Tanques rede de pequeno volume é testado com sucesso na criação intensiva de tilápias nilóticas

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Panorama da AQÜICULTURA, maio/junho, 1998

Tanques-rede de pequeno volume

Sistema de cultivo é testado com sucesso na criação intensiva de tilápias nilóticas

Silvio Romero de C. Coelho Mogiana Alimentos S.A. tecnico@guabi.com.br Marcelo Berriel Cardoso Piscicultura Lago Azul Rodovia Bauru-Tibiriçá, SP

Dados da FAO - Organização para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas, mostram que a produção da aqüicultura brasileira cresceu de 26.800 toneladas para 30.750 toneladas entre 1992 e 1994 e estima-se que tenham sido produzidos no Brasil cerca de 45.000 e 60.000 toneladas de pescados, oriundos de cultivo, nos anos de 1996 e 1997, respectivamente. Este crescimento é devido, em parte, à adoção de técnicas de intensificação do regime de criação, com destaque para o uso de tanques-rede e gaiolas. superfície de cada gaiola, e quatro galões plásticos de cinco litros serviram como flutuadores, de maneira que o tanque-rede ficasse 20 cm acima da superfície da água. As gaiolas foram amarradas a um cabo de nylon de 10 mm, esticado entre as margens de um reservatório de 30.000 m2, dispostas em linha e distanciadas 2,0 m uma da outra.

Temperatura

Ainda que existam mais de 6 milhões de hectares de represas públicas e privadas no Brasil, o uso de tanques-rede para a criação intensiva de peixes ainda não é uma prática muito utilizada pelos piscicultores e, várias são as razões para que isto esteja ocorrendo, destacando-se a ausência de uma legislação adequada e de conhecimentos técnicos que permitam o estabelecimento racional e econômico da atividade. Quando existem porém, as criações em tanques-rede utilizam gaiolas de grande volume (acima de 27 m3) com baixas densidades de povoamento (10-30 peixes/m3). Dados da literatura sugerem, entretanto, que a criação de peixes em tanques-rede ou gaiolas de pequeno volume, permite uma maior eficiência na produtividade por unidade de volume de tanque. A seguir são apresentados os resultados da avaliação de uma criação de tilápias nilóticas, estocadas em gaiolas de pequeno volume (1 m3), com densidades maiores que 300 peixes/m3.

Gaiolas O material utilizado na construção das gaiolas foi a tela níquel, rejeito da Casa da Moeda do Ministério da Fazenda após a cunhagem das moedas de R$ 1,00, tendo abertura de malha de 24 mm. Os tanques-rede tinham comprimento e largura de 1,0 m e altura de 1,20 m (foto). Uma tampa de zinco cobriu toda a 22

Figura 1: Gráfico da variação diária da temperatura (ºC) da água do reservatório em Tibiriçá, SP, onde foram instalados os tanques-rede de 1 m3 , entre os dias 09 de maio e 10 de outubro de 1997.


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Oxigênio dissolvido

Cada gaiola possuía ainda uma estrutura em forma de caixa, com 20 cm de largura, 20 cm de comprimento e 80 cm de altura, fixada no centro da tampa de zinco, de maneira a apresentar 10 cm de borda acima da tampa, 20 cm acima da superfície da água e 50 cm abaixo da superfície da água. Esta estrutura servia para a retenção do alimento extrusado oferecido diariamente aos peixes.

Figura 2: Gráfico da variação diária do oxigênio dissolvido (mg O2/l) na água do reservatório em Tibiriçá, SP, onde foram instalados os tanquesrede de 1 m3 , entre os dias 09 de maio e 10 de outubro de 1997.

experiências realizadas na região de Ribeirão Preto-SP, demonstraram que peixes maiores, existentes nos reservatórios, podem cortar a malha e abrir buracos significativos, permitindo a fuga dos peixes estocados em gaiolas ou tanques-rede. A estrutura em forma de caixa aberta nos dois lados, desenhada para reter o alimento, reduziu significativamente a perda de ração para o ambiente. A função de reter o alimento é alcançada, desde que a estrutura de alimentação estenda-se a uma profundidade mínima de 40-50 cm abaixo da superfície da água. A turbulência causada pela entrada e saída dos peixes na hora da oferta de alimento não foi capaz de retirar qualquer quantidade de ração de dentro da estrutura. Optou-se pela utilização de ração extrusada, uma vez que sua flutuabilidade auxilia no manejo alimentar das espécies criadas em tanques-rede ou gaiolas, permitindo que piscicultores façam um monitoramento diário mais eficiente das quantidades de alimento que os animais efetivamente estão consumindo. Estudos recentes demonstraram ainda que a extrusão melhora o valor nutricional da farinha marrom de peixe, quando comparada com o processo de peletização, além do fato de que o uso de ração extrusada também resulta em uma menor carga orgânica de resíduos no meio ambiente. A análise bromatológica da ração D’aguabi/Pirá Tropical Inicial usada na alimentação das tilápias é apresentada na Tabela 1.

Tilápias As gaiolas foram estocadas com tilápias do Nilo sem que tenha sido feito sexagem, e machos e fêmeas foram aleatoriamente divididos em dois lotes com peso médio de 72 g e 150 g. Os peixes foram alimentados até a saciedade, em duas refeições diárias às 10:00 e 16:00 hs, com a ração extrusada D’aguabi/Pirá Tropical Inicial, com 32% de proteína bruta, fabricada e comercializada pela Mogiana Alimentos S.A. Entretanto, a quantidade oferecida nunca excedeu o máximo de 3,5% da biomassa existente na gaiola. Durante o estudo, as quantidades diárias de alimento foram registradas e biometrias mensais foram realizadas em 50 peixes de cada gaiola, de modo a se obter as informações referentes ao ganho de peso e conversão alimentar. Temperatura e oxigênio dissolvido foram registrados também diariamente e uma vez por semana, foram medidos o pH e a transparência da água através de disco de Secchi. Os valores registrados para a temperatura e o oxigênio dissolvido estiveram dentro dos limites satisfatórios para a espécie, considerando-se o fato que o experimento foi realizado durante a época de inverno, entre maio e agosto (Figuras 1 e 2). Os valores de transparência do disco de Secchi e de pH ficaram constantes em 36 cm e 6,8, respectivamente.

Comedouro As gaiolas construídas com a tela níquel mostraram-se bastante resistentes, mas causaram transtornos ao serem manuseadas. Tanto os peixes como o piscicultor se machucaram ao roçarem, ainda que levemente, a superfície áspera e rígida da tela. Recomenda-se que sejam usadas telas de material flexível, mas

Tabela 1: Composição Centesimal da ração D’aguabi/Pirá Tropical Inicial

Experimento Seis gaiolas (Tabela 2) foram povoadas com os peixes menores com peso médio inicial (pmi ) igual a 72,0 g, estocados com 320 a 385 animais, resultando em uma biomassa média inicial de 25,31 kg/m3. Não foi observada mortalidade em nenhuma das seis gaiolas durante os 120 dias do experimento. A conversão alimentar média (CAm) variou de 1,75:1 até 1,80:1. No final do experimento, as tilápias haviam atingido o peso médio de 493,70 g, com CAm 1,77:1. A biomassa média final foi de 173,0 kg/tanque-rede, representando um ganho médio de 147,69 kg/ m3 no período. Outros cinco tanques-rede (Tabela 3) foram povoados com os peixes maiores (pmi = 150,0 g), estocados com 320 a 350 animais, resultando em uma biomassa média inicial de 50,31 kg/ m3. Também não foi observada a morte de nenhum indivíduo durante o período de 90 dias que durou o experimento. A CAm variou de 1,77:1 até 1,83:1 e o peso médio final dos peixes foi de 464,80 g. A biomassa média final foi de 156 kg/m3, representando um ganho médio de 105,69 kg/m3 no período. 23


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Diversos trabalhos já foram publicados* avaliando o desempenho de várias espécies de peixes, sob diferentes taxas de estocagem, freqüências alimentares, volume dos tanques-rede, tipos e características do alimento, mas nenhum deles chegou aos níveis de produtividade alcançados neste estudo. (* as referências encontram-se disponíveis na redação da Panorama da Aqüicultura)

Tabela 2: Sumário dos resultados da criação de tilápias de menor tamanho (pmi=72,0 g) em gaiolas de pequeno volume (1m3). Data do povoamento: 05/Maio/97; Data da despesca: 10/outubro/97.

Tabela 3: Sumário dos resultados da criação de tilápias de maior tamanho (pmi=150,0 g) em gaiolas de pequeno volume ( 1 m3). Data de estocagem: 05/Maio/97; Data da despesca: 10/Agosto/97.

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Futuro Mesmo com uma produção total de 700.000 toneladas anuais, incluindo a pesca marítima e de águas interiores junto com a aqüicultura, o Brasil ainda importou 289.300 ton. de pescado em 1996. Se a tecnologia de criação de peixes em gaiolas ou tanques-rede de pequeno volume for empregada em cerca de 5% da área total dos reservatórios públicos existentes no País (cerca de 6 milhões de hectares), e considerando-se uma produtividade em torno de uma tonelada por hectare, já estaríamos produzindo mais do que o total de pescado importado em 1996. A fronteira da piscicultura tropical tende a se expandir nas regiões do Centro-Oeste e Sudeste, dada a proximidade com os maiores mercados consumidores, como as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Brasília, Ribeirão Preto, Campinas e Campo Grande. Regiões como o Norte e Oeste do estado do Paraná, o Centro/Norte de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato do Grosso, Tocantins, Goiás, e Oeste/Sul de Minas Gerais, possuem grande potencial para a rápida expansão da aquicultura. Atualmente, estes centros apresentam produções sazonais, com forte declínio durante o inverno, dada a influência das baixas temperaturas do período sobre o metabolismo e biologia dos animais criados em viveiros de terra com um ou dois metros de profundidade. Entretanto, nestas regiões também existem uma grande concentração

de reservatórios aptos para o uso de tanques rede, que podem continuar produtivos mesmo durante os períodos de frio, haja visto a maior manutenção da temperatura em grandes corpos de água. Em outras áreas, como o vale do Rio São Francisco, os grandes reservatórios do Nordeste (Sobradinho, Paulo Afonso), e o interior do Rio Grande do Sul, as potencialidades também são boas, mas existe a ocorrência de alguma limitação de mercado ou infra-estrutura. O aumento no consumo de peixes é também um fator de grande relevância futura, e está intimamente ligado ao aumento da renda per capita e de um maior conhecimento das características nutricionais saudáveis da carne de pescado. O fenômeno do pesque-pague, que hoje causa o crescimento na demanda por peixes vivos, deverá estabilizar-se e a aqüicultura brasileira então terá que se voltar à sua vocação original de produzir proteína animal de alta qualidade para o consumo humano. Entretanto, os aspectos de estabelecimento das ações prioritárias, o desenvolvimento de informações básicas sobre nossas espécies e as características específicas do marketing dos produtos gerados pela aqüicultura, devem ser de responsabilidade integrada de todos aqueles setores envolvidos com a atividade. Participando mais ativamente deste segmento, a indústria de rações será capaz de auxiliar o estabelecimento da aqüicultura em bases sólidas, colaborando para que o Brasil alcance a sua vocação de um país de grande potencial aqüicultor.

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