Estresse na raiz da fertilidade

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&


• Pesq~~a

Ciência e Tecnologia no Brasil www.revislapesquisa.fapesp.br

SEÇÕES

REPORTAGENS

CARTAS

5

OPINIÃO

6

José Fernando Perez

CARTA DO EDITOR

7

MEMÓRIA

8

Há 590 anos, Brunelleschi redescobria a perspectiva linear

,(

CAPA

CITRICULTURA

Estresse gerado por breves ausências da mãe depois do parto afeta profundamente a vida de filhotes

Empresa de biotecnologia cria exame para identificar morte súbita dos citros

26

34

IMPORTAÇÕES

Diálogo com os árabes, no idioma da ciência Falta convencer os credores A genética mobiliza os britânicos Livre acesso aos primatas chineses A crônica pilhagem do tesouro afegão Parque construído em silêncio

Propostas de compra de bens e serviços voltam a ser analisadas

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

ESTRATÉGIAS 10 10 11 11 11 12

27

ACIDENTE DIFUSÃO Centro de Óptica e Fotônica dismistifica a física para a comunidade de São Carlos ....

28

INOVAÇÃO Curso de capacitação de gestores vai apoiar empresas do PIPE

29

CIÊNCIA Destruição do VLS sugere uma revisão do Programa Espacial Brasileiro

BIOQUÍMICA 16

MEDICAMENTOS No México{ como no Brasil Ciência na web Osolhos do Brasil sobre Moçambique O resgate da memória da ciência Aids na fronteira da perdição Diversidade no encontro da Anpocs O fim do militante da saúde pública

12 12 13 13 14 14 14

Brasil integra esforço mundial para o desenvolvimento de novas drogas

20

FOMENTO Ministério firma convênios com FAPs para incentivar pesquisa regional

24

Uma nova explicação para a origem do mal de Parkinson e de doenças raras

40

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 3


________________________

~~~~~!S~qlli!S....:êl~~ciê=nc=ia=e~~~cn~o,~og~ia~nO~B~ra~sil~ ~

_

FAPESP

REPORTAGENS

SEÇÕES Bom senso no mundo da patentes Nova roupagem, com mais conteúdo

15 15

LABORATÓRIO As cores secas ou frescas O sagrado sono dos adolescentes Cinco anos até publicar um artigo

30 30 30 "

Ê o c

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~

INFORMÁTICA

GENÔMICA Genoma da cana impulsionou projetos, empresas e carreiras científicas

44

NEUROLOGIA Diferença de temperatura nos ouvidos sugere que o sagüi do Cerrado tem um cérebro complexo

1\\111

54 Sistema desenvolvido na UFMG permite controlar a privacidade na Internet

AMBIENTE

....

76

Compostos orgânicos urbanos utilizados como adubo são analisados por software

78

AGRICULTURA

Água não é mais H20 Comparando ratos e elefantes Insulina para correr mais O destino do submarino ultraveloz Caminho livre para as bactérias Fisicos numa mina de ferro

31 31 31 32 33 33

SCIELO NOTÍCIAS

60

LINHA DE PRODUÇÃO Transformações na emissão de luz ...•.... Ovelhas e gansos entre as vinhas O menor motor elétrico do mundo Plataforma produz metanol Rosto é a senha de acesso

MEDICINA

São Paulo recupera 3,8% da vegetação natural e inverte tendência de desmatamento

Patente do Catuama garante medicamento que reverte fibrilação ventricular

82

HUMANIDADES 48

ILUSTRAÇÃO

COSMOLOGIA 62 62 63 63 63

Físicos selecionam as partículas candidatas a compor a matéria escura 56

TECNOLOGIA ENGENHARIA

DE MATERIAIS

Pesquisa recupera a divertida e crítica epopéia satírica de Manuel de Araújo Porto-Alegre Pássaros distantes de curtos-circuitos Chip acústico para controlar percevejo Secagem com chaminé solar Energia eólica oxigena água Patentes

64 64 64 65 65

RESENHA Os Caminhos dos Livros, de Márcia Abreu

94

LANÇAMENTOS

95

CLASSIFICADOS

96

ARTE FINAL

98

HOMENAGEM Polímero derivado do óleo de mamona, sintetizado no Brasil, ganha mercado externo

Morto aos 73 anos, o poeta Haroldo de Campos não cabia dentro de rótulos

Pesquisador cria kit com peças de plástico que mostram estruturas protéicas em forma tridimensional

88

ARQUITETURA 66

DIFUSÃO

4 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

84

72

Tese analisa conceitos de patrimônio histórico de Lúcio Costa ..... Capa: Hélio de Almeida sobre obra A Virgem com o Menino, Filippo Lippi

90


cartas@fapesp.br

Matemática É lastimável o texto intitulado "Será que o Abel pode ser um Nobel?" publicado em Pesquisa FAPESP (edição nv 90). Na ficha técnica da revista (página 7) se lê "Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESP':Bem, a nota publicada não está assinada, depreendo que ela reflete a opinião da FAPESP.Como o texto é pejorativo à comunidade matemática, rogo-me no direito e dever de formular uma resposta ante a minha perplexidade. Em linhas gerais, o texto é maldoso, pois é pouco informativo e diz que a matemática não é digna da criação do Prêmio Abel, porque não goza de popularidade. O texto completo está no final dessa mensagem. Vejamos algumas pérolas: "longe do apelo popular", "será que a matemática tem charme suficiente para emprestar ao Abel?","Mas, do ponto de vista do público, que peso isso tem? Talvez nenhum:' Concluo que à FAPESP só interessa apoiar uma ciência de "apelo popular", é claro que isso não é verdade. O texto deveria divulgar que na comissão de cinco matemáticos responsáveis pela escolha daquele que deveria ser o primeiro a ser agraciado com o Prêmio Abel, o Brasil teve a honra de contar com o eminente matemático brasileiro Iacob : Palis. Isso é apenas um primeiro indicativo do prestígio e importância que a matemática brasileira tem nos meios acadêmicos mundiais. Além disso, o Brasil está numa boa posição no ranking que mede a pesquisa em matemática mundial, ao lado de: Austrália, Bélgica, Hungria, Índia, Polônia e Espanha. Detalhes de como o ranking é feito podem ser encontrados em www.mathunion.org. Há diversos centros onde se faz pesquisa de ponta no Brasil, tais como: Unicamp, USP, IMPA-RJ, PUC-RJ, UnB, UFRJ, UFPE. Certamente estou omitindo involuntariamente outras instituições. O texto também é maldoso, pois o

tom em que foi escrito só ajuda a arraigar ainda mais o preconceito de alguns com a matemática e a ciência em geral, isso é um absurdo, repito: um absurdo, vindo de uma revista que se propõe a divulgar a ciência. É realmente lamentável o nível de alguns jornalistas que escrevem sobre ciência no Brasil. Quanta desinformação, quanto preconceito com a ciência sobre a qual eles escrevem. MARCELO MONTENEGRO

Departamento de Matemática do IMECC-Unicamp Campinas, sr Para o autor da nota "Será que o Abel pode ser um Nobel?", número 90, o critério para avaliar o charme de um prêmio passa pelas aplicações surgi das da pesquisa premiada e pelo "estilo da apresentação" da cerimônia. Para alívio e satisfação geral, o próprio Prêmio Nobel não é concedido nesses termos e a ciência básica ainda é autorizada a existir. Espero mesmo assim que sobre algum charme ao Nobel e à atividade científica. Ironicamente, uma das áreas em que trabalhou Serre, teoria de números, hoje é indispensável à criptografia, por sua vez empregada na movimentação de centenas de bilhões de dólares por dia. Ciência é confusa: 60 anos atrás, um dos especialistas da teoria, Hardy, orgulhava-se da pretensa inutilidade do assunto. CARLOS TOMEI

Departamento de Matemática, rUC-Rio Nota da Redação: Julgamos desproporcional a reação dos pesquisadores à nota em questão. Para que o leitor faça seu próprio julgamento, reproduzimos o texto abaixo.

Será que o Abel pode ser um Nobel?

na Noruega, o rei Harald V passou o primeiro Prêmio Abel de Matemática às mãos de Jean-Pierre Serre, do Collêge de France, em Paris (New Scientist, 17 de junho). O prêmio foi instituído para preencher a lacuna deixada por Alfred Nobel, que ignorou solenemente a matemática ao criar sua premiação. Não que faltem prêmios importantes. O Canadá, por exemplo, oferece a disputada Medalha Fields. Mas só acontece de quatro em quatro anos, paga bem menos que o Nobel (em torno de US$ 11 mil) e está longe de ter apelo popular. O Abel, por sua vez, será entregue anualmente e, já no nascimento, contemplou Serre com US$ 816 mil. Há quem pergunte: será que a matemática tem charme suficiente para emprestar ao Abel? Não há dúvida de que Serre é um grande matemático. Foi o mais jovem ganhador da Fields, em 1954; seu trabalho teve influência em várias áreas da matemática - da teoria do número à geometria algébrica - e sua teoria foi fundamental para ajudar Andrew Wiles a desenvolver a prova do último teorema de Fermat. Mas, do ponto de vista do público, que peso isso tem? Talvez nenhum. Por isso, pode ser que conte o estilo da apresentação, no melhor estilo Nobel, com presença de rei e tudo. O nome Abel é uma homenagem a Niels Henrik Abel, matemático norueguês do século 19.

Correção Na reportagem "Visão das profundezas" (edição n= 90), o mapa da página 51 mostra o fundo do mar entre o Espírito Santo e a Bahia - e não entre o Rio Grande do Sul e o sul da Bahia, como consta na legenda.

Cartas para esta revista devem ser enviadas para o e-mail cartas@fapesp.br, pelo fax (11) 3838-4181

Em cerimônia realizada no dia 5 de junho, na Universidade de Oslo,

ou para a Rua Pio XI, 1.500, São Paulo, SP, CEP 05468-901. As cartas poderão ser resumidas por motivo de espaço e clareza.

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 5


OPINIÃO

JOSÉ FERNANDO

PEREZ

MusArtS, FAPESP e o Ircam

J\:.

eleza singela da praça Igor Stravinsky, junto ao Centro Pompidou, em Paris, conduz, naturalmente, o olhar para as lúdicas e sedutoras esculturas de Niki de Saint Phalle. Com isso, pode-se até deixar de notar a sutil arquitetura do edifício de esquina onde está instalado o Institut de Recherche e Coordination Acoustique/Musique, o Ircam, criado, em 1969, por Pierre Boulez, um dos mais influentes músicos do século 20. Na frente do edifício, uma placa (foto ao lado) descreve de forma sintética e precisa a missão do instituto: a) desenvolver pesquisas sobre Acústica Musical e Tecnologia; b) transferir conhecimento para diversos setores da indústria; c) promover atividades educacionais para especialistas e para o público em geral. Placa no Ircam: missão Desde sua criação, o Ircam tem sido referência internacional e fonte de inspiração para a organização da pesquisa nessa interface entre música, ciência e tecnologia. Músicos e pesquisadores de todo o mundo fazem estágios para freqüentar seus cursos, utilizar suas instalações e interagir com a excelência científica e musical do seu ambiente. A contribuição do Ircam se estende também para o desenvolvimento tecnológico, tendo sua pesquisa contribuído para, até mesmo, a geração de patentes com produtos cuja relevância se estende para bem longe do campo da acústica e da música. A indústria aeronáutica e a teoria de escoamento de gases são exemplos desse espectro de alcance. É fascinante observar a coincidência dessa missão com a definida pela FAPESP para os seus dez Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) - um programa experimental, implantado em 2000, que está testando um novo paradigma da organização da pesquisa. De fato, cada um desses centros deve: a) realizar pesquisas multidisciplinares em suas respectivas áreas de conhecimento; b) desenvolver estratégias eficazes de transferência do conhecimento gerado por meio de parcerias com empresas e com o governo; c) implementar projetos educacionais inovadores em todos os níveis - isto é, tanto para especialistas como para estudantes do ensino fundamental e médio. Inspirada no modelo do Ircam e na experiência da FAPESP com os Cepids, nasceu a proposta do novo progra-

6 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

ma, Musica Articulata Scientia (MusArtS), o Instituto Virtual da Música e Tecnologia. O MusArtS deverá ser um programa da FAPESP dedicado à pesquisa sobre Música e Tecnologia, aberto à participação de todos os pesquisadores do Estado de São Paulo, com uma missão idêntica à do Ircam, mas com uma estrutura virtual e descentralizada. Tratase de utilizar a mesma estratégia bem-sucedida dos projetos genoma e Biota - este estudando toda a biodiversidade do Estado - para o desenvolvimento de projetos de grande complexidade. Essa estratégia colaborativa, sem custos de infra-estrutura de prédios e de administração, é ideal para a nossa era dominada pela Internet. O MusArtS não pretende ser uma réplica do Ircam, bem à vista mas deverá ser uma resposta brasileira aos mesmos desafios. O que torna viável um programa como o MusArtS é, sem dúvida, a qualidade dos pesquisadores que vêm trabalhando no Estado, muitos com o apoio da FAPESP, em projetos na interface Música- Tecnologia. Só o entusiasmo dessas lideranças e sua disposição para trabalhar de forma cooperativa poderão levar ao sucesso do empreendimento. A intensa interação propiciada pelas oficinas de trabalho e as palestras realizadas de 11 a 15 de agosto permitiram criar a base para uma colaboração estável entre o Ircam e o MusArtS em mais de uma dezena de projetos de pesquisa. A excelência da atividade de pesquisa em curso no Estado e financiada pela FAPESP foi amplamente reconhecida. A FAPESP está orgulhosa desta iniciativa cujo lançamento com a presença do Ircam em São Paulo, além de preparar o início dos trabalhos do MusArtS, se constituiu em um marco na vida cultural da cidade e do Estado. A Fundação também está feliz por ter propiciado uma inovadora parceria com o Ircam, o Instituto Cultural Itaú, o Centro de Documentação Tecnológica (CenDoTeC), o Consulado Francês em São Paulo, a Rádio Cultura FM e tantos outros que tornaram possível este evento.

JOSÉFERNANDOPEREZ é diretor científico da FAPESP


CARTA

Pesquisa

DO EDITOR

Verde, que te quero verde

FAPESP CARLOS VOGT PRESIDENTE

PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO vleE·PRESIDENTE

CONSELHO SUPERIOR ADILSON AVANSI DE ABREU,ALAIN FLORENT STEMPFER, CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ, CARLOS VOGT, FERNANDOVASCO LEÇA DO NASCIMENTO, H ERMANN WEVER, JOSÉ JOBSON DE ANDRADE ARRUDA, MARCOS MACARI, NILSON DIAS VI EIRA JUNIOR, PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO, RICARDO RENZO BRENTANI, VAHAN AGOPYAN CONSELHO TÉCNICO·AOMINISTRATlVO FRANCISCO ROMEU LANDI DIRETOR

PRESIOENTE

JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER OIRETORADMINISTRAT!VQ

JOSÉ FERNANDO PEREZ DIRETORCIENT!FICO

PESQUISA FAPESP LUIZ

HENRIQUE

CONSELHO EDITORIAL lOPES 00$ SANTOS (COOROENADORClfNTiFICO),

EDGAR OUTRA ZANOTTO, FRANCISCO ANTONIO BEZERRA COUTlNHO, FRANCISCO ROMEU LANDI, JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER, JOSÉ FERNANOO PEREZ, LUIZ EUGÉNIOARAUJO DE MORAES MELLO, PAULA MONTERO, WALTER COlLl DIRETORA

DE REDAÇAO

MARILUCE

MOURA

EDITOR CHEFE

NELDSON MARCOLlN EOITORASÊNIOR

MARIA DA GRAÇA MASCARENHAS DIRETOR

DE ARTE

HÉLIO DE ALMEIDA EDITORES

CARLOS FIORAVANTI IClt,C~), CLAUDIA IZIQUE lPOúnCAC&1I MARCOS DE OLIVEIRA (HCrrot.OC!A), HEITOR SHIMIZU (VERSÃOOH·lINO REPÓRTER ESPECIAL

MARCOS PIVETTA EDITORES-ASSISTENTES

DINORAH ERENO, RI CARDO ZORZETTO CHEFE DE ARTE

TÂNIA MARIA DOS SANTOS OJAGRAMAÇÃO

JOSÉ ROBERTO MEODA, LUCIANA FACCHINI FOTÓGRAFOS

EDUARDO CESAR, MIGUEL BOYAYAN COLABORADORES

ALESSANDRO GRECO, BRAZ, CARLOS HAAG, EDUARDO GERAQUE ION-lI,E), ELlZABETH TOGNATO, FABRicIO MARQUES, GIL PINHEIRO, JOÃO CARLOS LEAL, LAURABEATRIZ, L1L1ANE NOGUEIRA, urcn.n ATAS, MARCELO FERRONI, MARIA ZILDA FERREIRA CURY, MARIA MARGARIDA NEGRO, NEGREIROS, MARILI RIBEIRO, SIRIO J,B, CANÇAOO, RENATA SARAIVA, YURI VASCONCELOS, THIAGO ROMERO ION-lI'E), T1AGO MARCONI ASSINATURAS

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http://www.revistapesquisa.fapesp.br cartas@fapesp.br NÚMEROS ATRASADOS TEL. llll 3038-1438

Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESP É PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DE TEXTOS E FOTOS SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO

FUNDAÇÃO DE AMPARO

Â

PESQUISA 00 ESTADO DE SÃO PAULO

SECRETARIA DA CltNCIA, TECNOLOGIA, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E TURISMO

GOVERNO 00 ESTADO DE SÃO PAULO

P

esquisa FAPESP traz encartado nesta edição um presente para seus leitores: o mapa do verde em São Paulo. É um pôster, tamanho 80 x 52 centímetros, que mostra a vegetação remanescente no Estado de São Paulo. E ainda que possam chocar os olhares mais sensíveis os vastos claros na primitiva - e a essa altura só imaginada - cobertura vegetal do estado, na verdade, o mapa é anunciado r de uma excelente notícia: a área verde em São Paulo está crescendo, ainda que lentamente. É a primeira vez, desde a chegada dos colonizadores europeus a essas terras ao sul do Equador, que se registra uma inversão na tendência de desmatamento nestas plagas. Os paulistas e todos os brasileiros que se preocupam com as contribuições nefastas do país ao amplo rol de ameaças perpetradas todos os dias, no mundo inteiro, contra a saúde do planeta, podem, neste caso, comemorar. De nossa parte, estamos comemorando não só a boa notícia como a própria publicação do mapa, um dos produtos do programa Biota-FAPESP. Ela resulta da cooperação e do esforço concentrado de muita gente. Em particular, da equipe de pesquisadores do Instituto Florestal, Francisco 'Kronka à frente, que coordenou a elaboração do mapa, cuidou de transferi-lo para uma linguagem que facilitasse sua publicação pela revista, acompanhou sua finalização na redação de Pesquisa FAPESP e, não bastasse isso, empenhou-se na procura de parceiros que viabilizassem financeiramente sua impressão e veiculação sem ônus adicional para a revista. Mas há que se reconhecer aqui também o esforço da própria equipe da revista e o apoio das empresas privadas que patrocinaram esse presente para nossos leitores. Em tempo, a coordenação da reportagem que detalha aquilo que sinteticamente o mapa permite visualizar, a partir da página 46, é do editor Carlos Fioravanti. Na reportagem de capa desta edição, a partir da página 30, enfocamos

uma pesquisa cujos resultados, se cedêssemos à tentação fácil das transposições mecânicas, se mostrariam alarmantes para nós, humanos. É que pesquisadores paulistas e gaúchos, que trabalham conjuntamente num projeto de pesquisa sobre o sistema reprodutor feminino, observaram que o estresse provocado em filhotes de animais de laboratórios por breves períodos de separação da mãe, nos dias seguintes ao parto, produz danos cerebrais irreversíveis nos ratinhos recémnascidos e desencadeia um quadro de infertilidade em grande parte desses animais, durante a vida adulta. Como observa o repórter especial Marcos Pivetta, autor da reportagem, seria temerária, aqui, a comparação simplista entre ratos e homens - mas, guardadas as necessárias distâncias, não inteiramente desprovidas de lógica. E tanto é assim que uma das linhas de estudo dos pesquisadores envolvidos no projeto procura medir possíveis efeitos negativos da pouca interação entre mães com depressão pós-parto e seus filhos recém-nascidos, situação que pode guardar alguma semelhança com a experiência de manipulação neonatal dos ratos. Ainda nos domínios da ciência, esta edição traz uma reportagem (página 40) com um balanço do projeto Genoma Cana, aproveitando a oportunidade de publicação na Genome Research, nos próximos dias, do artigo científico que descreve as funções dos principais grupos de genes da planta, dentre um conjunto identificado de 33 mil. Para concluir, na área de tecnologia destacamos a reportagem sobre as mais diversas próteses feitas com um biopolímero de mamo na desenvolvido por pesquisadores paulistas (página 62), que agora, certificado pela Food and Drug Administration, a poderosa FDA dos Estados Unidos, deve ganhar o mercado internacional.

MARILUCE

MOURA

- DIRETORA

DE REDAÇÃO

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 7


Exatidão ,..."

naar e Há 590 anos, Brunelleschi redescobria a perspectiva linear

NELDSON

O

Maquete original da última peça da catedral, que vai acima do domo

MARCOLIN

arquiteto italiano Filippo Brunelleschi (1377-1446) era um escultor de talento, mas isso não significava exatamente uma raridade na Florença dos séculos 14 e 15. Naquele tempo, o Renascimento desabrochava em todas as direções e as atividades artísticas da época ganharam grande relevo. Conta a lenda criada em torno de Brunelleschi que ele optou decisivamente pela arquitetura depois de participar de um concurso para esculpir uma das portas do batistério florentino,

entre 1402 e 1403. Os responsáveis optaram por dar o trabalho para Lorenzo Ghiberti e Brunelleschi, que se recusou a dividir a obra. A partir daí, ele teria viajado para Roma com outro escultor, Donatello, onde mergulhou profundamente nos estudos sobre arquitetura e escultura clássicas. Disso resultou a redescoberta da perspectiva linear, já usada por gregos e romanos na Antigüidade e esquecida por longos séculos. O florentino deu aos seus estudos um caráter mais científico do que

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propriamente artístico - teria sido o primeiro a medir os monumentos de arquitetura antiga procurando sempre entender e passar para o papel a precisão do que analisava. O próprio Brunelleschi explicou o conceito da seguinte forma: "A perspectiva consiste em dar com exatidão e racionalmente a diminuição e o aumento das coisas que resulta para o olho humano no seu afastamento ou na proximidade: casas, planos, montanhas, paisagens de todas as espécies, figuras e outras coisas': Em outras

palavras, a perspectiva é o método que permite a representação tridimensional em superfícies bidimensionais por meio de regras geométricas de projeção. A sua característica principal é o ponto de fuga, para o qual cada série de linhas paralelas parece convergir. Embora baseada em geometria e óptica, essas técnicas tiveram enorme importância para os artistas renascentistas por ser objetiva e racional- algo bem diferente dos conceitos usados durante a Idade


Maquete em madeira do domo, também feita por Brunelleschi

Média. Foi entre 1413 e 1415 que Brunelleschi tornou suas idéias claras ao pintar o batistério da cidade exatamente como era visto da porta principal da catedral de Florença. A experiência impressionou seus amigos artistas, Donatello, escultor, e Masaccio, pintor. Hoje, os três são considerados precursores da estética renascentista. Vinte anos depois, o também artista Leon Battista Alberti, profundamente erudito, dedicou a Brunelleschi seu

Trattato della Pittura, onde explicitava as bases teóricas do método. Como arquiteto,

Interior da igreja (com linhas e ponto de fuga): perspectiva perfeita

Brunelleschi foi escolhido para projetar e finalizar a catedral de Santa Maria del Fiore, em Florença, em 1420. A cúpula da igreja era inteiramente original por dispensar o cirnbre, uma armação de madeira que servia como molde e suporte a arcos e abóbadas. A

Pronta, a catedral tornou-se referência e objeto de estudo obrigatório

construção da abóbada deveria ser feita sobre uma grande base octogonal, um bom desafio para os arquitetos da época. Para levar adiante seu projeto, ele criou máquinas e andaimes especiais e concluiu a obra que, ainda hoje, é referência e

objeto de estudo em todos os cursos de arquitetura. Sua fama como arquiteto era tão grande que, ao morrer, foi enterrado na catedral de Santa Maria del Fiore, honra só concedida aos nobres e integrantes do clero. Polemista, não fugiu ao espírito efervescente daquele tempo e travou boas brigas com seus pares. "Brunelleschi afirma implicitamente que o valor da arquitetura não está na delicadeza e na variedade de adornos, mas na lucidez distributiva de sua estrutura", diz em seu livro Brunelleschi (Xarait Ediciones), o também italiano Giulio Carlo Argan (1902-1992) um dos maiores historiadores em arte e arquitetura do mundo.

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 9


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

ESTRATÉGIAS

MUNDO

Diálogo com os árabes, no idioma da ciência A União Européia (UE) redobra esforços para incluir cientistas dos países árabes em seu Programa Quadro de Ciência e Tecnologia. Em junho, a UE assinou acordo de cooperação com o Marrocos e a Tunísia e iniciou negociações com o Egito. Os responsáveis pelo programa apostam que esse tipo de convênio terá o dom de impulsionar a ciência no mun-

• Falta convencer os credores O governo argentino quer multiplicar as fontes de recursos para ciência e tecnologia - e tenta envolver nesse esforço até os credores de sua dívida externa, que hoje alcança US$ 172 bilhões. A idéia, divulgada no dia 30 de julho na revista eletrônica SciDev.Net, é destinar 1% dos juros anuais da dívida a um fundo de apoio à pesquisa. Caso os credores aceitem abrir mão do percentual em nome da ciência, serão convidados a gerenciar o fundo em

do muçulmano e estimular o diálogo com o Oriente Médio, esvaziando as críticas de que a Europa discrimina os árabes em favor de Israel. O programa da União Européia é quadrienal e, em sua edição 2002-2006, vai destinar 17,5 bilhões de euros a projetos de pesquisa de todas as áreas. Teoricamente, cientistas de todos os países podem inscrever-se e celebrar parce-

parceria com as autoridades. A proposta, conhecida como "Dívida em troca de conhecimento", integra um plano para dobrar os investimentos em pesquisa no país que foi

10 . SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

rias com centros europeus. Mas a falta de divulgação e os complexos procedimentos de inscrição desestimulam as candidaturas. Acordos específicos, como os firmados com o Marrocos e a Tunísia, facilitarão os trâmites. Integrante ativo dos Programas Quadro desde 1988, Israel havia acabado de renovar sua participação quando foi firrnade o acordo

apresentado à Comissão de Ciência do Parlamento pelo secretário de Ciência, Tulio Del Bono. O plano é formado por outros dois projetos. Está prevista a criação de um fun-

com os árabes. Tanto melhor. Como lembra em editorial a revista Nature (23 de junho), "Israel tem problemas comuns - como a desertificação - com os vizinhos árabes", e, embora pareça distante o dia em que trocarão informações em paz, "a ciência é uma das poucas áreas em que se pode manter um diálogo construtivo entre povos em conflito': •

do de risco, com aparte inicial de US$ 6,2 milhões pelo governo argentino, para financiar empresas de inovação tecnológica. O outro projeto estabelece um sistema de financiamento semelhante ao dos fundos setoriais brasileiros, abastecido por taxas cobradas de empresas de setores como biotecnologia, energia, combustível. A meta é fazer com que só uma parte dos US$ 79 milhões do orçamento de Ciência e Tecnologia em 2004 tenha origem no Tesouro. O restante seria financiado por meio desses fundos. •


• A genética mobiliza os britânicos

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o Reino Unido

anunciou um investimento de mais de US$ 80 milhões em pesquisas genéticas nos próximos três anos (Science, 27 de junho). Os planos prevêem verbas para várias frentes: desde a difusão de exames de diagnóstico de males hereditários até estudos sobre as interações de droga usadas em terapias genéticas. Um programa pretende identificar e tratar cerca de mil pessoas portadoras de um distúrbio genético conhecido como hipercolesterolemia hereditária, que eleva as taxas de colesterol do sangue a níveis alarmantes. Outra preocupação das autoridades é proteger o cidadão contra o uso abusivo de informação genética. Para isso, vão propor uma lei que proibirá a realização de testes de DNA sem consentimento explícito das pessoas. O governo também reiterou seu apoio a um projeto que proíbe empregadores e agências de seguro de requisitarem dados genéticos de seus funcionários e clientes. Há quem ache isso pouco. "Seria preciso proibir claramente esses testes", protesta David King, ativista do grupo Human Genetic Alerts. •

• Livre acesso aos primatas chineses Biólogos do Sul da China planejam capitalizar o fácil acesso a macacos na região para criar uma reserva de animais para pesquisas médicas (Nature, 17 de julho). O centro, sediado na Universidade Sun Yat-sem, em Guangzhou, deverá montar um banco de células-tronco e criar grandes colônias de primatas transgênicos, para usá-los como mo-

delo para o estudo de doenças humanas. Juntos, a universidade e o governo local, investiram cerca de US$ 1 milhão no projeto, que conta

com intensa cooperação Bruce Lahn, geneticista Universidade de Chicago. objetivo é explorar áreas medicina, como o estudo

de da O da de

doenças neurológicas, em que o uso de primatas foi limitado na Europa e nos Estados Unidos. A iniciativa chinesa vai na contramão da tendência do mundo desenvolvido, no qual o sacrifício de macacos nos laboratórios vem sendo abandonado por pressão de ativistas dos direitos dos animais. Quinze pesquisadores já trabalham no novo centro. De acordo com Lahn, eles terão entre 100 e 200 macacos para começar a pesquisas neste outono. Os fundadores do centro garantem que vão respeitar os padrões ocidentais de ética nas pesquisas com animais. •

A crônica pilhagem do tesouro afegão Não foi apenas no Iraque que a guerra descambou na pilhagem do patrimônio arqueológico e cultural. No Afeganistão, a destruição começou há duas décadas - e continua até hoje (Science, 4 de julho). Mais de um ano e meio depois da queda do regime talibã, relíquias do passado afegão continuam a ser saqueadas, enquanto o principal museu do país se deteriora. Especialistas descobriram no Paquistão um amplo comércio de moedas, estatuetas e manuscritos pertencentes a sítios

arqueológicos ainda não legalmente escavados no norte do país. Omar Khan Masudi, diretor do Museu Nacional, pediu aos afegãos que devolvam as peças, mas tem contra si a pobreza generalizada e os altos preços pagos no mercado internacional pelas antigüidades. Graças à sua localização estratégica, no entrecruzamento de várias civilizações, o Afeganistão era um importante guardião de riquezas arqueológicas. Duas décadas de guerra - para não falar na destruição proposital de

monumentos por fanáticos religiosos - haviam aniquilado boa parte dessa herança. Em uma reunião em Cabul, em 2002, governos de vários países se comprometeram a destinar recursos para a restauração do edifício do Museu Nacional, que já foi várias vezes bombardeado e saqueado desde a década de 90. Até agora, porém, só um pedaço insignificante dessa ajuda despontou. Apenas 416 das 70 mil peças roubadas do museu - que já teve um acervo de 100 mil itens foram recuperadas. •

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Ciência na web Envie sua sugestão de site científico para cienweb@trieste.fapesp.br

• Parque construído em silêncio A Malásia montou um plano para transformar sua rica diversidade biológica numa indústria próspera (Nature, 10 de julho). O projeto prevê investimento de US$ 160 milhões, em três anos, na construção de um parque biotecnológico a 45 quilômetros da capital, Kuala Lampur. Três institutos de pesquisa serão construídos no local até 2006. Três empresas já concordaram em se mudar para o parque, e o governo negocia a transferência de outras 20. Nem o governo nem a comunidade científica querem alardear a iniciativa. Não por falta de entusiasmo, mas por cautela. O país se ressente do fiasco de um grande plano na área de tecnologia da informação, em 1997. "Preferimos fazer em vez de ficar falando", diz o primeiro-ministro, Mahatir bin Mohamed. A discrição também ajuda a prevenir insinuações de que o governo estaria entregando a biodiversidade malaia a interesses privados. Embora os recursos naturais sejam realmente

promissores - convênios internacionais estudam, por exemplo, as propriedades da planta nativa tongkat ali no combate à impotência -, alguns analistas apostam que os investidores malaios não conseguirão bancar os duradouros investimentos que companhias de biotecnologia demandam. •

www.vision.ime.usp.br/-gaspar/neurof.html

Uma infinidade de endereços de páginas eletrônicas com informações sobre neurociência.

• No México, como no Brasil O presidente do México, Vicente Fox, pediu à comunidade científica que se associe ao setor produtivo para levar avante os 2 Ú5 projetos apresentados por pesquisadores ao programa Avance del Conacyt (Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia). "Pesquisadores, governo e empresas devem trabalhar em equipe, em prol de um propósito comum: criar um aparato produtivo competitivo para manter o dinamismo das exportações, fortalecer o mercado interno e gerar novos empregos", afirmou o presidente, sublinhando que seu governo tem como meta reduzir a distância que separa estes setores. •

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ESTRATÉGIAS

BRASIL

Os olhos do Brasil sobre Moçambique Dois satélites que coletam dados meteorológicos e ambientais em 500 pontos do território brasileiro vão ajudar o governo de Moçambique a monitorar a bacia do rio Zambeze. Quatro plataformas automáticas de coleta de dados serão instaladas no Zambeze e em rios vizinhos e transmitirão informações hidrológicas para os satélites SCD-2 e

• O resgate da memória da ciência Uma política para preservação da memória da ciência vai sair do forno neste mês. Uma comissão criada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia deve propor, entre outras iniciativas, a criação de cursos de pós-graduação em história da ciência e o investimento em mão-de-obra nacional nas áreas de arquivismo e restauro. "Só há três cursos de história da ciência e freqüentem ente temos de recorrer a especialistas estrangeiros em restauro", diz Ma-

CBERS-l. Eles, por sua vez, retransmitirão os dados para uma estação na cidade de Beira. O custo do projeto, de US$ 230 mil, será bancado pela Unesco, o braço da ONU para educação, ciência e cultura. "Para o Brasil, não custará nada ligar os satélites quando eles passarem sobre Moçambique", diz Wilson Yamaguti, responsável pelo sistema de coleta de

nuel Domingos Neto, vicepresidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e coordenador do grupo de trabalho. A comissão foi criada em resposta à dilapidação que atinge alguns acervos. Um exemplo é o centenário arquivo do Departamento Nacional de Obras contra a Seca. Registros de expedições ao sertão nordestino ao longo do século 20 estão abandonados em um prédio em Fortaleza. Outro impor-

dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe. "E poderemos usar os dados do que acontece na África para aprimorar nossas previsões': O controle do Zambeze, rio que serviu de caminho para a colonização portuguesa em 1632, faz parte de um esforço para amenizar uma tragédia ecológica. O vale em seu delta ficava encharcado 7 me-

ses por ano, e, na superfície de terras úmidas, a agricultura e a pesca vicejavam. Tudo mudou após a construção de barragens nos anos 60 e 70. Sem as inundações anuais, as culturas se arruinaram. Quando a água volta, produz desastres. Foi o que aconteceu na enchente de 2001, quando as comportas da hidrelétrica CahoraBassa foram abertas. •

tante acervo, a biblioteca do CNPq, está empilhado num galpão em Brasília, colocando em risco relatórios cinqüentenários. Esse acervo será reabilitado com a instalação da biblioteca ao edifíciosede do CNPq. Está ' " Ie!!!!l!l'"'~ sendo discutida uma r::;1o---".~ :l fórmula que estimule universidades e órgãos públicos a reservar recursos para preservar sua memória. "O Brasil precisa se reconhecer como o produtor de ciência que sempre foi", diz Domingos Neto. •

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Aids na fronteira da perdição o extremo norte do Brasil abriga um movimento migratório peculiar. Índios de quatro tribos ignoram, naturalmente, as fronteiras políticas entre o Amapá e a Guiana. E convivem com levas de brasileiros paupérrimos, que cruzam clandestinamente o rio Oiapoque em busca de oportunidades no território controlado pela França. Uma dupla de antropólogos saiu a campo para investigar o espectro da Aids • Artigo de brasileiros na Nature Genetics A edição de outubro da revista Nature Genetics, um dos periódicos científicos com maior impacto na comunidade acadêmica internacional, trará um artigo de dez páginas com os resultados do projeto do genoma Schistosoma mansoni, uma das iniciativas da rede ONSA, a rede virtual de laboratórios genômicos criada no Estado de São Paulo pela FAPESP. Iniciada no primeiro semestre de 2001, a empreitada tinha como objetivo produzir pelo menos 120 mil ESTs sigla que, em inglês, significa etiquetas de seqüências expressas - a partir do DNA do parasita, principal agente causador da esquistossomose. As ESTs são fragmentos dos genes presentes no genoma de um organismo. Essa doença tropical, que no homem causa lesões no fígado, hemorragias e a popular barriga d' água, afeta 10 milhões de brasileiros, sobretudo no Nordeste e Centro-

nessa terra inóspita. O francês Frédéric Bourdier, da Universidade Victor Segalen - Bourdeaux 2, e a colombiana Claudia López Garcés, do Museu Paraense Emílio Goeldi, constataram que quatro índios, pertencentes às tribos Karipuna e Galibi Marworno, já contraíram a doença - dois deles morreram. ''A região é muito vulnerável. Mais pessoas parecem estar com Aids, mas é impossível com-

Oeste, onde é endêmica, e mais de 200 milhões de habitantes de zonas pobres do planeta. Todos os seis estágios do ciclo de vida do S. mansoni, cujo hospedeiro intermediário são caramujos do gênero Biomphalaria, foram alvo do trabalho do grupo brasileiro. O artigo deve fornecer importantes informações para o desenvolvimento de novas formas de tratamento ou vacinas contra a moléstia. Para gerar informações sobre as regiões codificadoras do genoma do parasita (que dão origem a proteínas), o projeto usou basicamente o método de seqüenciamento Orestes, desenvolvido no Brasil. Ainda este mês, antes da saída de sua edição impressa de outubro, a Nature Genetics deve liberar, de forma antecipada, uma versão eletrônica do trabalho dos pesquisadores da ONSA. O projeto do genoma S. mansoni é coordenado por Sergio Verjovski-Almeida, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo. •

14 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

provar porque não há um laboratório na região", diz Claudia Garcés. Os resultados da pesquisa estão sendo usados para pressionar os governos brasileiro e francês a estabelecer uma política pública para a região de fronteira, em seus acordos bilaterais. "É muito mais fácil obter atendimento na Guiana do que na capital do Amapá, que fica a uma distância maior e tem menos recursos': afirma Claudia .•

• O militante da saúde pública O pesquisador e o político conviviam em simbiose na biografia de Sérgio Arouca, o sanitarista e ex -deputado morto aos 61 anos, no dia 2 de agosto. A vocação política expressou-se primeiro: aos 15 anos, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro, hoje Partido Popular Socialista, agremiação pela qual concorreu à vice-presidência da República, em 1989, e cumpriu dois mandatos na Câmara Fede-

Pesquisador e político

ral. A trajetória científica floresceu na Unicamp, onde Arouca criou nos anos 60 um centro de medicina que serviria de modelo, duas décadas mais tarde, para implantação do Sistema Único de Saúde. Teve seu grande momento nos anos 80, quando presidiu a Fundação Instituto Oswaldo Cruz. Um dos marcos de sua gestão foi a reabilitação de 11 pesquisadores expulsos pelo regime militar. As duas vocações sempre caminhavam juntas. Em 1980, como consultor da Organização PanAmericana de Saúde, transferiu-se para a Nicarágua e trabalhou com o governo sandinista. Em 1986, acumulou a presidência da Fiocruz com a Secretaria de Saúde fluminense. Conhecido pela personalidade inquieta, prosseguia na militância. No governo Lula, assumiu a secretaria de Gestão Participativa do Ministério da Saúde, mas era presença inconstante em Brasília. O câncer no intestino, contra o qual lutou durante um ano e meio, minara o fôlego do militante. •


• Nova roupagem, com mais conteúdo

• Bom senso no mundo das patentes Vem aí um guia com orientações práticas para obter o registro de patentes, marcas e direitos autorais. Mas a grande novidade é que a ênfase do manual não está nos trâmites burocráticos. Ele vai expor estratégias para a comercialização de inovações e mostrar que o registro da propriedade intelectual é apenas uma etapa desse proces-

so, não um fim. "Os pesquisadores se preocupam muito em proteger a propriedade intelectual, mas se esquecem de avaliar o essencial, que é a potencialidade comercial de sua obra", diz Claudia Iungmann, da consultoria 14BISness, que está preparando o guia. O manual será lançado até o final do ano. Terá versão impressa e estará disponível na internet, num link da empresa (www.14bisness. com.br). •

Será lançada em setembro a edição revista e ampliada de Nova História Moderna e Contemporânea, do professor e historiador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Sagrado Coração, de Bauru, José Iobson Arruda, pela Edusc (792 páginas e R$ 90,00). Esta é a 28a edição de uma obra que já tem 30 anos de existência. Nesse período, passou por duas revisões completas, a primeira em 1980 e a segunda em 1986, com atualização permanente em cada edição. As novidades apresentadas agora são numerosas - vão desde a formatação do livro, diagramação, cores, capa até a organização do conteúdo. Mas a principal é que este é o primeiro livro didático de história que contempla a ciência produzida no Brasil. A obra ganhou três elementos que ajudam na assimilação de conteúdo: documentos, leituras complementares e bibliografia e filmografia. Uma das atrações da nova edição é o uso constante de obras de arte que parecem antecipar fatos ocorridos no futuro ou o

contrário, referências do passado que voltam em pinturas do presente. Uma tela de Siqueiros (Explosão na Cidade, 1935), lembra de modo espantoso a explosão da bomba atômica sobre Hiroshima, dez anos depois. O presente também participa ativamente do livro. Os atentados de 11 de

setembro e a guerra contra o Iraque, marcos deste início de século, não são esquecidos. O avanço da ciência e sua presença cada vez maior na mídia são citados e explicados pelo autor. O novo conhecimento gerado pelos projetos de mapeamento do genoma de numerosos organismos é lembrado, assim como a decisiva participação da FAPESP no seqüenciamento do primeiro fitopatógeno (a bactéria Xylella fastidiosa, que ataca os laranjais), que ganhou a capa da revista Nature em julho de 2000 e o reconhecimento, pelo jornal The New York Times, de que há um modelo de pesquisa próprio - que funciona - no mundo subdesenvolvido. "A obra destina-se preliminarmente aos estudantes do ensino médio, sobretudo candidatos aos vestibulares, mas atenderá aos estudantes universitários em seus cursos iniciais na seara das Humanidades", diz o autor na apresentação do livro. •

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 15


POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICAcc

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ACIDENTE

As lições da tragédia Destruição do Veículo Lançador de Satélite sugere uma revisão no programa espacial brasileiro

ois dias depois da maior tragédia da história da tecnologia brasileira, que resultou na morte de 21 engenheiros e técnicos e destruiu o Veículo Lançador de Satélite (VLS), no Centro Espacial de Alcântara, no Maranhão, em dia 22 de agosto, o presidente Luiz lnácio Lula da Silva e a Agência Espacial Brasileira (AEB) anunciaram que o planejamento do programa será mantido. Um foguete suborbital, por exemplo, deverá ser lançado entre junho e julho 16 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

do próximo ano. As negociações com a Ucrânia, interessada em utilizar a base de Alcântara para lançar seus próprios foguetes, também não deverão ser comprometidas com o acidente, segundo o ministro da Defesa, José Viegas. O acidente que comoveu o país e ganhou o noticiário internacional levantou dúvidas sobre o modelo adotado até agora na condução do Programa Espacial Brasileiro. A morte em condições dramáticas dos 21 engenheiros e técnicos do Centro Técnico Aeroespacial (CTA), de São José dos Campos,


Base de A\cântara: maior desastre na história da tecnologia brasileira

empenhados em cumprir o desafio que o Brasil se impôs na década de 80 - desenvolver satélites com tecnologia nacional e construir foguetes capazes de levá-los ao espaço -, intensificou certamente estas dúvidas. "É preciso aprender com o erro e avançar, em vez de assustar-se e fugir, até para valorizar o sacrifício das pessoas que morreram no acidente", disse Carlos Henrique de Brito Cruz, reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), um analista atento do desenvolvimento científico e tecnológico nacional. Maior mobilização - Para avançar mais rapidamente, Brito considera estratégico ampliar a freqüência de lançamentos, o que poderia ser obtido com mais recursos e a rnobilização de um número ainda maior de especialistas. Mas enfatiza: "O CTA precisa ser a instituição líder do programa espacial", alertando para a necessidade de incluir no programa "um conjunto maior de instituições de pesquisa, empresas e universidades".

Iniciada há 43 anos com a criação do Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais, a pesquisa espacial no Brasil apresenta um saldo positivo. Sozinho e com sucesso, o país desenvolveu dois satélites de comunicação, o SCD-1 e o SCD-2, e, em parceria com a China, produziu o CBERS-1, de sensoriamento remoto. O programa também permitiu a nacionalização de materiais para fabricação de propelentes - compostos químicos usados como combustíveis -, de ligas metálicas e materiais cerâmicos. Os propelentes desenvolvidos para o Programa Espacial Brasileiro são hoje produzidos em escala industrial e utilizados como matéria-prima na fabricação de colas, tintas e espumas. "O Programa é importante por seus objetivos específicos, mas também por ter propiciado o desenvolvimento de uma indústria brasileira de precisão, algo de que o Brasil tem uma grande carência", comentou José Fernando Perez, diretor científico da FAPESP.

É certo que, em qualquer país, programas espaciais estão sujeitos a riscos. Os Estados Unidos são o país que mais avançou nesse campo e também o que mais registrou acidentes: desde o incêndio da nave Apollo 1, em 1967, com a morte de três astronautas, até a explosão do ônibus espacial Challenger, em fevereiro deste ano, quando morreram os sete tripulantes. No Brasil, o lançamento dos dois protótipos anteriores do VLS terminou em fracasso, embora sem vítimas: em 1997 a missão foi abortada 65 segundos após o lançamento por causa de uma falha no primeiro estágio do foguete; em 1999, o foguete explodiu depois de uma falha no segundo estágio, 33 segundos após decolar. O acidente do dia 22, de acordo com o major brigadeiro Tiago Ribeiro, diretor do Centro de Tecnologia da Aeronáutica (CTA), foi causado pelo acionamento espontâneo de um dos quatro motores do foguete. Essa ignição pode ter ocorrido por uma onda eletromagnética, uma descarga elétrica PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 17


Acidente foi causado pelo acionamento espontâneo de um dos motores

somados os recursos dos Fundos Setoriais, Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O desejável seria algo próximo a R$ 100 milhões. Ainda assim, os investimentos seriam equivalentes a um terço de países como a Índia. «Com esse nível de investimento, não vamos realizar o sonho de ter a autonomia espacial, pelo qual morreram nossos colegas",diz Câmara.

ou o contato de uma peça metálica no reservatório de combustível, que queima até o fim depois de detonado. O calor de 3.000° Celsius, equivalente à metade da temperatura da superfície do Sol, derreteu o foguete e a torre de lançamento. Preço da tecnologia - Mas há quem veja na falta de recursos um fator de risco para o programa. «Não há caminhos baratos para a tecnologia de ponta, que custa caro em termos de investimento, gente e compromisso na18 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

cional", comenta Gilberto Câmara, coordenador geral do setor de Observação da Terra, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Na sua avaliação, o Programa Espacial não havia recebido investimentos à altura dos desafios encontrados. Lançado há 42 anos, o programa consumiu US$ 300 milhões e conta com um orçamento de R$ 30 milhões em 2003, valor considerado irrisório na avaliação do próprio presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Luiz Bevilacqua. Ele contava com pelo menos R$ 45 milhões, já

Perda irreparável - Na segunda-feira, 25, Viegas garantiu à imprensa que a falta de recursos não teria comprometido a segurança do VLS. O prejuízo com a explosão foi estimado em R$ 36 milhões. Só o VLS estava avaliado em R$ 14 milhões, sem contar o custo da plataforma de lançamento, que ficou inutilizada, e dos dois satélites - um do Inpe e outro da Universidade Norte do Paraná (Unopar) - que já estavam acoplados ao foguete e seriam colocados em órbita. Mas as perdas humanas são irreparáveis. Entre os mortos, 11 tinham formação superior e 10 eram técnicos de nível médio, com 20 a 51 anos de idade. Sem eles, desfizeram-se equipes inteiras de especialistas em tecnologia aeroespacial, cujo domínio é estratégico na medida em que os países que a detêm, como os Estados Unidos e a França, não a repassam por razões estratégicas: o uso comercial dos satélites de telecomunicação é um mercado ainda restrito e muito disputado, estimado em bilhões de dólares. O Brasil tem ao menos uma vantagem geográfica: Alcântara é o centro de lançamentos que se encontra mais próximo da linha do Equador, o que lhe permite aproveitar ao máximo a rotação da Terra para impulsionar os foguetes, com economia de combustível e, portanto, custos menores (13% a 31% de vantagem em relação ao Cabo Canaveral, dos Estados Unidos). Desde sua inauguração, em 1989, o Centro de Alcântara pôs no ar cerca de 200 foguetes. •


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• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA MEDICAMENTOS

Brasil integra esforço mundial para o desenvolvimento de sete novas drogas LucILIA

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ntre 1975 e 1999, apenas 15 novos produtos foram desenvolvidos para o tratamento da tuberculose e de doenças tropicais como o mal de Chagas, a malária, a leishmaniose e a doença do sono. Em comparação, no mesmo período, surgiram 179 novas drogas somente para atender os portadores de doenças cardiovasculares. Vale registrar que tanto aquelas doenças - negligenciadas, para as quais o tratamento, quando existe, é inadequado - como as cardiovasculares, respondem praticamente pelo mesmo percentual, em torno de 12% do número total de doenças do planeta. O desenvolvimento de novas drogas para as doenças que afetam populações em países em desenvolvimento pouco interessa à indústria farmacêutica. Este imenso mercado, apesar de reunir cerca de 80% da população mundial, é pouco atrativo já que responde por apenas 20% das vendas globais de remédios. E este descaso é responsável pela morte de milhões de pessoas em todo o mundo. Recentemente, graças à iniciativa da instituição humanitária Médicos Sem Fronteiras (MSF), à qual se aliou a Organização Mundial da Saúde (OMS), começam a brotar os primeiros frutos de um programa focalizado no desenvolvimento de produtos inovadores - medicamentos e vacinas - para enfermidades como essas, cujo tratamento não figura no mapa das prioridades da indústria e que tampouco têm sido alvo de políticas públicas firmes e estruturadas.

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Denominado Iniciativa de Drogas para Doenças Negligenciadas (cuja sigla é DNDi, em inglês), esse programa articula os esforços de instituições científicas, governamentais e privadas de vários países. Os investimentos previstos são da ordem de US$ 250 milhões para um prazo de 12 anos, período em que se calcula obter seis ou sete drogas novas registradas e um portfólio de oito projetos em desenvolvimento. A proposta da MSF - bancada inicialmente com os recursos do prêmio Nobel da Paz, recebido pela organização em 1999 - é, basicamente, utilizar nessa iniciativa o mesmo padrão que a indústria farmacêutica adota na produção de drogas "rentáveis", geralmente chanceladas pela chamada tecnologia de ponta. Isto é, desenvolver remédios que representem verdadeiras inovações para males antigos, muitos dos quais já não respondem aos medicamentos convencionais. Doença e mercado - Os recursos iniciais para o período 2003-2004 giram em torno de US$ 20 milhões. Com o avanço da iniciativa, a expectativa é de que outros parceiros se juntem ao programa, tecendo, no campo da saúde, uma rede humanitária, científica e social talvez inédita no mundo. Típicas das regiões subdesenvolvidas do planeta, as doenças negligenciadas são geralmente ligadas à subnutrição e à falta de saneamento. Sob a ótica empresarial, não vale a pena investir tempo e dinheiro



nessa seara: o retorno financeiro é muito baixo e, em certos casos, praticamente nulo. As estatísticas mostram que menos de 10% dos gastos totais em pesquisas de saúde são aplicados em doenças que representam 90% da carga global. E às doenças negligenciadas cabe uma fatia ainda menor: calcula-se que, dos cerca de US$ 70 bilhões gastos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) em 2001, menos de 1% tenha sido destinado ao desenvolvimento de tratamentos para esses males. uscando reverter esse quadro de modo duradouro e profissional, a MSF lançou oficialmente o DNDi em julho deste ano, em Genebra. Suas bases de ação estão fincadas nas propostas de um grupo que trabalha no tema há aproximadamente três anos. Sob a coordenação e gerenciamento da MSF e da OMS, a intenção é envolver instituições públicas e privadas, bem como laboratórios e empresas, numa verdadeira cruzada internacional pela cura dessas doenças. No traçado desse modelo, o desenvolvimento de novos remédios resultará no diálogo entre vários centros de pesquisa, usando-se o aparato e a infra-estrutura já existentes de modo mais racional, produtivo e eficiente. É o que está ocorrendo no Brasil, com a participação da Fundação Os-

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waldo Cruz (Fiocruz), cujo Instituto de Tecnologia em Fármacos (Far-Manguinhos) é um dos membros fundadores da DNDi. O médico sanitarista Paulo Buss, presidente da Fiocruz, explica que a instituição vem trabalhando em uma nova formulação farmacêutica que associa duas substâncias, a artesunato e a mefloquina (AS/MQ), no tratamento da malária. Nesse projeto, o Far-Manguinhos comanda uma parceria com outros dois centros de pesquisa brasileiros, que passaram pelo crivo dos técnicos da OMS. Os sofisticados testes de toxicidade - uma das áreas em que a d~fasagem tecnológica do país é mais profunda - são realizados pelo laboratório . Unitox, da Universidade Santo Amaro (Unisa), de São Paulo. E a Genotox, empresa incubada no Centro de Biotecnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), encarrega-se dos testes de genotoxicidade, que detectam a possibilidade de mutação genética induzida por substâncias químicas que compõem os medicamentos e avaliam o seu dano potencial. A parceria internacional para a obtenção desse medicamento - o qual, dependendo dos resultados da fase clínica, poderá ser lançado num prazo que varia entre três e seis anos - envolve ainda instituições da Tailândia e da Malásia (testes clínicos) e do Reino Unido (estudos in vitro e moleculares). Além da formulação AS/MQ, conduzida pelo Far-Manguinhos, um outro

projeto ligado à malária está em andamento. Trata-se de uma formulação que associa artesunato e amodiaquina (AS/AQ), cujo desenvolvimento farmacêutico está sendo elaborado na França, cabendo ao Brasil os testes de toxicidade e genotoxicidade e a Burkina Faso os testes clínicos em humanos. Encontra-se também em fase de desenvolvimento, em âmbito internacional, o paromomicin, droga de uso veterinário que está sendo rejuvenescida para uso humano, sob a forma injetável, para combater a leishmaniose. A criação de outros medicamentos deverá, em linhas gerais, seguir esse mesmo esquema cooperativo: diferentes centros pelo mundo encarregam-se de diferentes etapas, da formulação à produção. Competência e resultados - Eloan Pinheiro, ex-diretora do Far-Manguinhos e membro da DNDi internacional, assinala que a presença brasileira nessa iniciativa representou a consolidação do Far-Manguinhos no cenário mundial, após a instituição ter desenvolvido as formulações para o coquetel de drogas de combate ao vírus da Aids. A capacitação científica existente hoje no país é "extraordinária", avalia Paulo Buss. O que falta, em sua opinião, é um projeto mais consistente que combine a parte científica com a área industrial. "Porque a pesquisa produz artigos científicos; produzir algo tangível não é prática corriqueira, não faz parte da


cultura universitária brasileira:' Nesse âmbito, o representante da Campanha de Acesso a Medicamentos Essenciais da MSF no Brasil, Michel Lotrowska, sugere que as instituições brasileiras de financiamento adotem linhas de apoio específicas para projetos que focalizem o desenvolvimento de novos produtos, isto é, projetos que ofereçam resultados concretos para os pacientes. loan Pinheiro observa que o país tem uma boa competência científica instalada em várias universidades e institutos. Esta base está apta a desenvolver novos produtos para doenças negligenciadas, utilizando tanto plantas medicinais como armas da biotecnologia e da síntese química. Apesar disso, há grandes lacunas na área de farmacologia, toxicologia, testes clínicos e desenvolvimento de metodologia clínica. "Temos no país os cérebros, mas faltam áreas estruturadas em quantidade e qualidade para a realização dos ensaios. Considero isso conseqüência da falta de uma política industrial no setor de insumos terapeuticamente ativos. Não há ainda uma política de produção de insumos que estão fora de patente': constata Eloan. Nas últimas décadas, o conhecimento científico na área de saúde evoluiu bastante e introduziram-se novos medicamentos para as doenças globais,

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como o câncer e as cardiovasculares. Até mesmo para problemas ligados ao "estilo de vida", como celulite, calvície e jet leg, têm surgido medicamentos inovadores. Contrastando com esse quadro de avanço, acentuou-se o abismo que separa as doenças tropicais e não tropicais. Praticamente não se lançaram, nos últimos 25 anos, remédios mais "modernos" para controlar ou debelar as primeiras. Muitas dessas enfermidades são combatidas até hoje com formulações existentes há cerca de 40 anos, que não produzem mais os efeitos desejados, aumentando o sofrimento das pessoas. Documento da MSF assinala que até muito recentemente pacientes que sofriam da doença do sono, por exemplo, tinham de submeter-se a um doloroso tratamento à base de arsênico por falta de disponibilidade de um remédio mais eficaz. Apesar dessas constatações, os especialistas que traçaram as diretrizes da DNDi não culpam apenas a iniciativa privada pela falta no mercado de novos produtos, de kits de diagnóstico ou mesmo de vacinas para as doenças negligenciadas. O programa indica também falhas na área pública. Nos países menos desenvolvidos, há, entre outros fatores, uma combinação perversa de falta de recursos financeiros e de estabelecimento de políticas de incentivo à produção e ao desenvolvimento tecnológico de tratamento para essas patologias.

Rede regional - Na fase atual do programa, foram pré-selecionados 71 projetos, informa Michel Lotrowska. O próximo passo é realizar uma triagem para escolher aqueles que serão efetivamente desenvolvidos. A participação do setor privado ainda está sendo delineada, tendo havido reuniões com a indústria farmacêutica, mas os tipos de colaboração não foram ainda formatados. O representante da MSF diz ainda que a DNDi está montando uma rede de escritórios regionais para sincronizar melhor os diferentes projetos, em várias partes do mundo. O "braço" da iniciativa para a América Latina e Caribe deverá funcionar no Brasil provavelmente a partir de 2004. A meta é organizar um network, para que os profissionais envolvidos compartilhem pesquisas, recursos humanos e uso de laboratórios, além de identificar oportunidades de projetos e captar fundos. Cada uma das etapas definidas para os projetos aprovados poderá ser executada em países diferentes, mas todas estarão sob o guarda-chuva institucional da MSF e da OMS no que se refere à coordenação e gerenciamento dos projetos. A idéia é que as inovações resultantes dos trabalhos de investigação constituam patentes públicas, o que garantirá o amplo acesso das populações-alvo aos medicamentos produzidos. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 23


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA FOM ENTO

Despesas parti Ihadas Ministério firma convênios com FA Ps para incentivar pesquisa regional

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nião e o Estado de São Paulo firmaram, no dia 29 de julho, convênio de cooperação técnica e científica por um período de quatro anos, para o desenvolvimento de programas de incentivo à pesquisa no Estado. Essa mesma parceria também está sendo firmada com os demais estados e inaugura a nova estratégia do MCT de compartilhar com as Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs) o financiamento de programas de apoio à pesquisa, entre eles os de Infra-Estrutura para Jovens Pesquisadores; de Bolsas de Iniciação Científica [únior; de Apoio a Núcleos de Excelência (Pronex); e, no caso de alguns estados, do Projeto Proteoma. ''A estratégia é integrar as FAPs ao programa nacional de desenvolvimento científico e tecnológico', explica Erney Camargo, presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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No caso de São Paulo, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), a Secretaria de Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Turismo e ? FAPESP são signatários do convênio que prevê a implementação de programas no valor total de R$ 43,28 milhões. Na Bahia, o convênio representará investimentos de R$ 14 milhões e, em Minas Gerais, R$ 7 milhões, apenas para citar alguns exemplos. "Estam os estimulando a criação das FAPs onde elas não existiam, como é o caso do Acre, Roraima e Amapá, alocando recursos nas várias regiões do país e, ao mesmo tempo, fazendo com que os estados cumpram a exigência do repasse de uma parcela do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), estabelecida pelas Constituições estaduais, para a ciência e tecnologia", justifica Camargo. Esta cooperação, por exigir contra partida dos estados, já resultou na ampliação

de recursos destinados à pesquisa no Amazonas, na Bahia, em Alagoas e em Sergipe. Recursos provisionados - Em São Paulo, os recursos para o convênio já estão provisionados. Os editais para a seleção dos projetos já foram publicados nos Diários Oficiais da União e do Estado e estão disponíveis no site da Fundação. "Esta parceria vai potencializar os programas que a FAPESP já vem desenvolvendo, uma vez que duplicará os investimentos em pesquisa. É um exemplo da boa governança em ciência e tecnologia", diz Carlos Vogt, presidente da Fundação. O Programa de Apoio à Infra-Estrutura para Jovens Pesquisadores, de acordo com o edital, vai financiar a instalação, modernização ou recuperação da infra-estrutura de pesquisa nas instituições públicas de ensino. Em 2003 e 2004, os investimentos previstos, de


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s quatro primeiros programas financiados por meio do convênio inauguram uma parcena que, na avaliação do presidente do CNPq, se ampliará "com a experiência': Representantes da região Norte, sugeriram que CNPq financiasse bolsas de desenvolvimento regional para jovens pesquisadores, doutores e pesquisadores sêniores de todo o país que quiserem se instalar na região. Os "estados hospedeiros" ofereceriam um "enxoval" com equipamentos, material de consumo e custeio, e o CNPq participaria com "um dote" com valor de até R$ 50 mil. ''A proposta foi aceita e ampliada para as regiões Nordeste e Centro Oeste': diz Camargo. Alagoas, Sergipe e Bahia já firmaram convênio no âmbito desse novo programa. Esta flexibilidade também permitiu que no Paraná e em Santa Catarina fossem firmados convênios para a realização de estudos e diagnóstico das diversas áreas de produção científica nos dois estados para identificar as regiões mais carentes.

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R$ 5,2 milhões por ano, serão divididos entre a FAPESP e o CNPq. Os proponentes devem ser recém-doutores. Serão financiáveis todos os itens de capital e custeio. Os interessados têm prazo para encaminhar propostas até o dia 22 de setembro. Para o Programa de Bolsas de Iniciação Científica [únior, o convênio oferecerá um total de 500 bolsas no valor de R$ 480 mil. Os alunos do ensino médio da rede pública serão selecionados pela FAPESP, que também será responsável pelo acompanhamento da execução dos projetos. Os pedidos de bolsa devem ser encaminhados à Fundação pelos coordenadores de projetos de pesquisa em andamento até o dia 22 de setembro por meio do e-mail icjjunior@fapesp.br. Em São Paulo, o Projeto Proteoma contará com R$ 2,4 milhões, e o financiamento será compartilhado entre a FAPESP e a Financiadora de Estudos e

de capital nos mesmos moldes previstos para os projetos temáticos da FAPESP, e as propostas poderão prever recursos de até R$ 1 milhão por um período de quatro anos. Os projetos deverão ser apresentados até o dia 22 de setembro.

Projetos (Finep) por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento Ciehtífico e Tecnológico. O convênio terá vigência de 12 meses, podendo ser prorrogado por mais um ano. O projeto será coordenado pelo Centro de Biologia Molecular Estrutural (CeBiME), do Laboratório Nacional de Luz Síncroton. Prevê a implementação de uma rede de pesquisa científica que dará suporte à continuidade de projetos genoma já realizados, como Xylella fastidiosa, Xanthomonas citri, do câncer e do bovino, entre outras ações. O convênio vai financiar desde upgrades de grandes equipamentos já disponíveis até a aquisição de mobiliários e pequenos equipamentos de apoio. As propostas deverão ser enviadas à FAPESP até o final de setembro. O Pronex, o quarto programa conveniado, contará com um total de R$ 30 milhões para apoiar a execução de projetos de grupos consolidados de pesquisa. Serão financiáveis itens de custeio e

Descentralização - Os novos convênios põem em prática a intenção do governo de descentralizar a ciência e a tecnologia no país. "Em alguns setores, essa idéia foi mal-entendida e interpretada como um seqüestro de recursos das regiões Sul e Sudeste", lamenta Camargo. ''A nossa intenção é trazer outros setores para participar das atividades da comunidade científica, e não fragmentar recursos:' As críticas às mudanças no Pronex - que passou a contar com contrapartida das FAPs - têm origem, segundo ele, nessa má interpretação. "O Pronex estava sem recursos, e o repasse era errático", justifica. A parceria com os estados permitirá dobrar os recursos do programa e, em três anos, atingir a casa dos R$ 100 milhões. Os recursos do CNPq, de acordo com Camargo, já estão provisionados. A expectativa é de que os estados cumpram os termos dos convênios. "Se os estados não o fizerem, cabe à comunidade científica mobilizar-se:' • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 25


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

CITRICULTURA

Diagnóstico precoce Empresa de biotecnologia cria teste para identificar morte súbita dos citros Doença atinge mais de um milhão de pés de laranjas

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ma forma rápida e precoce de fazer o diagnóstico da morte súbita dos citros (MSC), uma nova e misteriosa doença que ameaça a citricultura paulista e do sul de Minas Gerais e é capaz de matar em semanas um pé de laranja, deve ser oferecida aos produtores em breve. A Alellyx, empresa privada de biotecnologia ligada ao grupo nacional Votorantim, desenvolveu um teste que permitiria descobrir se uma árvore foi infectada pelo agente causador da morte súbita - provavelmente uma mutação do antigo vírus da tristeza dos citros, doença que, na década de 40, dizimou 80% da citricultura paulista antes de os primeiros sintomas da moléstia se manifestarem. "Nossa idéia é fechar um acordo de prestação de serviço com o setor para aplicarmos o teste numa amostra representativa dos laranjais do estado", diz Fernando Reinach, presidente da Alellyx, que estima o custo de uma empreitada de tal porte em alguns milhões de reais.

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Sopa de vírus - Segundo Reinach, os pesquisadores da empresa desenvolveram um novo método de seqüenciamento de misturas de vírus. Isso foi importante porque o patógeno da MSC não parece ser uma simples mutação do antigo vírus da tristeza, mas, sim, uma "sopa" de diferentes vírus mutados. "Conseguimos identificar as mutações", afirma ele. Hoje, o diagnóstico da MSC é sempre tardio. Podem se passar dois anos entre o momento da entrada do patógeno na árvore e o aparecimento dos sintomas, como a perda de brilho nas folhas da laranjeira decorrente do entupimento generalizado do sistema de condução da seiva elaborada da copa para as raízes. Nesse momento, a planta já apresenta queda na produtividade e, se nada for feito, caminha para a morte. A MSC já atingiu mais de um milhão de pés de laranja no sul de Minas e São Paulo, causando prejuízos de mais de US$ 20 milhões para a citricultura, que somente no território paulista emprega algo em torno de 400 mil pessoas.

Para o engenheiro agrônomo Marcos Antônio Machado, do Centro de Citros Sylvio Moreira, instituição pública situada em Cordeirópolis, interior paulista, onde também se pesquisa o agente causador da morte súbita e formas de controle da doença, ainda não é possível saber se o teste da Alellyx funciona realmente. "Não há dúvida de que os pesquisadores da empresa são bons, mas não sabemos em detalhes o que eles fizeram", afirma Machado. A MSC preocupa e mobiliza. A Secretária da Agricultura de São Paulo e a FAPESP buscam formas de cooperação para combater a doença. No inicio do ano, uma força tarefa foi criada para estudar a etiologia da doença, definir características da epidemiologia e desenvolver formas de controle. Uma das alternativas consideradas pela força tarefa é a substituição do porta-enxerto. Esta solução, no entanto, poderia ter impacto negativo nos custos de produção do citro. Ao mesmo tempo em que se busca acelerar as pesquisas, a FAPESP organiza um encontro entre pesquisadores de diversas instituições envolvidas nesta investigação para definir estrutura de ação mais eficaz. •


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA r-------------~----------------------------------------------------------------------------_,~

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IMPORTAÇÕES

Retomada gradativa Propostas de compras de bens e serviços voltam a ser analisadas

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:APESP vai retomar o processo de importação de bens e serviços. A medida foi autorizada pelo Conselho Superior que acatou proposta da diretoria científica da Fundação. Até o dia 15 de setembro serão aceitas solicitações para aquisição de material permanente, de consumo e serviços de terceiros, para projetos de pesquisa já contratados e com conclusão prevista para até 31 de outubro de 2003. Oportunamente, será divulgado o cronograma para atender demandas relativas a projetos com conclusão em data posterior a esta. As importações tinham sido interrompidas, em agosto do ano passado, em caráter emergencial, por conta de uma desvalorização de 67,5% do real em relação ao dólar registrada até o terceiro trimestre de 2002. Posteriormente, em outubro, para evitar prejuízos ao desenvolvimento de pesquisa, a FAPESP passou a autorizar, em caráter excepcional, compras externas de material de consumo e de peças de reposição, apenas na quantidade indispensável. Ago-

ra, essas aquisições serão reiniciadas, de forma planejada e gradativa, a fim de evitar danos irreparáveis aos projetos de pesquisa em fase de conclusão.

Pré-requisitos - A FAPESP analisará, em caráter emergencial, solicitações referentes a itens já constantes do Termo de Outorga e Aceitação. Somente serão autorizadas as importações dos bens e serviços considerados "absolutamente indispensáveis" para a conclusão do projeto, de acordo com portaria assinada pelo presidente da Fundação, Carlos Vogt. Não serão atendidas as solicitações de compra de equipamentos já existentes na instituição à qual está vinculado o pesquisador. O saldo dos recursos de Reserva Técnica, de cerca de 25% dos valores concedidos, eventualmente existente no projeto, será utilizado para cobrir os custos de importação desses bens. As solicitações que responderem a tais pré-requisitos serão atendidas de acordo com a disponibilidade orçamentária da Fundação. A estimativa é de que a retomada das importações atinja a casa

de US$ 5,4 milhões, que, somados aos US$ 2,22 milhões relativos às importações emergenciais já em curso, totalizarão US$ 7,62 milhões. Esse desembolso deverá ocorrer num período de, pelo menos, quatro meses e representará gastos mensais de cerca de US$ 1,9 milhão. Os investimentos serão realizados com os recursos orçamentários disponíveis em 2003. Por isso, a FAPESP recomenda aos interessados que renegociem com fornecedores os preços desses bens, para que seja possível atender o maior número possível de pedidos. As solicitações - que serão encaminhadas ao endereço eletrônico consulta_import@fapesp.br. - deverão conter informações sobre o pesquisador, estágio de desenvolvimento do projeto, prazo solicitado para a sua conclusão e os itens cuja importação é considerada indispensável. Na descrição desses itens devem constar quantidade e valor em moeda estrangeira, empresa fornecedora, razões que tornam a importação indispensável e uma breve descrição do parque de equipamentos de mesma natureza disponíveis na instituição. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 27


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA DIFUSÃO

Au Ia públ ica Centro de Óptica e Fotônica desmitifica a física para a comunidade de São Carlos

oito á anos, geralmente na terceira semana de agosto, os pesquisadores do Grupo de Óptica do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos, interrompem suas atividades para cumprir uma programação intensa que inclui aulas, palestras e seminários para milhares de estudantes de ensino médio, superior e de pós-graduação da região. Nesse período, conhecido como Semana de Óptica (Semóptica), o Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (CePOF), um dos dez Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) financiados pela FAPESP, cumpre uma de suas missões: difundir a ciência para a comunidade. "O evento é divulgado nas escolas e a procura cresce a cada ano", diz Vanderlei Bagnato, coordenador do CePOF, em São Carlos. O CePOF é formado por pesquisadores dos institutos de física da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos, e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). Em sua oitava edição, realizada entre os dias 19 e 23 de agosto, a Semóptica reuniu algo em torno de 4 mil estudantes. Os alunos puderam optar por aulas sobre diversas áreas da óptica, desde a física da bolha de sabão, passando pela nanotecnologia, até telecomunicações ópticas ou óptica retrativa. "Os cursos que utilizam demonstração com laser e lentes são os mais concorridos", conta Bagnato. Em todas as suas edições, a Semóptica é antecedida por uma mostra no shopping center da cidade de São Carlos, onde, além de experimentos dos pes-

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quisadores, também são expostos produtos desenvolvidos por empresas de alta tecnologia da região. A exposição, neste ano, ocupou uma área de 350 metros quadrados e foi visitada por cerca de 7 mil pessoas. "Essa é uma forma de aproximar a universidade da comunidade': diz Bagnato. Premiação - A cada dois anos, os alunos do ensino médio são convidados a escrever uma monografia sobre um tema ligado à ciência, com a qual disputam o prêmio Milton Ferreira de Souza, que homenageia um dos decanos do Instituto de Física da USP, idealizado r da Fundação Parque de Alta Tecnologia de São Carlos e criador da empresa Opto Eletrônica. No ano passado, ós alunos do ensino fundamental escreveram sobre o valor social da ciência e os do ensino médio, sobre as aplicações médicas do laser. Os prêmios - um laboratório de biologia com microscópio, lupas, entre outros equipamentos, patrocinado por quinze empresas locais - vão para a escola de origem dos vencedores. Neste ano, a Semóptica instituiu o prêmio Reconhecimento Científico e Tecnológico atribuído a uma personalidade com contribuição destacada no desenvolvimento da pesquisa no período. Nesta primeira edição, o prêmio foi conferido ao diretor-científico da FAPESP, José Fernando Perez, pela iniciativa da criação dos Cepids. ''A homenagem é à FAPESP, já que esses programas foram concebidos de forma coletiva", justificou Perez na cerimônia

de premiação e inauguração da 8" Semóptica, na qual estiveram presentes pesquisadores, entre eles o coordenador do CePOF na Unicamp, Hugo Fragnito, e os coordenadores de dois outros Cepids, o de Biotecnologia Molecular Estrutural, Glaucius Oliva, e o de Desenvolvimento de Materiais Cerâmicas, Elson Longo. •


• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

INOVAÇÃO

Mira nos negócios Curso de capacitação de gestores vai apoiar consolidação das empresas do PI P E

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empresas inovadoras têm alto potencial de geração de receitas e de empregos. Mas tudo depende da boa gestão do negócio. Para consolidar a inserção no mercado e ampliar o impacto sócioeconômico de pequenas empresas de inovação tecnológica, a FAPESP, em parceria com o Instituto Empreender Endeavor e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae - SP), lançou um projeto de capacitação de empresários apoiados pelo Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), criado pela Fundação em 1997. ''A maior parte das empresas tem visão mais clara do produto do que do negócio", justifica o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez. O projeto Capacitação Gerencial e Inserção no Mercado de Empresas do PIPE prevê a realização de cursos semestrais, com atividades presenciais e de ensino a distância, reuniões de aconselhamento estratégico com executivos da rede Endeavor, desenvolvimento de projetos de interesse específico em conjunto com estudantes de pós-graduação, entre outras atividades. Os cursos serão conduzidos pelo W-Institute, parceiro educacional contratado, responsável pelo corpo docente, pelo conteúdo, material didático e pela infra-estrutura tecnológica exigida pelo ensino a distância. Serão realizados em 49 municípios que

pelo PIPE em suas conferências internacionais, além de acompanhar e avaliar as atividades educacionais. A FAPESP oferecerá a infra-estrutura para a realização dos cursos. O Sebrae-SP custeará o programa educacional e incluirá os participantes empreendedores nas rodadas de negociação promovidas pela instituição voltadas à área de tecnologia, en~ tre outras tarefas. O projeto está orçado em R$ 808,4 mil. As empresas participantes contribuirão com o custeio do programa, pagando R$ 100 por empreendedor. O Sebrae-SP financiará 49% do custo total do projeto e o Instituto Endeavor e a FAPESP, juntos, farão contrapartidas financeiras correspondentes a 16,910/0 do projeto. O projeto será coordenado por um especialista contratado pela Endeavor, que será responsável pela implementação do cronograma de trabalho, elaboração do material de comunicação, operacionalização das aulas, aplicação de formulários de avaliação do projeto e elaboração de entrevistas de pré-seleção, entre outras atividades. Concluído o programa, os empreendedores seguirão participando de grupos de discussão e reuniões anuais organizadas pela coordenação do projeto. A expectativa é de que o curso de capacitação faça evoluir os indicadores de receitas, geração de emprego e aportes de investimento das empresas participantes do projeto.. N

abrigam projetos financiados pelo PIPE e a primeira turma contará com 100 participantes. Os três parceiros integrarão os comitês de seleção de empresas. A avaliação técnica dos projetos a serem financiados pelo PIPE continuará sendo de exclusiva responsabilidade da FAPESP. O Instituto Endeavor colocará à disposição do projeto sua rede de 146 executivos voluntários - da qual fazem parte presidentes e altos executivos de grandes empresas, advogados e investidores de risco. Além disso, se responsabilizará pelas sessões de aconselhamento, oferecerá vagas gratuitas em seus workshops semanais, concederá 25% de desconto aos empreendedores apoiados

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• CIÊNCIA

LABORATÓRIO

• O sagrado sono dos adolescentes Rapazes e moças estão dormindo menos do que necessitam. De acordo com especialistas do laboratório do sono Wits Dial-a-Bed Sleep, na África do Sul, seria normal o adolescente dormir até tarde, pois sente sono mais tarde e tende a protelar a hora de ir dormir. Mandá-lo para a cama cedo ou despertá-lo cedo de-

mais de manhã seria uma violação de seu relógio biológico. Recentemente, escolas dos Estados Unidos e de Israel adaptaram seus horários a essa característica e aumentaram o aproveitamento escolar. Em contrapartida, os jovens sulafricanos dormem em média 7 horas e meia por noite consideradas insuficientes - e sentem sono na escola, o que estaria prejudicando o desempenho escolar. Uma pesquisa

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MUNDO

publicada na Sleep mostrou que os alunos de 11 a 15 anos que dormem mais vão melhor, faltam menos e sentemse mais dispostos na escola que os que dormem menos. •

• Cinco anos até publicar um artigo Há cinco anos, o matemático Thomas Hales, da Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos, anunciou ter conse-

guido provar um postulado do astrônomo alemão Iohannes Kepler (Nature, 23 de julho). Quatrocentos anos atrás, Kepler havia afirmado que a maneira mais eficiente de agrupar esferas, ocupando o menor espaço possível, era empilhá-Ias em pirâmides, como se faz com as laranjas e os limões nas feiras. Para chegar à solução, Hales reduziu o número infinito de arranjos possíveis das esferas a 5 mil varia-


ções. Com o auxílio de computadores que trabalharam com um código especialmente escrito para analisar o problema, o matemático avaliou 100 mil inequações em dez anos. Hales submeteu o trabalho para publicação nos Annals of Mathematics, a pedido do editor Robert McPherson. Mas a análise do artigo se revelou complicada. De modo incomurn, McPherson enviou o trabalho à apreciação de doze matemáticos, em vez de dois ou três como é comum. Como não bastava repetir a análise por computador e era impossível verificar linha por linha o código do programa e os resultados das inequações, os especialistas avaliaram o raciocínio usado em cada passo e a lógica do código. Exaustos, os revisores declararam em julho que havia 99% de certeza de que a prova estivesse correta - não acharam erros nem omissões. Mas disseram que a certeza absoluta só viria com a avaliação completa do programa. Os editores liberaram a publicação do artigo, que deve sair em 2004 com uma observação: trabalhos que exigem uso intensivo de computador podem ser impossíveis de serem revisados por inteiro. Hales não gostou. •

• Água não é mais H20 A fórmula da água não é mais a mesma, pelo menos do ponto de vista dos nêutrons e elétrons que interagem com a molécula da água por uns poucos attosegundos (1 attosegundo corresponde a 1 trilionésimo de segundo). Experiências feitas na Universidade de Berlim, na Alemenha, revelaram que, durante as colisões ultra-rápidas com a água, os nêutrons e elétrons não

A gota d'água: fórmulas e reações químicas sob revisão encontram mais que um átomo e meio de hidrogênio para cada átomo de oxigênio - algo mais parecido com Hl,SO do que com o tradicional H20 (Physical Review Letters, 10 de agosto). A fórmula da água não deverá ser a única a sofrer revisões com essa janela de tempo denominada attosegundo, capaz de revelar efeitos quânticos de duração tão ínfima que antes nem podiam ser apreendidos. Mais que revisar fórmulas, essas experiências abrirão caminho para o entendimento das reações químicas que ocor-

rem em uma escala de 100 a 500 attosegundos, já que os estudos a laser nessa escala permitem seguir a trajetória do elétron dos átomos para a molécula. •

• Comparando ratos e elefantes Os elefantes são maiores que os ratos porque têm mais células, é claro. Mas a pergunta seguinte é mais difícil: por quê? Ernst Hafen, da Universidade de Zurique, parece ter descoberto um mecanismo que controla o número

A melhor forma de empilhar frutas: computadores para provar postulado de 400 anos

de células e, portanto, o tamanho de um animal (Journal of Biology, 6 de agosto). Hafens verificou em drosófiIas, as moscas-das-frutas, que a ação de uma enzima chamada FOXO aumenta quando a atividade da insulina está baixa. Resultado: diminui o número de células das larvas da mosca, tornando-as menores que o normal. Um processo semelhante pode explicar a diferença de tamanhos entre espécies distintas de mamíferos, que também possuem a enzima. O pesquisador viu ainda que, quando a FOXO não funciona de forma adequada, as moscas parecem normais, mas são mais sensíveis à oxidação celular, associada ao envelhecimento. Em excesso, a enzima causa a morte das células. •

• Insulina para correr mais Cresce o número de pessoas que recorrem à insulina para turbinar seus corpos. A Britsh [ournal of Sports Medicine de 10 de agosto relata o caso de um homem de 31 anos que chegou a um hospital inconsciente com crise hipoglicêmica, aparentemente de origem diabética. Ao acordar, confessou que era um fisiculturista que se preparava para uma competição. Tomava insulina três vezes por semana para aumentar a massa muscular e, na véspera, tinha usado insulina de efeito rápido combinada a esteróides. Faz sentido. Os músculos se nutrem de glicogênio durante o exercício. Quanto mais glicogênio conseguem armazenar, maior a energia obtida. Se os esteróides fazem aparecer músculos, a insulina os reforça. O inconveniente: qualquer descuido pode terminar em coma diabético ou morte. •

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 31


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Caminho livre para as bactérias ..,....------,'"

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Tratamento interrompido Os casos de tuberculose multirresistente, causada por variedades do

Mycoplasma tuberculosis (acima) não contidas por pelo menos dois antibióticos, propagam-se mais facilmente com alcoolismo, tabagismo, número de tratamentos

• Físicos numa mina de ferro Começou a funcionar no dia 14 de agosto o primeiro detector subterrâneo do Minos, sigla de Busca das Oscilações de Neutrinos Usando o Injetor Principal, construído a 750 metros abaixo da superfície, na mina de ferro Soudan, no norte de Minnesota, Estados Unidos. O chamado detector remoto (far detectar) será utilizado no estudo dos neutrinos, partículas elementares que viajam quase à velocidade da luz e se formam em abundância no Solou pela fragmentação dos raios cósmicos na alta atmosfera terrestre. O Minos consiste de dois detetores: o remoto, com 5,4 mil toneladas e 20 metros de

anteriores ou tratamentos irregulares contra essa doença e a falta de esgoto, segundo estudo feito no Hospital de Maracanaú, Ceará (Jornal

de Pneumologia). As conclusões resultam da comparação entre os modos de vida de 134 pessoas atingidas por variedades multirresistentes e 185 não afetadas. •

extensão, com 486 lâminas metálicas octogonais de 7 metros de diâmetro que lembram fatias de um pão; e o próximo (near detectar), com 980 toneladas, situado no Fermilab, a 750 quilôrne-

Comida mal conservada No Rio Grande do Sul, o uso de ingredientes sem inspeção sanitária sobretudo ovos - no preparo dos alimentos e sua conservação à temperatura ambiente por mais de duas horas são as principais causas da salmonelose, infecção

tros de distância. O conjunto completo, incluindo o feixe de neutrinos produzidos no acelerador de partículas Fermilab, entrará em operação no começo de 2005. "Já vimos que o detector remo-

provocada pela Samonella spp. (acima), com diarréias e febre. Um estudo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brazilian

Journal of Microbiology) mostra que quase metade das contaminações se deve ao consumo de maionese feita em casa sem o devido cuidado. •

to funciona muito bem e faz uma ótima reconstrução dos eventos de raios cósmicos determinando bem a energia dos múons (um tipo de partículas) de raios cósmicos", comenta o físico Carlos Ourívio Escobar, do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Esse projeto congrega cerca de 200 físicos de seis países: Estados Unidos, Brasil - representando pela Unicamp e Universidade .de São Paulo (USP) França, Grécia, Rússia e Reino Unido. •

o

detector do Minos: 486 placas metálicas como esta ' PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 33


R

CIÊNCIA

Ecos

da separação Estresse gerado por breves ausências da mãe nos dias seguintes ao parto lesa o cérebro de animais de laboratório e provoca infertilidade nos filhotes MARCOS

PrVETTA

inguém duvida de que estresse demais pode comprometer o desempenho sexual e as funções reprodutivas. Mas quem suspeitaria de que a pressão psicológica de ficar apenas dois minutos por dia longe da mãe, durante os dez primeiros dias imediatamente após o parto, fosse tão intensa a ponto de causar danos cerebrais irreversíveis num rato recém-nascido? E mais: quem acreditaria que essas lesões nervosas surgidas na mais tenra infância poderiam desencadear um quadro de infertilidade em grande parte desses animais durante a vida adulta, caracterizado pela redução da libido, por alterações hormonais e pela dificuldade de ovular, nas fêmeas, e de produzir esperrnatozóides, nos machos? Pesquisadores paulistas e gaúchos, que trabalham em conjunto num projeto temático apoiado pela FAPESP, não só acreditaram nessa hipótese como agora a defendem publicamente num artigo a ser impresso na edição de outubro da revista científica norte-americana Behavioral Neuroscience. No estudo, a equipe mostra que roedores que foram momentaneamente separados da mãe logo depois do nascimento apresentaram, quando adultos, uma redução da ordem de 30% no número de células nervosas de uma pequena região do cérebro, o locus coeruleus. Classicamente ligada à resposta ao estresse, tal estrutura nervosa passou, mais recentemente, a ser relacionada ao comportamento sexual e ao funcionamento do sistema reprodutivo. Aparentemente, a causa da diminuição na quantidade de neurônios no locus coeruleus foram justamente os 20 minutos que esses animais ficaram afastados de sua mãe ao longo dos dez primeiros dias de sua vida. Num segundo trabalho, com resultados ainda preliminares e ainda não publicados em revistas científicas, os pesquisadores constataram uma queda significativa na quantidade de neurônios em outra estrutura cerebral envolvida na resposta ao estresse e no processo reprodutivo, o núcleo paraventricular. "O estresse no período neonatal produz 34 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91


Detalhe de A Virgem da Cesta, Antonio Allegri Correggio

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compreende a parte mais crítica do pemarcas definitivas e estáveis em alguríodo neonatal dos roedores. mas áreas específicas do sistema nervoOs efeitos da manipulação neonatal so central que, por sua vez,levam a mudanças no comportamento sexual e na são quase instantâneos e persistem ou até se agravam com o tempo. No décicapacidade reprodutiva durante a vida adulta", explica a mo primeiro dia de vida dos animais, sofisiologista Ianete Anselmo-Franci, da Uni-o mente 24 horas depois estresse de terminado o experiversidade de São Paumento, já é possível velo (USP), em Ribeirão causou a morte rificar uma redução Preto, coordenadora relevante na quantidado projeto temático e de 30% dos de de neurônios nas grande estudiosa do neurônios de uma duas áreas cerebrais espapel do loeus coerutudadas. Quando os raleus no sistema reproárea do cérebro tos entram na fase dutivo feminino. "Não dos filhotes adulta, as lesões consão alterações genetinuam lá, às vezes de ralizadas em todas as forma ainda mais seáreas cerebrais, mas vera, um indício de sim danos em regiões localizadas", comenta o fisiologista que o estrago em pontos do sistema nervoso central deve ser perene. Os daAldo Lucion, da Universidade Federal nos se manifestam tanto em animais do do Rio Grande do Sul (UFRGS), que sexo masculino quanto feminino, emestá à frente do núcleo gaúcho ligado bora apresentem maior magnitude nas ao projeto. O loeus eoeruleus e o núcleo ratas. Talvez isso se deva à suspeita de paraventricular não são estruturas exque seu sistema reprodutivo - sobretuclusivas dos roedores - também estão do o processo de ovulação - seja mais presentes em outros mamíferos e no dependente da atuação do loeus eoeruser humano. leus, a estrutura nervosa estudada em mais detalhes no projeto. Por ter um ciLonge da mãe - A perda de células nerclo ovariano bastante semelhante ao da vosas nessas áreas cerebrais se produziu mulher, com o mesmo perfil de horem ratos recém-nascidos que foram submônios sexuais envolvidos nesse prometidos a um tipo de intervenção chacesso, a rata é freqüentem ente usada mada no jargão técnico de manipulação neonatal. Para um leigo, tal expressão em estudos que enfocam a reprodução feminina. Seu padrão de ovulação tamremete, erroneamente, à idéia de que os filhotes foram literalmente molestabém é espontâneo e regular - com a .dos ou maltratados logo após o parto, o diferença de que seu ciclo completo que explicaria o seu alto grau de estres- .dura apenas 4 ou 5 dias, enquanto o da mulher leva em média 28 dias. "Nas se e as lesõescerebrais permanentes manifestadas mais tarde. Mas não é isso ratas, podemos observar os mesmos fenômenos que ocorrem na mulher de que a expressão significa. A manipulação neonatal- uma forma da causar esforma mais rápida", diz Janete. tresseusada em experimentos com ratos As ratas nascem com cerca de l.500 desde a década de 50 - caracteriza-se neurônios nessa estrutura, um centro pela interrupção momentânea e, à prinervoso do tronco cerebral não muimeira vista, quase inofensiva do estreito distante da medula espinhal, que no to convívio mãe-filho que se estabelece ser humano é pigmentado (daí o nome loeus coeruleus, que quer dizer,em latim, nos dias seguintes ao nascimento. A inlugar azul). Quando as fêmeas não são tervenção dos pesquisadores, portanto, submetidas ao processo de estresse delimitou-se ao gesto de afastar os filhorivado da manipulação neonatal, há com tes da mãe durante dois minutos a cada período de 24 horas. Durante esses 120 o passar do tempo um ligeiro aumento na quantidade de neurônios nesse local. segundos diários em que ficaram longe Elas chegam a apresentar l.800 células da mãe, os ratinhos permaneceram gentilmente alojados nas mãos enluvanervosas no loeus eoeruleus na faseaduldas de um pesquisador. Tal procedita, com 90 dias de vida. Já as ratas esmento foi repetido entre o primeiro e o tressadas, que se viram privadas do condécimo dia de vida dos ratinhos, que tato materno por alguns minutos no

o

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início do período neonatal, apresentam em seu décimo primeiro dia de vida somente um dia após o termino da manipulação - 970 neurônios no loeus eoeruleus. Um terço a menos do que no momento de seu nascimento. "Ainda não se sabe o que causa a morte dessas células nervosas': afirma Lucion. E o pior é que essa quantidade de neurônios praticamente não aumenta quando as fêmeas entram na fase adulta. Além de constatar a perda de neurônios, os pesquisadores mediram outro parâmetro que mostra a retração do loeus coeruleus nas fêmeas. Na fase adulta, o volume dessa estrutura em ratas que haviam sido estressadas no período neonatal era quase um quarto menor do que o verificado em fêmeas que não tinham sido manipuladas (0,037 milímetros cúbitos contra 0,050 milímetros cúbicos). Nos ratos machos, ocorre praticamente o mesmo: tanto o número de neurônios como o volume do loeus eoeruleus mostram-se reduzidos. lesões cerebrais decorrentes do estresse no período neonatal, que causam um desbalanço na liberação de hormônios sexuais, repercutem diretamente sobre o seu interesse sexual e a capacidade de procriação. Do ponto de vista comportamental, há uma menor ânsia pelo ato reprodutivo. "Os machos quase não perseguem as fêmeas na época da ovulação, montam menos nas parceiras, ejaculam pouco e a sua produção de espematozóide se reduz", diz Lucion. As ratas, principal foco de estudo dos trabalhos, também agem fora do padrão. Durante o cio, quase não fazem a lordose, um movimento destinado a estimular a penetração do macho, caracterizado pelo empinamento da parte traseira e exposição de sua genitália. "A maioria das fêmeas não ovula e dois terços não conseguem engravidar", afirma Lucion, da UFRGS. Seria temerário especular, num exercício de simples transposição mecânica, que os danos cerebrais verificados em animais - e os problemas sexuais e reprodutivos decorrentes dessas lesões - também devam ocorrer em bebês humanos que, por algum motivo, não receberam a devida atenção da sua mãe ou de alguém que represente a figura materna durante os

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Detalhe de A Virgem e o Menino, Thierry Bouts

primeiros dias ou meses de vida. Embora haja muitas semelhanças entre o sistema nervoso central do rato e o do ser humano, há também diferenças que não podem ser negligenciadas. Em trabalhos que tentam mapear o impacto de um estímulo estressante em recémnascidos, como os da equipe USPUFRGS, um detalhe precisa ser levado em conta: no momento do parto, o cérebro de um ratinho que acaba de vir ao mundo se encontra num estágio de formação mais atrasado do que o cérebro de um recém-nascido humano. Nessa fase de desenvolvimento, sua vulnerabilidade a agressões externas, como um evento estressante, é teoricamente maior do que a apresentada pelos neurônios de um bebê no período neonatal. Apesar disso, ainda que perigosa, a comparação entre ser humano e roedor está longe de ser desprovida de lógica. Afinal, muito do que se sabe sobre a fisiologia de nossa espécie - aí incluída a

área de reprodução, ponto-chave dos estudos aqui tratados - decorre de observações feitas previamente em mamíferos. Por isso, uma das linhas de estudo dos pesquisadores paulistas e gaúchos .procura medir possíveis efeitos negativos da pouca interação entre mães com depressão pós-parto e seus filhos recémnascidos, uma situação que pode guardar alguma semelhança com o experimento de manipulação neonatal feito com ratos. Os resultados desses trabalhos mostram que a carência de contato físico entre mãe e filho e de outras formas mais sutis de interação podem ser fatores de estresse para a criança. "Até mesmo a reduzida troca de olhares entre a mãe e o bebê pode ter esse efeito", diz Lucion. Exagero? Nada disso. A psiquiatra Gisele Manfro, da UFRGS, encontrou, por exemplo, elevados índices de cortisol, um hormônio esteróide que funciona como um marcador de estresse, na

saliva de bebês filhos de mães que apresentavam depressão pós-parto. Em outras palavras, há indícios consistentes de que a falta de atenção materna parece ter exercido uma pressão psicológica sobre o recém-nascido. Isso pode ser dito. Mas daí a afirmar que esse estresse, a exemplo do que acontece com ratos separados da mãe no período neonatal, pode provocar pequenas lesões em certas regiões do cérebro e causar infertilidade na vida adulta vai uma distância enorme. "Estabelecer esse tipo de relação em humanos é muito difícil e demandaria décadas de estudos", comenta [anete, "O que podemos dizer é que nossos trabalhos reforçam a hipótese de que as dificuldades de reprodução de alguns casais, em especial das mulheres, podem derivar de um estado psíquico do presente ou até do passado." Para entender as amplas implicações decorrentes da perda de neurônios no locus coeruleus é preciso compreender o PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 37


papel desempenhado por essa pequena estrutura cerebral na manutenção do comportamento sexual e da capacidade reprodutiva dos ratos. Com seus 1.800 neurônios, o loeus eoeruleus é o principal núcleo noradrenérgico do cérebro. Tal termo é usado para designar um grupo de neurônios que, quando estimulado, libera noradrenalina, substância intimamente ligada a conceitos como medo e estresse. Atuando como hormônio na corrente sanguínea e neurotransmissor no cérebro, onde, ao lado de outras substâncias, intermedeia a troca de mensagens químicas entre os neurônios, a noradrenalina é o centro de muitos estudos sobre o papel do sistema nervoso central na reprodução. "Nas fêmeas, a presença da noradrenalina é de essencial importância para que ocorra um pico na secreção do hormônio luteinizante (LH) pela glândula hipófise', explica o endocrinologista Celso Rodrigues Franci, da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, outro participante do projeto temático."Sem esse pico, não há ovulação." e acordo com [anete, essa função do loeus eoeruleus, de estimulado r do pico de LH que antecede e desencadeia a ovulação, foi demonstrada pela primeira vez por ela e José Antunes Rodrigues, também da USP em Ribeirão Preto, em 1985, na revista Neuroendoerinology. Daí para frente, tal efeito tem sido confirmado por sua equipe em vários trabalhos publicados nos últimos anos em revistas internacionais. Na revista Brain Researeh, entre 1997 e 2002, os brasileiros emplacaram três artigos sobre o papel do loeus eoeruleus. O mecanismo de ação desse núcleo noradrenérgico portanto, de uma região do cérebro sobre a capacidade reprodutiva feminina é bastante complexo. A ovulação só acontece se for mantida uma sucessão de eventos e estímulos hormonais sincronizados, que coordenam uma série de ações e reações no organismo. Desde a década de 30 se sabe que os hormônios sexuais produzidos pelo ovário - estrógeno e progesterona - inibem a secreção de LH pela hipófise durante a maior parte do ciclo menstrual. Esse é o princípio básico da pílula anticoncepcional, que passou a ser utilizada internacionalmente na década de 60.

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Esperança para quando o leite secar A mãe de um bebê recém-nascido sofre um estresse - bate o carro ou um parente próximo morre - e o leite seca. Todo mundo já ouviu uma história assim sobre o impacto de um evento negativo na amamentação. De tão freqüente, essa situação é alvo de estudos que tentam entender os mecanismos envolvidos na interrupção da produção do leite materno. Para isso, os cientistas estudam os processos de regulação da secreção de prolactina, o hormônio que controla a produção de leite. As lactantes precisam manter níveis altos de prolactina para que a produção de leite não seja interrompida. De alguma forma, o estresse derruba a

Mais tarde, no entanto, a literatura científica mostrou que, paradoxalmente, no meio do ciclo menstrual, em torno do décimo quarto dia, aumentos na secreção desses hormônios eram absolutamente necessários para deflagrar o pico de LH e, por conseguinte, levar à ovulação. Ou seja, começou a ficar claro que, de acordo com a fase do ciclo menstrual, a presença dos hormônios sexuais pode ter efeitos opostos: ora inibe a liberação de hormônio luteinizante, ora a estimula. Como se sabe, sem a ocorrência do pico de produção de LH, não há ovulação. Ainda hoje, essa contraditória ·dualidade de funções dos hormônios sexuais sobre a ovulação não é bem compreendida pelos estudiosos. Mui-

o PROJETO Sistema Reprodutor Feminino: Controle Neuroendócrino e Efeitos do Estresse MODALIDADE

Projeto Temático COORDENADORA JANETE APARECIDA ANSELMo-

Franci/Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto/USP INVESTIMENTO

R$ 1.056.714,56

concentração de prolactina, que nas lactantes é normalmente alta, e dificulta a amamentação. Um passo para a melhor compreensão desse mecanismo foi dado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto, e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Eles viram que bloquear a ação de outro hormônio - a angiotensina 11, mais conhecida por sua ação de constrição dos vasos sangüíneos, com impactos sobre a pressão arterial - num ponto específico do cérebro de ratas lactantes que haviam sido estressadas evita a esperada queda na produção de prolactina

tos pesquisadores tentam, por exemplo, descobrir interações entre esses hormônios e estruturas cerebrais que podem ser decisivas para que ocorra a ovulação. Nessa linha de pesquisa, o grupo de Ribeirão Preto começou a desconfiar que o loeus eoeruleus poderia estar relacionado ao circuito cerebral que atua sobre a ovulação quando, anos atrás, lesou esse grupo de neurônios em ratas adultas e observou os efeitos desse procedimento. "Vimos que as fêmeas não ovulavam", afirma Ianete. Depois de realizar uma série de experimentos, alguns muito recentes e com resultados ainda não publicados, o grupo da USP formulou um modelo que tenta dar conta da ordem dos eventos que levam à ovulação. De forma esquemática, o modelo pode ser assim resumido. No período pré-ovulatório do ciclo menstrual, a forma mais comum e ativa de estrógeno, chamada estradiol, é secretada pelo ovário e começa a atuar nas células nervosas do loeus eoeruleus, induzindo-o à síntese de receptores para a progesterona, outro importante hormônio sexual produzido pelo ovário. Num segundo momento, o folículo ovariano maduro, que contém o óvulo pronto para ser expulso, passa a secretar progesterona. Tal hormônio se liga então a seus receptores no loeus coeruleus, onde deve estimular a se-


decorrente de um trauma psicológico. Tal efeito, que pode ser benéfico à produção de leite, foi obtido por meio da injeção de um anti-hipertensivo no núcleo arqueado do hipotálamo, região do cérebro que controla a secreção de prolactina. "Esses resultados confirmam, em um modelo fisiológico, o papel da angiotensina II na inibição da prolactina", afirma Gilberto Sanvitto, do Insti-

tuto de Ciências Básicas da Saúde da UFRGS, que realizou o procedimento em roedores. Desde a década de 60, há evidências mostrando que o estresse crônico ou agudo produz um aumento na concentração do hormônio angiotensina 11 no sangue e no cérebro. Esse aumento, acreditam os pesquisadores, é um dos fatores que fazem a concentração de prolactina cair, o que levaria

a uma inibição da produção de leite. Portanto, em tese, o emprego de um anti-hipertensivo, como feito experimentalmente com as ratas, conseguiria impedir o efeito negativo para a lactação do excesso de angiotensina 11 decorrente do estresse. "Bloquear a ação no cérebro da angiotensina 11 é uma proposta para contornar a falta de leite materno por estresse", diz Ianete Anselmo- Franci, da USP, em Ribeirão Preto. Apesar dos resultados promissores em animais, tal procedimento ainda está em fase de testes e seu uso não é recomendado na clínica médica em humanos.

Detalhe de Caritas, Cranach, o Velho

ereção de noradrenalina. Esse neurotransmissor ativa um grupo de neurônios que produzem o hormônio liberador de LH, chamado de LHRH. A presença do hormônio LHRH, por sua vez, é o sinal-chave para que a hipófise acelere a secreção do hormônio luteinizante. E é este, quando atinge seu pico de liberação, que, por fim, estimula a ovulação. "Nosso modelo difere dos outros porque defende a idéia de que a progesterona ativa o loeus eoeruleus e essa estrutura é que aciona o grupo neurônio LHRH", comenta Ianete, "Antes, pensava-se que o estrógeno e a progesterona atuassem diretamente sobre o LHRH." Gravidez em atletas - Não chega a ser de todo surpreendente verificar que uma forma de estresse, como a manipulação neonatal em ratas, é capaz de bagunçar a produção de hormônios e influir decisivamente no desempenho sexual e re-

produtivo. Alguns estudos mostram que grande parte das mulheres atletas, submetidas diariamente a grande pressão psicológica em treinos e competições na busca por bons resultados, apresenta um ciclo ovulatório irregular. Para essas esportistas, ainda que aparentemente saudáveis, engravidar pode ser uma tarefa mais difícil do que para a maioria da população feminina. "O mesmo pode acontecer com aeromoças que trabalham em vôos longos, intercontinentais, que vivem mudando de fuso horário", comenta o endocrinologista Franci. Nesses casos, certos especialistas acreditam que a ovulação não ocorre devido ao estresse, que pode levar ao excesso de noradrenalina ou de outras substâncias que intermedeiam circuitos neurais relacionados à secreção de LH. Seria uma situação inversa à das ratas com lesão no loeus eoeruleus, que não ovulavam devido à escassez desse neurotransmissor.

Numa jogadora de vôlei ou basquete, a pressão psicológica por bons resultados, aliada a uma estafante carga de exercícios, estimularia mais do que o necessário - e na hora errada - o loeus eoeruleus, que despejaria sem freios a noradrenalina no cérebro. Resultado: uma pane na ovulação, por excesso de neurotransrnissoro Por ora, essa idéia ainda é uma hipótese, não um fato totalmente comprovado. Mas há quem a defenda. "Tanto a falta quanto o excesso de noradrealina alteram o pico do hormônio luteinizante, que é imprescindível para a ocorrência da ovulação': afirma Ianete, "Muitas. vezes, uma atleta só consegue engravidar quando pára sua atividade esportiva e o seu ciclo hormonal volta ao normal:' Como quase tudo pode ser um fator de estresse (um ferimento, uma doença, uma preocupação qualquer), a correria e as preocupações da vida moderna podem estar por trás de alguns casos inexplicados de infertilidade humana. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 39


• CIÊNCIA BIOQUÍMICA

Fuga do labirinto Equipe carioca propõe nova explicação para a origem do mal de Parkinson e de doenças raras que afetam rins, coração, olhos e nervos

OdOmomento o fígado fabrica e despeja no sangue milhares de unidades de uma proteína que funciona como um teleférico: de maneira alternada, ela se liga a dois compostos essenciais ao funcionamento harmonioso do organismo e os carrega pelo interior de artérias e veias para, em seguida, distribuí-los às células do corpo. O nome dessa proteína, transtirretina, é na realidade uma sigla que anuncia sua função: transportar o horrnônio tiroxina, produzido pela glândula tireóide, e o retinol, a forma ativa da vitamina A. Associada ora a um ora a outro desses compostos, a transtirretina circula pelo sangue durante quase toda a vida. Com o envelhecimento, porém, a transtirretina tende a se unir em longos cordões - ou fibras -, que se acumulam durante décadas no coração. Os longos cordões se tornam uma espécie de muro entre as células, que prejudica o funcionamento do músculo cardíaco e dificulta o bombeamento do sangue. Uma em cada quatro pessoas com mais de 80 anos vive esse problema, chamado amiloidose sistêmica senil. O químico norte-americano Jeffery Kelly, do Instituto de Pesquisa Scripps, nos Estados Unidos, propôs há quase dez anos um

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40 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

modelo teórico para explicar o aparecimento dessa forma de amiloidose. Quando velhas, as proteínas são levadas para serem degradadas em uma espécie de usina de reciclagem das células denominada lisossomo. Ali, as transtirretinas seriam desmontadas em suas quatro partes básicas - os blocos chamados monômeros, que serviriam de matéria-prima para a formação dos cordões que se acumulariam nas células e depois formariam depósitos extra celulares chamados de fibras amilóides, que atuariam como verdadeiros muros entre as células, atrapalhando seu funcionamento.

Modelo simplificado - Mas pode não ser bem assim. Em uma série de estudos publicados recentemente, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) apresentam um mecanismo que explica de modo mais simples a formação das fibras típicas da amiloidose sistêmica senil pelo acúmulo das transtirretinas - um processo semelhante ao que se verifica em outras duas doenças características do envelhecimento, o mal de Parkinson, que leva ao descontrole dos movimentos do corpo, com tremores sobretudo nas mãos, e o mal de Alzheimer, que provoca a perda da memória, cada uma delas causada pela união de uma proteína diferente.


Nesse novo modelo, a transtirretina nem chegaria a ser desmontada nos lisossomos e permaneceria inteira no sangue, embora sem se ligar à tiroxina e à forma ativa da vitamina A, cuja concentração diminui com a idade. Assumiria então uma forma alterada, que deixaria mais expostos seus segmentos que repelem as moléculas de água e servem de ponto de contato. entre duas transtirretinas. Depois, pela mesma razão, outras moléculas de transtirretinas se uniriam sucessivamente. O resultado seriam as fibras amilóides, agora formadas pelo acúmulo das transtirretinas inteiras e não pela união das unidades que a constituem, os monômeros. "Essa proposta é mais coerente, uma vez que não pressupõe a passagem da proteína pelos lisossomos, onde jamais foi vista", diz a bióloga Debora Foguel, da UFRJ, que contou com apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Os pesquisadores do Rio chegaram a esse novo modelo após experimentos em que submeteram a transtirretina a pressões altíssimas, até 3.500 ve-

zes superiores à do nível do mar, que é de uma atmosfera. A alternância entre pressões altas e baixas alterou a forma da proteína, que passou a formar fibras em menos de 30 minutos. Antes, por meio de reações químicas, as fibras custavam até quatro dias para se constituírem. Ganhou-se assim uma' forma mais rápida de obter fibras amilóides, o que abre a possibilidade de uso desse método na seleção de compostos químicos a serem usados como medicamentos. efato, a equipe coordenada por Debora e pelo médico Ierson Lima da Silva, do Centro de Ressonância Magnética Nuclear da UFRJ, está testando compostos capazes de combater a formação das fibras características da amiloidose senil sistêmica do mal de Parkinson e do mal de Alzheimer. Entre os cinco tipos de compostos analisados nos últimos meses, os candidatos mais promissores, que se mostraram capazes de impedir a formação das fibras características de Alzheimer e da própria transtirretina, são os compostos da família do anilino naf-

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taleno sulfonado, um líquido amarelo usado apenas como reagente químico, para mapear o enovelamento de proteínas. "Mas os resultados são muito preliminares", alerta Debora. "Ainda serão necessários anos de pesquisa até que se consiga algum medicamento que possa ser usado por seres humanos." Velhos e jovens - Enquanto a forma normal ou selvagem da transtirretina se acumula lentamente e só causa problemas no coração dos idosos, suas formas alteradas - ou mutantes - são mais agressivas e atacam os rins e os nervos de outro público, os jovens - é a amiloidose familiar polineuropática. Embora rara na maioria dos países, com uma incidência de um caso em cada 1 milhão de pessoas por ano, é mais freqüente em comunidades isoladas de Portugal, da Suécia e do Japão, podendo matar antes dos 30 anos. No Brasil, já se estudou cerca de 30 casos em 24 famílias, todos provocados pela forma mutante mais comum dessa proteína. Quando diagnosticado, o problema só pode ser resolvido com um transplante de fígado, o órgão que produz a proteína. PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 41


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pelas transtirretinas selvagens se desfazia em unidades menores, aquelas compostas pelas proteínas mutantes não se desmontavam completamente, apenas geravam fibras mais curtas. «As fibras encurtadas são muito resistentes à pressão e aparentemente mais tóxicas para as células", explica Debora.

A proteína transtirretina: defeitos aceleram a formação das fibras

Trabalhando hoje em colaboração com Kelly, a equipe da UFRJ mostrou que duas das 80 formas mutantes da transtirretina já identificadas - a mais comum delas, conhecida pela sigla V30M, freqüente em Portugal, e a mais agressiva, a L55P, que afeta principalmente os suecos - se parecem muito com a proteína normal e também lembram uma ampulheta. A diferença é tão pequena que, por si só, não bastaria para explicar a agressividade das formas modificadas ou mutantes. Num artigo publicado em maio no [ournal of Molecular Biology, Debora descreve como surge essa pequena diferença: pequenos defeitos no gene que contém a receita dessa proteína, localizado no cromossomo 18, causam a troca de apenas uma das 127 unidades (aminoácidos) que compõem cada um dos quatro blocos da transtirretina. A substituição de apenas um aminoácido - uma metionina por uma valina na V30M ou uma prolina por uma leucina na L55P - faz com que a proteína assuma uma forma mais frágil que a selvagem. «Por ser mais frágil que a proteína selvagem, a proteína mutante é menos estável e pode mais facilmente assumir a forma que gera as fibras amilóides",

afirma Debora. Quando compararam a capacidade de agregação das três formas da proteína - a V30M, a L55P e a selvagem -, os pesquisadores do Rio constataram que a versão selvagem da proteína forma fibras amilóides mais lentamente que as outras duas. Viram ainda que a transtirretina com a alteração mais agressiva, a L55P, gerava as fibras mais rapidamente que a forma mutante mais comum, a V30M. Esses resultados explicam por que os sintomas se manifestam mais cedo, por volta dos 20 anos, nas pessoas que produzem a forma mais agressiva da proteína, a L55P, e mais tarde nos indivíduos cujas fibras amilóides se formam a partir da variedade selvagem. A importância clínica do trabalho da equipe do Rio fica mais clara a partir dos resultados de outro estudo, publicado em 19 de agosto no Procee-

dings of the National Academy of Seiences. Dessa vez, Debora decidiu comparar o comportamento das fibras amilóides resultantes da união das transtirretinas selvagens com as formas mutantes frente à pressão hidrostática. Após submeter as fibras à pressão de 3.000 atmosferas, veio a conclusão: cada fibra se desmontava de uma maneira distinta. Enquanto a fibra constituída

ais uma vez, os dados são compatíveis com a realidade clínica. Maria João Saraiva, da Universidade do Porto, em Portugal, havia estudado portadores de amiloidose familiar polineuropática decorrente do acúmulo das proteínas V30M e constatado que as pessoas com sintomas mais avançados da doença apresentavam fibras de tamanho intermediário, e não as mais longas, como seria de esperar. Esses resultados põem por terra uma antiga crença dos especialistas em proteínas. "Sempre se achou que todo tipo de fibra amilóide era igual e se comportava da mesma maneira", comenta a bióloga da UFRJ. «Mostramos que não é assim." Mas qual seria o comportamento de uma fibra amilóide formada por outra proteína que não a transtirretina? Debora testou em seguida as fibras amilóides constituídas por uma outra proteína, a alfa-sinucleína, ligada ao desenvolvimento do mal de Parkinson - doença em que o indivíduo perde progressivamente o controle sobre os movimentos e apresenta tremores e paralisia. Ainda de função desconhecida, a forma normal da alfa-sinucleína parece com um barbante esticado. Em algumas famílias, um defeito genético leva à fabricação de formas mutantes da alfa-sinucleína, que passa a se acumular no interior das células nervosas (neurônios) de uma região do cérebro responsável pelo controle dos movimentos, matando-as. Outra surpresa: todas as fibras formadas pela alfa-sinucleína desmontavam-se em suas unidades básicas, que são tóxicas para os neurônios. Mas as formas mutantes se desfaziam de duas a três vezes mais rápido que a fibra formada pela proteína selvagem. Conhecer a diferença de comportamento entre as fibras é importante para traçar as estratégias mais adequadas para tratar cada uma das doenças. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 43


• CIÊNCIA

GENÔMICA

Farta colheita Saem os dados finais do genoma da cana, que impulsionou projetos, empresas e carreiras científicas CARLOS

FIORAVANTI

e virasse um filme nas mãos de um cineasta de talento, a história do genoma da cana-de-açúcar daria algo como Nós que nos Amávamos Tanto, um clássico do diretor italiano Ettore Scola sobre um grupo de amigos que viveram com intensidade uma época de suas vidas e voltam a se encontrar, tempos depois, após terem tomado seus próprios caminhos. Os 240 pesquisadores que participaram desse trabalho pioneiro, iniciado há quatro anos, ainda não se reuniram num jantar regado, claro, a vinho, mas teriam para comemorar a publicação, este mês, de um artigo na revista científica Genome Research com uma descrição minuciosa da constituição genética da cana-de-açúcar, a planta cultivada há mais tempo em larga escala no Brasil. Consta que as primeiras mudas dessa planta chegaram em 1532 com o colonizador português Martim Afonso de Souza. Está lá, na Genome Research: o genoma da cana-de-açúcar é constituído por 33.620 possíveis genes, dos quais cerca de 2 mil parecem estar associados à produção de açúcar. A habitual frieza da linguagem científica, evidentemente, deixa de lado a matéria-prima do suposto filme - a angústia e as alegrias que sustentam essa contabilidade científica. Mas só Felipe Rodrigues da Silva, biólogo, e Guilherme Pimentel Telles, formado em Computação, sabem realmente como foi torturante chegar a esses números finais, que, de certo modo, põem fim a uma aventura iniciada em abril de 1999, quando Paulo Arruda, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), aceitou a tarefa de coordenar o tra-

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balho de 22 grupos de pesquisa que se prontificaram a identificar os genes de uma das plantas que sustentam a agricultura paulista. Dois anos atrás, para determinar inicialmente o número de genes, informação básica sobre qualquer genoma, Silva, então um doutorando com 29 anos, e Telles, com 27, tiveram de resolver o que ainda não havia sido solucionado em nenhum outro laboratório do mundo: descobrir como eliminar as repetições e aproveitar do melhor modo possível as informações contidas em cerca de 300 mil fragmentos de genes, chamados de ESTs, ou Etiquetas de Seqüências Expressas. O Genoma Cana foi um dos primeiros projetos de planta no mundo a adotar essa técnica de identificação de genes. Até acertarem o passo, trabalharam pelo menos 12 horas por dia, durante quatro meses, com programas segundo os quais a cana teria ora 9 mil genes, ora mais de 100 mil, ora um valor intermediário qualquer, que variava de acordo com critérios diferentes sobre o que é um gene. Num dos momentos mais emocionantes, descobriram que estavam sendo jogados fora trechos de genes que poderiam ser aproveitados. Quatro anos depois, notam-se três ganhos mais abrangentes do Genoma Cana, projeto viabilizado com um financiamento da ordem de US$ 4 milhões da FAPESP e outros US$ 400 mil da Cooperativa dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Coopersucar). Em primeiro lugar, as informações sobre a planta fertilizaram uma série de pesquisas, algumas com resultados promissores, a exemplo de um antibiótico potencial descoberto recentemente por um


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Telles uniu-se em maio de 2002 a grupo da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Além disso, há 50 João Meidanis, Zanoni Dias e a outros projetos em andamento, conduzidos por bioinformatas - os especialistas em grupos de pesquisa que fazem a chamacomputação que criam ou adestram programas de identificação e análise de da garimpagem de dados ou data migenes - e, juntos, criaram a Scylla, uma ning - a busca de informações sobre o empresa enxuta, com nove funcionámetabolismo da cana, de modo a obter, mais rapidamente, variedades mais rios. Numa demonstração de como é vasto o espaço a ser ocupado pela bioprodutivas e resistentes à seca ou a solos pobres. Pelas técnicas informática no Brasil, a atuais de melhoramento Scylla anunciou no mês genético, uma nova variepassado seu primeiro produto comercial: um prodade consome dez anos Nova geração de trabalho, dos primeiros grama que detecta e anareconhece testes à aprovação para lisa pequenas variações de genes e pode ser empreuso no campo. a importância gado para identificar doAinda este mês, os gedo trabalho nes da cana tornam-se enças psiquiátricas. Outro participante do Genoma públicos ao serem exposem equipe Cana, Eder Antonio Gitos numa base de dados mundial sobre ESTs, tão glioti, é hoje um dos cinco sócios da Cana Vialis, logo saia o artigo na Genome. Com 250 mil fragtodos eles com mais de 30 anos de experiência no melhoramento mentos de genes, a cana será a quinta genético da cana-de-açúcar, agora à planta com mais seqüências descritas, frente de uma equipe 25 pesquisadores após trigo, milho, cevada e soja. Até agoque vão se valer da genômica e da biora, pesquisadores de outros países podiam ter acesso só aos clones - não à tecnologia para desenvolver novas variedades de cana e otimizar as já existentes. sua descrição detalhada -, mantidos no Laboratório de Estocagem e Distribuição Mas nem as pesquisas nem as emde Clones, em Jaboticabal. Ali, oito frepresas seriam possíveis sem o terceiro efeito, ainda mais profundo: a qualifiezers guardam 240 mil clones de genes, resultado dos projetos de seqüenciamencação do corpo científico. O Genoma Cana aproximou pesquisadores que de to já feitos em São Paulo. outro modo dificilmente teriam se conhecido, consolidou lideranças - em Jornada dupla - Como segundo efeito, 2000, por exemplo, Andrew Simpson, o o projeto também chamado de Sucest (sigla de Sugar Cane EST) colocou mais coordenador do Genoma Xylella, do fermento no ambiente que impulsionou qual derivou o Sucest, era provavelos investimentos que resultaram na crimente o cientista mais conhecido no Brasil- e impulsionou a carreira cienação de três empresas, Allelyx, Scylla e tífica dos pesquisadores, como se nota Cana Vialis - todas contam com o apoio financeiro da Votorantim Ventuem especial com os três doutorandos res, fundo de capital de risco do Grupo que trabalharam mais próximos de ArVotorantim, e a experiência acumularuda: Edson Kemper, André Luiz Vettore e Felipe da Silva. da a partir do seqüênciamento do genoma da bactéria Xylella fastidiosa, o primeiro organismo a ser estudado sob PROJETO esse viés no Brasil. O próprio Arruda divide hoje seu tempo entre a UniGenoma Cana camp - onde leciona no Instituto de Biologia e pesquisa no Centro de BioMODALIDADE logia Molecular e Engenharia Genética Projeto de pesquisa no âmbito do Programa Especial Genoma FAPESP (CBMEG), que foi a sede do Genoma Cana - e a Allelyx, hoje com 50 pesquiCOORDENADOR sadores empenhados em deter, por PAULOARRUDA- Unicamp exemplo, a Clorose Variegada dos Citros, ou amarelinho, a doença causada INVESTIMENTO pela Xylella que abate um terço dos laUS$ 4.484.090,61 ranjais paulistas.

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Durante quase todo o projeto, eles cuidavam de tarefas estratégicas como o controle das finanças do projeto, coletavam no campo amostras dos tecidos da cana (da raiz à flor, colhidas tanto no interior de São Paulo quanto nas plantações de Alagoas), faziam os elones de trechos do genoma, cuidavam da distribuição de material de pesquisa aos 22 laboratórios do projeto e interpretavam nos computadores os resultados que voltavam. Em quatro anos, gerenciaram 9.375 placas com 900 mil clones, que formavam as chamadas bibliotecas do cDNA, sigla do ácido desoxirribonucléico complementar ao DNA original da planta. alvez os três não tenham gostado do trabalho excessivo, dos finais de semana no laboratório e das broncas das namoradas por mais uma vez adiarem a ida ao cinema por terem de trabalhar até mais tarde. Mas, um a um, os quase-filhos de Arruda - no sentido puramente científico, bem entendido - deixaram o CBMEG, tomaram rumos próprios e hoje estão bem posicionados em instituições de pesquisas ou em empresas. E, melhor: aplicando o que aprenderam. "O Genoma Cana foi um exemplo concreto de que o trabalho em equipe funciona, dá resultados e anima a todos para fazer mais e mais", diz Kemper, engenheiro agrônomo reconhecido pela dedicação quase sem limites. Se, por exemplo, os dados dos laboratórios de seqüenciamento da cana chegavam num final da tarde, quando os técnicos de apoio já tinham ido embora, ele não via por que esperar até o dia seguinte e, sem hesitar, fazia ele próprio o trabalho, avançando pela noite até que a tarefa terminasse. Primeiro a partir, em agosto de 2000, Kemper trabalha hoje na sede da Monsanto, em Saint Louis, cidade dos Estados Unidos encravada entre os rios Mississipi e Missouri. Aos 34 anos, o exaluno de doutorado de Paulo Arruda gerencia o Laboratório de Pureza Genética, que nos momentos de trabalho mais intenso abriga até 35 pesquisadores e técnicos, atentos para que o milho e a soja transgênicos cumpram os requisitos de qualidade definidos pelo governo norte-americano e pela própria empresa. A planta mais parecida com uma cana que ele vê por lá é o sor-

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go, uma gramínea miúda, de não mais que um metro de altura, usada como alimento para gado. "Vivemos juntos uma época de efervescência, não havia vaidade nem obstáculos, e conversávamos de igual para igual com os pesquisadores mais experientes", recorda Vettore, o segundo a deixar o CBMEG. Exímio planejador dos gastos e da rotina de trabalho, Vettore trocou Campinas pela capital paulista em julho de 2001. Hoje como coordenador do laboratório de genética do câncer do Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer, procura identificar marcadores moleculares para tumores. Três meses depois, quando as conclusões do trabalho com a cana já estavam avançadas, foi a vez de Silva dizer adeus a Paulo Arruda e a Adilson Leite, seu ex-orientador e um dos coordenadores do CBMEG, que morreu de câncer de pulmão em fevereiro de 2003. Silva passou oito meses em uma unidade da Embrapa do Rio e desde julho do ano passado trabalha em outra unidade, o Centro Nacional de Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen), em Brasília, onde trabalha no geno ma do café e da banana, em programas de computador um pouco mais cordiais que os que teve de enfrentar anos atrás. "O respeito com que os outros pesquisadores me tratam hoje não tem preço", comenta Silva, que ao terminar o doutorado havia participado de 11 artigos científicos. O equilíbrio de forças, a seu ver, foi essencial para o grupo sobreviver na mesma sala em que trabalhavam juntos e superar as diferenças de estilo de trabalho - ele, por exemplo, é dispersivo e barulhento (tem uma banda de rock desde os 12 anos), enquanto Vettore conquistou a fama de ser ultra-organizado e metódico. A própria história da cana emergia à medida que se acumulavam as descobertas sobre seu genoma, anunciadas em 2001 numa edição especial da Genetics Molecular Biology e sintetizadas no artigo da Genome Research, assinado por 57 brasileiros. Os pesquisadores concluíram que a cana conserva pelo

menos 70% de similaridade com outro grupo de plantas, as dicotiledôneas, como o feijão e a soja (a cana é uma monocotiledônea) - entre 50 e 70 milhões de anos, antes de se separarem, havia uma espécie única, com características dos dois grupos. A comparação entre genomas revela ainda que 71% dos genes da cana encontram-se também na Arabidopsis thaliana, uma planta - modelo usada em genética que não chega a 10 centímetros de altura, e 80% dos genes da cana apresentam um correspondente em arroz.

Essas informações são importantes por sinalizarem como tornar a cana mais produtiva ou mais resistente à seca. Na prática, significa, por exemplo, intensificar a atuação ao menos de parte dos 2.000 genes ligados à produção de açúcar do híbrido de cana hoje cultivada no Brasil, resultado de cruzamentos realizados ao longo de cinco séculos entre as espécies Saccharum spontaneum, mais efetiva na produção de açúcar, e a S. officinarum, mais resistente a doenças. Os pesquisadores sabem há tempos que estão lidando com uma planta complexa, cujas células carregam até 12 cópias de cada gene. Se por um lado essas peculiaridades dificultam o trabalho, por outro tornam as conquistas mais gratificantes. "O trabalho com o genoma da cana facilitou o desenvolvimento de ferramentas mais simples de comparação de genomas, que permitem a qualquer biólogo tirar conclusões muito boas para qualquer organismo vivo", comenta Carlos Menck, geneticista do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP). Menck, Michel Vincentz, do CBMEG, e um grupo de 10 pesquisadores do Sucest, estão finalizando um artigo em que compararam genes da cana e de Arabidopsis e apresentam alguns que ainda não haviam sido identificados. Esse trabalho pôs os cientistas em outro patamar. Por essa razão, o filme com os percursos dos cientistas que revelaram a essência da cana não poderia deixar de reconstruir a cena em que João Meidanis entrou no CBMEG em 1995 na ânsia de conseguir uma seqüência genética pequena. Bastariam três mil pares de bases. Com eles, pretendia desenvolver os programas que seriam essenciais, alguns anos depois, no estudo da Xylella, da cana e de outros organismos já seqüenciados. A desejada matéria-prima, que naqueles tempos demorava seis meses até ser entregue, hoje sairia em dois minutos, enquanto se toma um café ou, melhor ainda, um caldo de cana gelado. • PESQUISA FAPESP 91 ' SETEMBRO DE 2003 ' 47


• CIÊNCIA rescem pelos barrancos figueiras colossais, cujos ramos curvam-se para o rio, e que projetam raizes multiformes que mergulham nas águas. (...) Concorrem também outras espécies vegetais, das quais destacam-se, pela sua profusão, ingazeiros capados, cujas flores brancas, de estames múltiplos, semelhantes à penugem, atraem miríades de insetos, que voltejam em torno dos seus vastos nectários; imbaúbas de tronco alvacento e esgalhamento escasso; genipapeiros de folhas lustrosas efrutos aromáticos, e que forneciam tinta negra para a tatuagem dos índios." MAMEDE

DA ROCHA

AMBIENTE

A floresta

renasce Vegetação natural paulista recupera 3,8% do espaço perdido nas últimas décadas e Mata Atlântica volta a crescer; embora o Cerrado esteja quase acabando

RICARDO CARLOS

ZORZETTO FIORAVANTI

E MARCELO

FERRONI

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Em 1905, o médico e naturalista Mamede da Rocha descrevia dessa forma poética que aparece na epígrafe a vegetação próxima ao rio Tietê nos arredores de Araçatuba, no oeste paulista. Quase cem anos depois, desapareceram os ingazeiros, os jenipapeiros e as árvores de madeira de lei - aroeiras, cabreúvas e jequitibás - vistos durante as expedições da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo. As árvores começaram a cair com a chegada da agricultura e das ferrovias, construídas para facilitar o comércio e a expansão do café no final do século 19. E continuaram a desabar à medida que as cidades se formavam - desde os tempos de Mamede da Rocha, a população do Estado aumentou quase 17 vezes, de 2,2 milhões de habitantes para os atuais 37 milhões, enquanto a economia paulista conquistou uma posição respeitável, equivalente a 35% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Hoje são claras as conseqüências desse avanço que não se importou em pôr abaixo a mata natural, que já ocupou 82% do território paulista. De acordo com um levantamento recém-concluído do Instituto Florestal de São Paulo, restam apenas 13,9% da cobertura vegetal natural paulista, o equivalente a 3,46 milhões de hectares, ou 34,6 mil quilômetros quadrados (100 hectares equivalem a um quilômetro quadrado). Curiosamente, esses 13,9% correspondem à área de vegetação natural derrubada durante um dos mais intensos períodos de devastação, a década de 60, quando ainda não havia preocupação com os danos ambientais. É também quase o mesmo espaço hoje ocupado pelas plantações de cana-de-açúcar, de longe a cultura agrícola que ocupa maior extensão das terras paulistas. Esse novo estudo, o Inventário Florestal de São Paulo, traz também uma boa notícia: no Estado de São Paulo, após quatro décadas de levantamentos periódicos, houve uma inversão da tendência de desmatamento, que pode ser visualizada no pôster que acompanha esta edição. Desde que os portugueses chegaram para começar a colonização, é provavelmente a primeira vez que a vegetação natural aumenta em vez de diminuir. A área preservada hoje é 3,8% maior do que dez anos atrás, data do levantamento anterior realizado pelo Instituto Florestal, que acompanha a evolução dos ecossistemas paulistas desde 1962. Ainda que modesto, o crescimento observado entre os dois inventários mais recentes indica algum progresso: são 126,6 mil hectares a mais, o mesmo que 1.266 parques do Ibirapuera, o mais conhecido da capital paulista, que num domingo ensolarado recebe cerca de 30 mil paulistanos.



servação à Mata Atlântica (PPMA), Mesmo assim, ainda é cedo para coparceria entre a Secretaria de Estado do memorar. Pode de fato haver uma regeMeio Ambiente e o banco alemão KfW neração consistente da vegetação natu(Kreditanstalt für Wiederaufbau). O ral em dez anos, segundo o agrônomo PPMA, no qual já se investiram US$ 30 Francisco Kronka, do Instituto Florestal, milhões, sobretudo em fiscalização e na um dos coordenadores do inventário. consolidação de unidades de conserMas o aumento da cobertura vegetal do vação, cobre uma área de 22 mil quilôEstado não se deve só à ampliação das áreas de mata original. O uso de imagens metros quadrados de vegetação natural em 72 municípios no litoral e nos vales dos satélites Landsat 5 e 7 e de fotos feitas a partir de aviões que voam próxido Paraíba e do Ribeira, justamente mo ao solo permitiu onde a recuperação da um nível de detalhe vegetação natural foi pelo menos três vezes mais expressiva. inventário maior que o do invenMas a norte e a noauxilia as tário anterior, realizaroeste do Estado, as do no início dos anos mesmas terras percorprefeituras a 90. Desse modo, foi ridas por Mamede da recuperar Rocha no início do sépossível identificar treculo passado, a situação chos de vegetação antes e preservar é desoladora - e agraimperceptíveis, de até as matas 4 hectares, em especial va um quadro que já não era nada bom. "As os que estão em processo de regeneração. Ouregiões que têm metro ponto importante: o aumento é uma nos vegetação natural são as que mais perdem", diz Kronka, que divide a aumédia e representa o que aconteceu com o conjunto da cobertura vegetal paulistoria do inventário com João Batista Baitello e Marco Nalon, do Instituto ta - um mosaico formado por florestas Florestal, Hilton Thadeu Zaratte do densas entremeadas por mangues à Couto, da Escola Superior de Agriculbeira-mar, enquanto no vasto planalto que se estende pelo interior resistem tãotura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (USP), e Carlos Alfredo somente fragmentos de uma vegetação com algumas árvores tortuosas e raros Ioly, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). blocos compactos de florestas. O cenáÀ frente da devastação aparecem os rio é outro quando se avalia cada tipo de municípios de Araçatuba e São José do vegetação separadamente: alguns encoRio Preto, que em dez anos perderam, lheram, até mesmo drasticamente, e respectivamente, 16,2% e 12,6% de suas outros conseguiram recuperar parte do matas. Por ali, o Cerrado, agora chaespaço perdido nas últimas décadas. mado de Savana, de acordo com a terGanhos e perdas - Primeiro, as boas minologia adotada pelos pesquisadonotícias. O ecossistema mais extenso em res, foi substituído progressivamente São Paulo, a Mata Atlântica, uma vegepor pastagens e plantações de cana-detação fechada e sempre verde, aumenaçúcar - eis os mares de canaviais, como tou 2,86%, o correspondente a 808 quium dia as definiu o poeta pernambulômetros quadrados. A Mata Atlântica cano João Cabral de Melo Neto. Hoje voltou a crescer principalmente no Vale resta menos de 1% (211 mil hectares) do Paraíba, a leste, com um ganho de desse tipo de vegetação, que um século 27% sobre a década anterior, e por quaatrás ocupava um quinto do território se todo o litoral, com 12,3% a mais. É paulista. Os trechos restantes aparecem difícil determinar com exatidão as cauno mapa como pontos dispersos pelas sas desse crescimento. A equipe do Floregiões mais baixas e levemente ondularestal o atribui, em primeiro lugar, à todas do Estado. mada de consciência pela população da necessidade de preservar o ambiente, Planejamento - A partir de imagens de que se soma a outros dois fatores mais satélite de todo o Estado obtidas ao tangíveis: a legislação ambiental mais longo de 2000 e 2001, a equipe do Insrigorosa e a adoção de medidas contra tituto Florestal trabalhou na escala de 1 o desmatamento. Kronka considera efipara 50 mil, na qual cada centímetro do cazes iniciativas como o Projeto de Premapa corresponde a 500 metros no

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solo. Já assim mais minucioso que os mapeamentos similares no Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro, o estudo paulista chegou a um detalhamento ainda maior, de 1 para 10 mil, ao longo do litoral, com o reforço de fotos aéreas digitais. Com essa ampliação, cinco vezes maior que a dos levantamentos anteriores, a equipe de Kronka detectou fragmentos de vegetação nativa de apenas 4 hectares, que antes escapavam ao olhar do satélite. Considerado em junho o melhor trabalho do Prêmio Excelência em Informática Pública em duas modalidades, melhoria de gestão interna e projetos, o mapa do verde em São Paulo, como é chamado esse mapeamento da vegetação, tem sido extremamente útil. Em sua vertente puramente científica, será a base cartográfica sobre a qual se apóiam os 38 projetos de pesquisas do Biota-FAPESP, programa de levantamento da fauna e da flora paulistas. "Esse mapa digital torna mais clara a distribuição de plantas e animais no Estado", explica o botânico Carlos Ioly, coordenador do Biota. estudo do Instituto Florestal tornou-se também um instrumento de planejamento estratégico por indicar os alvos iminentes de ações de proteção ambiental. "O mapeamento é uma ferramenta valiosa para identificar novas regiões que podem se tornar unidades de conservação", atesta o ambientalista Paulo Nogueira-Neto, um dos fundadores do Departamento de Ecologia Geral da USP. Antes mesmo da conclusão do inventário, Nogueira-Neto encontrou 109 manchas de vegetação natural candidatas a se tornarem áreas protegidas. Um delas é a fazenda Barreiro Rico, no município de Anhembi, entre as cidades de Botucatu e Piracicaba. Com 2.300 hectares, a Barreiro Rico abriga trechos de floresta fechada em que os pesquisadores encontraram árvores típicas da Mata Atlântica como ipês, quaresmeiras e cedros de até 30 metros de altura. Ali vivem quatro espécies de macaco ameaçadas de extinção, como o bugio e o muriqui ou monocarvoeiro, e cerca de 350 espécies de pássaros, identificadas com o auxílio de um de seus proprietários, José Carlos Reis de Magalhães, um caçador conver-

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Interior pau lista, entre 1905 e 1910: desmatamento abre espaço para os cafezais

nar o inventário detalhado da cobertura vegetal dos 645 municípios paulistas. "Essa informação ficará à disposição das prefeituras que se interessarem em restaurar áreas devastadas", diz ele. Talvez assim os municípios consigam reverter, ao menos em parte, um longo processo que, se por um lado levou à devastação do verde paulista, por outro transformou São Paulo no Estado mais rico do país. niciada no século 16 com plantações de cana-de-açúcar, a perda da vegetação natural intensificase com o avanço dos cafezais. Entre 1890 e 1927, o número de pés de café plantados no Estado saltou de 220 milhões para 1,3 bilhão, segundo um estudo do agrônomo Mauro Antonio de Moraes Victor. Naquele tempo, solo bom para o café era aquele coberto por mata virgem, com uma espessa camada de nutrientes. Sempre que a produtividade diminuía, os cafezais antigos eram abandonados e se avançava sobre a floresta em busca de terras mais férteis. Com desmatamentos de até 150 mil hectares por ano, a cobertura vegetal nativa do Estado caiu à metade no início do século passado. Nutridos por lucros crescentes, os barões do café apoiaram a construção de ferrovias que uniam o interior ao porto de Santos, além de facilitar a chegada de imigrantes europeus que ajudavam a derrubar mais mata e ampliar as plantações.

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tido em conservacionista, falecido em agosto do ano passado. Por ter sido estruturada uma base digital, com um banco de dados e mapas, o inventário do verde em São Paulo pode ser aplicado tanto para áreas extensas, como todo o Estado, quanto para regiões menores, a exemplo das bacias dos rios paulistas e dos próprios municípios. A base digital permite também a produção de mapas contendo modelos do terreno com detalhes de altitude, inclinação e formas, além dos tipos de solo. Desse modo, o levantamento indica as melhores formas de ocupar o espaço,

trocando o empirismo pelo planejamento embasado em informações apuradas com método científico. É o que foi feito no Parque Estadual de Porto Ferreira, área de 611 hectares a nordeste de São Paulo, ocupada por Mata Atlântica e fragmentos de Savana. A partir das imagens da cobertura vegetal e de informações sobre solo, relevo e fauna locais, os pesquisadores definiram quais áreas devem permanecer intocadas e quais comportam trilhas e visitantes sem danos ao ambiente. Atualmente, a equipe de Kronka trabalha em ritmo acelerado para termi-

Reflorestamento - E agora, o que fazer? Os pesquisadores asseguram: é quase impossível restaurar a situação florestal primitiva do Estado. Mas também é certo que é viável avançar um bocado além dos atuais 13,9%. Segundo Kronka, a adoção de medidas que promovam a regeneração da flora nativa remanescente e o aumento da fiscalização para inibir as queimadas destinadas a limpar o solo permitiriam à vegetação natural chegar aos níveis do início dos anos 60, quando ocupava quase um terço do Estado - algo próximo do mínimo exigido pela legislação ambiental, que determina que as proPESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 51


priedades rurais preservem 20% da cobertura vegetal nativa, além da vegetação à margem dos rios, as chamadas matas ciliares, e dos topos de morros. O papel restaurador não caberia só à natureza. A recuperação das matas e dos campos naturais poderia receber ajuda por meio do reflorestamento. Um estudo do Instituto Florestal que resultou na ampliação da Estação Ecológica de Assis,no oeste paulista, mostrou que o plantio de eucalipto auxiliou o ressurgimento da vegetação nativa. O inventário das espécies usadas na formação artificial de florestas para fornecer madeira às fábricas de papel e de móveis indica que a área de eucalipto se manteve estável (612 mil hectares), enquanto a de Pinus diminuiu quase um quinto e hoje ocupa 158 mil hectares - resultado do interesse comercial por árvores de fibras curtas, como o eucalipto, para fabricar papel. Além disso, como indicou outro estudo do Instituto Florestal,desta vezna região de Santana do Parnaíba, existe muita terra coberta apenas por pastagens mal cuidadas, onde já são visíveis os sinais da erosão. "Uma estratégia inicial poderia ser a recuperação desses pontos de mau uso do solo",sugere Kronka. Mesmo nesse estado crítico, o pouco que resta da vegetação natural ainda surpreende. O biólogo João Batista Baitello, do Instituto Florestal, percorre há três anos a flora do Parque Estadual Iuquery, uma área de quase 2.000 hectares com remanescentes da agora chamada Savana (ex-Cerrado), na região metropolitana de São Paulo, e ainda encontra por lá plantas que se pensava não existirem mais. Das cerca de 250 espécies que ele próprio catalogou, seis eram consideradas presumivelmente extintas e quatro com sério risco de extinção no resto do país. É o caso da Camarea hirsuta, com suas pétalas redondas e amareladas, da Passiflora clathrata, uma planta aparentada do maracujá com flores violeta, escondida entre os arbustos, e de uma espécie com uma flor esbranquiçada, a Alophia sellowiana, cujas pétalas só se abrem à noite. "De outubro a novembro", diz Baitello, "a incrível diversidade de formas, cores e tamanhos de flores faz com que o parque pareça um lindo jardim natural, onde as plantas florescem em seqüência, especialmente após as queimadas:' • 52 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

Savanas e três tipos de floresta Vegetação do Estado de São Paulo agora segue a terminologia nacional

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edida que se apurava o olhar sobre o que resta de verde em São Paulo, as anti~as categorias de veg~t~çao tornaram-se genencas demais para dar conta de nuances cada vez mais claras. As matas dos arredores de Teodoro Sampaio, nas planícies do extremo oeste do Estado, com um período chuvoso e outro seco bem definidos (as árvores perdem as folhas durante a seca), por exemplo, eram classificadas há dez anos como mata o mesmo termo era empregado para designar as florestas de Campos do Iordão, a leste do Estado, com árvores como as araucárias que crescem a 1.500 metros de altitude sob chuva contínua ao longo do ano e jamais perdem as folhas por causa da seca. Para lidar com as diferenças' de comportamento, solo, clima e relevo, os pesquisadores atualizaram as categorias de vegetação do Estado de São Paulo, adotando a terminologia do projeto

A

Radam-Brasil, gigantesco mapeamento do território nacional feito nos anos 70 por meio de aviões, helicópteros e equipes terrestres. A região Sudeste havia ficado de fora do padrão proposto, já que a prioridade era conhecer e mapear o interior da Amazônia (Radam quer dizer Radar da Amazônia) e do Nordeste. Convertida à terminologia do Radam, as matas e as capoeiras - trechos de mata natural em regeneração - desdobraram-se em três tipos de vegetação: Floresta Ombrófila Densa, próxima ao litoral; Floresta Ombrófila Mista, em áreas altas como Campos de Iordão; e Floresta Estacional Sernidecidual, com períodos chuvosos e secos bem definidos, como em Teodoro Sampaio (ombrófila quer dizer "que gosta de chuva", em grego). O termo Cerrado, de uso regional, foi substituído por Savana, adotado internacionalmente para designar a vegetação formada por árvores tortuosas que crescem sobre solos pobres e ácidos.

OS PROJETOS Unidades Fisionômico-Ecológicas Associadas aos Remanescentes da Cobertura Vegetal Natural do Estado de São Paulo MODALIDADE

Projeto

Caracterização e Quantificação da Matéria-Prima Florestal (Pinus e EucaliptoJ no Estado de São Paulo MODALIDADE

do Biota-FAPESP

COORDENADOR

JOÃO BATISTA BAITELLO Instituto Florestal INVESTIMENTO

R$ 127.875,00

Políticas

Públicas

COORDENADOR

FRANCISCOJOSÉ DO NASCIMENTO I<RONKA- Instituto Florestal INVESTIMENTO

R$ 218.476,00


Área de contato na fazenda Barreira Rico: cerrado cercado pela mata estacional semidecidual

densa que a savana típica; savana arborizada (campo cerrado), com predomínio de vegetação herbácea, principalmente gramíneas, e pequenas árvores e arbustos bastante espaçados entre si; e savana gramíneo-lenhosa (campo), constituída por uma vegetação herbácea, sem árvores. Mangue - Vegetação encontrada em áreas em que as águas do mar e de rios se misturam, adaptada à salinidade elevada e ao solo lodoso. "Cerrado, em inglês, corresponderia a uma vegetação mais fechada, como o cerradão", observa Baitello. "Temos agora um padrão mais universal, quase o nome científico de cada tipo de vegetação:' Agora são cinco as categorias básicas da vegetação paulista: Floresta Ombrófila Densa - São os trechos de Mata Atlântica encontrados ao longo do litoral, em regiões de temperatura elevada (médias de 25° Celsius) e chuvas intensas e bem distribuídas ao longo do ano, praticamente sem estação seca. Inclui, como ecossistema associado, a restinga, que ocorre ao longo de praias e planícies costeiras. Floresta Ombrófila Mista - Situada em regiões com altitudes de 1.200 a 1.800 metros, chuvas bem distribuídas ao longo do ano e período seco curto (in-

ferior a 60 dias). Também chamada de mata de araucária ou pinheiral. • Floresta Estacional Semidecidual Caracteriza-se por duas estações cli. máticas, uma chuvosa e outra seca, que condicionam o comportamento das plantas: entre as árvores, de 20 a 50% perdem as folhas durante o período seco (dois a três meses). Abrange os trechos de Mata Atlântica encontrados no interior do Estado de São Paulo. Savana (Cerrado) - Vegetação adaptada a regiões normalmente planas, com climas secos (um a quatro meses sem chuva) e solos pobres e ácidos. Apresenta-se sob quatro formas distintas: savana típica (cerrado stricto sensu), com arbustos e árvores de até 7 metros de altura, caules e galhos tortuosos recobertos por casca espessa; savana florestada (cerradão), com árvores de até 12 metros de altura, mais fechada e

Os trechos em que esses tipos básicos de vegetação se misturam aparecem no mapa como contatos, também chamados de áreas de tensão ecológica. Há nove contatos - entre Savana e Floresta Ombrófila Mista ou entre Savana e Floresta Estacional Semidecidual, por exemplo -, por sua vez divididos em dois grupos. Quando as espécies realmente se entrelaçam, formam-se os chamados ecótonos, nos quais as características originais de cada tipo de vegetação se perdem. Há também os chamados encraves, nos quais um tipo de vegetação - a Savana, digamos - forma ilhas cercadas por outro tipo - uma Floresta Estacional Semidecidual, por exemplo. O que fazer com os nomes antigos como Mata Atlântica ou Cerrado? Ainda podem ser usados, claro, embora agora tenham se tornado claramente genéricos. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 53








Biblioteca de Revistas Científicas disponível na Internet www.scielo.org

Notícias • Polímeros

Carros de plástico As peças plásticas têm sua importância reconhecida como parte integrante dos automóveis por trazerem economia, segurança e flexibilidade para o produto final. Considerando o volume do material, atualmente é utilizado mais plástico do que aço na construção de um automóvel, em razão do grande número de aplicações que os polírneros encontraram nesse produto. A média de 30 quilos de polímeros empregada por veículo, na década de 70, passou a representar cerca de 180 quilos no final da década de 90 e estima-se que nos próximos cinco anos esse valor ultrapasse os 200 quilos. Por conta disso, o artigo Polímeros e a Indústria Automobilística propõe uma discussão sobre a disponibilidade de fornecimento de matérias-primas por parte da indústria de polímeros no Brasil, com o objetivo de identificar a intensidade do uso do material pela indústria automobilística brasileira. O artigo apresenta inicialmente uma classificação dos polímeros, de acordo com suas características técnicas e econômicas e, em seguida, faz uma explanação sobre os principais tipos desse material com aplicação em automóveis. O trabalho traz também um panorama do relacionamento existente entre a indústria automobilística e a indústria de polímeros, em nível internacional, e como essa interação ocorre no Brasil.

prevenção justificou-se pelo aumento dos índices de gravidez não planejada entre meninas, pelos altos índices de infecção de doenças sexualmente transmissíveis (DST), Aids entre elas, e pelo uso de drogas. As oficinas representaram um espaço de reflexão sobre assuntos relacionados à sexualidade, temas dificilmente discutidos com a família ou na escola. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 50% das novas infecções por HIV no mundo ocorrem na adolescência. Segundo a última pesquisa feita sobre o assunto pelo Ministério da Saúde, em 1999, do total de indivíduos sexualmente ativos pesquisados, 76% não usam preservativo. Porém a avaliação dos trabalhos de prevenção de gravidez e DST voltados para adolescentes tende a ser negativa se o esperado for a mudança de comportamento, sobretudo no uso do preservativo. Nesse caso, os autores propõem algumas alternativas para minorar o problema, como a diminuição de metáforas negativas relacionadas à Aids, aumento dos espaços de discussão para que os jovens possam refletir sobre os riscos vividos por eles partindo de suas próprias experiências e das dificuldades de optarem por práticas de proteção, além da eliminação gradativa de medos e tabus. Segundo os autores do estudo, o ideal seria promover um processo de educação sexual exercido não como uma espécie de domesticação dos indivíduos, mas como uma oportunidade de auto-reflexão. CrENCIA &.SAODE

COLETfVA -

VOL.8 - N° 2 - SÃoPAUW2003

www.sciélo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141381232003000200021&Ing=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Agricultura POLIMEROS -

VOL.13- N° 2 - SÃo CARWS- ABR./JUN.2003

www.scielo.br/scie 10. php?scri pt=sci_arttext&pid=SO 10414282003000200008&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Saúde

Consciência coletiva O artigo Oficinas de Prevenção em um Serviço de Saúde para Adolescentes: Espaço de Reflexão e de Conhecimento Compartilhado analisa os resultados de um projeto de extensão universitária realizado em um serviço público de saúde da cidade de Londrina, no Paraná. O programa ofereceu atendimento integral a cerca de 850 adolescentes por mês, entre 1999 e 2001, com o objetivo de diminuir a vulnerabilidade sociocultural dos jovens. O trabalho de

60 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

Colheita com precisão Fornecer a fazendeiros meios precisos e de baixo custo para prever variações na produção de cacau, de modo a auxiliá-Ios na tomada de decisões de caráter estratégico, foi o objetivo principal do trabalho Previsão de Produção Agrícola Baseada em Regras Linguísticas e Lógica Fuzzy, de três pesquisadores do Departamento de Engenharia Elétrica da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). O artigo propõe um método que complementa a previsão por amostragem, permitindo que o fazendeiro avalie o impacto das suas decisões de tal forma que ele consiga melhorar sua margem de lucro. O sistema fuzzy, que não exige do produtor conhecimento técnico específico, ajusta a estimativa amostral de previsão à medida que ocorram fatos que afetem a produção. Assim, o produtor pode reavaliar a previsão de sua colheita


a qualquer instante. O programa desenvolvido pode ser utilizado para simulações de casos, proporcionando uma avaliação do impacto de uso dos recursos financeiros do produtor. Depois de o sistema ser avaliado por especialistas, o próximo passo será testá-Io em condições reais. & AUTOMAÇÃO 2003

SBA CONTROLE - ABRILI/UN.

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v.14 - N° 2 - CAMPINAS

www.seielo.brlseielo .php?seri pt=sei_arttext&pid=S01 0317592003000200003&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Química

Reciclar é preciso O artigo Processamento da Pasta Eletrolítica de Pilhas Usadas propõe uma discussão sobre os possíveis meios seguros de aproveitamento de pilhas e baterias usadas, visto que o descarte em aterros nada mais é do que adiar um grave problema ambiental para o futuro. "A pilha é um típico exemplo de produto tecnológico desenvolvido para proporcionar conforto e bem-estar à nossa civilização, mas que não levou em conta o período após seu consumo", afirmam os autores. Segundo o estudo, o processamento de baterias usadas com objetivo de reciclar componentes é uma tarefa muito complexa do ponto de vista experimental. Para reciclar a pasta eletrolítica, o problema que se coloca é o desmonte mecânico das pilhas, um dispositivo eletroquímico que tem a capacidade de converter energia química em elétrica, e a possível separação dos materiais que a compõem. Outra questão que dificulta a reciclagem das pilhas e baterias como um processo economicamente viável seria a implementação de uma coleta seletiva eficaz. Sendo assim, por falta de uma conscientização coletiva ambiental em todo o mundo, os autores propõem que não somente se tenha uma coleta seletiva e um destino final seguro, mas que se desenvolvam novas tecnologias de pilhas que sejam compatíveis com um ambiente mais saudável para a humanidade. Estima-se que, levando em conta toda a população mundial, haja um consumo da ordem de 10 bilhões de pilhas por ano. QUIMICA

NOVA -

v.26 - N° 4 - SÃo PAULO- /uU AGO.2003

www.seielo.br/seielo. php?seri pt=sei_arttext&pid=SO 10040422003000400022&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Psiquiatria

Desempenho infantil

de autocuidado, mobilidade e função social. Foram realizados testes para comparar os grupos e avaliar fatores de interação entre idade versus patologia. O estudo concluiu que o desempenho funcional de crianças com SD é inferior ao de crianças normais. Entretanto, as interações entre patologia e faixa etária revelaram que esse desempenho não se mantém constante ao longo do desenvolvimento. O estudo mostra que a diferença entre os grupos apresenta-se mais evidente aos dois anos, e, em algumas áreas, essa diferença é menos evidente aos cinco anos de idade. Tal fato apresenta-se como uma maneira de se caracterizar o atraso apresentado por criança com SD, indicando que ele sofre influência direta da idade. Os resultados poderão ser utilizados por profissionais da área de saúde para nortear os processos de avaliação e intervenção, além de ser usados para informar os familiares de crianças portadoras de SD sobre as prováveis conseqüências desta patologia nas idades investigadas. Além disso, o estudo indica as áreas de desempenho e perfis etários onde o atraso apresentado por estas crianças é mais evidente. ARQUIVOS

DE NEURO-PSIQUIATRIA

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VOL.61 - N° 2B - SÃO

PAULO- JUN.2003 www.seielo.br/se ieIo.php?se ript-sct , arttext&p id= SOO04282X2003000300016&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Endemia

Vice-campeão O Brasil só fica atrás da índia em número de casos de hanseníase no mundo, doença infecciosa crônica causada pelo Mycobacterium leprae. "Aproximadamente 94% dos casos conhecidos nas Américas e 94% dos novos diagnosticados são notificados pelo Brasil': diz Marcelo Grossi Araújo, do Serviço de Dermatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, em seu artigo Hunseniase no Brasil. Segundo o estudo, a moléstia possui características peculiares que tornam seu diagnóstico simples na maioria dos casos. O tratamento da hanseníase compreende quimioterapia específica, eliminação dos surtos reacionais, prevenção de incapacidades físicas e reabilitação física e psicossocial. Pesquisas envolvendo esses tratamentos mostraram que a perspectiva de controle da doença no Brasil é real a curto prazo. Por conta disso, ao longo das últimas décadas as taxas de prevalência da doença no país têm declinado ano a ano, resultado da consolidação do tratamento poliquimioterápico. Entretanto, as taxas de detecção de novos casos ainda são elevadas. No final de 2000, havia 4,6 casos para cada grupo de 10.000 brasileiros. ''A expectativa é de que se alcance a meta de eliminação da doença em 2005, quando a prevalência deverá ser inferior a um caso a cada 10.000 habitantes': escreveram os autores do artigo.

O estudo Comparação do Desempenho Funcional de Crianças Portadoras de Síndrome de Down (SD) e Crianças com Desenvolvimento Normal aos 2 e 5 Anos de Idade reu-

- VOL.36 - N° 3 - UBERABA MAIOI/UN.2003

niu 40 crianças para serem avaliadas pelo teste funcional PEDI. O teste quantifica o desempenho infantil nas áreas

www.seielo.br/seielo .php?seri pt=sei_arttext&pid=S003786822003000300010&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

REVISTA

DA SOCIEDADE

BRASILEIRA

DE MEDICINA

TROPICAL

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRODE2003 • 61

I1

I


ITECNOLOGIA

LINHA

DE

PRODUÇÃO

MUNDO

Transformações na emissão de luz Uma nova maneira de gerar luz fosforescente promete revolucionar os meios de iluminação artificial conhecidos. Pesquisadores dos laboratórios da Sandia - corporação do grupo Lockhead Martin -, nos Estados Unidos, usaram pontos quânticos - nanopartículas semicondutoras que medem cerca de um bilionésimo de metro - para criar o primeiro dispositivo emissor de luz branca em estado sólido. "O intuito de nosso trabalho': diz a coordenadora do projeto, Lauren Rohwer, em comunicado da assessoria de imprensa da Sandia, "é conhecer a física da luminescência em escala nanométrica e estender esse conhecimento ao desenvolvimento

• Ovelhas e gansos entre as vinhas A procura por produtos alimentícios orgânicos que não recebem pesticidas e herbicidas e privilegiam os adubos naturais chegou até os vinhos. A tendência, que já corresponde a 3% da produção mundial com mais de duas mil marcas, está aumentando na América Latina. Depois das Vinícolas

Pontos de luz: nanopartículas semicondutoras de fontes de luz mais econômicas e eficientes." De fato, até o momento, o que impede a produção em escala de sistemas de iluminação à base de materiais semicondutores são os altos custos. Os chamados LEDs

Santa Iulia, na Argentina, com o vinho Vida Orgânica, Velho Museu, no Brasil, com o Cabernet Sauvignon Iuan Carrau e Vifia Carmem, no Chile, com o Nativa, chegou a vez da também chilena Viria Cano Sur. Até o final do ano, a empresa colocará à venda o primeiro lote desse tipo de vinho, que será uma mistura de uvas Cabernet Sauvignon e Merlot. Para a empresa, o ma-

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(diodos emissores de luz), por exemplo, conseguem emitir luz azul, verde e vermelha, mas necessitam de chips muito caros para combinar as cores e obter luz branca. O novo dispositivo funciona de maneira dife-

~ rente. Os pontos quânticos ;;l conseguem absorver eficientemente a luz na faixa de comprimento de onda próxima do ultravioleta. Encapsulados em silício ou epóxi, são estimulados por LEDs emissores de radiação ultravioleta a irradiar luz visível. Como a cor emitida depende do tamanho da superfície que cada emissor possui, basta alterar esse tamanho para obter a cor desejada. Além disso, como os pontos quânticos são tão minúsculos que 70% de seus átomos se concentram na superfície, fica fácil sintonizar suas propriedades de emissão de luz, de modo que cores diferentes possam ser emitidas por um único ponto de qualquer tamanho. •

nejo integrado @ uma opção permanente para garantir as soluções naturais e o uso mínimo ou nulo de produtos sintéticos. Por isso, tudo é reaproveitado, desde a água até outros rejeitas como os restos da vinificação (cascas principalmente) que são usados como adubo. Fungos inertes às videiras são usados para matar fungos e insetos inimigos. A maior novidade no vinhe-

do da Cano Sur são os habitantes que passeiam por entre as fileiras de parras: ovelhas, gansos, patos e perus. Além de dissiparem seus rejeitas que funcionam como fertilizantes naturais para a plantação, eles também se alimentam dos insetos. O vinho orgânico vai seguir os preços baixos dessa bebida no Chile. Cada garrafa vai custar algo em torno de R$ 17,00. •


• o menor motor elétrico do mundo Quinze anos depois da construção do primeiro motor em escala micrométrica por uma equipe da Universidade da Califórnia, em Berkeley, Alex Zettl, outro físico da casa, anunciou, em julho, a criação do primeiro nanomotor - basicamente, um rotor de ouro compacto o suficiente para girar na haste de um nanotubo e viajar nas costas de um vírus. "É o menor motor já sintetizado pelo homem", diz Zettl. ''A natureza consegue fazer alguns ligeiramente menores, mas estam os chegando lá", disse em comunicado da universidade. Já era possível equipar nanotubos com transistores, mas esse novo sistema é diferente e pode ser controlado, pois ele gira e permite a ligação a fios elétricos externos. A peça inteira não tem mais de 500 nanômetros, ou 300 vezes menos que o diâmetro de um fio de cabelo humano. A parte que gira mede 300 nanômetros de comprimento e pode ser encaixada em um nanotubo de aproximadamente 5 a 10 nanômetros de espessura. Não faltam pretendentes para as aplicações. Como pode ser posicionado em qualquer ângulo, seria muito útil, por exemplo, para redirecionar a luz nos circuitos ópticos ou misturar líquidos em escala micrométrica. Desbanca da condição de menor motor elétrico do mundo o chamado sistema microeletromecâ-

nico (MEMS). Fabricado em silício, em 1988, pela equipe do professor Richard Muller, da mesma universidade, o MEMS, com seus 100 micra de comprimento, apenas empata com o diâmetro de um ,-__Lfio de cabelo humano. •

Rosto é a senha de acesso -L__'~

• Plataforma produz metanol Extrair gás natural do fundo do mar e produzir metanol em uma plataforma flutuante é o objetivo de um megaprojeto que está em execução por um consórcio de duas empresas sul-africanas, o PetroWorld, e mais duas empresas norte-americanas, a Foster Wheeler e a Waller Marine. Será a primeira usina desse tipo em escala comercial. Ela vai extrair gás natural em reservas remotas em alto mar e convertê-lo num montante de 12 a 15 mil toneladas de metanol líquido por dia. O combustível poderá ser transportado em navios-tanques comuns e terá preços baixos. Vai servir principalmente às usinas de produção de energia elétrica norte-americanas. A plataforma vai custar US$ 700 milhões e será instalada inicialmente na costa oeste da África. A intenção do grupo empreendedor é instalar plataformas semelhantes na costa litorânea de países que não têm condições econômicas de construir usinas de extração de gás e de produção de metanol •

300 280

260 240 220 200

o

Sombra projetada por fonte luminosa permite medir volume da face Uma nova forma de reconhecimento do ser humano, pelo rosto, poderá em breve ser usada para liberar o acesso aos cofres de uma agência bancária ou mesmo a locais controlados, como presídios. Batizado de Projeto Sorface, esse sistema, coordenado pelo professor Jorge Muniz Barreto, do Departamento de Informática e de Estatística da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), permite reconhecer a face humana em três dimensões, da mesma maneira como é percebida pelo olho humano, enquanto os outros métodos existentes baseiam-se em imagens bidimensionais. O modelo tridimensional obtido é comparado a outros previamente armazena-

dos no banco de dados do computador. Para captar a imagem, são utilizadas uma câmera digital e uma lâmpada que funciona com uma espécie de rede sobre a fonte luminosa. A sombra da rede projetada sobre a face é deformada conforme o relevo do rosto. A partir das linhas da rede, um programa faz cálculos que fornecem o volume do rosto e o reconhecem numa fração de segundo. •

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 63


Pássaros distantes de curlos-circuitos o joão,.de-barro(Furnarius rufus), um pássaro encol)trado em grande quantidade na cidade paranaense de Coronel Vtv,ida, quase na fronteira com o Es~do de Santa Catarina, havia elegido os postes de. eletricidade para fazer seus ninhos,provocapdo constantes interrupções de energia. Isso ocorria porque. o diligente pássaro escolhia a Cruzeta (locàl onde ficam os isoladores) de sustentação das linhas para construir -sua moradia, feita de barro úmido e . pàlha. Ao se. movimentar, encostava no cabo, provocauda um curto-circuito que, além de ser fatal pa-

• Chip acústico para controlar percevejo Os sons emitidos pelos percevejos-da-soja, uma praga que causa grande devastação agrícola,estão sendo gravados e reproduzidos para serem utilizados no controle desses insetos.Quando estão na fase de acasalamento, os percevejos se comunicam por meio de ondas sonoras produzidas por movimentos no abdome. "Elas lembram o coaxar de sapos, mas são inaudíveis ao ouvido humano", explica o pesquisador Miguel Borges, coordenador da equipe da Embrapa, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília, que há mais de 15 anos estuda a comunicação entre insetos. "Os machos e as fêmeas emitem ruídos diferentes e

joão-de-barro': A peça em fibra de vidro é instalada na cruzeta, impedindo que o pássaro construa sua casa muito perto dos cabos da rede primária de fornecimento. "Indicamos ao pássaro o melhor lugar para ele fazer a construção", diz ..• o. engenheiro Roberto :i Lang, da Porcel. Coloe cado em postes localizados próximos a beiras de ríqs, riachos e lagoas, áreas onde o joão-de-barro encontra a matéria-prima para fazer seu ninho, o afastador tem evitado que acidade fique às. escuras e permitido ao passarinho procriar sem sustos. • .J

João-de-barro faz ninho em postes, __ protegidos com afastador (detalhe) ra ele, ativava a proteção da rede.éíétrica, interrompendo o fornecimento de energia. A solução encontrada

cada espécietem um padrão:' Segundo o pesquisador, são cinco as espécies de percevejos que atacam a soja, sendo três as principais. Os sons capturados são reproduzidos e ampliados de 20 a 30 vezes em laboratório. A idéia de Borgesé colocar essessons em chips, que funcionariam como uma minicaixa acústica para atrair os insetos em armadilhas previamente preparadas. •

64 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

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pela Porcel, empresa responsável pelo fornecimento de energia à cidade, foi construir-um "afastador de-

• Secagem com chaminé solar Pesquisadoresmineiros começaram a testar a chaminé solar, que tradicionalmente funciona como usina de produção de energia elétrica,para secar alimentos como café,tomate, banana, uva, maçã e abacaxi. O protótipo da chaminé, com 12 metros de altura e 25 de diâmetro em sua base, foi construído por Cristiana San-

tiago e André Ferreira,alunos de doutorado em engenharia mecânica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Os principais beneficiados pela novidade serão os pequenos agricultores,que normalmente não usam nenhum tipo de secador e por isso têm grandes perdas de alimentos. Segundo o coordenador do projeto, Márcio Fonte-Boa Cortez, as medidas ainda não são definitivas, uma vez que há carência de dados detalhados de temperatura, umidade e velocidade de secagempara cada tipo de alimento. "Partimos de idéias teóricas, portanto matemáticas, para estabelecer as medidas adequadas", diz FonteBoa Cortez. A construção do protótipo custou R$ 13 mil, financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig). •


• Energia eólica oxigena água Apenas a energia do vento é suficiente para colocar em funcionamento um aparelho que oxigena a água de tanques de criação de peixes e Camarões e pode também ser usado no tratamento biológico de efluentes. O aerador de pás flutuante, acionado por uma turbina eólica de pequeno porte, foi desenvolvido pela empresa

Patentes Inovações financiadas pelo Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec) da FAPESP. Contato: nuplitec@fapesp.br

CompostosBásicos

Inventores: Claudio Airoldi, Isabel Cristina Sales Fontes Jardim e César Ricardo Silva

Titularidade:

FAPESPI

Unicamp

• Elementos ópticos mais eficientes

Resina produzida pelas abelhas tem vários compostos

Turbina eólica movimenta pás do aerador flutuante gaúcha Hyperlogic Automação de Sistemas. De construção simples, com duas peças móveis, o Jangada 2000, como foi batizado o aparelho, é durável e tem baixo custo. E tem grande potencial para substituir os aeradores acionados por motores elétricos. "O maior diferencial desse equipamento é que não gasta energia': diz Sérgio Severo, diretor da Hyperlogic. O dispositivo flutuante simplifica a forma de orientação da turbina eólica contra o vento. O controle da velocidade da turbina é feito por mergulho progressivo das pás e a orientação ocorre via movimentação completa da torre. •

• Identificação da própolis brasileira

• Reagentes químicos para análises

Processo químico e separação dos mais diferentes tipos de substâncias presentes na própolis brasileira utilizando duas técnicas de fracionamento, a de cromatografia líquida de alta eficiência e a de cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas. Essas duas técnicas permitem identificar e quantificar com precisão os diferentes compostos presentes nessa resina. Após a identificação e quantificação de distintos marcadores de própolis, um software desenvolvido para esse fim classifica a própolis analisada de acordo com um conjunto de tipos previamente estabelecidos.

Processo de síntese e caracterização de novos reagentes químicos (silanos contendo grupos do tipo uréia), para posterior utilização na modificação química da sílica cromatográfica. Essas sílicas quimicamente modificadas são utilizadas como fase estacionária em cromatografia líquida de alta eficiên~ia, técnica analítica que pode ser empregada em diferentes ramos da química. Os silanos do tipo uréia são preparados em uma única etapa e envolvem a reação de apenas dois reagentes, enquanto os do grupo carbamato, bastante utilizados para a mesma finalidade, necessitam de várias etapas, o que aumenta os custos.

Título: Processo para Separação e Identificação de Substâncias Químicas em Própolis Brasileiras Inventor: Maria Cristina Marcucci Ribeiro Titularidade: FAPESP/ Uniban

Título: Novas FasesEstacionárias para Cromatografia Líquida, ContendoGruposPolares do Tipo Uréia Inseridos na Cadeia n-alquila, para a Separaçãoe a Purificação de

Os elementos ópticos difrativos (EODs) são dispositivos ópticos "moldadores" de ondas luminosas. Os EODs podem ser obtidos por intermédio de relevos gravados na superfície de um material transparente, reflexivo ou de padrões gravados em filmes fotográficos. Grande parte dos EODs modula a fase da luz incidente e em alguns casos sua amplitude, mas não ambos. Para contornar essa limitação, foi desenvolvido um novo elemento óptico difrativo capaz de realizar a modulação completa de frente de luz. Esse elemento foi fabricado com técnicas precisas, de baixo custo e bem estabelecidas para uso na fabricação de circuitos eletrônicos integrados, obtendo-se 100% de eficiência lumionosa.

Título:

Elemento Óptico com Modulação Complexa Completa de Frentes de Ondade Luz, e seu Processo de Obtenção Inventores: Luiz Gonçalves Neto, Ronaldo Domingues Mansano, Giuseppe Antonio Cirino, Patrícia Soares Pinto Cardona e Patrick Bernard Verdonck Titularidade: FAPESP/USP

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 65

III


TECNOLOGIA ENGENHARIA

DE MATERIAIS

Próteses

demamOna Polímero derivado de óleo vegetal, sintetizado por químico de São Carlos, ganha mercado internacional DINORAH

ERENO

itade Cássia Xavier da Costa, 46 anos, há três evitava sair de casa para ir ao mercado, a reuniões com amigos e até procurar emprego. A reclusão só foi quebrada no final de junho deste ano, depois de ela passar por uma cirurgia de reconstrução da mandíbula que lhe devolveu a antiga forma do rosto. "Sou outra depois da cirurgia. Perdi o medo de encontrar as pessoas, voltei a rir e a mastigar comidas sólidas", conta essa moradora de Petrópolis, na serra fluminense. A matéria-prima utilizada para refazer o maxilar de Rita, corroído por um tumor, é um polímero, material semelhante ao plástico, que tem como base o óleo da mamona, planta arbustiva muito disseminada pelo Brasil. A síntese desse material, que pode ser chamado de biopolímero porque tem alta capacidade de interação com as células do corpo humano. e não provoca casos de rejeição como a platina usada até aqui nos maxilares e em outras partes do corpo, é de autoria do professor Gilberto Orivaldo Chierice, do Instituto de Química de São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP) .. O invento de Chierice recebeu, em junho deste ano, a aprovação da Food and Drug Administration (FDA), a agência do governo norteamericano responsável pela liberação de novos alimentos e medicamentos. Esse certificado abre as portas para o maior mercado do mundo na área de saúde e garante visibilidade científica e comercial em todo o planeta. No Brasil, o Ministério da Saúde já havia aprovado o biomaterial em 1999, oito anos depois de iniciados os trabalhos de Chierice nessa área. Ao longo desse tempo mais de 2 mil pessoas - vítimas de acidentes com armas, carros, motos e de tumores - foram beneficiadas com próteses para substituir ossos nas mandíbulas, no crânio e na face ou, ainda, como suportes na coluna cervical, no lugar dos testículos, no pênis, nos globos oculares e nas gengivas. Para conceder a aprovação, a FDA fez testes químicos e biológicos, como o de citotoxicidade (para avaliar se o produto é tóxico ao organismo), e uma série de outros que já haviam sido realizados no Brasil. A certificação da agência norte-americana não é nada barata. O custo de US$ 400 mil foi bancado pela empresa Doctors Research Groups (DRG), de Plymouth, no Estado de Connecticut, que vai distribuir o produto nos

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Estados Unidos e no Canadá. O interesse deles pelo polímero da mamona surgiu quando médicos brasileiros foram convidados a apresentar nos Estados Unidos cirurgias experimentais com o novo material. Representantes da DRG estiveram em uma dessas apresentações e entraram em contato com Chierice. Em setembro do ano passado, foram a São Carlos pela primeira vez para conhecer o produto e, depois disso, voltaram outras sete vezes ao país, em algumas delas para acompanhar cirurgias de vários grupos médicos. "Fizeram muitas perguntas e quiseram ver tudo, mas valeu a pena porque com o certificado poderemos exportar para outros países':comenta calmamente Chierice, enquanto pica fumo de corda para enrolar um cigarro de palha, ritual que repete várias vezes ao longo do dia. Para comercializar o produto, o professor criou em 1997 a empresa Poliquil, instalada em Araraquara, e depositou a patente do invento no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) em seu nome, no mesmo ano. A empresa é dirigida desde então por três técnicos que trabalhavam com ele. Segundo cálculos de Chierice, as exporta68 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

ções do polímero de mamo na, apenas para os Estados Unidos, devem resultar numa receita de cerca de US$ 500 mil por ano para a Poliquil. polímero registrado no Brasil como composto ósseo de ricinus (COR), em referência ao nome científico da planta (Ricinus communis), recebeu nos Estados Unidos o nome de RG Kryptonite, palavra que lembra o planeta de origem do Super-Homern, famoso personagem das histórias em quadrinhos e de séries da TV e do cinema. O nome, embora não confirmado pela empresa, relaciona o efeito da kriptonita, o metal que tira a força do homem de aço, com o biopolímero que deve ganhar mercado, enfraquecendo as próteses de metal. O material produzido pela Poliquil é

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exportado em forma de kit, com duas ampolas, compostas de poliol e pré-polímero extraídos do óleo de semente de mamona, os produtos desenvolvidos pelos pesquisadores, mais o carbonato de cálcio, misturados apenas no momento em que serão usados. O sucesso do biopolímero é explicado pela compatibilidade que ele tem com o organismo humano. "Na composição química desse material existe uma cadeia de ácidos graxos cuja estrutura molecular está presente nas gorduras existentes no corpo humano. Por isso, as células não 'enxergam' a resina de mamona como um corpo estranho e não a repelem': explica Lizeti Toledo Ramalho, professora da Faculdade de Odontologia de Araraquara da Universidade Estadual Paulista (Unesp). As pesquisas realizadas na USP,na Unesp e na Poliquil proporcionaram sucesso no


exterior mesmo antes da aprovação da FDA."A área em que mais utilizamos esse novo produto foi em cirurgias de coluna, com mais de 500 intervenções, realizadas por seis grupos distintos de cirurgiões", conta Jorge Viscovig, distribuidor do produto no Chile e na Argentina, onde foram feitas cerca de 1.700 cirurgias com o polímero. Em uma dessas intervenções, uma argentina de 60 anos com fraturas na coluna vertebral em decorrência de osteoporase, uma doença que desgasta naturalmente os ossos, livrou-se da dor cerca de 40 minutos depois de receber a resina de mamo na na forma líquida. Injetado dentro dos ossos com uma seringa, por uma técnica conhecida comovertebroplastia, o líquido viscoso de cor amarelo-claro preencheu os espaçoscorroídos pela doença e se solidificou.Dessaforma, ocorreu a fixação das

fraturas e a paciente sentiu alívio imediato da dor. Chierice ressaltaque a vantagem desse material em relação ao cimento acrílico, bastante utilizado nesse tipo de procedimento, é contribuir para a regeneração óssea, e não apenas para imobilizar a fratura.

; mesmo, o osso se regenera. Num processo bioquímico ainda não totalmente explicado,o organismo substitui o polímero por células ósseas. "Ele vai se desmembrando e o osso cresce no lugar", conta Sérgio Augusto Catanzaro Guimarães, professor aposentado da Faculdade de Odontologia de Bauru, da USP,e coordenador de pesquisa da Universidade do Sagrado Coração, da mesma cidade. Ele usou em suas pesquisas a resina para recobrir defeitos ósseos do crânio e da face.

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A capacidade do biopolímero de -regenerar ou não o osso está relacionada com a forma como ele é preparado. Conforme o arranjo molecular das substâncias que formam o material, ele tanto pode ser absorvido ou não pelo organismo. Esse fator é ressaltado por pesquisadores e cirurgiões que trabalham com o polímero de mamona, como o médico Edelto dos Santos Antunes, de Petrópolis. Em agosto, ele reconstruiu parte da mandíbula de um paciente com o polímero em duas texturas diferentes. "A parte externa, mais dura, vai ficar sempre como pró tese. A interna, que fica em contato com o osso e é porosa, vai ser substituída por uma estrutura óssea",relata o especialista em cirurgias maxilo- faciais, que já fez 30 pró teses com o polímero de mamona nos últimos quatro anos, todas feitas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Hospital Santa Teresa, de Petrópolis. A resina de mamona surge também como uma boa promessa na área estética. Uma das linhas de pesquisa mais recentes mostra que o polímero tem grande potencial, em forma de fios muito finos, para amenizar rugas de expressão e combater a flacidez da pele. PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 69


"Esses fios já foram implantados com excelentes resultados em animais de laboratório", diz Lizeti, da Unesp. Para ela, o fio de biopolímero é candidato potencial a substituir o fio feito de polipropileno, um plástico derivado do petróleo, desenvolvido na Rússia em 1999. "O fio russo é muito utilizado por cirurgiões plásticos. Depois de introduzido na face por meio de uma cânula, permanece no tecido conjuntivo da derme por tempo indeterminado", relata. "Mas o fio de resina de mamona tem maior biocompatibilidade e não provoca rejeições ou alergias como o de polipropileno", ressalta a pesquisadora, que em agosto apresentou resultados de suas pesquisas para cirurgiões plásticos em um workshop em Araraquara. ugas e mandíbulas nem passavam pela cabeça de Chierice quando ele iniciou os primeiros estudos que resultaram no eclético polímero. Tudo começou em 1984, quando o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (CPqD), da Telebrás, a então holding estatal das telecomunicações localizada em Campinas, enfrentava problemas com uma resina importada utilizada para proteger da umidade os cabos telefônicos subterrâneos e aéreos. Como estavam se degradando antes do tempo, a empresa procurou o Instituto de Química da USP para que avaliasse o material. "Comecei a analisar a resina e concluí que podia fazer coisa melhor", conta Chierice. Era um trabalho previsto para durar seis meses que foi, depois, estendido para um contrato de três anos com a Telebrás. "Fizemos um polímero novo para eles, derivado da mamona, com resultados fantásticos:' A pesquisa teria provavelmente parado por aí não fosse o interesse que o produto despertou no começo da década de 90 em um médico do Hospital Amaral de Carvalho, de Iaú, no interior de São Paulo, instituição que é referência no tratamento de câncer. "Durante uma visita à USP de São Carlos, o urologista Renato Prado Costa, que na época era diretor clínico do hospital, ficou entusiasmado com a novidade e propôs que fizéssemos algumas pró teses de testículos, para substituir as de silicone, então em uso no hospital': conta Chierice. As próteses foram feitas e enviadas para testes no hospital da Faculdade de

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Dispersão doméstica o

óleo de mamona, também conhecido no Brasil como óleo de rícino, possui uma enorme versatilidade química dentro do ramo industrial. Ele pode ser utilizado na indústria de plásticos, de cosméticos, tintas e vernizes, na siderurgia, além de ser indispensável para impedir o congelamento de combustíveis e lubrificantes de aviões a baixíssimas temperaturas. Extraído das sementes de um arbusto herbáceo da família das euforbiáceas, também conhecido como carrapateira, o óleo de mamona foi largamente utilizado no Brasil como laxante e vermífugo.

Medicina Veterinária de Botucatu, da Unesp. Depois de algum tempo, Prado Costa procurou Chierice para dizer que o material tinha propriedades desconhecidas, que precisavam ser estudadas. Isso porque, segundo o relato do pessoal de Botucatu, o coelho que recebeu o polímero não apresentou nenhuma rejeição. "Até então não se falava em biocompatibilidade do polímero", diz Chierice. Foram feitos experimentos em ratos, porcos e cachorros e os resultados confirmaram a experiência com o coelho. A partir desse momento, os testes em humanos foram iniciados. Prado Costa pediu a Chierice ql.re fizesse várias pró teses de testículos, destinadas a pacientes terminais com câncer de próstata. O urologista conversou com as famílias dos pacientes, que autorizaram o procedimento. Quando os pacientes morreram, as pró teses foram

o PROJETO Caracterizações de Polímeros Poliuretanos Derivados de Óleo de Mamona para ser Utilizado na Área Médica MODALIDADE

Linha regular de auxílio à pesquisa COORDENADOR GILBERTO ORIVALDO CHIERICE - IQSC-

USP INVESTIMENTO

R$ 99.245,00

A existência de um grande número de variedades dessa planta, encontradas tanto no continente africano como no asiático, impossibilita qualquer tentativa de se estabelecer sua origem efetiva. Sementes encontradas em túmulos mostram que a mamona já era utilizada pelos egípcios há pelo menos 4 mil anos. Na antiga Grécia, alguns filósofos mencionaram em seus escritos o emprego do óleo de mamo na no Egito para iluminação e na produção de ungüentos. ''A mamona é sempre encontrada onde existem aglomerados humanos, indicativo de dispersão do-

retiradas e as análises mostraram perfeita compatibilidade com o organismo. Prado Costa decidiu aprofundar as pesquisas. "Coloquei 50 pares de próteses de testículos e 12 penianas, e não foi relatada nenhuma rejeição", conta. Quase dez anos depois, alguns pacientes ainda estão com as próteses. Prado Costa diz que conseguiu seu objetivo. "Mostrei que o polímero é biocompatível e serve para a confecção de pró teses para uso médico': relata. "Sem contar que as de polímero custam até 15% menos que as de silicone," Paciente recuperado - Os relatos das bem-sucedidas experiências chamaram a atenção de especialistas em câncer de cabeça e pescoço de [aú, que também queriam experimentar o material. Algumas modificações nos arranjos das moléculas tornaram o polímero mais rígido, possibilitando implantes de mandíbulas, por exemplo. Chierice conta que se emocionou quando viu um paciente no Hospital Amaral de Carvalho, que tinha perdido metade da mandíbula por causa de um câncer, morder um bife após receber uma pró tese com o polímero. Outro caso semelhante é de Alexandre do Nascimento, um motorista de 30 anos que recebeu o mesmo tipo de prótese depois de passar um bom período com inchaços e dores provocados por um tumor. "Eu como pão, carne e não sinto diferença. Quando vou a churrascos, não faço cerimônia", relata. "As pessoas não acreditam

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méstica" diz Márcia Barreto de Medeiros Nóbrega, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, na Embrapa Algodão, em Campina Grande (PB), que trabalha com melhoramento genético de oleaginosas. "De Porto Alegre (RS) a Tabatinga (AM), essa é a situação observável em todo lugar que passo:' A planta foi trazida ao Brasil pelos portugueses, com a finalidade de utilizar seu óleo para iluminação e lubrificação de eixos de carroças. O clima tropical facilitou o seu alastramento.

Durante décadas o Brasil manteve o posto de maior produtor e exportador mundial de óleo de mamona. Mas nos últimos anos perdeu o primeiro lugar e ficou atrás da índia e da China, respectivamente. Na safra 200112002, o Brasil produziu 82.200 toneladas de bagas (sementes) de mamona, com uma produção média de 651 quilos por hectare, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Desse total, a Bahia produziu 75.700 toneladas.

Utilizada desde o antigo Egito, a mamona ganhou espaço em várias aplicações industriais que tenho uma pró tese, porque me alimento bem e a cicatriz é pequena." O trabalho de reconstrução de mandíbulas e crânios com o polímero é feito em parceria com pesquisadores da Faculdade de Engenharia Mecânica da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), também da USP. Cabe a eles a tarefa de projetar e calcular cada detalhe da prótese feita sob medida, como o local exato de encaixe do parafuso que permite a articulação da mandíbula. O primeiro passo do trabalho é obter uma tomografia do local que vai receber o polímero. Essa imagem, trabalhada em computador, vai para uma máquina de prototipagem, onde a prótese é produzida em plástico rígido, para em seguida ser feito um molde em silicone e na etapa final ser confeccionada no polímero. "Quando o paciente vai para a mesa de cirurgia, a pró tese já está pronta, personalizada", diz o professor lonas de Carvalho, da EESC. "A inter-

venção, que demorava de 16 a 17 horas pelo método tradicional, leva, em média, duas horas com esse procedimento." Pelo processo antigo, todas as medições e acertos da nova prótese eram . feitos na própria sala de cirurgia. Sem contar que a platina, material utilizado nesse tipo de prótese, pode ser rejeitada pelo organismo, e a mamo na não.

Material modificado - Os estudos envolvendo o polímero são um capítulo à parte nessa trajetória. Pelos cálculos de Chierice, hoje são mais de 200 trabalhos publicados e cerca de 40 mestrados e doutorados, nas áreas de medicina, odontologia, veterinária e engenharia. Parte dos estudos do professor também foi financiada pela FAPESP por meio de um auxílio à pesquisa. A profusão de estudos sobre o polímero da mamo na produziu soluções ainda não imaginadas pelos pesquisadores ligados à produção de próteses.

Uma delas está no potencial bactericida e fungicida do biomaterial, revelado pelas professoras Izabel Froner, da Faculdade de Odontologia da USP de Ribeirão Preto, e Izabel Yoko Ito, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da mesma universidade. Essa pesquisa resultou no registro de dois novos produtos bactericidas, o endoquil, usado no tratamento de canais dentários, e o perioquil, para aplicação na periodontia (gengivas).

Isolador barato - Na área de engenharia elétrica, mais um uso inédito. Misturado a outros materiais, o biopolímero foi aprovado como isolador elétrico para redes de alta tensão. "Fizemos um isolador usando a resina e, para melhorar suas cacterísticas mecânicas e térmicas, colocamos diferentes aditivos, como areia e sílica", conta o professor Ruy Alberto Correa Altafim, da EESC. "Conseguimos com esses aditivos baratear custos e manter as características elétricas do material': diz Altafim, que já requereu a patente do isolador polimérico. Mesmo com tantos resultados animadores, nenhuma empresa se dispunha a investir no polímero até a metade da década de 90. Chierice decidiu então criar as condições para produzir o polímero comercialmente, ainda que em pequena escala. Na mesma época, o prefeito de Araraquara pensava em instalar empresas de base tecnológica no município. Bastou uma reunião para que a Poliquil tomasse forma. Segundo Antônio Rossi, um dos sócios, hoje as peças são elaboradas de acordo com a necessidade. "O médico tem a idéia e nós projetamos a peça." São 300 itens catalogados. Outro produto da fábrica de Araraquara é uma variedade usada como adesivo em filtros de bomba extracorpórea, aparelho que faz a filtragem de sangue em cirurgias. Quando se ouve Chierice e outros pesquisadores falando a respeito dos possíveis usos do biopolímero parece que ele é uma panacéia para tudo. Mas na verdade ele é fruto da pesquisa acadêmica que mobilizou estudiosos de várias universidades paulistas e agora se transforma em produtos para a sociedade. Mas a história desse óleo vegetal parece que não pára aqui. Dado o interesse despertado pelo polímero de mamona, os pesquisadores ainda prometem muitas surpresas. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 71


• TECNOLOGIA DIFUSÃO

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a proteína Pesquisador desenvolve kit com peças de plástico que mostram as estruturas protéicas em forma tridimensional ALESSANDRO

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ma das conseqüências do mapeamento do genoma humano e de outros projetos semelhantes é o aumento da necessidade de estudar as proteínas, compostos orgânicos constituídos de longas cadeias de aminoácidos e codificados pelos genes encontrados em todos seres vivos. São responsáveis por várias funções químicas no corpo humano, da digestão ao transporte de oxigênio e a reprodução. Um dos maiores problemas de cientistas e estudantes é justamente visualizar como essas proteínas se relacionam e se grudam umas às outras. A dificuldade tem uma razão simples: as cadeias de aminoácidos são estruturadas em três dimensões. Olhar para uma figura em duas dimensões em um livro e imaginá-Ia no espaço não é tarefa trivial. Exige muito treino. Pensando em diminuir o tempo de aprendizado e facilitar a vida de quem pesquisa essas substâncias, um professor inglês radicado no Brasil, o bioquímico Richard Garratt, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC), da Universidade de São Paulo (USP), resolveu criar um modelo concreto capaz de representar as proteínas no espaço tridimensional. O resultado é um kit de proteínas formado por peças de plástico coloridas que simbolizam as estruturas protéicas

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mais encontradas na natureza, como a hemoglobina, responsável pelo transporte de oxigênio no sistema sanguíneo, e a insulina, que controla os níveis de glicose no sangue. Segundo Garratt, não há nada similar no mundo. Por isso, ele fez o pedido de patente no Brasil,no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), em fevereiro deste ano. Atualmente, ele tenta fazer o mesmo com a patente internacional. "Assim que completarmos o processo da patente internacional vamos estudar a forma de produção e de venda do kit no Brasil e no exterior", diz Garratt. Três formas de comercialização estão em estudo: venda direta, criação de uma empresa para produzir e vender ou o licenciamento. "No Brasil ainda está indefinido, mas no exterior acredito que o melhor caminho é o licenciamento', comenta o professor. Por enquanto, o kit não foi mostrado a nenhuma empresa. "Estarnos realizando algumas modificações nos moldes e ainda não podemos produzir as peças em grande escala:' Em alguns meses, no entanto, o produto deve estar à venda. O preço não está definido, mas não deve ser caro. Para Garratt, seja qual for a forma de comercialização, o intuito é disseminar o uso do kit em universidades e escolas do ensino médio no Brasil."Não queremos que o preço seja



uma barreira para a aquisição do material': diz. A inspiração para criar o material veio durante o congresso da Sociedade Brasileira de Bioquímica e Biologia Molecular (SBBq) de 2001, realizado na cidade de Caxambu (SP). "Eu estava na beira da piscina do Hotel Glória e a professora Glória Franco, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), me perguntou se não seria possível reproduzir um tipo de modelo de estrutura atômica, que já existe há anos no mercado, por um preço bem mais barato, lembra Garratt. "Eu respondi que era possível, mas comecei a pensar que seria muito mais interessante fazer algo diferente. Uma coisa que ninguém tivesse feito antes e que não estivesse disponível no mercado. Foi assim que tive a idéia." onversa

o fez lembrar das dificuldades em explicar para seus alunos de pósgraduação como é uma ~ proteína em três dimensões. A preocupação não é nova. Ele já havia tentado outros artifícios. Quando começou a dar aulas no IFSC há 11 anos, três após chegar ao Brasil, ele improvisou alguns modelos. "Eu comprava alguns metros de fios de cobre em casas de construção e fazia o dobramento. Isso significa produzir dobras com a mão ao longo do fio de forma que o resultado represente o percurso da cadeia de aminoácidos no espaço tridimensional. A idéia é mostrar que a estrutura compacta da molécula está intimamente relacionada com a sua atividade biológica." Na verdade, dobrar os fios foi também um aperfeiçoamento de uma idéia mais antiga que Garratt viu na Inglaterra. "Dobrar os fios com as mãos foi inspirado na minha orientadora de mestrado Ianet Thornton, agora diretora do European Bioinformatics Institute, na cidade de Cambridge, na Inglaterra. Ela costumava dobrar tiras de metal para ilustrar o dobramento de proteínas, só que era difícil de dobrar, além de freqüentemente provocar cortes nos dedos", lembra Garratt. Design e produção - Após a reunião da SBBq, Garratt sedimentou a idéia e resolveu sofisticar seu modelo. Ele apresentou o projeto para a professora Leila Beltramini, coordenadora de difusão do Centro de Biotecnologia Molecular 74 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91


Estrutural (CBME), um dos dez Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) financiados pela FAPESP. Leilagostou do projeto e a dupla, junto com a equipe do CBME, começou a trabalhar no design das peças. Em oito meses, os primeiros protótipos dos moldes começaram a sair da máquina injetora de plástico do Centro de Divulgação Científica e Cultural (CDCC) da USP de São Carlos, que está trabalhando em parceria com o Cepid no projeto do kit. om as pnmeIras peças, Garratt decidiu testar a' eficácia do produto na prática. Ele e outros membros do CBME têm apresentadoworkshops em eventos da SBBq e da Sociedade Brasileira de Genética (SBG),propondo um desafio para os alunos presentes (30 a 40 em média): construir uma proteína com as peças do kit. Os resultados são animadores. Apósos 20 minutos da apresentação, a maioria dos alunos consegue completar a tarefa em uma hora. O teste já foi feitocom mais de 200 alunos que preencheram também um questionário ao final do desafio. Nele, 87% das pessoasdisseram que o kit é de fácil manuseio,99% que ele é capaz de desenvolvero raciocínio reflexivo e 97% que

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facilita a assimilação de conceitos. O próximo passo é testar o kit no ensino médio, uma idéia que faz parte do projeto original de Garratt. Os kits, no entanto, podem ter usos não previstos pelo professor. Por exemplo, professores estão querendo utilizar o kit para ajudá-los em seus trabalhos de pesquisa. "O professor da Universidade Yale,dos Estados Unidos, Arthur Horwich viu o kit e disse que pretende usá-lo para ajudar na visualização da estrutura da proteína fibrosa amilóide associada a várias doenças como o mal de Alzheimer," diz Garratt. Na mesma época que criou o kit de proteínas, Garratt teve uma outra idéia inspirada na observação de uma brincadeira de seu enteado. "Ao vê-lo jogan-

o PROJETO Kits de proteína MODALIDADE

Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) COORDENADOR RICHARD GARRATT - Centro

de Biotecnologia Molecular Estrutural (CBMEl INVESTIMENTO

R$ 80.000,00

do supertrunfo, um baralho com cartas com diferentes carros, tive a idéia de fazer o mesmo com amino ácidos", conta. Nesse jogo, cada jogador escolhe uma característica do veículo que quer apostar (velocidade máxima, por exemplo) e coloca a carta na mesa. Quem possuir o carro com a maior velocidade ganha a rodada. Existem ainda baralhos equivalentes para aviões, motos e agora um com aminoácidos que recebeu o sugestivo nome de Aminotrunfo. Para quem estuda a estrutura de proteínas é muito importante conhecer as características físico-químicas dos aminoácidos, mas também é muito chato decorá-Ias. O aminotrunfo busca tornar essa tarefa mais atraente. "Idéias parecidas formuladas por outros membros da equipe devem levar a novos produtos em futuro próximo." Tripé reforçado - Os trabalhos realiza-

dos por Garratt, no entanto, não seriam possíveis sem o apoio e financiamento do Cepid. "Ele foi muito importante, pois nos obrigou a pensar no que poderíamos contribuir para a difusão do conhecimento." E completa: "O grande mérito do Cepid neste caso é contemplar o tripé pesquisa (estrutura protéica), difusão (kit usado para criar uma nova forma de ensinar) e inovação (transferir a tecnologia para produção). Paralelamente ao trabalho de Garratt, Leila fez um kit de DNA. A idéia surgiu independentemente do kit de protéinas na mesma época e tem o mesmo objetivo: facilitar a vida de alunos e professores na sala de aula. Leila fez também uma análise de aproveitamento do uso do kit com professores e alunos de universidades e do ensino médio e os resultados foram semelhantes aos obtidos pelo professor. O desenvolvimento do kit de proteínas, no entanto, não acabou. Ele deve ainda criar um CD para explicar o seu uso e melhorar o manual para facilitar a utilização entre alunos do ensino médio. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 75


ITECNOLOGIA

INFORMÁTICA

Máscaras na Internet Sistema desenvolvido na U FMG permite controlar a privacidade na rede mundial de computadores LILIANE

NOGUEIRA

ouca gente se dá conta da maior facilidade em manter a privacidade no mundo real do que no, cada vez mais complexo, mundo on-line. Além dos hackers que invadem computadores de usuários e servidores, os próprios provedores (empresas que hospedam sites e contas de e-mails) e qualquer endereço na Internet também podem coletar dados, de forma sistemática, com a finalidade de personalizar serviços ou de bisbilhotar a vida alheia. Ao acessar a rede mundial de computadores, o usuário pode, por meio do preen-

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chimento de formulários, fornecer dados pessoais como endereço, telefone, número da identidade ou do cartão de crédito, além de dar informações, sem saber, sobre seus interesses, costumes, compras e preferências pessoais. Preocupados com a perda de privacidade dos milhões de internautas que acessam a Internet e não querem ser identificados, pesquisadores do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) desenvolveram um sistema que permite navegar pela rede com mais privacidade, protegidos por "máscaras".

Uma máscara é um tipo de pseudônimo associado a um grupo de pessoas que compartilham um mesmo tema de interesse, em vez de estar associada a um indivíduo específico. Assim, de forma automática, o usuário ao se conectar a um site sobre turismo, por exemplo, fica ligado a um grupo identificado ao tema, no próprio provedor. Os mantenedores do site registram a visita do grupo e não do usuário que poderá receber informações personalizadas, se for o caso, sem nenhum tipo de identificação. O trabalho da equipe da UFMG ganhou notoriedade. Foi capa da revista


Security&Privacy (Segurança e Privacidade), uma das mais importantes publicações da área nos Estados Unidos, editada pelo Institute of Electrical and Electronics Engineers ou Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos, organização mais conhecida pela sigla IEEE, que reúne 380 mil membros em 150 países, nas áreas de engenharia, telecomunicações e computação. O artigo Masks:

sa um site. "Na verdade, a identificação do internauta é realizada usando recursos do navegador, tanto do Netscape quanto do Explorer" diz Meira Iúnior, explicando que os cookies estão atrelados a eles. Outra forma de ser identificado é através do endereço IP, Internet Protocol, que é o registro dos usuários nos respectivos provedores presente em todas as interações do usuário na rede. bringing anonymity and Atualmente, o interpersonalization together nauta pode facilmente re(Máscaras: conjugando anonimato e personalizacorrer a ferramentas para programa ção) foi escrito pelos pesnão ser identificado, coserá gratuito quisadores Virgílio AImo as que desativam os cookies nos próprios nameida e Wagner Meira e deverá estar vegadores, mas fica totalJ únior, professores da finalizado até mente anônimo, o que, UFMG, e pela doutoranda em alguns casos, dificulta Lucila Ishitani. O protótio final do ano a navegação pela rede da po estará disponível como Internet. "As ferramensoftware livre, de forma tas de anonimato barram gratuita, para usuários e qualquer informação, enquanto a másinstituições - universidades, governo, cara filtra, mas deixa passar informaempresas e provedores - ainda este ano. ções que possam ajudar': explica AlmeiPerfil valioso - O problema da falta de da. "Um pouco de exposição é benéfica e contribui para a melhoria dos serviprivacidade na Internet é grave porque ços", complementa Meira [únior, "É o muitos internautas desconhecem que a rede mundial aloja programas cacaso das empresas de telefonia celular, que monitoram todos os movimentos muflados, capazes de monitorar o comportamento e traçar o perfil dos do telefone, traçam o perfil dos usuários usuários. O simples fato de acessar um e lançam planos e pacotes promocionais que atendem a maioria dos clienportal já é o suficiente para ser identificado. Segundo Almeida, os pop-ups, tes", exemplifica. "As compras nas livraaquelas janelinhas com publicidade que rias virtuais também podem ficar mais interessantes se você deixar claro as suas se abrem na tela independente da escopreferências. Os programas Instalados lha do usuário, além de irritantes, identificam de forma compulsória os comno site registram o perfil literário e enviam preciosas dicas aos clientes virtuais': putadores conectados à página, antes lembra Almeida, que testou os mecanismesmo de serem fechados. Não é necessário nenhuma ação do internautà mos de formulação das máscaras no site de uma livraria eletrônica real. para que exista essa invasão. Quanto aos banners (os espaços de publicidade dentro de um site), basta clicar sobre eles Mensagens detestáveis - Por outro e, automaticamente, as informações solado, não faltam motivos para preocubre a máquina podem ser capturadas. pação com a privacidade na internet. Uma das formas de monitorar o "Existem empresas nos Estados Unidos especializadas em capturar dados, tracomportamento e preferências dos çar perfis, rnapeá-los e vendê-los', conusuários é através dos cookies - arquita Almeida. Se hoje as informações são vos armazenados por sites no computador do usuário - com o objetivo de voltadas para o marketing direto que tornar possível identificar o internauta entopem as caixas de mensagens dos que acessa as páginas virtuais, bem co"selecionados" com os detestáveis spams - e-mails não solicitados e nem autorimo recuperar as atividades anteriores desse usuário, arquivadas no servidor zados -, nada impede a essas empresas do site. Esses arquivos são instalados no especialistas de rastrear as idas e vindas computador do usuário, independente dos surfistas da Internet que decidam da vontade do mesmo e sem que ele semudar o foco e ultrapassar os limites da publicidade personalizada. quer perceba, no momento em que aces-

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Como na rede é possível coletar dados em quase todas as operações, inclusive nos correios eletrônicos, essas "inocentes" empresas voltadas para o marketing digital podem estender a clientela e passar a vasculhar dados médicos em hospitais ou empresas de seguros saúde para atender a finalidades que os usuários desconhecem. Isso sem falar nos projetos desenvolvidos pelo governo norte-americano que prevêem detectar comportamentos, considerados suspeitos por eles, de pessoas em qualquer lugar do planeta. Seguro e personalizado - A estrutura de máscaras desenvolvida pelos pesquisadores de Minas Gerais é segura porque gera uma identificação temporária e anônima, que o usuário adota enquanto navega, impossível de ser recuperada pelos sites e outros programas. Um mesmo usuário recebe várias identificações, dependendo dos locais visitados. Ao acessar um site que identifica os visitantes, por exemplo, seus dados estarão totalmente protegidos e apenas a identificação da máscara, que não contém nenhum dado do usuário, será capturada. No entanto, a máscara oferece informações que podem ajudar a personalização dos serviços dos sites. O sistema é inovador porque seleciona o grau de privacidade. Como esse conceito é, além de cultural, muito pessoal, o próprio internauta decide os dados pessoais que podem circular pela rede. Em linhas gerais, a arquitetura das máscaras funciona com dois recursos: o agente de privacidade e o servidor de máscaras. O agente fica instalado na máquina do usuário e tem a finalidade de negociar com o servidor a máscara mais adequada ao site eventualmente visitado, além de alertar sobre o nível de ameaça à privacidade. O servidor, que pode estar em qualquer lugar da rede, tem a função de armazenar as máscaras e selecioná-Ias de acordo com o site visitado. Uma caixa de diálogo alerta sobre os dados colhidos pela página acessada na Internet e dá a chance ao usuário de controlar informações que não quer revelar. Em determinadas situações, as máscaras devem ser desativadas. "Nos sites seguros, como os de banco, onde a identificação é fundamental, temos que abrir mão do anonimato para usufruir dos serviços online', lembra Almeida. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 77


ITECNOLOGIA

AGRICULTURA

o melhor do lixo Software e nova metodologia de análise indicam a qualidade do composto orgânico usado como adubo YURI VASCONCELOS

m dos recursos usados por pequenos agricultores para adubar as plantações é a adoção do composto orgânico obtido a partir do lixo urbano. Preparado por usinas de triagem e compostagem a partir de restos de comida, frutas, verduras e legumes e vendido a preços bem menores que os adubos convencionais, o composto é bem aceito principalmente por quem cultiva hortaliças. Embora utilizado desde a década de 70, quando foram instaladas as primeiras usinas no país, até hoje não

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existe uma legislação específica que estabeleça normas para aplicação agrícola desse produto. Com baixa qualidade, ele pode contaminar os alimentos com microorganismos, como vírus e bactérias, e provocar sérios danos ambientais, como a contaminação do solo e do lençol freático por metais pesados e nitratos, substâncias oriundas principalmente dos dejetos humanos e animais. Ciente do problema e sabendo das reclamações dos agricultores, um grupo multiinstitucional de pesquisadores resolveu estudar a fundo os compostos

urbanos. Além de estabelecer um sistema de análise que pode servir para uma futura normatização do produto no país, eles criaram uma sistemática pioneira embutida em um software capaz de analisar o composto de lixo urbano (CLU). Ele informa quais as substâncias existentes em cada amostra de uma usina e fornece indicações sobre seu uso na agricultura. A equipe é formada por pesquisadores ligados à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Escola de Engenharia de Piracicaba (EEP), Escola Superior de Agricultura Luiz de

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Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade de Taubaté (Unitau) e Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Boa parte das pesquisas que serviram de base para o desenvolvimento do programa foi financiada pela FAPESP. O recém-criado software, batizado de SistemáticaInteligente para Recomendação ao Uso de Composto de Lixo Urbano na Agricultura (Sirclua), proporcionará um controle maior sobre a qualidade do composto feito no país e auxiliará os produtores rurais no emprego adequado desse adubo orgânico com toda segurança ambiental. Usado até agora no âmbito da universidade, o programa passa atualmente por uma adaptação para o uso nas usinas de compostagem. O primeiro acordo para uso comercial do sistema deverá ser fechado com a Urbanizadora Municipal (Urban), a autarquia que administra a coleta de lixo,o aterro sanitário e a usina de compastagem da cidade de São José dos Campos (SP).As negociações estão bem adiantadas. "Queremos controlar mais de perto o nosso composto, dando mais segurança aos agricultores que o utilizam",afirma José Roberto Bráulio de Melo, gerente do Departamento de Tratamento de Resíduos da Urbano O contrato, no valor de R$ 55 mil, prevê o fornecimento do programa para análise do produto obtido na usina

e também o desenvolvimento de padrões para uso do CLU em parques, jardins e na agricultura. A usina de compostagem de São José dos Campos produz 40 toneladas de composto por dia, que é vendido por R$ 20 a tonelada. "Nosso composto foi o primeiro e talvez ainda seja o único registrado no Ministério da Agricultura. Nunca recebemos denúncias de contaminação por metais pesados", afirma Melo. Tal fato é comprovado pelos resultados de pesquisa do grupo. Níveis aceitáveis - "O sistema Sirclua está capacitado para avaliar a qualidade do composto, apontando se ele está ou não dentro dos padrões mínimos desejáveispara o cultivo de cada produto agrícola",explica o engenheiro agrônomo Fábio César da Silva,pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária e um dos responsáveis pela criação e coordenação da base de conhecimento do sistema. O programa avalia, entre outras coisas,a estabilizaçãofísicae biológica da matéria orgânica, os níveis aceitáveis de metais pesados, os valores de nitrogênio, fósforo e potássio presentes no composto e a eficiênciado uso dos nutrientes nas lavouras. "O programa também faz uma recomendação de adubação, indicando a quantidade a ser usada para determinado solo ou vegetal e, se for o caso, se deve ser complementado com fertilizantes químicos. Desse modo, a equipe acredit~ que es-

tabeleceu um procedimento padrão para o uso agrícola da compostagem." egundo o agrônomo, o emprego de composto de lixo urbano na agricultura traz grandes benefícios não só para os produtores, mas também para o meio ambiente. "Com a utilização do CLU,o agricultor faz uma grande economia, porque substitui o fertilizante químico, que responde por 30 a 40% do custo de produção, pelo adubo orgânico, muito mais barato", diz ele. Além disso, o composto é uma excelente alternativa para o processo de reciclagem. "Ele fecha o ciclo de vida dos elementos que compõem a fração orgânica do lixo, contribuindo para aliviar a carga poluidora dos aterros sanitários, dobrando a vida útil desses ambientes", diz Fábio Silva. A vantagem da obtenção do composto é livrar os aterros dos problemas advindos da parte orgânica do lixo, eliminando situações desagradáveis, como a exalação de odor, a formação de gases e de chorume (líquido malcheiroso), que podem gerar risco de impacto ambiental no local, além de atrair e proporcionar o aumento da população de ratos, baratas, mosquitos e outros insetos. Por enquanto, o Sirclua está capacitado para emitir recomendações de uso do composto em dez diferentes culturas: arroz, feijão, cana-de-açúcar,

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Opinião semelhante tem o engenheitriticale (cereal híbrido entre o trigo e O agricultor Manuel dos Santos, ro agrônomo José Carlos Chitolina, o centeio), milho, mandioca, aveia, alex-presidente da Associação dos Proface, beterraba e chicória. Tudo nas dutores de Hortaliças de Arujá e Região professor aposentado da Esalq e vice(Apro-Horta), dono de uma propriediretor da Escola de Engenharia de Picondições de solo de grande parte do racicaba. No final dos anos 90, ele fez Estado de São Paulo. "Aquantidade do dade rural de 36 mil metros quadracomposto a ser usada pelo agricultor e dos onde cultiva folhagens comestíveis, um exaustivo trabalho de caracteria necessidade ou não de uma supleconfirma a duvidosa qualidade do mazação química do composto produziterial enviado pelas usinas. "O composmentação química com suas respectivas do pelas três unidades paulistas. "Nas quantidades vão depento vem bruto, com muito material esnossas pesquisas, concluímos que, quando der do solo e da cultura tranho. Depois que o recebemos, somos onde vai ser aplicado", obrigados a fazer correções e terminar comparado aos padrões definidos pela leexplica o engenheiro a compostagem, antes de aplicar no programa agrônomo Ronaldo Sesolo. Caso contrário, com o passar do gislação de vários países recomenda europeus, como Alemaveriano Berton, pestempo, a saúde do trabalhador ficaria comprometida e a terra ficaria inutilinha, Itália, França, Suíquisador do Instituto a quantidade zada em função da grande quantidade Agronômico de Campiça e Áustria, o composnas (IAC), um dos intede vidro, plástico e metais pesados que to das usinas paulistas de composto grantes do grupo. "Com vão se acumulando no campo", conta continha teores de mepara cada solo o produtor rural. taispesados,como cobre, essa ferramenta, inédita zinco, níquel, chumbo no Brasil e talvez na e vegetal América Latina, criamos e, principalmente, cádMau cheiro e mosquitos - A qualidade mio, acima dos níveis padrões de qualidade do pré-composto produzido na usina de Vila Leopoldina, localizada na zona aceitáveis, o que deveria que poderão ser usados oeste da cidade de São Paulo, na verdainviabilizar o uso desse material na na formatação de uma legislação sobre compostagem no Brasil",diz. de um lixo pré-tratado, segundo os pesagricultura", diz Chitolina. "Mas, infelizmente, ele era destinado ao cinturão quisadores, não é o único problema da No futuro, a intenção dos pesquisaunidade. O forte odor exalado pela insverde de São Paulo sem monitoramendores é oferecer o programa na Interto ambiental e sem uma sistemática de net para que qualquer usina ou produtor talação e a proliferação de mosquitos controle." rural possa acessá-lo gratuitamente. vêm, há muitos anos, causando insatis"Para manter-se atualizado, o programa "Ashortaliças, por exemplo, devem fação e gerando protestos dos moradores das redondezas. "A população sofre usar compostos produzidos de lixo de é complementado na medida em que o coleta seletiva com índices de metal conhecimento sobre novas aplicações com o mau cheiro da usina. Existem na agricultura forem gerados", conta o denúncias de que as crianças de uma muito mais baixos do que os apresentados nas amostras coletadas." No traengenheiro agrícola Luiz Henrique Roescola da redondeza chegam a passar drigues, da Faculdade de Engenharia mal durante as aulas': afirma o promobalho de Chitolina, o chumbo no préAgrícola da Unicamp, que coordenou tor do meio ambiente Geraldo Rangel, composto da Usina de Vila Leopoldina que pretende propor uma ação cível apresentou um índice 20% maior que o trabalho de desenvolvimento e implementação do software. o aceitável.Segundo os pesquisadores.as pública pedindo o fechamento da usina. "Tenho um laudo emitido pela hortaliças devem receber apenas compostos provenientes de lixo coletado seCompostagem paulistana - O novo proCompanhia de Tecnologia de Saneagrama será muito útil nos locais onde mento Ambiental (Cetesb) atestando letivamente porque se consegue reduzir são produzidos os CLUs mais probleque a usina deve encerrar suas atividabastante o risco de contaminação com microorganismos e os índices de metais máticos encontrados pelos pesquisades por operar muito próxima da copesados ficam muito mais baixos. dores. "Asduas usinas de compostagem munidade e não ter condições de evida cidade de São Paulo, de Vila Leopoldina e de São Mateus, e a de Santo OS PROJETOS André, por exemplo, não operam de forma adequada. Os produtores rurais Caracterização Química do cinturão verde de São Paulo reclaDefinição de Critérios para de Compostos de Lixo Urbano Aplicação de Composto de mam do composto produzido pelas de Duas Usinas de Compostagem Lixo Urbano em Cana-de-Açúcar duas usinas paulistanas que os abasteda Grande São Paulo cem': comenta Silva."O composto e o MODALIDADE pré-composto (fase em que o produto MODALIDADE Linha Regular de Auxílio à Pesquisa ainda não foi devidamente 'curado', Linha Regular de Auxílio à Pesquisa considerado apenas um lixo pré-trataCOORDENADOR COORDENADOR do) feitos por elas têm uma grande FÁBIO CÉSAR DA SILVA - Embrapa JOSÉ CARLOSCHITOLINA Esalq-USP quantidade de material inerte, como pedaços de vidro, plástico e cerâmica. INVESTIMENTO INVESTIMENTO Até agulhas e cabeça de boneca já foR$ 24.258,00 e US$ 1.661,00 R$ 10.375,00 ram encontradas nele."

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tar o mau cheiro. Estou apenas aguardando outras informações relacionadas ao risco de contaminação do précomposto para propor a ação", afirma o promotor. A equipe de pesquisa também foi convidada pelo promotor Rangel para dar um parecer sobre a situação da qualidade do composto e a necessidade de medidas de correção. Outra denúncia diz respeito às condições de trabalho na usina. "Elas são péssimas", afirma a química Maria Gricia Grossi, pesquisadora da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), atualmente na Secretaria de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos do Ministério do Meio Ambiente, que elaborou um relatório técnico avaliando as condições e o meio ambiente de trabalho na unidade de compostagem da Vila Leopoldina.

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diretor do Departamento de Limpeza Urbana (Limpurb) da Prefeitura, Fabio Pierdomenico, defende-se das acusações. Para ele, o problema do odor deverá ser resolvido em breve. "O Limpurb já está em fase de aditamento do contrato, que irá possibilitar a implantação de um sistema de neutralização de odores, entre outras medidas no plano de mitigação de impactos ambientais. Esse plano estabelece também o recobrimento das baias de armazenamento de materiais recicláveis", explica Pierdomenico. Quanto às denúncias a respeito da qualidade do pré-composto produzido na usina, o diretor da Limpurb esclareceu que "é difícil se posicionar quando não há parâmetros legais específicos para fração orgânica e para o composto". Ele afirma que, segundo testes laboratoriais mensais efetuados nos laboratórios da Esalq, assim como em laboratórios particulares, o pré-composto possui níveis de metais pesados e bactérias patogênicas abaixo dos preconizados pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), pela Embrapa e pela Comunidade Européia.De qualquer forma, é possível dizer que o novo sistema de análise e o software serão valiosos para a produção de um composto de melhor qualidade em São Paulo e no país, garantindo maior segurança da cadeia alimentar. •

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ITECNOLOGIA

MEDICINA

Catuama no coraçao ~

Patente garante medicamento que reverte a fibrilação ventricular

MARCOS

DE OLIVEIRA

e tudo der certo nos estudos realizados em parceria entre a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e o Laboratório Catarinense, uma indústria farmacêutica nacional localizada em Ioinville, Santa Catarina, os médicos de todo o planeta vão ter nas mãos um medicamento inédito para combater a fibrilação ventricular. Essa disfunção ocorre quando o músculo cardíaco se contrai de forma desordenada e sem controle, impedindo o bombeamento do sangue pelos ventrículos, uma situação presente em várias doenças cardíacas, como o infarto do miocárdio (parede do músculo cardíaco), ou em conseqüência da ingestão de drogas e medicamentos. Quando jovem, abaixo dos 40 anos, a chance de o indivíduo com esse tipo de infarto apresentar a fibrilação ventricular, o que pode levar a morte, é grande porque a irrigação colateral ao músculo cardíaco ainda é pouca. A salvação, hoje, se resume à aplicação em poucos minutos de um desconfortável choque elétrico com um aparelho chamado desfibrilador, que coloca o coração no ritmo certo. A esperança de um novo medicamento está no extrato de um composto fitoterápico, produzido pelo Laboratório Catarinense, que possui o

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nome comercial de Catuama. A intenção final dos pesquisadores e da empresa é chegar até a produção de um medicamento intravenoso que possa ocupar o lugar do choque elétrico. Para garantir os direitos da nova droga, os pesquisadores da USP, com o professor Irineu Velasco, do Departamento de Clínica Médica, à frente, e o Laboratório Catarinense depositaram o pedido de patente no Brasil, nos Estados Unidos, na União Européia e no Japão, entre os meses de junho e agosto deste ano, que protege o uso como desfibrilador das plantas associadas ao Catuama: catuaba (Trichilia catígua), guaraná (Paullinia eupana), muirapuama (Ptychopetalum o/acoides) e gengibre (Zingiber officinale). "Agora nós vamos estudar as frações do extrato para verificar quais deles, um ou mais, têm a propriedade de cessar a arritmia", explica Velasco. "Daí vamos saber qual a molécula responsável pelo efeito terapêutico."

Assim que identificarem a molécula, os pesquisadores vão fazer os testes toxicológicos e saber como é o funcionamento genético em relação às proteínas e aos possíveis genes envolvidos nas doenças cardíacas. Por fim, eles tentarão reproduzir e sintetizar a molécula em laboratório. Só aí ela será testada em humanos. Todo esse percurso deve demorar de cinco a oito anos. Uso fácil - "Queremos chegar a esse medicamento inédito na forma injetável e por via oral': diz Velasco. A injeção é para os pronto-socorros e equipes de resgate que precisam reverter a fibrilação em casos de emergência. Os comprimidos serão úteis como preventivo para pessoas propensas a esse problema cardíaco e que muitas vezes usam desfibriladores implantados no corpo de forma idêntica aos marca-passos. A adoção de um medicamento mudaria muita coisa na prática da desfibrilação. "Hoje, em muitos países, principalmente na Escandinávia (Noruega, Suécia e Dinamarca),


em separado. Eles já sabem que uma das plantas é a responsável direta pela desfibrilação, mas a empresa não quer divulgar qual, mesmo com a patente depositada no Brasil e em vários países. Nesse documento também estão citadas outras plantas associadas, que podem dar uma rapidez maior à ação desfibriladora da planta principal.

desfibriladores portáteis estão sendo colocados em pontos estratégicos nas ruas, estações de metrô e aeroportos para uso em casos de emergência, além de treinarem as pessoas para utilizá-los," A produção de um medicamento e a boa expectativa dos pesquisadores se baseiam nos experimentos de laboratório executados em corações de coelhos e de ratos. "Na verdade, tudo começou quase por acaso, quando testávamos o Catuama (vendido na forma líquida ou em cápsulas) para verificar possíveis danos ao miocárdio provocados pelo remédio': diz Velasco. "Os testes foram em colaboração com o farmacologista João Batista Calixto, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que estudava em 2002 as atividades antidepressivas do Catuama, confirmadas posteriormente na captação e liberação das monoaminas (serotonina, noradrenalina e dopamina), alguns dos neurotransmissores responsáveis pela regulação do comportamento humano. "Ajudávamos o professor Calixto a fazer o controle químico doproduto. Em um experimento, alguns coraçõesfibrilaram. Aí, aplicamos o medicamento para ver o que acontecia e, para surpresa nossa, a arritmia cessou': contaVelasco.

ara continuar os testes em corações fibrilados, eles precisaram desenvolver um modelo diferente do usado normalmente, que também provoca o infarto. "Por meio de uma técnica desenvolvida por dois alunos de iniciação científica, Anezka Carvalho Rubim de Seles e André Ferrari de Franca Camargo, sob supervisão da pesquisadora Vera Pontieri, que colocaram um eletrodo dentro do coração provocando a fibrilação, conseguimos um modelo excepcional para nossos testes:' Normalmente, uma arritmia desse tipo deve ser revertida em cinco minutos. Com o Catuama, o coração voltava a bater de forma normal dentro desse tempo. "Para não deixar dúvidas, fizemos uma fibrilação de 20 minutos, faixa de tempo em que não há volta à normalidade, nem com choque elétrico. Aplicamos o Catuama e a arritmia cessava. E melhor, depois do remédio, mesmo excitado eletricamente, o coração não voltava a fibrilar." A curiosidade científica e a necessidade de identificar o que estava fazendo o coração parar de fibrilar, pois seria impossível aplicar diretamente o composto fitoterápico no coração humano, levaram os pesquisadores da USP a testar cada extrato de planta do Catuama

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Canal de sódio - Com o extrato principal em mãos, os pesquisadores fizeram também testes num equipamento chamado Patch-clamp, que serve para analisar os canais das células. Esse aparelho foi adquirido em um projeto temático coordenado pelo professor Velasco e financiado pela FAPESP para o estudo da solução hipertônica, um preparado com altíssima concentração de sal (veja reportagem sobre esse assunto e as primeiras descobertas sobre o Catuama na edição 78 de Pesquisa FAPESP). O teste realizado com uma célula de coração mostrou que o extrato da planta inibe os canais de sódio e com isso produz um rearranjo dos estímulos elétricos no coração, fazendo o papel de desfibrilador. O próximo passo é estabelecer novas parcerias para obter financiamento das agências de fomento ou de indústrias multinacionais que podem alocar recursos para o avanço das pesquisas e a formatação do medicamento. "Estamos analisando se fechamos parcerias com outra empresa agora ou mais para a frente", diz o médico Luc Raes, diretor científico do Laboratório Catarinense. "De qualquer forma, não vamos abrir mão do controle das pesquisas, que deverão ser feitas no Brasil e sob a supervisão dos professores Velasco e Calixto." Raes calcula que até o desenvolvimento completo de um produto sintético, testado em humanos e com o medicamento pronto para ser colocado no mercado, sejam gastos de US$ 200 milhões a US$ 500 milhões durante um período de até dez anos. O Laboratório Catarinense fatura R$ 35 milhões por ano e 3% desse montante é investido em pesquisa, além de financiamentos obtidos em parceria com outras instituições. Da receita, 85% é proveniente de fito terápicos como o Catuama e o xarope expectorante Melagrião. "O restante vem de medicamentos como sulfas e analgésicos e de uma linha fitoterápica constituída de monodrogas como o Gingko biloba, por exemplo:' • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 83


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Pesquisa recupera a divertida e crítica epopéia satírica de Manuel de Araújo Porto-Alegre em A Lanterna Mágica CARLOS

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médico em sua versão francesa (acima) e na versão nacional

ir é o melhor remédio, em especial para aquelas coisas que não parecem ter remédio. Esse misto de esperança idealista e cinismo pessimista alimentou uma experiência tão pioneira quanto pouco conhecida da imprensa alternativa no Brasil do século 19, a revista A Lanterna Mágica, editada no Rio de Janeiro entre 1844 e 1845, redigida solitária e anonimamente pelo escritor, pintor arquiteto, cenógrafo, poeta, dramaturgo, ensaísta e, ufa, caricaturista Manuel de Araújo PortoAlegre (1806-1879). Em 23 números (a idéia era que durasse 366 "atos"), a revista, nos moldes dos trabalhos de ácida crítica social do desenhista e caricaturista francés Honoré Daumier (180879), apresentava as aventuras de um par de pilantras sem escrúpulos cujo propósito na vida era enriquecer da forma mais rápida possível.

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"O propósito crítico do periódico era denunciar a sociedade de seu tempo, ironizando os vícios de caráter que observava e que podemos considerar, lamentavelmente, como intemporais: especulação, corrupção, malandragem", diz Heliana Angotti Salgueiro, curadora da mostra (e do recém-lançado catálogo da exposição) A Comédia Urbana: de Daumier a Porto-Alegre, apresentada de abril a junho no Museu de Arte Brasileira da FAAP. O interesse por PortoAlegre foi assunto de seu pós-doutorado, em 1995, História da Arte, História

da Cidade: Atores e Leituras no Brasil do Século 19, que teve apoio da FAPESP. Para a exibição, foram reunidas mais de 240 obras, procedentes de 13 museus e bibliotecas de Paris, São Paulo, Rio e Porto Alegre. Em A Lanterna Mágica, Porto-Alegre foi pioneiro ao incluir caricaturas para ilustrar seus textos, diálogos entre

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os dois personagens centrais, Lavemo e Belchior dos Passos. A dupla, antepassados do heroísmo sem nenhum caráter de Macunaíma, faz de tudo para "se dar bem" na capital carioca: de romancistas a médicos, passando pela política e até pela ópera, os dois fingem entender de tudo para arrancar trocados dos "papalvos" da cidade. "Porto-Alegre queria mostrar, sob a luz de sua lanterna mágica, os personagens-tipo do seu tempo, os 'Lavemos' que gravitavam na sociedade do Rio de Janeiro. Nesse sentido, ele é 'moderno' na clarividência dos problemas do seu país e se engajou numa série de combates, nem sempre compreendidos por seus contemporâneos': fala a pesquisadora. ''Afinal, após ter vivido sete anos na Paris de Balzac, Hugo, Sue, Daumier, entre outros, num universo em que a imprensa ilustrada, o romance de costumes, a industrialização e a dessacralização da imagem, pela


à desonestidade que grassava entre os poderosos, sob a máscara da filantropia e da respeitabilidade. E mais: demonstrava o tempo todo enorme habilidade para assumir várias identidades falsas, enganando os incautos e fugindo da lei. Tudo isso talvez tenha impressionado muito Porto-Alegre na peça Robert Macaíre", analisa João Roberto Faria. "Entre Daumier e Porto-Alegre há um abismo evidente, mas ambos se encontram no teatro das experiências da condição humana, no registro dos tipos e dos vícios da comédia urbana moderna: na tarefa de desenhar do primeiro e de escrever do segundo, de Macaire a Laverno, emerge a consciência da cena trágica da cidade", nota Heliana. "Em sua diferença, ambos enxergam a experiência do encontro com a modernidade enquanto heróis solitários, excêntricos, cujas experiências não se encaixam no 'socialmente mediatizado' das relações humanas:' Para tanto, Porto-Alegre usou uma curiosa e complexa metáfora: a lanterna mágica. tecessor do cinema, o aparelho projeta imagens por meio de lentes e lâminas de vidro sobre os quais são desenhadas figuras que, ao serem iluminadas, eram projetadas sobre uma tela branca. Ao mesmo tempo, e de forma sintomática, o termo, no século 19, passou a ser aplicado igualmente à imprensa ilustrada que exibia "quadros" da realidade aos leitores. "Mas Porto-Alegre frisava que o seu desejo era projetar as imagens do Rio de Janeiro que tinha diante dos olhos, não com o intuito de 'fazer ilusões a este ou àquele indivíduo', mas, ao contrário, concebendo sua obra como 'o teatro onde se representarão as principais cenas de nossa época", observa Roberto Faria. No fundo de todo cínico mora um idealista. Ao voltar ao Brasil, em 1837, com a cabeça plena do que vira em Paris em transformação, Porto-Alegre acreditava que o Brasil também poderia ser reelaborado e que ele poderia dar sua contribuição com o novo meio que descobrira na cidade-luz. "Ele usa a lanterna mágica como um instrumento que exibe 'a verdade com todas as suas luzes", diz Heliana. E com todos os seus risos. "Viemos ao mundo para representar uma vasta comédia: é melhor to-

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litografia e pela caricatura, e, em especial, pelo teatro, produziam retratos de um novo tempo de comunicação que se afirmava no espaço urbano. Assim, ao voltar ao Brasil, ele estava à frente de seus compatriotas", observa.

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Leitura a vapor - Discípulo de Debret, a abdicação de Pedro I pegou PortoAlegre de surpresa e o obrigou a partir, em 1831, para Paris, com a ajuda do antigo mestre. A vida na capital francesa não foi fácil para o brasileiro, mas é lá que pôde vivenciar a explosão da imprensa ilustrada e da "modernidade" visual, em que a imagem, acompanhando as transformações por que passava a metrópole, suja e insalubre, se dessacraliza, se industrializa, trocando a "arte pura e elevada" pelo mercado, pela "leitura a vapor" dos cartazes de rua, das revistas de caricaturas que mostravam os novos tipos dos novos tem-

poso No mesmo espírito dós flâneurs que passeiam sem rumo certo pela metrópole, os textos também passam a trazer a marca da leitura rápida, do passar de olhos pelo texto e pelas imagens, que ganham novo status: a capacidade de sintetizar o real e, de quebra, criticar de forma incisiva essa realidade. Entre o muito que viu, Porto-Alegre impressionou-se com o personagem literário e teatral Robert Macaire, um ladrão, assassino e impostor, acompanhado por seu fiel e estúpido cúmplice, Bertrand, uma versão em negativo de Quixote e Sancho. O sucesso da dupla era imenso e Daumier ilustrou os álbuns Les Cent-et-un Robert Macaíre, sobre textos de Alhoy e Huart. O detalhe curioso da fama do canalha era a contrapartida moralista de seus engodos. "O personagem central, apesar de seus crimes e de seu cinismo, fazia uma crítica violenta à corrupção, à cupidez,

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Daumier e cena de Macaire: canalha que

inspirava virtude com seus crimes e golpes

mar os assentos da frente e os apoucados que venham atrás", escreve o redator anônimo de A Lanterna Mágica. Afinal, continua, com cinismo machadiano, indo ainda mais longe, "o que é o mundo senão uma comédia. Os velhacos são os acrobatas, os néscios, os palhaços, a mocidade, os galãs; a velhice, os logrados, o povo, os comparsas. A orquestra é todo este movimento, este zunido de mutucas que se chupam reciprocamente. O ferrão mais duro é o que vence': r.'?'~

stãoaí reunidos, de forma informal, todas as paixões e os ,:"íc.iosda época: o teatro, o cuusmo, o novo, a competição e o fim dos valores diante da era do capital. Mas como ninguém é de ferro, Porto-Alegre logo emenda com um aviso notável: "Quem tem olho de vidro não espirra forte': O riso castigando os costumes. "A Lanterna Mágica mostra também o 'outro' lado de Porto-Alegre, que, como qualquer homem lúcido oitocentista, reunia o realismo, o esplim do cotidiano ao 'sonho' progressista, à idealização da técnica, associando a história e a arte, enquanto elementos de transformação deste cotidiano", avalia Heliana. "Ele é um romântico marcado por um nacionalismo retórico, mas ao mesmo tempo crítico e consciente dos problemas de seu país. É, antes de tudo, um saint-simoniano típico, expressando-se assim em seus projetos para o Brasil.Seu messianismo letrado e inquieto se prolongará em gerações posteriores." Assim como o banditismo de Macaire podia ser inspirado r de virtudes, a

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safadeza de Lavemo e Belchior era'uma forma de, por meio do riso, mostrar o que havia de errado no Brasil e tentar corrigir a impostura geral. "Aatitude de 'Porto-Alegre surpreende por várias razões. De modo geral, os escritores românticos brasileiros afastaram-se da realidade, criando em suas obras um Brasil ideal, retratado de forma superlativa. Essesentimento de amor à pátria não trazia nenhuma preocupação em abordar as mazelas sociais da vida cotidiana", lembra Roberto Faria. As exceções ficaram por conta das peças de Martins Pena, de Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida e, entre outros poucos, do breve A Lanterna Mágica. Para tanto, um protagonista à altura do país. "Ele será sempre o imortal Laverno, esse homem prodigioso, espécie de Mefistófeles, de judeu errante que anda entre nós nas praças, nos

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templos, nos salões dourados, no parlamento, nas estalagens, nas lojas e nos ranchos das estradas; que se acha, ora no mar, ora na terra, e mesmo às vezes por essesares",escreve Porto-Alegre. Os ambientes são variados. De início, Lavemo se apresenta como médico homeopata, idealizador de um Panteão Homeopático, receitando para todos os males a mesma poção feita de água e açúcar. O alvo seguinte da pena ácida do escritor, por meio de seu temível Lavemo, são os viajantes estrangeiros:"Eles dão a camisa do corpo para irem encaixar lá na estranja, que é raça descoberta por eles e então dão-lhe logo um nome esquisito, e escrevem trezentos volumes sobre o bicho e põem o mundo naturalista em uma revolução': nota o satirista. "Aestranja é a melhor panacéia conhecida neste país: chegado delas podes impunemente fazer o que quiseres:' Não é de hoje, então, o amor febril


Porto-Alegre e cena de A Lanterna Mágica: sátira ácida com espirito idealista

do Brasil pelo que vem de fora. Laverno vira, para tanto, o sr. Lavernoff. "Cá nesta terra, ninguém é o que é, mas o que apregoa ser", é a moral das histórias, pois "quem escuta a consciência fica com cara de tolo" e "neste mundo não há senão dois homens de bem: um é meu compadre e o outro meu compadre dirá quem é': Sua visão do Brasil é uma carta de Caminha do mau caráter: "Esta é a terra da promissão para os empreendedores e os atrevidos; e eu o quero ser, para não ficar a olhar ao sinal. Entre nós, cura quem nem é médico nem cirurgião; ensina quem não sabe da matéria; abre colégio quem da sua pátria para cá fugiu por ladrão': "A Lanterna Mágica é obra fundadora da sátira tropical, síntese da comédia urbana. Pretendida por seu autor como uma 'epopéia patriótica' de seu tempo, acaba sendo intemporal pela

atualidade de seus 'hérois sem éaráter', cujas atitudes, gestos e frases nada têm de datados, mas que se revelam como retratos trans-históricos da vida moderna', observa a pesquisadora. "Sob roupas de sua época, os personagens são de todas as épocas, sobretudo nesta terra em que, como escreveu Porto-Alegre, 'andam mais de mil arlequins, vestidos de retalhos de todas as cores e formas, passando por homens superiores:' Abismo - Daí, é claro, uma passagem rápida da dupla pela política, cuja lição é sustentar quem está no poder até se perceber que está para cair, momento de dar no pé, pois, "logo que sentirmos cheiro de defunto, dar-lhe-emos um tremendo empurrão, que o precipite no abismo': Pois "o mundo é de quem mais pilha e a moral do século, a moral de todos os séculos, é obter, não importam os meios': E mais: "Em política,

tudo se prova por ambos os lados: se o empregado é inteligente, probo, ativo ...vai-se pelo artigo do Alcorão: não é de minha confiança; se ele não presta, mas tem padrinho, diz-se que é de minha confiança; e prova-se que ele é o autor de uma gramática sânscrita que há aí à venda': Após passar por cantora de ópera, a sra. Lavernelli, educador e, entre outros tipos, romancista, a saga de Laverno e Belchior se interrompe e o escroque vai ser primadona nos teatros do Norte do Brasil. "Porto-Alegre tinha um temperamento polêmico, enfrentou descaso pelo seu trabalho e foi muitas vezes tratado como um estrangeiro em seu país, por causa de suas posturas francas, propostas inovadoras e idéias, então impossíveis de serem acatadas ou postas em prática', conta Heliana. "Fez inimigos e, quando as portas se fecham para ele, da academia às outras instâncias, ele deixa o país definitivamente em 1859, 'como diplomata errante e sem vintém':' Curiosamente, ele e Daumier morrem em 1879, ambos pobres e esquecidos, um em Paris, outro em Lisboa. Como poucos, tiveram "narizes" hábeis o bastante para cheirar o que havia de podre no ar das metrópoles em modernização, cada um a sua maneira, mas de forma análoga. Ou, nas sábias palavras de Laverno: "Um grande escritor cômico foi acusado de furtos literários. A tais acusações respondeu o homem que, onde quer que achava uma boa cena, a tinha logo por sua. Digo eu também que onde quer que me deparo com uma boa idéia a tenho logo por minha". • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 87


• HUMANIDADES

HOMENAGEM

o ~

~va nguarda

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Cl

da poesia

Poeta, crítico e ensaísta, além de tradutor brilhante, Haroldo de Campos não cabia dentro de rótulos

Campos: semântico, retórica e sonoro

oiobservando a "dura poesia concreta" das esquinas de São Paulo que um grupo de jovens poetas decidiu que era hora de deixar de lado "lamúrias 'pessoais e demagógicas" que, segundo eles, infestavam a poesia da geração moderna de 1945 e fazer a cultura entrar no novo ritmo do mundo. Bastava mesmo olhar para os lados e perceber que o país mudara, mas poucos se deram a esse trabalho: já se falava em uma nova capital e o presidente apregoava as virtudes do desenvolvimentismo. À poesia daquele tempo cabia falar sobre aquele momento. Um desses jovens visionários foi Haroldo de Campos, morto dia 16 de agosto, aos 73 anos. Podia-se gostar dele ou detestá-lo (não havia meio-termo e ele sabia disso), mas ninguém pode se dar ao luxo de ignorar a sua importância como poeta, crítico, ensaísta e, nos últimos anos, longe da polêmica e perto da academia, um tradutor brilhante. Haroldo nasceu em São Paulo em 1929 e formou-se em direito pela Universidade de São Paulo (USP), em 1952. Quando saiu das arcadas, bem na tradição da escola, queria fazer poesia revolucionária. Ou, nas palavras dele e de seus colegas (o irmão Augusto e Décio Pignatari), "poe-

F

88 • SETEMBRO OE 2003 • PESQUISA FAPESP 91


51.1.

que lambe a hélios-sol (sem realeza)

53.1.

da gravidade inscrita no trajeto

2.

o rastro de rei-posto (subalterna) -

2.

dos corpos mais pesados do que o ar

3.

e depois newton vem: a maçã (reza

3.

por amor-atração sempre que o objeto

52.1.

a lenda) cai-lhe aos pés -

maga lanterna

2.

vermelha -

3.

pronto lhe ensina a lei (à queda interna)

54.1.

da alta rama e ao intelecto

se precipite e tombe sem cessar

2. 3.

seja aos maiores corpos a ordenar

Acima, trechos de A Máquina do Mundo Repensada (2000>; ao lado, poema de 1955/56: transcedência de épocas

o A

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lei universal seja aos mais pequenos

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sia de exportação", como os carros que Juscelino Kubitschek prometia aos brasileiros que faria aos milhares para os estrangeiros admirarem. O desejo de "exportação" fora herdado de Oswald de Andrade (1890-1954), o guru da nova geração poética, ao lado de Stéphane Mallarmé (1842-1898) e Ezra Pound (1885-1972).A primeira vez que o grupo de Haroldo falou em "concreto" foi durante o Festival de Música de Vanguarda do Teatro Arena, em 1955. No ano seguinte, a poesia, gráfica, ganhou exposição no Museu de Arte Moderna de São Paulo. O jovem poeta era radical nas suas declarações:"Toda poesia digna deste nome é concreta: de Homero a Dante, de Goethe a Pessoa. Mais especificamente, a poesia concreta representa o caso limite da poesia, no qual existe uma total sistematização de todos os níveis: semântico, sintático, retórico, sonoro - da palavra". Muitos chama-

a

9 o

ram tudo aquilo que se representava como o "avesso do avesso do avesso do avesso" de "mau gosto, mau gosto': A música popular brasileira (MPB), aliás, se alimentou muito das idéias de Haroldo, de Caetano Velosoa Gilberto Gil, que cultuavam o poeta e ensaísta em suas letras e declarações.

Poemas barrocos - Nessa transcendência de épocas, Haroldo buscou no passado formas antigas para revisitar e "transcriar": em 1963, por exemplo, criou suas Galáxias a partir de poemas barrocos. Da mesma forma, como ensaísta, resgatou o obscuro poeta Sousândrade (1833-1902) e o elevou à categoria de gênio. Por essas e outras, teve

boas polêmicas com gente da estatura de Antonio Candido. Sempre com elegância e sabedoria. Mesmo quando não aceitavam as suas "transcriações', forma como entendia o processo de tradução, aplicado a Pound, Goethe, Dante, Ioyce, entre outros, em que o poeta moderno intervinha no texto do antigo para trazer seu texto ao momento presente. Em 2000, Haroldo lançou A Máquina do Mundo Repensada (editora Ateliê). "É um poema cósmico, todo feito em rima dantesca, que mostra Haroldo de Campos não só como um grande poeta, mas alguém que não cabe dentro de rótulos': diz Leda Tenório da Motta, crítica literária, tradutora e professora da PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo. Sua poesia tornou-se cada vez mais filosófica.Em 2002 encerrou a tradução da Ilíada, de Homero, fruto de dez anos de trabalho. No fim, vanguarda e berço da poesia se encontraram e reconciliaram. De forma bem concreta. • PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 89


• HUMANIDADES ARQUITETURA

ma tese de doutorado defendida em fevereiro na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP) substitui conclusões definitivas e potencialmente redutoras por referências para uma reflexão sobre a trajetória de Lúcio Costa. Defendida por Marcos José Carrilho a tese Lúcio Costa Patrimônio Histórico e Arquitetura Moderna parte de uma hipótese até mesmo conhecida, a de que a essência da arquitetura moderna brasileira reside na associação entre vanguarda e tradição, para ampliar as bases de análise do legado do pai da arquitetura moderna e do patrimônio histórico nacionais. Carrilho foi orientado pelo professor Nestor Goulart Reis Filho, também da FAU, e participou de um projeto de auxílio à pesquisa de Goulart sobre Lúcio Costa. Formado em arquitetura em Curitiba, Carrilho mudou-se para São Paulo em 1982, após ser aprovado em um concurso do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat). Era inevitável deparar-se com a figura de Lúcio Costa, fundador do Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (atual Iphan) ao lado de Rodrigo Mello de Franco Andrade, nos anos 30. "Além da admiração por Lúcio Costa, sempre senti certa identificação com ele, pois, como arquiteto, divido-me entre as propostas construtivas da arquitetura contemporânea e a preocupação com o patrimônio histórico", diz o pesquisador. Sua pesquisa aborda desde o surgimento da vocação vanguardista brasileira, com a Semana de Arte Moderna de 22, até o ápice expressivo da arquitetura moderna, com o traçado original que Lúcio Costa fez para Brasília. Carrilho ressalta o caráter paradoxal dos modernistas brasileiros, em que tradição e ruptura se misturam. E aponta a permanência desse paradoxo nos anos 30 e 40, quando a produção intelectual brasileira produziu sob a tutela de um Estado conservador. De acordo com o pesquisador, as afinidades de Lúcio Costa com o regime de Getúlio Vargas o levaram a analisar vanguardas que também se aproximaram de idéias políticas conservadoras: o Racionalismo Italiano e a Vanguarda Russa. "Ao nos compararmos com movimentos como aqueles, percebemos que não foi só o modernismo brasileiro que trabalhou na busca de uma referência histórica", diz Carrilho. Pois foi na pesquisa do passado que Lúcio Costa se baseou para criar algo tão original para o seu tempo. A tese de Carrilho aborda três aspectos do legado do arquiteto: a produção teórica, o patrimônio histórico e sua obra arquitetôni-

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Memória do novo Tese analisa conceitos de patrimônio histórico de Lúcio Costa RENATA SARAIVA

90 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91


Fachada do Palácio Capanema, no Rio de Janeiro: Lúcio Costa incentivou governo a trazer Le Corbusier

ca propriamente dita. "A obra de Lúcio Costa é relativamente pequena e já foi bastante analisada, então procurei encontrar características que ainda não tinham sido notadas", afirma o pesquisador. Se no campo teórico Lúcio Costa contribuiu muito para a história da arte brasileira, foi no patrimônio histórico . que ele deixou pensamentos-chave para muito do que se pensa sobre conservação hoje. "Seu interesse pelo patrimônio nasceu cedo. Um momento especial desse processo foi em 1926, quando visitou Diamantina", conta Carrilho. "Costa encontrou uma cidade completamente intacta e aquilo foi muito importante para o trabalho de patrimônio que desenvolveu depois." Também os primeiros projetos arquitetônicosestavam, a seu modo, baseados na pesquisa do passado colonial brasileiro."Desde que se formou na Escola Nacional de Belas Artes, do Rio, Costa desenvolveudiversos projetos de cunho historicista, principalmente neocoloniais.Era a forma que ele encontrava pa-

ra pesquisar', diz. ''Alguns chegaram a ser premiados, como o da Embaixada da Argentina:' O momento de transformação de todo esse resgate para aquilo que se chamaria de arquitetura moderna brasileira, na opinião do pesquisador, pode ser atribuído, no campo das idéias, ao período em que Lúcio Costa foi diretor da Escola Nacional de Belas Artes, a mesma em que se formara. "Costa promoveu profundas alterações na orientação da escola, enfatizando o enfoque técnico e científico", conta. "Para ele o ensino artístico deveria reforçar a harmonia entre projeto e construção. A história da arquitetura deveria ser estudada criticamente ao invés de ser aplicada diretamente no projeto." No campo da construção, o mesmo divisor de águas pode ser atribuído ao Palácio Gustavo Capanema, sede do antigo Ministério da Educação e Saúde Pública, no Rio, o qual, em breve, pode ser o primeiro prédio brasileiro a receber o título de patrimônio da humanidade pela Unesco. Costa incentivou o gover-

no brasileiro a trazer Le Corbusier para desenvolver o projeto. Embora o mestre franco-suíço tenha feito o primeiro croqui, o projeto executado teve autoria de uma equipe brasileira, entre eles Costa e Oscar Niemeyer. ara Marcos Carrilho, o Ministério da Educação foi a síntese mais madura das concepções de Lúcio Costa, as quais já tinham sido expressas em projetos como o da Vila Monlevade, de 1934. Nesse projeto, realizado para um concurso promovido pela Companhia Belgo-Mineira, mas nunca construí do, Lúcio Costa formulou uma de suas propostas mais arrojadas da associação dos procedimentos construtivos tradicionais com as fórmulas da arquitetura moderna: a construção de urna casa da pau-a-pique (herança de nosso passado colonial e interiorano) sobre uma plataforma de concreto armado. "O projeto fala por si, mas uma análise mais atenta do memorial descritivo

P

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 91


Museu de São Miguel das Missões: trabalho eclético do arquiteto se deu na construção de colunas sobre os restos das antigas missões

me fez perceber que a equação tradição/ruptura não era tão simples quanto todo mundo sempre evocou: Lúcio Costa influenciado por Le Corbusier e resgatando o passado colonial brasileiro", diz Carrilho. "Há menções a arquitetos de origem anglo-saxã, o que nos mostra um repertório bastante rico", explica o pesquisador. A complexidade da obra construtiva de Lúcio Costa está também no Museu de São Miguel das Missões, em que o trabalho eclético do arquiteto com o profissional do patrimônio histórico se materializou na construção de colunas sobre resquícios das antigas missões do Rio Grande do Sul. Ligadas por paredes de vidros, elas sugerem a construção de um museu que, ao mesmo tempo que conserva e abriga a memória do local, não se impõe como um elemento invasivo na história das missões. "Além disso, o museu foi construído em um local que permite, para quem está em seu interior, reconstituir, na imaginação, o plano urbanístico das edificações originais", conta Carrilho. "Lúcio Costa é um arquiteto que consegue, com um projeto, sugerir todo o traçado urbanístico do entorno." Foi assim que, nos anos 40, ele foi chamado pelos herdeiros de Eduardo Guinle para construir, no Rio, um grupo de prédios em torno da velha mansão sem a descaracterizar. A análise de Carrilho sugere diversas evocações do passado nacional na obra de Lúcio Costa. "Até mesmo o traçado de Brasília, possivelmente o desenho mais famoso dele, pode ser interpretado como uma remissão à primeira missa dos portugueses em solo brasileiro, uma vez que o desenho tem a forma de uma cruz." •

o PROJETO Lúcio Costa e as Origens da Arquitetura Moderna e do Patrimônio Histórico MODALIDADE Linha regular

de auxílio à pesquisa

COORDENADOR

N ESTaR GOULART FAU/USP

Interior da mansão de Eduardo Guinle, no Parque Guinle: capacidade de reunir o novo e o antigo 92 . SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91

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••••

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Ministério do Trabalho e Emprego


Cultura letrada no Brasil Colônia Trabalho de pesquisadora contribui para a história da leitura MARIA ZILDA FERREIRA CURY

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Os Caminhos dos Livros

uma linguagem agradável e fluente. A primeira parte - O Márcia Abreu fui ter com o anjo, Trânsito das Letras - nos leva para o conhecimento do condizendo-lhe que me trole dos "passes" dos livros desse o livro. E ele Mercado de Letrasl disse-me: Toma o livro, e da Europa para o Brasil e dos FAPESP/ALB OSWIIlaos devora-o; e ele fará amarcaminhos da censura. A auDOS lIVROS 384 páginas gar o teu ventre, mas na tora se dedica, a seguir, a um R$ 42,00 levantamento das obras solitua boca será doce como mel... citadas e submetidas à censuPois saibam os leitores ra portuguesa entre 1769 e que livros também se co1807 que viriam para o Rio. mem, como nos diz o treA conclusão a que se chega, cho acima, tirado ao Apocalipse de São João. A imna contramão do que se afirmava nos livros sobre a portância conferida à leitura do texto sagrado indigência cultural do Brasil Colônia, é que os haombreia-se à da assimilação adequada da palavra bitantes do Rio, nos finais do século 18 e primeiras de Deus e à predestinação daquele escolhido para décadas do 19, não estavam excluídos do universo anunciar os juízos divinos. Há, pois, que se ler bem das belas letras. Mas quem eram esses leitores? Pase há que se dar o livro a gente escolhida. O sistema sa-se, então, pelas relações de livros constantes dos social percorre e contamina todo o processamento inventários e dos livros de contas de livrarias, pelas da comunicação letrada, desde a natureza mesma bibliotecas dos padres e até por relações de vendeda própria linguagem, que é social, até os limites de dores não formais e por lugares inesperados como interpretação e réplica dos leitores em determinaarmazéns e farmácias. da época, em determinadas condições políticoA segunda parte do livro - Julgar e Sentir - coeconômicas, sob determinadas restrições ideológiloca o leitor na rota de como se lia à época, através cas. Ao ler, um indivíduo ativa seu lugar social, suas dos textos que postulavam uma preceptiva, indicavivências, sua biblioteca interna, suas relações com ções sobre a correta maneira de ler e sobre o que se o outro, os valores de sua comunidade. E por isso supunha ser um bom livro, com o objetivo de traexiste o controle exercido pela sociedade sobre o çar o perfil deste leitor tão distanciado no tempo. ato de ler, manifesto de formas diversas. Os espaços Chega-se, assim, ao leitor carioca do período que, de circulação do livro já determinam uma forma muitas vezes, lia insurgindo-se contra a lista dos de exclusão. "recomendados", já que se dedicava aos romances. Os Caminhos dos Livros traçados por Márcia Debruçar-se sobre o que lia o carioca leva-nos ao Abreu colocam o leitor diante de material de pesúltimo capítulo do livro, A Leitura do Romance, com quisa surpreendente. O mapa a ser percorrido tem direito aos argumentos pró e contra o gênero e ao como ponto de partida, como nos diz a própria auestudo dos processos de sedução do leitor. tora, uma desconfiança. Toma duas referências: os Esta deliciosa viagem pelos caminhos dos livros textos de viajantes queixosos de que aqui não havia proposta pelo brilhante texto de Márcia Abreu, leitores, de que não circulavam livros nos primeiros além da disponibilização de farto material de pesséculos do Brasil colonial e os milhares de pedidos quisa, contribui de modo extraordinário para a hisde autorização para envio de material impresso tória da leitura e de seus mecanismos de circulação, constantes do Catálogo para exame dos livros para fornecendo uma visão nova sobre a cultura letrada saírem do reino com destino ao Brasil. "Se aquelas no Brasil Colônia. pessoas não liam, por que buscavam tão assiduamente os censores a fim de obter permissão para ter perto de si alguns livros?': é a pergunta que põe em MARIA ZILDA FERRElRA CURYé professora titular de Teomarcha a pesquisa e que serve de guia ao leitor por ria da Literatura da UFMG, onde coordena o Prograum caminho calçado em pesquisa de fontes e levantamento rigoroso de referencial teórico, com ma de Pós-graduação em Estudos Literários.

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94 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91


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LIVROS

o Filósofo

e sua História: Uma Homenagem a Oswaldo Porchat

Amor, Desejo e Poder na Antigüidade: Relações de Gênero e Representações do Feminino

M ichael Wrigley e Plínio J. Smith Coleção CLE/FAPESP 525 páginas I R$ 50,00

Pedro Paulo Funari, Lourdes Conde Feitosa e GlaydsonJosé da Silva Editora UNICAMP 390 páginas I R$ 59,00

Organizado pelo Centro de Lógica e Epistemologia e História da Ciência, da Unicamp, o volume traz uma série de artigos para homenagear o filósofo e fundador do Centro de Lógica e Epistemologia (CLE), em 1977, e foi responsável pela implementação do programa de pós-graduação em filosofia na mesma universidade. Entre os vários artigos: "Descartes Cético", "Leibniz", "Liberdade e os Possíveis".

Não contente em mirar apenas os exemplos das mulheres de Atenas, os pesquisadores deste volume reuniram-se para analisar como se davam as relações de gênero na Grécia, no Oriente e em Roma. O resultado é um painel fascinante de damas e de como funcionava o feminino e o masculino no mundo antigo.

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A Loucura de Isabella e Outras Comédias da Commedia dell'Arte

UMA SÃo PAULO ALEMÃ: \"""'Q""ti.lia,u&..to.~_,,,,,,,,,,,,,,,, ""R.p.to~(lm·ln9l

Roberta Barni (tradução e notas) I1uminuras I FAPESP 416 páginas I R$ 43,00 A pesquisadora apresenta traduções críticas de textos de Flaminio Scala, um conhecido ator, diretor e autor do século 17 e um mestre da chamada commedia dell' arte, que, fugindo das convenções clássicas do teatro, trazia enredos dos mais rocambolescos, cheios de improvisações, piadas de gosto popular e muita comédia física. A Scala devemos a primazia na impressão desses improvisos, o que faz do livro um documento. Editora Iluminuras: tel: (11) 3068-9433 fax: (Ll ) 3082-5317 www.iluminuras.com.brouiluminuras@iluminuras.com.br

Uma São Paulo Alemã: Vida Quotidiana dos Imigrantes Germânicos na Região da Capital (1827-1889) Silvia Cristina Lambert Siriani Imprensa Oficial I FAPESP 327 páginas I R$ 37,00

Parte integrante de uma grande pesquisa sobre os vários grupos migratórios, que teve financiamento da FAPESP, este texto traz um registro da chegada dos alemães a São Paulo durante o século 19. O ponto importante é a verificação da onda migratória germânica, que foi fundamental para a concepção urbana da cidade, de sua indústria e comércio. Imprensa Oficial: tel: n n 6099-9800 - www.imprensaoficial.com.br ou divulgacaoeditoriais@imprensaoficial.com.br

Natureza, Conservação e Cultura: Ensaio sobre a Relação do Homem com a Natureza no Brasil

A Jornada e a Clausura Raquel de Almeida Prado Ateliê Editorial 245 páginas I R$ 28,00

Evaristo Eduardo de Miranda Metalivros 178 páginas I R$ 96,00

O romance representou a vitória, na arte, do individualismo burguês, como o veículo privilegiado de suas tristezas, amores e alegrias. O estudo de Raquel de Almeida Prado faz uma análise de como se configurou essa estrutura dentro do romance filosófico francês do século 18. Já fomos muito apresentados ao modelo inglês e daí a novidade da tese da pesquisadora, baseada no estudo de quatro obras de Rousseau e Diderot, revelando as suas peculiaridades.

Um belo livro em vários sentidos, de seu conteúdo, preciso, à sua apresentação, primorosa, com fotos de Adriano Gambarini. O estudo mostra como se deu, ao longo da história, a relação do homem com a natureza no Brasil, com o diferencial marcante do país que era uma colônia de exploração. O pesquisador mostra as várias etapas de como surgiu a cultura da devastação pelo lucro e quais as conseqüências que ainda permanecem.

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PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 95


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e trabalhos

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realizados no InCor-HCFMUSP.

INSCRiÇÕES. Os trabalhos deverão ser inscritos entre os dias 01 de abril de 2003 e 15 de outubro de 2003. Para mais informações, consulte o site

www.zerbini.org.br ou retire o regulamento na: Fundação Zerbini, Av. Brig. Faria Lima, 1884 - 2º ando - Edif. Cal Center São Paulo-SP - Tel.: (Oxx11) 3038-5300.

CIÊNCIA

E HUMANISMO

PESQUISA FAPESP 91 • SETEMBRO DE 2003 • 97


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98 • SETEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 91


INFORME PUBLICITÁRIO

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OS-GRADU ENFATIZA

QUALIDA o

Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento é o centro de Pesquisa da Universidade do Vale do Paraíba. A Univap está localizada em São José dos Campos, situada no eixo que une as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. O IP&D é composto por duas sedes e pelos Laboratórios Associados que abrigam os Grupos de Pesquisas e Desenvolvimento, atualmente 32, dos quais 25 incluídos

no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. Estes Grupos congregam 97 doutores em regime de tempo integral, diversos mestres em fase final de doutoramento, técnicos, bolsistas de Iniciação Científica, além de mais de 300 alunos de pósgraduação matriculados nos Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu da Univap, todos recomendados pela CAPES. A

participação do IP&D no Diretório de Grupos Nacional tem sido expressiva, na sua última versão a Univap aparece em 10 lugar na área de Engenharia Biomédica no Brasil. A estrutura de pesquisa da Univap está organizada em quatro grandes áreas: Ciências Biomédicas, Planejamento Urbano e Regional, Ciências Exatas e Ciências Humanas.

OS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO o

estabelecimento de Programas de PG, associados com a implantação de laboratórios de pesquisa e uma política de agregação de pesquisadores em tempo integral, têm produzido bons resultados. Na última avaliação pelas Comissões e ratificada pelo CTC da. CAPES, todos os Programas foram recomendados novamente e um deles, o Programa de Pós-Graduação em Engenharia Biomédica, foi promovido do conceito 3 para conceito 4. · Engenharia Biomédica MestradolDoutorado · Bioengenbaria - Mestrado · Planejamento Urbano e Regional Mestrado · Ciências Biológicas - Mestrado · Engenharia Mecânica - Mestrado

APOIO CULTURAL:

COI -/ CONSULTÓRIOS OOONTOLOGlCOS INTEGRADOS

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Mestrado e Doutorado em Engenharia Biomédica enfocam os procedimentos de diagnóstico e terapia a laser, visando a utilização e desenvolvimento de novas técnicas para diagnóstico não-invasivo, de baixo custo e com alta especificidade. O Mestrado em Planejamento Urbano e Regional, constitui-se num dos poucos cursos existentes no Brasil voltados a essa temática, imprescindível para o desenvolvimento sustentado. O Mestrado em Bioengenharia tem enfoque profissionalizante. As disciplinas são oferecidas em blocos para possibilitar que profissionais liberais possam acompanhar o Programa. Este curso não requer dedicação integral. O Mestrado em Ciências Biológicas

COI Telefone: (41) 332-2024 Rua Baltazar Carrasco dos Reis, 2728 CEP: 80250-130 - Água Verde Curitiba - Paraná - Brasil Site: www.coi-pr.com.br E-mail: coi@vrs.com.br

fj

objetiva desenvolver no aluno uma visão integrada, multi e interdisciplinar das Ciências Biológicas, apoiada nas áreas de competência dos docentes! pesquisadores que integram o curso. O Mestrado em Engenharia Mecânica está concentrado nas áreas de materiais e ciências térmicas. As inscrições estão abertas e os documentos necessários podem ser obtidos no si te da Univap e enviados pela internet ou para o endereço: Av. Sbisbima Hifumi, 2911 Urbanova - 12244-000 S. J. dos Campos/SP, até 1 de fevereiro de 2004. Para mais informações: (12) 3947-1121 / 1129/1122 Site: www.univap.br

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ASTECHNOLOGY Telefone: 0800-7737030 e (12) 3929-5504 Fax: (12) 3929-3936 Rua Prof" Ana Izabel Barbosa, 207 CEP: 12223-180 - SJC - SP - Brasil Site: www.titaniumfix.com.br E-mail: ast@astechnology.com.br


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