covid-19 economia mundial dá sinais de abrandamento Katembe com a ponte, a especulação imobiliária tem crescido Desenvolvimento pode o crowdfunding ser a solução para a agricultura?
indústria do PÃO
“é preciso eficiência”
Gilberto cossa, director-geral da merec, a maior moageira do país, fala do estado de um sector que precisa de evoluir ‘como de pão para a boca’
MARÇO 2020 • ano 03 no 23 • Preço 200 MZN
moçambique
recursos humanos como as empresas devem preparar equipas de sucesso
Sumário 6
Observação
Covid-19 A imagem de luta contra o vírus mortal que surgiu na China e se espalha pelo mundo
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Radar
Panorama Economia, Banca, Finanças, Infra-estruturas, Investimento, País
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59 ócio 60 Escape Uma viagem até à Ilha de Santiago 62 Gourmet A descoberta da “Comida Saudável” e “Pratos da Terra”, do “Black Salt” 63 Adega Rum pode chegar ao topo das bebidas preferidas em 2020 64 Agenda Música, livros, filmes 65 Arte Marrakesh é a capital africana da cultura 66 Ao volante China lança o AIWAY U5, o carro eléctrico que já está no livro dos recordes
Macro
Covid-19 Vírus já foi confirmado em mais de 125 países e ameaça estabilidade da economia global
22 nação indústria de panificação 20 Do grão ao pão A E&M analisa a cadeia de produção e levanta todos os desafios e oportunidades do mercado 28 Na voz de... Gilberto Cossa, director-geral da MEREC
34 provÍncia Katembe A ponte acelerou a procura pelo outro lado da Baía de Maputo e fez disparar o preço da terra
40 mercado e FinanÇas Capital Humano Especialistas falam sobre o caminho para formar equipas de trabalho e alto rendimento
44 empresas Ximovissa A história de uma empresa que se inspirou no slogan “Se conduzir, não beba!”
46 Megafone Marketing O que está a acontecer no mundo das marcas em Moçambique e lá por fora www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
48 figura do mÊS First National Bank Melba Jorge fala da aposta do banco na inovação, com foco nos recursos humanos
50 sociedade Agricultura África assiste ao surgimento de agri-techs que ajudam a melhorar a produtividade
54 lÁ fora EUA A relevância de impor que os reguladores bancários publiquem os seus ratings secretos
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Editorial
Um olhar à indústria nacional de panificação
o
Celso Chambisso • Editor da Economia & Mercado pão é o item comum no cabaz de consumo da maior parte dos
moçambicanos. Dentro da indústria alimentar, que há oito anos representava 15% do Produto Interno Bruto (não há dados estatísticos actualizadas), o alimento tem, seguramente, um peso importante. Mas pouco se sabe sobre o que há por detrás da indústria panificadora. A informação dada a consumir ao público cinge-se, geralmente, na publicação esporádica das dificuldades que os empresários da área enfrentam, sempre que os custos de produção sobem, e no alvoroço que se assiste quando estes respondem ajustando o preço do pão. À lupa, o sector revela uma série de dados que permitem uma visão mais clara do que se passa, sendo um dos pontos mais preocupantes e, se calhar a origem de todas as fragilidades, a ausência de estatísticas sobre o mercado. Ou seja, não se sabe quantas pessoas a panificação emprega, para quanta gente produz, quanto dinheiro movimenta, tampouco quantas padarias o país tem. O presidente da Associação Moçambicana de Panificadores, a AMOPÃO, Víctor Miguel, reconhece tratar-se de um problema que dificulta a organização da actividade e assegura que já há movimentações no sentido de criar uma base de dados nos próximos tempos. Mas enquanto isso não acontece, o mercado do pão vai sendo feito de operadores com margens mínimas de receitas, muitos a abandonarem a actividade e muito poucos a aderirem, em meio a que chamam “concorrência desleal”. Todos estes factores tornam muito longa a distância para chegar aos patamares das indústrias de panificação mais evoluídas, que se distribuem pela Europa, América e Ásia. É importante observar que nem tudo vai mal. As dificuldades também vêm aguçando a consciência de competitividade, trazendo ao mercado panificadoras que apostam em equipamentos modernos para produzir com relativa qualidade e responder a nichos mais exigentes. Esta edição da E&M convida o caro leitor a conhecer mais a fundo a realidade da indústria moçambicana do pão — do grão à mesa.
MÊS ano • Nº 01 Março 2020 • Nº 23 propriedade Executive Mocambique EDITOR EXECUTIVO Celso Liquatis nienis doluptae velitChambisso et magnis JORNALISTAS Emídio Cristina enis necatin nam fuga. Massacola, Henet exceatem Freire, Elmano Madaíl, Rui Trindade seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant PAGINAÇÃO José Mundundo adis destiosse iusci re in prae voles FOTOGRAFIA Mariano sant laborendae nihilib Silva uscius sinusam REVISÃO Manuela Rodriguesdolorep dos Santos rehentius eos resti dolumqui Direcção Comercial Esteves reprem vendipid que ea etAna eumque non ana.esteves@media4development.com nonsent qui officiasi conselho CONSULTIVO lorem ipsum Executive Mocambique Alda Salomão, Narigão, Liquatis nienis Andreia doluptae velit et António magnis Souto, Bernardo Denise Branco, enis necatin namAparício, fuga. Henet exceatem Fabrícia de Almeida Henriques, Frederico seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant Silva, Iacumba Ali Aiuba, adis destiosse iusci re in João prae Gomes, voles Narciso Matos, Rogério Salim sant laborendae nihilib Samo usciusGudo, sinusam Cripton Valá rehentius eos resti dolumqui dolorep DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Cativelos reprem vendipid que ea et eumque non pedro.cativelos@media4development.com nonsent qui officiasi ADMINISTRAÇÃO, lorem ipsum LiquatisREDACÇÃO nienis doluptae E PUBLICIDADE Media4Development velit et magnis enis necatin nam fuga. Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311nis A— Henet exceatem seque cus, sum nam Sommerschield, – Moçambique; iu Qui te nullant Maputo adis destiosse iusci re in marketing@media4development.com prae voles sant laborendae nihilib uscius IMPRESSÃO E ACABAMENTO sinusam rehentius eos resti dolumqui Minerva - Maputo - Moçambique dolorep Print reprem vendipid que ea et Tiragem 4 500 exemplares eumque non nonsent qui officiasi Propriedade dO Registo lorem ipsum Liquatis nienis doluptae Executive Moçambique velit et magnis enis necatin nam fuga. Número de Registo Henet exceatem seque cus, sum nis nam 01/GABINFO-DEPC/2018 iu Qui te nullant adis destiosse iusci re in prae voles sant laborendae nihilib uscius sinusam rehentius eos resti dolumqui dolorep reprem vendipid que ea et eumque non nonsent qui officiasi lorem ipsum Liquatis nienis doluptae velit et magnis enis necatin nam fuga. Henet exceatem seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant adis destiosse iusci re in prae voles sant laborendae nihilib uscius sinusam rehentius eos resti dolumqui dolorep reprem vendipid que ea et eumque non nonsent qui officiasi
assinatura digitalizada
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www.economiaemercado.co.mz | Abril 2019
observação Wuhan, China, Março de 2020
Da China para o Mundo
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m novo Coronavírus chinês, da família da SARS, infectou dezenas de milhares desde o início do surto em Wuhan, na China, em Dezembro passado. O cientista Leo Poon, virologista da Escola de Saúde Pública da Universidade de Hong Kong, que primeiro descodificou a estirpe, acredita que teve origem num animal e se espalhou para os seres humanos. “O que sabemos é que causa pneumonia e, em seguida, não responde ao tratamento com antibióticos, o que não é surpreendente”, disse Poon. De então para cá, a epidemia tem provocado uma infindável cadeia de efeitos económicos, através das medidas adoptadas por autoridades e empresas para evitar maior disseminação como, por exemplo, restrições de viagens ou encerramento de fábricas. Por todo o mundo, grandes eventos foram cancelados e as bolsas caíram como há muito não se via. No entanto, nem tudo é mau. Para o ministro da Economia da França, Bruno Le Maire, a epidemia é “uma oportunidade de mudança para a globalização, tendo em vista a vulnerabilidade das cadeias de fornecimento interligadas internacionalmente, um acontecimento que questiona como nunca as práticas do mundo actual”, disse. fotografia D.R.
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www.economiaemercado.co.mz | Janeiro 2019
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RADAR Investimento externo cai para níveis de 2010
ECONOMIA FMI. O Fundo Monetário Internacional vai enviar a Moçambique uma equipa para discutir com as autoridades locais a retoma do programa de assistência, revelou o porta-voz da instituição, Gerry Rice, confirmando que a instituição recebeu um “pedido formal” de Maputo para um programa de assistência. A equipa de peritos deve chegar já na segunda metade de Março corrente, marcando o fim de quase quatro anos de suspensão do apoio, na sequência da descoberta das dívidas que não tinham sido reveladas.
Inflação. O Banco Central prevê um aumento do nível geral de preços nos próximos meses. Na sua mais recente análise sobre os principais indicadores macroeconómicos, a instituição explicou que esta previsão é fundamentada pela aceleração da inflação na ordem de 3,48% no início do ano, que decorre, principalmente, “do impacto dos choques climáticos sobre a dinâmica futura dos preços, conjugado com as perspectivas de depreciação do metical no curto prazo e a tendência para
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O Investimento Directo Estrangeiro caiu, em 2019, para o valor mais baixo desde 2010 com um total de 1 991 milhões de dólares, segundo dados recentemente publicados pelo Banco de Moçambique. Um valor muito abaixo dos cerca de 7 mil milhões de dólares dos anos 2014 e 2015, quando o país se situou entre os dois principais receptores de Investimento Directo Estrangeiro em África, depois da Nigéria e da África do Sul. Mais de metade do IDE registado no ano passado foi efectuado pela
mineradora Vale Moçambique, que explora carvão em Tete, no valor de 979,8 milhões de dólares, sendo que, no seu conjunto, os grandes projectos responderam por 1,1 mil milhões de dólares. O segundo sector que mais recebeu Investimento Directo Estrangeiro foi o dos Transporte, Armazenagem e Comunicações com 365 milhões de dólares, seguido pelas Indústrias Transformadoras (alimentares, bebidas, tabaco, têxteis, outras) que receberam investimentos na ordem de 152 milhões de dólares.
o aumento dos preços dos alimentos no mercado internacional”. O Banco Central também alertou para os riscos de aumento do stock da dívida pública já que o Estado voltou a recorrer aos Bilhetes do Tesouro para se financiar no valor de 5 mil milhões de meticais e a uma emissão líquida de 498 milhões de meticais em Obrigações do Tesouro, fazendo com que a dívida aumentasse em cerca de 5,4 mil milhões de meticais para 145,5 mil milhões de meticais entre Dezembro de 2019 e Fevereiro deste ano.
produção e escoamento de alguns produtos de exportação como o carvão mineral, rubis e areias pesadas. Já as importações aumentaram 10% para 6,7 mil milhões de dólares, levando à deterioração do saldo da balança comercial em cerca de 2 mil milhões de dólares.
Perspectivas. A consultora Fitch Solutions prevê que a economia de Moçambique quase duplique, este ano, o crescimento de 2019, registando agora uma expansão de 4,3%, o que compara com os 2,2% do ano passado. No comentário, enviado aos clientes, citado pela Lusa, os analistas escrevem que “no ano passado, os ciclones Idai e Kenneth, acrescidos de fortes chuvas, prejudicaram a produção agrícola e os rendimentos de 71,3% da força de trabalho, limitando o consumo privado e causaram perturbações à produção e exportação mineiras”. Ainda assim, acrescentam, “a expectativa é que o impacto dos ciclones seja temporário, com a actividade económica a recuperar nos próximos trimestres”. Comércio externo. As exportações de Moçambique caíram 9% no ano passado, e situaram-se nos 4,7 mil milhões de dólares, devido ao efeito combinado da queda dos preços internacionais de mercadorias e do impacto negativo dos ciclones Idai e Kenneth sobre a
Transporte aéreo. A empresa Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) reprogramou para 02 Junho próximo, a retoma dos voos para Lisboa. O plano inicial previa o regresso ao espaço aéreo europeu a 31 de Março. Segundo o director-geral da LAM, João Carlos Pó Jorge, o adiamento deve-se a negociações de espaço no Aeroporto de Lisboa. Petromoc. A empresa Petróleos de Moçambique (Petromoc) prevê sair da crise financeira em 2021, uma vez que os resultados operacionais começam a melhorar já no exercício de 2020, refere o Instituto de Gestão de Participações do Estado (IGEPE). Segundo a instituição, foi concluída com sucesso a reestruturação do passivo da empresa junto da banca, o que abre boas perspectivas para um futuro próximo. O presidente da www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
Petromoc, Hélder Chambisse, revelou que foram tomadas diversas medidas de reestruturação interna da empresa, que vão desde a redução de custos, aumento das vendas e angariação de novos clientes, tudo para melhorar o desempenho da petrolífera estatal. Industrialização. A nova direcção da Associação Industrial de Moçambique (AIMO) promete impulsionar o diálogo entre os mais de 300 membros da agremiação para revitalizar a indústria nacional que conheceu declínio contínuo de 2008 a 2017, com a contribuição no PIB a cair de 11,8% para 8,7% nesse período. Eleitos em Dezembro de 2019 (e presididos pelo empresário Rogério Samo Gudo), os novos órgãos sociais da AIMO assumem o desafio de aumentar exportações e promover a indústria moderna através da formação profissional, entre outros aspectos.
maiores economias do continente, enfrenta um défice que Moçambique pode ajudar a suprir, com a concretização dos vários projectos de produção de energia que tem na forja. Empreendedorismo. O projecto Super Mentores - um programa de desenvolvimento do empreendedorismo concebido pela empresa de publicidade, comunicação e marketing CDBRAND, em parceria com o Instituto para Promoção das Pequenas e Médias Empresas (IPEME) - voltou a assegurar o seu apoio aos empreendedores, ao anunciar, em princípios de Março corrente, a sua segunda edição. O Banco Comercial e de Investimentos (BCI), principal patrocinador do Super Mentores, avança que “as empresas locais precisam estar à altura de explorar as oportunidades decorrentes dos grandes projectos, pelo que os empreendedores devem ganhar consciência da importância da sua certificação”, revelou Heisler David, porta-voz daquela instituição.
EXTRACTIVAS
Electricidade. Foi lançado no princípio do presente mês o concurso internacional para a construção de três subestações em Marracuene, Chibuto e Vilanculos no quadro do projecto da linha de transporte de energia Temane-Maputo e a respectiva central eléctrica movida a gás. Com o financiamento na ordem de 1,2 mil milhões de dólares já assegurado, a estatal Electricidade de Moçambique e a petroquímica sul-africana Sasol preparam-se para iniciar com as respectivas obras no princípio de 2020. Trata-se de um projecto que se enquadra na estratégia do acesso universal à energia até 2030. Energia. Os governos de Moçambique e da África do Sul vão estudar formas de dinamizar a cooperação no sector energético para superar o défice de energia na África Austral. De acordo com o director-nacional de Energia de Moçambique, Pascoal Bacela, a África do Sul, uma das www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
Certificação. A multinacional francesa Total está a apoiar a certificação de qualidade de produtos e serviços com padrões internacionais a 40 empresas moçambicanas, 20 das quais da província de Cabo Delgado, para garantir a sua participação no negócio do petróleo e gás na bacia do Rovuma. A informação foi avançada pelo director-geral da Total Moçambique, Ronan Bescond, durante a inauguração do centro de orientação do empresário na cidade de Pemba, que custou à Total cerca de 200 mil dólares. Carvão. A empresa indiana JSPL Mozambique pretende aumentar a produção de carvão dos actuais 3 milhões para 4,5 milhões de toneladas a
partir deste ano, disse o director-geral da empresa, que opera na localidade de Chirodzi, província de Tete. De acordo com Rajendra Tiwari, os trabalhos de alargamento da unidade de processamento de carvão, em curso desde o primeiro semestre de 2019, estão na fase final, prevendo-se que sejam concluídos neste mês (Março). A operar desde meados de 2013, a JSPL conseguiu, em 2019, produzir cerca de 2,4 milhões de toneladas de carvão que foram todas comercializadas no mercado asiático.
TECNOLOGIA
Automóveis. O grupo alemão Volkswagen, um dos maiores fabricantes de automóveis do mundo, lançou, em Fevereiro passado, o seu novo modelo no mercado moçambicano, o TIGUAN ALLspace, de sete lugares. Em comunicado, a agência Caetano Equipamentos S.A. indica que o carro foi desenhado com novas ferramentas de condução e novos equipamentos que oferecem maior comodidade e segurança na condução. Bancarização. O mapeamento dos pontos de acesso às instituições financeiras em Moçambique passou, recentemente, a ser digital para flexibilizar acções de expansão dos serviços financeiros em zonas de maior défice, sobretudo no meio rural. Este avanço é parte do esforço de luta contra a exclusão financeira que continua alta (cerca de 68,3% da população adulta não tinha conta bancária em 2018, de acordo com estatísticas publicadas pelo Banco de Moçambique), não obstante o rápido recuo face à expansão das Fintech. O sistema de Informação Geográfica dos pontos de acesso aos serviços financeiros foi oficialmente lançado a 28 de Fevereiro do ano corrente pelo Banco de Moçambique e pelo Ministério dos Transportes e Comunicações.
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OPINIÃO
Inovação no Pretérito Perfeito Frederico Silva • Fundador da UX
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ssd (dados de serviços suplementares não estruturados) é o jargão que representa a tecnologia arcaica que usamos nos nossos celulares sempre que discamos *XYZ#. Pode dizer-se que o USSD é uma alternativa às mensagens de texto (SMS) que tem como base menus. É uma tecnologia que possibilita a troca de dados em tempo real sob o formato de sessões, o que a torna numa solução mais ágil e com uma multiplicidade de usos. É verdade que, aparentemente, se trata de algo completamente ultrapassado, quando o que parece estar na moda é ter um iPhone11 ou um Samsung S10. No entanto, os smartphones, mesmo que de gamas mais baixas, estão longe de se tornar o standard no continente africano. Embora a taxa de penetração de smartphones tenha apresentado um crescimento considerável nos últimos anos, como consequência da queda do custo destes aparelhos, esta métrica não transmite uma noção real. A África Subsaariana mantém uma percentagem de utilização de internet via celular de 23%. Tendo em consideração o segmento populacional de baixo rendimento, os custos de dados são proibitivos, e o número de pessoas capaz de usar as potencialidades dos smartphones é ainda reduzido. Relativamente ao USSD, o que torna as aplicações nesta tecnologia do século passado em soluções com um potencial gigante é o facto de serem compatíveis com todo o tipo de celulares (GSM), serem de uso corrente de todos os utilizadores, independentemente do seu estrato social, e serem relativamente simples de se desenvolver. Embora o USSD seja usado na maioria das vezes para a consulta de saldo ou outros serviços das operadoras móveis, tem-se constatado que a sua relevância no contexto do continente africano tem vindo a evidenciar-se cada vez mais pela diversidade de serviços que apresenta. Em 2007, no Quénia, surgiu o primeiro serviço de carteira móvel, o M-Pesa, que gera, actualmente, cerca de 2 mil
milhões de transacções e processa mais de 29 mil milhões de euros por ano, mais do dobro que o PIB deste país. Após a expansão do M-Pesa para outros países africanos, a popularização deste serviço e o crescimento exponencial dos valores transaccionados fizeram com que a banca rapidamente se tornasse num dos maiores clientes da tecnologia USSD. As aplicações permitem ver extractos, consultar saldos e até mesmo fazer transferências. Além do contributo para a inclusão financeira, as aplicações em USSD evidenciaram-se noutras áreas de âmbito social. Novamente no Quénia, em 2010, a MFarm foi lançada para solucionar um problema comum dos pequenos produtores agrícolas, permitindo-lhes agrupar a sua colheita num local específico, para poderem vendê-la a compradores por atacado. Em Moçambique, o USSD foi usado pelo aplicativo biscate. co.mz para fazer a ponte entre trabalhadores de baixa renda (ex: carpinteiros, serralheiros, canalizadores, etc.) e clientes de classe média e média-alta, com o objectivo de contribuir para a criação de emprego. Outras utilizações de destaque desta tecnologia incluem educação, saúde e engajamento do cidadão. Apesar do seu potencial, teria de haver uma mudança brusca no paradigma actual para que a inovação em USSD assumisse o protagonismo na resolução de problemas nas mais diversas áreas. As operadoras móveis ainda operam numa lógica de 80/20, na medida em que o custo de acesso só é acessível para 20% das empresas que lhes atribuem 80% dos lucros, factor que inibe a maioria das startups de fazer uso desta tecnologia. As operadoras devem redefinir os seus modelos de negócio e os reguladores devem tornar o processo de obtenção de shortcodes mais simples para startups, e certamente que o USSD irá revolucionar o acesso à informação para as massas e tornar-se no verdadeiro impulsionador da indústria de serviços móveis do continente africano.
Apesar do seu potencial, teria de haver uma mudança brusca no paradigma actual para que a inovação em USSD assumisse o protagonismo na resolução de problemas nas mais diversas áreas
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www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
Virtual ou não, o Corona tem efeitos bem reais na economia Como uma epidemia com muito de viralidade mediática pode afectar um conjunto de cadeias globais de distribuição e mercados de capitais elevando as preocupações sobre desaceleração da economia na China e, claro, no Mundo
O
avanço da epidemia do novo coronavírus pelo Mundo tem provocado sérios abalos nos mercados globais e tem elevado as preocupações de investidores e Governos sobre o real impacto da propagação do vírus nas cadeias globais de suprimentos, nos lucros das empresas e na desaceleração do crescimento da economia global. Embora o maior número de casos confirmados e os principais impactos ainda estejam concentrados na China e na Itália, o vírus já se espalhou por
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mais de 125 países de todos os quatro cantos do globo, provocando o encerramento de fábricas, a interrupção de produção, o estrangulamento do comércio e serviços, a suspensão de aulas, além de cancelamentos de grandes eventos. Primeiras consequências
O surto tem provocado um grande abalo na economia chinesa, pois tem sido responsável pelo encerramento de fábricas e centros comerciais, colocado regiões inteiras em quarentena e deixado muitos cidadãos trancados em casa por
medo do contágio, reduzindo dessa forma o consumo e a actividade económica. Mesmo em regiões que não estão em quarentena, eventuais suspeitas de contaminação têm levado ao encerramento total de algumas indústrias até que se descarte um novo caso. Até mesmo a produção de mel foi afectada na China, a maior produtora mundial, uma vez que as restrições de viagens adoptadas para conter o surto prendem apicultores em casa e deixarão as suas abelhas sem alimento durante semanas. Fora da China, os países mais impactados até ao momento são a Coreia do Sul, www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
macro escolas e universidades até 15 de Março para tentar conter o vírus e determinou que todos os principais eventos desportivos do país, incluindo os jogos de futebol da Serie A italiana, fossem disputados sem a presença de público, no Japão, todas as escolas de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio foram orientadas a ficar fechadas até o fim das férias da Primavera em Abril para ajudar a conter o surto. E a ministra da Olimpíada (de 2020) disse, pela primeira vez, que há a possibilidade de adiamento dos Jogos. Na Suíça, a organização do Salão de Genebra 2020 cancelou o evento que aconteceria entre os dias 5 e 15 de Março. E em França, uma meia maratona com mais de 40 mil participantes, foi cancelada em Paris, e o salão anual internacional de agricultura também acabou um dia antes do previsto. Até no quente Médio Oriente, na Arábia Saudita, foram suspensas as peregrinações a Meca também para cidadãos sauditas (além da suspensão já assumida para estrangeiros). Desaceleração da economia global e da China
Itália, Irão e Japão, com encerramentos de lojas, interrupção de serviços de transportes e paralisação de inúmeras actividades. Mas há mais: viagens aéreas internacionais, eventos e espectáculos têm sido cancelados um pouco por toda a parte onde o Corona é a notícia de abertura dos jornais e das redes sociais. E nem o mais famoso agente secreto do mundo escapa, com a estreia mundial de “Sem tempo para morrer”, novo filme do James Bond, a ter sido adiada devido à histeria colectiva que assolou o globo. Se em Itália, o Governo decidiu encerrar www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
2,4%
É a nova previsão de crescimento da economia global revista em baixa em 0,5 pontos percentuais pela ocde devido ao novo coronavírus
Embora ainda seja difícil estimar a magnitude do choque na economia, já é praticamente consensual que a economia global e o PIB da China deverão crescer menos que o esperado em 2020. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) reduziu a previsão de crescimento da economia mundial para 2020, passando a projectar um crescimento de 2,4%, a menor taxa desde 2009, e uma quebra de 0,5 pontos percentuais face à perspectiva anterior de 2,9%, citando o coronavírus e as contracções na produção chinesa como principais incitadores dessa diferença negativa. A projecção da OCDE para a China, a segunda maior economia do mundo, com uma participação no PIB global na ordem de 16%, é de uma taxa de crescimento de 4,9% em 2020, 0,8 pontos percentuais a menos do que as estimativas de Novembro passado. Embora já em 2019, o PIB chinês ter desacelerado para 6,1%, o menor crescimento em 29 anos. Cadeias globalmente integradas
O impacto do coronavírus na produção manufactureira chinesa traz um mar de consequências para os principais parceiros comerciais chineses e pa-
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Macro
bares e restaurantes no país. Já para não falar do impacto directo na venda de uma das marcas do seu portefólio, a Corona, que já anunciou uma redução de vendas na ordem dos 250 milhões de dólares. Bolsas desabam pelo mundo
Máscaras tornaram-se artigos indispensáveis para a prevenção e o preço chegou a disparar face a uma maior procura
ra as cadeias globais de suprimentos, incluindo electrónicos, e até medicamentos. As exportações chinesas de bens intermediários no segmento tecnológico respondem por mais de 10% da produção global desses produtos. Segundo um relatório da Trendforce, empresa chinesa de análise de canais de distribuição, a produção de smartphones no primeiro trimestre de 2020 pode cair 12% se comparada com o período homólogo de 2019. Confirmada essa previsão, seria a pior produção para o primeiro trimestre em cinco anos. E outros dispositivos, como monitores, TV’s e notebooks também devem ter redução de milhões de unidades na produção, de acordo com a consultora. A Organização Mundial da Saúde (OMS) fez um alerta sobre o “esgotamento rápido” dos stocks de equipamentos de protecção. E o seu director, Tedros Adhanom Ghebreyesus, pediu para aumentar a sua produção em 40%. Na China, o Governo converteu fábricas de cobertores, fraldas e até telemóveis em unidades de produção de máscaras ou macacões de protecção. “Quando as pessoas reagem porque não viajam, não vão a restaurantes ou não fazem compras, isso terá um impacto imediato na economia. Depende de quanto tempo dura e quão amplo é o contágio”, acrescentou.
Empresas projectam quebra dos lucros
Entre os investidores, crescem as apostas de mais medidas de estímulos por parte dos Governos. A 3 de Março, o Federal Reserve (FED), banco central dos Estados Unidos, anunciou um corte extraordinário de 0,5 pontos percentuais nas taxas de juros da maior economia do mundo. A decisão foi tomada fora do calendário regular, algo que não acontecia desde o crash do mercado financeiro de 2008. Dezenas de multinacionais passaram a alertar os seus accionistas para o facto de o surto afectar as suas finanças, não deixando incólumes grandes empresas como a Apple, a Microsoft, a AB InBev, a United Airlines, a IAG, a Mastercard, a Toyota, a Danone e a Diageo. A Apple já anunciou que a crise global causada pelo vírus não permitirá que a empresa alcance as metas de facturação traçadas para o primeiro trimestre e que “a oferta global de iPhones será temporariamente restrita”. A AB InBev estima uma queda de 10% no lucro do 1° trimestre como impacto do coronavírus e disse que a doença reduziu em 2,3% a sua receita na China nos primeiros dois meses deste ano em razão do encerramento de
Por conta de fluxos elevados de capitais para mercados de menor risco, o dólar tem seguido um caminho de valorização, acompanhado pelo euro que sofre do mesmo fenómeno
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O avanço da epidemia causou impacto também nos mercados e ameaçou derrubar as principais bolsas do mundo. Na Europa, o maior tombo aconteceu com o índice MIB, de Milão, com uma queda histórica de 5,43%. Aqui, a maior baixa foi a da Juventus, a equipa de Turim (e de Cristiano Ronaldo) com sede no Piemonte, uma das regiões afectadas, tendo cancelado alguns jogos. Caiu 11%. O impacto no sector do luxo reflectiu-se na queda de 8,9% da empresa de moda Salvatore Ferragamo. Depois de o Governo de Itália ter decretado o encerramento de colégios, escolas e universidades em várias regiões do norte do país, a entrada nas regiões do Vêneto e da Lombardia foi restrita, 50 000 pessoas de 11 municípios foram isoladas e quatro partidas do futebol da Série A foram canceladas para conter a propagação do vírus. Até 11 de Março, 827 pessoas tinham morrido no país por causa do Covid-19. No resto da Europa, a Bolsa de Londres caiu 3,3%, o CAC de Paris perdeu 3,94% e o Dax alemão 4,01%. Ainda no continente europeu, os valores mais afectados foram os relacionados com o turismo, o luxo e os produtos básicos. E o tombo foi tão grande que, em conjunto com os mercados dos EUA, as bolsas registaram, na última semana de Fevereiro, a pior desde a crise financeira de 2008, com perdas estimadas em 5 biliões de dólares. Por fim, um outro impacto: o cambial que se sente, também por cá. Por conta de fluxos elevados de capitais para mercados de menor risco, o dólar tem seguido um caminho de valorização (acompanhado pelo euro que sofre do mesmo fenómeno), especialmente visível comparando com outras moedas, em especial currencies de países emergentes, como o metical. Em Moçambique, um dólar custava, nos primeiros dias de Março, e de acordo com o Banco de Moçambique, 64,9 meticais, enquanto no início do ano se situava nos 60 meticais. Uma subida, portanto, de 8,3% em pouco mais de dois meses. texto Javier Salvatierra fotografia D.R.
www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
Números em conta Economias emergentes vão dominar o mundo em 2030 os mercados emergentes de hoje serão as potências de ‘amanhã’. A constatação é mais ou menos óbvia, mas vem consubstanciada em ordem de grandeza pelo Standard Chartered, um banco multinacional com sede em Londres. Assim, economias em desenvolvimento como a Indonésia, Turquia, Brasil e Egipto sobem a escada até ao topo e, em 2030, sete das dez maiores potências do mundo em termos de PIB estarão localizadas precisamente em mercados emergentes. Possivelmente a maior surpresa da lista é o Egipto, um país que a Standard Chartered vê a crescer num ritmo ‘tórrido’ nesse período. Além do Egipto, é provável que a ascensão dos mercados emergentes continue a ser um tema em projecções futuras de outros bancos e organizações internacionais. Na próxima década, a Índia irá tornar-se a segunda maior economia em termos de riqueza absoluta e, até lá, tornar-se-á também no país mais populoso do mundo, ultrapassando a China em 2026, de acordo com as previsões. Estando a divisão entre economias emergentes e desenvolvidas a diminuir a uma taxa mais rápida do que nunca, tal deve ser visto como “uma oportunidade interessante para todos os investidores que adoptem uma visão de longo prazo”.
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China O crescimento da China será moderado e andará na casa dos 5% ao ano ao longo da próxima década. Ainda assim, suficiente para liderar.
www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
População é riqueza?
Egipto
Se em 2017 o PIB do Egipto era de 1,2 biliões de dólares, em 2030 deverá chegar aos 8,2 ‘bis’. Um crescimento de 583% baseado nas previsões de crescimento do FMI de próximo dos 8% em média anual.
A percentagem de riqueza dos países irá, na próxima década, convergir com a sua percentagem na população mundial, ou seja, os países que mais vão crescer serão os com maior taxa de crescimento da população, como a Índia, Brasil, Indonésia ou Egipto, a única economia africana desta lista.
FONTE FMI, Standar Chartered – Projecções 2030
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OPINIÃO
O reverse charge à luz do código do imposto sobre o valor acrescentado
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Fabrícia de Almeida Henriques, Managing Partner & Henrique Calvão Martins • HRA Advogados omo sabemos, o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) incide sobre a transmissão de bens e sobre a prestação de serviços efectuados no território nacional, a título oneroso, incluindo a importação de bens por sujeito passivo agindo nessa qualidade, ou seja, em regra, pessoas singulares ou colectivas que, de forma independente e de modo habitual, exercem uma actividade económica (produção, comércio, ou prestação de serviços, actividades extractivas, agrícolas, silvícolas, pecuárias e de pesca). Tratando-se, como é o caso, de um imposto indirecto (i.e., incide sobre a manifestação de riqueza ou de rendimento), plurifásico (atingindo, tendencialmente, todo o acto de consumo nas diversas fases do circuito económico, desde a produção, passando pela distribuição e comercialização), actua através do método subtractivo indirecto. Materializa-se, em regra, na obrigação de proceder à liquidação, a montante, do IVA, pelos agentes económicos fornecedores de bens ou prestadores de serviços (operações activas) e, a jusante, no direito à dedução do valor do IVA, por aqueles suportado, na aquisição dos bens e serviços necessários à prossecução da sua actividade (operações passivas). O IVA é, por conseguinte, repercutido ao consumidor final, a quem incumbe efectuar o pagamento do respectivo valor, aquando do consumo (final) do bem ou serviço e/ou no acto de importação. Em regra, a liquidação do imposto é devida pelo transmitente dos bens ou pelo prestador dos serviços, quando os mesmos são postos à disposição do adquirente ou no momento da sua realização, ou quando seja total ou parcialmente cobrado ou debitado o preço, no caso da transmissão de bens e prestação de serviços, respectivamente. Quanto à importação de bens, é devido e torna-se exigível, em regra, aquando do desembaraço aduaneiro, cabendo ao importador efectuar o seu pagamento. Ora, o reverse charge ou a inversão do sujeito passivo traduz uma alteração ao sobredito mecanismo de liquidação
do imposto. Com efeito, nestes casos, incumbe ao adquirente do bem ou serviço proceder à sua liquidação e pagamento. Trata-se de um regime jurídico que, a traço grosso, tem como escopo, por um lado, prevenir a fraude e a evasão fiscal, já que uma das formas de evasão mais recorrente consiste na emissão de factura com a liquidação do imposto pelo transmitente, sujeito passivo de IVA, que muitas vezes não entrega o valor do imposto ao fisco (nalguns casos, desaparecendo), ficando o adquirente, igualmente sujeito passivo de IVA, com o direito de deduzir o valor do imposto liquidado. É inquestionável o prejuízo que, para o Estado, decorre desta prática. Por outro lado, a autoliquidação do IVA é ainda justificada por razões de praticabilidade e desburocratização na liquidação do tributo, porquanto permite ao erário público a cobrança do imposto em operações económicas que, por outra via, ficariam subtraídas à respectiva tributação, contribuindo, por isso, em última instância, para o aumento da receita fiscal. Entre nós, o Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado (CIVA) faz referência à inversão do sujeito passivo, nomeadamente nos artigos 2.º, n.º 2; 6.º, n.º 7; e 26.º, n.º 3, no tocante às prestações de serviços, quando o respectivo prestador não tenha sede ou estabelecimento estável ou domicílio em território nacional, a partir do qual aqueles sejam prestados, e sempre que o adquirente seja um sujeito passivo do imposto, com sede ou estabelecimento estável ou domicílio em Moçambique, ainda que pratique exclusivamente operações isentas e sem direito à dedução do imposto. Com efeito, nos termos do artigo 6.º nº 7 do CIVA, os serviços sujeitos ao regime de liquidação de IVA pelos seus adquirentes são os seguintes: cessão ou autorização para utilização de direitos de autor, licenças, marcas de fabrico e de comércio e direitos análogos; publicidade; telecomunicações; os prestados por consultores, engenheiros, advogados, economistas, contabilistas e gabinetes de estudo; tratamento de dados e fornecimento de informações;
Em termos sancionatórios, o incumprimento da obrigação de liquidação do imposto por sujeitos passivos de IVA consubstancia a prática de transgressão fiscal
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A Autoridade Tributária de Moçambique é a entidade responsável por fiscalizar o cumprimento das obrigações fiscais
operações bancárias, financeiras, de seguro e resseguro; colocação de pessoal à disposição; os prestados por intermediários que intervenham em nome e por conta de outrem no fornecimento das prestações de serviços enumerados no invocado preceito; locação de bens móveis corpóreos (incluindo a sua locação financeira) e, em geral, os efectuados por via electrónica (v.g., fornecimento de sítios informáticos; domiciliação de páginas web; manutenção à distância de programas e equipamentos; fornecimento de programas e respectiva actualização; fornecimento de base de dados; fornecimento de música, filmes e jogos, incluindo os de fortuna e azar e a dinheiro; ensino à distância e, em geral, os análogos aos serviços efectuados por via electrónica). Ademais, nas situações em que sejam realizadas operações em Moçambique (i.e., transmissão de bens ou prestação de serviços), por sujeitos passivos do imposto, não residentes, não tendo estes designado, talqualmente é devido, representante residente em Moçambique para cumprimento das obrigações em sede de IVA (v.g., liquidação e pagamento do imposto), serão, também neste caso, os respectivos adquirentes, contanto que sujeitos passivos do imposto, a cumprirem com as obrigações fiscais (de acordo com a clarificação e uniformização do tratamento fiscal constante da Circular nº 16/GAB-DGI/2019, da Autoridade Tributária de Moçambique). Damos nota de que, no âmbito do reverse charge, os sujeitos passivos têm o direito a deduzir o valor do IVA pago enquanto adquirentes dos aludidos bens ou serviços, ao IVA que liquidaram nas suas operações activas. Para tanto, deverão proceder à apresentação, junto da administração fiscal, da declaração periódica, bem como à entrega do quantum correspondente ao imposto que liquidaram (se for o caso), através dos meios legalmente permitidos para o pagamento do imposto. Caso os referidos sujeitos passivos (adquirentes dos bens ou serviços) pratiquem apenas operações isentas que não conferem direito à dedução, só ficarão obrigados à entrega da sobredita declaração nos meses em que se tenham www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
verificado as liquidações decorrentes do mecanismo da inversão do sujeito passivo. Em termos sancionatórios, o incumprimento da obrigação de liquidação do imposto, por sujeitos passivos de IVA, enquanto adquirentes de bens ou serviços, consubstancia a prática de transgressão fiscal, na veste de infracção tributária formal, prevista e punida nos termos do artigo 24.º, n.º 4, alínea a), do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pelo Decreto n.º 46/2002, de 26 de Dezembro, sendo punível com multa. Fazendo uma incursão, en passant, pelo direito comparado, designadamente o português, verifica-se que o reverse charge tem um quadro de aplicação mais alargado. Com efeito, neste ordenamento (ver, entre outros, os artigos 2.º, alíneas e), g), h), i, j) e l), todos do CIVA de Portugal), além de estarem consignadas as operações positivadas pelo legislador moçambicano, estão, outrossim, sujeitas àquele regime, em regra, os serviços de construção civil prestados no âmbito de contrato de empreitada ou subempreitada (incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis), os serviços que tenham por objecto direitos de emissão, reduções certificadas de emissões ou unidades de redução de emissões de gases com efeito de estufa, bem como a aquisição de (alguns) bens ou serviços tocantes ao sector de desperdícios, resíduos e sucatas recicláveis. Em suma, o regime jurídico do reverse charge não só constitui um importante mecanismo no combate à fraude e evasão fiscal, como também permite ao Estado aumentar a receita fiscal decorrente da cobrança do imposto, mercê do alargamento do seu espectro de incidência. Sob o enfoque financeiro, a operação poder-se-á revelar neutra, caso o sujeito passivo (in casu, adquirente dos bens ou serviços) tenha direito à dedução do imposto liquidado, podendo fazê-lo no mesmo período tributário. Pese embora os méritos desta solução, será conveniente não perder de vista que tal figura representa uma distorção ao mecanismo regra da liquidação e pagamento do IVA, pelo que, não obstante os seus aspectos positivos, não deverá passar a constituir a regra.
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Nação
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Indústria do pão
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Mata a fome de todos, mas sujeita a indústria à fome Em mesas fartas ou nas mais humildes, o pão tem sempre um lugar privilegiado. Às vezes em todas as refeições… dia após dia. Mas nem um mercado com uma demanda tão incessante tem sido capaz de transformar a panificação num segmento forte e consistente a nível nacional, prevalecendo as barreiras próprias de uma indústria ainda demasiado dependente de factores externos. A começar pelo trigo que Moçambique não produz em quantidade suficiente, passando por tudo o resto que ainda falta na cadeia de valor do pão
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levada dependência de importação de matéria-prima, altos custos de produção, baixa margem de facturação, investidores permanentemente endividados e parte deles a abandonarem a actividade. É, em suma, este, o retrato da pequena indústria nacional de panificação, segundo o presidente da Associação Moçambicana de Panificadores (AMOPÃO), Victor Miguel. “Só com o aumento do poder de compra é que a indústria encontrará o caminho do crescimento”, conclui Víctor Miguel. Afinal, o que está por detrás desta conclusão? O que se passa, afinal, nos bastidores desta indústria da qual pouco se fala? Antes de irmos à indústria, um pouco de história sobre a História do pão. Começou a ser produzido há aproximadamente seis mil anos, na região da Mesopotâmia, onde hoje está situado o Iraque, tendo sido difundido por várias civilizações da antiguidade. Esse era um pão diferente do de hoje, resultado de uma mistura seca, dura e acre produzida à base de farinha de trigo. A sua origem e evolução está intimamente ligada ao processo de sedentarização, quando se iniciou o desenvolvimento da agricultura, sendo o trigo um dos cereais resultantes dessa actividade produtiva. Só com o processo de fermentação, uma técnica desenvolvida pelos egípcios há 6 000 anos, o pão ganhou um aspecto
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próximo do que conhecemos hoje em dia. Por ser um produto alimentar basilar, foi usado durante séculos também como moeda de troca e há até indícios de que os faraós o utilizavam como forma de pagamento. Talvez por ser o alimento do povo, o pão sempre teve uma importância social que nenhum outro alimento tenha alguma vez tido em toda a História. E já originou discórdias, guerras e até revoluções sociais. Em França, foi um dos rastilhos da Revolução Francesa, quando o povo se revoltou em protesto com a quebra na produção que gerou o aumento dos preços, levando à queda do rei Luís XVI. Para termos um exemplo mais próximo, quem não recorda os tumultos de há uns anos quando aumentaram os preços? A desorganização
Voltando ao presente: a primeira grande preocupação é a ausência de estudos sobre o mercado que facilitem a identificação e quantificação das oportunidades e obstáculos para tornar a indústria mais organizada e competitiva. Nem dados estatísticos existem. Por exemplo, é muito provável que haja milhares de padarias espalhadas pelo país (ninguém sabe ao certo quantas são), mas só 377 fazem parte da AMOPÃO, entidade que defende os interesses empresariais da área. A maior parte do que é feito fora desta
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Nação
A AMOPÃO garante estar a preparar uma pesquisa de fundo sobre o sector (investimentos, procura, consumo, preços, volume de negócios, etc.) para impulsionar o seu crescimento esfera - e que é a esmagadora maioria - é desconhecido. Não se sabe quantas pessoas trabalham na área nem quanto vale a indústria do pão. Sabe-se apenas que representa um “grande pedaço” dentro da indústria alimentar, podendo “superar o mercado das bebidas”, segundo as estimativas do presidente da AMOPÃO, cuja avaliação é baseada no amplo mercado de consumo. É uma indústria em que a prioridade, grosso modo, é produzir o pão na sua concepção mais simples: água, sal, farinha de trigo e fermento e, mais recentemente, o pão na base da mandioca. Sem grande inovação. Uma realidade que contrasta com a que se observa nos dias que correm, em países desenvolvidos, onde a indústria factura milhares de milhões de dólares e está focada na inovação como forma de gerar receita, empregos e melhor qualidade. É verdade que, nos últimos anos, como resultado da crescente concorrência, assiste-se a um “tímido aumento de empresários atentos e interessados em novos modelos e nichos de negócio, sobretudo os que alimentam o ramo da restauração, com produtos mais sofisticados”, segundo Víctor Miguel. Mas este mercado ainda é bastante pequeno e pertence ao segmento composto por famílias com maior poder de compra e, obviamente, padrões de consumo relativamente mais elevados, que são, de longe, a minoria. A magra margem de lucros das panificadoras não é um dado
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Indústria do pão
novo. Tem sido manchete dos jornais sempre que os operadores são sufocados pela subida dos custos de produção. A E&M ouviu o gestor da padaria Costa Tembe (nome herdado do respectivo fundador), no bairro da Maxaquene, arredores de Maputo. Com cerca de 70 funcionários, Costa Tembe só consegue pagar salários e manter a sua actividade porque a sua produção cobre um mercado com grande número de consumidores nos populosos bairros de Maxaquene e Polana Caniço. Ainda assim, estima que o ideal seria vender o pão pelo dobro do preço (20 meticais por unidade), para cobrir os custos que crescem todos os anos (salários, energia, água e farinha de trigo), lembrando que as panificadoras deixaram de ser subsidiadas pelo Governo em Abril de 2017, altura em que tiveram de rever o preço do pão pela última vez. A AMOPÃO fala de padarias a fecharem todos os dias. “O negócio exige muita paciência. É para empresários que gostam do que fazem e mesmo assim têm de ser disciplinados na gestão”, conclui Victor Miguel. Tudo isto ocorre porque o mercado tende a assegurar a acessibilidade ao pão por parte das populações mais pobres, ao mesmo tempo que depende da importação da totalidade do trigo e outras matérias-primas, daí o congelamento a que se tem assistido nos preços do pão, mesmo com o aumento do custo de importação da matéria-prima. Espiga, o Ouro que perdeu brilho? As dificuldades em operar na panificação não dependem, sequer, da força com que se entra no negócio. Em finais de
2017, foi aberta a maior unidade de produção de pão do país, a Espiga D’Ouro, num investimento privado avaliado em 50 milhões de dólares. Com capacidade instalada para produzir www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
A panificação moderna O ramo da panificação em Moçambique não oferece grandes oportunidades de conhecer as suas funcionalidades e tendências ao longo do tempo. No entanto, a nível global, este é um segmento em que, há muito, se pensa fora da caixa, questionam-se conceitos e culturas, investigam-se os motivos pelos quais as coisas são feitas e traçam-se ideias disruptivas e novas formas de trabalho. Eis algumas tendências que podem orientar as padarias nacionais para a industrialização e maior competitividade, segundo a plataforma Massa Madre, que pertence à Ramalhos Brasil, um dos maiores fornecedores de equipamentos de ponta da indústria de panificação:
Saúde Deve haver a preocupação de aliar o sabor à saúde, oferecendo alimentos feitos com sementes, grãos e diversos tipos de cereais ricos em nutrientes, sem conservantes e aditivos químicos.
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Qualidade Investir em embalagens para atender as exigências referentes à conservação e higiene, com rótulos explicativos sobre informações nutricionais e validade.
Diversificação Pães, bolos e outros produtos tradicionais são investimentos certos para o sucesso da padaria. É uma óptima forma de inovar e garantir um diferencial em relação à concorrência.
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Personalização É preciso atender clientes com restrições alimentares e dietas especiais. A tendência é investir em produtos sem glúten, lactose, açúcar ou gordura.
Refeições pré-prontas Uma tendência que está a ganhar espaço e a conquistar o público: massas, pizzas, sanduíches e assados congelados, que proporcionam maior praticidade.
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Serviço delivery
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Garante comodidade para o consumidor, permitindo que ele adquira os produtos desejados sem precisar de se deslocar, enfrentar o trânsito e as filas na padaria.
Serviços no local Uma tendência que está a ganhar espaço é a oferta de serviços mais amplos nos horários de refeições, aumentando as opções de atendimento ao público.
Modernização
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Nova maquinaria proporciona maior eficiência energética, ajudando a reduzir os custos da actividade e aumentando a competitividade do negócio.
Profissionalização Actualmente, valorizam-se os profissionais mais capacitados. Num standard elevado, a profissão de padeiro profissional exige técnica e conhecimento.
Marketing
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É também tendência investir na internet, uma boa opção, pois atinge mais clientes e não se limita aos consumidores mais próximos do empreendimento.
Hoje em dia, o pão está disseminado pelo mundo. A sua produção envolve métodos diferentes que resultam numa variedade enorme de tipos e variedades. Apesar desse desenvolvimento, uma boa parcela da população mundial ainda não tem acesso a esse alimento quotidianamente Tales Pinto, historiador brasileiro
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Nação
Indústria do pão
“panificação é indústria de sobrevivência” Esta é a visão de quem se dedica a este ramo, que se desdobra em esforços para tentar convencer a sociedade a pagar um pouco mais pelo pão, num jogo em que muitas vezes sai a perder.
Qual é o peso da panificação que praticam preços bastante na indústria alimentar em inferiores aos que eram Moçambique? praticados há 10 ou 15 anos, Imagine que a indústria de panificação encerra e desaparece no país. Qual o impacto que teria para a sociedade? É uma indústria com participação significativa, embora não possa, agora, exprimir este peso de ponto de vista percentual, em comparação com outras indústrias do ramo alimentar.
o que matematicamente não possibilita que estejam a garantir a sustentabilidade do seu negócio. Daí suspeitarmos que são operadores que apostam na ilegalidade através da fuga ao fisco ou lavagem de dinheiro.
Não. Pelo contrário. O determinante é o fraco poder de compra da maioria das famílias, porque temos procurado entrar em todos os pontos possíveis. Hoje, o produtor é que vai ao consumidor. Pela nossa avaliação ao estágio da economia do país, pelos salários que se pagam à maioria dos cidadãos, entre outros factores, entendemos que poderão existir pessoas que não compram pão por privilegiarem a compra do arroz e da farinha, não por serem mais baratos, mas por serem indispensáveis.
funcionários, nada poderá mudar. Só o desenvolvimento e um maior poder de compra das pessoas tem potencial para aumentar as vendas e melhorar o desempenho da indústria nacional de panificação… não podemos trabalhar permanentemente com preços muito baixos. Teremos de corrigir sempre os preços quando houver aumento dos custos de produção (farinha de trigo, água, energia, salários, etc.), mesmo correndo o risco de descida das vendas.
Quais são os factores críticos para o retorno à Há, no país, muita gente que sustentabilidade não consegue ter o pão à da indústria de mesa. Por ser um alimento panificação? relativamente fácil de Enquanto o desenvolvimento adquirir, é correcto colocar tardar e o Estado não a hipótese de défice de tiver capacidade de pagar produção? salários condignos aos seus
Se é um alimento que toda a gente quer ter à mesa, com mercado em todos os pontos onde é distribuído, era de esperar que o negócio compessasse... É uma indústria de sobrevivência a avaliar pelos custos, preço do produto final e pela concorrência, sobretudo a desleal. Desleal não só pelo facto de ter muitos operadores fora da associação, mas também porque há padarias
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Víctor Miguel, Presidente da AMOPÃO
O principal mercado produtor e consumidor de pão situa-se a Sul do país onde estão, no total, o dobro das panificadoras das zonas Centro e Norte 2,5 milhões de pães por dia (1,8 milhões numa primeira fase) para abastecer a cidade e província de Maputo. Frustrada a tentativa de ouvir a administração da empresa que, por telefone, disse não ser oportuno falar sobre a dinâmica da sua actividade, a E&M conversou com Daniel Napatima que, até finais do ano passado, era funcionário daquela empresa. Napatima assinala que “a entrada em funcionamento do empreendimento veio agregar competitividade ao sector, com reflexo na redução do preço e na melhoria da qualidade do pão fornecido pela generalidade das padarias, que temiam sucumbir perante um gigante que lhes ameaçou retirar todo o mercado”. Mas, apesar de tudo, não tardaram os sinais de instabilidade. Segundo Daniel Napatima, em 2018 a Espiga D’Ouro decidiu ajustar o preço do pão, aumentando-o gradualmente de seis meticais para oito meticais a unidade. E o efeito foi, obviamente, a redução significativa das vendas, em benefício das concorrentes que apresentavam vantagens no tamanho relativamente maior do pão e, claro, no preço. Depois, o ajustamento também aconteceu www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
Um mercado difícil de medir
Um estudo feito por analistas do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), sobre o sector da panificação, acaba por ser útil para melhor entender a especificidade deste mercado também por Moçambique onde, infelizmente, nunca foi realizado qualquer pesquisa no sector: “Como negócio complexo que é, em que coexistem os sistemas de transformação de matéria-prima em alimentos (componente industrial) e o de comercialização ao consumidor final, a panificação prescinde de empresários atentos às variantes de mercado. As empresas de panificação têm uma gestão centrada no principal empreendedor e podem verificar-se várias formas de gestão no sector”. É uma particularidade que, no fundo, explica a razão da dificuldade em estudar o sector, o que acaba por contribuir para tornar a indústria panificadora numa actividade organizada e com máximo contributo no desempenho das economias, não obstante o grande potencial de esgotar sempre o stock da sua produção.
ao nível das quantidades fornecidas ao mercado. Antes, havia excesso de oferta que resultava em perdas significativas. Agora, os clientes revendedores da Espiga D’Ouro encomendam as quantidades que acreditam que podem fornecer ao mercado o que resulta numa efectiva redução da oferta existente. O desânimo
Ao circular pela capital do país, é fácil constatar que barracas identificadas como as de venda de pão da Espiga D’Ouro estão abandonadas ou passaram a prestar actividades que não têm qualquer relação com a venda do pão, sintomas que chamam atenção e que levaram a E&M a dois dos seus clientes revendedores, em extremos diferentes da Cidade de Maputo: um no bairro da Polana Caniço, periferia, e outro no Bairro Sommerchield, centro da cidade. Sob anonimato, ambos relataram a redução da procura por parte dos consumidores finais, mas divergiram em relação aos motivos. O revendedor da Sommerchield constatou que a Espiga D’Ouro mantém a boa qualidade do pão, mas, nos últimos tempos, tem variado o seu tamanho, sistemática e incompreensivelmente, para desagrado do consumidor, o que levou ao recuo da procura e da facturação em aproximadamente 30%. Já o revendedor da Polana Caniço faz menção ao “recuo da qualidade”, que terá devolvido à www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
concorrência parte importante dos seus clientes. Este é um exemplo de algo que vai mal na indústria do pão nacional, Pouca qualidade, diversidade e uniformidade são indicadores comuns de um segmento do sector industrial que tinha tudo para dar certo. Falta-lhe fermento para crescer. E há estudos que o comprovam: África e América do Sul têm as indústrias de panificação “menos desenvolvidas no mundo”. No polo oposto, as mais desenvolvidas estão na América Central e do Norte, em toda a Europa e na Ásia do Norte. Já a Ásia do Sul tem uma indústria mediana. Os dados são da consultora canadiana Mordor Intelligence, cuja vocação é fornecer indicadorres precisos sobre os mercados de 20 sectores industriais (incluindo o alimentar, que também engloba a panificação). A consultora estima que, graças ao desempenho das economias mais desenvolvidas (com destaque para os Estados Unidos da América e Europa), a indústria do pão deva, de forma agregada, alcançar cerca de 205 mil milhões de dólares em receitas ao longo deste ano. E a previsão é que mantenha o seu crescimento das últimas décadas e desenvolva 3,4% ao ano até 2023. texto Celso chambisso fotografia Mariano silva
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indústria do pão
“É preciso eficiência e qualidade para tornar a panificação lucrativa” Gilberto Cossa Director-geral da MEREC
Aos olhos do gestor de uma das mais importantes indústrias da cadeia de valor do pão, há mudanças importantes a fazer no mercado. Da modernização do processo de produção à adição de vitaminas que ajudam a combater a desnutrição fica, uma vez mais, confirmado o longo caminho a percorrer para a modernização de um sector fulcral para Moçambique
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indústria do pão
endo o trigo, a matéria-prima que é a base da indústria panificadora, importado, até porque não há produção em quantidade deste cereal em Moçambique, o preço da farinha para a produção está demasiado exposto às oscilações cambiais. Para se ter ideia do défice que este simples facto causa na indústria, basta observar que, internamente, a produção ronda as 20 mil toneladas por ano (de acordo com dados do Fundo de Desenvolvimento Agrário, FDA), e só MEREC, maior moageira do país, processa 1 540 toneladas por dia. Ou seja, toda a produção anual seria processada em apenas duas semanas só pela MEREC, que detém uma quota de cerca de 50% de todo o mercado nacional. Assim, Argentina, Canadá, Rússia ou Alemanha entre outros, vão assumindo papel crucial enquanto fornecedores do trigo a Moçambique cuja importação custa cerca de 160 milhões de dólares por ano. Mas a MEREC não é apenas um actor de destaque na cadeia de produção da indústria do pão. Com aproximadamente 500 trabalhadores directos e outros 300 indirectos, a empresa aposta na produção de massas e bolachas, o que lhe confere o estatuto de uma das referências nacionais da indústria alimentar, a par da Companhia Industrial da Matola (CIM). Além da visão da MEREC em relação à indústria do pão, Gilberto Cossa fala da (pouco conhecida) vocação da empresa para lá da esfera de moagem do trigo. Enquanto empresa de peso no ramo alimentar, que bastece parte importante da indústria da panificação à escala nacional, como caracteriza esta área enquanto fornecedor? Estamos a falar de uma indústria muito importante para a MEREC, e que tem sofrido algumas alterações ao longo dos anos. O sul do país regista o maior número daquilo que denominamos por padarias formais, enquanto no resto do país (Centro e Norte) temos uma grande quantidade de padarias informais (fabrico caseiro), de pequena dimensão. Não podemos esquecer o impacto da crise financeira em 2015, que afectou todos os sectores da economia, mas, em particular, o sector industrial devido à desvalorização da moeda nacional que atingiu cerca de 150% face a 2014 (29,00 Mts/USD) e que, actualmente, se tem mantido ainda ao nível de 100% (63,00 Mts/USD). As taxas de desemprego e, consequentemente, a redução do poder de compra da população são alguns dos factores que afectam o crescimento deste sector de actividade onde o consumo de pão per capita continua a ser inferior à média da região (África Austral). Nos últimos anos, o mercado tem assinalado algum investimento na indústria de panificação, com a aquisição de novos equipamentos para padarias de pequena e média dimensão, tendo mesmo permitido o surgimento, em 2017, da primeira padaria industrial em Maputo, a Espiga D’Ouro. Qual é o papel da MEREC na cadeia da produção do pão e outros produtos de panificação? Somos a maior indústria nacional neste sector com unidades de produção em Maputo, Beira e Nacala e, como tal, temos um papel muito importante ao nível nacional. Temos uma capacidade total instalada de 1 540 toneladas por dia de produção da farinha de trigo. O nosso core business consiste na transformação do trigo
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O mercado tem assinalado algum investimento na indústria de panificação, com a aquisição de novos equipamentos para padarias de pequena e média dimensão (matéria-prima que importamos) em farinha de trigo que, por sua vez, é a matéria-prima principal para a indústria da panificação. Posicionamo-nos como um dos principais agentes na cadeia de produção do pão. O grande factor diferenciador neste mercado está no facto de oferecermos produtos e serviços de qualidade, assim como um customer service (área da empresa cuja função é receber as reclamações dos clientes) muito próximo e adaptado a cada consumidor. Também procuramos estar sempre na linha da frente, apostando na inovação e melhoria contínuas, oferecendo novas soluções e novos produtos para responder a um mercado cada vez mais exigente e competitivo. Que peso tem a MEREC enquanto fornecedor da farinha de trigo às panificadoras e em relação ao universo dos “clientes-padarias” ao nível nacional? A nossa quota de mercado da farinha de trigo destinada à panificação situa-se entre os 45% e os 50%. O número de clientes não é constante ao longo dos anos, vai registando oscilações. Em termos médios, o www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
da dívida privilegiando sempre as boas relações entre a MEREC e os seus clientes. De que mercados a MEREC importa o grão de trigo, quanto custa o investimento anual de importação e como avalia o retorno dos investimentos? O trigo, principal matéria-prima da MEREC, é, tendo em conta a sua qualidade, importado principalmente do Canadá (Trigos de Alta Proteína) e da Europa - regiões dos mares Negro e Báltico -, e Argentina (Trigos de Baixa Proteína). O investimento anual na compra de trigo é de aproximadamente 65 milhões de dólares ao ano. No que diz respeito às margens, importa referir que, de uma forma geral, o sector moageiro, em todos os países, trabalha com margens líquidas bastante reduzidas, considerando que se transforma o trigo na matéria-prima “farinha”, utilizada noutras indústrias, como as da panificação e alimentar (massas alimentícias, bolachas, etc.). O mais importante para tornar esta indústria lucrativa é o investimento na eficiência e qualidade.
número de “clientes-padarias” ao nível nacional é de, aproximadamente, 300 (a Associação Moçambicana de Panificadores, AMOPÃO, tem 377 associados), número que tem vindo a crescer mensalmente face à grande procura das nossas farinhas de trigo. De referir que os 300 clientes dizem respeito apenas às padarias formais, pois, a esse número, acresce ainda uma grande quantidade de padarias informais (caseiras), que também preferem as nossas farinhas. Segundo a AMOPÃO, o fornecimento aos clientes é geralmente feito a crédito. Como avalia o impacto desta modalidade para as contas da MEREC, tomando em consideração o facto de as padarias estarem a operar com margem mínimas de ganhos? O crédito é sempre uma ferramenta de gestão que deve ser gerida de uma forma bastante rigorosa. A MEREC vende a crédito, no entanto, uma parte considerável das suas vendas é feita a pronto pagamento. A crescente competitividade do mercado aliada ao factor cambial (o trigo é todo importado) obriga-nos a manter uma atenção especial sobre os níveis de crédito concedido. Existe um comité de crédito onde se avaliam e aprovam todas as propostas de concessão tendo como base os pressupostos previamente aprovados pelos accionistas. Mas, mesmo com estas ferramentas, temos alguns casos de incumprimento que são internamente geridos pelas áreas competentes. Neste tema, damos primazia ao estabelecimento de acordos para a liquidação www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
Há alguns anos, o Governo introduziu a obrigatoriedade de adicionar nutrientes aos alimentos como forma de reduzir a desnutrição crónica. Que posição assume a MEREC em relação a esta iniciativa? A MEREC está a adicionar vitaminas e sais minerais à farinha de trigo há cinco anos. E de há três anos a esta parte a farinha de milho também passou a ser fortificada o que permite enriquecer estes alimentos e contribuir para o combate à desnutrição crónica que existe no país. É um projecto que estamos a implementar com sucesso nas nossas três unidades (Maputo, Beira e Nacala), com um contributo notável na redução da desnutrição, uma vez que os nossos produtos chegam a uma percentagem significativa da população. O core business da MEREC é a transformação do grão de trigo. Mas, nos últimos anos, resolveu diversificar a actividade e estendeu-a para a produção de massas, bolachas e rações. Qual é o peso de cada um destes subsectores? A nossa unidade de Maputo produz massa esparguete desde 2010 e a da Beira desde 2013. Um ano antes, iniciámos a produção de bolachas e instalámos a fábrica de rações em Maputo. São subsectores que, não sendo o nosso core business, têm um peso importante na nossa estrutura de produção. A capacidade de processamento dos três produtos é de 444 toneladas por dia (180 toneladas de massas, 24 toneladas de bolachas e 240 toneladas de rações). Quanto ao milho, processamos 268 toneladas diariamente. A unidade da MEREC da Beira sofreu com o ciclone Idai. Em quanto é que foram avaliados os danos, que impacto tiveram e qual é o actual ponto de situação? De facto, sofreu danos consideráveis e causou prejuízos avaliados em dois milhões de dólares. Hoje, a unidade e está em processo de recuperação gradual em fase de tramitação da aceleração dessa recuperação com os serviços de seguros. texto Celso chambisso fotografia Mariano silva & D.R.
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OPINIÃO
Guerra do Talento (em Moçambique). Quando o calor apertar, vai pela sombra!
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João Gomes • Partner @ JASON Moçambique aso 1: “O Governo Moçambicano pretende criar, em parceria com o sector privado, cerca de 1,5 milhão de empregos, até 2019.” in O Portal do Governo. Caso 2: Soraya, recém-licenciada em marketing digital, tem a seguinte dúvida: “Não encontro emprego compatível com a minha qualificação. Talvez vá tentar arriscar num negócio com impacto social”; Caso 3: Sebastião, engenheiro informático, responsável pela divisão de TI dizia: “queria ter feito nove certificações em 2019, mas nem uma consegui: não tive tempo quando tinha paciência! Não tinha paciência quando tive tempo”; Caso 4: Armando, engenheiro de minas com 63 anos de idade: “Gosto muito do que faço. Confesso que não estou preparado para me reformar e ir para casa”. O que têm estes quatro casos em comum? Todos são manifestações do Capital Humano (CH), mas em fases do ciclo de vida diferentes: criação (caso 1); aquisição (caso 2); valorização (caso 3); revalorização (caso 4). Duas forças operam em conjunto tornando a situação do CH em Moçambique altamente desafiadora para os Empregadores. Por um lado, a (hiper) globalização a exigir novas competências, conhecimentos e atitudes e a que chamaremos de Prontidão Digital. Por outro lado, a descoberta de enormes reservas de gás natural em Moçambique promete ter um Efeito de Sucção de talentos para este sector. Antevemos que ambas as forças conjuntamente operarão uma enorme pressão sobre o CH. E a consequência será o aumento da escassez desta forma de capital: e o que se seguirá será uma luta entre os Empregadores para encontrar a pessoa certa, para o lugar certo, no tempo certo, a que chamamos de Guerra do Talento. E a novidade histórica é a de que, desta vez, o Talento ganhará: o “ás de ouros” não está nas mãos dos Empregadores, mas sim na mão dos Indivíduos Talentosos. E como poderão os Empregadores, habituados a viver num modelo de Contratar/Despedir, agora posicionar-se num modelo baseado no Suprimento Sustentável de Talento?
1ª Batalha – Criação & Stock de CH (Casos 1 e 3) Participar activamente, por intermédio das respectivas associações sectoriais, em parcerias com promotores dos grandes projectos, na identificação do modelos de competências que garantam simultaneamente: a Prontidão Digital - habilidades e conhecimentos para manejar dados e a complexidade; Soft Skills - saber-ser e saber-saber; e a Perícia técnica (saber-fazer) em domínios não transferíveis. Nesta estratégia, ao Estado caberá a criação de um sistema de incentivos financeiros e fiscais de apoio às competências transferíveis (i.e. Prontidão Digital + Soft-Skills). Cabendo aos Empregadores suportar os investimentos na formação específica (i.e. não transferível intra e inter-sectorialmente). Para reduzir o peso dos investimentos iniciais a aposta recairia sobre programas acelerados de treino. 2ª Batalha – Aquisição de CH (Caso 2) A estratégia que recomendamos é a de ida ao mercado e contratar pela proficiência e atitude - ao invés do título académico ou influência - os recursos que não poderão ser treinados internamente. Adicionalmente, no sentido da redução do peso deste investimento inicial a aposta recairia sobre programas internos acelerados de treino. 3ª Batalha – Valorização do CH (Casos 2 e 3) A estratégia que recomendamos coloca o esforço não apenas nos Empregadores - através de programas de formação contínua acelerados e de melhoria do clima organizacional -, mas, também, no colaborador e na sua vontade e esforço de simultaneamente valorizar/impedir a “depreciação” do activo que é o seu Talento: a auto-formação baseada em programas acelerados. 4ª Batalha – Revalorização do CH (Caso 4) A estratégia que recomendamos aponta para a criação de comunidades internas de Talento através da mobilização de colaboradores próximos à reforma e que possam funcionar como Coach, Mentores ou on-the-job trainers. Acreditamos que a Guerra do Talento em Moçambique será longa e difícil. Mas não antecipar o problema e não adoptar estratégias certas será, certamente, planear falhar.
A estratégia que recomendamos é a de ida ao mercado e contratar pela proficiência e atitude - ao invés do título académico ou influência - os recursos que não poderão ser treinados internamente
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província
katembe
KaTembe, o recanto que a ponte já revela ao mundo O Distrito Municipal da KaTembe começa, pouco a pouco, a despir o verde que ainda o domina, para dar lugar ao ‘enraizar’ de novas plantas de concreto, dinamizadas pela abertura da maior ponte suspensa de África
é
do alto da ponte maputo katembe que, do outro lado da baía de Maputo, se visualiza um horizonte que vai mudando todos os dias e promete total transformação nos próximos tempos. Antes, uma dicotomia, tão perto/tão longe, quando a travessia era exclusivamente por via fluvial, hoje a KaTembe é somente… tão perto, graças ao novo caminho, que traz consigo novos ângulos e percepções sobre o seu potencial económico até aqui pouco explorado.
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província Maputo
Distrito: KaTembe área: 174 km² População mais de 30
mil habitantes
região SUL
Valor da KaTembe subiu substancialmente
Mesmo antes da abertura da ponte, a demanda por espaço já tinha causado uma subida significativa do preço dos terrenos.Por ser proibida a venda de terra por Lei, as autoridades locais não têm dados a este propósito. Mas um estudo recente da Real Estate Consulting (REC), uma empresa de consultoria para o mercado imobiliário, aponta para “uma valorização de 10% face aos anos anteriores (à abertura da ponte)”, e faz menção à crescente onda de especulação. Actualmente, “terrenos com áreas www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
de cerca de 10 000m², com frente para a nova estrada, podem variar entre oito e vinte dólares por m², sendo os mais valorizados os mais próximos da ponte e da cidade de Maputo”, segundo o director-geral da REC, Nuno Tavares. Na KaTembe, ainda de acordo com Tavares, registou-se também um aumento de quase 10% dos proprietários de terra interessados em vender, convencidos de que estão diante de uma oportunidade de maximizar os benefícios através de preços muito altos. “Vieram muitos clientes (vendedores de terra) pedir-nos para promover as suas propriedades, mas quando os questionamos sobre o valor que esperavam como retorno, avançaram com números desajustados ao mercado (muito elevados)”, explicou Nuno Tavares. O director da REC adiantou também que “a crise de que o país ainda se refaz, e que levou o Estado a uma profunda reforma, veio abrandar a cobiça pelos terrenos da KaTembe”, que tinha sido aguçada pela espectativa que havia quanto às facilidades que seriam criadas pela ponte, e isso afectou o mercado imobiliário, no sentido de que “grande parte da procura por terrenos desapareceu e os investidores retraíram-se à espera de melhores dias”.
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se prevê alocar 60% do espaço à habitação e relativamente menor espaço para os diferentes projectos de geração de emprego que, entretanto, serão insuficientes para absorver a população que ali se instalar. Aí, aconselha Tavares, “é preciso olhar para outros exemplos de construção de cidades na Europa e em África, especialmente Angola, onde nas ‘novas cidades’ há pouco movimento laboral como se perspectivava”.
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… E com ela chegam novos projectos
“b00m” populacional A dinâmica de expansão económica na KaTembe poderá dar impulso a um crescimento rápido da população dentro de 20 anos Em milhares de habitantes
2007 20 2017 prev. 2040 FONTE INE Área: 4 056 hectares de solo urbanizável nos bairros de Guachene, Incassane, Chamissava, Chalí e Inguide.
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Milhões de dólares É o valor do investimento no Projecto Geral de Urbanização que, em princípio, será desembolsado pelo Banco Mundial em Outubro deste ano
Promessa de prosperidade
Mas nem a todos a crise conseguiu desanimar. E já era de se esperar que o caminho, por alto, que leva à KaTembe e mais além (Bela Vista, Boane e Ponta d’Ouro), criasse, nos pequenos e grandes investidores, o desejo de migrar para aquele espaço ‘virgem’. “Antes estávamos no Hotel Glória Mall, na cidade de Maputo, e depois saímos para aqui na KaTembe, no ano passado, porque lá a procura era fraca”, revela Inocência Tembe, gerente do N’tilas Beach Restaurant, uma casa-de-pasto situada à beira-mar, onde o volume de negócios cresceu 60% em comparação com o que era do lado da cidade. Para o KaTembe Gallery Hotel, “depois da construção da ponte houve um crescimento das receitas em cerca de 20% a 30%, o que representa duas ou três vezes mais”, segundo Ivan Leonel, gestor de Marketing e Eventos. Esta é uma das razões por que se assiste, hoje, a uma grande corrida em busca de um lugar privilegiado naquele lado da baía. www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
População quase triplicou…
O crescimento da KaTembe já cria as primeiras movimentações típicas de uma região actractiva. Há muitas infra-estruturas que vão sendo (re)erguida a sinalizar um futuro de acelerado ritmo de actividade económica. Com a ponte, a pressão populacional é ainda maior, tendo aumentado significativamente em pouco tempo. “Há poucos anos éramos cerca de 20 mil habitantes, mas hoje já somos cerca de 30 mil, sendo a maioria reassentados no âmbito da construção da ponte”, disse à E&M Celso Fulano, vereador do Distrito Municipal da KaTembe. Para Nuno Tavares, o crescimento populacional é que vai determinar o fluxo da actividade económica, e só depois é que se vai “iniciar a construção de unidades comerciais que possam dar vida àquela urbe”. Tavares prevê que KaTembe venha a tornar-se num “dormitório” num futuro breve, ou seja, com muitos habitantes a trabalharem na cidade de Maputo, já que
Embora Nuno Tavares não preveja a fixação, na KaTembe, das sedes nem representações de um número significativo de grandes empresas do mercado nacional (excepto instituições financeiras e outras de grande utilidade para a sociedade) – por faltar ainda muitas infra-estruturas que possa facilitar as suas operações – o Plano Geral de Urbanização do distrito, instrumento financiado pelo Banco Mundial no valor de 40 milhões de dólares, já reservou espaços para algumas unidades empresariais, garante o vereador do Distrito Municipal da KaTembe. “Vimos o movimento do Standard Bank, que já montou um ATM desde que a ponte foi inaugurada. Mas também temos um edifício da Movitel”. A estes juntam-se “o BCI a construir um condomínio e a movimentar-se nos limites da KaTembe e Matutuíne, próximo da área reservada para a nova Assembleia da República. O Grupo Soico também adquiriu espaço no bairro Chalí e já apresentou uma proposta para investir na hotelaria”, informou Celso Fulano, para quem este movimento, seguramente, vai incrementar o turismo e diversificar a economia local que, segundo o Anuário Estatístico de 2018, é baseada na agricultura de subsistência, silvicultura e pesca artesanal, que no seu conjunto compõem 88,6% da economia do distrito”. Com muita coisa ainda por arrumar, pairam dúvidas sobre o que esperar da nova KaTembe, mas que já há mudanças não se pode negar. Embora tímidas. Até porque “possivelmente, em Outubro, vai se fechar o financiamento (do PGU pelo Banco Mundial) e a partir, do próximo ano, começamos a abrir as vias de acesso, reabilitar escolas, colocar energia, entre outras infra-estruturas”, promete o vereador.
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província
katembe DISTRIBUIÇÃO Da TERRA A habitação irá absorver quase 60% da nova cidade. Espaços reservados para a actividade turística serão os menos privilegiados, com apenas 3% da terra disponível Em milhões de m2 | Em % da área total habitação
9,5m² 58,9%
comércio e serviços
indústria, logística e crescimento económico
3,3m² 20,3% 1,9m² 11,7%
equipamentos colectivos
0.9m² 6,1%
turismo
0.5m² 3,0% FONTE Plano Geral de Urbanização da KaTembe
Enquanto se espera pelo resto, o turismo vai “aquecendo”
Na verdade, o turismo – área para a qual o PGU dedicou 3% – vai assumir um papel importante para o ‘boom’ económico que se espera naquela zona, porque os poucos espaços que vão ganhando vida com a construção de infra-estruturas, pelo menos na zona ribeirinha, são investimentos turísticos. São os casos do De Lagoa Bay, que abriu as suas portas oficialmente a 14 de Fevereiro, segundo fonte do estabelecimento. A registar ganhos significativos no ramo da restauração e prestação de serviços para a realização de eventos, a gerente do N’tilas Beach Restaurant revelou que “agora a ideia é alargar o investimento para o ramo da hotelaria”, ali no mesmo espaço. O facto deriva da existência de “clientes que pretendem pernoitar e ainda não têm muita oferta de locais de repouso”. Já para atrair um público mais jovem, o Hotel Gallery pretende criar um pool bar (bar na piscina). “Tentámos desenhar o projecto pensando na juventude. Nós não temos a mesma dinâmica de outros estabelecimentos aqui, em que se pode pernoitar, e é isso que que-
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Nuno Tav
Mergulho é um dos nichos mais apetecíveis do turismo e Moçambique tem condições previlegiadas para tal
es ar
Director-geral do Real Estate Consulting “A crise de que o país ainda se refaz, e que levou o Estado a uma profunda reforma, veio abrandar a cobiça pelos terrenos da KaTembe. Isso afectou o mercado imobiliário e os investidores retraíram-se à espera de melhores dias”
remos trazer”, prometeu Ivan Leonel. O Director-geral da REC, reconhece o potencial turístico da Katembe, mas relembra que a existência de outros lugares próximos com o mesmo potencial, e já consagrados, pode levar a que o desenvolvimento do distrito nesse aspecto seja tímido. “A KaTembe vai ser o próximo destino turístico da cidade de Maputo, mas a seguir a ela temos a Ponta D’Ouro já com praias de qualidade e alguma estrutura de alojamento que a KaTembe não tem” de maneira que “tudo tem de ser criado de raiz”, observou. Importa lembrar que a ponte responsável pela visibilidade que a Katembe vem ganhando custou 725 milhões de dólares financiados Exim Bank da China (95%) e o restante pelo Governo moçambicano. Foi inaugurada a 10 de Novembro de 2018. Mesmo a fechar, Celso Fulano deixa um apelo: “Como vereador deste distrito tenho estado a apelar aos investidores a recrutarem a mão-de-obra local, sobretudo para áreas mais fáceis de encontrar jovens”, texto Emídio Massacola fotografia D.R.
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OPINIÃO
2020 - Apesar dos atrasos a luz continua acesa
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Bernardo Aparício • Head of Corporate and Investment Banking do Absa Bank Moçambique uando me pediram que voltasse a escrever sobre as perspectivas macroeconómicas para o ano de 2020, a primeira coisa que fiz foi ler o artigo publicado em Janeiro do ano passado e perceber quais as previsões que se concretizaram e as que não. De todas as previsões, aquela que claramente falhou o alvo foi a do crescimento do PIB, o qual estimávamos que crescesse cerca de 5% e o mesmo não deverá ultrapassar os 2,2% em 2019. Como todos sabemos, o grande choque macroeconómico de 2019 foram os ciclones Idai e Kenneth, que impactaram duas províncias cujas economias são relevantes para o país, mas também um sector como o agrícola com um peso de cerca de 20% no PIB. No entanto, este não foi o único impacto de relevo no PIB. O motor da economia nos dois últimos anos, o sector mineiro, abrandou de forma significativa registando crescimentos negativos no 2º e 3º trimestres de 2019, como resultado de uma redução na produção de carvão (que hoje já constitui cerca de 33% do total de exportações do país). Adicionalmente, com um crescimento médio nos últimos dois anos de 2,7% e um crescimento populacional de 2,8%, importa realçar a deterioração no rendimento per capita e no nível de vida dos moçambicanos, acentuando ainda mais o nível de pobreza. Em termos de inflação e taxas de juro a performance foi em linha com o esperado, com a inflação homóloga a estabilizar por volta dos 3,5% e a taxa de juro a cair cerca de 2%. No caso da inflação de Moçambique esta poderia ter sido mais baixa, tendo em conta que a inflação em Maputo foi apenas de 1,80%, no entanto o impacto nos preços do período pós-Idai elevou ligeiramente a média geral. Este risco de inflação combinado com as incertezas típicas de um ano de eleições foram as principais razões para que o Banco Central mantivesse uma política conservadora, não permitindo que as taxas de juro descessem de forma não sustentada. A outra previsão com um impacto relevante no longo prazo, era de que os projectos da Área 1 e Área 4 chegassem à DFI. Apesar da Área 1 ter atingido essa meta, o processo de
aquisição teve ligeiros atrasos. Já a Área 4, tem a Decisão Final de Investimento para meados de 2020. Ora, estes dois factores contribuíram para que não se sentisse ainda na economia o impacto destes investimentos, afectando naturalmente o crescimento de 2019. É exactamente com um foco nos investimentos no gás natural que olhamos para 2020, prevendo que a Área 4 atinja a DFI no primeiro semestre de 2020, e que os dois projectos garantam os financiamentos externos necessários para o seu desenvolvimento e que os consórcios construtores comecem a adjudicar os tão esperados contratos para os diversos serviços e fornecimentos com impacto nas empresas moçambicanas da cadeia de valor. Neste sentido, é de esperar uma subida do IDE em cerca de 15% para valores acima de 6 mil milhões de dólares em 2020. Para além deste sector, será de contar com uma recuperação na agricultura em 2020 e no sector da construção com as obras de reconstrução e os investimentos no Rovuma. A normalização das relações com os doadores, que se tem verificado nos últimos dois anos, também dará frutos permitindo o investimento em infra-estruturas rodoviárias, portuárias e eléctricas. Nesse sentido estimamos um crescimento do PIB na ordem dos 4,7%, ainda aquém do potencial do país, mas descolando dos crescimentos “anímicos” dos últimos quatro anos. Relativamente a riscos, é importante destacar não só o impacto do coronavírus na economia global, e em particular na China enquanto um dos principais destinos das exportações de Moçambique, mas também o risco de atrasos nos projectos do Rovuma provocados pela instabilidade que se vive em Cabo Delgado. Neste cenário de retoma é importante destacar a estabilidade macroeconómica do país, com uma inflação esperada de 4,5%, uma redução nas taxas de juro entre 1% a 2% e o metical a flutuar entre os 63 e os 65 relativamente ao dólar. É com este enquadramento que me aventuro a dizer que continuamos a ver a “luz ao fundo do gasoduto”, que apesar de toda a chuva que caiu em 2019 continua acesa e a assinalar, tal qual um farol, que Moçambique.
Estimamos um crescimento do PIB na ordem dos 4,7%, ainda aquém do potencial do país, mas descolando dos crescimentos “anímicos” dos últimos quatro anos
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mercado e finanças
Os limites do know how na excelência empresarial A área dos Recursos Humanos é constantemente desafiada a fazer update das suas teorias para ajustar as habilidades das pessoas aos desafios actuais do mundo empresarial. Hoje, mais do que a difícil tarefa de buscar competências está em voga o que se chama de Equipas de Alto Rendimento. O que são?
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m busca da competitividade, o mundo empresarial
trava verdadeiras batalhas na disputa das (poucas) competências que os mercados oferecem. Mas o que pouco se diz (e se calhar também pouco se sabe) é que conseguir bons ‘cérebros’ é apenas “meio caminho andado”. Uma reflexão sobre o tema foi apresentada no mês passado, em Maputo, pela consultora Ernst & Young, com a intenção de aprimorar a capacidade das empresas de atrair e reter talentos, bem como responder à crescente necessidade de alinharem esse mesmo talento com a sua estratégia de negócio. É neste
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10%
É o ritmo de crescimento médio das empesas que investem em Equipas de Alto Rendimento quando comparadas com o crescimento das que não seguem este caminho
encontro que se introduziu e discutiu a ideia da criação de “Equipas de Alto Rendimento”. Ao dirigir-se a representantes de cerca de 20 empresas, quase todas da área de serviços, sobretudo dos sectores da banca e seguros, a especialista portuguesa e parceira da Ernst & Young para serviços de Consultoria de Recursos Humanos, Marta Santos, começou por revelar que “é importante discutir o tema sobre ‘Equipas de Alto Rendimento’, porque as empresas não vão conseguir colocar o talento no seu máximo potencial se não conseguirem ter Equipas de Alto Rendimento”. Ou seja, “é possível ter uma equipa cheia de talentos individuais, mas www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
se não trabalharem enquanto equipa, por mais fenomenais que sejam, não terão rendimento à altura dos anseios das empresas”. Esta colocação sugere que as empresas estão sujeitas a muito mais trabalho do que têm feito até hoje (e não é pouco, num país com o já conhecido défice de talentos em qualidade e quantidade) para tornarem competitivo o seu quadro de pessoal. A essência do ‘Alto Rendimento’ Marta Santos, que é também coordenadora de Pós-Graduação em Gestão Estratégica de Recursos Humanos na Católica Lisbon Business School e na Universidade Católica de Angola, explica que muitos aspectos a este respeito parecem óbvios e bastante discutidos, mas ganham importância porque, muitas vezes, ‘passam ao lado’ dos líderes das empresas e dos departamentos de Recursos Humanos, apesar de serem determinantes na sua posição perante o mercado (clientes, concorrência e a sociedade em geral). A especialista explicou que a “Equipa de Alto Rendimento é a que trabalha de forma enérgica, com capacidade de se dedicar ao máximo e demonstrar vontade de alcançar metas e objectivos”. Um aspecto particular é que, nesta questão, o(s) objectivo(s) da empresa deve(m) ser partilhados e profundamente conhecidos pelos elementos da equipa do topo à base. E a partir daqui começar-se a incutir, a cada integrante da equipa de trabalho, a consciência em perceber “porque é que faz o que faz.” Outra característica é a forte orientação para os resultados. Sem esta orientação, não há motivação. Não há grandes novidades na forma de trabalhar nem nas ofertas para os clientes. Falta capacidade de ‘levantar a cabeça’ e fazer melhor. Há uma estagnação que vai beneficiar a concorrência. Também aqui é chamado o elevado sentido de responsabilidade. O que chama particular atenção neste ponto é um aspecto frequente nas empresas e “sintomático da falta de rigor na constituição de equipas de trabalho: as desculpas ou não tive condições ou não tive tempo, etc. É o que mais se ouve nas equipas de trabalho onde não há responsabilização”, o que acaba por minar a eficiência do processo produtivo. As Equipas de Alto Rendimento trazem à empresa vantagem competitiva e rendimentos que fazem toda a diferença nos resultados. “Mas é importante a noção de que a maior parte das equipas www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
Cinco características de uma Equipa de Alto Rendimento Há cinco comportamentos que potenciam as Equipas de Alto Rendimento, estão todos interligados e devem ser trabalhados pelas próprias equipas
Confiança Profissionalmente, a confiança parte de cada um dos membros, mas deve ser potenciada pelas lideranças das equipas através da partilha de conhecimentos, de soluções, de eventuais dúvidas, pedidos de apoio, etc.
Conflito Se não houver conflito, cria-se ambiente em que estão todos de acordo e se isso for permanente não haverá inovação. Só há conflito positivo quando há pouco discurso politicamente correcto e todos têm o direito de discordar.
Compromisso Só há compromisso quando houver sentimento de pertença, confiança e valorização das ideias na diversidade (seja quando forem aceites ou mesmo quando forem desafiadas dentro do grupo).
Responsabilização A responsabilização promove questões essenciais como saber o que fazer, quando fazer e cumprir prazos, critérios de qualidade e respeito mútuo pelos trabalhos uns dos outros. Isto permite alcançar elevado standard de qualidade.
Resultados O resultado deve ser visto como a conquista da equipa e não individual e os insucessos não devem ser atribuídos a indivíduos, para permitir que a equipa se mobilize rapidamente em busca de sucesso.
de trabalho nas empresas, mesmo as que apresentam resultados positivos (como as equipas da área comercial), não podem ser consideradas de alto rendimento enquanto não forem trabalhadas nesse sentido”, alerta a especialista. Investir ou… investir Afinal não se trata de um tema totalmente desconhecido cá dentro. A E&M ouviu João Gomes, da Jason Moçambique, empresa cuja vocação é olhar para os requisitos que os líderes das equipas de trabalho têm de preencher para criarem, stocarem, dinamizarem, promoverem e reterem talentos. Gomes, que considera tratar-se de um domínio novo na administração de pessoas em Moçambique, prefere chamar-lhes Equipas de Alto Desempenho. Para este gestor não há escolha para as empresas que quiserem fazer a diferença no mercado. É tempo das áreas de Recursos Humanos convencerem as administrações das empresas a investirem em Equipas de Alto Desempenho. Mas este investimento tem custos. João Gomes entende que a pressão exercida pelos líderes sobre Equipas de Alto Desempenho no sentido de apresentarem resultados ao trimestre, ao semestre ou ao ano, prejudicam o seu desempenho, porque esta pressão busca respostas imediatas enquanto uma equipa a este nível precisa que o seu líder esteja focado em respostas de longo prazo. “Hoje, os accionistas a pressionam os administradores a obterem resultados imediatos, e a perspectiva imediata não permite a formação de uma Equipa de Alto Desempenho. A única saída é recrutar pessoas no mercado, que conseguem dar respostas imediatas. E agindo desta maneira, o líder não colabora para a formação e stocagem de capital humano, porque uma Equipa de Alto Desempenho não é instantânea”, alertou. Marta Santos, na mesma linha, revelou que o maior custo de investir numa Equipa de Alto Rendimento é o tempo que os investidores têm de perder primeiro, para avaliar o perfil de cada integrante do grupo de trabalho, depois, para incutir o “espírito” de trabalho que se aconselha neste modelo de equipas. E porque nos negócios “tempo é dinheiro”, não é fácil aplicar na prática esta iniciativa. Mas vale a pena encarar os obstáculos, garante uma pesquisa recente da Ernst & Young que concluiu que as empresas que enveredam por este caminho crescem em média 10% mais do que as que
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mercado e finanças ligados à gestão de pessoas, é para nós de elevado interesse. E por ser uma questão que está na ordem do dia, não poderia deixar de nos interessar. A ideia de cá vir foi para aprimorar estas noções actualizando as boas práticas”.
Marta Santos, espcialista em Recursos Humanos
não investem nestas equipas, e têm 6% mais de rentabilidade. Isto é, compensam no negócio por serem altamente motivadas e produtivas. Empresas estão atentas… Geralmente, a preocupação das empresas tem sido conseguir os melhores talentos do mercado e formar equipas de “estrelas”. O workshop promovido pela Ernst & Young veio mostrar que só isso não basta, o que acabou por merecer apreciação positiva das cerca de 20 empresas participantes. “Estar aqui com pessoas de outras áreas é fundamental para que haja crescimento do conhecimento para todos nós”, defendeu Marco Graça, da empresa de advocacia Sal & Caldeira. Marco Graça revelou que a empresa onde trabalha é composta por pessoas de diversas áreas com conhecimentos técnicos muito especializados, onde a questão da motivação e do compromisso que elas têm de ter com a empresa (e vice-versa) é um elemento estruturante para o seu crescimento dentro da organização, daí ter-se interessado em participar. A representar o banco Moza, Yara Santos revelou que “o tema, tal como outros
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“Ao constituir uma Equipa de Alto Rendimento, deve-se evitar o excesso de semelhanças entre os seus membros (mesma idade, formação, experiências, etc.). Ao contrário, deve-se diversificar para criar perspectivas inovadoras”
… Mas o investimento deve ser individual João Gomes também avança que em empresas mais sofisticadas e avançadas já se começa a perceber sinais de trabalhadores a investirem em si próprios. Há também mais famílias a investirem mais na formação dos filhos, o que é típico de uma classe média a emergir no país. Na fase da formação inicial começa a haver um esforço “muito grande” das empresas moçambicanas em nela apostarem, um pouco por imposição dos grandes players da área do oil & gas e do sector financeiro, principalmente os bancos. É uma percepção semelhante à de Paulo Santos, director-geral da Heading, uma empresa de recrutamento. “Já começa a existir preocupação em adquirir competências pessoais e tecnológicas. E normalmente, estas pessoas são bem-sucedidas porque as suas qualidades ainda são um bem escasso”. Mas a directora-executiva da Atittude, Marlene de Sousa, não tem a mesma visão. “Os jovens não percebem que têm de se cultivar mais”, concluiu na entrevista dada à E&M há precisamente um ano.. Formação de base, o ponto fraco João Gomes não resistiu em abordar o que todos já sabem: ao nível formação de base no sistema de ensino (que é tarefa do Estado), ninguém está a criar e a fazer o stock de talentos para nenhuma empresa que está no mercado. Também não são aproveitados os talentos na idade de reforma, que além de se sentirem aptos para trabalhar poderiam agregar valor aos profissionais que chegam ao mercado de trabalho através da formação, por exemplo. Esta colocação é confirmada por um estudo publicado anualmente desde 2013, no Fórum de Davos – O Índice de Competitividade Global de Talentos – que vem colocando Moçambique entre os cinco piores países em cerca de 130 avaliados. Assim, Moçambique está entre os que não conseguem se impor-se no que diz respeito à produção, atracção e retenção de talentos. texto Celso Chambisso fotografia D.r.
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empresas
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combinar álcool e volante, e chegar seguro!
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Se beber, não conduza! O slogan, um dos mais antigos e populares do mundo, inspirou um negócio de imensurável utilidade para quem quer sair sem conduzir ão há novidade nenhuma em ouvir que alguém terá sido conduzido porque não conseguia dirigir, por si, o seu carro”. E por isso há quem tenha identificado uma oportunidade de negócio neste aspecto insuspeito. O empreendimento é designado Ximovissa (que significa, literalmente, ‘quem gosta muito de carro’, em Xichangana, língua da província de Gaza e uma das mais faladas no Sul do país). A iniciativa veio afastar a já antiga preocupação de ter de conduzir depois de uns irresistíveis “copos”. Mas não só. Quando começou a operar, a Ximovissa assumiu a designação “Me Pega Aqui” e tornou-se pioneira, em 2019, no fornecimento de motoristas para conduzir o carro dos clientes, incluindo os acompanhantes destes em caso de impedimento de o fazer por si por motivos diversos. “Primeiro, fizemos um estudo geral e vimos que em Moçambique não havia serviços desta natureza. Encontrámos, no entanto, o modelo de negócio noutros países da Europa e da Ásia”, conta Manuel Álvaro, director-administrativo da Ximovissa. Trata-se de um projecto que adiciona força à luta incessante da sociedade moçambicana contra a elevada sinistralidade rodoviária. Dados do Anuário Estatístico revelam que em 2018 houve registo de 1 553 acidentes de viação, que vitimaram 3 867 pessoas, das quais 1 164 foram mortais. Já o director-executivo do projecto, Beca Zulu, explica que o modelo de negócio foi desenhado para atender às especificidades da sociedade moçambicana e, por isso, “trabalhamos a partir das 19 horas de quinta-feira até às
5 horas de segunda-feira”, justamente porque está na génese da sua criação “dar oportunidade a todos de terem os seus momentos de lazer de uma forma segura sem se preocuparem em estar com problemas de saúde ou embriagados”, mesmo porque a embriaguez é a principal causa dos acidentes. A Ximovissa tem seis veículos que prestam, em média, 12 serviços por dia nas cidades de Maputo e Matola numa primeira fase, empregando um total de 16 motoristas activos da empresa, e tem uma carteira de mais 56 motoristas que ainda devem passar por uma formação, já que, “se formos a avaliar o crescimento mensal, e pela demanda que temos, estamos a falar de até ao final do ano expandirmos a nossa presença para toda a região Sul e até pensar em entrar para a região Centro”, segundo as perspectivas de Zulu. Mas enquanto lá não se chega, a empresa vai ganhando alguma visibilidade e confiança até de grandes corporações “como foi o caso de uma empresa que precisou dos nossos serviços para escolta”. Esta situação despertou a atenção para pensar na protecção dos clientes da dita empresa e, neste momento, existem “conversações com uma empresa de segurança”, revela Manuel Álvaro.. Assim, a empresa vai expandindo a sua vocação para áreas que não fizeram parte da sua génese original, o que requer da administração, actualmente composta por quatro colaboradores na gestão de topo, uma abordagem dentro dos quadrantes da evolução tecnológica.
B Empresa XIMOVISSA RAMO TRANSPORTE INÍCIO DAS ACTIVIDADES 2019 CO-FUNDADORES BECA ZULU e MANUEL ÁLVARO MOTORISTAS 16 activos e 56 por formar MERCADO MAPUTO E MATOLA (numa primeira fase)
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clientes por dia e 2 empresas fixas
texto emídio massacola fotografia Mariano silva
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megafone KENMARE JÁ PRODUZ CONCENTRADO DE MINERAIS Mas ainda não há data para concluir a unidade de processamento
FINTECHs NACIONAIS JÁ TêM UMA ASSOCIAÇÃO Chama-se Fintech.Moz (Associação das Fintechs de Moçambique) e foi recentemente criada por um grupo de 12 empresas tecnológicas ligadas ao sector financeiro, apoiados pelo Banco de Moçambique e FSDMoç, para maximizar o processo de inclusão financeira através do uso de plataformas digitais como a venda de seguros e a criação de um sistema de pagamento electrónico ‘gateways’. A associação também promete criar espaço de diálogo com os reguladores no sentido de pressioná-los a trazer nova legislação que dê espaço ao seu campo de actuação. “Não basta ter mais pessoas com contas bancárias, é preciso fazer com que utilizem os sistemas digitais de pagamento e aí entramos na área da tecnologia, em conceitos novos e de uma maneira nova de abordar o cliente”, revelou o presidente da agremiação, João Gaspar, referindo-se ao papel das Fintechs na expansão do acesso aos serviços financeiros. Actualmente, o país conta com 16 empresas que estão a começar a trabalhar na área, quatro numa plataforma de ensaios, denominada sandbox, e criada pelo Banco de Moçambique, e outras em nichos de mercado ou sob regime piloto, segundo João Gaspar. Segundo dados apresentados pelo Banco de Moçambique, em 2017, as contas baseadas só em moeda electrónica, associadas a telemóveis, são as mais populares no país e já chegam a cerca de 40% da população.
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a mineradora irlandesa que explora areias pesadas em Moma, província de Nampula, produziu o primeiro concentrado de minerais pesados, com recurso a uma unidade de concentração húmida (Wet Concentrator Plant C – WCP C). A unidade é um dos três projectos que a administração da empresa pretende implementar para produzir 1,2 milhões de toneladas de ilmenite, por ano. Em comunicado, a Kenmare, empresa cotada nas bolsas de valores de Londres e da Irlanda, adiantou ainda que o processo associado à colocação da respectiva unidade de processamento na mina de Moma está orçamentado em 45 milhões de dólares, e será concretizado num prazo ainda por divulgar. O segundo dos três projectos programados é a abertura de uma terceira frente de exploração mineira e o terceiro e último é a deslocação da WCP C para uma zona de elevada concentração de minérios na região de Pilivili, ainda em Moma, o que deverá acontecer no terceiro trimestre de 2020.
A Kenmare Resources plc é uma empresa de mineração sediada em Dublin, na Irlanda. Está listada na Bolsa de Valores daquele país e na Bolsa de Londres. Possui e opera a mina de Moma, o maior depósito mineral de titânio (ilmenita e rutilo) do mundo, localizado a 160 km da cidade de Nampula, no norte de Moçambique. Em 2017, teve um resultado operacional de 51,6 milhões de dólares e um resultado líquido de 19,4 milhões de dólares. A produção da mina de Moma representa cerca de 7% da produção mundial de titânio e é exportada para mais de 15 países.
Millennium bim eleito “Banco do Ano” pela 12ª vez O Millennium bim foi distinguido com o Prémio “Banco do Ano de Moçambique 2019” pela conceituada revista internacional The Banker. Com este galardão, o Banco atinge a meta dos 100 prémios, atribuídos por entidades de avaliação e análise do mercado financeiro mundial. A cerimónia de entrega dos prémios The Banker decorreu em Londres, destacando, mais uma vez, o banco liderado por José Reino da Costa como instituição de referência e reconhecendo o seu desempenho, aliado à credibilidade no sector bancário.
TOTAL ADJUDICA MASTER SERVICE AGREEMENTS À WORLEY A australiana Worley Ltd anunciou que garantiu mais dois contratos junto da petrolífera francesa Total. Os acordos prevêem o fornecimento de serviços de consultoria e engenharia especializada, dentro e fora de Moçambique, mas o destaque vai para o fornecimento das instalações onshore e offshore de produção de gás natural liquefeito ao largo da província de Cabo Delgado, onde já ocorrem investimentos. A Worley, que vai contar com o apoio de uma outra empresa nas suas actividades em Moçambique, apoia o desenvolvimento da operação relacionada com os jazigos de gás desde as descobertas, em 2010. www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
figura do mês quer um dos nossos colaboradores tem de se sentir próximo do outro, seja que cargo este ocupe na estrutura.
Desenvolver capital humano é desafiante Melba Jorge
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Head of Human Capital no FNB Moçambique
atravessar um processo de alteração de identidade alicerçado numa redefinição do ‘core’ da própria marca para o mercado nacional, o FNB enveredou, em 2019, por um alinhamento mais próximo do Grupo First Rand, um dos mais poderosos em África ao nível do investimento em grandes projectos, e do qual é subsidiário. Toda esta mudança assenta numa reestruturação cultural que abrange todas as áreas do banco com o objectivo final de, em poucos anos, se constituir enquanto referência ao nível da banca de investimento com foco nos grandes projectos de oil & gas (à imagem do gupo que detém o seu capital). E claro que, com tudo isto, também a equipa se alterou. A esse respeito, Melba Jorge, Head of Human Capital no FNB Moçambique, explica o que mudou na filosofia interna do banco. Em que assenta a estratégia de mudança do FNB? A estratégia de crescimento para criar e implementar o plano geral ao nível do capital humano é essencial para o banco permanecer ágil e cada vez mais aberto à inovação e à mudança. O nosso trabalho, numa primeira fase, passou por identificar, diagnosticar e trabalhar com as lideranças ao nível interno para conseguir agilizar toda a estrutura, a começar na criatividade, na proactividade, passando pelo gerenciamento do desempenho, preparando uma desejável prontidão dos funcionários para os momentos de mudança que se avizinham. O grande foco é potenciar talento interno e criar as condições para a sua retenção, um dos problemas na área financeira.
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Como é que esse trabalho é desenvolvido, na prática? Houve, logo desde o começo desta nova fase do banco, um grande foco na forma de implementação do plano estratégico de Recursos Humanos, bem como no acompanhamento das actividades e projectos para o desenvolvimento e implementação de ferramentas que atendam aos desafios actuais e futuros da instituição. A ideia que queremos cultivar é a de mobilidade e atitude proactiva e dou-lhe alguns exemplos: juntamos semanalmente todos os trabalhadores, falamos, interagimos, as pessoas fazem as perguntas, há essa abertura. Pretendemos criar uma cultura de comunicação aberta que é pouco usual neste sector, mas que é fundamental para que esta mudança tenha reflexos no serviço e nos nossos clientes. Há de facto essa ideia, um pouco ortodoxa, de como deve ser a estrutura de uma instituição financeira... Sem dúvida. E é por isso que estamos a imprimir este dinamismo em que qual-
cv
curriculum vitae
Formada na Universidade de Pretória em gestão de Recursos Humanos com um ‘major’ em Psicologia Organizacional e Business Management, Melba Jorge foi Talent & People Manager na SabMiller, Development and Special Projects Coordinator na ENI e People Development Coordinator na MRV. Está no FNB desde 2019.
Vendo a questão pelo lado inverso, o que é que é “de evitar” nesta nova fase, ao nível do capital humano? (sorri) Um aquecedor de cadeiras. É o que não queremos. Porque qualquer organização só cresce e se desenvolve com pessoas que se desafiem e que desafiem o ‘status quo’. Pensar fora da caixa e não apenas aparecer para trabalhar e ganhar o salário. Isso não queremos. Apesar de jovem, tem um carreira no sector do oil & gas (Eni e RMV). Que mais-valias trouxe dessa sua experiência, tratando-se de áreas tão distintas? São organizações diferentes, mas em sectores muito rígidos. O que trago é o que aprendi, que por vezes as pessoas pensam nos Recursos Humanos como factor administrativo e o que advogo é que devem fazer parte da estratégia de desenvolvimento do negócio, seja este qual for. Para ter sucesso em qualquer estratégia precisamos das pessoas. Saindo do âmbito do banco e olhando ao país, qual é a sua opinião sobre a preparação dos Recursos Humanos para os desafios que Moçambique tem pela frente? Existem mais fóruns de RH, vários afterworks, breakfasts e agora fala-se de forma mais estruturada, principalmente nas maiores organizações, do que deve ser o capital humano nas empresas e a sua importância para os resultados. Acredito que há uma mudança mas que ainda existe muito por fazer. Uma coisa que digo aos jovens é que quando alguém vai para uma entrevista de trabalho não deve ir só para trabalhar. Tem de se propor a aportar algo, a criar uma parceria. Mas, muitas vezes, o que encontramos não é isso. Não sei se isso tem que ver com a educação nas nossas faculdades ou o ensino em geral. Acredito que as organizações podem fazer mais e é essa a base do nosso trabalho. Estamos a formar quadros, a investir em programas de graduados, queremos trazer pessoas para aqui para as formarmos dentro do nosso espírito e identidade. É esse o caminho. texto Pedro Cativelos fotografia Mariano Silva
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sociedade ‘Crowd farming’, uma solução para fomentar a produtividade África detém 25% das terras agrícolas do mundo, mas só 10% do que se produz globalmente provém do continente, um problema que um conjunto de Agri-Techs, startups de tecnologia africanas, se propõe a resolver
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á um ciclo vicioso que afecta a agricultura africana que já todos conhecem. Existe um potencial brutal para a agricultura que não tem reflexos na produtividade efectiva. De acordo com a Opportunity International, a “larga maioria” dos agricultores africanos opera a apenas 40% da sua capacidade. As razões são várias: da (micro) dimensão de grande parte dos produtores à falta de tecnologia, o que desemboca (ou é a causa, daí o círculo vicioso) na falta de acesso a financiamento devido ao baixo rendimento das suas culturas, o que os impede de fornecer garantias utilizáveis por instituições financeiras para a concessão de empréstimos e, enfim, quebrar o ciclo e dar origem a um novo começo. Em 2018, havia quase 50 milhões de pequenos agricultores em África. Embora sejam responsáveis pela produção de perto de 80% de todos os alimentos do continente, a grande maioria vive com menos de 2 dólares por dia e está entre as populações mais pobres e vulneráveis do planeta. Este é o cenário de fundo que caracteriza o que é a agricultura em África, de um modo geral. No continente, o sector é responsável por cerca de 65% da força de trabalho o que nos leva a pensar que, se aproveitada correctamente, poderia ser “o ganha pão” de um mundo a precisar de sustentabilidade, como de ‘pão para a boca’. No entanto, parecem começar a surgir algumas soluções para desbloquear este problema endémico da produtividade num continente que abriga um quarto de toda a terra arável do mundo. E é num conjunto
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de startups tecnológicas africanas que ele parece estar a ser desenvolvido. Crowdfunding: a solução?
O financiamento de massas de agricultores em África foi uma manobra pioneira do Farmcrowdy, da Nigéria, mas o modelo já foi usado e adaptado por várias outras startups como a Prosper Agric, a Seekewa, a Complete Farmer, a BaySeddo, a YouFarm ou a Livestock Wealth, para citar apenas algumas. A lógica de funcionamento destas plataformas é simples: conectar usuários de qualquer parte do mundo com pequenos produtores de todo o continente africano, a quem financiam a compra de insumos em troca de retorno no final de um ciclo agrícola, garantindo escoamento dos produtos e uma receita extra. Desde o seu lançamento, o Farmcrowdy, por exemplo, gerou mais de 14 milhões de dólares de rendimento para milhares de agricultores africanos. E há novas startups que estão a causar impacto. Como a Thrive Agric, uma
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é a força de trabalho absorvida pela agricultura em áfrica. um potecial que, bem aproveitado, poderia acelerar o passo do desenvolvimento
startup nigeriana que procura tornar a agricultura rentável para os pequenos agricultores africanos através da facilitação de acesso ao financiamento, que já trabalha com 22 000 produtores e gerou melhorias na produção de mais de 127 000 toneladas de grãos. E também há a ganesa Complete Farmer, uma plataforma agrícola inovadora que, empregando tecnologias disruptivas para gerenciar fazendas e cadeias de distribuição para produtores e consumidores, permite que cada um obtenha uma vantagem competitiva em várias cadeias de valor agrícola. Em apenas dois anos, trabalhou com 1 500 agricultores e promoveu a exportação de 4 700 toneladas de matérias-primas alimentares. Depois, há o caso da Seekewa, uma agri-tech da Costa do Marfim, e a primeira plataforma participativa que permite que usuários e empresas online de todo o mundo apoiem directamente pequenos projectos agrícolas africanos, e que desta forma já canalizou financiamentos para dezenas de iniciativas. Outro caso de destaque é o da BaySeddo. www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
O impacto destas novas plataformas está a transformar todas estas startups em negócios bem-sucedidos, tornando-as cada vez mais populares entre investidores de todo o mundo Criada em 2016 por um grupo de jovens empresários senegaleses, esta plataforma de rede para agricultores e investidores do Senegal nasceu com o objectivo de optimizar a agricultura por via da tecnologia digital e até já venceu prémios internacionais, como o Pitch Agrihack 2017. Os seus primeiros resultados são já visíveis: em 2019, foram canalisados mais de 400 000 dólares em investimento através da sua plataforma. Não parece muito. Mas fez, certamente, alguma diferença. Movimento disruptivo
O impacto destas novas plataformas está a transformar todas estas startups (e há mais a caminho) em negócios bem sucedidos, o que as torna cada vez mais populares entre investidores de todo o mundo, porque combinam sectores impactantes e em voga como o www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
das fintech e os da agro-tecnologia onde há amplo espaço para expansão. E essa tendência já se nota no Farmcrowdy que se diversificou, passando para o espaço de crowdfunding mais geral, através do Crowdyvest. Segundo o director executivo (CEO) Onyeka Akumah, “o financiamento colectivo pode até ter impacto noutros sectores, como o dos transportes, por exemplo”. No entanto, prossegue, “há ainda muito mais por fazer” no espaço agrícola até porque, diz, “a indústria está a evoluir rapidamente e o potencial de solução de problemas é imenso”, observa. E é aí que o Complete Farmer está a concentrar os seus próprios esforços de expansão: “A nossa plataforma funciona no fornecimento de mercadorias, onde compradores globais que precisam de produtos de qualidade podem adquiri-los directamente a
essas fazendas ou a pequenos produtores“, explica o CEO Desmond Koney. “Os produtos são cultivados pela nossa equipa de produtores e gerentes agrícolas qualificados, com o uso de tecnologias modernas, práticas comprovadas e protocolos de cultivo certificados. Depois, a plataforma oferece aos potenciais clientes a visibilidade e controlo de todo o processo, do cultivo até à entrega final.” No entanto, o trabalho ainda não está concluído quando se trata de expandir o acesso ao financiamento para milhões de pequenos agricultores africanos. Koney fala de como a demanda por financiamento agrícola para pequenos agricultores na África Subsaariana, estimada em 11 mil milhões de dólares, se encontra actualmente a menos de 3% das suas necessidades actuais. “A natureza e a magnitude dos desafios que enfrentamos no sector agrícola africano, associados à segurança alimentar, inovação, tecnologia e produtividade agrícola são uma prova da grandeza do ‘gap’ existente entre as necessidades e a realidade do que é o financiamento agrícola em África”, assume, para prosseguir: “Esse défice estrutural de acesso ao financiamento por pequenos agricultores e outras partes interessadas da cadeia de valor é um dos principais factores que nos tornam amplamente dependentes de outras nações e continentes para alimentos que poderíamos cultivar e processar nos nossos próprios quintais! Isso está a restringir a contribuição da agricultura para a economia, para o crescimento e para o desenvolvimento.” No entanto, de acordo com Koney, a boa notícia para a agricultura e para o agro-negócio em África é que “há um crescente número de instituições financeiras e entidades que começam a utilizar a inovação como ferramenta para dar soluções a todas essas questões. Isso já é um progresso bem visível pela prevalência de plataformas de crowfunding, agri-techs e startups que estão a começar a canalizar fluxos de investimento para a criação de cadeias de valor mais sustentáveis que fazem crescer as sementes de uma nova vida para milhões de agricultores africanos.” texto Pedro Cativelos fotografia D.R.
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OPINIÃO
Cultura de Segurança e de Confiança Denise Branco • Investigadora e Consultora em Comunicação Intercultural e Tradução para Fins Empresariais, Técnicos e Científicos
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fenómeno recente do coronavírus e a forma como se tem comunicado sobre o mesmo motivou-me a convidar o leitor a reflectir sobre a noção de Cultura de Segurança, do seu papel nos actuais processos de tomada de decisão nacional e internacional (sobretudo considerando a responsabilidade organizacional pública em situações de emergência com impactos locais e transfronteiriços) e a comunicação de informação com vista a influenciar comportamentos individuais e colectivos. Nove anos depois do acidente de Chernobyl em 1986, a noção de cultura de segurança ganhou novos contornos. Saiu da agenda sectorial e passou para a lista de prioridades de organizações internacionais consideradas altamente credíveis, onde a importância de incluir as dimensões social e humana se encontra espelhada nas orientações e recomendações para a elaboração de planos de comunicação de emergência para o público. Porquê? Porque a segurança é um fenómeno que se define pela sua presença ou ausência. Muito mais pela sua ausência. É um conceito instrumental para uns; emocional para muitos outros. Segurança invoca realidades processadas automaticamente pelas experiências individuais e colectivas; sugere a existência de risco; de algo que pode prejudicar; de uma potencial ameaça; da necessidade de protecção. Invoca o instinto de sobrevivência que tem na sua base uma forte componente de medo.Se uma cultura de segurança é uma cultura informada, então temos de falar de comunicação. Continuamos a assistir ao constrangimento que muitas organizações sentem ao tentar comunicar com o público sobre um fenómeno cuja dinâmica e imprevisibilidade as expõe; situações que, no caso dos riscos transfronteiriços,
colocam as vulnerabilidades de modelos, procedimentos e medidas de segurança a olho nu. Comunicar com o público é, em si, um risco para muitas organizações; é um acto público de tomada de responsabilidade; é a demonstração do nível de confiança que existe — ou não — entre o público e a organização. Enquanto as decisões de análise e gestão do risco valorizarem mais os indicadores económico-financeiros, maior a probabilidade de a comunicação falhar porque vai basear-se na percepção de risco da empresa, em vez daquilo que o público precisa de saber. Mas nestes momentos de vulnerabilidade, e num esforço de mudar o paradigma em torno da importância da comunicação certa, na língua certa, no momento certo, pela pessoa certa, as organizações e empresas têm a obrigação, hoje, de fazer mais e melhor. Têm a obrigação de compreender que não há risco maior na cultura de segurança do que o risco de não informar, e de ignorar o impacto do erro humano e do potencial humano. E que o preço a pagar por ignorar este facto será incalculável se um dia for preciso accionar um plano inexistente. No passado dia 12 de Fevereiro, numa nota de imprensa, o Director-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, recorreu a metáforas bélicas para apresentar a epidemia do coronavírus como um “teste de solidariedade-política, financeira e científica”, pedindo que todos se juntem para lutar contra um inimigo comum que não conhece fronteiras e que o melhor de cada um fosse colocado ao serviço desta luta. Aproveitando a metáfora, e enquanto a comunidade científica procura respostas, pergunto: estamos a saber comunicar? Ou estamos a deixar que os rumores e as teorias populares reforcem comportamentos de risco?
Mas nestes momentos de vulnerabilidade, e num esforço de mudar o paradigma em torno da importância da comunicação certa, na língua certa, no momento certo, pela pessoa certa, as organizações e empresas têm a obrigação, hoje, de fazer mais e melhor
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lá Fora
devem os reguladores tornar públicos os ratings secretos?
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O Federal Reserve e o Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC) querem mais informações sobre os Uniform Financial Institution Ratings Systems, mais conhecidos por CAMELS, que regem como os bancos são classificados s ratings camels (acrónimo que representa a medida de rating aplicada pelos reguladores aos bancos norte-americanos) formam a espinha dorsal da regulamentação e supervisão bancária, tornando-os essenciais para a saúde de todo o sistema financeiro norte-americano e global. Actualmente, eles são confidenciais, tendo alcançado um estatuto legal que supera os requisitos das empresas públicas de divulgação de problemas materiais. O trecho abaixo é da minha carta de comentários que propõe a classificação agregada do CAMELS para os
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clientes de todos os bancos e porque penso que isso melhoraria a regulação financeira e os mercados. ‘Go public or go home’
Tornar públicos os ratings CAMELS dos bancos pode parecer algo radical, pois estes eram tão cuidadosamente protegidos que, até em 1997, os reguladores nem divulgavam os CAMELS ao próprio avaliado. No entanto, uma análise cuidadosa prova que, para as maiores instituições financeiras, CAMELS negativos já são tornados públicos. Isso ocorre porque o FDIC publica os activos agregados de todas as instituições problemáticas, definidos com base
numa classificação CAMELS agregada de quatro ou cinco, trimestralmente, como parte do seu perfil bancário trimestral. Actualmente, esses bancos detêm activos cumulativos de 49 mil milhões de dólares, uma faixa consistente com a experiência em períodos sem crise. Isso, juntamente com o número de bancos com carteiras de activos semelhantes abaixo de 10 mil milhões de dólares, torna praticamente impossível identificar instituições menores específicas nessa lista, dando-lhes, assim, relativo anonimato. A adição a esta lista de qualquer um dos dez principais bancos do mercado www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
aplicado arbitrariamente no que se refere à privacidade, dependendo da dimensão dos activos de uma determinada instituição, faz ressaltar a necessidade de reconhecer os problemas que isso cria e considerar alternativas. Tornar públicas todas as classificações de instituições é uma solução para nivelar o campo de jogo e criar muitas outras ramificações positivas, como fornecer mais informações aos participantes do mercado sobre a saúde das instituições financeiras, por exemplo. Afinal, os participantes do mercado não deveriam ter o direito de saber se o Governo acredita que uma instituição financeira está à beira do colapso? Por outro lado, se o Governo acredita que uma instituição apresenta uma excelente saúde financeira, essas informações são importantes. Por fim, a questão da transparência das classificações iria melhorar a qualidade da regulamentação financeira,
e que até forneceu condições ao mercado e disciplina para trabalhar de forma mais eficaz”. Por fim, a Lei Dodd-Frank criou um novo regime de resolução de falhas na qual reguladores e formuladores de políticas expressaram grande grau de confiança especialmente pela forma como evitaria um possível contágio da falha idiossincrática de qualquer instituição financeira de grande porte: se um banco gigantesco pode ser mal administrado, os formuladores de políticas precisam de deixá-lo falir. Tornar públicas as classificações, ajuda a aumentar a responsabilização dos reguladores que se comprometeram a acabar com o ‘demasiado grande para falir’. Maximizar a transparência e preservar o valor ideal das informações confidenciais de supervisão são objectivos duplos na política de regulamentação financeira. A tensão inerente entre
Maximizar a transparência e preservar o valor ideal das informações confidenciais de supervisão são objectivos duplos na política de regulamentação financeira tornaria facilmente perceptível ao público que um banco de grande dimensão foi adicionado, pois cada um tem mais de 300 mil milhões em activos totais. Dada a dimensão única de cada banco, não seria difícil descobrir de qual deles estaríamos a falar. A questão da transparência
Hoje, é fácil identificar a adição de certos bancos mais pequenos - por exemplo, existe apenas uma instituição com activos entre 80 e 90 mil milhões de dólares. Somente abaixo do limite de 50 mil milhões de dólares há bancos suficientes para que não seja fácil perceber de qual deles estaríamos a falar. Assim, o sistema actual torna, de facto, público um pequeno subconjunto das maiores instituições financeiras com classificação CAMELS cumulativa, embora de forma indirecta e ligeiramente atrasada. Isso cria um campo de jogo desnivelado pelo qual uma série de incentivos são aplicados a reguladores e instituições financeiras, o que não existe para as entidades de menor poderio financeiro. O facto de o status quo não ser consistente entre as instituições e de ser www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
exigindo que os reguladores defendam as suas avaliações para o mercado e, mais importante, para o público em geral. Operadores não querem
As duas principais objecções para se tornarem públicos os CAMELS são as preocupações de que isso reduziria a qualidade da supervisão bancária e iria aumentar o potencial de execução num banco que foi, digamos assim, rebaixado. As evidências sobre a exigência de divulgar ratings aos bancos que estão a ser classificados mostram que não houve redução na eficácia da supervisão (Feldman, Schmidt e Jagtiani). Da mesma forma, no que diz respeito ao risco de execução, pesquisas do Federal Reserve de Boston (Rosengren, Peek e Jordan) analisaram o papel do aumento da divulgação de acções de fiscalização no contexto bancário dos EUA e dos problemas bancários globais em crises anteriores à Grande Crise Financeira e descobriram que “melhorar a divulgação em bancos americanos em dificuldades durante a crise bancária não era desestabilizador
ambos cria um problema de análise na determinação exacta da quantidade e do tipo de informação divulgada ao público, bem como o momento ideal para proceder à divulgação de tal informação. Forneça muitas informações muito cedo e os riscos aumentam. Faça-o muito pouco, tarde, e os incentivos económicos e de mercado não se vão aplicar segundo as regras que todos conhecemos, causando ineficiência e aumentando o grau de risco. O sistema existente, através de um conjunto subestimado de normas diferentes, criou um regime de dois níveis, sujeitando as maiores e mais poderosas instituições financeiras a um nível de facto diferente, e mais favorável do que as instituições menores. E o que antes era considerado radical e imprudente ao nível da transparência nas decisões de política monetária tornou-se agora uma realidade cada vez menos clara. texto Aaron Klen, Director de Políticas Económicas, Centro de Regulação e Mercados do Brookings Institute Fotografia d.r.
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NOVOS ÂNGULOS
O vírus viral
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Pedro Cativelos • Director-Executivo da Media4Development
izem-nos as notícias que o coronavírus é o tema do momento, uma pandemia mundial que nos obrigou, de forma abrupta, a mudar a nossa maneira de olhar e viver este mundo. Pode não ser mais endémica ou letal do que alguma das outras epidemias com que nos habituámos a conviver ao longo dos anos. Em 2018, a malária contaminou 228 milhões de pessoas e vitimou 405 mil. Não é uma fake news. Está escrito no relatório mundial sobre a malária, lançado pela OMS. E a própria gripe, nas suas variadas estirpes, vitimou, de acordo com a mesma OMS, entre 500 mil a 650 mil pessoas em todo o mundo, em 2019. E poder-se-ia falar dos diversos tipos de cancro que alastram incansavelmente à nossa volta. Da diabetes, da tuberculose ou do HIV. E de tantas outras enfermidades que vitimam mais do que este vírus que tomou conta das manchetes e dos nossos telemóveis. No entanto, a taxa de transmissão e a rapidez com que se propagou é assustadora e merece uma atenção redobrada e todos os esforços de Governos, Instituições e cidadãos na sua contenção. E dos médicos que a combatem, na primeira linha da nossa defesa colectiva. Obrigado a eles, por cuidarem dos que mais precisam, expondo-se ao risco. O que temos estado a viver nas últimas semanas e o que nos aprestamos para enfrentar nos próximos tempos traz consequências, a vários níveis imprevisíveis, que testam o modo como vivemos em sociedade e a forma como nos relacionamos com o mundo e com o próximo. Da macroeconomia à microeconomia de todos os dias. A esse propósito, o modo como hoje nos relacionamos e interagimos em sociedade mudou. Já demos por isso. E tornou-se viral também ao nível da informação, e este é só mais um exemplo, porventura o maior de todos. Olhando ao modo como a informação hoje circula, especialmente via redes sociais, tornou-se difícil saber o que é e o que não é verdade, num caso que, não me parece um fenómeno de voragem informativa assim tão diferente de outros que o antecederam. Lembro-me, sem ir pesquisar, como ganharam relevância nas opiniões do
dia-a-dia, Trump, Bolsonaro, o movimento Me Too, os incêndios na Amazónia e na Austrália, o Príncipe Harry e a Meghan Markle e tantos outros. Nada tão globalizado como o que hoje, de facto, vivemos. E que é preocupante a todos os níveis. Todos estes casos alastraram pelo mundo da opinião pública tendo na origem alguns factos verídicos que acabaram por se encaminhar para o extremismo das opiniões, agora muito mais facilmente transpostas para o nosso dia-a-dia. Até há dez anos era diferente. Era o dia-a-dia que estava na televisão, nos jornais e na internet. Hoje, em muitos casos, é ao contrário, e são os media que condicionam a vida da sociedade, massificando o que é a notícia. E tal como a máquina de polimento de uma qualquer indústria, a massificação (neste caso da informação) retira as particularidades singulares das coisas simples. Torna-as básicas e pouco idiossincráticas, rouba-lhes a identidade própria e transforma-as em produtos aparentemente standartizados. Será esta uma das mudanças que mais nos escapou nos últimos anos: a industrialização da Verdade que os novos media nos vieram trazer. Ou o processo em que esta (a Verdade) é seleccionada, escolhida e triturada para tornar fácil a cada um de nós o seu consumo, em pequenos pedaços a que depois damos uso, partilhando com os outros (todos nós o fazemos) sem pensar muito bem nas consequências dessa partilha. Curioso que haja cada vez mais gente a emitir opinião, mas que exista actualmente muito menos diversidade nas opiniões. É já, quanto a mim, uma consequência de todo este processo. O que me parece que este vírus vai pedir de todos é esse tal novo modo de olhar e participar na vida em sociedade. Com mais verdade e sentido colectivo, maior respeito pelo próximo e um crescente sentimento de partilha do que é bom, em vez de apenas uma repartilha do que nos chega, e que é mau. Este é o momento para agir e, mais do que fazer like, criar com gosto uma verdadeira mudança. Não de opinião, mas de acção.
O que este vírus vai pedir de todos é esse tal novo modo de olhar a vida. Com mais verdade e sentido colectivo, maior respeito pelo próximo e um sentimento de partilha do que é bom
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ócio
(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio
60 Desta vez, a sugestão de Escape leva-nos até à Ilha de Santiago, em Cabo Verde
g
e 62 À descoberta do Black Salt, onde a arte se degusta num espaço de excelência
63 Uma degustação de algumas referências de runs que ganham cada vez mais espaço nas garrafeiras
Santiago
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Cabo Verde
Ilha misteriosa
e
dos tempos. Assim, a viagem implicava deslocação não só no espaço, mas também no tempo. Chegar ao Arquipélago de Cabo Verde significa encontrar muitas surpresas, começando pela grande variedade de paisagem (terrestre, marinha e subaquática). Num território relativamente pequeno, encontramos monumentos históricos, praias sem fim, costas rochosas com piscinas naturais, ribeiras de vegetação luxuriante ou desertos de pedra e areia. A ilha de Santiago, que ainda não está colonizada por turismo de massa, corresponde perfeitamente ao velho sonho de encontrar uma ilha misteriosa e afastada do barulho do mundo. Assim, Santiago oferece ao
a terra onde o deserto encontra o mar e as ilhas atlânticas que desde sempre fomentavam o imaginário, e enquanto o Mediterrâneo era conhecido já na Antiguidade como Mare Nostrum, o Atlântico era visto como infinito e tenebroso. Desde Platão conhecemos o mito de Atlântida, como civilização desenvolvida, mas perdida algures e meio esquecida. Se olharmos para as crónicas marítimas, reparamos, em primeiro lugar, que antigamente a navegação no Atlântico era difícil (distâncias, ventos, mar bravo e imprevisível, ilhas pouco numerosas). Juntando isso com instrumentos de navegação imperfeitos, e embarcações frágeis, o cenário ficava assustador, mas o perigo fomentava a imaginação. Em consequência, nasceu o mito de uma ilha mágica, rodeada pelo oceano e envolta na bruma
no Atlântico viajante a possibilidade de procura de um mundo diferente, próximo ao poema “Perfume Exótico” de Charles Baudelaire, que aportou na ilha em 1841: Um éden terreal, uma indolente ilha com plantas tropicais e frutos saborosos; onde há homens gentis, fortes e vigorosos, e mulheres cujo olhar honesto maravilha. A ilha de Santiago é reservada aos viajantes exigentes, que querem descobri-la com calma, saboreando as composições da sua música, arquitectura e paisagem. Na Cidade Velha, antiga Ribeira Grande (Património Mundial da UNESCO), podemos visitar ruínas da mais antiga catedral erguida nos trópicos (século XV), uma fortaleza colonial, a antiga praça de compra e venda
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de escravos com o pelourinho que ainda lembra castigos ministrados outrora. Com um pouco de sorte podemos assistir a um concerto no edifício do antigo convento de São Francisco. As ruínas de vários edifícios religiosos lembram tempos do padre António Vieira. A cidade da Praia (actual capital) desenvolveu-se devido a decadência da Ribeira Grande, após saques perpetrados pelos corsários tão famosos como Francis Drake ou Jacques Cassard. A cidade conserva a sua parte colonial situada num plateau rochoso com vista para a Baía de Santa Maria. O visitante não deve perder o mercado tradicional com a sua gama de cores, música da língua crioula e aroma das especiarias. Na mesma zona algumas lojas ainda vendem candeeiros a petróleo e as barbearias lembram filmes antigos. A cultura crioula testemunha a miscigenação, o melting-pot de línguas, tradições e raças que marcaram Cabo Verde. Visitando a vila podemos entrar na Biblioteca Nacional para descansar um momento na livraria-café, saboreando o café cultivado nos socalcos vulcânicos. Para os amantes da natureza podemos recomendar dois parques naturais no coração montanhoso da ilha: Serra de Malagueta e Pico d’Antónia. Nas duas serras podemos contemplar a natureza com diversidade de plantas endémicas e aves. As zonas mais altas oferecem vistas deslumbrantes de ribeiras verdes que desembocam no Atlântico. As duas ilhas mencionadas podem ser o destino da próxima viagem. Como disse Baudelaire: “Uma ilha vista de longe é uma promessa”. texto Wlodzimierz J. Szymaniak, na Ilha de Santiago fotografia Istock Photo
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Chegar ao Arquipélago de Cabo Verde significa encontrar muitas surpresas, começando pela grande variedade de paisagem terrestre, marinha e subaquática Roteiro Como ir
A cidade da Praia dispõe de ligações aéreas directas de Lisboa (TAP, TACV), Casablanca (Air Maroc), Las Palmas (Binter), Dakar, Bissau, Paris, Amsterdão, Providence (TACV), Fortaleza (TACV), Ponta Delgada (SATA). Para outras ilhas pode viajar-se de avião ou de barco. Onde dormir
Existem muitos hotéis e para todos os gostos. Pode encontrar informação credível no site www.turismo.cv. Recomenda-se pequenos hotéis de charme no centro histórico da Praia. Onde comer?
Nos restaurantes com esplanadas na rua Serpa Pinto (rua pedonal em Praia) ou nos restaurantes com vista para o mar na Cidade Velha. Cuidados a ter
Negociar sempre o preço do táxi antes de iniciar uma viagem (preço médio de um trajecto de táxi na cidade da Praia é de 250 escudos cabo-verdianos (CVE), cerca de 165 MZN). Evite muita exposição ao sol tropical.
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Maputo tem visto surgir alguns espaços que têm como denominador comum a proposta de um “conceito”
Black Salt
Av. Kenneth Kaunda, 470 Maputo
84 049 8787
g em anos recentes, Maputo
tem visto surgir alguns espaços que têm como denominador comum proporem, mais do que a mera degustação gastronómica, um “conceito”, isto é, são espaços que se caracterizam por integrar outras componentes (arte, moda, etc.) e privilegiam a ideia – que tem sido uma das tendências internacionais marcantes nas últimas duas décadas – de que aquilo que os consumidores mais sofisticados procuram hoje são sobretudo “experiências”, momentos estimulantes, memoráveis e “únicos”. O “Black Salt” insere-se nesta linha de espaços “conceptuais”: o apurado design e a escolha de objectos artísticos a marcar toda a envolvência (mobiliário, esculturas, pinturas) sublinham, de forma inequívoca, a vontade de identificar o projecto como alinhado com o modelo “art & food” presente em inúmeras capitais e espaços
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Black Salt, arte e gastronomia urbanos mais cosmopolitas. No que toca à restauração propriamente dita, uma das particularidades mais interessantes do “Black Salt” é a existência de três menus distintos: no primeiro, a lista é essencialmente constituída por uma variedade de entradas, saladas, peixes, mariscos e carnes; no segundo, a proposta é definida como sendo de “Comida Saudável” e, no terceiro, intitulado “Menu da Nossa Terra”, a ementa gira em torno da gastronomia moçambicana. Vejamos então, mais em detalhe, o que cada um destes menus nos propõe. No que toca ao primeiro, na componente das saladas, um destaque deve ser dado a três ofertas igualmente sugestivas. Em “Cry for Me”, a salada compõe-se de carne de vitelo, alface, abacate, fruta da época, rúcula, tomate cereja,
num espaço de excelência cebola roxa e torradas. Na salada “Cobb”, a sua composição inclui pequenos pedaços de peito de frango, bacon, abacate, cebola, ovo, queijo parmesão e torradas. Finalmente, na “Sea Food Lover”, encontramos camarão, peixe, lulas, salsa, pepino, tomate cereja, cebola roxa e torradas. Passando agora ao menu da “Comida Saudável”, entre os pratos principais destaque-se, em primeiro lugar, a “Beringela à Parmesão” e a “Salada de Legumes no Forno”. A ementa propõe-nos ainda uma série de pratos à base de massas. As sugestões principais incluem “Noodles de Aboborinha e Frango”, “Noodles de Cenoura com mistura de vegetais” e “Noodles de Aboborinha e Peixe na Manteiga”.
Olhemos, por fim, para o “Menu da Nossa Terra”, em que as “especialidades da casa” são constituídas por uma “Matapa com camarão e arroz” e um “Caril de Camarão com côco e arroz”. Mas há outras opções a merecer atenção. Entre elas as “Tripas de Cabrito (Kongué) com arroz”, os vários pratos de caril, entre os quais cumpre destacar o “Caril de Quiabo com camarão, côco e arroz” e ainda o “Frango à Zambeziana com Mukuane e Mucapata”. Em síntese, seja qual for a sua preferência, não faltam boas razões para uma visita ao “Black Salt”. texto RUI TRINDADE fotografia MARIANO SILVA
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Produtores de rum têm vindo a investir, cada vez mais, em séries limitadas
Mount Gay Eclipse paÍs Barbados Cor Âmbar dourado brilhante Aroma Florais e frutados (com destaque para damasco e banana) e com notas de baunilha Paladar Notas torradas subtis transmitidas pelas barricas de carvalho de Kentucky em que é envelhecido Teor alcoólico 40%
reinvenção do Rum, das séries limitadas Bacardi Carta Blanca País
Porto Rico Cor
Branca, clara como cristal Aroma
Muito delicado de citrino e madeira de bambu Paladar
Santa Teresa 1796 paÍs Argentina Cor Âmbar escuro Aroma Frutado, com notas de mel e chocolate preto Paladar Notas de tabaco e couro com um equilíbrio e suavidade extraordinário Teor alcoólico 40%
Kraken Black Spiced paÍs Trinidad e Tobago Cor Âmbar escuro Aroma Notas de café, caramelo, toffee e especiarias Paladar Redondo, picante e presença equilibrada de caramelo, baunilha e das várias especiarias Teor alcoólico 40%
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Limpo e seco, mas muito leve, com açúcar mascavado, queijo azul, maçãs, pêras e notas de baunilha, caramelo e uma ligeira pitada de pimenta preta Teor alcoólico
37,5%
às variedades aromatizadas
o ano que agora está a começar poderá vir a ser marcado pela chegada do rum ao topo das bebidas mais preferidas pelos consumidores. Essa é, pelo menos, a opinião, entre outras, da consultora britânica Jefferies International. A principal razão que leva a consultora a fazer esta previsão decorre do “boom” que se tem vindo a verificar no mercado dos “cocktails” e, também, por se ter vindo a assistir a um reposicionamento das marcas de rum (à semelhança do que aconteceu há alguns anos atrás com a vodka) no sentido de dotar a bebida de uma imagem “sofisticada”. Só no Reino Unido, por exemplo, o aumento no consumo de rum foi de 7,5% entre 2017 e 2018, quase o dobro do gin. O rum branco é ainda o mais consumido, mas os analistas sublinham que o crescimento mais significativo tem sido nas vendas de rum com sabores ou com especiarias. É verdade que, desde os anos noventa, a Bacardi, porventura a marca de rum mais popular do planeta, já vinha lançando no mercado uma infinidade deste tipo de variantes (Limón, Spice, Coconut, Silver, Peach Red, Big Apple, etc.). Mas agora não são apenas as marcas “clássicas” a investir neste nicho de mercado, há também uma série de novos produtores. Por outro lado, os produtores de rum têm vindo a investir na produção de séries limitadas o que lhes permite um posicionamento no segmento de mercado de luxo onde abundam os apreciadores de produtos “exclusivos” e “únicos”. Das várias opções possíveis (e são cada vez mais numerosas), deixamos aqui algumas sugestões. A começar por um “clássico”: o “Bacardi Carta Blanca”, o mais famoso e consumido mundialmente. Feito pela primeira vez em 1862 por Don Facundo Bacardi Massó (fundador da Bacardi), continua a ser um rum branco perfeito e ideal para uma grande variedade de “cocktails”. Outra proposta, é o “Santa Teresa 1796 que continua a ser um rum único e, sem dúvida, um dos melhores do mundo. Finalmente, entre as novidades mais recentes, o “Kraken Black Spiced”, produzido em Trinidad e Tobago, constitui uma experiência a não perder. É um rum escuro, aromatizado com 13 especiarias diferentes e com um toque picante que o torna inconfundível.
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• em destaque Timbila Tathu – Política Cultural e Construção da Identidade em Moçambique Marílio Wane Edições Khuzula
“A Economia dos Pobres – Repensar de Modo Radical a Luta contra a Pobreza Global” (Ed. Temas & Debates”)
O livro “Timbila Tathu – Política Cultural e Construção da Identidade em Moçambique”, da autoria de Marílio Wane, nasce da dissertação de mestrado intitulada “A Timbila chope: construção de identidade étnica e política da diversidade cultural em Moçambique (19342005)” defendida pelo autor na Universidade Federal da Bahia (Brasil), em 2010. Em cinco capítulos, Wane aborda o papel desta expressão cultural na construção da identidade nacional em Moçambique. Desde o seu nível local, como símbolo da identidade do povo chope, à sua dimensão universal, atingida através da proclamação como “património da Humanidade” pela Unesco (em 2005), o percurso desta expressão de música e dança revela aspectos importantes de como se deram, ao longo da História, as relações entre a cultura e os diversos projectos políticos vigentes no país. Marílio Wane nasceu a 25 de Maio de 1980, na Cidade da Beira. É licenciado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (Brasil) e Mestre em Estudos Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia (Brasil).
Abhijit V. Banerjee e Esther Duflo receberam (juntamente com Michael Kremer) o Prémio Nobel da Economia 2019. Uma boa altura, portanto, para ler ou reler o seu livro “A Economia dos Pobres – Repensar de Modo Radical a Luta contra a Pobreza Global” (Ed. Temas & Debates”) o qual condensa o essencial da sua investigação. Durante mais de 15 anos, os autores trabalharam em dezenas de países dos cinco continentes, tentando compreender os problemas específicos que surgem com a pobreza e encontrar soluções consistentes. O seu livro é, em simultâneo, radical, na medida em que repensa a economia da pobreza, e inteiramente prático nas sugestões que oferece, permitindo uma visão autêntica das vidas dos mais pobres do mundo.
música filmes livros
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EXPOSIÇÕES
“Ciclo de Cinema Francófono
Capulanas: Mistérios e Tendências MASSUNGANHANE
Centro Cultural Franco-Moçambicano Inauguração: 9 de Março Hora: 18h30
Fundação Fernando Leite Couto Inauguração: 4 de Março Hora: 18h Debate com MASSUNGANHANE sobre a exposição Capulanas: Mistérios e Tendências
Fundação Fernando Leite Couto Dia: 17 de Março Hora: 18h “Através da Lente: violência baseada no género a preto e branco” Micas Mondlane
Centro Cultural Franco-Moçambicano Inauguração: 9 de Março Hora: 18h30 Se me Quiseres Conhecer – uma reflexão fotográfica entre dois mundos” Ricardo Franco Curadoria: Miguel Rego
Centro Cultural Franco-Moçambicano Inauguração: 10 de Março Hora: 18h30
CINEMA Semana de Cinema Africano (5ª edição)
Centro Cultural Franco-Moçambicano Inauguração: 4 de Março Hora: 18h
TEATRO CADA CANTO UMA VOZ Instalações teatrais e performativas de Mulheres
Fundação Fernando Leite Couto Dia: 12 de Março Hora: 18h MBILA! (Teatro Infantil) Dramaturgia e encenação de Rogério Manjate Interpretação de Milsa Ussene e Fernando Macamo
Fundação Fernando Leite Couto Dia: 21 de Março Hora: 10h30
MÚSICA KONGOLOTI SESSIONS DATTIE CAPELLI
Fundação Fernando Leite Couto Dia: 13 de Março Hora: 18h KONGOLOTI SESSIONS CANTINHO DAS CORES TRKZ, May Mbira e Nanndele em sons experimentais
Fundação Fernando Leite Couto Dia: 19 de Março Hora: 18h
LITERATURA
THE DEVIL AND DANIEL JOHNSTON (documentário) Realização Jeff Feuerzeig
Lançamento do livro “Vestidos de Terra” de Rogério Manjate
Fundação Fernando Leite Couto Dia: 10 de Março Hora: 18h
Fundação Fernando Leite Couto Dia: 5 de Março Hora: 18h www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
“Capital Africana da Cultura”
Em Marrakech vão marcar presença 20 galerias da Bélgica, Costa do Marfim, Egipto, França, Alemanha, Itália, Marrocos, Senegal, África do Sul e Reino Unido
Marrakesh vai ser Capital a cidade de marrakesh, em Marrocos, vai ser, durante 2020, “Capital Africana da Cultura”. O projecto “Capitais Africanas da Cultura” começou a tomar forma no âmbito das cimeiras “Africities” e o objectivo, à semelhança do que acontece com projectos similares existentes noutros continentes, é que diferentes cidades de África venham a ser designadas, periodicamente, como “capitais da cultura”. O programa, que arrancou a 31 de Janeiro, inclui um extenso número de eventos e tem como Director Artístico Younès Ajarraï. Além das iniciativas especificamente concebidas para a “Capital Cultural”, o programa vai integrar também eventos organizados por numerosas instituições e organizações locais. Do programa, destaca-se, em primeiro lugar, a abertura da exposição
Africana da Cultura em 2020 “Have you seen a horizon lately?” no MACAAL (Museu de Arte Contemporânea Al Maaden). Desde a sua abertura, que o MACAAL, com um conjunto de exposições e iniciativas absolutamente notáveis, colocou, de forma incontornável, Marrakesh no mapa da arte contemporânea. Esta exposição, cujo título remete para uma música de Yoko Ono, que tem curadoria de Marie-Ann, conta com a participação de trabalhos de Rahima Gambo, Akira Ikezoe, Kapwani Kiwanga, Amina Benbouchta e da própria Yoko Ono. De referir ainda várias iniciativas no Musée Yves Saint Laurent Marrakech, a realização do Marrakech International Film Festival e, em particular, a nova edi-
O programa conta com a presença de 20 galerias de primeiro plano e obras de mais de 65 artistas consagrados www.economiaemercado.co.mz | Março 2020
ção da 1:54 – Contemporary African Art Fair. Criada por Touria El Glaoui, esta feira de arte contemporânea de África começou por se afirmar na cena internacional com as suas edições em Londres e Nova Iorque. Em 2018, decorreu a primeira edição em Marrakech e, face ao sucesso da iniciativa, o programa deste ano conta com a presença de 20 galerias de primeiro plano - provenientes da Bélgica, Costa do Marfim, Egipto, França, Alemanha, Itália, Marrocos, Senegal, África do Sul e Reino Unido – e obras de mais de 65 artistas tanto consagrados como emergentes. A escolha de Marrakech teve em atenção, para além da riqueza do seu património cultural e do dinamismo da sua vida cultural, o facto de dispôr de uma infra-estrutura turística capaz de acolher os milhares de visitantes que são esperados ao longo do presente ano.
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Single Drive RWD
Autonomia de 460 km, que pode chegar até aos 560 km. Equipado com bateria de 65 kWh de capacidade
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Aiways U5, o primeiro SUV
eléctrico chinês na Europa o aiways U5 vai ser o primeiro SUV eléctrico chinês a chegar ao mercado europeu - o início da sua comercialização está previsto para o segundo semestre de 2020 – e marca o início da ofensiva chinesa, neste segmento de mercado, ao nível mundial. Para demonstrar ao mercado europeu (e mundial) as qualidades e capacidades do Aiways U5, o fabricante chinês apostou forte numa primeira apresentação pública no Salão Automóvel de Frankfurt, em Setembro do ano passado. Assim, a empresa organizou uma viagem do Aiways U5 entre Xian (China) e Frankfurt (Alemanha) onde o SUV teve uma entrada triunfal. A viagem durou 53 dias e atravessou 12 países (China, Cazaquistão, Rússia, Finlândia, Noruega, Suécia, Dinamarca, Holanda, Bélgica, França, Suíça e Alemanha). Um feito notável - e que já entrou mesmo para o Livro de Recordes da
Guinness como a “mais longa viagem ‘eléctrica’ de sempre” – pois o Aiways U5 percorreu 15 022 km, incluindo zonas onde a infra-estrutura de carregamento não abunda (basta pensar, por exemplo, no Deserto de Gobi, na estepe cazaque ou nos Montes Urais). Tendo obtido a certificação necessária para comercializar o seu SUV U5 em qualquer parte da União Europeia, a marca chinesa anunciou que embora os seus alvos prioritários sejam a Noruega, a Alemanha e a Holanda, pretende alargar rapidamente a sua comercialização a outros países europeus. O Aiways U5 é maior que a concorrência – 4 680 mm de comprimento vs 4 375 mm do e-Niro e 4 180 do Kauai e 1 880 mm de largura e 1 680 mm de altura – e tem uma
autonomia de 460 km, que podem ir até aos 560 km se forem alugados módulos de baterias adicionais. Possui uma bateria de 65 kWh de capacidade, densidade de 181 Wh/kg, podendo carregar em apenas 27 minutos entre 30% a 80% da sua capacidade, com um carregador rápido de 50 kW DC. Mas não é só em termos de fabrico de veículos eléctricos que a China se destaca. Este país também lidera a produção de baterias de iões de lítio, fonte de energia responsável pela locomoção destes veículos. Em 2017, a China era responsável por 60,1% da produção mundial destas baterias e, segundo a Benchmark Mineral Intelligence, estima-se que esta liderança não será ultrapassada nos próximos dez anos. Segundo a revista “Bloomberg”, o valor-base de comercialização do U5 será de 25 000 euros.
O Aiways U5 fez “a mais longa viagem ‘eléctrica’ de sempre”
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