6 dias e 5 noites em Peniche

Page 1

6 Dias e 5 Noites em Peniche de PatrĂ­cia Cardoso


es 6 Dia s e 5 Noit

em Pen iche

Esta viagem surgiu do equilíbrio natural entre a viagem sonhada e a possível. Inicialmente falou-se em visitar o sul de Itália, Nápoles e Sicília. Uma verdadeira “tour mafiosa” que acabou por tornar-se um acampamento em Peniche, com direito a visitar as Berlengas. Os motivos que pesaram na balança são os óbvios: / = A relação Tempo Dinheiro. Mas o que realmente me convenceu foram as fotografias das ilhas das Berlengas que vi na internet. Águas azuis profundas rodeadas de rochedos escarpados, imagens que fazem lembrar os anúncios do per-fume Light Blue da Dolce & Gabbana. Uma verdadeira Capri em território português,

afinal de contas o paraíso não fica assim tão longe. Julho de 2012



1º dia: Chegada a Peniche e Praia da Gamboa Hoje pela primeira vez, senti-me estrangeira em Portugal. Um Portugal que eu mal conheço. Para uma algarvia, as férias de verão passam-se em casa e apesar de já ter viajado e visitado outros lugares, devo admitir que conheço pouco o meu país. Chegar hoje a Peniche, estender a toalha na baía de Gamboa, com as ondas a bater na fortaleza, foi como chegar a um outro lugar, em qualquer parte do mundo. Venci os meus medos e mergulhei na água fria, para agradecer as boas vindas e para voltar a sentir-me em casa.








2º dia: Papôa, Praia do Baleal e Cabo Carvoeiro A manhã acordou cinzenta. Mais tarde iria aperceber-me que aqui o sol só chega depois do meiodia. Regozijei-me por ter escolhido o parque de campismo com piscina e come-cei o dia com um belo mergulho. O dia foi dedicado à fotografia e ao lazer, a caminho do Baleal, paramos em Papôa para pôr à prova as vertigens e conhecer os pescadores. Andam à pesca de peixe-porco, mas o dia está fraco, alguns chegaram antes das oito e ainda não apanharam nenhum. Quando se olha lá p'ra baixo, veem-se cardumes de cavalas mas por algum motivo esses não lhes interessam. A tarde foi passada no Baleal, a fotografar surfistas com poucas ondas e muita “crowd”. O Baleal é uma península num rochedo e a praia é o caminho que nos leva até lá. Quem para ali no meio daquele areal, terá a sensação de que Moisés mandou separar as águas. Para terminar o dia, fomos ver o sol esconderse e o farol, de luz vermelha, acender no Cabo Carvoeiro.












Peixe-Porco

Apanha de Percebes



Baleal



“Filho de peixe sabe nadar” e no Baleal sabe surfar.



Cabo Carvoeiro







3º dia: Buddha Eden e Mercado Medieval de Óbidos Quero ir à Berlenga num dia de sol e calor, mas a manhã está fria e por isso volto a deixar para amanha. Aproveito e hoje vou ao Buddha Eden. Chegar lá foi fácil, bastou-me seguir as setas que indicavam Bombarral e quando deixei das encontrar já lá tinha chegado. Gostava de poder dizer que gostei do jardim, mas estaria a mentir. As fotografias que fazem imaginar um lugar remoto, calmo e cheio de espiritualidade não mostram a verdadeira dimensão do “parque temático”. A homenagem aos budas gigantes de Bamyan deu lugar a estátuas colossais feitas em serie e carentes de valor artístico. Blocos de mármore e caminhos ainda em construção misturados com excursões de seniores e fotógrafos compulsivos.

Quando penso em Óbidos não consigo evitar pensar em chocolate e essa é a melhor associação de ideias que posso fazer. O mercado medieval é interessante e vale pela animação de rua, o artesanato, o espírito que se vive em toda a vila e pela alegria das crianças disfarçadas de bobos e dançarinas. Ainda assim gostaria de conhecer a vila longe dos turistas, as pessoas da terra no seu dia a dia e claro a fábrica de chocolate.
















Ginginha em copo de chocolate








Os Curinga

e a Rita “bonita”



4º dia: Ilha da Berlenga De noite uma tempestade, de manhã o vento acalma e o céu está limpo, hoje finalmente podemos ir à Berlenga. Há barcos de hora a hora que saem do cais de Peniche. Compramos viagem de ida e volta num barco pequeno chamado Nau, durante o ano é usado para a pesca desportiva e na época balnear faz viagens turísticas à ilha. Num mar agitado de ondas rebeldes que almareiam o barco e o chicoteiam com força. Quarenta e cinco minutos é o tempo estimado para o percurso. Mas os minutos transformam-se em horas e as horas em dias, para quem não está habituado a navegar é um sofrimento que parece não ter fim. Finalmente lá, o esforço feito é um preço aceitável para a recompensa. É um lugar tão ou mais belo que os mais belos sonhos. Quem dá a volta à ilha e chega ao forte, tem a certeza que encontrou a ilha do tesouro. Um tesouro natural, pronto a ser descoberto e conquistado a cada olhar, com águas cristalinas e grutas secretas. Mas como todas as preciosidades devem estar bem protegidas esta é vigiada noite e dia por um exército de gaivotas. A ilha é delas e nos somos apenas visitantes.




Este c茫o protagonizou um dos epis贸dios mais curiosos da viagem.


























5º dia: Bairro do Visconde Esta noite foi muito ventosa e a manhã começou igual. Dentro de uma tenda, parece que o mundo vai acabar. Após esta curta estadia na península, cheguei a uma importante conclusão: faça calor ou frio, brisa ou vendaval, às 12 horas o céu vai estar limpo e o sol vai brilhar. Desta vez o calor chegou ainda antes que o ponteiro. Depois do Cabo, escondidas entre as rochas existem pequenas praias, sossegadas, longe dos barulhos e escondidas dos olhares alheios. Para lá chegar podemos ir pelo Carreiro da Furninha, o Carreiro de Joannes ou a Tromba. Continuamos a dar a volta à península e por acaso, quase como um presente pela persistência, encontramos o Bairro Visconde. Casas desenhadas na encosta, caiadas de branco, pintadas de amarelo, de azul e às riscas, construídas por quem ainda lá vive e viveu toda a vida. Um bairro de gentes simples que ainda lavam a roupa em tanques e onde as crianças são os donos das ruas. Ruas sem carros e de nomes tão nobres como rua das Ondas, das Arribas do Mar, das Algas, das Estrelas-do-Mar, da Saudade e ou da Falésia. Um lugar onde o azul-escuro do mar salga as rochas e as paredes brancas e faz-nos lembrar as ilhas Gregas.











Amigos de Peniche Tenho que fazer uma pausa para falar sobre isto. Aqui apresento um doce regional, um pastel de ovo e amêndoa, chamado “Amigos de Peniche”. Este nome é também uma expressão portuguesa utilizada para referir “amigos falsos”. Toda a minha vida ouvi a minha avó dizer isto e quando encontrei estes bolos voltei a lembrar-me dela e deu-me vontade de rir. Para explicar a origem desta história, teria que falar de reis, invasões, herdeiros da coroa, etc... mas não quero entrar por ai. Resumidamente, o que se passou foi que, a certa altura Portugal pediu ajuda aos Ingleses para expulsar os Espanhóis que tomavam conta do país. As tropas Inglesas que chegaram a Portugal, desembarcaram em Peniche e durante o seu trajeto até Lisboa, onde eram esperados, foram saqueando as terras pelas quais passaram e portanto merecendo a desconfiança das pessoas. Os Ingleses, “os amigos, que desembarcaram em, Peniche” acabaram por também não serem bem-sucedidos na sua missão e portanto os “patifes” são os Ingleses e não os habitantes de Peniche. Já os bolos que nada tem a ver com isto, de falsos e ruins não tem nada, são sim, bastante saborosos.



6º dia: Hora de Voltar No fim de cada viagem pergunto-me a mim mesma: Seria capaz de viver aqui? Já sei a resposta há alguns dias e é Sim. Onde haja mar e arte eu sinto-me em casa. O mar é algo que aqui não falta e a beleza da arte vêm da própria natureza e do que ela provoca em mim. Não quero ir-me embora, mas mesmo contra vontade, chegou a hora de voltar. Dar um último mergulho, fazer as malas, arrumar a tenda e seguir viagem. Espero que um dia a estrada volte a trazer-me até cá.

As vezes não tenho a certeza de onde reside a beleza, se nos lugares ou na sua procura e em quem os encontra.





Dedicado: A quem foi comigo.


Passaporte Patrícia Cardoso nasceu em Faro, Portugal, a 15 de junho de 1986. Quando era pequena descobriu as Artes, onde se destacou desde cedo, principalmente no desenho. Em 2008 licenciou-se em Design de Comunicação pela Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Portalegre (Pre-Bolonha). Atualmente reside em Vila Real de Santo António onde trabalha com crianças e jovens no projeto Escolhas Vivas (Programa Escolhas, ACIDI). Paralelamente trabalha como freelancer e desenvolve projetos pessoais, dos quais podemos destacar os diários gráficos, assim como vários trabalhos na área da fotorreportagem de viagem. Nos tempos livres dedica-se à fotografia, à ilustração e ao desporto. Este livro é o quinto álbum fotográfico sobre viagens. Em comparação com o primeiro, Roma em Fotografia (2009), é notória uma evolução no estilo. Pela primeira vez, além de fotografias e ilustrações, incluem-se também textos que enriquecem a descrição da viagem. Em 2011 ganhou um 3º lugar no concurso de fotografia Vive PCI - Património e Cultura Imaterial, promovido pela Direção Regional da Cultura do Algarve. Em 2010 ganhou um 3º lugar no concurso de fotografia Pela Arte Contra a Pobreza, no âmbito do ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social, promovido pela Associação In Loco em parceria com a AMAL. Venceu o concurso para a criação de um cartaz 11ºMarcha LGBT de Lisboa. Ainda no mesmo ano ganhou uma menção honrosa no concurso Cria a 1ª Página do Jornal de Leiria.



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.