em arte, foi produzido pelos alunos um autorretrato. Inicialmente ficaram insatisfeitos com os resultados, pois ainda se prendiam a padrões realistas na arte, mas após um debate onde o olhar a respeito da arte contemporânea e questões de belo foram o foco, os alunos conseguiram rever seus valores e validar o próprio trabalho de criação. Continuando essas interações relacionadas à produção de retratos, partiu-se para diversas produções como a de um retrato de uma mulher que fosse significativa para eles. Todos os alunos falaram que iriam retratar as mães, pois julgavam ser a mulher mais importante em suas vidas. Uma outra linha temática proposta foi a execução do retrato do amigo. Alguns alunos ficaram insatisfeitos com o resultado final do desenho, o que nos levou novamente a debates próprios da arte, onde questões diversas nos levaram a uma apropriação de um olhar próximo à contemporaneidade, onde noções ideais de “belo” e “feio” são observadas em uma instância revelando diversas necessidades e diversos diálogos frente ao mundo. Observou-se que a medida que foram experimentando diferentes materiais e suportes, os alunos foram exercitando uma liberdade cada vez maior para criar e ousar em seus desenhos e pinturas e passaram a gostar dos resultados alcançados e a querer desenhar cada vez mais. Os resultados obtidos vislumbraram nas figuras seguintes.
Figura 10
Figura 11
Figura 12
Figura 13
Figura 16
Figura 15
Figura 14
Figura 17
Figura 18
Figura 19
A opção de trabalhar com lápis 6B usando graduações tonais em luz e sombra com o grafite, na busca de um realismo maior em suas representações, foi determinante quando da realização dos seus autorretratos. A pintura tendo como suporte a fotocópia de uma fotografia (um retrato do próprio aluno) proporcionou um grande envolvimento em suas ações junto a arte e a praticaram como um exercício de libertação, pois usaram e abusaram das cores aplicadas nos desenhos, com bastante liberdade, já acenando para a necessidade do entendimento da elaboração de suas próprias poéticas pessoais. Vide figuras 22/25.
Figura 20
Figura 21
Figura 23
Figura 24
Figura 22
Figura 25
PABLO PICASSO, UM CONTRAPONTO
As propostas ligadas a Picasso iniciaram-se com apresentações de diversas imagens de suas obras na TV Multimídia, o que possibilitou uma análise sobre as mesmas. Vocês reconhecem essas pinturas? Lembram de ter visto essas imagens? Vocês conhecem esse estilo de pintura? Sabem quem foi Pablo Picasso? Esses questionamentos fomentaram um amplo debate em sala, onde todos os alunos participaram ativamente. Após assistirem a recortes do filme “Os Amores de Picasso” e da análise sobre sua poética, iniciamos a aula no laboratório de informática, onde os alunos pesquisaram a respeito do Cubismo Analítico e Cubismo Sintético. Apresentou- se assim uma excelente oportunidade para trabalharmos a representação feminina na poética de Picasso. Debateu-se junto aos alunos como essas mulheres eram retratadas nas diferentes fases de sua pintura. Como então Picasso representava suas esposas e amantes, com o vigor do apogeu ou declínio
das suas relações vividas. A discussão pontuou aspectos do seu envolvimento emocional no contexto histórico e político, que acompanhava suas pinturas,que segundo alguns críticos, permeava ou definia a sua poética.
DA LEITURA À PRODUÇÃO Iniciando a reflexão sobre as obras de Picasso, foi proposto aos alunos a leitura descritiva da imagem “A Mulher Chorando”. Os alunos foram instigados a analisar a imagem através dos seguintes questionamentos: a) O que a imagem sugere a você? b) Quais são os Elementos Visuais presentes na obra “A mulher Chorando” (1937) de Picasso? c) As principais linhas apresentadas na obra descrevem quais movimentos ou condutas visuais? Diagonais? Curvas? d) Existe a presença de contrastes? Quais são eles? e) Quais aspectos da Arte Contemporânea que você vê já presentes nesta obra de Picasso? Lembrando que Picasso em algumas condutas de seu fazer e poéticas antecede a Arte Contemporânea e também questões da Abstração. Relacionando os conhecimentos já adquiridos com Frida Kahlo, optamos por fazer um painel coletivo em grandes dimensões, como forma de levar o aluno a apropriar-se dos conteúdos visuais percebidos na obra. Dando seguimento aos olhares mediados frente às obras de Picasso, os alunos produziram retratos e a partir destas produções e foram desafiados a citar elementos do Cubismo, como forma de apropriação de conteúdos que o aproximem da poética de Picasso, abrindo espaço para, no futuro, os alunos entenderem como a produção de Picasso torna-se um contraponto e caminho para a Abstração. Para Canton, no Cubismo, a fragmentação das imagens projetava simbolicamente a própria fragmentação do mundo da industrialização. Na arte abstrata, procurava-se uma síntese que transcendesse uma realidade de guerras, destruições e desigualdades. Temos abaixo uma amostra nas figuras 26/30.
Figura 26
Figura 27
Figura 29
Figura 28
Figura 30
FUNDAMENTANDO POÉTICAS PESSOAIS:
REFAZENDO A BAGAGEM PARA
NOVAS VIAGENS...
Tendo como finalidade maior e fechando os conteúdos propostos, os alunos foram instigados sobre as diversas possibilidades de elaborar retratos e autorretratos na arte contemporânea, para isso enriquecemos seus conhecimentos frente a arte, usando como apoio metodológico o DVD Arte na Escola, cujo conteúdo trata a respeito de Autorretrato. Assim sendo, foi oportunizado aos discentes o contato com outros artistas e suas obras, oferecendo diversas possibilidades ao aluno de criar e produzir em busca de uma própria poética visual. Houve identificação com as obras de Paula Rego, Dora Longo Bahia, Lourdes Colombo e Panmela Castro, mas causou grande impacto e movimentação as obras da grafiteira Panmela Castro, mais conhecida como Anarkia Boladona, tornando-se rapidamente a artista preferida dos alunos. O aluno “F” demonstrou forte desejo e interesse de grafitar os muros do colégio, tendo como “mentora
artística” Panmela Castro. A forma crítica e consciente com que ela aborda questões de gênero e violência doméstica em suas obras levou os alunos a maiores autoquestionamentos. Os desenhos e pinturas realizados pelos alunos demonstraram, em sua produção final, já mais avançada e relacionada aos diversos componentes apreendidos individualmente, uma maior fundamentação da poética pessoal deles. Essa produção teve também como referência as imagens das obras de Picasso e Frida Kahlo somadas aos artistas explorados nos conteúdos de Arte Contemporânea e foram expostas como forma de expressão genuína, buscando estabelecer um diálogo necessário entre a produção realizada pelos alunos em sala de aula e a comunidade escolar, também como um fechamento dos trabalhos desenvolvidos por esta professora no programa PDE 2012. Cabe salientar que a professora Elaine, professora surda desta instituição de ensino,
após
visitação
à
exposição,
procurou
a
professora
do
PDE,
entusiasmadamente, para agradecer pelos conteúdos trabalhados em história da arte, pois disse que este: “era um conteúdo de vestibular e, dessa forma, os surdos teriam mais oportunidades em relação à concorrência frente aos ouvintes.” A fala da professora Elaine reforça a teoria do novo olhar para a disciplina.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Finalizado o percurso proposto e considerando o processo de ensino desenvolvido com os alunos, constatamos que o projeto PDE cumpriu sua finalidade ao transpor as quatro paredes da sala de aula, envolvendo toda a comunidade escolar com o fazer artístico e despertando um novo olhar para a disciplina de arte. Através da leitura da obra, foi possível aos nossos alunos, ressignificar sua própria realidade ao pensar e refletir a sociedade, adquirindo um olhar mais crítico, independente, observador e perceptivo sobre os papéis ocupados por homens e mulheres no meio social, promovendo um entendimento maior de gênero, bem como uma compreensão apurada na análise da obra de arte e do processo criativo. A exposição dos trabalhos realizados pelos alunos foi uma oportunidade para socializar as atividades e seus resultados junto a toda a comunidade escolar. Ao organizarem a exposição, nossos alunos propuseram intervenções como sujeitos,
pois pela organização do trabalho, conseguiram traçar simbolicamente
uma trilha, um percurso a ser trilhado que provocava e instigava o público que seguia o caminho até chegar à exposição dos trabalhos. Onde diversas interações tornaram-se possíveis e onde os olhares puderam permitir-se um momento de contemplação próprio e significativo para a arte. Nossos alunos, ativos participantes de todo o processo, não mais olham a obra de arte como algo distante deles, pois foi perceptível durante o desenvolvimento deste projeto o fato de como os seus olhares mudaram e como a arte reserva um manancial de possibilidades para olhares cada vez mais elaborados e necessários ao universo da arte. Considerando que o trabalho não se esgota com o término da aplicação do PDE, ao contrário se reconhece que existe um novo caminho a ser percorrido, para que nossos alunos superem o julgamento moral presente na análise da leitura da obra de arte, que muitas vezes leva ao extremo de uma análise simplista:” Bonito – feio”, “Gosto - não gosto”, “Bom – ruim” e outros... Sem dúvida a mostra do trabalho efetuado pelos alunos culmina no atingir dos objetivos propostos durante a pesquisa teórica oportunizada pelo programa PDE. Conclui-se, portanto, que sua implementação foi importante e relevante para o estreitamento da parceria escola-universidade.
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