Como um castelo de areia

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Como um

Castelo

de Areia



Osmar Cordeiro

Como um

Castelo

de Areia


COMO UM CASTELO DE AREIA © Todos os direitos reservados Todo conteúdo presente nesta obra é de inteira responsabilidade do autor. Autor Osmar Cordeiro Revisão Editora Kiron Projeto Gráfico e Editoração Eletrônica Editora Kiron Criação e Editoração Eletrônica da Capa Editora Kiron Impressão e Acabamento Editora Kiron (61) 3563.5048 - www.editorakiron.com.br

C8116 Cordeiro, Osmar Como um castelo de areia; Osmar Cordeiro. Brasília: Editora Kiron, 2017. 232p. : 22,5 cm ISBN 978-85-8113-553-3 1. Ficção. 2. Literatura. I. Título. CDU 82-1


Nota do Autor C

aro leitor, quando li o meu primeiro livro, fiquei fascinado com a criatividade do autor e o enredo da história. Não que eu não gostasse de ler, mas preferia ler outras coisas ao invés de romances. A partir dessa leitura, algo bom dentro de mim me incitou a começar a escrever imediatamente, uma força inexplicável que te move e você não pode se conter. E isso acabou sendo muito prazeroso, porque como dois mais dois são quatro, e quatro mais quatro são oito, esta contagem é infindável. Considero minha mente infindável também, pois sempre tenho ideias, e acontece que as vezes acabo aceitando estas ideias e colocando-as no Word ou no papel. Foi fácil escrever Como um castelo de areia, o difícil foi revisá-lo, porque todas as vezes que eu relia a história, algo não se encaixava, e lá ia eu revisar o texto novamente. Mas tudo ocorreu bem e finalmente eu pude concluir o meu primeiro romance.



Para meus pais e para Joaquim, pessoas inestimรกveis.



Nossa vitalidade é tão frágil quanto um castelo de areia, tanto que um sopro do destino é capaz de nos fazer desmoronar.



Parte

UM



Um Cristal, interior de São Paulo: 14 de julho 1992.

N

um sábado como outro qualquer, Cristina e sua filha Beatriz estavam no bosque Alvorada, contemplando a beleza que se prescrevia envolto de uma bela paisagem e árvores de copas redondas. O gramado no chão estava aparado, e parecia não estar tão verde como antes. O sol reluzia, deixando a percepção humana estonteante. Ipês, amarelinhos e roxos enfeitavam ainda mais a paisagem deslumbrante do ambiente. Os patos banhavam-se no lago. Beatriz chegou até a alimentar alguns patos que nadavam na beira do lago artificial que estava coberto de folhas secas. Parecia surreal o pedacinho de natureza que o bosque havia se tornado dentro da cidade. Ao passarem a ponte sob o lago, Cristina e a filha encontraram um aglomerado de crianças agitadas, todas observadas por seus respectivos responsáveis. A menina, que tinha cabelinhos negros lisos, e apenas dois aninhos de idade, interessou-se pelas crianças que via a sua frente e convenceu a mãe a deixá-la ir até aqueles diabinhos frenéticos. A mãe não levou a ideia muito a sério, não queria que a filha se desgarrasse dela, mas se era a vontade de Beatriz, que assim fosse feita. Quinze minutos depois, Cristina olhava Beatriz brincar com as outras crianças; algumas da mesma idade que a sua filha, outras um pouco mais velhas. Como Beatriz se parece tanto comigo, disse para si 15


mesma. A filha usava um vestidinho estampando, com florezinhas vermelhas. Vestida dessa maneira, era uma verdadeira princesinha, meiga e gentil. A mãe via a menina como um presente dos céus, um verdadeiro anjinho. Tê-la ao seu lado era uma grande dádiva, e de pé sob o gramado, Cristina pensou: Que estes momentos bons nunca terminem para nós duas, pois, assim, um dia se tornará uma semana, e uma semana se tornará em um mês, e um mês se transformará em anos, de intensas alegrias. Olhando o grupo de crianças se enturmarem com Beatriz, ela avistou um homem alto e branco sentado em um banco. Ele usava vestes negras e chapéu da mesma cor, parecia um corvo. Observava fixamente Beatriz, como se tivesse analisando a fisionomia da menina em uma obra de arte. Cristina se estarreceu, sentiu vontade de ir até o homem e perguntar por que ele tanto olhava para sua filha, se ali havia outras crianças também, e parecia que só Beatriz lhe interessava. Ela conteve-se. Quem sabe o homem elogiava a filha somente com os olhos. Cristina era acostumada a receber elogios intensos direcionados a filha, era como se Beatriz fosse o centro das atenções. Ah... Como a sua filha é tão lindinha... Não é mesmo uma princesinha? Um dia, quando Cristina e a filha estavam no consultório médico à espera de uma consulta, uma mulher desconhecida virou-se para ela e disse: — Hum... Sua filha é esbelta demais, imagino que vive fazendo comerciais para TV. A mãe exibiu um largo sorriso, e quase explodiu de orgulho. O fato das pessoas elogiarem excessivamente a filha não aborrecia Cristina, ela não se importava com os olhares que pairavam sobre Beatriz, até achava bom. O que podia fazer se a menina possuía uma beleza singela e ao mesmo tempo notável? Ela cruzou os braços quando notou o homem de vestes negras levantar-se de onde estava sentado, e andar na sua direção. Suspirou, imaginou coisas sem nexo, e quase saiu de onde estava, mas não ousou fazer isso. — Olá! — disse o homem aproximando-se. — Oi! — respondeu desconfiada. — De onde eu estava sentado, percebi que a senhora não desgrudava os olhos das crianças, cheguei a pensar que elas estavam todas com você. 16


Ele levou a sua mão direita ao chapéu. — Não, imagina. — Sorriu quanto ao exagero dele. Cristina apontou o dedo e disse: — Minha filha é aquela ali, de vestidinho com florezinhas. Há dias que nós duas não vínhamos ao bosque. Ela estava cobrando muito de mim. Bom, não tive saída, tive que trazê-la. O homem estendeu a mão na direção dela, fitando-a seriamente. — Deixa eu me apresentar, me chamo Boris... Boris Freitas. — Cristina Amaral, senhor. Os dois trocaram um rápido aperto de mãos. Ela ergueu os olhos e perguntou: — O senhor olhava o seu filho ou sua filha brincar? Ele limpou a garganta e respondeu: — Sim. Antes de olhar para Cristina, o homem virou-se e olhou para as crianças, que pareciam uma nuvem de abelhas agitadas. Ele fez um sinal com o chapéu e acrescentou: — Aquela ruivinha ali é a minha filhinha. Não é uma gracinha? Cristina esticou o pescoço e espiou a menina ruiva. — Ela é linda. — É uma criança muito adorada, puxou mais a mãe do que a mim. A mãe dela não pode vir conosco. Como a sua filha, há dias que ela também cobrava uma visita ao bosque Alvorada. Resolvi trazê-la antes que ela me retorquisse. Cristina forçou um sorriso e passou as mãos nos cabelos cacheados. — O que não fazemos por nossos filhos, não é mesmo? Ele balançou a cabeça. — Fazemos até sacrifício, se for preciso. Beatriz corria desenfreada no meio as outras crianças, e começou a gritar de felicidade. Atenta, Cristina não desgrudava os olhos da filha. O homem fitou-a e falou: — A senhora parece estar preocupada. — Eu? — Perguntou ela como se estivesse perdida em uma floresta tropical. — É sim. — Ele cruzou os braços. 17


Cristina disfarçou a sua tensão e mudou de assunto. — Preciso ir ao banheiro, mas talvez seja melhor eu pegar a minha filha e irmos para casa. — Ela apoiou o peso do seu corpo na perna direita. — Não se preocupe Sr.ª Amaral. Bem à esquerda há um banheiro, eu fico a olhar sua filha, pode ir tranquila. — Ele exibiu um olhar agradável e continuou: — Confie em mim; a sua filha será bem observada. Cristina ficou emudecida, seus lábios espremeram um ao outro. Correu os olhos na filha e depois no homem, especulou se ele não estava indo para um velório. E disse para si mesma em pensamento: Pode não ser confiável ir ao banheiro e deixar Beatriz com esse estranho. Minha princesinha é o meu tesouro, não posso dar bobeira. Mas a vontade de urinar falou mais alto do que a sua lógica, e ela acabou aceitando a ideia do homem. — Bom, senhor. — Ela colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha. — Vou ao banheiro e volto rapidinho. — Não se preocupe, pode ir. — Disse ele gentilmente. Assim que Cristina saiu, o homem aproximou de Beatriz com um largo sorriso no rosto. Pegou no bolso da sua calça uma pequena barra de chocolate e entregou a ela. Tentando passar uma boa impressão de si, falou à menina que era amigo da mãe e que de onde o chocolate havia vindo, tinha muitos doces a esperando. Beatriz exibiu um olhar inocente e perguntou: — Em que lugar os doces estão? Ele tirou o chapéu da cabeça e respondeu: — No meu carro, querida. — Levou o chapéu de volta à cabeça e acrescentou: — Olha só que maravilha, não? Pegou em uma das mãos da menina e a chamou. — Vem comigo, princesa? Beatriz foi com ele, entraram no carro e desapareceram. Cristina retornou do banheiro, correu os olhos no grupo de crianças que brincava com a filha, e não viu Beatriz. Também não viu mais aquele homem. Ela entrou em desespero e perguntou para algumas mães se elas não tinham visto a filha. Uma delas respondeu que Beatriz havia saído minutos antes com um homem de vestes negras e chapéu. Nervosa e ao mesmo tempo trêmula, foi para o seu carro e ligou para o marido, Danilo Marques. 18


— Danilo… Danilo! — as mãos tremiam. — O que foi Cristina? Parece que o mundo todo está caindo sobre você. — E realmente está! Estou no bosque Alvorada, Beatriz estava comigo, mas acho que um homem estranho roubou-a de mim. As comportas foram abertas, e ela começou a chorar. Danilo enrubesceu as bochechas e pediu: — Fique onde está, estou indo para aí. Com a voz meio engrolada, ela disse: — Esta bem, venha logo. Quinze minutos depois, Danilo chegou perplexo ao bosque, que, em algumas partes, era todo coberto por árvores de copas densas. O bosque Alvorada era o lugar perfeito para esquecer todos os problemas do cotidiano. — Para onde esse homem que você me disse no celular levou Beatriz? — passou as mãos nos cabelos e demonstrou o seu desespero — eu não acredito que você perdeu a nossa filha, Cristina! Como pôde ter deixado isso acontecer? Ela, que estava cabisbaixa, levantou o semblante e começou a falar: — Não me crucifique, Danilo! Eu só fui ao banheiro por alguns minutos e deixei que o estranho olhasse a nossa filha. Quando regressei, a menina já não estava mais. Perguntei a algumas mães se elas não tinham visto para onde a nossa filha tinha ido, uma delas me respondeu que Beatriz tinha acompanhado o homem. Ele falou com raiva: — Você esta louca. Não deveria ter deixado que um estranho olhasse a nossa filha enquanto ia ao banheiro. Cristina, parecia chorar mais ainda. — Não sou louca, Danilo. — Retrucou ela. — Como eu ia imaginar que isso iria acontecer logo comigo? Ele continuou reprovando-a: — Você é louca sim… — Deu uma pequena pausa, depois perguntou: — Pelo menos esse homem disse como se chamava? Ela respondeu imediatamente: 19


— Ele me disse que se chamava Boris Freitas; este era o nome. Ainda estamos aqui, Danilo, enquanto isso a nossa filha está por aí com esse homem. O que você sugere que façamos? — Ela limpou os olhos. — Sugiro irmos à polícia. Eles foram à delegacia e prestaram queixa do desaparecimento de Beatriz. Ainda no fim do dia, nada fora resolvido. Uma semana depois a menina ainda não havia aparecido, então o delegado abriu uma investigação. Conforme o tempo foi passando e o rapto da menina continuava prescrevendo, deprimida, Cristina foi até a Cruz Sobral, uma agência de detetives particulares, onde conheceu Miguel Rodrigues. Três anos depois. 28 de junho de 1995: Carta ao Sr. Miguel Rodrigues. Como vai, senhor Rodrigues? Com certeza, deve estar bem. Espero que tenha conseguido desvendar mais alguma coisa sobre a minha filha. Vejo o tempo passar e os fatos nunca mudam. Sabe o quanto sofro pela ausência de Beatriz, e meu esposo não desiste em me culpar… 14 de julho de 1995: data do desaparecimento de Beatriz. Carta a Sr.ª Cristina Marques. Estou bem, Sr. ª Marques, muito obrigado quanto a sua preocupação. Como já havia lhe dito, este caso não é tão simples assim. Diga a Danilo que a senhora não teve culpa de nada. Há coisas que nós só conseguimos solucionar com o tempo. Já outros casos não encontramos solução. Pode ser que Boris Freitas tenha ido para outro estado, ou país, nunca se sabe ao certo. Com certeza esse não é o nome verdadeiro dele. Um sujeitinho como ele possui vários nomes e documentos falsos, e isso acaba tornando as coisas um pouco difíceis para mim. Tenha paciência quanto a minha investigação, se é que a senhora possa ter um pouco a mais de paciência. Acredite, sou bom no que faço, minha firma tem escritórios espalhados por todo território nacional, assim as investigações acabam ficando melhores ainda. Qualquer dúvida entre em contanto comigo, e qualquer novidade eu passarei à senhora. Miguel Rodrigues. Cruz Sobral. 20


Dois Agosto de 2010.

A

praia parecia uma obra surreal, as grandes extensões de areia percorriam quilômetros. Observadores curiosos passavam de um lado para outro e testemunhavam um triste acontecimento, envolvendo um animal marinho. Era inacreditável e ao mesmo tempo estranho para as pessoas verem a enorme baleia-jubarte ainda respirar. Uma idosa disse: Parece um monstro pré-histórico. Pouco podendo ajudar o animal, Cristina perguntou para si mesma: Como essa baleia enorme fora capaz de sair de seu habitat e terminar encalhada aqui na praia? E respondeu também: Com certeza ela está com algum problema neurológico, e isto deve ter atrapalhado o seu sistema de orientação, ou pode ter tido outro problema maior, e deixou-se levar pela corrente, vindo parar aqui na praia. Fora da água, o animal marinho tornou-se tão inútil quanto um pássaro sem asas. As pessoas que estavam ali observando a baleia definhar aos poucos não entendiam o sofrimento do animal. Cristina deduziu que os observadores estavam pensando estupidamente a respeito da baleia-jubarte: É só um animal mesmo, no mar tem mais. Era triste para ela, presenciar o animal agonizar . Cristina entendia perfeitamente a natureza dos animais, era bióloga e veterinária, tinha uma estatura de 1,68, cabelos negros cachea21


dos, olhos escuros, pele branca e uma valentia expressiva. Danilo falava que ela preferia mais a presença de animais do que a dele. Os animais eram algo fantástico para ela, acreditava que a felicidade encontrava-se neles e na natureza. Sabia que, ao contrário do marido, os animais nunca a trairiam. Às vezes fechava os olhos e quando os abria de volta, tinha toda certeza que havia nascido para lidar com o mais belo e singelo que a natureza podia lhe proporcionar. Cristina observou a baleia dar seus últimos suspiros. Minutos depois o animal encontrou-se com a morte. Ela passou as suas mãos brancas na baleia, e sentiu como se tivesse perdido alguém da família. Não conteve a angústia e decidiu falar com alguém. Então tirou o celular do bolso da calça jeans e ligou para o marido. Danilo estava em seu escritório, no Centro de Cristal. Ao conversar com a mulher no telefone, ele pouco se mostrou interessado sobre o que ela falava do outro lado da linha. Ignorou-a e Tratou-a com indelicadeza, como se ela não significasse nada para ele. Enfurecida com o mau humor dele, ela encerrou a ligação e sentiu-se estúpida: Ah! Como eu sou boba. Danilo não se importa com nada, por que haveria de querer importar-se com a morte de uma baleia-jubarte? Respirou fundo e continuou pensando: Ele é muito chato, não considerou a minha ligação, com certeza deve estar atendendo algum cliente da elite. Com as botas mergulhadas na areia pegajosa, ela sentiu-se desolada com a morte do animal. Não podia culpar ninguém, tudo tinha acontecido tão naturalmente como a própria natureza. Cruzou os braços e olhou para o horizonte. O céu estava meio acinzentado. Observou na direção do porto e teve a impressão que o próprio céu encontrava-se com o mar. Assim que viu o seu amigo Fred Neves se aproximar, Cristina exibiu um largo sorriso, de um lado a outro. Fred tinha cabelos loiros cacheados, olhos azuis e uma simpatia cativante. — Desculpe o atraso, Cristina. — Disse Fred — é que eu demorei ver a sua mensagem no celular, mas assim que a vi corri para cá — ele olhou na direção da baleia — é uma triste perda. Será que uma embarcação muito grande não teria batido nela? Ela olhou para ele e respondeu: — Não foi isso, eu analisei o corpo dela. Acho que ela estava 22


com algum problema neurológico, e por isso veio parar aqui na praia. — Suspirou, e ainda disse: — Realmente é uma triste perda. Fred balançou a cabeça e concordou: — É mesmo... — recordou de algo e falou: — Você se lembra daquela vez em que presenciamos a morte daquela jubarte lá no Rio? Já passara tantos anos, mas Cristina fez um esforço e recordou: — Claro! Como eu poderia ter esquecido. Foi muito ruim ter visto aquela baleia morrer. E como anos atrás, hoje vi a mesma coisa acontecer — ela mexeu a areia com um dos pés — eu até chorei, acredita? Fred olhava sério para ela. — Sim, eu acredito. — Fico triste quando um animal dessa categoria perde a vida dessa maneira, ainda mais quando o vejo em minha frente, pode ser de qualquer espécie. Eu tenho uma ligação meio boba com os animais mesmo. Isso não será diferente no presente e nem no futuro. Presenciar a perda dessa baleia e não poder fazer nada, é como se eu estivesse de mãos atadas, me sinto inútil quanto a isso. Não sei porque me preocupo tanto assim. Os religiosos dizem que os animais não possuem alma. Ao mesmo tempo em que estava triste, também estava abalada pelo fato de não compreender a morte. Todo ser vivo nasce exalando vida e um dia morre. Seu fôlego de vida se extingue, e esse ser vai para o paraíso ou para o nada. Quando Cristina tinha doze anos de idade, ouviu de um padre que os animais não possuíam alma, somente a essência da vida. Indignada, ela procurou um pastor, este disse a mesma coisa. O pastor e o padre estavam absolutamente errados para ela. Então resolveu tirar uma conclusão: Cada ser humano tem a sua própria crença e pensa de uma forma diferente a respeito da morte. Ela tinha as suas próprias convicções a respeito desse mistério. Cristina observou a baleia novamente e sentiu vontade de chorar, e só não o fez porque Ebrahim Sampaio acabava de chegar. Ele era arrogante e prepotente, encontrava-se com o nariz empinado e parecia ser o dono da praia e de todos que estavam nela. Era uma espécie de fascista, por isso Cristina sempre tinha motivos para contestá-lo. Ela o suportava por amor ao trabalho, e não iria abandonar o INA. (Ins23


tituto Natureza Animal) por conta dele. O instituto patrocinado pelo governo e por empresas particulares era muito importante para ela. — O que o nosso chefe veio fazer aqui? — perguntou Fred. — Com certeza veio decidir o que vai fazer com o corpo da baleia — respondeu Cristina — aqui na praia ela não poderá ficar — ela caminhou um pouco e disse: — Eu acho melhor a gente se aproximar do gestor ambiental e tirar as nossa dúvidas. Fred aconselhou: — Eu acho melhor não, Cristina. Depois de um pequeno silêncio ele falou: — Você sabe como Ebrahim é chato, ele tem suas próprias convicções, que são muito diferentes das nossas. Eles caminharam e pararam a dez metros de distância de Ebrahim, observaram ele gesticular as mãos enquanto conversava com dois funcionários. Cinco minutos depois, os dois funcionários se aproximaram da baleia e colocaram uma caixa de papelão lacrada ao lado do animal, romperam o lacre da caixa e pegaram pequenos explosivos. Cristina viu os explosivos e olhou para Ebrahim. Ele falava alguma coisa e apontava o dedo para a baleia. Ela não se conteve e foi em direção ao seu chefe. Com o intuito de impedi-la, Fred segurou o braço dela e pediu: — Não vá, Cristina, deixe que ele cuide disso. Você sabe que qualquer desavença pode custar o seu emprego. Ela olhou séria para o amigo. — Você não vê o que Ebrahim pretende fazer? Ele vai usar aqueles explosivos na baleia, e isso eu não posso deixar que aconteça. Ela ficou em silêncio, e estudou Fred por um tempo. Ele era um de seus melhores amigos e só queria o bem dela. Caso fosse demitida, ficaria ruim para ambos continuarem mantendo a amizade. Ele não queria ficar longe da presença dela, e nem ela dele. Quando tinham tempo para conversar, trocavam bons conselhos, eram como se fossem bons irmãos, mas os sentimentos que Fred sentia por Cristina iam além do que uma simples amizade. Ele a amava e tinha uma convicção chata a respeito desse amor: Enquanto fizesse tudo por ela, Cristina faria tudo por Danilo. Ela colocou a mão no ombro dele e murmurou: 24


— Você tem que me entender. Ele virou as costas para ela e ficou olhando para o mar. De alguma forma, Fred a entendia, ela era ousada, tinha algo especial que o encantava, e ao mesmo tempo o animava. Virou-se para ela, espalhando a areia com os pés e disse: — Por mais que eu tente impedi-la, não irei conseguir. Você tem sua própria maneira de ver a vida, já eu não... sou só um tolo. Enquanto penso que tudo está normal, você me mostra que o mundo não esta perfeito. Não sei o que seria de mim sem a sua amizade. Fred entristeceu o olhar. Tudo que ele mais queria naquele momento era beijá-la, e quase fez isso, só não fez porque talvez ela ficaria muito chateada com ele. Ela deu um tapinha amigável no ombro dele e falou: — Eu adoro a sua amizade, Fred. É meigo, gentil, carinhoso, educado, é um bom homem. Os elogios dela quase fê-lo explodir de orgulho. — Obrigado, Cristina. — Não há de quê, Fred. Fred a presenteou com um largo sorriso. E ela começou a caminhar novamente. Observando-a caminhar, gritou: — Cristina! Ela parou e olhou para trás. — O quê? Fred colocou as mãos na cintura e falou: — Olha lá o que você vai fazer, hein. Ela exibiu um largo sorriso, mas assim que olhou para Ebrahim, o sorriso desapareceu imediatamente. — Fique tranquilo, Fred. Ebrahim olhava para o mar, quando Cristina aproximou. Ele a fitou e disse: — Olha quem eu vejo a minha frente... se não é a fujona do Instituto. Pelo que me lembro, eu não a designei para esta missão. A senhora desobedeceu minhas ordens. Ebrahim era ruivo, tinha as bochechas redondas e a pele meio avermelhada. 25


— Isso não importa. O que você pretende fazer com o corpo da baleia? — ela disparou um olhar de ódio para ele, quase um veneno fulminante. Ele não respondeu à pergunta, ficara perplexo ao fato dela pouco ter se importado com as ordens que ele havia dado. Fred se aproximou para que, de algum modo, pudesse ouvir a conversa entre a amiga e o chefe. — Não podemos deixar o corpo daquela baleia putrefazer aqui na praia. Olha só o tamanho dela, não parece uma montanha? Cristina fitou a caixa de explosivos a uma distância de quinze metros dela. — Eu sei que você usará os explosivos nela. Ele coçou um dos braços e respondeu: — É claro que usarei. Acha que será fácil tirar aquela criatura de tamanho enorme daqui? Se usarmos os explosivos nela, iremos diminuir o tamanho de seu corpo, isso dará mais agilidade ao nosso trabalho — ele começou a estudar os contornos da baleia — pelo seu tamanho, é uma fêmea, deve medir doze metros, pesar de 30 a 35 toneladas, deve ter uns 25 anos ou mais. — Você não pode fazer isso. Ebrahim ficou aturdido. — Ora, Sr.ª Marques, o animal morreu. Você pensa que a baleia irá retornar para o mar e viver a vidinha dela como antes? — Ela será enterrada — replicou Cristina. — Veremos — ele enfureceu o semblante e continuou: — Vejo que a senhora não esta em um bom dia hoje. Eu tinha designado Quênia Braga para inspecionar esta missão, então você tomou a frente dela, e se intrometeu aonde não devia. Ela não o retrucou e pensou: No momento, Quênia Braga está lá no laboratório do INA, trabalhando em uma pesquisa. Ao saber que a amiga viria para a praia, Cristina correu e conversou com ela. Disse para a amiga que seria muito importante analisar a baleia encalhada. Depois de ter convencido Quênia a ficar, as duas trocaram de função; Cristina foi para a praia inspecionar o animal e amiga ficou no laboratório. 26


Ela passou a mão nos cabelos e o criticou: — Você pouco entende a natureza. Só está na diretoria do INA porque o salário é muito bom, e porque gosta de oprimir também. Mas saiba que não possui talento algum. E digo mais: é machista, egoísta, prepotente, acha que é superior às outras pessoas. Não compreende ninguém, e acho que nem a si próprio. Não tem o direito de me contestar. Só não digo mais coisas a seu respeito porque estaria perdendo o meu tempo. Cristina olhou na direção de Fred. Ele parecia impaciente e chutava as pequenas dunas de areia. Ebrahim deu uma enorme gargalhada quando ela voltou-se para ele. — Olha só como a senhora fala comigo! Isto pode custar-lhe o emprego. Ela meneou um dos olhos e perguntou: — Está me ameaçando? Ele suspirou, e respondeu: — Quem sabe. — Não podia esperar mais nada de você, a não ser isso. Ebrahim passou as mãos em seu uniforme. — Eu sei que a senhora sente inveja de mim e deseja estar no meu cargo há muito tempo. Cristina riu. — Engano seu. Estou muito feliz com a minha posição no INA, eu adoro o meu cargo… Ela deixou as palavras no ar e recordou de uma péssima coisa que Ebrahim havia feito no passado com dois “pinguins de Magalhães”, que haviam migrado até à costa brasileira, e foram resgatados por uma equipe do INA. — Até hoje me lembro de quando o senhor mandou dar sumiço naqueles dois pinguins que tínhamos resgatados na praia de Florianópolis. — Eles estavam doentes, poderiam ter infectado os outros animais. E se isso tivesse acontecido, nós teríamos tido grandes prejuízos. Eu não iria arriscar a vida dos outros animais por causa de dois pinguins doentes como aqueles. 27


— Você tomou atitudes desnecessárias, e nem esperou que eu estudasse o que aqueles dois pinguins de fato tinham. Preferiu exterminá-los ao invés de ajudá-los — Cristina passou a língua nos lábios. Ele apalpou o queixo com os dedos, e disse: — Eles estavam muito debilitados, com certeza tinham uma grave doença. Pensei que a senhora não fosse tão burra assim… me contestar só porque eu fiz a coisa certa. Cristina rangeu os dentes. — Burra? E você que não possui senso de ética algum. Comparando, o senhor é um animal tanto como aqueles dois pinguins. Eu sou um animal. Somente a nossa sabedoria nos difere das outras espécies. Assim como nós, os animais também precisam viver e respirar o mesmo ar que respiramos. E digo mais, Ebrahim, você não fará o que pretende com aquela baleia. Ele franziu o rosto. — Por que, Sr.ª Marques? — Porque eu vou impedi-lo. Ela deu as costas para ele e começou a caminhar. Segundos depois, se aproximou dos funcionários e chutou a caixa de explosivos que estava perto da baleia-jubarte. Pegou um por um dos explosivos e atirou-os em várias direções. Ebrahim aproximou-se dominado pelo ódio e tentou impedir que ela não atrapalhasse seus funcionários. Ele não obteve sucesso ao tentar contê-la. Os explosivos ficaram espalhados na água e na areia. Fred se aproximou de Cristina para tentar impedi-la de cometer qualquer besteira, mas era tarde, a amiga já tinha cometido. — Olha só o que você fez, Cristina — Fred estava muito preocupado. — Ebrahim vai demiti-la. — Isso é o que veremos — ela não se importou com o que o amigo disse. Ebrahim postou-se diante de Fred e acrescentou: — Esta sua amiga não passa de uma encrenqueira. Fred sentiu vontade de afundar-se na areia. Antes que as palavras fugissem da boca, Fred falou: — Ela não está em um bom dia. 28


Cristina olhou para Ebrahim e o retrucou: — Encrenqueiro é o senhor. Olha só quem fala… abateu dois pinguins e, ainda por cima quer detonar a baleia. Os dois funcionários de Ebrahim esmaeceram quando olharam para os explosivos sobre a água e a areia. Os explosivos possuíam o mesmo tamanho e características: Ainda eram pequenos tubos de um oculto big bang. Um dos dois funcionários perguntou: — O que vamos fazer agora, senhor? Ebrahim suspirou, coçou a cabeça e respondeu: — Não vamos fazer mais nada, apenas recolham os explosivos. Esta mulher ainda vai se arrepender muito por me contestar, pensou Ebrahim. Ela sempre o enfrentava, e isso causava muita raiva nele. Percebeu que sobre o rosto dela havia uma máscara nada convencional. Cristina era irredutível, por isto ele queria demiti-la, mas ela possuía algo em si que o impedia de fazer isso. Ficou observando Fred. Este estava encolhido como sempre. Era um seguidor nato de Cristina, mas não ousado como ela. Até certo ponto ele estava em um bom caminho, não contestava e nem replicava o seu chefe, ouvia muito e falava pouco, características que Ebrahim gostava muito de ver em seus funcionários. Ebrahim colocou as mãos na cintura e virou-se para Cristina. — Não ande a pensar que você pode tomar decisões precipitadas por ai, Sr.ª Marques. Dessa vez eu vou deixar passar, mas da próxima não deixarei. Precisamos conversar depois em meu escritório. — Ele começou a retirar-se com os dois funcionários, mas antes que desaparecesse, parou e disse: — Providenciarei para que uma retroescavadeira venha para cá. Assim que Ebrahim se foi, Fred deu um longo suspiro de alívio. A guerra entre o chefe e a amiga parecia finalmente ter acabado, pelos menos ali na praia, pensou ele. Uma hora depois, a retroescavadeira chegou e fez uma enorme vala na área. A baleia morta foi depositada na fenda e enterrada. Cristina olhou ao seu redor, e viu que os observadores curiosos haviam se dissipado; somente ela e o amigo ainda estavam ali. Ficara intrigada e ao mesmo tempo pensativa, não conse29


guia entender porque Ebrahim não quis usar os explosivos na baleia, ele era o diretor do INA, e podia tomar qualquer decisão a respeito da inspeção. Fred pousou a mão no ombro de Cristina, sorriu e disse: — Meus parabéns! Você enfrentou Ebrahim com veemência. Ninguém no INA, ousa enfrentá-lo. — Só fiz o que tinha que ser feito — ela passou as mãos em seus cabelos, que o vento desalinhava no momento. E de repente o semblante dela fora tomado por uma máscara desesperadora. — Coitados desses animais indefesos! O planeta precisa deles, nós precisamos. E quantas espécies já não foram extintas, hein? Quase ninguém parece se importar com isso; onde essa situação vai parar? — É uma situação triste que parece nunca ter fim… — Fred deu uma pequena pausa e olhou para o mar. — Por mais que as coisas sejam difíceis, nós temos que continuar a lutar pelos animais e buscar recursos para eles, enquanto ainda há tempo. O pouco que fazemos já ajuda muito. Se fossemos seguir o exemplo de algumas pessoas por aí, a natureza e os animais estariam perdidos de vez. — É verdade — concordou Cristina. Os cabelos louros e cacheados de Fred pareciam que se cacheavam mais ainda com o passar do vento. Se fosse preciso, percorreria o mundo por Cristina, e ela percorreria o mundo por Danilo. Um dia ele teve a capacidade de imaginar a amada com o marido numa tela de TV. Imaginou eles se amando entre os lençóis. Sentia inveja de Danilo, ele sim era o amado dela, Fred não passava de um simples amigo para Cristina. Ele olhou para o céu, as nuvens continuavam acinzentadas. Fitou Cristina e pensou: Pelo menos ela é minha amiga, minha melhor amiga. Ela estava percorrendo um caminho que Fred não podia acompanhá-la. Era um caminho tão distante que ele fez questão de trazê-la de volta. — Você está bem? Parece até que estava em outro planeta. Ela exibiu um sorrisinho sem graça e respondeu: — Estou ótima. 30


Ela se agachou, colocou as suas duas mãos na areia, e quinze minutos depois terminou de esculpir um pequeno castelo. Fred observou-a e pensou: Se este castelo fosse real e também da nobreza, seria impenetrável como uma fortaleza; Cristina seria a rainha e Danilo o rei; eu seria apenas o bobo da corte. Cristina sentou na areia e recordou os momentos tristes do passado que vieram sem lhe pedir permissão. Lembrou-se de seu imensurável tesouro, Beatriz, e lamentou o desaparecimento da filha. Às vezes, quando estava cumprindo algumas de suas funções mais importantes do dia, ela se perguntava: Em que lugar a minha filha deve estar? Será que ela continua linda? E quando fazia perguntas para si, ficava com raiva, Boris Freitas surgia obscurecendo seus pensamentos. Irritada, no momento, procurava não pensar em Beatriz, porque pensar na filha desaparecida a entristecia. Levantou-se do chão e comparou a sua vida com o pequeno castelo de areia que tinha acabado de fazer. Ambos eram tão frágeis que um simples sopro do destino poderia desmantelá-los, assim como Boris Freitas fez com ela, há dezoito anos. — O que achou da minha obra de arte? — perguntou Cristina. Fred observou o castelo mais uma vez e respondeu: — Achei legal! Está de parabéns. Mas quando surgiu esse dom para esculpir? — Aqui mesmo nesta praia. A minha casa ficava de frente para o mar. Eu nasci e cresci em Cristal. Quando era pequena, eu e os meus dois irmãos mais novos costumávamos brincar na areia. A coisa que nós mais gostávamos de fazer eram os castelos. Eu era muito ingênua naquela época, acreditava que quando me tornasse moça, iria me casar com um príncipe, e iríamos viver em um grande castelo. Não um castelo de areia, mas um castelo de verdade, que fosse imenso e pudesse abrigar uma família. Como aqueles tempinhos foram bons... Eu daria tudo para voltar no tempo outra vez… Beatriz ainda não teria nascido, e eu não iria sofrer por causa dela. Os dois começaram a andar. — Eu sinto muito, Cristina. Você é uma pessoa tão boa, não merecia ter perdido sua filha — ele limpou o suor do rosto. — Eu 31


fico imaginando as noites que você não deve ter dormido por causa da Beatriz. Cristina entristeceu o olhar. — Eu já fiquei muitas noites sem dormir e já chorei muito também. Se não tivesse deixado Beatriz sob o olhar de um estranho, hoje ela ainda estaria comigo. Fred acrescentou: — Você não deve ficar se culpando. Acho que esse sentimento de culpa é o que mais a consome. — Tenho culpa sim. Perdi a minha filha por descuido meu. Beatriz se foi para nunca mais voltar. Ela ficou tão pouco tempo comigo. Na vida, os filhos nunca deveriam partir antes dos pais, não é mesmo? — Beatriz não morreu Cristina. Você fala de um jeito estranho… é como se ela estivesse morta. — Para mim, é como se ela estivesse morta mesmo, Fred. Eu perdi as esperanças de encontrá-la. — Não, ela não esta morta, e um dia você ainda há de encontrá-la. Guarde as minhas palavras e verá como eu estou certo. Ela se colocou na frente do amigo e pousou a mão no ombro dele. Ele sentiu vontade de beijá-la, mas conteve seu desejo novamente. — Tomara que eu a encontre mesmo, Fred. — Tomara não, com certeza vai encontrá-la sim — disse ele esperançoso e perguntou: — Você vai para o INA agora? — Vou para casa. Depois eu ligo para administração e explico porque não fui. Sei que Ebrahim ficará uma fera comigo. — Vejo que a senhora quer brincar um pouco de dona de casa. — Exatamente — ela riu — a discussão com Ebrahim me deixou indisposta. Eu tenho uma rotina de trabalho muito estressante. Preciso estar um pouco mais próxima de Oscar, talvez esteja deixando o meu filho de lado. Como Danilo vive enfiado naquele escritório, as coisas que precisam ser resolvidas lá em casa acabam ficando todas sobre a minha responsabilidade. — Ela olhou no relógio e viu que já passava da uma da tarde, e ainda continuava na praia. Assim como alguns peixes se tornam iscas de tubarão, Cristina havia se tornado isca de Ebrahim. Ele estava a esperando no INA, 32


pronto para desestabilizá-la, e ao final do expediente, ela estaria tão exausta como um ser desfalecido. Instantes depois, Fred manobrava seu Ford Fiesta e Cristina sentava na poltrona de seu GM Prisma. Ela acionou a ignição e escutou o motor do seu carro ser acionado. Ele saiu do meio fio e aproximou-se dela, abaixou o vidro escuro e falou: — Até amanhã, Cristina! — Até, amigo. Fred acelerou e começou a sair. Cristina ficou observando o carro dele desaparecer aos poucos na avenida. O cansaço físico e psicológico estava dominando-a.

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