"LIBERTE O CATIVEIRO SOCIAL": memória, cultura e territórios negros de Santa Maria/RS | TFGI

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memória, cultura e território s negro s de Santa Maria/RS

UNIVERSIDADE FRANCISCANA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO

PESQUISA

Gabriela Petersen Coimbra

Orientadora: Profª Arq. Urb. Me Fernanda Peron Gaspary

Santa Maria 2022

GABRIELA PETERSEN COIMBRA

Pesquisa apresentada ao curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Franciscana UFN, como requisito parcial para aprovação da monografia de conclusão de curso.

Orientadora: Profª Arq. Urb. Me. Fernanda Peron Gaspary

Santa Maria 2022

Será que já raiou a liberdade

Ou se foi tudo ilusão Será, oh, será Que a Lei Áurea tão sonhada Há tanto tempo assinada Não foi o fim da escravidão

Hoje dentro da realidade Onde está a liberdade Onde está que ninguém viu

Moço Não se esqueça que o negro também construiu As riquezas do nosso Brasil Trecho do samba enredo de 1988 da G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira, escola de samba do grupo especial do Carnaval do Rio de Janeiro, com autoria de Hélio Turco, Jurandir e Alvinho

Éevidente queasproblemáticas raciais nãoacabaram com o fim da escravidão, a discriminação racial ainda é uma realidade no Brasil, manifestando se por meio da segregação cultural e socioespacial que diferencia tratamento e oportunidades entre brancos e negros. A presente pesquisa tem o intuito de abordar características da história da população negra na cidade de Santa Maria e aspectos que demonstrem a intervenção em preexistência de arquitetura popular, a fim de formar um embasamento teórico e prático que justifique o projeto situado nos territórios negros da cidade de Santa Maria.

A partir da criação de diretrizes de um projeto interpretativo se reforça a relevância da implantação de um local voltado à memória da população negra. O espaço cultural, a ser proposto no Trabalho Final de Graduação II, utiliza se da edificação do antigo clube social negro União Familiar e pretende abrigar um programa de necessidades arquitetônicas que possibilite o reconhecimento e a valorização da cultura negra, visto a importância dessa em nossas raízes identitárias.

Palavras chave: arquitetura popular; clube social negro; intervenção em preexistência; projeto interpretativo.

memória | cultura | territórios negros

It is evident that racial problems did not end with the end of slavery, racial discrimination is still a reality in Brazil, manifesting itself through cultural and socio spatial segregation that differentiates treatment and opportunities between whites and blacks. This research aims to address characteristics of the history of the black population in the city of Santa Maria and aspects that demonstrate the intervention in the preexistence of popular architecture, in order to form a theoretical and practical basis that justifies the project located in the black territories of the city from Santa Maria.

From the creation of guidelines for an interpretive project, the relevance of implementing a place dedicated to the memory of the black population is reinforced. The cultural space, to be proposed in the Final Graduation Work II, uses the building of the former black social club União Familiar and intends to host a program of architectural needs that allows the recognition and appreciation of black culture, given the importance of this in our identity roots.

Keywords: popular architecture; black social club; intervention in preexistence; interpretive project.

memória | cultura | territórios negros

Figura 1 | Localização dos bairros em que a intervenção está inserida e pontos de referência 28

Figura 2 | Mapa com marcação dos pontos do projeto interpretativo 29

Figura 3 | Fachada da edificação da antiga Sociedade União

Familiar 2022...........................................................................................................30

Figura 4 | Mapa Nolli (fundo figura) 33

Figura 5 | Mapa Nolli (figura fundo) 33

Figura 6 | Mapa de Vegetação........................................................................34

Figura 7 | Mapa de uso do solo 35

Figura 8 | Mapa de altura das edificações 36

Figura 9 | Mapa do Sistema Viário 37

Figura 10 | Mapa de locação das fotografias do entorno imediato 38

Figura 11 | Ponto de Vista "a" 39

Figura 12 | Ponto de Vista "b" 39

Figura 13 | Ponto de Vista "c"..............................................................................39

Figura 14 | Ponto de Vista "d" 39

Figura 15 | Ponto de Vista "e" 40

Figura 16 | Ponto de Vista "f"..............................................................................40

Figura 17 | Ponto de Vista "g" 40

Figura 18 | Ponto de Vista "h" 40

Figura 19 | Ponto de Vista "i".................................................................................41

Figura 20 | Ponto de Vista "j" 41

Figura 21 | Ponto de Vista "k" 41

Figura 22 | Ponto de Vista "l"................................................................................41

Figura 23 | Ponto de Vista "m" 42

Figura 24 | Ponto de Vista "n" 42

Figura 25 | Ponto de Vista "o".............................................................................42

Figura 26 | Ponto de Vista "p" 42

Figura 27 | Planta de Situação 43

Figura 28 | Mapa da rede de esgoto............................................................44

memória
territórios negros
| cultura |

Figura 29 | Mapa da rede de energia elétrica.........................................44

Figura 30 | Mapa do microclima 45

Figura 31 | Linha do Tempo com documentos e projetos arquitetônicos............................................................................................................46

Figura 32 | Montagem de imagens com as modificações na fachada ao longo dos anos..............................................................................47

Figura 33 | Planta da cidade de Santa Maria de 1902, marcações feitas pela autora na localização da Igreja do Rosário e na rua 24 de Mayo.........................................................................................................................56

Figura 34 | Rua 24 de Mayo e Igreja do Rosário 1914 57 Figura 35 | Fachada da Sociedade Cultural Ferroviária Treze de Maio 1978...................................................................................................................58

Figura 36 | Chalés de madeira e possível reservatório de água da Vila Operária Brasil. Extraída do Álbum de Santa Maria, de 1914 60

Figura 37 | Membros do Clube União Familiar..........................................63

Figura 38 | Mapa com localização do projeto e seu entorno 68 Figura 39 | Plantas baixas da edificação com ambientes 69 Figura 40 | Exposição “Carnaval: Ritos, Artes e Criatividade” ........70

Figura 41 | Painel que representa a multiplicidade do Carnaval 70 Figura 42 | Fachada do Centro de Artes e Criatividade 71

Figura 43 | Fachada da Casa do Benin.......................................................72

Figura 44 | Planta Baixa Térreo da Casa do Benin 72

Figura 45 | Planta Baixa Primeiro Pavimento da Casa do Benin 72

Figura 46 | Planta Baixa Segundo Pavimento da Casa do Benin.73

Figura 47 | Planta Baixa Terceiro Pavimento da Casa do Benin 73 Figura 48 | Restaurante do Benin 73

Figura 49 | Sala de exposição com trançado nas colunas, à direita 74

Figura 50 | Margem do rio Loire com intervenções no piso 75 Figura 51 | Placas com informações históricas e reflexões 75

Figura 52 | Intervenção no passeio público 76

Figura 53 | Folheto informativo com pontos do Circuito Histórico de Herança Africana 77

Figura 54 | Realização do circuito que contou com quase 100 participantes 77

memória | cultura |

Tabela 1 | Índices exigidos para a zona 3.a 43

Tabela 2 | Comparação entre população livre, liberta e escrava de Santa Maria nos anos de 1858 e 1872.............................................................51

Tabela 3 | População Total de Santa Maria, em 1872 51

Tabela 4 | Resumo das informações sobre os pontos escolhidos para estudo..................................................................................................................61

Tabela 5 | Dimensionamento do setor Resistir 78

Tabela 6 | Dimensionamento do setor Celebrar 79

Tabela 7 | Dimensionamento do setor Complementar.......................79 Tabela 8 | Síntese das áreas por setor 80 territórios negros

ANEXO A | Documento do registro de móveis de Santa Maria, datado de 05 de março de 1942. 88

ANEXO B | Prancha do Projeto Arquitetônico, datada de 1953, com assinatura do Engenheiro Civil Luiz Bollick. 89

ANEXO C | Prancha 01 do Projeto Arquitetônico, datada de 1967, com assinatura do Engenheiro Civil Luiz Leandro Scherer Lutz.....90

ANEXO D | Prancha 02 do Projeto Arquitetônico, datada de 1967, com assinatura do Engenheiro Civil Luiz Leandro Scherer Lutz. 91

memória
| territórios negros
| cultura

2.1 | OBJETIVO GERAL 22 2.2 | OBJETIVOS ESPECÍFICOS 22 3.1 | AGENTES DE INTERVENÇÃO 24 3.2 | CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO ALVO ...........24 3.3 | DEFINIÇÃO DOS NÍVEIS PRETENDIDOS 24 4.1 | LEVANTAMENTO DOCUMENTAL, BIBLIOGRÁFICO E DE DADOS 26 4.2 | ORGANIZAÇÃO DO MATERIAL COLETADO ............ 26 4.3 | ANÁLISES E CONCLUSÕES 26 5.1 | LEVANTAMENTO DA ÁREA 30 5.1.1 | RELAÇÕES FUNCIONAIS 30 5.1.2 | ASPECTOS QUALITATIVOS E QUANTITATIVOS DA POPULAÇÃO RESIDENTE E USUÁRIA 31 5.1.3 | CARACTERÍSTICAS ESPACIAIS DAS EDIFICAÇÕES E VEGETAÇÃO EXISTENTE...........................................................................32 5.1.4 | USO E OCUPAÇÃO DO SOLO 34 5.1.5 | SISTEMA DE CIRCULAÇÃO 36 5.1.6 | POTENCIALIDADES E FRAGILIDADES.......................37 5.1.7 | LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO DO ENTORNO 38 5.2 | LEVANTAMENTO DO TERRENO E DA EDIFICAÇÃO 42 5.2.1 | REDE DE INFRAESTRUTURA 43 5.2.2 | MICROCLIMA 44

memória | cultura | territórios negros

5.2.3 | LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO DA PREEXISTÊNCIA 45 6.1 | LEGISLAÇÃO MUNICIPAL 48 6.2 | LEGISLAÇÃO ESTADUAL 48 6.3 | LEIS FEDERAIS ............................................................48 7.1 | A SANTA MARIA DO PÓS ABOLIÇÃO: PODER E CONTROLE SOCIAL 50 7.2 | IDENTIDADE, MEMÓRIA E CULTURA AFRO BRASILEIRA ..........................................................................52 7.3 | TERRITÓRIOS NEGROS: TRAJETOS NA CIDADE INVISÍVEL 55 7.3.1 | VILA RICA................................................................................55 7.3.2 | IRMANDANDE DO ROSÁRIO 57 7.3.3 | SOCIEDADE TREZE DE MAIO 58 7.3.4 | VILA OPERÁRIA BRASIL....................................................59 7.4 | DIREITO A SOCIABILIDADE E AO LAZER: SOCIEDADE UNIÃO FAMILIAR 62 7.5 | INTERVENÇÃO EM PREEXISTÊNCIA ..........................64 8.1 | CENTRO DE ARTES E CRIATIVIDADE .......................68 8.2 | CASA DO BENIN 71 8.3 | MEMORIAL DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVATURA 74 8.4 | CIRCUITO HISTÓRICO DE HERANÇA AFRICANA ... 76

“Liberte o cativeiro social” é a frase que intitula essa pesquisa e que busca trazer à tona a força e a resistência da população negra, além de debater sobre a temática da escravidão, ainda relevante. A frase faz parte do samba enredo “Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?”, de 2018 da Escola de Samba G.R.E.S Paraíso do Tuiuti do grupo especial do Carnaval do Rio de Janeiro, comemoração de origem afro brasileira que se tornouidentitária doBrasil.A cançãofoimais uma das contribuições do Arq. Urb. Me. Paulo Rogério Lemos para esse trabalho, que somou enquanto importante consultor da pesquisa. Aproximando para a esfera pessoal, em 2018, durante o 2º semestre da faculdade, tive a oportunidade de participar da primeira edição do projeto de extensão [com]VIDA, juntamente com outros acadêmicos e professores do curso. O projeto, que tinha como objeto de estudo a paisagem urbana, começou suas atividades no bairro Nossa Senhora do Rosário. Com o passar do tempo diversas ações foram realizadas, no entanto, ficaram comigo as inquietações em relação ao histórico da área de estudo. Segundo os poucos materiais bibliográficos que encontrávamos, ali tinha sido território da população negra após a abolição da escravatura, informação, que para mim ainda no começo docurso,soava estranhovistoa minha percepçãode que o local era predominantemente ocupado por jovens universitários.

Foi a partir dessas inquietações que o assunto dessa pesquisa surge. “Memória, cultura e territórios negros” relaciona se a dedicação em compreender o assunto em suas múltiplas faces. “Memória” uma vez que a população negra foi apagada até mesmo dos registros oficiais, tornando necessário recorrer para relatos orais. “Cultura” uma vez que é imprescindível conhecermos nossa identidade para valorizá la “Territórios negros ” uma vez que os espaços urbanos foram parte, enquanto cenário e refúgio, da História que ainda está sendo contada.

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memória |
| territórios negros
cultura
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memória | cultura | territórios negros

A proposta de tema do Trabalho Final de Graduação I consiste em valorizar e reconhecer a cultura negra na cidade de Santa Maria, visando os espaços ocupados por essa comunidade no período pós abolição, a partir de 1888 até a atualidade, que conforme aponta Grigio (2018) “embora as diferenças jurídicas tenham desaparecido com o fim da escravidão, a segregação racial, social e cultural era um desafio a ser enfrentado”. O trabalho se configura por dois projetos independentes, porém complementares: o interpretativo da área situada nos bairros Bom Fim e Nossa Senhora do Rosário e a requalificação do edifício do Clube União Familiar.

No fim do século XIX, as reformas urbanas surgem com políticas de higienização e embelezamento das cidades, evidenciando uma classe dominante e, por sua vez, reprimindo ainda mais a população negra, que nesse cenário começa se organizar em vilas operárias e cria redes ao seu redor para ter a possibilidade de desfrutar de momentos sociais, culturais e religiosos.

É com base na análise dessa situação que essa pesquisa propõe a elaboração de um projeto interpretativo nos territórios negros e proletários da cidade, visando evidenciar a história e a memória, tanto do patrimônio imaterial como do patrimônio edificado, de uma comunidade que, muitas vezes, é invisibilizada. Os pontos elencados para estudo foram a Vila Rica, a Irmandade do Rosário, a Sociedade Treze de Maio, a Vila Operária Brasil e a Sociedade União Familiar.

No período citado, diversas organizações associativas são fundadas em Santa Maria, no entanto, segundo Oliveira (2014) a historiografia sobre Santa Maria destaca apenas a criação de

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entidades compostas “majoritariamente por indivíduos brancos, fundadas, na maior parte, pelos homens “chefes dessas famílias” e com certa estabilidade financeira, algo que lhes confere status social” (OLIVEIRA, 2014. p. 143 143). A relevância para as mesmas organizações ainda permanece atualmente, ficando evidente ao observarmos a predominância do patrimônio cultural atrelado a alta sociedade da cidade.

Com o objetivo de assegurar o direito à sociabilidade e ao lazer, associações negras são formadas, em Santa Maria uma delas é a Sociedade União Familiar, clube negro fundado em 1896, oito anos após a abolição da escravatura, que funciona por cerca de 90 anos como espaço social, cultural, recreativo e beneficente para a população negra, possuindo sede situada na rua Barão do Triunfo, nº 855. Como observado “parece consenso entre muitos pesquisadores que o cerne da fundação de muitos clubes sociais negros está na exclusão e, ao mesmo tempo, no desejo de participação ou interação social de muitos negros e negras” (OLIVEIRA, 2016), não foi diferente no caso do União Familiar. Visto a relevância da temática, propõe se, junto com o projeto interpretativo, a requalificação arquitetônica da antiga edificação do clube, abrigando um programa que represente a identidade e as raízes negras, dando enfoque para as tradições carnavalescas.

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Os objetivos apresentados abaixo referem se a etapa de Pesquisa do Trabalho Final de Graduação I.

2.1 | OBJETIVO GERAL

O objetivo da pesquisa é o embasamento teórico e prático da temática proposta, a fim do reconhecimento cultural negro e da fundamentação para posterior etapa projetiva do Trabalho Final de Graduação.

2.2 | OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Com a finalidade de alcançar o objetivo geral proposto, elencou se objetivos específicos para atingir tal propósito.

* Abordar a história da comunidade negra na cidade de Santa Maria, no período pós abolição, evidenciando os aspectos culturais;

* Demonstrar a relevância da preservação dos territórios negros por meio do estudo dos pontos mais marcantes para a população;

* Reunir relatos orais e materiais bibliográficos para reforçar a importância da pesquisa;

* Analisar referenciais práticos buscando embasamento para a abordagem do projeto interpretativo e para as decisões da intervenção na preexistência.

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memória | cultura | territórios negros
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memória | cultura |

territórios

3.1 | AGENTES DE INTERVENÇÃO

A edificação que abrigará o espaço cultural será de uso público, em razão de ter como finalidade o incentivo cultural, histórico e turístico, além do contato e das contribuições da comunidade que poderá usufruir dos ambientes para oficinas, eventos e exposições. Com o objetivo de preservar a edificação e de manter as atividades em funcionamento, a iniciativa privada é fundamental para o investimento. Logo, os agentes de intervenção serão as esperas público e privada, em conjunto com o apoio da comunidade interessada, o que possibilita uma autogestão.

3.2 | CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO ALVO

Considerando que o projeto tem a intenção de provocar a população acerca da história e da cultura afro brasileira, compreende se que o espaço deve atender todo o público interessado, independente de classe social, faixa etária, gênero ou etnia. Ainda há a possibilidade de receber turistas que buscam atividades além do Centro Histórico da cidade de Santa Maria.

Além de atender o público geral, se empenha para que o local seja, especialmente, um ambiente de acolhimento para artistas e movimentos negros

3.3 | DEFINIÇÃO DOS NÍVEIS PRETENDIDOS

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Com base no diagnóstico e no levantamento de dados resultantes dessa pesquisa, propõe se o lançamento de diretrizes do projeto interpretativo que complementarão o projeto arquitetônico, a fim de auxiliar no entendimento da importância da preservação dos territórios negros. Para o projeto arquitetônico de intervenção na preexistência da antiga sede do Clube União Familiar se pretende alcançar o desenvolvimento a nível de anteprojeto arquitetônico. negros
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A metodologia para elaboração dessa pesquisa consiste na exploração de materiais para aprofundamento na temática, logo, trata se de uma pesquisa exploratória apoiando se em 3 etapas.

4.1 | LEVANTAMENTO DOCUMENTAL, BIBLIOGRÁFICO E DE DADOS

O desenvolvimento foi feito por meio de pesquisa em livros e materiais bibliográficos, buscando aprofundamento no assunto por meio de referenciais teóricos ou práticos para estudo de caso. Com base em informações cadastrais, normas técnicas e índices urbanísticos pertinentes ao sítio escolhido, procurou se a melhor compreensãoda área. Ainda, através de registros orais, coletados em entrevistas ou em conteúdos já produzidos, explora se as possibilidades do programa de necessidades, além do entendimento do público alvo.

4.2 | ORGANIZAÇÃO DO MATERIAL COLETADO

Após o levantamento do material, efetuou se o registro, seleção e organização das informações obtidas com a finalidade de ter embasamento para a elaboração da pesquisa final.

4.3 | ANÁLISES E CONCLUSÕES

Concluídas as etapas de pesquisa e organização, iniciou se a análise para interpretar as possíveis soluções projetuais e adequar o programa de necessidades já pré definido em fases anteriores. Além disso, foi com base nas análises e conclusões que será elaborado o zoneamento, sendo essa a última parte do Trabalho Final de Graduação I.

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O local escolhido para o projeto está situado no município de SantaMaria RS,que consiste na quinta cidade maispopulosa do estado com estimativa de 285.159 habitantes (IBGE, 2021), distante cerca de 290km da capital Porto Alegre

O trabalho aqui proposto está estabelecido no espaço urbano com base em dois momentos interligados: o projeto interpretativo acontece na área meso, que se utiliza dos pontos marcantes dos territórios negros abrangendo os bairros Nossa Senhora do Rosário e Bom Fim (Figura 1), e o projeto arquitetônico na área micro, que conta com a antiga edificação do clube União Familiar, localizada no atual bairro Bom Fim Figura 1 | Localização dos bairros em que a intervenção está inserida e pontos de referência

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022. Para a escolha do lugar foi considerado o valor histórico, identitário, cultural e social que o território negro carrega, além da facilidade de acesso dado atualmente ser considerado como área central da cidade. O entorno do território não possui mais características periféricas, como antigamente, e tampouco tem

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memória | cultura | territórios negros

predominância por residentes negros, não minimizando a sua importância histórica.

O projeto interpretativo contempla os marcos identitários da população negra (Figura 2), sendo eles o bairro Vila Rica (atualmente, Nossa Senhora do Rosário), a Sociedade Treze de Maio (atualmente, Museu Comunitário Treze de Maio), a Irmandade do Rosário (atualmente, Paróquia Nossa Senhora do Rosário), a Vila Operária Brasil (não existindo mais nenhum exemplar, atualmente incorporada pelo bairro Bom Fim) e, por último, a Sociedade União Familiar (existindo apenas a edificação da sede). Praticamente todos os pontos não apresentam mais suas características ou usos originais.

Figura 2 | Mapa com marcação dos pontos do projeto interpretativo

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

A sede da antiga Sociedade União Familiar (Figura 3), um dos pontos do projeto interpretativo, foi escolhida para abrigar a intervenção que pretende valorizar e reconhecer a cultura afro brasileira. A edificação localiza se na rua Barão do Triunfo, nº 855, entre a rua Venâncio Aires e a travessa Mendes Nunes.

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Nas análises a seguir, a escala meso será considerada para levantamento, excedendo o entorno imediato da preexistência, levando em consideração a necessidade de observar a área para a proposição das diretrizes do projeto interpretativo. Em seguida, se concentra no levantamento do terreno com a construção existente, na escala micro, com a finalidade de explorar para a proposta arquitetônica.

5.1 | LEVANTAMENTO DA ÁREA

5.1.1 | RELAÇÕES FUNCIONAIS

Santa Maria é uma cidade com forte influência na região central do estado, considerada um centro acadêmico e um polo de inovação, um dos motivos de ser conhecida como cidade cultura.Adiversidadedospúblicoshabitantesnomunicípioéoutra característica marcante, composto por negros, descentes italianos e alemães, estudantes universitários, militares, entre outros

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Figura 3 | Fachada da edificação da antiga Sociedade União Familiar 2022 Fonte: Arquivo pessoal, 23 out. 2022.

A escolha da área de intervenção se deu por meio da historiografia da ocupação do local que veio a se tornar a cidade de SantaMaria.Os territórios ocupadospelobairroVila Rica e pela Vila Brasil eram considerados periféricos, praticamente delimitavam os limites do espaço urbano, conforme abordagem feita na seção 7 dessa pesquisa. Atualmente, o contexto é completamente diferente, o local incorporado pelos bairros Nossa Senhora do Rosário e Bom Fim se encontra na divisa com o bairro Centro, o que possibilita o fácil acesso ao sítio escolhido.

A localização do projeto possui grande fluxo de veículos, principalmente nas ruas Silva Jardim, dos Andradas, Venâncio Aires, Barão do Triunfo e Visconde de Pelotas, essas importantes vias de interligação no perímetro urbano. Há possibilidade de acesso à área por meio do transporte público coletivo de diversos pontos da cidade, inclusive de bairros da região leste, como Camobi. Por estar na região central do município, apresenta diversos serviços e atividades nas proximidades.

5.1.2 | ASPECTOS QUALITATIVOS E QUANTITATIVOS DA POPULAÇÃO RESIDENTE E USUÁRIA

Os bairros Nossa Senhora do Rosário e Bom Fim totalizam juntos 13.926 habitantes (IBGE, 2010) e 1,4071 km² de área, segundo dados de 2014 disponibilizados pelo Instituto de Planejamento de Santa Maria. O Gráfico 1 relaciona a distribuição por faixa etária, dividida em jovens (zero a 14 anos), força de trabalho (15 a 64 anos) e idosos (65 anos ou mais), e o sexo da população de ambos os bairros.

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Gráfico 1 | Distribuição da população por faixa etária e sexo dos bairros Bom Fim e Nossa Senhora do Rosário

Fonte: IBGE, 2014 Elaborado pela autora, 2022. Pela proximidade com a Universidade Franciscana, há uma quantidade considerável de estudantes residindo na área, característica que alterou o perfil do bairro. No entanto, o bairro também é bastante ocupado por usuários que não residem no local, visto a disponibilidade de comércios e serviços na área.

O público alvo do projeto não se limita a população residente e usuária da região, buscando atender a todo público interessadonatemática e nasatividadespropostas,deformaque possa atrair pessoas de todas as regiões da cidade.

5.1.3 | CARACTERÍSTICAS ESPACIAIS DAS EDIFICAÇÕES E VEGETAÇÃO EXISTENTE

A área estudada é bastante densificada e possui poucos vazios urbanos, como é possível analisar pela técnica do mapa Nolli (Figura 4 e Figura 5), ficando evidente os espaços cheios e vazios. Por estar na região central do município e ser uma das áreas mais antigas da cidade, observa se que está bastante consolidada. Além disso, o traçado é ortogonal em praticamente todo o território, no entanto, na parte norte do mapa é perceptível

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um desenho distinto, decorrente do projeto de Saturnino de Brito o bairro Nossa Senhora do Rosário passa a assumir um traçado de malha urbana radial (GUMA; ALCÂNTARA; COIMBRA, 2021, p. 3876).

Figura 4 | Mapa Nolli (fundo figura) Figura 5 | Mapa Nolli (figura fundo)

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

Em relação a vegetação (Figura 6), o recorte analisado possui algumas vegetações nos meios de quadras e nos passeios públicos. A praça Saldanha Marinho é um dos espaços abertos de lazer da região, no entanto não é muito arborizado e não apresenta uma infraestrutura qualificada, logo é subutilizado. Por fim, o espaço abordado possui uma Área de Preservação Permanente (APP), localizada entre a rua dos Andradas e a travessa Hermes Cortês

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Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

5.1.4 | USO E OCUPAÇÃO DO SOLO

Conforme a análise da área (Figura 7), o uso residencial é predominante, principalmente nas regiões mais periféricas dos bairros. Em direção ao bairro Centro, situado a leste do recorte, é notável o aumento de edificações de uso misto e comercial. Em relação aos prédios institucionais, estão estabelecidos na região o Colégio Adventista Santa Maria, a Paróquia Nossa Senhora do Rosário, a Escola Básica Estadual Cícero Barreto, a Policlínica do Rosário, o Museu Comunitário Treze de Maio, os conjuntos II e III da Universidade Franciscana, a Igreja Evangélica Assembleia de Deus Universal, o Clube de Atiradores Santamariense, o Pronto Atendimento da Unimed e a Paróquia Nossa Senhora do Bom Fim.

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Figura 6 | Mapa de Vegetação

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

Quanto à análise da altura das edificações da região (Figura 8), o bairro do Rosário, como é popularmente conhecido, possui menor densidade demográfica que o Bom Fim decorrente da quantidade de edificações residenciais unifamiliares ou multifamiliares de baixa altura. A maioria das construções estão entre 01 e 02 pavimentos e as maiores edificações ficam em, aproximadamente, 12 pavimentos.

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Figura 7 | Mapa de uso do solo

Figura 8 | Mapa de altura das edificações

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

5.1.5 | SISTEMA DE CIRCULAÇÃO

As ruas Silva Jardim, dos Andradas, Duque de Caixas e Serafim Valandro são classificadas como vias arteriais nas quais é assegurado uma boa fluidez na circulação e velocidade moderada, segundo a Lei de Uso e Ocupação do Solo (SANTA MARIA, 2018). Conforme levantamento (Figura 9), as ruas Visconde de Pelotas, Barão do Triunfo e Venâncio Aires são de caráter coletor, logo, fazem a distribuição o tráfego entre as vias locais e as vias arteriais.

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Figura 9 | Mapa do Sistema Viário

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

Todas as vias sinalizadas nesse recorte são pavimentadas de asfalto, facilitando a circulação de veículos. Nas proximidades da preexistência estão posicionadas paradas de ônibus em quantidade aceitável, que circulam para outras regiões da cidade.

Enquanto aspecto negativo, existem calçadas na área que apresentam bastantes irregularidades, prejudicando o tráfego de pedestres e a acessibilidade.

5.1.6 | POTENCIALIDADES E FRAGILIDADES

Com base nas análises feitas anteriormente, entende se que orecorte estudadoé um localconsolidado,com usosealturas variados. Acredita se que a localização próxima ao Centro, o caráter histórico, a facilidade de acesso e o fluxo de veículos e

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pessoas sejam pontos positivos da área, que podem contribuir de forma positiva para a proposta. Entretanto, características como as irregularidades nas vias e nos passeios públicos, a escassa arborização e a abrangência de públicos diferentes atendidos, podem gerar condicionantes ao projeto.

A questão da insuficiência de espaços de lazer e de cultura é um ponto a ser explorado como fortalecedor do programa de necessidades arquitetônico apresentado. As diretrizes do projeto interpretativo também poderão contribuir para fomentar a cultura e o turismo da cidade.

5.1.7 | LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO DO ENTORNO

As imagens a seguir, locadas no mapa abaixo (Figura 10), retratam oentornoimediatoda edificaçãodoclubeUniãoFamiliar por meio do levantamento fotográfico realizado no dia 22 de outubro de 2022, aproximadamente às 18h30min, pela autora do trabalho.

Figura 10 | Mapa de locação das fotografias do entorno imediato

Fonte: Mapbox Editado pela autora, 2022.

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Figura 11 | Ponto de Vista "a"

Figura 12 | Ponto de Vista "b"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

Figura 13 | Ponto de Vista "c"

Figura 14 | Ponto de Vista "d"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

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Figura 15 | Ponto de Vista "e"

Figura 16 | Ponto de Vista "f"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

Figura 17 | Ponto de Vista "g"

Figura 18 | Ponto de Vista "h"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

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Figura 19 | Ponto de Vista "i"

Figura 20 | Ponto de Vista "j"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

Figura 21 | Ponto de Vista "k"

Figura 22 | Ponto de Vista "l"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

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Figura 23 | Ponto de Vista "m"

Figura 24 | Ponto de Vista "n"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

Figura 25 | Ponto de Vista "o"

Figura 26 | Ponto de Vista "p"

Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022. Fonte: Arquivo pessoal, 22 out. 2022.

5.2 | LEVANTAMENTO DO TERRENO E DA EDIFICAÇÃO

O local escolhido para o projeto arquitetônico foi a edificação da antiga sede da Sociedade União Familiar, situada

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na rua Barão do Triunfo, nº 855, no bairro Bom Fim. O terreno (Figura 27), de meio de quadra, possui 382,88m² , com construção preexistente de cercade 220m²,resultandoem aproximadamente 162,88m² de área livre

Figura 27 | Planta de Situação

Fonte: Elaborado pela autora, 2022. De acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo (SANTA MARIA, 2018) do município, o lote situa se na zona 3.a, sujeito aos seguintes índices:

Tabela 1 | Índices exigidos para a zona 3.a

Área Estimada do Terreno: 382,88m² Área Estimada Construída: 220,00m² Área Estimada Livre no Lote: 162,88m² Índice de Aproveitamento (IA) 3,5 1.340,0800m² | permitido Índice de Ocupação (IO) 0,6 229,7280m² | permitido Índice Verde (IV) 0,18 68,9184m² | exigido IA Atividades associativas, recreativas, culturais e desportivas 1,5 574,3200m² | permitido

Fonte: SANTA MARIA, 2018 Elaborado pela autora, 2022.

5.2.1

| REDE DE INFRAESTRUTURA

No entorno do terreno em estudo ocorre o recebimento de abastecimento de água tratada e distribuída pela Corsan

43

(Companhia Rio grandense de Saneamento). O sistema de esgoto (Figura 28) está presente em toda a região. Em relação a rede de energia elétrica (Figura 29), a maioria das vias apresenta posteamento em um dos lados do passeio público.

Figura 28 | Mapa da rede de esgoto Figura 29 | Mapa da rede de energia elétrica

Fonte: Elaborado pela autora, 2022. Fonte: Elaborado pela autora, 2022

5.2.2 | MICROCLIMA

Tendo em vista que a análise do microclima influencia nas decisões projetuais, se faz necessário explorar as condições na cidade de Santa Maria relacionando com o lote e a edificação em questão.

A cidade apresenta as estações bem demarcadas, acarretando uma significativa amplitude térmica ao longo doano, com temperaturas médias variando de 25ºC a 13,5ºC. O vento é predominantemente a partir da orientação sudeste, sendo bem intenso em alguns momentos.

Relativo ao terreno e a construção existente (Figura 30), a testada fica voltada a orientação leste. A preexistência possui a maior parte das janelas na fachada norte, orientação proveitosa para incidência solar. Destaca se que a posição da edificação é favorável, visto não ter interferência na insolação e ventilação decorrente da altura de prédios vizinhos.

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5.2.3

Figura 30 | Mapa do microclima

Fonte: Elaborado pela autora, 2022.

| LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO DA PREEXISTÊNCIA

A edificação do antigo clube União Familiar foi escolhida para a intervenção, a qual não apresenta significativa relevância nos traços arquitetônicos, mas, por outro lado, possui importância histórica, afetiva e simbólica para uma comunidade.

Após o encerramento das atividades do “União”, o local passou a abrigar diversos empreendimentos, que vieram a fazer alterações na edificação com o intuito de atender suas demandas. Atualmente, o prédio possui dois acessos, um principal e outro de serviço por uma circulação lateral. A fachada da edificação foi modificada ao longo dos anos, inclusive, acredita se que com o fechamento de uma esquadria. Hoje em dia o espaço abriga atividades clandestinas, por isso a dificuldade de acesso às dependências.

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A Sociedade União Familiar foi fundada em 1896, porém o clube passou a ter sede alguns anos depois, possivelmente por volta dos anos 1940. Em meio às buscas, depara se com projetos arquitetônicos, das décadas seguintes, para reforma e ampliação das dependências do prédio. Os projetos dos anos de 1953 e 1967 apresentam um segundo pavimento que não foi executado. Não foi possível a compreensão de se alguma intervenção foi realizada, mas considera se que a entidade tinha problemas financeiros que não possibilitaram a construção da sede exatamente como pretendiam A Figura 31 expõe alguns dos documentos, em ordem cronológica, que demonstram as análises acima.

Figura 31 | Linha do Tempo com documentos e projetos arquitetônicos

Fonte: Arquivo da Secretaria de Licenciamento e Desburocratização1 Elaborado pela autora, 2022.

Sabe se que os comércios que ocuparam olocal realizaram mudanças tanto externas como internas (Figura 32). Atualmente há um anexo construído na parte posterior do lote, que deixa o

1 O documento e as pranchas arquitetônicas completas estão anexados no final do trabalho (ANEXO A, ANEXO B, ANEXO C, ANEXO D)

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terreno praticamente sem área livre e ultrapassa os índices urbanísticos permitidos.

Figura 32 | Montagem de imagens com as modificações na fachada ao longo dos anos

Como é possível observar, há a possibilidade de os espaços do clube não atenderem todas as demandas de suas atividades e de seus associados.Tal situação reforçaainda mais a relevância do local para a comunidade negra e a uso expressivo dele.

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Fonte: [2009]: ESCOBAR, 2010; [2011], [2012], [2016] e [2019]: Google Street View; [2022]: Acervo pessoal.

A consulta das leis e normativas específicas é importante para conhecimento dos condicionantes legais sob os quais o projeto da etapa do Trabalho Final de Graduação II deverá responder, inclusive enquanto critério de aprovação.

6.1 | LEGISLAÇÃO MUNICIPAL

No nível municipal, o Plano Diretor de Desenvolvimento Territorial do Município de Santa Maria (PDDT), a partir da Lei Complementar Nº 118 de 26 de julho de 2018, tem como função ordenarodesenvolvimentodoterritório.EstãointegradosaoPDDT a Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), sob a Lei Complementar nº 117 de 26 de julho de 2018, e o Código de Obras e Edificações (COE), sob a Lei Complementar nº 119 de 26 de julho de 2018.

No projeto arquitetônico em questão, o LUOS tem efeito no potencial construtivo, visto ter o objetivo de controlar a densidade do uso e ocupação do solo. O COE dispõe dos parâmetros para a construção em si, englobando critérios de segurança, conforto ambiental e qualidade dos espaços.

Ainda, outros decretos municipais refletem no projeto, como é o caso do Programa Caminhe Legal, a partir do Decreto Executivo nº 30, de 27 de abril de 2016.

6.2 | LEGISLAÇÃO ESTADUAL

Em específico no estado do Rio Grande do Sul, deve se atender a Resolução Técnica do Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Sul (CBMRS) nº 11:2016. A norma estabelece as condições para o dimensionamento e execução das saídas de emergência.

6.3 | LEIS FEDERAIS

Além das legislações citadas anteriormente, as normas técnicas relativas a algumas temáticas devem ser consultadas

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memória | cultura | territórios negros

para o desenvolvimento da proposta. As normas pertinentes ao projeto são as seguintes:

* ABNT NBR 9050:2020 Acessibilidade a edificações, mobiliários, espaços e equipamentos urbanos;

* ABNT NBR 9077:2001 Saídas de emergência em edifícios.

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O capítulo a seguir tem a intenção de elaborar um embasamento teórico acerca das temáticas relevantes para o projeto. Inicia se abordando a cidade de Santa Maria na virada do século XIX, mostrando o panorama da liberdade condicionada em que a população negra vivia, inclusive, na prática de hábitos da cultura afro brasileira, esses representativos da sua identidade. Por fim, apresenta se os territórios negros ocupado no período pós abolição, elencando marcos relevantes para o trajeto proposto em etapa posterior.

7.1 | A SANTA MARIA DO PÓS ABOLIÇÃO: PODER E CONTROLE SOCIAL

Para abordarmos o período pós abolição da escravatura, ocorrida em 1888, em Santa Maria, é necessário contextualizar a história da cidade relacionada a população negra. Segundo o imaginário coletivo, o Rio Grande do Sul foi um Estado com situação “mais moderada” de escravidão e onde pouco existem negros, essa crença é reforçada no relato do viajante Saint Hilaire em 1820:

Tive a oportunidade de referir ao fato de serem vendidos aqui os negros imprestáveis aos habitantes do Rio de Janeiro; quando querem intimidar um negro ameaçam no de enviá lo para o Rio Grande. Entretanto não há, creio, em todo o Brasil, lugar onde os escravos sejam mais felizes que nesta capitania (LAYTANO, 1957, p. 78 apud ESCOBAR, 2010, p. 48).

Ainda que posteriormente o viajante venha a relatar cenas marcantes de crueldade com os escravos ao chegar às charqueadas, a narrativa de que o povo gaúcho foi majoritariamente formado por descendentes europeus ainda perdura atualmente. Referindo se a Santa Maria e contrapondo essa ideia,de acordocom Grigio (2018) antes mesmoda formação do povoado que originou a cidade, escravos já trabalhavam aqui nas terras de posse do padre Ambrózio José de Freitas, um senhor

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memória | cultura | territórios negros

de escravos, nas quais mais tarde alojariam o acampamento militar que veio ser o marco fundador do município

A comunidade que se instalou na cidade dependia da mão de obra escravizada como fonte de capital. A estimativa da população obtida a partir dos censos ao longo dos anos (Tabela 2 e Tabela 3) auxilia no entendimento da presença significativa de negros livres e escravizados, que no decorrer da pesquisa justificará a criação de entidades voltadas ao público.

Tabela 2 | Comparação entre população livre, liberta e escrava de Santa Maria nos anos de 1858 e 1872

1858 4.124 + 20 966 (18,9%) 5.110 1872 7.024 1.204 (14,6%) 8.228

Fonte: Mapa Estatístico da População da Província classificada por idades, sexos, estados e condições com o resumo total de livres, libertos e escravos apud GRIGIO, 2018.

Tabela 3 | População Total de Santa Maria, em 1872

4.268 1.380 1.257 1.323 8.228 51,9% 16,8% 15,3% 16,1% 100% Fonte: Recenseamento do Brasil em 1872 Rio Grande do Sul Paróquia de Santa Maria da Boca do Monte apud GRIGIO, 2018.

Em 1858, pelo menos 19,3% da população era negra no município, número que sobe para 32,1% em 1872, sem contar os caboclos e mestiços, chegando a praticamente um terço do total de habitantes. Como fica evidente a partir dos dados, nos anos que antecederam a abolição a presença de negros era bem expressiva e é nesse cenário que a cidade passa por épocas de mudanças.

A cidade de Santa Maria viveu momentos de agitação no final do século XIX. Uma colônia italiana foi instalada no município em 1877, trazendo novos imigrantes e novas ideias. Em 1884, chegaram os trilhos da ferrovia e com ela o desenvolvimento urbano e o espírito de modernidade. [...] Os ideais republicanos avançavam, e

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o fim da escravidão estava na agenda das discussões (GRIGIO, 2018, p. 155).

A partir do crescimento urbano e da movimentação econômica que ocorria, o município começa a receber reformas urbanas, com o objetivo de melhorias por meio de políticas de saneamento, higienização e embelezamento que reprimem determinada parcela da população. De acordo com Oliveira (2016), o período foi marcado pelo impulso tecnológico e por atividades “civilizatórias” que acarretam no aprimoramento dos mecanismos de controle social, reforçadopela criação da Guarda Municipal em 1893 e do Código de Posturas em 1898. Segundo Grunewaldt (2010), a abolição da escravatura auxiliou para formar a crença de que existia uma classe perigosa que deveria ser contida, pois ameaçava a ordem pública, logo, medidas são tomadas para “ordenar as cidades segundo valores burgueses, controlar o espaço público, impondo regras às ruas, às diversões, ao comércio, à higiene domiciliar e a moral” (GRUNEWALDT, 2010, p. 342).

A incriminação de hábitos e práticas de lazer ligados à comunidade negra é assunto pertinente para entendimento das condições de liberdade que foi concedida e do contexto em que organizações negras foram formadas.

7.2 | IDENTIDADE, MEMÓRIA E CULTURA AFRO BRASILEIRA

A identidade, no viés cultural, é o conjunto de atributos culturais, étnicos, políticos, econômicos e geográficos que caracteriza e singulariza determinado grupo na sociedade, afirmando as origens e as diferenças em meio a diversidade cultural. A identidade cultural do Brasil tem fortes influências das características afro brasileiras, considerando o período colonial

O Brasil, dado o longo processo de escravidão, constitui se em um país que possui uma

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predominância demográfica de afrodescendentes, gerando então uma diversidade de manifestações culturais, as quais também são frutos do período de escravidão, visto que, a cultura de várias regiões do continente africano contribuiu e contribui para enriquecer a diversidade étnica do país (FONSECA, 2022, pág. 47).

Dessa forma, é fundamental abordar a cultura e a memória trazidas pelos negros para o Brasil, visto fazerem parte da história do país, logo, como forma de fortalecimento e reconhecimento das nossas raízes identitárias, se faz relevante preservar enquanto patrimônio cultural e imaterial buscando evidenciar a pluralidade cultural. Em resumo,

Transmitido como uma herança ou legado o Patrimônio Cultural remete à riqueza simbólica e tecnológica desenvolvida pelas sociedades. Ele diz respeito aos conjuntos de conhecimentos e realizações de uma comunidade, acumulados ao longo de sua história, que lhe conferem os traços de sua identidade A partir do patrimônio, nos tornamos únicos. Por outro lado, a diversidade cultural por si só pode ser considerada um dos maiores patrimônios da humanidade (BRASIL, 2020a, p. 1 apud FONSECA, 2022, p. 47).

Conforme Escobar (2010), o reconhecimento do patrimônio imaterial em 2000 foi um grande avanço na legislação brasileira para o reconhecimento de bens culturais. A capoeira, prática típica entre a comunidade negra, é um exemplar que recebeu o tombamento do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) em 2008 como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, prática que foi considerada crime por cerca de 40 anos.

Uma das maiores representações identitárias do povo brasileiro, marcado por sua raiz africana, o samba também ocupa significativo espaço como patrimônio cultural imaterial Segundo Ercolani (2021) a manifestação cultural do samba perpetua desde a formação do país, ainda que passe por transformações pelo contexto sociocultural e apresente suas particularidades em cada região dopaís. O gênero musical é cultuado no Carnaval, uma das maiores celebrações populares nacional, que igualmente possui

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origens afro brasileiras e vai além das questões festivas, sendo espaço para manifestações, resistência, engajamento social e expressão cultural.

Apesar de o RioGrande doSulser marcadopela cultura das tradições regionalistas, o Carnaval também tem sua presença. Em Santa Maria, as comemorações tiveram seus espaços, ainda que ao longo dos anos tenha enfraquecido, em partes pela falta de incentivo.

No coração do Rio Grande do Sul, estado marcado pela forte cultura regionalista, também pulsa o mais brasileiro dos ritmos. Embora não tenha seu berço nesses pagos e registros documentais e fotográficos fossem raros a época , o samba tem sua história arraigada em Santa Maria e segue pungente até os dias de hoje. Suas vertentes e seus representantes são referência aos amantes do ritmo, [...] (MATGE, 2016, p. 3 apud ERCOLANI, 2021, p. 32).

Os primeiros registros do reconhecimento do samba e das festividades carnavalescas na cidade se dão a partir de 1930, principalmente pela figura, hoje conhecida nacionalmente, de Lupicínio Rodrigues, compositor boêmio natural de Porto Alegre que residiu na Vila Operária Brasil em Santa Maria prestando serviços militares Segundo ERCOLANI (2021), em 1959 foi fundada a primeira Escola de Samba, batizada de Vila Brasil, realizando o primeiro desfile no ano seguinte.

Ainda que o Carnaval seja uma das representações afro brasileiras de melhor aceitação pela comunidade em geral, é válido salientar que não se limita a festa e comemoração. Em conversa informal com o Arq. Urb. Me. Paulo Rogério Lemos, ressaltou se a necessidade de debater sobre o papel das escolas de samba enquanto equipamentos urbanos, inclusive enquanto espaços profissionalizantes.

Diferente do razoável reconhecimento das tradições carnavalescas hoje em dia, nem sempre foi assim e, principalmente, ao tratarmos de outros hábitos praticados pela

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população negra, como já abordado anteriormente. Portanto, de acordo com Oliveira (2016),

[...] os clubes e associações negras funcionavam, basicamente, para garantir um espaço de acesso a direitos como, por exemplo, o lazer em suas diferentes modalidades (o festejar, o dançar, o beber e o socializar) entre os seus. Além disso, tais espaços significavam melhorias para a vida de seus frequentadores que, inclusive, também movidos pelo desejo de interação social [...] (OLIVEIRA, 2016, p. 33).

A partir desse contexto, os territórios negros, enquanto espaços de pertencimento e memória da população negra, serão abordados no próximo tópico.

7.3 | TERRITÓRIOS NEGROS: TRAJETOS NA CIDADE INVISÍVEL

Os pontos elencados para estudo são marcos, de caráter material ou imaterial, que foram ocupados pela população negra no período pós abolição, fazendo parte da memória e da história da cidade de Santa Maria, embora a maioria não esteja mais preservada em suas características arquitetônicas originais e/ou tenha sido objeto do esquecimento

7.3.1 | VILA RICA

O bairro Vila Rica se consolidou como o local de moradia e socialização da população negra e proletariado da cidade de Santa Maria, tendo ocupação do seu território anterior à instalação da Estação Férrea de Santa Maria (TOCHETTO, 2016). O local, que hoje identifica se como o Bairro Nossa Senhora do Rosário,organizou se nasproximidadesdeumaigrejaquenomeia o bairro, tratada no tópico seguinte a esse. Vila Rica aparece em algumas das plantas mais antigas da cidade, como a de 1902 assinada pelo agrimensor José Neher (Figura 33), sendo praticamente a delimitação do limite do espaço urbano. Para Grigio (2018)

[...] o bairro Vila Rica fazia parte dos “arrebaldes” de Santa Maria, como se referiam os jornais do período, e

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seus habitantes eram tratados com desprezo e, muitas vezes, com ironia pela elite que vivia na área central (GRIGIO, 2018, p. 178).

Figura 33 | Planta da cidade de Santa Maria de 1902, marcações feitas pela autora na localização da Igreja do Rosário e na rua 24 de Mayo

Fonte: MARCHIORI; NOAL FILHO, 1997

O bairro ainda possuía outras duas peculiaridades: é mencionado sobre o “tanque das lavadeiras”, que se situava na esquina das ruas 24 de Mayo (atual Silva Jardim) e Floriano Peixoto, local em que havia uma espécie de poço enorme, utilizado por muitas mulheres do bairro que trabalhavam como lavadeiras (GRIGIO, 2018); e, por fim, a partir do projeto de Saturnino de Brito o bairro assume um traçado de malha radial, que o difere do restante da cidade (TOCHETTO, 2016).

Atualmente, o “Rosário”, como é popularmente conhecido, apresenta características distintas das descritas, devido às modificações que estão ocorrendo na paisagem construída decorrente da implantação e da proximidade física com a Universidade Franciscana situada no limite do bairro, caracterizando o como “bairro universitário” (GUMA; ALCÂNTARA; COIMBRA, 2021, p. 3877).

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7.3.2

| IRMANDANDE DO ROSÁRIO

Com o fim da escravidão algumas entidades negras têm início, em Santa Maria a Irmandade do Rosário (Figura 34) foi a primeira delas, permitindo a comunidade um ambiente de convivência religioso e social. O espaço solicitado para a construção foi o antigo Cemitério Santa Cruz, localizado na Rua Silva Jardim (antiga Guararapes e 24 de Mayo) no bairro Vila Rica, do qual as pedras e tijolos seriam aproveitadas na edificação. A obra, que teve início em 1890, apresentou diversos problemas, principalmente com dificuldades econômicas, necessitando de auxílio financeiro de doações da comunidade. A inauguração da igreja ocorreu em 1901 (GRIGIO, 2018).

A Irmandade tinha agora a sua sede própria e o templo onde podia celebrar a festa de sua padroeira. Foi mais de uma década de espera entre o lançamento da pedra fundamental e a inauguração da igreja. [...] Era também um símbolo de organização e emprenho dos habitantes daquela região da cidade que enfrentavam uma sociedade preconceituosa onde a cor se mantinha como critério de hierarquia social (GRIGIO, 2018, p. 176).

Na figura abaixo, é possível ver a rua 24 de Mayo (atual Silva Jardim), na direita a Capela do Rosário e na esquerda o Orfanato São Vicente no terreno ocupado atualmente pela Universidade Franciscana.

Figura 34 | Rua 24 de Mayo e Igreja do Rosário 1914

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Fonte: Revista do Centenário de Santa Maria de 1914 apud GRIGIO, 2018

A igreja do Rosário, de 1901, não se encontra mais no local, foi destruída e deu espaço para outra com o acesso voltado para a rua do Rosário. Ainda assim, por toda a sua história de resistência, a Irmandade do Rosário é um marco para a comunidade negra de Santa Maria

7.3.3 | SOCIEDADE TREZE DE MAIO

A Sociedade Cultural Ferroviária Treze de Maio, conhecida carinhosamente como o “Treze”, foi um clube social negro fundado em 1903 por ferroviários da extinta Viação Férrea de Santa Maria. Teve como primeiro local de encontro à residência de Sisnande Antonio de Oliveira, sendo idealizado por negros e para negros, abrangendo atividades sociais, culturais e esportivas. Em 1906 houve a compra doterreno na Rua Silva Jardim, onde a edificação se encontra atualmente, mas apenas em 1911 que começaram as construções da primeira sede da Sociedade Treze de Maio (Figura 35). Chegando a ter 800 sócios, todos negros, na década de 60 o prédio passou por uma construção para comportar suas atividades (ESCOBAR, 2010).

Figura 35 | Fachada da Sociedade Cultural Ferroviária Treze de Maio 1978

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Fonte: ESCOBAR, 2010.

O clube entrou em decadência a partir dos anos 1980, motivado por vários fatores como o declínio da ferrovia, as crises econômicas, os problemas de gestão e, até mesmo,a abertura da restrição racial nos clubes tradicionais.

A partir de 2001 o local passou a funcionar como Museu Comunitário Treze de Maio, como forma de resgate ao histórico e a cultura da população negra e do antigo clube. Para Escobar (2010, p. 100) a entidade “é um símbolo de resistência e poder da comunidade negra, materializado em um espaço privilegiado que demarca na cidade, um espaço político, uma vontade, um lugar de memória e identidade negra”. O local passou a abrigar oficinas, eventos, exposições e manifestações que valorizam a cultura negra.

Em 2004, o prédio que abriga o Museu foi tombado como Patrimônio Cultural Municipal. Atualmente, as atividades do Museu se encontram em processode retomada juntoaocursode História da Universidade Franciscana, após um período fechado por problemas estruturais.

7.3.4 | VILA OPERÁRIA BRASIL

A Vila Operária Brasil (Figura 36), criada no início da década de 1910, foi um loteamento localizado no quarteirão delimitado pelas ruas Venâncio Aires, dos Andradas, Barão do Triunfo e ViscondedePelotas,compostoporcercade50chalésdemadeira e idealizado por Perfecto Leirós. As casas populares abrigavam cozinheiras, famílias operárias e trabalhadores ferroviários. A população do local tinha o Carnaval como principal tradição, inclusive com o bloco Rancho Succo (MARCHIORI; NOAL FILHO, 1997, p. 147 apud OLIVEIRA, 2016, p. 74).

Na figura abaixo, aparecem os chalés anteriormente descritos e, no centro, acredita se que seja um grande reservatório de água.

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Figura 36 | Chalés de madeira e possível reservatório de água da Vila Operária Brasil. Extraída do Álbum de Santa Maria, de 1914

Fonte: MARCHIORI; NOAL FILHO, 1997.

Sobre o projeto original “na época, poderia ser taxado de faraônico previa a construção de 180 moradias, ruas calçadas e arborizadas, um mercado, uma praça e umgrande reservatóriode água” (MARCHIORI; NOAL FILHO, 1997, p. 161).

Acredita se que o Sociedade União Familiar tivesse relação com a Vila Brasil, com base em relatos de moradores e pela proximidade física.Éa partir da Vila Brasilque se inicia a suposição sobre uma rede ao seu redor, composta pelo Clube, o bloco Rancho Succo, o jornal “O Succo” e a Escola de Samba Vila Brasil.

Hoje em dia não há mais nenhuma casa da antiga Vila Brasil, nem mesmo o reservatório, no entanto a importância do local se dá

Para além de um projeto urbano, um espaço de convivência de trabalhadores da cidade. Como toda e qualquer convivência, fora marcada também por conflitos, rivalidade e tensões, sem deixar de ser também um espaço de lazer, festividade e moradia. Como no caso, por exemplo, do União Familiar, uma parte da Vila (OLIVEIRA, 2016, p.88).

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A seguir é apresentado uma tabela resumo (Tabela 4) com os principais aspectos de cada um dos pontos abordados anteriormente.

Tabela 4 | Resumo das informações sobre os pontos escolhidos para estudo

Localização

Atualmente identifica se como bairro Nossa Senhora do Rosário

Ano Teve ocupação anterior à instalação da Estação Férrea de Santa Maria (TOCHETTO, 2016)

Características Gerais Local de moradia e socialização da população negra e proletariado da cidade

Situação Atual Caracterizado como “bairro universitário” pela proximidade física com a Universidade Franciscana (GUMA; ALCÂNATARA; COIMBRA, 2021)

Localização

Ano

Construída no antigo Cemitério Santa Cruz, localizado na Rua Silva Jardim

A inauguração da igreja foi em 1901, mais de 10 anos após o começo das obras

Características Gerais Primeira entidade negra do período pós abolição, permitindo um ambiente de convívio religioso e social (GRIGIO, 2018)

Situação Atual

Localização

A igreja, de 1901, foi destruída dando espaço para outra com o acesso na rua do Rosário

Rua Silva Jardim, nº 1405

Ano Fundada em 1903, porém só em 1911 começaram as obras da sede existente (ESCOBAR, 2010)

Características Gerais Foi um clube social negro, organizado por ferroviários da extinta Viação Férrea

Situação Atual A partir de 2001 passou a funcionar como Museu Comunitário Treze de Maio

Localização

Situava se no quarteirão delimitado pelas ruas Venâncio Aires, dos Andradas, Barão do Triunfo e Visconde de Pelotas Ano Início da década de 1910

Características Gerais Foi um loteamento composto por 50 chalés de madeira que abrigavam a população negra e proletariado

Situação Atual

Nos dias atuais não se encontra mais nenhuma das casas populares e nenhum vestígio do antigo loteamento

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Localização

Rua Barão do Triunfo, nº 855 Ano Fundado em 1896 Características Gerais Clube social negro com fins de lazer e socialização da população negra

Situação Atual Encerrou as atividades por volta dos anos 1990, porém ainda existe a sede física do antigo clube Fonte: Elaborado pela autora, 2022.

Considerando a importância do Clube União Familiar para a etapa projetiva desse trabalho, o espaço será assunto de uma seção a parte.

7.4 | DIREITO A SOCIABILIDADE E AO LAZER: SOCIEDADE UNIÃO FAMILIAR

Oito anos após a abolição da escravatura no Brasil, é fundada em Santa Maria a Sociedade Cultural Recreativa União Familiar, segundo registros encontrados o mais antigo clube social negro da cidade.

“Acaba de ser fundada nesta cidade, sob a denominação de União Familiar, uma sociedade de baile, comportas por homens de cor”. Foi com essas poucas palavras que o jornal O Combatente noticiava, em 15 de março de 1896, a fundação do clube União Familiar (OLIVEIRA, 2016, p. 51).

Conhecido popularmente por alguns como o “clube dos negros pobres”, o União Familiar surge no cenário (abordado anteriormente no capítulo 1 desse texto) de exclusão de outras entidades e, ao mesmo tempo, no desejo de participação e convivência social. A invisibilidade da população negra é evidente até na escrita da História, ainda que não seja um fato limitado a esfera local, nessa lógica na cidade

[...] pode se salientar obras clássicas sobre Santa Maria, como História do município de Santa Maria 1797 1933 (1933), de João Belém e a Cronologia histórica de Santa Maria e do extinto município de São Martinho 1787 1930 (1958), de Romeu Beltrão, difundidas como de fundamental importância para História local e que suguem as bases de uma escrita de tradição positivista (OLIVEIRA, 2016, p. 24).

Acredita se na possibilidade de o clube ter existido em um primeiro momento na informalidade, por meio de reuniões sociais

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possivelmente nas residências dos membros (OLIVEIRA, 2014). Situado junto a Vila Brasil, o “União” passa a ter uma sede física na rua Barão do Triunfo nº 855, na época considerada periferia da cidade, que ainda se encontra em pé no mesmo local, porém atualmente considerada como região central em razão da expansãourbana. Sabe se tambémdaelaboraçãodeum projeto arquitetônico para a edificação, assinado pelo engenheiro civil Luiz Bollick, que não saiu do papel, provavelmente por questões financeiras.

De acordo com Extrato dos Estatutos da Sociedade União Familiar, de 17 de janeiro de 1958, os objetivos do clube seria desenvolver o espírito de sociabilidade, recreativo, beneficente e esportivo. As entidades negras existiam no propósito de garantir o direito, que não estava inerente a esses indivíduos, de ter um ambiente para sociabilidade, lazer, festividades e, acima disso, interação social (Figura 37) Além disso, a preocupação não era somente com festa, existia uma precaução com a proteção de seus membros, visando a segurança e a defesa de seus direitos, inclusive no meio trabalhista. (OLIVEIRA, 2018).

Figura 37 | Membros do Clube União Familiar

63
Fonte: Acervo particular de Alcione Flores do Amaral OLIVEIRA, 2016.

As principais memórias do clube são relacionadas as atividades que eram promovidas, como bailes, concursos, reuniões, aniversários, casamentos, festas juninas e as mais diversascelebrações,noentantooCarnavalerabastantepopular e movimentado no local.

Por fim, entende se que os clubes sociais negros eram uma forma de obter melhorias nas condições de vida da população negra, sendo relevante na discriminação racial (ESCOBAR, 2010). Esses espaços funcionavam também de maneira simbólica a liberdade, dando a possibilidade de demonstrar resistência praticamente em modo de afronta social pela conquista em meio a exclusão social (OLIVEIRA, 2016).

7.5 | INTERVENÇÃO EM PREEXISTÊNCIA

A respeito do termo “intervenção” no campo da arquitetura se refere a forma genérica de um projeto sobre uma construção existente, englobando ações distintas, entre elas a restauração, a requalificação, a revitalização, a reutilização, a renovação, a conservação, a adaptação, entre outros, que conduzirão a diferentes resultados dependendo a interpretação do edifício e do planejamento das estratégias (RIOS, 2013) A questão das posturas intervencionistas em preexistências ainda não é consenso entre a classe de arquitetos, inclusive, duas teorias importantes na história do debate sobre as formas de intervir no patrimônio se contrapõem em vários momentos, sendo elas a de Viollet Le Duc, defendendo recompor o projeto a um estado ideal, e a de John Ruskin, defendendo a não intervenção julgando a como uma ação agressiva.

À frente dos desafios projetuais de intervir em uma edificação são diversos os fatores que devem ser considerados, como a questões da sensibilidade em respeitar o legado histórico como também na responsabilidade de propor um espaço para as necessidades de uso contemporâneo. É válido salientar que

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qualquer projeto de arquitetura pretende responder aspectos de uma carência física e satisfazer demandas funcionais e formais.

Em relação a atribuição formal de intervenção em edificações preexistentes, em determinadas situações se faz preciso a incorporação de novas partes a construção para suprir determinadas necessidades, como eventualmente ocorrerá no projeto decorrente desse trabalho. A autora Françoise Bollack (2013), em seu livro OldBuildings , New Forms , expõe formas de conceber essaspartes anexas,objetivandoa permanência douso desses prédios

As estratégias da autora são didáticas para estimular a imaginação durante a criação, sendo denominadas como “inserção, parasita, invólucro, justaposição e trama”. De maneira bem resumida e simplória: na inserção um novo edifício é inserido no antigo, esse último criando um ninho para o novo; na parasita uma parte se beneficia da outra, deixando o edifício original como protagonista; no invólucro um novo edifício envolve um antigo, quase como forma de proteção; na justaposição a adição permanece lado a lado com o original, com certa separação visual; por fim, na trama é feito um trabalho complexo de desenho dentro e fora do original, sem ser imediatamente aparente (BOLLACK, 2013)

Seguindo no tópico das posturas contemporâneas da intervenção, o autor Salvador Muñoz Viñas (2004) publica o livro TeoríaContemporáneadelaRestauraciónem queapresenta uma análise a fim de atualizar aos dias atuais as teorias “clássicas” afirmando que estão limitadas para a situação cultural atual (VELLEDA, 2013). Segundo o autor, além dos aspectos histórico e artístico, a restauração pode estar relacionada também a juízos ideológicos, afetivos, religiosos e outros, inclusive, contando com contribuições multidisciplinares como a etnografia, a antropologia e o planejamento urbano.

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Desviando da perspectiva que antes era direcionada ao objeto e a sua materialidade, Muñoz Viñas se volta à função e ao significado que o objeto a ser restaurado simboliza a seu grupode pertencimento, antes de se inclinar exclusivamente para o aspecto técnico (VELLEDA, 2013). Para o autor

A teoria contemporânea da conservação requer o ‘bom senso’, para decisões ponderadas e ações sensíveis. O que determina isso? Não é a verdade nem a ciência, mas os usos, os valores e os significados que os objetos têm para as pessoas. Esses são determinados pelas pessoas (MUÑOZ VIÑAS, 2005, p. 212 apud ZANCHETI, 2014) [grifo no original]

Por último, é de suma importância ressaltar que o respeito ao pensar em uma intervenção em preexistência não pode estar limitado apenas a edificações monumentais, a arquitetura popular também possui seu espaço histórico para preservação, reforçado pela população sensível a sua existência e ao seu legado.

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Os tópicos a seguir fazem parte da pesquisa de referenciais práticos, sendo escolhidos estudos de caso que auxiliarão na melhor compreensão dos aspectos formais, funcionais e programáticos ao longo do desenvolvimento do projeto.

8.1 | CENTRO DE ARTES E CRIATIVIDADE

LocalizadoemTorresVedras,em Portugal,oCentro deArtes e Criatividade ocupa a edificação de um antigo matadouro, do final do século XIX, que refletia na identidade e na memória do local dado que ali situado bairro (Figura 38) havia crescido em torno da edificação e da pedreira que servia como pasto para o gado.

Figura 38 | Mapa com localização do projeto e seu entorno

Fonte: ArchDaily Brasil, 2022 Editado pelo autor.

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memória | cultura | territórios negros

O projeto de reabilitação foi do arquiteto José Neves, ganhador do Concurso Público, foi inaugurado em 2021 e tem como tema central o Carnaval

O equipamento social utiliza a edificação do antigo matadouro como acesso principal (Figura 39), além das salas de exposição temporária, uma pequena biblioteca, a loja do museu e um auditório. No local onde encontrava se um pátio de ventilação e drenagem do sangue dos animais, hoje foi construída a escada principal. O último pavimento abriga a mostra permanente, os depósitos e os espaços administrativos.

Figura 39 | Plantas baixas da edificação com ambientes

Fonte: ArchDaily Brasil, 2022 Editado pelo autor.

A temática principal abordada no CAC é o Carnaval, o evento é explorado em diferentes locais do mundo e em toda sua complexidade por meio da mostra permanente (Figura 40 e Figura 41) intitulada “Carnaval: Ritos, Artes e Criatividade”

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Enquanto intervenção, a fachada da edificação original é preservada e um anexo vertical é inserido sobre a volumetria (Figura 42), deixando demarcado o preexistente e o novo. Além disso, vale salientar que a edificação, ainda que histórica, não era considerada um patrimônio monumental de grande relevância, no entanto, pôde ser utilizado para um novo uso.

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Figura 40 | Exposição “Carnaval: Ritos, Artes e Criatividade” Fonte: Site oficial do Carnaval de Torres Vedras, 2021 Figura 41 | Painel que representa a multiplicidade do Carnaval Fonte: Site oficial do Centro de Artes e Criatividade de Torres Vedras, 2021.

8.2 | CASA DO BENIN

A Casa do Benin foi inaugurada em 1988, com projeto de restauro da arquiteta Lina Bo Bardi, e fez parte de uma sequência de projetos da arquiteta no Centro Histórico de Salvador. O local funciona como espaço cultural, fazendo o intercâmbio entre a cidade da Bahia, onde fica localizada, e a cultura beninense, país de onde diversas pessoas foram traficadas como escravas

A edificação atual (Figura 43) foi construída com a restauraçãode três imóveis, sendo eles um sobradodo século XVIII que sofreu um incêndio em 1978 e as fachadas de dois casarões em ruínas. A parte interna do imóvel busca evidenciar que as intervenções foram realizadas no século XX, refletindo em traços modernistas.

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Figura 42 | Fachada do Centro de Artes e Criatividade
Fonte: ArchDaily Brasil, 2022

Figura 43 | Fachada da Casa do Benin

Fonte: Mídias digitais oficiais do fotógrafo Nelson Kon, s.d.

O prédio possui um programa de necessidades bem extenso composto por salas expositivas, de acervo permanente ou de mostras temporárias, auditório, residência para intercambistas, restaurante e residência para um representante diplomático do Benin, conforme desenhos técnicos (Figura 44 a Figura 47)

Figura 44 | Planta Baixa Térreo da Casa do Benin

Figura 45 | Planta Baixa Primeiro Pavimento da Casa do Benin

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Fonte: Acervo Digital Instituto Bardi Editado pela autora, 2022

Figura 46 | Planta Baixa Segundo Pavimento da Casa do Benin

Fonte: Acervo Digital Instituto Bardi Editado pela autora, 2022

Figura 47 | Planta Baixa Terceiro Pavimento da Casa do Benin

Fonte: Acervo Digital Instituto Bardi Editado pela autora, 2022

Fonte: Acervo Digital Instituto Bardi Editado pela autora, 2022

O restaurante do Benin (Figura 48) é um dos espaços de destaque da proposta, projetado com referências na arquitetura presente na região rural de Benin, essas construídas em barro, madeira e palha. A planta é em elipse, com paredes baixas, coberto de palha e com estrutura de madeira, que contou com a colaboração do arquiteto Lelé Filgueiras

Figura 48 | Restaurante do Benin

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Fonte: Mídias digitais oficiais do fotógrafo Nelson Kon, s.d.

Destaca se também a sensibilidade da arquiteta em relação a cultura estudada, como na escolha de um trançado para revestir as colunas (Figura 49) remetendo as técnicas artesanais de palha e cestaria. Além disso, ocorre um cuidado na seleção e desenho do mobiliário e do acervo exposto na edificação, processo no qual Lina participou ativamente.

Figura 49 | Sala de exposição com trançado nas colunas, à direita

Enquanto atuação, o local promove artistas baianos que têm como inspiração a arte de matriz africana, dessa maneira, contribuindo com a valorização da cultura

8.3 | MEMORIAL DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVATURA

A cidade de Nantes comportou o primeiro porto de tráfico de escravos na França e o principal do século XVIII, por isso, com objetivo de marcar a luta e a resistência pela abolição da escravatura foi projetado pelo escritório Wodiczko + Bonder, ao longo da margem do rio Loire, o Memorial da Abolição da Escravatura. O projeto utiliza se de cerca de 350 metros da costa do rio (Figura 50) e um espaço residual de subsolo preexistente (Figura 51).

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Fonte: Mídias digitais oficiais do fotógrafo Nelson Kon, s.d.

Figura 50 | Margem do rio Loire com intervenções no piso

Fonte: ArchDaily Brasil, 2012. Figura 51 | Placas com informações históricas e reflexões

Fonte: Site oficial do Mémorial de L’abolition de L’esclavage, s.d

Por meio do percurso (Figura 52), os pedestres podem estar em contato com o histórico, memórias e reflexões sobre o assunto através do espaço público e da paisagem urbana. O projeto engloba as esferas ético política, urbana, artística, paisagística e arquitetônica

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Figura 52 | Intervenção no passeio público

Fonte: ArchDaily Brasil, 2012.

8.4 | CIRCUITO HISTÓRICO DE HERANÇA AFRICANA

Promovido pelo Instituto Pretos Novos a partir de 2016, o Circuito Histórico de Herança Africana é um “passeio aula”, funcionando como oficina a céu aberto. Com o propósito de promover a educação patrimonial e a cultura trazida do continente africano e de reconhecer os territórios da região portuária da cidade do Rio de Janeiro, o caminho conta com 12 pontos (Figura 53), ao longo de cerca de 2km com duração média de duas horas.

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Figura 53 | Folheto informativo com pontos do Circuito Histórico de Herança Africana

Fonte: Site oficial do Instituto Pretos Novos, 2021.

A experiência é gratuita e ressignifica o processo de aprendizagem (Figura 54), tendo forte repercussão junto aos educadores e estudantes da Rede Pública de Ensino O projeto é incluído como referência funcional e programática para o percurso que se pretende propor na próxima fase.

Figura 54 | Realização do circuito que contou com quase 100 participantes

Fonte: Site oficial do Instituto Pretos Novos, 2021.

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A seguir, será apresentado o programa de necessidades que se pretende abrigar no projeto arquitetônico em posterior etapa. A análise das dimensões da área de intervenção foi considerada para a proposta.

O setor Resistir busca dar visibilidade para a cultura afro brasileira e para artistas negros contemporâneos por meio de ambientes para eventos e exposições.

Tabela 5 | Dimensionamento do setor Resistir Sala de Eventos Local adaptável para pequenas oficinas e atividades 50 1 80m² Exposição permanente Espaço para exibição artística fixa 1 15 1 40m²

Loja Comércio de itens de lembrança do local 1 5 1 20m² Mostras temporárias Local itinerante para exibições 12 1 30m²

Sanitários Feminino e masculino PCD 1 2 6m² ²

FONTE: Elaborado pela autora, 2022.

O setor Celebrar procura o resgate do uso da edificação enquanto espaço de festividades, de trocas sociais e de experiências

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memória | cultura | territórios negros

Boteco

6 | Dimensionamento do setor Celebrar

Espaço para venda de petiscos e bebidas 1 25 1 40m²

Copa Local de preparo dos alimentos 1 1 16m²

Depósito Apoio para a copa 1 1 4m²

Sanitários Feminino e masculino PCD 1 2 6m² ²

FONTE: Elaborado pela autora, 2022. O setor Complementar aparece como forma de apoio para o restante das atividades.

Tabela 7 | Dimensionamento do setor Complementar

Sala administrativa Local para gerência 1 5 1 15m²

Copa Espaço para acolhimento dos funcionários 5 1 15m²

DML Espaço de armazenamento de materiais 1 1 10m²

Vestiário e sanitário

Feminino e masculino para higienização de funcionários 1 2 10m² ²

FONTE: Elaborado pela autora, 2022.

As áreas expostas acima são uma projeção do pré dimensionamento, que poderá sofrer alterações ao longo do projeto e do entendimento das reais necessidades. É válido destacar que nas áreas totais apresentadas não foi considerado área de circulação geral.

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Tabela

Tabela 8 | Síntese das áreas por setor

Aprox. 176m² CELEBRAR

RESISTIR

Aprox. 66m² COMPLEMENTAR

Aprox. 50m²

ÁREA DOS SETORES 292m² 20% (paredes e circulações) 58,40m² ²

Fonte: Elaborado pela autora, 2022.

Avalia se que, em função do somatório preliminar de áreas do programa de necessidades, será necessário um anexo à preexistência do Clube União Familiar, edificação com cerca de 220m² construídos. Acredita se que a questão não seja uma problemática para as propostas do projeto arquitetônico, visto o lote ter ocupado apenas cerca de 38% do índice de aproveitamento permitido para atividades associativas, recreativas, culturais e desportivas.

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A partir da pesquisa realizada foi possível formar embasamento teórico e prático para justificativa da etapa do Trabalho Final de Graduação II. As análises feitas no território escolhido tornaram possível perceber as características, as potencialidades e as fragilidades da área que auxiliarão nas decisões projetuais.

A identidade cultural do Brasil tem fortes influências das características afro brasileiras, considerando que no período colonial a cultura de várias regiões do continente africano contribuiu para a diversidade étnica do país. Dada a importância do assunto, fica evidente a necessidade de abordar a cultura e a memória trazidas pelos negros para o Brasil, inclusive, como forma de fortalecimento, reconhecimento e preservação das nossas raízes identitárias

Entende se que os locais abordados e propostos como projeto anteriormente funcionavam de maneira simbólica, representando a liberdade, dando a possibilidade de demonstrar resistência praticamente em modo de afronta social pela conquista em meio a exclusão social. Além disso, eram uma forma de obter melhorias nas condições de vida da população negra, sendo relevante em meio a discriminação racial.

Por fim, espera se que essa pesquisa possa contribuir para outras iniciativas de valorização da cultura negra, vistoa escassez de trabalhos acadêmicos sobre a temática, principalmente no campo da Arquitetura e Urbanismo.

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memória | cultura | territórios negros
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BOLLACK, Françoise Astorg Old buildings, New forms: new directions in architectural transformations. New York: The Monacelli Press, 2013.

BRITTO, Fernanda Memorial da Abolição da Escravatura / Bonder + Wodiczko ArchDaily Brasil, 20 ago. 2012. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01 65801/memorial da abolicao da escravatura bonder mais wodiczko>. Acesso em: 16 set. 2022.

CENTRO de Artes do Carnaval / José Neves ArchDaily Brasil, 08 jun. 2022. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/983269/centro de artes do carnaval jose neves>. Acesso em 16 set. 2022.

CENTRO DE ARTES E CRIATIVIDADE DE TORRES VEDRAS. Site oficial doCentro de Artes eCriatividade: onovo equipamento culturalda cidade de Torres Vedras, 2021. Exposições Permanentes Carnaval: Ritos, Artes e Criatividade. Disponível em: <https://cac tvedras.pt/permanentes/carnaval ritos artes e criatividade/>. Acesso em: 16 set. 2022.

CENTRO de Artes e Criatividade de Torres Vedras foi inaugurado Site oficial do Carnaval de Torres Vedras, 2021. Disponível em: <http://www.carnavaldetorresvedras.com/destaques/287>. Acesso em: 16 set. 2022.

ESCOBAR, Giane Vargas. Clubes Sociais Negros: lugares de memória, resistência negra, patrimônio e potencial. 2010. Dissertação (Mestrado em Patrimônio Cultural) Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2010.

ESCOLANI, Giullia Almeida. Identidade Movediça: os trilhos do samba na cidade cultura. 2021. Monografia (Graduação em Dança) Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2021.

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memória
| territórios negros
| cultura

FONSECA, Grazielle Gonçalves. Patrimônio Cultural Negro de Santa Maria: uma proposta de roteiro turístico na região central do Rio Grande do Sul. 2022. Dissertação (Mestrado em Patrimônio Cultural) Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2022.

GRIGIO, Ênio. “No alvoroço da festa, não havia corrente de ferro que os prendesse, nem chibata que intimidasse”: a comunidade negra e sua Irmandade do Rosário (Santa Maria, 1873 1942). Santa Maria: Câmara de Vereadores de Santa Maria, 2018.

GRUNEWALDT, Silvana. Santa Maria e a modernização da paisagem urbana no fim do século XIX e início do século XX. In: RIBEIRO, José Iran; WEBER, Beatriz Teixeira. (orgs.). Nova história de Santa Maria: contribuições recentes. Santa Maria: Câmara de Vereadores, 2010.

GUMA, Juliana Lamana; ALCÂNTARA, Marina; COIMBRA, Gabriela Petersen. Cidade e Memória: histórias narradas em retratos de família. In:Seminário de História da Cidade e do Urbanismo, 16., 2021, Salvador. Anais eletrônicos do XVI Seminário de História da Cidade e do Urbanismo. Salvador: UFBA, 2021, p. 3874 3891. Disponível em: <http://xvishcu.arq.ufba.br/anais 16o shcu/>. Acesso em: 18 set. 2022.

IBGE. Santa Maria. Disponível em: < https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rs/santa maria/panorama>. Acesso em: 15 out. 2022.

INSTITUTO PRETOS NOVOS. Site oficial do Instituto Pretos Novos: museu memorial, 2021. Educativo Circuito de Herança Africana. Disponível em: < https://pretosnovos.com.br/educativo/circuito de heranca africana/>. Acesso em: 16 set. 2022.

MARCHIORI, José Newton Cardoso; NOAL FILHO, Valter (orgs.). Santa Maria: relatos e impressões de viagem. Santa Maria: Editora UFSM, 1997.

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MÉMORIAL DE L’ABOLITION DE L’ESCLAVAGE. Site oficial do Mémorial de L’abolition de L’esclavage, Nantes, s.d. Découvrir. Disponível em: <https://memorial.nantes.fr/decouvrir/>. Acesso em 16 set. 2022.

NELSON KON. Site oficial de Nelson Kon: imagens da arquitetura brasileira, s.d. Projetos na Bahia, 1963 1989. Disponível em: <http://www.nelsonkon.com.br/projetos na bahia/>. Acesso em: 16 set. 2022.

OLIVEIRA, Franciele Rocha de. Moreno Rei dos astros a brilhar, Querida União Familiar. Santa Maria: Câmara de Vereadores de Santa Maria, 2016.

“Moreno Rei dos astros a brilhar, Querida União Familiar”: trajetória e memórias de um clube social negro fundado em Santa Maria/RS. In: II Encontro Internacional Fronteiras e Identidades, 2014, Pelotas. Caderno de Resumos do II Encontro Internacional Fronteiras e Identidades. Pelotas: Editora e Gráfica Universitária UFPEL, 2014. p. 143 143.

RIOS, Maira Francisco. Intervenção na Preexistência: o projeto de Paulo Mendes da Rocha para transformação do Educandário Santa Teresa em Museu de Arte Contemporânea. 2013. Dissertação (Mestrado Área de Concentração: Projeto de Arquitetura) Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013.

SANTA MARIA. Lei Complementar nº 117, de 26 de julho de 2018. Lei de Uso e Ocupação do Solo, Parcelamento, Perímetro Urbano e Sistema Viário do Município de Santa Maria. Câmara de Vereadores, Santa Maria, RS, 2018.

Lei Complementar nº 119, de 26 de julho de 2018. Código de Obras e Edificações do Município de Santa Maria. Câmara de Vereadores, Santa Maria, RS, 2018.

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TOCHETTO, Daniel. Santa Maria: uma história precursora do planejamento urbano no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Corag/CAU RS, 2016.

VELLEDA, Karen Caldas A Restauração em foco: entre mitos e realidades. Resenhas Online, São Paulo, ano 12, n. 138.01, Vitruvius, 2013. Disponível em: <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/12.138/47 65>. Acesso em: 24 out. 2022.

MUÑOZ VIÑAS, Salvador. Teoria contemporanea de la restauración. 1. ed. Madrid: Editorial Sintesis, 2003. ZANCHETI, Silvio Mendes. A Teoria Contemporânea da Conservação e a Arquitetura Moderna Centro de Estudos Avançados de Conservação Integrada: Textos para Discussão nº 58. Olinda, 2014. Disponível em: <http://www.ceci br.org/ceci/br/publicacoes/59 textos para discussao/665 a teoria contemporanea da conservacao e a arquitetura moderna.html>. Acesso em: 24 out. 2022.

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ANEXO A | Documento do registro de móveis de Santa Maria, datado de 05 de março de 1942.

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memória
territórios negros
| cultura |

ANEXO B | Prancha do Projeto Arquitetônico, datada de 1953, com assinatura do Engenheiro Civil Luiz Bollick.

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ANEXO C | Prancha 01 do Projeto Arquitetônico, datada de 1967, com assinatura do Engenheiro Civil Luiz Leandro Scherer Lutz.

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ANEXO D | Prancha 02 do Projeto Arquitetônico, datada de 1967, com assinatura do Engenheiro Civil Luiz Leandro Scherer Lutz.

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