M de Mulher

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Prêmio Claudia 2016 | Panmela Castro

“Aos 15 anos, não sabia conversar com as pessoas. Era mantida em uma bolha, tratada como frágil por minha mãe e me sentia despreparada.” O relato é da artista visual Panmela Castro, nascida na Penha, subúrbio carioca, e criada – como ela diz – sob violência intrafamiliar. “Todos falavam aos berros, faziam críticas, julgavam os comportamentos femininos.” O resultado: aos 21 anos, vivia uma relação abusiva com o marido, que chegou a engessar sua perna só para ela não sair de casa. “Não imaginava que se chamava tortura psicológica o que ele fazia”, conta. “Além do cárcere privado, ameaçava queimar meu corpo e me punha no chuveiro gelado.” Depois de uma surra que a levou para o hospital, Panmela foi à delegacia. “Não existia a Lei Maria da Penha; meu marido não foi intimado.” Quando surgiu a lei, em agosto de 2006, ela já havia rompido o cerco. Pichava muros com riscos rebeldes até o grafite tomar conta dela. O tema não foi escolhido, brotou das entranhas, fez de Panmela uma feminista. “Desconstruía a opressão, discutia gênero, punha o corpo na rua”, explica. Foi nesse momento de relação com a cidade, tomando os espaços públicos, que a grafiteira ouviu o anúncio da Maria da Penha. “Essa regra de direito libertaria todas as violentadas em casa”, pensou. Então, para divulgá­la, Panmela usou o que aprendeu na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tornou­se a mais popular porta­voz da lei. Ela atua em dois flancos: a arte em murais, telas e performances – numa delas, teve o longo cabelo raspado pelo público, como símbolo da libertação das velhas amarras da educação sexista que ainda carregava. “De forma subjetiva, minha arte faz refletir”, garante. O outro lado é prático. Panmela criou a Rede Nami, que oferece oficinas para prevenir a violência entre jovens e encorajar mulheres a vencer aquilo que as cerceia. Os projetos principais: Arte Urbana como Ferramenta de Promoção de Direitos (que inclui o programa Grafite pelo Fim da Violência contra a Mulher); Liderança na Cultura Urbana (que prepara, por exemplo, afrografiteiras para tratar de gênero e raça) e Economia Criativa e Empoderamento Econômico, para as artistas se tornarem autossuficientes no mercado masculino. Nos últimos seis anos, com 530 grafiteiras, a ONG gastou 6,2 mil latas de spray e grafitou 5,5 mil metros quadrados de muros e viadutos. Tudo o que a Rede faz é amplificado na web: 50 mil pessoas se conectaram às ações da Nami. Boa vizinha, presenteou a comunidade da Tavares Bastos, no Catete, onde se instalou, com um museu a céu aberto, salpicado com grafites de artistas de vários países. Panmela é uma usina de ideias e está sempre atrás de apoiadores. Por isso, acabou conhecendo Hillary Clinton em 2010, no Kennedy Center, em Washington, ao receber o prêmio Vital Voices Global Leadership Awards, da ONG fundada pela candidata à Presidência dos Estados Unidos, com a qual desenvolveria parcerias. Em 2012, ganhou outro prêmio, em Nova York, da estilista Diane von Furstenberg. Dividiu a honraria com 149 mulheres que agitaram o mundo, entre elas Angelina Jolie e Oprah Winfrey. Sua arte está em Miami, em Nova York (nos bairros de Manhattan e do Bronx) e logo chegará a Berlim, onde fará um enorme painel.


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