CiĂŞncia e Tecnologia
e no Brasil
Para organizações complexas, tecnologia de ponta. InfoCluster. Tecnologia cluster de alto desempenho com plataforma Intel® e arquitetura de 32 ou 64 bits.
Do trabalho conjunto entre a Itautec e a Escola Politécnica de São Paulo nasce o InfoCluster: primeiro supercomputador brasileiro. Com capacidade mil vezes superior à do primeiro rcomputador do mundo, o Itautec InfoCluster baseado no processador Intel® ltanium" 2 uma incrível capacidade de processamento de informações. Capaz de realizar de cálculos por segundo, é uma ferramenta importantíssima para a pesquisa ca, cálculos de operações financeiras, previsão do tempo e até localização de petróleo. ltautec InfoCluster com processador Intel®ltanlum" 2. mputador que colocou a Itautec e o Brasil no topo do mundo da tecnologia.
• Pesql!!,a
Ciência e Tecnologia no Brasil www.revistapesquisa.fapesp.br
SEÇÕES
REPORTAGENS
CARTAS ..•..••......•......•..•..•
5
CARTA DO EDITOR ..•..•..•..•..•...•
7
MEMÓRIA
8
Há 40 anos, era criado o Cenpes, especializado em pesquisas sobre petróleo
CAPA Ao contrário
dos europeus
10 10 11 11 11
AVANÇADA
Tidia inicia análise de projetos de rede óptica,
o Brasil tinha sociedades complexas antes da chegada
ESTRATÉGIAS A República Tcheca no clube das células-tronco Quando Einstein enfrentou Britney A onda dos espiões de laboratório Parceria contra os flagelos africanos A mobilidade dos cérebros europeus
INTERNET do que se dizia,
82
incubadora de conteúdos e aprendizado eletrônico
.....
28
GOVERNO FEDERAL
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
Presidente
Lula reinstala
Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia
ESPAÇO
31
~--~-'~~mn~--~z CIÊNCIA
~ ~ ~ w
GENÉTICA
"
"
,------------------,~
Ê o
:i!
~
África e Índia duelam por instituto Teller: a ciência dos artefatos mortais Ciência na web Conselheiros com biografias notáveis Diversidade no Fórum da Anpocs Dinheiro para o software livre Sem fronteiras para a biodiversidade Um edita I em que as exatas não entram Saídas para o desenvolvimento O BN DES entra no jogo Ferramenta que integra o Nordeste O sonho começa a sair do papel Retomada de importações
12 12 12 13 13 13 14 14 14 14 15 15 15
Plano de revisão do programa espacial valoriza o diálogo
POLÍTICAS
Destaque na Nature Genetics,
16
com universidades
trabalho de grupo paulista leva à identificação de quase 14 mil genes
PÚBLICAS
do Schistosoma mansoni
Projeto de recuperação de
.....
36
matas ciliares preserva sistema hídrico em São Paulo
22
MICROBIOLOGIA Análise de genes ajuda a
EDUCAÇÃO
entender mecanismos de adaptação
Endeavor, Sebrae-SP e FAPESP
da bactéria
firmam parceria inovadora
...
26
violaceum
Chromobacterium 42
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 3
---------------'---'-
Pesquisa FAPESP
Ciência e Tecnologia no Brasil
-------"-----------------------
REPORTAGENS
SEÇÕES LABORATÓRIO
SAÚDE PÚBLICA
Mais verde, menos estresse O protozoário mutante O cigarro, o DNA e o câncer de pulmão O mapa da gravidade na Terra Pequenos tremores, grandes estragos O gene sexual das abelhas
Cresce o número de moradores das grandes cidades que aderem à atividade física moderada ...
32 32 32 33 33 33
ENGENHARIA
DE MATERIAIS
44
GEOLOGIA A erosão e o recuo do mar redesenham o litoral brasileiro
46
AMBIENTE
Grupos do Ipen e da USP desenvolvem coração do sensor de oxigênio, peça importada pelo Brasil 74
Remédios provocam quedas de idosos Escova de baixo custo aprovada A análise de genes do eucalipto A poluição na gênese dos raios Os vermes persistentes
34 34 34 35 35
Coletor desenvolvido na Unesp registra volume de chuvas, data e horário em que ocorreram
SCIELO NOTícIAS
58
CRIAÇÃO
LINHA DE PRODUÇÃO Interferências na formação de cristais Receptor capta sinais múltiplos Investimento em tecnologia sem fio Laser quebra barreira do quilowatt Embalagens transformadas
62 62 62 63 63
METEOROLOGIA
Excesso de prédios e escassez de áreas verdes fazem a temperatura em São Paulo variar até 10 graus no mesmo momento ....
77
ANIMAL
Cultivo em água doce e pesquisa genética fortalecem a produção do camarão marinho 78
HUMANIDADES 52
LITERATURA
TECNOLOGIA ENERGIA
Gaúchos ganham parque tecnológico Informação sobre o câncer nas escolas Alunos criam robô para detectar bomba Recuperação de águas contaminadas Empresa fecha contrato no Havaí Patentes
63 64 64 64 65 65
RESENHA
94
Imigrantes Judeus do Oriente Médio São Paulo e Rio de Janeiro, de Rachei Mizrahi
LANÇAMENTOS
95
CLASSIFICADOS
96
ARTE FINAL
98
4 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
Pequena empresa faz ajustes finais em célula a combustível que será entregue à Eletropaulo
Estudo póstumo de Roberto Ventura sobre Euclides da Cunha dá visão psicanalítica do escritor ..... 66
Ônibus produzido em São Bernardo, com tração elétrica e motor a diesel, ganha destaque internacional
ARQUITETURA Livro analisa espaço e estilo dos cemitérios
TRANSPORTE
71
88
Capa: Hélio de Almeida Foto: Carlos Fausto/Museu
92
Nacional
cartas@fapesp.br
Ainda a matemática
Revista
Fiquei apavorado com a reação de dois colegas ao artigo sobre o prêmio Abel na seção Cartas de Pesquisa FAPESP (edição nO91). Parece óbvio que o jornalista está enunciando uma situação bastante objetiva: sendo a matemática uma forma de conhecimento altamente abstrata e com uma interação com o cotidiano nem sempre óbvia, pode ser difícilque ela mexa com o imaginário das pessoas com o mesmo impacto que assuntos como paz, economia, medicina etc., que emprestam ao Nobel um glamour só comparável alguns grandes eventos do mundo "profano" (cinema ou moda, por exemplo). Isto não significa desprezar o valor da matemática, nem muito menos da ciência em geral. Além disso, não sei a que tipo de preconceito os autores se referem. A maioria das pessoas, cientistas ou não, tem uma certa veneração pela matemática, à que consideram produto de mentes inteligentes e altruístas. Pelo contrário, eu acho que cartas como essas (que não devem nada aos manifestos do Ku Klux Klan) contribuem sim para criar preconceito nos leitores, inclusive nos que têm contato com o mundo matemático. Lendo essas queixas, pessoas desinformadas poderiam pensar que o protótipo do matemático é Iohn Forbes Nash. Aliás, ser parecido a Nash não seria tão ruim: foi um dos poucos matemáticos a ganhar um Nobel e quem sabe ainda não ganhe o Abel.
Volto a escrever para a Pesquisa FAPESP pois, a cada número, mais me encanta a qualidade editorial e gráfica desta revista. A abrangência temática e seriedade jornalística tornam sua leitura obrigatória e gratificante. Fantástico o trabalho de sua equipe de fotógrafos, ressaltando a foto que abre a reportagem "Imagem ampliada", de Eduardo Cesar (edição nO88), uma autêntica obra de arte. Parabéns também a Carlos Henrique Fioravanti e Marcos Pivetta pelos prêmios de reportagem sobre biodiversidade da Mata Atlântica. Nosso meio ambiente precisa de profissionais desse quilate. Continuem surpreendendo e eu continuarei me sentindo na obrigação de escrever agradecendo e elogiando.
CARLOS ALBERTO LUNGARZO
Centro de Lógica/Unicamp Campinas, SP
Ensino médio Li com interesse a reportagem "Portas abertas" (edição nv 90) sobre o programa do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP). A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) também tem um programa para estu-
dantes do ensino médio intitulado Ciência & Arte nas Férias. O programa, organizado pela Pró-Reitoria de Pesquisa da universidade, recebeu em sua primeira edição, realizada em janeiro deste ano, 33 estudantes de escolas públicas. Os estudantes foram recebidos em laboratórios de pesquisa da universidade, onde desenvolveram projetos individuais durante todo o mês de janeiro. Os trabalhos foram expostos na forma de pôster. Estamos ampliando o programa e, em janeiro de 2004, planejamos receber cem estudantes. Atualmente estamos na fase de submissão de projetos pelos docentes da Unicamp. Ioss ROBERTO DE F. ARRUDA Comissão organizadora do programa "Ciência & Arte nas Férias" Campinas, SP
JOÃo ROBERTO LAQUE
São Paulo, SP Gostaria de continuar a receber regulamente a revista Pesquisa FAPESP. Esclareço que recebi mensalmente esta estimulante e orientadora publicação em 2000, 2001 e 2002 até que fui transferido de unidade prisional. Encontro-me em reclusão, em regime fechado. Desenvolvo pesquisas de caráter pessoal nas áreas de literatura e organização e métodos em penitenciárias. EDUARDO
Texto e foto
ISAAC MANZINO
ISRAEL
Dracena, SP
A revista está cada vez melhor. Mas há um problema, fácil de resolver. Exemplos: a excelente reportagem "Os olhos do deserto" (página 35, edição nv 90) e "Adubo Natural". (páginas 68 e 69, edição nv 90). Seguinte: texto sobre foto é um horror. Difícil de ler. Até que fica bonitinho, mas ... primeiro a informação, depois o enfeite, que é importante, claro. Parabéns. LUIZ ALBERTO DE LIMA NASSIF
São Paulo, SP
Omissão A matéria "A micose da terra" (edição n° 89) inexplicavelmente omitiu os nomes de Edecio Cunha Neto e Jorge Kalil, os "pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP': responsáveis pela predição e identificação dos peptídeos promíscuos da gp43 do Paracoccidioides brasiliensis em pacientes apresentadas na mesma matéria. Este assunto é alvo do auxílio FAPESP nv 00/008404-3, coordenado PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 5
pelo dr. Edecio Cunha Neto. O Laboratório
de Imunologia
disciplina
de Imunologia
Clínica
e
Alergia estão entre os poucos centros brasileiros ficação
especializados
e análise
gênicos,
na identi-
de peptídeos
com atuação malária,
imunes As reportagens de Pesquisa FAPESP retratam a construção do conhecimento que será fundamental para o desenvolvimento do país. Acompanhe essa evolução sem perder nenhum movimento.
vatório
de
esquistosso-
Aids, doenças
CUNHA
NETO
JORGE KAUL
Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração Disciplina de Imunologia Clínica e Alergia-Faculdade de Medicina da USP. Instituto de Investigação em Imunologia/Institutos do Milênio São Paulo, SP
Sou leitora assídua da revista Pes-
i:
Ligue: u 3038-1434 Mande um fax: n 3038-1418 Ou envie um e-mail: fapesp@teletarget.com.br
i:
• Opiniões ou sugestões Envie cartas para a redação de Pesquisa FAPESP Rua Pio XI, 1.500 São Paulo, SP 05468-901 pelo fax (11) 3838-4181 ou pelo e-mail: cartas@fapesp.br
• Site da revista No endereço eletrônico www.revistapesquisa.fapesp.br você encontra todos os textos de Pesquisa FAPESP na íntegra e um arquivo com todas as edições da revista, incluindo os suplementos especiais. No site também estão disponíveis as reportagens em inglês e espanhol.
te, me surpreende veis assuntos
por tornar
acessí-
das mais diversas áreas.
Gostaria de sugerir um tema para reportagem: o destino de docentes/ pesquisadores
aposentados.
Para onde
vão esses indivíduos com grande experiência de vida e acúmulo de conhecimento?
Muitos
pesquisa
voluntária,
na própria
tituição
tomam
de origem,
engrandecendo
ainda mais sua trajetória
o rumo
da ins-
propicia
'saúde mental. nhecermos mo tempo,
a manutenção
da
Seria interessante
co-
mais sobre eles. Ao mespoderíamos
bre as políticas
refletir
so-
para essa parcela dos
docentes/pesquisadores,
que tende a
se tornar maior com a atual reforma da Previdência Social. MÁRCIA VALÉRIA
cacha-
demos a cachaça como uma das mais autênticas expressões da cultura brasileira nhecer
e nos empenhamos profundamente
principalmente
em coo produto,
suas características
técnico-científicas,
as quais procura-
mos passar para os nossos clientes. ANTONIO
GILLET E CATARINA LAMARCA
Rio de Janeiro, RJ
R. SCOGNAMILLO
interrom-
33, edição nv 91), di-
ferentemente
do que foi publicado,
a tuberculose
é causada
pela bacté-
Mycobacterium tuberculosis, não Mycoplasma tuberculosis.
ria
e
Na reportagem Universo" (edição
"O lado escuro do nv 91), a matéria
escura responderia
por 90% de toda - e não 85%,
a massa do Universo como foi publicado quantidade centrada
-, o equivalen-
de matéria em planetas,
Laurabeatriz
con-
No mapa do pôster que acompanha a edição n= 91, Jaboticabal
apa-
rece duas vezes - a cidade a nordeste do Estado Franca, aparece
SP
comum
estrelas e nu-
vens de gás.
de São Paulo, próxima
corresponde
São Joaquim
SZABO
Jaboticabal-
Na nota "Tratamento pido" (página
te a nove vezes - e não seis vezes - a
e fazendo jus
ao fato de que a persistência da atividade profissional em indivíduos maduros
engenhei-
de uma loja (não
Correções
Aposentados
quisa FAPESP, que, freqüentemen-
• Assinaturas, renovação e mudança de endereço
Somos
ça, no Rio de Janeiro, bairro do Leblon, chamada Garapa Doida. Ven-
• Números atrasados Preço atual de capa da revista acrescido do valor de postagem. Tel. <ll) 3038-1438
Nacional.
ros e proprietários
um bar) que vende somente
auto-
oculares e neurológicas. EDECIO
Lemos o artigo "Cachaça sem Mistério" (edição nv 87), fornecida por um amigo astro físico do Obser-
anti-
na doença
Chagas, febre reumática, mose,
Cachaça
do Incor e a
realidade,
na verdade
a a
da Barra. A cidade que
com o nome Penápolis;
de Lins é, na Lins encontra-
se a cerca de 50 quilômetros antes de Penápolis para quem vai da capital para o interior
pela rodovia
Mare-
chal Rondon.
• Para anunciar Ligue para: Nominal Propaganda e Representação: tel. 5573-3095
Parabéns belos
desenhos
a Laurabeatriz
pelos
que enriquecem
a
revista Pesquisa FAPESP.
o e-mail cartas@fapesp.br, pelo fax (Ll) 3838-4181 ou para a Rua Pio XI, 1.500, São Paulo, SP,
LAVRO VARGAS
Maringá, PR 6 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
Cartas para esta revista devem ser enviadas para
CEP 05468-901. As cartas poderão ser resumidas por motivo de espaço e clareza.
CARTA
Pesquisa
De indígenas e de imaginação
FAPESP CARLOS VOGT PRESIDENTE PAULO
EDUAROO DE ABREU VleE-PRESIDENTE
MACHADO
CONSELHO SUPERIOR AOILSON AVANSI DE ABREU, ALAIN FLORENT STEMPFER, CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ, CARLOS VOGT, FERNANOOVASCO LEÇA 00 NASCIMENTO, HERMANN WEVER, JOSÉ JOBSON DE ANORAOE ARRUOA, MARCOS MACARI, NILSON DIAS VIEIRA JUNIOR, PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO, RI CARDO RENZO BRENTANI, VAHAN AGOPYAN CONSELHO TÉCNICO-AOMINISTRATIVO FRANCISCO ROMEU LANOI DIRETOR PRESIDENTE JOAQUIM J. OE CAMARGO ENGLER DIRETOR ADMINISTRATIVO JOSÉ FERNANOO PEREZ DIRETOR CIENTíFICO PESQUISA
FAPESP
CONSELHO EDITORIAL LUIZ HENRIQUE LOPES DOS SANTOS (COOaOENADORCIENTIF1CO), EDGAR OUTRA ZANOTTO, FRANCISCO ANTONIO BEZERRA COUTlNHO, FRANCISCO ROMEU LANOI, JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLER, JOSÉ FERNANOO PEREZ, LUIZ EUGÉNIO ARAUJO DE MORAES MELLO, PAULA MONTERO, WALTER COLLI DIRETORA DE REDAÇÃO MARILUCE MOURA EDITOR CHEFE NELOSON MARCOLlN EOITORAS~NIOR OA GRAÇA MASCARENHAS
MARIA
DIRETOR DE ARTE HÉLIO DE ALMEIOA CARLOS
EDITORES FIORAVANTI (C]!,,"), CLAUDIA OLIVEIRA mCIiOlOGIA), HEITOR
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MARCOS DE
REPÓRTER MARCOS
TÂNIA
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CHEFE DE ARTE MARIA DOS SANTOS DIAGRAMAÇAo MEOOA, LUCIANA
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Osartigos assinados não refletem necessariamente a opinião da FAPESP É PROIBIOA DE TEXTOS
FUNDAÇÃO
A REPRODUÇÃO
TOTAL
E FOTOS SEM PRÉVIA
DE AMPARO
A PESQUISA
OU PARCIAL AUTORIZAÇÃO
DO ESTADO
DE SÃO PAULO
SECRETARIA DA CltNCIA, TECNOLOGIA, OESENVOLVIMENTO ECONÓMICO E TURISMO
GOVERNO
•
DO ESTADO
DO EDITOR
DE SÃO PAULO
S
empre imaginávamos todos os indígenas brasileiros como homens muito primitivos reunidos em pequenas aldeias formadas por ocas cobertas de palha, isoladas umas das outras, e prontos para procurar um novo pouso assim que as condições de caça, pesca e coleta de frutos do local em que estavam estabelecidos se deterioravam, Civilizações mais avançadas na América pré-colombiana, só as dos maias e astecas, acima do Equador, e a dos incas, nos Andes, Éramos assim capazes de viajar boquiabertos e cheios de inveja pelo vasto império asteca, em guerra contra os invasores espanhóis comandados por Hernán Cortez, que Salvador de Madariaga, por exemplo, nos oferecia nos quatro volumes de No Coração da Pedra Verde, escrito lá pelos anos 40 do século passado, Tínhamos a opor à riqueza e ao esplendor com que ele atiçava nossa imaginação apenas umas poucas lendas, como a da Iara e a da índia Mani. A reportagem de capa desta edição, contudo, nos diz que as coisas não se passaram exatamente assim - e podemos, portanto, abandonar aquele feio sentimento de inveja, Recentes descobertas arqueológicas em pelo menos dois pontos distintos da Amazônia brasileira, relata o repórter especial Marcos Pivetta, a partir da página 82, sugerem a existência de grandes e refinados assentamentos humanos, habitados por milhares de pessoas, há 500 anos ou talvez mais tempo, no Alto Xingu, norte do Mato Grosso, e na confluência dos rios Negro e Solimões, a cerca de 30 quilômetros de Manaus, Amazonas, Esses achados foram relatados na edição de 19 de setembro passado da revista norte-americana Science e, o que é melhor, num artigo científico que tem a raridade de contar entre seus autores dois índios kuikuro do Brasil, ao lado de três pesquisadores da Universidade da Flórida e dois do Museu Nacional do Rio de Janeiro. É uma leitura que vale a pena, com certeza, Merece também destaque especial nesta edição a reportagem sobre os resultados do projeto Genoma do Schis-
tosoma mansoni (página 36), que foram publicados em artigo científico na edição de outubro da revista britânica Nature Genetics e anunciados pelo governador Geraldo Alckmin, em cerimônia no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, em 15 de setembro último. Os pesquisadores responsáveis por esse projeto conseguiram determinar de forma integral ou parcial as seqüências de 92% dos estimados 14 mil genes do parasita analisado e, por analogia com o material genético de outros organismos seqüenciados, descobriram a função de 45% dos genes do verme que infecta cerca de 10 milhões de brasileiros. As conseqüências práticas desse belo trabalho deverá ser o desenvolvimento de novas formas de tratamento contra a esquistossomose, conhecida popularmente como barriga-d'água, É possível que mais adiante surja de todo esse esforço científico uma vacina contra a doença. Outro destaque é a reportagem sobre o programa espacial brasileiro (página 16), posto em cheque desde o trágico acidente na Base de Alcântara em 22 de agosto, quando um incêndio destruiu completamente o terceiro protótipo do Veículo Lançador de Satélites (VLS), provocou a morte de 21 técnicos e causou perdas materiais estimadas em R$ 36 milhões, As fragilidades, os avanços e os impasses do programa são esmiuçados num texto primoroso do editor de Ciência, Carlos Fioravanti. Para encerrar, destacamos a reportagem de Fabrício Marques a respeito das conclusões do primeiro levantamento nacional sobre as alterações do perfil litorâneo brasileiro (página 46). São preocupantes, registre-se. Hoje, 40% das praias brasileiras são fustigadas por algum processo de erosão e perdem terreno para o mar, enquanto em 10% da costa ocorre o inverso: a areia avança sobre o oceano, Ou seja, a estabilidade da silhueta de boa parte dos oito mil quilômetros da costa do País não passa de uma referência nos mapas escolares, como o repórter explica, Boa leitura! MARILUCE
MOURA
- DIRETORA
DE REDAÇÃO
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 7
I.
MEMÓRIA
Do poço ao laboratório A Petrobras faz 50 anos; há 40 criava o Cenpes, especializado em pesquisas sobre petróleo
NELDSON
MARCOLIN
N
a década de 1970, as discussões sobre o monopólio estatal do petróleo ainda existiam, mas não eram tão intensas como nos anos 40 e 50. Também não havia dúvidas sobre a capacidade de o Brasil achar e produzir seu próprio "ouro negro". De 1974 a 1977, foram descobertos extensos campos de petróleo no mar, na bacia de Campos, Rio de Janeiro. Garoupa, Pargos, Namorado, Badejo, Enchova, Bonito e Pampo prenunciavam recordes de produção nos anos que viriam. Mas havia um problema a ser resolvido: como explorar petróleo em águas profundas? Não faltavam dinheiro e vontade para resolver a questão, de caráter meramente tecnológico. A complexa tarefa foi entregue ao Centro de Pesquisa e
8 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes), órgão criado oficialmente pela Petrobras em 1963. O centro levou alguns anos 'para desenvolver a tecnologia necessária, sempre aperfeiçoada nas décadas seguintes - e o fez com maestria, a ponto de ganhar por duas vezes, em 1992 e 2001, o prêmio Distinguished Achievement, da Offshore Technology Conference (OTC), de reconhecimento internacional na liderança mundial em tecnologia de exploração e produção em águas profundas. Em 1987, por exemplo, foi lançado ao mar o primeiro veículo submarino de controle remoto concebido e fabricado inteiramente no Brasil. A excelência do Cenpes não se construiu apenas nessa época. Ela nasceu no final dos anos 1940,
Pesquisadores em laboratório do Cenap, em 1957: precursor do Cenpes
quando o então Conselho Nacional do Petróleo apontou para a necessidade da formação de engenheiros para uma futura indústria brasileira nessa área. Esse desejo se materializou em 1952, quando foi montado o Centro de Aperfeiçoamento de Pessoal (Cenap). Nesse mesmo ano, foi ministrado o primeiro curso de refinação de petróleo no Brasil, em convênio com a Escola Nacional de Química da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, a UFRJ). As duas iniciativas se deram antes mesmo da criação da Petrobras, em 3 de outubro de 1953. Depois de incorporado à Petrobras, em 1954, o Cenap investiu em novos
cursos de formação, como geologia, perfuração e produção, manutenção de equipamentos e aplicação de asfalto, entre outros. Em 1956, um grupo de trabalho e estudos sobre petróleo concluiu que a pesquisa tecnológica era um imperativo da atividade industrial, o que levou à reestruturação do Cenap - definiu-se que sua finalidade, além da formação, era "incentivar a realização de estudos e pesquisas científicas da tecnologia do petróleo': Foi em 1963 que um relatório produzido por especialistas russos a pedido da Petrobras recomendou a instalação de uma instituição que agregasse pesquisa científica e laboratórios bem estruturados. Foi o sinal para a criação do Cenpes, que absorveu o Cenap, ganhou
Perfuração em alto-mar e robô nos anos 80: expertise em ágúas profundas
mais recursos nos anos seguintes e um prédio dentro da cidade universitária da UFR]. O centro tornou-se um dos principais do mundo. Desde 1992 recebe 1% do orçamento bruto da Petrobras e dispõe de 137 laboratórios e 28 unidades-piloto, com 1.308 funcionários, dos quais 86 são doutores, 247 mestres e 292 graduados, situação sem igual em nenhuma empresa brasileira. Não à toa, o Cenpes é responsável por grande parte do sucesso da Petrobras, como as 750 patentes depositadas pela Petrobras no Brasil e, entre elas, 180 no exterior. PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 9
• POLÍTICA CIENTÍFICA
•
E TECNOLÓGICA
ESTRATÉGIAS
MUNDO
A República Tcheca no clube das células-tronco Cientistas tchecos conseguiram cultivar linhagens de células-tronco extraídas de embriões humanos descartados numa clínica de fertilização (Nature, 7 de agosto). E estão estudando o potencial dessas matrizes capazes de se transformar em várias outros tipos de
• Quando Einstein enfrentou Britney Na tentativa de descobrir até que ponto os desbravadores da ciência e da tecnologia rivalizam com os artistas no imaginário popular, a revista NewScientist (16 de agosto) decidiu testar a popularidade de expoentes dos dois times na Internet. Como regra, ficou estabelecido que o ranking dos mais famosos seria decidido sumariamente pelo número de referências encontradas para cada nome no site de busca Google. Como astro que se preza tem de ser conhecido por um só nome
células no desenvolvimento de neurônios, uma área de pesquisa promissora para pacientes dos males de Parkinson e Alzheimer. Com esse avanço, a República Tcheca se torna o primeiro país do Leste Europeu, e em vias de ingressar na União Européia (UE),
- como Elvis ou Einstein, por exemplo -, decidiu-se que os nomes sobressalentes seriam dispensados. Se ignorarmos
10 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
a iniciar pesquisas dessa natureza. Também crescem as pressões para que a UE patrocine experiências com células-tronco de embriões humanos. Não será fácil. Países como Itália e Alemanha se opõem visceralmente. A Espanha, que era contra, acaba de mudar de
alguns senões - como o de que os resultados para Madonna certamente incluem menções à Virgem Maria -,
posição. Outros países, como Inglaterra e Suécia, permitem a pesquisa sob estritos padrões éticos. A pesquisadora Eva Syková, da Universidade de Carlos, em Praga, uma das responsáveis pelos estudos, garante que, na República Tcheca, a ética prevalece. •
alguns resultados surpreendem. Abaixo de Deus (naturalmente digitado como God), que não tem partido
Celebridades no Google 15.2
CIENTISTAS
ARTISTAS
e obteve expressivos 44 milhões de citações, o primeiro nome que aparece é o de Ford (o desbravador em questão é Henry Ford, o pioneiro dos automóveis), empatado com Jesus com "15 milhões". O que significa mais-do que triplo das menções obtidas pela primeira artista no ranking: Britney, com 4,3 milhões. É possível argumentar que Ford é um termo amplo demais, designa também uma das maiores indústrias do planeta e, afinal, não expressa originalidade científica. Mas o que dizer da originalidade artística de Britney? Justiça seja feita: se o time dos cientistas é mais rico em craques, o dos artistas tem mais craques ricos. E dá vagas a talentos vivos. •
• A onda dos espiões de laboratório O físico Valentin Danilov, do Centro de Termofísica da Universidade Técnica Estatal de Krasnoyarsk, na Sibéria, aguarda julgamento, desde sua prisão em fevereiro de 2001, sob a acusação de espionagem. Ele é suspeito de ter passado informações secretas sobre um aparelho em que trabalhava para uma companhia chinesa (Nature, 31 de julho). Não está sozinho. Vários outros cientistas, presos entre 1997 e 2002 pelo FSB - serviço de inteligência que substituiu a KGB -, respondem a processos de traição na morosa justiça russa. "Está na moda acusar cientistas de espiões", diz Ludmila Alexeyeva, chefe de uma organização de direitos humanos que luta para pôr um fim no que caracteriza como "uma perseguição aos pesquisadores". Danilov, como outros acusados, tem a solidariedade da comunidade acadêmica. O aparelho que
por quais desígnios, acredite que algo nele possa munir os chineses de uma arma espacial para usar contra a Rússia. Dos cientistas presos, nenhum, até agora, foi condenado. Alguns até já foram libertados. Danilov assegura que a condição de réu não mudou sua vida pessoal e profissional. "Ando de cabeça ergui da", diz. •
• Parceria contra os flagelos africanos
desenvolveu só serviria para testar o efeito da atividade eletromagnética dos satélites, embora o FSB, não se sabe
Na última reunião regional da Organização Mundial de Saúde (OMS), em Iohannesburgo, na África do Sul, o comissário de pesquisa da União Européia, Phillippe Busquin, conclamou os países da África a mobilizar esforços para colaborar com o progra-
ma Parceria Europa-Países em Desenvolvimento para a Pesquisa Clínica, lançado há um ano para combater o HIV, a malária e a tuberculose no continente (The Scientist, 4 de setembro). Busquin também aproveitou para informar os 46 ministros dos países africanos presentes que o programa já conta com os U$S 432 milhões de fundos prometidos pela Europa. Esperam-se contribuições da indústria farmacêutica e da comunidade internacional para completar os U$S 650 milhões previstos. "Trata-se de uma oportunidade para os pesquisadores, funcionários públicos e industriais africanos e europeus darem as mãos para lutar contra as piores epidemias do mundo", declarou o comissário. •
A mobilidade dos cérebros europeus Segundo o articulista do Financial Times Donald Kennedy (27 de agosto), os cientistas europeus já transitam entre as fronteiras do Velho Continente com a mesma leveza com que, por exemplo, um pesquisador norte-americano se desloca de· Massachusetts para Califórnia. Mas, ao mesmo tempo em que superam as barreiras nacionais e lingüísticas em nome de uma realidade mais comunitária e economicamente unificada, os países da Europa também assistem ao aumento da evasão de seus cientistas para os Estados Unidos. Que fazer? A implementação de políticas como Sexto Programa Quadro para a Pesquisa, que prevê subsídios para trabalho científico
por todo o continente, sem dúvida, pode ajudar, mas Kennedy sugere três outras ações coordenadas. Em primeiro lugar, reestruturar as prioridades da ciência européia - isso ajudaria, por exemplo, a conter a insatisfação dos pesquisadores que dizem haver pesquisa aplicada demais e pesquisa básica de menos nos programas da UE. Em segundo lugar,
a Europa e os Estados Unidos deveriam trabalhar juntos para evitar a fuga de talentos da Europa - um intercâmbio mais equânime resolveria problemas de parte a parte. Finalmente, empenhar os cientistas na criação de centros de excelência mais focados em regiões do que em países na tentativa de superar as políticas ainda definidas isoladamente por nações .•
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 11
• África e Índia duelam por instituto
Teller: a ciência dos artefatos mortais
Toma corpo a idéia de transferir para a África a sede do Icrisat, sigla em inglês para Instituto Internacional de Pesquisa de Colheitas para os Trópicos Semi-Áridos (Natute, 31 de julho). Atualmente, o instituto - um dos núcleos da ONG Future Harvest, que patrocina projetos de desenvolvimento agrícola e ecológico com o apoio de 50 países - funciona no Estado de Andhra Pradesh, na Índia. A proposta surgiu em Washington na última reunião do Conselho Consultivo para a Pesquisa Agrícola Internacional, que administra a ONG. A intenção seria fortalecer a posição dos postos mais carentes da organização no Quênia, na Nigéria e no Zimbábue. O corpo técnico do instituto e pesquisadores indianos desaprovam a mudança, pois temem que seus projetos fiquem em segundo plano. Com a ajuda do Icrisat, a Índia obteve avanços na produção de alimentos. •
O físico Edward Teller, controversa personagem da ciência no século 20, morreu no dia 9 de setembro, aos 95 anos. Seu esforço para fazer a bomba de hidrogênio, com poder de destruição centenas de vezes maior que as bombas de Hiroshima e Nagasaki, serviu de combustível para a corrida armamentista durante a Guerra Fria e transformou-o numa figura odiada. Nascido na Hungria numa família judaica, Teller deixou o país nos anos 20, depois que uma revolução comunista varreu o país em 1919 experiência que forjaria sua verve anticomunista. Mudou-se para a Alemanha, fez doutoramento sob orientação de Werner Heisenberg, um dos pais da física quântica, mas a ascensão do nazismo conduziu-o aos Estados Uni-
Teller deu fôlego à corrida armamentista dos, em 1935. Em 1943, integrou-se ao Projeto Manhattan, que produziu a primeira bomba atômica. Logo se tornaria rival de J. Robert Oppenheimer, o chefe do projeto. Encerrada a Segunda Guerra, Teller queria que os Estados Unidos desenvolvessem logo a bomba de hidrogênio - antes que a União Soviética o fizesse. Oppenheimer se opunha à idéia. Em 1950,
o governo americano decidiu investir no projeto da bomba H e deu autonomia para Teller trabalhar. Escanteado, Oppenheimer chegou a ser taxado de agente soviético. A vitória custou caro a Teller, que passou a ser visto como um pária entre os cientistas. Arrogante, não se furtava a dar depoimentos ao Congresso defendendo a bomba H testada em 1952 - e, mais tarde, o sistema espacial antimísseis que se converteu no programa Guerra nas Estrelas. É certo que Teller ajudou a transformar o mundo num lugar perigoso. Como teve vida longa, assistiu ao desmoronamento soviético e pôde defender-se com o argumento de que, sem pressão armamentista, o bloco comunista estaria de pé e o mundo continuaria sob a ameaça nuclear. •
Ciência na web Envie sua sugestão de site científico para cienweb@trieste.fapesp.br
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Um excelente site sobre os elementos químicos, preparado pela Royal Society of Chemistry.
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12 . OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
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ESTRATÉGIAS
BRASIL • Diversidade no Fórum da Anpocs
Conselheiros com biografias notáveis o
Conselho Superior da FAPESP ganhou três novos membros, indicados pelo governo do Estado: o ex-chanceler Celso Lafer, o presidente da Fiesp, Horacio Piva, e o economista Yoshiaki Nakano. Substituem o professor Alain Florent Stempfer, o advogado Fernando Vasco Leça do Nascimento e o historiador José Iobson Arruda, cujos mandatos terminaram. •
• Do Direito ao Itamaraty Celso Lafer é professortitular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e um dos integrantes do comitê consultivo da Organização Mundial do Comércio (OMC). Foi ministro de Estado em três ocasiões. No governo Fernando Collor, teve rápida passagem no Ministério das Relações Exteriores. No governo Fernando Henrique Cardoso, assumiu o Ministério do Desenvolvimento, Indús-
tria e Comércio em 1999 e, em 2001, tornou-se novamente chanceler. Homem público com conhecida formação intelectual, também foi embaixador do Brasil junto à OMC e à ONU. Recebeu a mais alta condecoração da Ciência e Tecnologia do Brasil, a Ordem Nacional do Mérito Científico. •
Global Leaders for Tomorrow (Líderes do um dos
Amanhã) pelo World Economic Forum. •
• Especialista em economia Yoshiaki Nakano é professor de Economia, diretor da Escola de Economia
• A nova geração da Fiesp Horacio Lafer Piva cumpre o segundo mandato como presidente da Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (FiespCiesp). Membro dos conselhos de administração da Indústrias Klabin e da Associação Brasileira de Celulose e Papel, integra o Comitê Empresarial Permanente do Ministério das Relações Exteriores e o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República. Formado em economia e pós-graduado em administração, foi eleito
da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e chefe do Departamento .de Economia da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, também da FGV. Foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, de 1995 a 2001, diretor do Centro de Política Econômica, secretário especial de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda e consultor do Banco Mundial. Nakano também já exerceu a função de secretário-adjunto do Estado de São Paulo, entre 1985 e 1987, e ocupou o mesmo cargo na Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Turismo. •
O mais prestigiado fórum dos antropólogos e sociólogos terá, neste ano, um ingrediente inédito: um pesquisador da Ásia e outro da África estão no rol dos conferencistas do 27° Encontro Anual da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs) - que acontece em Caxambu entre 21 e 25 de outubro. São o senegalês Adebayo Olukoshi, dirigente da associação de cientistas sociais da África, e o iraniano Asef Bayat, especialista em fundamentalismo islâmico da Universidade Americana no Cairo. Tradicionalmente, o encontro traz nomes dos Estados Unidos e da Europa. Eles também estarão lá. Renato Rosaldo, da Universidade de Stanford, por exemplo, será um dos conferencistas. •
• Dinheiro para o software livre O Comitê Gestor do Fundo Setorial para Tecnologia de Informação definiu investimentos de R$ 4,3 milhões para projetos na área do software livre - aquele tipo de programa que pode ser desenvolvido e aperfeiçoado por qualquer pessoa e se transformou em alternativa de baixo custo aos softwares das gigantes de informática. Um edital para seleção dos projetos está saindo do forno. Os recursos vêm do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. •
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 13
Sem fronteiras para a biodiversidade Uma parceria do governo do Amapá com a ONG ambientalista Conservation International deu origem a um gigantesco corredor ecológico. A área, maior que o território de Portugal, compreende 10 milhões de hectares de florestas tropicais, mangues e cerrados. Na prática, engloba 12 parques e reservas indígenas já exis-
tentes, das Guianas ao estuário do rio Amazonas, que agora passam a ser conectados por novas áreas protegidas. O que realmente muda é a forma de administrar o enorme patrimônio natural. Num corredor de biodiversidade, os recursos naturais são gerenciados de modo conjunto para garantir a sobrevivência de um
• Um edital em que as exatas não entram
• Saídas para o desenvolvimento
Pela primeira vez o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) lança um edital específico para as áreas de ciências humanas, no valor de R$ 3 milhões. Normalmente, os pesquisadores que atuam na área de humanidades têm de competir com especialistas de outras áreas do conhecimento - como Exatas e Biológicas, entre outras - nos editais universais do conselho. "A maior parte das verbas acaba destinando-se às ciências exatas e a turma das ciências humanas fica em desvantagem", afirma o cientista político Manuel Domingos Neto, vice-presidente do conselho. Para participar desta nova modalidade de edital, os candidatos interessados deverão ter nível de doutorado e estar vinculados a uma universidade ou instituição de pesquisa, no âmbito da qual desenvolverão as atividades de pesquisa. Cada um dos projetos receberá um valor máximo de R$ 20 mil. •
A Assembléia Legislativa paulista criou uma arena para discutir saídas que criem condições para o desenvolvimento sustentado, conceito que concilia prosperidade econômica com respeito à ecologia. Instalado no dia 9 de setembro, o Fórum Legislativo do Desenvolvimento Econômico Sustentado tem uma agenda ambiciosa. Vai promover audiências nas quinze regiões administra-
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número maior de espécies. O mosaico de reservas abriga 45 espécies de lagartos, 505 de aves e nove de prima tas. "O corredor preserva as cabeceiras dos principais rios do Amapá. Isso irá garantir o abastecimento de água no Estado no futuro", diz Russell Mittermeier, presidente da Conservation International. O projeto vai receber
tivas de São Paulo. O objetivo não é só fazer diagnósticos, mas também apresentar propostas que estimulem a retomada dos investimentos privados, fortaleçam a competitividade das empresas e reduzam as desigualdades regionais. "A Assembléia quer ser um catalisador de novas ações", disse o presidente da Assembléia, Sidney Beraldo. "Queremos identificar potencialidades que melhorem a distribuição de renda e preservem o -meio ambiente." Os deputados estaduais
investimentos de US$ 15 milhões nos próximos quatro anos. O governo do Amapá dará o maior quinhão. A Conservation lnternational entrará com US$ 1,6 milhão. A criação do corredor foi anunciada pelo governador do Amapá, Waldez Góes, no Congresso Mundial de Parques, realizado em Durban, na África do Sul. •
vão debater a eficácia das políticas públicas em cada região e discutir o Plano Plurianual apresentado pelo governo à luz das conclusões do fórum. As informações colhidas pelo fórum vão abastecer um banco de dados estratégicos da Assembléia. Outro objetivo do fórum é aproximar a comunidade acadêmica do setor produtivo. Para estimular esse contato, o conselho consultivo do fórum é composto por representantes de associações empresariais, além dos reitores das universidades estaduais e do presidente da FAPESP, Carlos Vogt. •
• O BNDES entra
no jogo As torneiras do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vão abrir-se para a criação de pequenas empresas de tecnologia, numa linha de financiamento que pode chegar a R$ 1 bilhão. "Estão sobrando recursos do banco para novos empreendimentos, devido à baixa demanda do setor privado", disse o presidente do BNDES, Carlos
Lessa. A fonte de capital de risco, que virá de uma parceria do banco com a Finep, está prevista num protocolo assinado por Lessa e o ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, no dia 19 de setembro. A meta do programa, batizado de Criatec Programa de Criação de Tecnologia -, é a formação de mil novas empresas tecnológicas no país até 2006 e a multiplicação do número de patentes. O Criatec deve ser lançado oficialmente ainda neste ano. •
• Ferramenta que integra o Nordeste Um acordo celebrado entre os presidentes das Fundações de Amparo à Pesquisa na Região Nordeste promete reduzir custos e burocracia. As FAPs decidiram compartilhar o software de gestão Agil, desenvolvido nos últimos três anos pela Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Facep). A ferramenta racionaliza o preenchimento de formulários. Permite, ainda, que os pesquisadores façam suas solicitações de verbas,
bolsas e passagens aéreas pela Internet e acompanhem a tramitação dos pedidos on-line. "As fundações de Minas Gerais, Mato Grosso e Rio Grande do Sul também demonstraram interesse em obter o programa", diz José Carlos Vieira Wanderley, presidente da Facepe. A integração entre as FAPs nordestinas deve ir além. Numa reunião entre os dirigentes das fundações,
realizada em Fortaleza, no final de agosto, decidiu-se que as instituições vão compartilhar um banco de dados de consultores. Com isso, sempre que uma delas abrir um edital, terá mais facilidade em arregimentar pesquisadores que avaliem os projetos. •
matas, manter um museu do cérebro - e ainda desenvolver projetos sociais. Deve ter entre dez e 15 laboratórios, liderados pelos melhores neurocientistas brasileiros. Com o aporte de verbas, deverá começar a funcionar em três • anos.
• O sonho começa a sair do papel
• Retomada de importações
O Instituto Internacional de Neurociências do Brasil, que será sediado em Natal, Rio Grande do Norte, vai receber R$ 2 milhões dos ministérios da Ciência e Tecnologia e da Educação - conforme estabelece um convênio e um protocolo assinados em meados de setembro. A idéia de criação do instituto partiu de três neurocientistas brasileiros que atualmente trabalham nos Estados Unidos: Miguel Nicolelis e Sidarta Ribeiro, pesquisadores da Duke University, em Durham, e Claudio Mello, da Oregon Health and Science University, em Portland (Pesquisa FAPESP, edição 88). A instituição pretende ser um centro de excelência mundial na pesquisa de circuitos neurais em pri-
A FAPESP iniciou nova etapa no processo de retomada das importações de bens e serviços. Vai analisar solicitação apresentada por pesquisadores responsáveis por projetos com conclusão prevista entre 10 de novembro de 2003 e 30 de abril de 2004. As propostas devem ser apresentadas até 14 de novembro. Na primeira etapa, foram autorizadas compras de bens para projetos com conclusão prevista até 31 de outubro, no valor de até US$ 5,4 milhões. Entre os 251 projetos qualificados para pleitear recursos, foram apresentadas 42 solicitações com valor total de US$ 535,5 mil, ou seja, pouco menos de 10% dos recursos disponíveis. •
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 15
dentes, dos quais não escapam nem mesmo os países mais avançados, como os Estados Unidos e a Rússia. "Estamos num momento fundamental para definir os rumos e concepções do programa espacial brasileiro", comenta João Evangelista Steiner, físico da Universidade de São Paulo (USP) que encerrou no final de dezembro uma temporada de três anos como secretário de coordenação das unidades de pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). enta-se agora inverter uma tendência histórica e dar maior transparência ao programa espacialbrasileiro, ao mesmo tempo que se promove maior integração com as universidades, cuja participação no desenvolvimento de satélites e foguetes tem sido bastante rara. Até agora, não foi exatamente profícuo o diálogo mesmo entre as duas instituições - uma militar e outra civil- que conduzem a pesquisa espacial: o Centro Técnico Aeroespacial (CTA), subordinado ao Ministério da Aeronáutica, responsável pelo desenvolvimento do VLS, e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), ligado ao MCT, que cuida dos satélites. O CTAe o Inpe se uniram em 1980, com o início da Missão Espacial Completa Brasileira, que prevê a conquista de autonomia no desenvolvimento e na operação do veículo lançado r e de satélites, em conjunto com a construção de uma plataforma de lançamento, em Alcântara, inaugurada em dezembro de 1989.A partir desse momento, embora vizinhos, em São José dos Campos, o CTA e o Inpe seguiram trajetórias distintas. Enquanto o Inpe ganhou tempo no desenvolvimento de satélites por meio de acordos internacionais de transferência de tecnologia, ao CTA só restou o caminho do trabalho solitário, sob forte bloqueio internacional. Os países que detêm a tecnologia de construção de veículos lançadores não a repassam nem a vendem, por razões estratégicas. Afinal, o mesmo foguete pode levar tanto um satélite quanto um míssil de uso militar. Mas o bloqueio também tem razões comerciais. Países como Estados Unidos, França, China e Rússia, que já contam com foguetes próprios, não desejam um competidor a mais nesse lucrativo mercado: para
T
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cada lançamento de satélite cobram-se de US$ 15 milhões a US$ 25 milhões. Reaproximação - A distância entre as duas instituições pode ser, até certo ponto, inevitável. "O Inpe não pode ser acusado de participar de pesquisas com finalidades bélicas, para não perde"!'a credibilidade nos acordos internacionais", alerta Leonel Fernando Perondi, coordenador geral de engenharia e tecnologia espacial do Inpe. O problema é que o isolamento, hoje, parece excessivo, na visão de Luiz Bevilacqua, presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), órgão civil criado em 1994 para coordenar o programa espacial. Ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, a AEB substituiu a Comissão Brasileira de Atividades Espaciais, subordinada ao Estado Maior das Forças Armadas, e deu um caráter civil ao programa espacial brasileiro, antes associado apenas aos militares. "Estou procurando criar canais mais ativos de comunicação entre o CTA, o Inpe, as universidades e as indústrias': diz Bevilacqua. O esforço de reaproximação havia começado, sem alarde, pouco antes do desastre de Alcântara. No início de agos-
to, três meses depois de ter assumido efetivamente a AEB, Bevilacqua havia promovido um encontro no CTA com representantes das duas instituições de São José dos Campos e de cerca de 20 empresas que atendem ao programa espacial- quatro delas já estão trabalhando na chamada plataforma multimissão, uma estrutura comum aos satélites a serem lançados a partir de 2006. No encontro, segundo Bevilacqua, cada um pôde expor o que fazia ou desejava fazer, as dificuldades e os ressentimentos. Seu plano é promover neste mês de outubro um encontro ainda maior, para o qual devem ser convidados também pesquisadores de universidades e institutos interessados em participar do programa espacial. "Há uma disposição tanto do Inpe quanto do CTA de cooperar", observa Bevilacqua, que abriu espaço para pesquisadores de universidades integrarem a comissão coordenada pelo CTA, que vai apurar as causas do acidente de Alcântara. Pressionada por instituições científicas, a Câmara dos Deputados anunciou a criação de uma comissão independente para examinar o desastre do final de agosto e promover uma ampla avaliação do programa
espacial brasileiro. "O programa espacial brasileiro civil é reconhecido no mundo todo porque houve continuidade, o que não se vê no programa militar, cujas equipes se mantêm, mas as chefias se alteram com freqüência e se perde ritmo de trabalho': diz Nelson de JesusParada, que dirigiu o Inpe na época da implantação da Missão Espacialmais tarde, entre 1993 e 1996, foi diretor-presidente da FAPESP. á no final dos anos 80 surgiram sinais de que seria difícilconciliar os ritmos entre as duas instituições à medida que se acentuava a defasagem entre os cronogramas e se tornava claro que o primeiro satélite do Inpe estaria pronto bem antes do veículo lançador. Renato Archer, na época o ministro da Ciência e Tecnologia, criou então uma vertente puramente civil do programa: assinou um acordo de cooperação internacional com a China para desenvolvimento conjunto de satélites de sensoriamento remoto, mais complexos que os projetados no âmbito da Missão Completa Brasileira.Apesar dos benefícios- o Brasil já era um usuário habitual de ima-
gens de sensoriamento remoto -, o acordo com a China causou um constrangimento nas relações entre o Inpe e o CTA, por representar a independência do Inpe em relação à Missão Completa e ao CTA. Este mês, na China - O acordo com a China resultou na construção do primeiro satélite sino-brasileiro de sensoriamento remoto, o CBERS-1(China- Brazil Earth Resources Satellite),lançado de Taiyuan em 1999 - com cinco anos de atraso - pelo foguete chinês Longa Marcha 4. Provavelmente no final deste mês, também de Taiyuan e novamente a bordo do Marcha 4, deve subir o CBERS-2, cujo lançamento deve ser acompanhado por um grupo de 12 técnicos e pesquisadores do Inpe, que em agosto deixaram a plataforma de Alcântara duas horas antes do incêndio com o VLS. O CBERS-2 ganha o espaço com pelo menos dois anos de atraso em relação ao planejado para substituir o satélite anterior, cuja vida útil é de dois anos. Réplica do anterior, com 1.450 kg e um corpo cúbico de 2 metros de lado acoplado a um painel solar de 2,6 metros de largura por 6,3 de comprimen-
to, o CBERS-2 também deverá entrar em órbita polar, a 778 km de altitude. Como o anterior, deverá enviar as imagens que indicam o uso da terra ou os espaços nos quais uma cidade ainda pode crescer, por exemplo, com uma resolução de 20 metros. "Já imaginou se no final do ano o governo disser que não sabe quanto se desmatou na Amazônia?",indaga Gilberto Câmara, engenheiro do Inpe que coordena o setor de observação da Terra. "O CBERSé a garantia de que teremos imagens sobre o território brasileiro': acrescenta, preocupado com o fato de um satélite norte-americano, o Landsat-7, outro assíduo observador da Amazônia, ter parado de funcionar, após quatro anos. Além dos satélites chineses, estão no ar dois satélites de comunicação de dados. O primeiro, o SCD-1 - um prisma de base octogonal com 1 metro de diâmetro, 1,45 de altura e 115 kg-, entrou em órbita em fevereiro de 1993, lançado da Flórida, Estados Unidos, por um foguete norte-americano, o Pegasus. Com uma vida útil estimada em um ano, o SCD-1 continua em funcionamento, por consumir lentamente a energia de sua bateria. Em 1998, um PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 19
ano depois de o CTA ter lançado o primeiro protótipo do VLS, que perdeu o rumo e teve de ser explodido 65 segundos depois de ter deixado o solo, o Inpe pôs em órbita o SCD-2, com o mesmo lançado r norte-americano. Ambos se encontram a 750 quilômetros de altitude, acompanhando a linha do Equador, e captam e enviam a cada 100 minutos informações meteorológicas (umidade do ar e temperatura) e hidrológicas (vazão dos rios e represas).
A
espeito .dos i~passes'A n~o se questiona a unportancia estratégica do programa espacial para o País. Um dos principais argumentos apresentados em defesa do programa por Bevilacqua, José Viegas, ministro da Defesa, e pelo brigadeiro Tiago da Silva Ribeiro, diretor do CTA, nas audiências do Senado e da Câmara, é que a extensão territorial exige monitoramento contínuo, em nome da segurança e da soberania do país. "Não há país grande como o Brasil sem um programa espacial ambicioso", reforça Steiner. Além disso, Alcântara é uma das bases de lançamento mais bem posicionadas do mundo - a proximidade com a linha do Equador permite o aproveitamento da força de rotação da Terra e a economia de combustível- e, é consenso, não deveria ser aproveitada apenas para pôr em órbita satélites estrangeiros. Outro ganho do programa é o Laboratório de Integração e Testes (LIT) inaugurado em 1978 para apoiar a pesquisa espacial. Parada lembra-se de como foi difícil montar esse laboratório, que simula as condições que os satélites enfrentarão lá em cima - com variações de temperatura de 70° negativos para 70° positivos em menos de duas horas -, além de fazer de 20 a 30 testes para fabricantes de objetos tão díspares como telefones celulares, equipamentos médicos ou automóveis. "Ninguém queria transferir tecnologia nem vender os equipamentos, que eram considerados de segurança nacional", diz Parada, que conseguiu ajuda do governo francês, após insistentes recusas dos norte-americanos. "No fim, com muita diplomacia e muito cuidado, conseguimos." Sob a lua soviética . O que está em jogo neste momento é como conduzir a
pesquisa espacial no Brasil. Steiner lembra que o programa espacial norte-americano também estava dividido entre vários ministérios quando os então soviéticos, mais ágeis, inauguraram a corrida espacial em outubro de 1957 lançando o Sputinik 1, o primeiro satélite artificial a entrar em órbita. Semanas depois, subiu o Sputinik 2 com a cachorra Laika, o primeiro ser vivo a ir para o espaço. Em dezembro desse mesmo ano, os Estados Unidos lançaram seu primeiro satélite, o Navy Vanguard, que explodiu. Como a partir daí a corrida espacial confundiu-se com a corrida armamentista, alimentando o conflito político entre os Estados Unidos e a União Soviética, o premiê Nikita Krushev aproveitou a chance para provocar: "A América dorme sob a lua soviética': Em resposta, no ano seguinte o governo norteamericano criou a Nasa, uma instituição civil, com o propósito de agilizar e centralizar a pesquisa espacial, e em 1969 pôs o homem na Lua. Também se critica o fato de o programa espacial brasileiro estar sujeito à Lei nO 8.666, ou lei das licitações, que exige a abertura de concorrências públicas para compras ou contratação de serviços. "O programa teria de ter flexibilidade para escolher as empresas por critérios técnicos, não por preço': reivindica Perondi, do Inpe. Segundo ele, o controle dos gastos poderia ser feito por meio de auditorias externas. "Nessa área, cada produto é único", diz. Num plano mais amplo, questiona, se o próprio papel das instituições. Não se tem ao certo, por exemplo, se a Agência Espacial Brasileira deveria realmente permanecer ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, como o Inpe, ou retornar, com mais autonomia, à Presidência da República, à qual era inicialmente vinculada. Nas semanas seguintes ao acidente de Alcântara, os jornais de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília publicaram uma série de artigos questionando os rumos do programa espacial. "Seria difícil questionar a dedicação e a competência do pessoal do CTA", escreveu na Folha de S. Paulo o brigadeiro-do-ar Aldo Vieira da Rosa, fundador do Inpe e hoje professor emérito da Universidade Stanford, nos Estados Unidos. "Poderíamos, quando
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Peças da plataforma multimissão: estrutura única para satélites com missões diferentes
muito, examinar se lá é o local mais adequado para o desenvolvimento de foguetes ou se tal atividade deveria ser contratada com indústria privada.'" Acordos· Em conseqüência dos nós que agora se procura desatar, o programa espacial brasileiro acumulou um atraso estimado em pelo menos 20 anos. "Até os anos 80, tínhamos. um programa espacial tão avançado quanto o da Índia': comenta Perondi. "Hoje, a Índia já tem capacitação integral na construção e no lançamento de foguetes e de satélites de sensoriamento remoto, científicos, meteorológicos e de telecomunicações." O governo da Índia tem dedicado cerca de US$ 400 milhões por ano ao programa espacial, motivado, é verdade, pela perspectiva de guerra iminente com um de seus vizinhos, o Paquistão. Sem um inimigo à vista, o governo brasileiro destinou ao programa, este ano, cerca de US$ 35 milhões. Mas pode haver mais no ano que vem. Bevilacqua e José Viegas, convocados para explicar o programa e o acidente de Alcântara no Senado e na Câmara dos Deputados, aproveitaram as audiências para reivindicar um reforço orçamentário de US$ 130 milhões para o próximo ano, aos quais se somariam
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os US$ 40 milhões a princípio já assegurados.
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evilacqua tem trabalhado intensamente em acordos de cooperação internacional que permitam ao programa espacial avançar mais rapidamente. No momento, o mais promissor é costurado com o governo da Ucrânia, interessado em usar a base de Alcântara para realizar os testes finais do seu lançador, o Ciclone 4. Já em fase final de redação, o acordo seria assinado, de acordo com o presidente da AEB, com a vinda ao Brasil do presidente da Ucrânia, Leonid Kuchma, prevista para este mês. Essa é uma das razões pela qual se deseja reconstruir a torre de lançamento, o mais rapidamente possível, e começar a fabricação de outro protótipo do veículo lançador. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou logo após o acidente e reiterou semanas depois que o quarto VLS deve ser lançado até o final de seu mandato, em 2006. Os ucranianos teriam interesse em aumentar a força exercida pelos foguetes do lançador Ciclone 4 com dispositivos adotados no VLS brasileiro, segundo Bevilacqua. Teriam tam-
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bém proposto o desenvolvimento conjunto de combustível líquido, adotado internacionalmente, junto com os propelentes sólidos, nos foguetes que põem satélites em órbita. Para participar do mercado de colocação de satélites de constelações de órbita baixa será necessário desenvolver veículos que utilizem apenas a propulsão líquida, ou, em uma solução-mista, também a sólida, reconhece, em um artigo na revista Parcerias Estratégicas, o brigadeiro-do-ar Tiago da Silva Ribeiro, diretor do CTA, que, procurado pela revista Pesquisa FAPESP, não respondeu às questões enviadas. Até agora, o CTA conhece apenas a produção de combustível sólido, escolhido no início da Missão Completa pela perspectiva de poder ser usado também em mísseis balísticos e por apresentar semelhanças com os explosivos de alta energia - os combustíveis líquidos são de manuseio mais complicado. Tratava-se de uma decisão coerente com os objetivos militares e com os interesses comerciais de um grupo de empresas de São José dos Campos, que nos anos 80 era um centro exportador de armamentos, principalmente para o Oriente Médio. O foco na indústria bélica, porém, difi-
cultou o acesso a tecnologias de uso civil dos próprios lançadores, cujo desenvolvimento permanece sob o cuidado exclusivo do CTA. "Somos prisioneiros do passado", comenta Gilberto Câmara, do Inpe. Por enquanto, o programa espacial brasileiro oscila entre cenários distintos. O primeiro deles implica a continuidade do modelo atual: o CTA consegue recursos para reconstruir o VLS e a base de Alcântara e lançar outro protótipo em 2006. Como segunda alternativa, o Brasil estabelece acordos de cooperação internacional que levem a um projeto totalmente diferente do lançador. Na terceira opção, o País adota o exemplo da Índia, procura recuperar o atraso, amplia bastante o orçamento do programa e inicia um projeto novo de VLS, com uma revisão completa dos objetivos do programa e do país e uma sinergia entre a pesquisa civil, militar e universitária. Outro caminho seria desistir de construir lançadores próprios, como o Canadá e a Argentina, e concentrarse nas tecnologias de satélites e suas aplicações. Na quinta saída, talvez ainda mais improvável de acordo com a realidade atual, o Inpe e parte do CTA seriam unificados, sob o comando da AEB, que passaria a ter o comando efetivo do programa espacial. Os próximos meses serão decisivos para definir o quanto vai mudar a pesquisa espacial no Brasil. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 21
• POLÍTICA CIENTÍFICA
E TECNOLÓGICA início o deste século, estimava-se que as áreas de matas ciliares degradadas em São Paulo somavam 1,3 milhão de hectares, expondo ao risco o sistema hídrico estadual. Grande parte desse desmatamento ocorreu de maneira irregular e ilegal e, por exigência de lei, estas áreas deveriam ser recuperadas. Na época, no entanto, as ações de reflorestamento enfrentavam dois obstáculos. O primeiro era a baixa capacidade de produção de mudas, de cerca de 13 milhões por ano, ante às necessidades do replantio, que demandava uma oferta de 2,6 bilhões de mudas. Mantido esse ritmo de produção, qualquer projeção para a reparação dessas áreas ultrapassava um período de 200 anos. O segundo problema era a baixa qualidade dos projetos de reflorestamento, que utilizavam poucas espécies - geralmente as de mudas mais baratas e mais facilmente disponíveis no mercado -, limitando-se assim à reconstituição da paisagem. "Em áreas de mata natural, existem entre 100 e 400 espécies arbóreas', ressalta Luiz Mauro Barbosa, diretor-geral do Instituto de Botânica da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SMA). Agravando a situação, dentre as espécies utilizadas, dois terços eram de ciclo de vida curto, ou seja, cresciam rapidamente. "O resultado é que, em 10 anos, começavam a declinar e precisavam ser replantadas", diz ele. O cenário de degradação e a falta de orientação técnica no reflorestamento exigiam rápida intervenção. E foi este o objetivo do projeto Modelos de Repovoamento Vegetal para a Proteção de Sistemas Hídricos em Áreas Degradadas dos Diversos Biomas do Estado de São Paulo, desenvolvido pelo Instituto de Botânica (lBt) em parceria com a Prefeitura Municipal de Ilha Comprida e de Mogi-Guaçu, com apoio da International Paper e da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), no âmbito do Programa de Políticas Públicas da FAPESP. O projeto, sob coordenação do diretorgeral do Instituto de Botânica, foi iniciado em 2001. "Constatamos, já na primeira fase, que a situação era pior do que imaginávamos", conta Barbosa. Neste diagnóstico foram avaliadas 98 áreas de reflorestamento em todo o Estado de São Paulo, num total de 2.500 hectares. "As áreas monitoradas ti/
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POLÍTICAS
PÚBLICAS
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produzidos Projeto de recuperação de matas ciliares resgata a biodiversidade e preserva sistema hídrico de São Paulo
22 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
nham tamanhos diversos e estavam vinculadas a empresas e universidades, sendo que a maioria dos projetos não utilizava mais que 30 espécies", afirma Barbosa. A diversidade só é maior em áreas próximas a grandes remanescentes de mata natural conservadas, como, por exemplo, na Mata Atlântica, por conta da propagação natural de determinadas espécies. Já nas áreas de restinga, a situação é ainda mais grave: ali é possível encontrar espécies arbóreas típicas de matas do interior, que haviam sido plantadas de forma errada. A baixa diversidade tem origem principalmente na pequena oferta de mudas diversificadas e até no custo de produção diferenciado, já que as espécies mais usadas eram sempre as mesmas. Os pesquisadores constataram que, em 41 viveiros florestais consultados, são produzidas cerca de 590 espécies arbóreas nativas. Mas a grande maioria concentra sua produção naquelas 30 espécies identificadas nas áreas de reflorestamento amostradas. Replantio orientado - A primeira medida da equipe de pesquisadores envolvida no projeto foi propor à SMA a edição da Resolução n= 21, publicada em novembro de 2001, normatizando procedimentos para o replantio em áreas degradadas. As novas normas passaram, desde então, a pautar a análise e a aprovação de projetos de revegeração, além de orientar sobre o reflorestamento heterogêneo no Estado de São Paulo. "Alguns dos objetivos do projeto foram identificar as formas mais adequadas para transferir conhecimentos para a sociedade, subsidiar o licenciamento ambiental no Estado e apoiar ações do Ministério Público e SMA, entre outros", justifica Barbosa. "A resolução é um parâmetro técnico a ser seguido:' A resolução estabeleceu proporções sobre o número mínimo de espécies por hectare. Projetos de reflorestamento de até um hectare, por exemplo, devem contar com 30 espécies. Já aqueles implementados em áreas maiores que 50 hectares, a exigência mínima é de 80 espécies distintas. Outra recomendação visa proteger as espécies em extinção, respeitando-se as regiões ou formações de ocorrência. Assim, áreas de replantio de até 1 hectare devem contar com 5% de mudas de pelo menos cinco espécies distintas ameaçadas de extinção. Nos grandes projetos, com mais de 50 hectares, as plantas em extinção devem representar 10% das mudas, com pelo menos 15 espécies distintas.
As mudas deverão, preferencialmente, ser produzidas com sementes procedentes da mesma região e nativas do bioma ou formação florestal correspondente, sempre com pelo menos 20 centímetros de altura e sistema radicular que garanta a sua sobrevivência pós-plantio. A medida é detalhada: sugere que nas áreas reflorestadas sejam adotadas medidas de controle de formigas e realizadas, no mínimo, três capinas e/ou coroamentos anuais, mantendo as entrelinhas vegetadas e baixas. "Se possível': consta na resolução, "devem ser efetuadas pelo menos duas adubações anuais com formulação normalmente utilizada na região, ou de acordo com os resultados da análise do solo." No caso de áreas degradadas localizadas em restingas, manguezais e florestas paludosas, também conhecidas como matas de brejo, 50% das mudas devem ser de espécies existentes nas vizinhanças. esoluçãOtraz ainda uma lista de 247 espécies arbóreas exemplificativas, com indicação do ecossistema de ocorrência natural e classe sucessional - isto é, levando-se em conta espécies pioneiras e não pioneiras - para facilitar a implementação de projetos. Esta lista acaba de ser ampliada. O Instituto de Botânica lançou o manual Diversificando o Refloresta-
A
mento no Estado de São Pau/o: espécies disponíveis por região e ecossistema, com a sugestão de 589 espécies que podem ser utilizadas no replantio. "O livro também é resultado da pesquisa patrocinada pela FAPESP", ressalta Barbosa. Ainda é cedo para avaliar os efeitos da resolução sobre a biodiversidade, já que foi adotada há pouco mais de um ano e meio. Mas há sinais de que seus efeitos são positivos. "Já é possível constatar uma maior conservação da biodi24 . OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
A diversificação da oferta de mudas nos viveiros é estratégica para o sucesso do projeto
versidade e a melhor qualidade dos reflorestamentos': observa Barbosa. A International Paper do Brasil Ltda., por exemplo, adotou, em 2002, as novas diretrizes para o plantio do Parque Florestal São Marcelo, mantido pela empresa. Plantaram 732 mil mudas em 439 hectares, com uma média de 1.667 plantas por hectare. Desta área, 24ahectares foram replantados utilizando 101 espécies nativas arbóreas das regiões de ,Mogi-Guaçu, Aguaí e Espírito Santo do Pinhal. De acordo com Miguel Magela Diniz e Doraci Milani, respectivamente supervisar técnico e gerente técnico do
o PROJETO Modelos de Repovoamento Vegetal para a Proteção de Sistemas Hídricos em Áreas Degradadas dos Diversos Biomas do Estado de São Paulo MOOALIDADE
Programa
Políticas Públicas
COORDENADOR
LUIZ MAURO BARBOSA- Instituto de Botânica - SMA INVESTIMENTO
R$ 178.062,59
parque, esta foi a primeira área do Estado a ser recomposta atendendo integralmente aos parâmetros técnicos estipulados pela resolução, garantindo maior diversidade florística e suporte alimentar para a fauna local. Comparando os procedimentos de repovoamento antes e depois da resolução, eles concluem que, utilizando uma menor diversidade de espécies, o custo de implantação da floresta nativa é menor na fase inicial, devido à rápida cobertura do solo, mas é necessário, no futuro, enriquecer o povoamento com outras espécies, o que acaba por acarretar custos adicionais. Em Ilha Comprida, município instalado em área de proteção ambiental, ao sul do Estado - cuja prefeitura é parceira no projeto patrocinado pela FAPESP -, a resolução também apresenta bons resultados. Para ampliar a oferta de mudas e treinar produtores locais, foi instalado um viveiro municipal de espécies florestais de restinga e manguezal na área de um antigo depósito de lixo. As mudas de mangue estão sendo utilizadas no plantio de uma área de 6.700 m2 na zona urbana, que vem sofrendo processos erosivos. "Busca-se com esta alternativa evitar a execução
Replantio exige diversificação das várias espécies
de obras civis, que aumentariam muito o gasto de recursos para a contenção da erosão", conta o prefeito Décio José Ventura. "O projeto", ele avalia, "criou uma nova consciência entre os viveiristas. Eles próprios estão sugerindo, por' exemplo, a produção de muda conhecida na região como cataia (Pimenta pseudocaryophyllus), espécie utilizada na produção de cachaça típica da região." Também está em estudo um projeto de arborização do setor urbano com mudas nativas produzidas nos viveiros locais. "A resolução pode se consolidar como instrumento legal de restauração da biodiversidade paulista", avalia Ricardo Ribeiro Rodrigues, da Esalq. Além da resolução e do manual sobre espécies, o projeto patrocinado pela FAPESP promoveu, ao longo de dois anos, uma série de ações de transferência de conhecimento à sociedade, como o treinamento de viveiristas e produtores de sementes, cursos sobre a conser-
vação, sobre tecnologia de sementes e produção de mudas, bem como de educação ambiental em escolas, além de um série de seminários. O último seminário e o workshop sobre a recuperação de áreas degradadas, realizados nos dias 12 e l3 de setembro, no Instituto de Botânica, reuniram cerca de 550 pesquisadores, técnicos, policiais ambientais e especialistas em meio ambiente e reflorestamentos, além de prefeitos, para avaliar os avanços e perspectivas da Resolução SMA n> 21/01. As contribuições fizeram avançar os critérios estabelecidos na resolução e deverão resultar na edição de um novo conjunto de regras, uma nova resolução. Dentre as modificações previstas está o número de espécies necessárias para garantir uma diversidade. Assim, para áreas de recuperação maiores que 1 hectare, a nova proposta sugere o plantio de, no mínimo, 80 espécies arbóreas diferentes, com um limite máximo de 20% do
total de mudas para qualquer espécie. As espécies escolhidas deverão estar incluídas em dois grupos ecológicos: pioneiras e não pioneiras, considerando o limite mínimo de 40% para qualquer dos grupos. Outros aspectos também considerados pelos especialistas referem -se aos critérios necessários para a recuperação por meio da semeadura direta, indução e/ou condução da regeneração natural, entre outras. Tais projetos devem levar em conta a avaliação da paisagem; avaliação do histórico de degradação da área; avaliação e retirada dos fatores de degradação; avaliação dos processos de regeneração natural e aproveitamento do potencial de auto-recuperação. O secretário do Meio Ambiente, José Goldemberg, que participou do evento, garantiu que a secretaria está disposta a editar novas resoluções para enfrentar o desafio de recuperar as áreas degradadas do Estado. "Esse projeto de política pública é paradigmático", ele afirmou, lembrando que a qualidade do programa de recuperação de matas ciliares garantiu à SMA um financiamento de US$ 7,7 milhões do Banco Mundial. O diretor científico da FAPESP,José Fernando Perez, também esteve presente. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 25
Endeavot Sebrae-S P e FAPESP firmam parceria inovadora
parceiro participa na sua área de competência, aliando a inovação, empresas e'pesquisa", diz Marcelo Dini Oliveira, gerente da Unidade de Inovação e Aces;< so a 'Iecnologias do Sebrae-SP. A FAPESP coloca à disposição do projeto sua expertise na seleção eacompanhamento de projetos de inovação tec- . nológica; o Empreender Endeavor, a experiência na seleção e suporte estratégico para empreendedores inovadores e na capacitação gerencial; e o Sebrae-SP, seu know-how na gestão de negócios de .pequenas empresas e sua relação com mercado. Os cursos - que serão conduzidos pelo W-Institute, parceiro educacional contratado - são o núcleo do projeto, Serão realizados em 49 municípios paulistas que abrigam projetos financiados.pelo PIFE, e a primeira turma contará. com cem participantes, Parte das atividades será presencial e ocorrerá em espaço físico cedidopela FAPESP. Outras atividades poderão ser realizadas a ' distância; pore meio de ferramenta de e-Iearning. Os empreendedores terão, ainda, acesso gratuito a reuniões dê . aconselhamento estratégico, participação igualmente, gratuita em seminários semanais, além de ter a oportunidade de desenvolver projetos :t. específicos de interesse de suas empresas Com o apoio de estudantes de pós-graduação de universidades conveniadas, recrutados pelo parceiro educacional.
o
Estes estudantes poderão colaborar, por " exemplo, na elaboração e realização do plano de negócio da empresa, uma das dificuldades mais comumente apon, tadas por en;ipreendores' na busca de parceiros de risco. I"Será, na verdade, um curso com consultores'l.resume Marília Rocca, diretora-geral do Endeavor,uma organização sem fins lucrativos,que iniciou suas atividades no Brasilem 2000 e ruja missão é gerar emprego e renda por meio do fomento à cultura empreendedora baseada na oportunidade e na inova- ' ção. Os participantes poderão também consultar - por meio eletrônico - uma rede de 300 empresários-voluntários mantida pelo Endeavor, que reúne diretores de empresas como Danone, Cisco,Votorantim Metais, Microssiga, apenas para citar uns poucos exemplos. Também terão assessoria de .advogados especializàdos em assuntos relevantes e com larga experiência no mercado, lgualmente ligados ao Endeavor.~(Opro, grama mova porque' reúne elementos que não andam' juntos em empreendimentos de base tecnológica: a capacitação de empresários, dirigida à necessidade de inovação, com orientação sobre patenteamento 'e capital de risco, além de qualificação para o desenvolvi, mento de novos modelos', diz Marília. O Sebrae-SP vai incluir os empreendedores participantes do projeto nas rodas de negócios voltadas para a área
de tecnologia, além de divulgar o programa entre as empresas da sua rede com o objetivo de trazer novos candi.datosao PIPE. Ó projeto será coordenado por um especialista - já contratado pelo Endeavor e que ficará locado na FAPESP responsável pela implementação do cronograma de trabalho, elaboração do material de comunicação, operacionalização das aulas, aplicação de formulários de avaliação do projeto e elaboração de entrevistas de pré-seleção, entre "Outrasatividades. Competitividade - Além de qualificar empreendedores e garantir a competitividade de sua empresa no mercado, o projeto poderá, ainda, fomentar par-cerias entre empresas e escolas, desenvolver tecnologias de acesso ao mercaao e programas de educação voltados para as necessidades, do público. "Não existe nada parecido no Brasil"; com)leta Marília. "Esse pode ser um modelo de formação de gestorês', observa ' Oliveira. '0 projetoesta orçado em R$ 808,4 mil. O Sebrae-SP responderá pelo custeio de 490/0 do custo total do projeto, ,e o Endeavor e a FAPESP,juntos, farão uma contrapartida financeira correspondente a 16,910/0 do custo total. As empresas participantes do programa também contribuirão para o seu custeiocom R$ 100,00 por empreendedor. •
Nesta primeira chamada, foram apresentados 29 projetos, dentre os quais selecionados os laboratórios participantes. Inicialmente, serão constituídos três grupos de trabalho. O grupo de Rede Externa vai implementar a infraestrutura externa dos laboratórios, testes de certificação, entre outras atividades necessárias à consolidação do que, no jargão de especialistas, é conhecido como Camada Física ou óptica da Internet Avançada. O grupo responsável pela Camada de Transporte vai analisar protocolos de comunicação para testar e definir padrões, aproveitando, inicialmente, o legado das redes Academic Network at São Paulo (ANSP) e Rede Metropolitana de Alta Velocidade (ReMAV) no Estado de São Paulo. Este grupo também vai conduzir pesquisas em engenharia de rede. O terceiro grupo vai trabalhar na Camada Aplicações, ou seja, na definição e acompanhamento de controle de instrumentos via Internet. Fará, inicialmente, um levantamento das tecnologias existentes e recomendará, por exemplo, softwares de controle de instrumentos, desenvolvimento de novos softwares, entre outras medidas necessárias. Os três grupos vão trabalhar de forma sinérgica, como partes de um único projeto. Ao final do 6° e do 12° mês de implementação do KyaTera serão realizadas reuniões para a apresentação dos resultados. Conteúdos digitais - O KyaTera será suporte para a implementação da Incubadora Virtual de Conteúdos Digitais, projeto que vai desenvolver metodologias cooperativas inovadoras, em ambiente de software livre e de código aberto. O software livre, propriamente dito, será um dos principais objetos de pesquisa. "Trata-se de um ambiente de cooperação auto matizada", detalha Imre Simon, coordenador deste projeto. 30 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
Diferentemente dos demais, esse projeto vai se organizar em função das demandas da comunidade científica por conteúdos acadêmicos. É, por assim dizer, quase uma obra em aberto. "A incubadora expressa de maneira paradigmática o conceito de bazar", compara Perez. Ele se refere à comparação da qual lançam mão dois antropólogos norteamericanos, Eric S. Raymond e Bob Young, no livro A Catedral e o Bazar, sobre o sistema operacional Lynux. Na catedral, a organização busca a perfeição absoluta. Já no bazar, a ordem é imperfeita e sujeita a permanente atualização, e o erro é um pressuposto. "A incubadora trabalha com o princípio do bazar. É aberta e de inteligência coletiva", compara Perez. O projeto inspira-se em experiências como a do site Source Forge, patrocinado por uma empresa pnvada, para o desenvolvimento de projetos de softwares livres. O site tem hóje 450 mil usuários de 40 mil projetos. "A comunidade desenvolvedora de software livre se apegou a essa proposta porque é um sistema padronizado", justifica Simon. Outro exemplo desse tipo de projeto é o site wikipedia.org, uma espécie de enciclopédia construída cooperativamente que, em menos de dois anos, já tem mais de 150 mil verbetes, mais que a Enciclopédia Britânica. O sistema permite a alteração, correção e recuperação de conteúdos, conhecido como sistema de controle de versões, e a intervenção de diversos usuários devidamente autorizados. A Incubadora de Conteúdos deverá funcionar de maneira semelhante. A Incubadora é inovadora também na forma de financiamento. Os projetos que completarem com sucesso seis meses de incubação poderão solicitar
auxílio à FAPESP. A primeira chamada deverá ocorrer dentro de um ano, quando está prevista a realização de uma avaliação crítica e pública do projeto. "Neste início, a Fundação vai funcionar como catalizadora de iniciativas de pesquisa. Se errar, não tem custo. ão há limite para a ousadia", afirma Perez. O site - incubadora.fapesp.br - já está funcionando em caráter experimental. No início de setembro, o site já hospedava 23 projetos e registrava 78 usuários. Um desses projetos quer reunir especialistas e interessados em analisar o Sistema Brasileiro de TV Digital. Outro projeto é o Arca, que pretende "organizar pessoas trabalhando em projetos transdisciplinares" Um terceiro é o Arte para Todos, que tem como objetivo oferecer "aos segmentos menos privilegiados o acesso ao conhecimento e à experimentação estética das Artes Visuais, usando Tecnologia Avançada da Informação': O site vai oferecer uma série de serviços que facilitem essa interação entre usuários e criar uma infra-estrutura de cooperação. Aprendizado eletrônico - A rede de fibra óptica implementada no KyaTera também vai apoiar o desenvolvimento das pesquisas de aprendizado eletrônico. A idéia é construir uma ferramenta comum, a partir de softwares abertos, fazendo convergir distintos esforços de pesquisa, com o objetivo de especificar, desenvolver e distribuir um conjunto único de ferramentas de suporte à aprendizagem. A coordenação do Tidia está analisando 34 projetos nesta modalidade de pesquisa.Também nesse caso, serão organizados três grupos de trabalho. O primeiro terá a tarefa de definir e disponibilizar desde ferramentas de trabalho até a documentação e o acervo técnico do projeto. O segundo grupo vai padronizar a arquitetura, linguagem e objetos de aprendizagem, entre outras tarefas. E o terceiro será responsável por dar suporte ao conjunto de ferramentas utilizadas no aprendizado a distância. Também nesse caso duas reuniões de apresentação de resultados serão realizadas ao final do primeiro semestre e do primeiro ano de trabalho. A expectativa é de que, no 12° mês de atividades, os grupos concluam a elaboração de um protótipo do ambiente de Educação a Distância sobre plataforma de Internet Avançada. •
• POLÍTICA CIENTÍFICA
E TECNOLÓGICA
• GOVERNO
Lula preside Conselho formado por 24 representantes do governo e dos setores de C& T
FEDERAL
Interlocução qualificada Presidente Lula reinstala Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia
O
presidente Luiz Inácio Lula da Silva reinstalou, no dia 11 de setembro, o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, uma instância criada em 1996 para assessorar o Planalto na definição de políticas de Ciência e Tecnologia. O conselho não se reunia desde março de 2001. A primeira reunião ocorreu logo depois da posse e a segunda, no dia 18 de setembro. Neste encontro, ficou decidido que o conselho vai operar com cinco comissões temáticas temporárias: de Coordenação; de Desenvolvimento Regional e Inclusão; de Prospectiva, Informação e Cooperação Internacional; de Interação com o Meio Acadêmico e Setor Empresarial; e de Acompanhamento e Articulação. A plenária do conselho se reunirá a cada três meses a as comissões terão
encontros mensais, sempre na segunda tro protótipo do VLS", disse. Mas requinta-feira de cada mês. clamou da ausência de mulheres. "Este Num gesto simbólico, o próprio conselho é um clube do bolinha", brinpresidente assumiu a coordenação do cou. No mesmo dia, assinou decreto conselho, que terá o ministro da Ciênampliando a sua composição de 12 para cia e Tecnologia, Roberto Amaral, co24 membros: doze ministros de Estamo secretário. "Quero dar minha con-~/oito representantes dos produtotribuição não sendo cientista, mas res e usuários de Ciência e Tecnologia sendo presidente da República, de ser e quatro representantes de entidades nauma espécie de indutor para que o cional de ensino e pesquisa, entre eles, conselho recupere o tempo perdido", uma mulher: Wrana Panizzi, reitora da disse o presidente, no dia da reinstalaUniversidade Federal do Rio Grande ção, Prometeu aumentar os investido Sul (UFRGS). mentos em ciência e tecnologia para José Fernando Perez, diretor cien2% do Produto Interno Bruto (PIE) e tífico da FAPESP, e Hermann Wever, ampliar o número de doutores em atipresidente do Conselho Consultivo da vidade no Brasil de 6 mil para 10 mil. Siemens e conselheiro da FAPESP, inO presidente voltou a defender a contegram o conselho. Perez participa das tinuidade do programa do Veículo Lancomissões de Desenvolvimento Regioçador de Satélite, depois da explosão nal e Inclusão e de Interação entre a do foguete em Alcântara que matou universidade e empresa. E Wever inte21 técnicos ( veja matéria na página 16). gra a comissão de Prospectiva, Informa"Vamos testar ainda nesse governo oução e Cooperação Internacional. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 31
• CIÊNCIA
LABORATÓRIO
MUNDO
Mais verde, menos estresse Sabemos, intuitivamente, que o contato com flores e plantas faz bem à saúde. Quase ninguém duvida de que a jardinagemou a simples contemplação de uma bela paisagem traz renovação física e mental. Mas como explicar esse efeito? Em um estudo publicado em junho no [ournal of Environmental Psychology, Terry Hartig, da Universidade de Contato Uppsala, na Suécia, concluiu que as pessoas se recuperam mais rapidamente do estresse quando entram em contato com a natureza. E, o que é melhor, esse restabelecimento ocorre em poucos segundos
• O protozoário mutante Pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, conseguiram criar uma versão geneticamente modificada do parasita causador da leishmaniose, doença que atinge 2 milhões de pessoas por ano, principalmente nos países pobres. Desprovido de moléculas conhecidas como fosfoglicanos, o protozoário mutante do gênero Leishmania mostrou-se perfeitamente apto a sobrevi-
uma redução na pressão arterial em menos tempo do que as pessoas que se sentaram em uma sala sem janelas e depois caminharam por uma área urbanizada. De acordo com outra pesquisa, a simples contemplação de paisagens naturais auxilia na reabilitação de pessoas recém-operadas. Roger Ulrich, da Universidade do Texas, nos Estados com plantas: efeito comprovado até na recuperação de cirurgias Unidos, constatou que os pacientes (The Wall Street [ournal, 26 que, depois disso, descaninternados em quartos com de agosto). Hartig submevista para a natureza se resaram em uma sala com teu 112 jovens a uma série vista para uma paisagem cuperam mais prontamente de tarefas estressantes - enarborizada e, em seguida, da cirurgia, em comparatre elas, dirigir um autoção com aqueles que ficapassearam por um local móvel por um local descoram em um lugar sem essa com árvores; recobraram nhecido. Os participantes, o ânimo e experimentaram vista privilegiada. •
ver no organismo de um hospedeiro por tempo indeterminado sem torná-lo doente (Science, 29 de agosto). Em sua versão natural, o parasita - transmitido aos homens e aos animais pela picada do mosquito flebótomo - consegue permanecer inativo durante longos períodos, reativando-se apenas para agravar os sintomas agudos da leishmaniose, que vão de leves ulcerações cutâneas a gravíssimas lesões nos órgãos internos. Os pesquisadores esperam que o parasita mutante possa ajudá-los a compreen-
32 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
der os mecanismos usados pela Leishmania para escapar do sistema imunológico e a desenvolver vacinas e tratamentos mais eficazes para combatê-Ia. •
• O cigarro, o DNA e o câncer de pulmão Se fumar é normalmente prejudicial à saúde, esse hábito pode causar danos ainda mais graves para as pessoas com problemas de reparo no material genético (DNA) das células: os membros desse grupo apresentam uma probabilida-
de até 124 vezes maior de desenvolver câncer de pulmão do que as pessoas que não fumam. Pesquisadores do Instituto de Ciências Weizmann, em Israel, investigaram em 68 pacientes fumantes e 68 nãofumantes a atividade da enzima OGG, uma das proteína associadas à correção de defeitos no DNA (Journal of the National Cancer Institute). Verificaram que a ação da enzima é rigorosamente a mesma nos dois grupos. Mas os problemas aparecem quando, a uma capacidade reduzida de regeneração do DNA por
Sob o olhar de Newton: forma de conhecer melhor o clima no planeta
carência dessa enzima, se acrescenta o tabagismo, o principal fator de risco para desenvolver câncer de pulmão. •
• O mapa da gravidade na Terra Saiu o primeiro resultado do Grace (Gravity Recovery and Climate Experiment), projeto conjunto entre as agências espaciais dos Estados Unidos e da Alemanha: é o mais detalhado mapa da gravidade terrestre, feito a partir de dois satélites idênticos lançados em março de 2002. De imediato, o trabalho deverá ajudar os oceanógrafos a entender melhor a circulação das correntes oceânicas profundas, que influenciam o tempo e o clima. As áreas vermelhas do modelo acima indicam as regiões nas quais a atração gravitacional da Terra é mais forte. •
• Pequenos tremores, grandes estragos As grandes falhas da crosta terrestre podem ser comparadas à fileira de botões de uma camisa apertada: basta saltar o primeiro e os outros se desgarram. Cada botão que voa equivale a um grande terremoto que, ao surgir em algum ponto do planeta, desencadeia uma série de abalos menores até dar origem a um novo tremor de grandes proporções. Por isso, ao traçar seus mapas projetando a localização e a intensidade de terremotos futuros, os geofísicos tendem a concentrar-se nos tremores maiores e a considerar os menores como atividade sísmica secundária. Em estudo recente, porém, Agnes Helmstetter, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, Estados Uni-
dos, sugere que esse método pode comprometer a precisão do prognóstico (Physical Review Letters, 10 de agosto).
Depois de analisar os registros de todos abalos secundários ocorridos nos últimos 28 anos no sul da Califórnia,
Agnês concluiu que a relação entre a magnitude de um terremoto e o número de abalos secundários provocados por ele não é diretamente proporcional. Segundo seus cálculos, o fator alfa, que determina essa relação, não é 1, como se acreditava, mas 0,8. Isso quer dizer, por exemplo, que o dobro de determinada magnitude não causaria necessariamente o dobro dos abalos secundários e que a todo abalo secundário também corresponde uma atividade sísmica própria - e importante o bastante para repercutir nos grandes terremotos. •
o gene sexual das abelhas Para ser fêmea, uma abelha tem de nascer com ao menos duas versões distintas de um gene chamado csd (determinador complementar do sexo). O macho só precisa de uma ou, eventualmente, duas cópias da mesma versão desse gene, que existe em uma dúzia de variações diferentes. A existência do csd foi proposta há 50 anos, mas só agora ele foi identificado pelo entomologista Robert Page, da Universidade da Califórnia, em Davis (Cell, 22 de agosto). Em abelhas, vespas e formigas - o grupo de insetos chamados himenópteros -, os ovos fertilizados geram fêmeas. Os machos não têm pai, quer dizer, nascem de ovos nãofertilizados. A vida social complexa desses insetos que vivem em colônias com raras fêmeas reprodutoras,
Vida ou morte: machos estéreis são devorados muitas trabalhadoras e um punhado de machos ociosos - é em grande parte comandada pela atividade do csd. As abelhas-rainhas copulam com muitos machos - talvez para garantir a mistura de genes. Ninguém sabe por que o sistema reprodutivo desses insetos evoluiu assim. Uma hipótese é que favoreça as fêmeas incapazes de encontrar
machos na natureza. Assim, elas conseguem gerar machos com os quais possam copular mais tarde. Mas a endogamia tem um preço. Se a fêmea copula com um macho que carrega um csd igual ao dela, metade da cria nasce estéril e é devorada pelas operárias. O próximo passo é descobrir por que versões idênticas do csd não funcionam juntas. •
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Remédios provocam quedas de idosos Delineia-se um grave risco para a qualidade de vida das pessoas idosas: o uso excessivo de medicamentos eleva a incidência de quedas. A conclusão emerge de um estudo coordenado por Suely Rozenfeld, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, e publicado na Revista Panamericana de Salud Publica. Suely entrevistou 634 mulheres com mais de 60 anos, freqüentadoras
• Escova de baixo custo aprovada Uma escova dental de baixo custo, cujo corpo e cerdas são feitas de um único material plástico, foi aprovada num teste realizado pelas pesquisadoras Symonne Parizotto e Célia Regina Rodrigues, da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP). Conhecida como monobloco e desenvolvida por Pedro Bignelli, professor da USP de Ribeirão Preto, essa
da Universidade Aberta da Terceira Idade, no Rio de Janeiro. Apenas 9,1% delas relataram que não haviam tomado medicamentos nos 15 dias anteriores. No outro grupo, 52,7% usaram de 1 a 4 medicamentos, 34,4% de 5 a 10 remédios diferentes e 3,8%, de 11 a 17 medicamentos. No universo de entrevistadas, 23,3% tinham sofrido uma queda nos 12 meses anteriores e 14%, duas ou mais. Dois tipos de medicamentos mostraram-se mais ligados
escova custa em média 15% do preço de uma escova vendida em farmácias. A pesquisa que comparou os dois tipos de escova envolveu 32 crianças de 4 a 6 anos de idade da cidade de Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Ambas as escovas apresentaram a mesma capacidade de remover a placa bacteriana, embora cerca de 60% dos depósitos de placa tenham persistido após a escovação, nas duas situações. "As crianças nessa idade ~inda possuem uma
A monobloco: com ou sem creme dental, o mesmo efeito
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à ocorrência de tombos. O primeiro são os beta-bloqueadores, que combatem a hipertensão e problemas cardiovasculares e podem provocar episódios de pressão arterial baixa. O outro grupo são os tranqüilizantes. A incidência de tombos recorrentes foi duas vezes maior entre os consumidores de beta-bloqueadores e 4,9 vezes maior entre os usuários de sedativos, comparados às idosas que não usavam tais drogas. "Muitas dessas que-
coordenação motora precária", comenta Célia Regina, que é professora de Odontopediatria da USP, alertando para a importância da supervisão dos pais na escovação durante essa fase. O estudo também comparou o desempenho da escova mono bloco usando-se ou não pasta de dente. Surpreendentemente, constatou-se que o uso do dentifrício (creme dental) não fez nenhuma diferença na remoção dos depósitos de placa. "Imaginávamos que o detergente das pastas de dente poderia ajudar na remoção, mas não houve diferença': diz a pesquisadora. Os resultados da pesquisa, publicados recentemente na revista Pesquisa Odontológica Brasileira, mostram o potencial da escova monobloco, sobretudo para populações carentes. Mas não se deve interpretar esses dados corno uma condenação à pasta de dente. "Os dentifrícios contêm flúor e seu uso é fundamental na realização da higiene bucal", afirma Célia Regina. •
das poderiam ser evitadas com um uso mais racional dos remédios", diz a pesquisadora. "Vivemos numa sociedade que se deixou medicalizar, um problema que atinge todos, não só aos idosos." Suely critica sobretudo o abuso dos tranqüilizantes, em geral, "usados para tratar problemas de ordem social, não médica", afirma. Dados dos Estados Unidos mostram que 42% dos idosos que sofrem quedas têm de ser hospitalizados. •
• A análise de genes do eucalipto Começou há dois meses o trabalho de data mining (garimpagem de dados) do genoma do eucalipto, mapeado por laboratórios e empresas paulistas no âmbito do projeto Forests - Eucalyptus Geno-
me Sequencing Project Consortium. As descobertas já começam a aparecer: um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), de Botucatu, descobriu um gene que pode conferir resistência a um herbicida. De modo geral, o que se busca são formas de melhorar a qualidade da madeira para celulose e a produção de aglomerados de madeira, além de aplicações em outros campos, como a indústria farmacêutica. Dessa etapa da pequisa, que deve terminar em janeiro do próximo ano, participam grupos de pesquisa de oito estados - Alagoas, Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catari-
á
na e São Paulo - sob a coordenação de Luis Camargo e Helaine Carrer, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP). •
a
• A poluição na gênese dos raios e
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Metrópoles de todo o mundo são fustigadas por uma quantidade cada vez maior de raios não apenas por causa do fenômeno conhecido como ilhas de calor - o aumento na temperatura de regiões urbanas causado pela impermeabilização do solo e as construções de concreto. "A poluição atmosférica também tem um papel importante na incidência crescente de raios", sustenta Osmar Pinto Iúnior, com base em
um estudo feito com outros dois pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Kleber Naccarato e Iara de Almeida Pinto e publicado na revista Geophysical Research Letters. Eles acompanharam as tempestades entre os verões de 2000
e 2002 em três regiões metropolitanas do Estado de São Paulo - a capital, Campinas e São José dos Campos - e comprovaram o aumento na incidência de raios: juntas, as três regiões foram alvo de 310 mil raios no período analisado e amargaram uma densidade de descargas elétricas de 60% a 100% maior que em regiões próximas menos urbanizadas. Tais dados combinavam com a teoria das ilhas de calor. Mas o estudo específico da Região Metropolitana de São Paulo revelou que os raios se intensificavam sempre que as partículas em suspensão no ar se avolumavam, segundo medições realizadas pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb). Acredita -se que a poluição exerça um duplo efeito sobre as tempestades. De um lado, colabora para a elevação da temperatura, potencializando as ilhas de calor. De outro, as partículas em suspensão formam núcleos de condensação na atmosfera, que fazem com que mais moléculas de vapor d'água se agreguem nas nuvens .e mais partículas de gelo sejam formadas. A fricção entre essas partículas produz cargas elétricas que se acumulam - e vão converterse em raros. •
Perigo urbano: partículas no ar atraem descargas elétricas
• Os vermes persistentes Um estudo realizado no município alago ano de Barra de Santo Antônio, a 40 quilômetros de Maceió, reafirma uma antiga equação dos sanitaristas: sem investir em saneamento básico e educação sanitária, é impossível combater as verminoses em comunidades pobres. Gilberto Fontes e Eliana Maurício da Rocha, da Universidade Federal de Alagoas, avaliaram a prevalência de parasitoses intestinais entre 1.020 alunos da 13 a 43 séries da rede de ensino da cidade, num trabalho financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal). O exame parasitológico de fezes mostrou que 938 estudantes (92%) estavam contaminados - e 767 traziam até oito tipos de vermes ao mesmo tempo, o chamado poliparasitismo. As crianças foram tratadas com medicamentos contra as verminoses. Seis meses depois, os pesquisadores retomaram e reexaminaram uma amostra de 383 estudantes. Pois 347 (novamente mais de 90%) estavam outra vez contaminados e 281 apresentavam até seis tipos de vermes. Segundo esse estudo, aceito para publicação na
Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, o único ganho foi uma redução no grau de poliparasitismo. "Não houve uma diferença significativa antes e depois de tratamento, o que revela a necessidade de investir em saneamento na melhoria das condições socioeconômicas da população", diz Fontes. Cidade turística com praias belíssimas, Barra de Santo Antônio é um dos municípios mais pobres de Alagoas: apenas 1,2% das casas têm saneamento básico. •
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da rede ONSA (consórcio virtual de laboratórios genômicos do Estado de São Paulo, na sigla em inglês), começam a escrever com tintas nacionais o que pode ser um novo capítulo na trajetória da esquistossomose - desta vez, com notícias alvissareiras. Eles determinaram, de forma integral ou parcial, as seqüências de 92% dos estimados 14 mil genes do parasita. Por analogia com o material genético de outros organismos seqüenciados, descobriram a função de 45% dos genes do verme. Os outros 55% representam seqüências totalmente novas ainda não se sabe quais proteínas derivam de sua ação. "Pouco mais da metade dos genes do parasita nunca havia sido identificada em outros organismos': afirma Sergio Verjovski-Almeida, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), coordenador do projeto, orçado em US$ 1 milhão, apoiado também pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). "Antes, eram conhecidas as seqüências completas de apenas 163 genes do verme. Elevamos esse número para 510 genes." 38 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
Para alcançar esse índice de informações inéditas sobre os genes do parasita da esquistossomose, os cientistas geraram 163 mil seqüências parciais de genes ativos nos seis principais estágios do ciclo de vida do verme, desde-as formas que vivem livremente na água doce até as que habitam seu hospedeiro intermediário, o caramujo, e as que infestam o homem (veja acima o ciclo de vida do parasita). tesda publicação dos resultados da rede ONSA, havia só 16 mil trechos de seqüências expressas - as expiessed sequence tags, ou etiquetas de seqüências expressas (ESTs)do verme da esquistossomose nas bases públicas de dados, 75% delas derivadas do estágio adulto do parasita. "Aumentamos em mais de dez vezes esse número", comemora Emmanuel Dias Neto, do Instituto de Psiquiatria da USP, participante do projeto. A façanha deve ser duplamente festejada: resulta da aplicação, por brasileiros, de um método nacional de encontrar ESTs, chamado
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Orestes. Ao lado de Andrew Simpson, hoje no escritório de Nova York do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, Dias Neto é um dos inventores desse método que identifica regiões centrais de genes expressos, que levam à formação de proteínas atuantes nos diferentes estágios analisados. Os resultados desse trabalho foram anunciados no dia 15 de setembro em uma cerimônia realizada no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, com a presença de representantes das universidades públicas paulistas, da comunidade científica e de autoridades do Estado. ''A conclusão do trabalho com o Schistosoma mansoni é mais um feito da ciência de São Paulo e do Brasil", disse o governador Geraldo Alckmin. "Somos um exemplo para a pesquisa na América do Sul': afirmou o presidente da FAPESP, Carlos Vogt, também presente ao evento. Em Brasília, no dia seguinte à apresentação dos resultados, Verjovski, os outros 37 pesquisadores do Genoma Schistosoma mansoni e a FAPESP ganharam reconhecimento público, na
forma de um Voto de Aplauso, conferido pelo Senado na sessão de 16 de setembro. A data para a divulgação do trabalho não foi escolhida ao acaso. Precisamente nesse dia, a versão eletrônica da revista Nature Genetics, um dos periódicos científicos de maior prestígio, antecipou em sua página na Internet o conteúdo de dois artigos sobre parasi-, tas causadores da esquistossomose: um texto de dez páginas escrito pelos cientistas brasileiros do Genoma Schistosoma mansoni e outro de nove páginas redigido por um grupo chinês que analisou genes e proteínas do Schistosoma japonicum, a espécie do verme que provoca a doença na Ásia. Feitos por grupos concorrentes, ambos os artigos renderam a principal chamada de capa da edição impressa de outubro da Na-
ture Genetics. No projeto concorrente à iniciativa da ONSA, pesquisadores do Centro Nacional Chinês de Genoma Humano, em Xangai, utilizaram a forma tradicional de procurar ESTs e geraram 43.707 fragmentos de seqüências expressas (qua-
tro vezes menos que os brasileiros) a partir de material coletado de apenas dois estágios de vida do S. japonicum o projeto da ONSA trabalhou com seis estágios do ciclo do S. mansoni. Ainda assim, os chineses dizem que. suas seqüências estão relacionadas a 13.131 genes dos 15 mil que, segundo eles, constituem o genoma do S. japonicum. Apenas 35% dos genes identificados no projeto chinês nunca haviam sido encontrados antes em outros organismos, ao passo que no trabalho brasileiro, como se verificou, esse índice chegou a 55%. ssa quantidade de genes inéditos pode ser uma decorrência de o S. mansoni ser um verme muito antigo. Segundo cálculos da equipe brasileira, o parasita diferenciou-se de outras espécies de animais multicelulares, a partir de um ancestral comum, há 1 bilhão de anos. Assim, originou uma linhagem independente de seres que apresentam os lados esquerdo e direito do corpo simétricos,
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mas não possuem tubo digestivo nem uma cavidade contendo os órgãos internos. "O S. mansoni é o mais antigo animal a apresentar dimorfismo sexual com genes seqüenciados'; afirma Verjovski. Ou seja: o macho e a fêmea do verme apresentam formas distintas: os exemplares do sexo masculino são maiores que os do sexo feminino. A importância atribuída ao artigo dos pesquisadores paulistas na Nature Genetics lembra outra recente façanha dos membros da rede ONSA. Em julho de 2000, eles conseguiram a capa da revista Nature, da qual deriva a Nature Genetics, ao se tornarem o primeiro grupo do mundo a terminar o seqüenciamento integral do genoma de uma bactéria que ataca plantas: a Xylellafastidiosa, causadora da Clorose Variegada dos Citros (CVC), ou amarelinho. A diferença é que, agora, o feito foi dividido com os chineses, talvez o país emergente que mais concorra com o Brasil na área genômica. Em dois anos, o Genoma Schistosoma mansoni envolveu 37 pesquisadores e nove laboratórios da rede PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 39
ONSA e gerou resultados de destaque como a descoberta de 46 genes, que, a princípio, podem ser úteis na busca de novos medicamentos, além de 28 genes candidatos a alvo de uma vacina contra a doença. Para garantir a proteção intelectual de eventuais produtos derivados de seus achados, os cientistas da ONSA pediram a patente nos Estados Unidos sobre o direito de uso de 1 mil fragmentos ativos de DNA do parasita. Tais pedaços de genes podem ser de grande valia também para criar formas mais eficazes de diagnóstico ou prevenção da esquistossomose. "Queremos evitar a biopirataria de nossos dados e buscar parcerias com empresas para custear os estudos para desenvolvimento de drogas e vacinas", explica o diretor científico da FAPESP,José Fernando Perez. "O genoma do Schistosoma mansoni é uma iniciativa de grande impacto social." oje,há indícios de que o medicamento mais usado contra a esquistossomose, o praziquantel, está perdendo eficiência,principalmente na África, o continente mais afetado. Ainda não há vacina contra a doença, que afeta 200 milhões de pessoas em 75 paísesé superada apenas pela malária, com 300 milhões de casos. Os dados sobre o número de mortes em decorrência da esquistossomose variam enormemente: vão de 11 mil a 200 mil óbitos anuais, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Há ainda seqüelas e perda de qualidade de vida associadas aos casos mais graves da doença, cerca de 10%. A esquistossomose é uma moléstia típica de países ou regiões pobres, em que faltam água encanada, rede de esgotos - saneamento básico, enfim -, além de campanhas educativas capazes de prevenir a contaminação. O homem elimina nas fezes os ovos do verme, que, em locais onde não há sistema adequado de esgoto, encontra seu hospedeiro inter-
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tra a esquistossomose. Nessa abordagem, os pesquisadores alteram genes do parasita possivelmente ligados ao desenvolvimento da doença. Depois, inoculam nos roedores um preparado contendo os genes modificados e os infectam com um elevado número de vermes. União antiga: hospedado pelos Biomphalaria, Até agora, a equipe do o S. mansoni surgiu há um bilhão de anos Butantan já testou vacinas com oito genes alterados. Os resultados iniciais com mediário, os caramujos de água doce dois genes mostraram-se razoáveis e do gênero Biomphalaria. No molusco, servem de estímulo para o trabalho proso Schistosoma se reproduz por cerca de 30 dias e retoma para a água - é seguir. "Conseguimos uma imunização de cerca de 35%", diz Luciana Cezar de nessa fase que se torna capaz de infecCerqueira Leite, do Butantan. "A OMS tar o ser humano. Criar uma vacina contra a esquistosdiz que uma vacina com 45% de eficácia é aceitável." É preciso ficar claro somose não é fácil. É uma tarefa para cinco ou dez anos, caso alguma linha o que significam esses números. Nesde pesquisa se mostre realmente -prose caso, uma proteção de 35% quer dizer que, se entrarem em contato com missora. O Instituto Butantan - um dos centros que participaram do estudo do uma população de cem parasitas, os genoma do verme, ao lado da Univeranimais imunizados com as mais efisidade Estadual de Campinas (Unicamp) cientes candidatas a vacinas de DNA e do Instituto Adolfo Lutz - já testou serão infectados por 65 parasitas. A imunização gênica consegue reduzir a em camundongos seqüências de DNA população de vermes no animal, o que que poderiam atuar como vacina conjá é um avanço no controle da infecção, mas não impede o desenvolvimenPROJETO to da esquistossomose.
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Genoma Schistosoma mansoni MODALIDADE
Programa Genoma - FAPESP COORDENADOR SERGIO VERJOVSKJ-ALMElDA
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Instituto de Química da USP INVESTIMENTO
US$ 500.000 00 (FAPESP) US$ 500.000 00 (CNPq) 1 1
Arsenal inteligente - Alguns genes recém-identificados do S. mansoni po-
dem ser úteis para a criação de fármacos, na medida em que fornecem importantes pistas sobre os mecanismos que permitem ao parasita driblar o sistema imunológico humano e permanecer a salvo na corrente sangüínea. Uma das descobertas mais interessantes diz respeito a um grupo de quatro genes com funções semelhantes. Com
eles, as células do verme fabricam quatro tipos de compostos químicos que provocam reação alérgica no organismo humano - as toxinas alergênicaso Curiosamente, cada uma dessas toxinas é similar ao veneno de espécies distintas de vespa. A síntese desse arsenal químico detona uma resposta alérgica especifica no sistema imunológico, que produz anticorpos contra essas toxinas, mas não direciona sua ação contra o próprio parasita. Outra descoberta de peso: o S. mansoni tem um gene responsável pela produção de uma proteína anticoagulante parecida com uma toxina encontrada no veneno de serpentes. Por não deixar o sangue do indivíduo contaminado coagular ao redor do parasita, essa toxina dificulta a identificação do Schistosoma mansoni pelo sistema de defesa do organismo no qual se instala. Funciona, portanto, como mais um despiste do verme.
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Capa da Nature Genetics de outubro: brasileiros e chineses desvendam o verme da esquistossomose
decorrentes da doença no território nacional. Em 1979, ocorriam sete mortes a cada 1 milhão de habitantes. Em 1999, esse índice caiu para três por 1 milhão. No Nordeste, a região mais afetada pela doença, também se verificou uma diminuição nos óbitos da ordem de 50% nesses 20 anos. O problema é que o número de mortes por 1 milhão de habitantes caiu de 12 para seis. Ou seja, o índice de letalidade da esquistossomose no Nordeste ainda é o dobro da média brasileira. Não se deve, no entanto, pensar que a moléstia é uma chaga exclusiva dos nordestinos. "Não há duvida de que o uso de medicamentos fez cair a mortalidade associada à doença em todo
o país", observa o parasitologista Paulo Marcos Zech Coelho, coordenador geral do Programa Integrado de Esquistossomose da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). "Mas a esquistossomose ainda está em expansão geográfica no Brasil, longe de ser controlada." Segundo Coelho, focos da doença foram descobertos nos últimos anos até nos Estados da região Sul, áreas antes livres desse problema. "Criar uma vacina eficaz contra a doença é difícil, mas os dados do genoma do Schistosoma mansoni podem ajudar no desenvolvimento de novas drogas para tratar a esquistossomose," Espera-se que, assim, o praziquantel deixe de ser a única arma contra a doença. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 41
• CIÊNCIA
MICROBIOLOGIA
Sobrevivente das selvas Análise de genes ajuda a entender mecanismos de adaptação de bactéria comum nas águas escuras da Amazônia
; idase com poucos nutrientes, as águas cor de café do rio Negro, no Amazonas, não devem ser o melhor local para viver. A temperatura chega facilmente a 40° Celsius, a radiação ultravioleta do Sol é intensa e a concentração de agentes tóxicos como metais pesados e radicais livres é elevada. Ainda assim, tanto o rio quanto o solo de suas margens abrigam quantidades elevadas
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de uma bactéria de vida livre, a Chromobacterium violaceum, agora mais bem conhecida. Em 30 de setembro, 107 pesquisadores do projeto Genoma Brasileiro publicaram um artigo na revista norte-americana Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) apresentando o seqüenciamento de todo o genoma (conjunto de genes) desse microorganismo. Além dos dados básicos, como a dimensão do genoma (cerca de 4,7 milhões de pa-
res de bases nitrogenadas) e o número estimado de genes (4.431), o artigo destaca uma peculiaridade da C. violaceum que parece ser vital para sua adaptação às águas de ambientes tão remotos quanto a Amazônia, oeste da África ou Austrália: 11% de seus genes (496) contêm instruções para a produção de proteínas de membrana celular relacionadas ao transporte de substâncias de fora para dentro da bactéria e vice-versa.
dências de que pode ter ação Os pesquisadores identiantibacteriana e antiviral. ficaram, por exemplo, 35 geEncontrada em ambientes nes ligados à utilização do tropicais e subtropicais, é a ferro e 14 que amenizam os única espécie desse gênero efeitos do calor. "Esse conjuneventualmente patogênica ao to de proteínas transportaser humano, sobretudo criandoras permite à bactéria uma ças e velhos: não costuma caueficiente exploração de baixas sar problemas sérios, embora concentrações de nutrientes existam registros de casos de e é responsável pela sua toleinfecções severas nos Estados rância a muitos agentes tóUnidos, França e Coréia do xicos", afirma Ana Tereza Sul. Mas foi sua abundância Vasconcelos, do Laboratório no rio Negro que motivou sua Nacional de Computação C. violaceum e o rio Negro: fonte potencial de antibióticos escolha como objeto de estuCientífica (LNCC), de Petródo, além da perspectiva de gerar proparece apresentar uma série de propolis, coordenadora do projeto. Tocadutos de valor econômico. priedades de interesse médico e ambido por uma rede nacional de 25 laA equipe do Genoma Brasileiro entalo A violaceína já é empregada em boratórios de pesquisa, espalhados por acredita que a C. violaceum possa ser uti15 estados, do Amazonas ao Rio Grantratamentos dermatológicos e há evilizada como uma biofábrica, capaz de de do Sul, o seqüenciamento do genoproduzir, por exempo, certos tipos de ma do microorganismo custou quase PROJETO plástico. "Para garantir a proteção inteR$ 12 milhões, financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento lectual de eventuais aplicações que posProjeto Genoma Brasileiro sam surgir a partir dos resultados de Científico e Tecnológico (CNPq). Parte nosso trabalho, antes de publicarmos da verba foi usada na compra de equiCOORDENADORA pamentos especiais, os seqüenciadores, o artigo na PNA5, pedimos patentes ANA TEREZA VASCONCELOS sobre genes da Chromobacterium", diz para os laboratórios da rede nacional. Laboratório Nacional Ana Tereza. Compreender os mecanisPrimeiro organismo seqüenciado de Computação Científica (LNCC) mos que a bactéria emprega para se pelo consórcio nacional de laboratóadaptar a ambientes diferentes pode rios, a C. violaceum ganhou esse nome INVESTIMENTO ser o primeiro passo para explorar suas por produzir um pigmento de cor R$ 11.990.074,84 (CNPq) potencialidades biotecnológicas. • púrpura denominado violaceína, que
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• CIÊNCIA
SAÚDE
PÚBLICA
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Cresce o número de moradores das grandes cidades que aderem à atividade física moderada
ada dia, quase 1.000 moradores da Região Metropolitana de São Paulo - a mancha urbana formada pela capital e pelos 37 municípios vizinhos, com 17 milhões de habitantes - começam a caminhar ou a praticar algum tipo de atividade física com regularidade. No ABC paulista, são quase 40 pessoas por dia que decidem acordar cedo e incorporar o hábito de caminhar na rua ou no parque mais próximo, de acordo com o Centro de Estudo do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul (Celafiscs),o mesmo que atestou o crescimento nada desprezível de 2% ao ano no contingente de paulistas que acrescentaram as atividades físicas à rotina. Mas não sejamos bairristas: a adesão a atividades físicas regulares e moderadas para combater a obesidade e sedentarismo avança também em outras capitais. Curitiba, vista há anos como exemplo de planejamento urbano, desponta agora como uma boa cidade para atividades físicas, com base em um estudo feito a partir de entrevistas com
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2.000 pessoas em 30 municípios paulistas, incluindo a cidade de São Paulo, e 400 na capital paranaense. Entre os euritibanos, 31% conheciam as pistas exclusivas para bicicletas de sua cidade, lembradas por apenas 19,6% dos paulistas, em média. Entre os curitibanos, 35% conhecem os espaços de lazer gratuitos onde se pode caminhar e praticar esportes, em comparação com 25% dos paulistas. Ao comparar o nível de atividade física entre os dois grupos de cidades, o autor desse estudo, o médico ortopedista Victor Matsudo, presidente do Celafiscs, notou um resultado equivalente: cerca de 60% dos moradores tanto da capital paranaense quanto das cidades paulistas fazem atividades moderadas. "Podemos interpretar essesdados como um sinal de que a mensagem do programa Agita São Paulo está rendendo frutos e as pessoas estão mais conscientes da importância de se exercitar", comenta Matsudo, organizador do 26° Simpósio Internacional de Ciências do Esporte, que se realiza de 23 a 25 de outubro na capital paulista.
o Agita São Paulo, um dos destaques desse encontro, no qual está prevista a apresentação de 900 trabalhos científicos,é um projeto que desde 1996 divulga a idéia de que não é preciso praticar esportes ou matricular-se numa academia de ginástica para se exercitar com eficiência. Ao contrário: atletas de fim de semana e malhadores compulsivos correm riscos ao exigir demais do próprio corpo. O Agita São Paulo pontifica: vale mais incorporar ao diaa-dia hábitos saudáveis que nem parecem ginástica, como subir escadas em vez de pegar um elevador, levar o cachorro para passear e descer do ônibus um ponto antes do destino. Uma caminhada de 30 minutos por dia - em até três blocos de 10 minutos - é suficiente para afugentar a obesidade e o sedentarismo, responsáveis por 15% a 20% dos casos de câncer, doenças do coração e diabetes. O Agita São Paulo é o resultado de uma parceria entre o Celafiscs e a Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, proposta em 1996 pelo então Secretário da Saúde José da Silva Guedes.
Complemento ao passeio no parque: exercício contra o sedentarismo e a obesidade
"Houve um tempo em que os problemas de saúde se resolviam com obras de saneamento, e dependíamos dos engenheiros para promover a saúde", comenta Guedes, professor de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo e consultor científico do Agita São Paulo. Depois, foi a vez das vacinas e remédios - eis a saúde nas mãos de médicos e enfermeiros. "Hoje, quando o sedentarismo é um fator de risco para uma série de problemas de saúde", diz Guedes, "podemos contar com um professor de educação física que oriente sobre exercícios ou um grupo de vizinhos que resolva fazer caminhadas." Guedes foi professor de Matsudo na Santa Casa e desde os anos 70 acompanhava seu trabalho. A reaproximação levou à criação de uma organização não-governamental, também chamada de Agita São Paulo, formada pela secretaria e pelo Celafiscs. Esse modelo foi
decisivo: se fosse um programa apenas privado, talvez não tivesse recursos para crescer; se somente público, estaria sujeito a solavancos políticos. Foi o que se deu com um dos frutos do Agita São Paulo, o Agita Brasil, criado em 2000 pelo Ministério da Saúde, mas interrom. pido com a mudança de governo. "No começo, éramos muito criticados, pois ninguém acreditava que o exercício moderado fosse suficiente': lembra o professor de educação física Luis Carlos de Oliveira, do Celafiscs. Aos poucos, o Agita São Paulo criou atividades para públicos específicos - jovens, idosos e trabalhadores. A mais abrangente é o Agita Mundo, parte de uma rede mundial de caminhadas em comemoração ao Dia Mundial da Saúde, festejado no dia 7 de abril. Nas ruas e no metrô - Hoje apoiado pelo atual secretário da Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata, o Agita também estimula prefeituras a construir calçadões e ciclovias e a fazer campanhas em locais públicos. "Quando há ambientes adequados e informação, as pessoas começam a caminhar com re-
guiar idade", comenta Oliveira. Em estações de trem e metrô, o programa instalou cartazes sugerindo o uso das escadas no lugar das escadas rolantes. No ano que vem, o programa vai integrar-se ao esforço da Organização Mundial de Saúde, que escolheu 2004 para lançar sua estratégia global de combate à obesidade e ao sedentarismo. A mensagem será a mesma: 30 minutos por dia de atividade física bastam para prevenir doenças e garantir qualidade de vida. Entre os convidados estrangeiros ao simpósio há três norte-americanos. Barry Franklin, da Wayne State University, vai fazer uma conferência sobre os benefícios das caminhadas. Steven Blair, do Instituto Cooper, vai apresentar um estudo feito com 16.878 homens entre 40 e 87 anos que estabelece uma relação estatística entre o mau condicionamento cardiorrespiratório e a ocorrência de derrames cerebrais. Mike Pratt, do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), narrará a experiência da campanha Healthy People 2000, pioneira na disseminação do estilo de vida ativo. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 45
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GEOLOGIA
As praias perdidas E rosão e recuo do mar redesenham o litoral brasileiro FABRícIO
MARQUES
m julho de 1993, o Farol da Conceição cedeu à ação do mar e desabou em uma das praias de São José do Norte, no sul. do Rio Grande do Sul. A queda do farol é o resultado de uma batalha silenciosa que se desenrola há anos nesse município gaúcho de 27 mil habitantes, distante 350 quilômetros de Porto Alegre e cenário de lutas da Revolução Farroupilha no século 18. Ali, as águas do oceano Atlântico disputam espaço com a areia e avançam de modo sorrateiro sobre uma faixa de 30 quilômetros de praias desertas de areia firme e escura. Construído no início do século passado numa estreita faixa de terra entre o mar e a Lagoa dos Patos - a maior do país -, o Farol da Conceição ficava até os anos 40 a 80 metros do mar, guiando as embarcações que chegavam ao porto de Rio Grande. Só caiu por causa do processo de erosão natural, decorrente de ondas vigorosas que a cada ano consomem 3 metros de areia. Seu posto é hoje ocupado por outro farol, feito de alumínio e instalado no alto de uma duna. Exemplos como o de São José do Norte são mais comuns do que se imagina. Cerca de três quartos do litoral brasileiro encontra-se num processo constante de transformação, que torna a aparente estabilidade da si46 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
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Vila do Cabeço, na foz do São Francisco: erosão destruiu as casas do povoado e deixou dentro d'água o farol que antes ficava em terra firme
lhueta de nossos 8.000 quilômetros de costa uma referência apenas nos mapas escolares. Atualmente, 40% das praias são fustigadas por algum processo erosivo e perdem terreno para o mar, enquanto em 10% da costa brasileira ocorre o inverso - a areia avança sobre o oceano, um fenômeno chamado de progradação -, de acordo com as conclusões do primeiro levantamento nacional sobre as alterações do perfil litorâneo. Segundo esse estudo, a erosão corrói também um quarto dos paredões naturais de rocha (falésias) e invade a desembocadura de 15% dos rios que deságuam no oceano. Em outros 15% dos casos a foz dos rios ganha espaço sobre o mar. Concluído recentemente, o Diagnóstico de Erosão e Progradação Costeira resulta de um esforço coletivo de 16 grupos de pesquisa e mostra que o desaparecimento das praias em alguns pontos e o crescimento das faixas de areia em outros ocorre com maior ou menor intensidade nos 17 estados
brasileiros banhados pelo Atlântico, dependendo da geografia local. Esse levantamento indica não apenas os trechos mais afetados e os pontos mais suscetíveis à força das ondas, como a região Nordeste, na qual as praias apre. sentam inclinação suave e facilitam a invasão do mar. O diagnóstico faz ainda um mapeamento detalhado das áreas em que a ocupação humana corroeu a paisagem e daquelas em que a transformação do litoral é obra da natureza. Por essa razão, deve orientar a criação de uma rede permanente de monitoramento dos trechos de maior risco e auxiliar na elaboração de normas que imponham limites mais rigorosos para a construção de casas e condomínios à beira-mar. "A fixação desses limites depende da velocidade de recuo da costa e do monitoramento das áreas de risco", comenta o geógrafo Dieter Muehe, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador geral do levantamento, fi-
nanciado pela Secretaria da Comissão lnterministerial para os Recursos do Mar (Secirm). Segundo Muehe, a adoção de recomendações adota das pelo Ministério do Meio Ambiente, como não construir a menos de 50 metros da praia em áreas urbanas e a distâncias inferiores a 200 metros nas regiões ainda não ocupadas - algo que não se observou até hoje em boa parte dos municípios costeiros -, evitaria problemas como os enfrentados em 2001 pela população da Barra de Maricá, no litoral norte do Rio de Janeiro, onde uma tempestade pôs abaixo um conjunto de casas construídas na faixa de areia. Esse trecho da costa tluminense se encontra numa área em que o emagrecimento da faixa de areia é cíclico - em um ano as águas tomam a praia, que se recupera no ano seguinte. Sem respeitar os limites impostos pelo oceano, os proprietários reconstruíram as casas e ergueram muros de defesa na areia, mutilando a paisagem. PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 47
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fil da praia do Cassino. Considerada a Dividido em 16 capítulos, o levanmais extensa praia do planeta com seus tamento deve ser publicado até o final 245 quilômetros de extensão, a praia do deste ano na forma de atlas, com mapas Cassino tornou-se ainda maior: endos trechos avaliados de cada estado. O gordou 450 metros desde 1947. Mais Rio Grande do Sul, com um litoral de ao norte da barreira artificial, a praia fácil acesso para os pesquisadores, é do Mar Grosso cumpre o estado que melhor eso destino oposto e vem quadrinhou sua orla encolhendo num ritmo marinha e reuniu inforMuros de 1,4 metro por ano mações coletadas durante os últimos 80 anos num trecho de quatro à beira-mar quilômetros. É algo sesobre os 640 quilômetransferem melhante ao que ocorre tros da costa gaúcha. Já em Ilhéus, no sul da Bao Maranhão, na região a erosão hia, onde a construção de Nordeste, e o Pará, na para o terreno um porto provocou eroNorte, dispõem apenas são severa nas praias ao de informações mais revizinho centes sobre as condinorte e acúmulo de areia nas praias ao sul. ções das praias, carência A situação de alerta que dificulta a comprenão significa, porém, que toda a costa ensão de como esses fenômenos evose encontre ameaçada. As praias ensoluem no tempo. laradas - e cercadas por coqueiros no O jogo de avanços e recuos do oceano remodela a costa brasileira desde Norte e no Nordeste ou rodeadas por morros no Sul e no Sudeste - não deque a América do Sul começou a se sevem desaparecer, embora se transforparar da África há 130 milhões de anos. mem com a ação do mar. Por hora, os É um fenômeno natural determinado pela energia das ondas e as característiefeitos da erosão são mais graves em trechos restritos, localizados sobrecas geológicas das praias, que orientam tudo em áreas urbanizadas, alvo de esas correntes marinhas e o transporte de peculação imobiliária recente como areia, a exemplo do que se observa em em Matinhos, balneário situado a 111 São José do Norte. Também é assim no quilômetros ao sul de Curitiba, no Palitoral norte do Rio de Janeiro, em um raná. Antes imperceptível para a potrecho de 50 quilômetros entre Cabo Frio e Saquarema, na restinga de Maspulação, a erosão que atinge 6 quilôsambaba. Ali, um Atlântico de águas metros de praia começou a gerar muito azuis - e também geladas, mesincidentes com o avanço da especulação imobiliária no litoral nos últimos mo sob sol intenso - consumiu 6 metros anos. Em maio de 2001, uma ressaca de praias e dunas de areia fina e branca de abril de 1996 a agosto de 2002. Como destruiu 19 casas erguidas na areia da a região é praticamente deserta, a eropraia em loteamentos irregulares, deixando 50 famílias desabrigadas. A sosão só foi identifica da porque os peslução mais eficaz - e óbvia - é respeitar quisadores da UFRJ já monitoravam a a natureza e construir a uma distância região nesse período. segura do nível de maré alta. Em vez disso, apela-se para paliativos, como a Intervenção danosa - O estudo detalha o impacto da intervenção humana e construção de muros, que podem causar resultado desastroso. "Os muros transé motivo de alerta. Em diversos pontos do litoral, a erosão e seu reverso, a proferem a erosão para o terreno vizinho, gradação, surgem ou são agravadas pela destroem a paisagem e desvalorizam os imóveis", comenta o geólogo Rointervenção na natureza. A construção de um cais ou de um canal para navedolfo José Angulo, do Laboratório de gação altera o ciclo de transporte de Estudos Costeiros da Universidade Fesedimentos e faz a areia acumular-se de deral do Paraná, que monitora a erosão em Matinhos, cidade apelidada de um lado dessa barreira artificial e falNamorada do Paraná. tar do outro. No porto gaúcho de Rio Grande, dois paredões de pedras (moNo balneário paranaense, o problema se agravou por causa da urbanilhes) de 3,5 quilômetros de comprimento, erguidos dentro do mar para zação mal planejada, que removeu as dunas da praia, uma proteção natural proteger a navegação, mudaram o per48 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
contra as ressacas - uma praia tem três partes fundamentais: a zona de quebra das ondas, a praia seca e um acúmulo de areia, conhecido como duna frontal. Em Saquarema, no litoral norte do Rio de Janeiro, a remoção das dunas para construção de uma estrada foi castigada pelo mar. A rodovia ruiu após duas décadas de erosão. Muehe conta que a prefeitura local, "num ato de insistência possivelmente inócua", aterrou novamente o local e reconstruiu a estrada à beira-mar. De modo geral, a falta de planejamento urbano induz ou mesmo acentua os danos da erosão. Os efeitos da interferência humana sobre o comportamento do mar não decorrem apenas de obras realizadas nas praias ou próximas ao litoral. Barragens erguidas a centenas de quilômetros da costa, em rios que deságuam no mar, interrompem o processo natural de transporte de sedimentos para as praias. Com a escassez repentina de areia dos rios, as ondas do mar deixam de enfrentar as barreiras naturais e invadem com mais facilidade as praias. Um exemplo extremo desse fenômeno ocorreu no povoado de Vila do Cabeço, 140 quilômetros ao sul de Aracaju, em Sergipe, na foz do rio São Francisco. Em 1998, as ondas varreram esse povoado de 50 famílias. Antes em terra seca, o farol da Marinha construído no final do século 19 encontra-se hoje dentro d'água, em conseqüência do processo de erosão associado à escassez de sedimentos. abe-se também que as desembocaduras de grandes rios são regiões naturalmente instáveis. De acordo com Muehe, esses ecossistemas sofrem erosão e progradação em proporções equivalentes (15% delas apresentam desgaste e 15%, acréscimo), em especial na costa do Paraná e de Santa Catarina. Os dois fenômenos podem ainda conviver numa mesma foz. É o que se vê, por exemplo, em Ilha Comprida, no litoral sul de São Paulo, onde a desembocadura do rio Ribeira de Iguape se desloca lentamente para o sul pela força das areias. "É comum que o embate entre a energia das ondas e a força dos rios mude lentamente a configuração de praias", diz José Maria Landim Dominguez, do Instituto de Geociências da Universidade Federal da
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o São Luís - Bancos de areia migram em direção à praia.
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Ponta do Tubarão - O mar alcançou poços de petróleo antes a 800 metros da praia. Fortaleza - Um quebra-mar provoca erosão nas praias a oeste da cidade. Guamaré - A erosão expôs tubulações de gás e óleo instaladas a 1,5 metro de profundidade.
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São Bento e Caiçara do Norte - A erosão destruiu duas ruas e casas nos últimos 30 anos. Paulista - Praia do Janga perdeu 10 metros de areia devido a obras contra a erosão em Olinda. Recife na praia acúmulo ao norte
Ocupação da orla de Boa Viagem gera de areia e erosão ao sul.
Vila do Cabeço - Barragens no rio São Francisco agravaram a erosão, que destruiu o povoado em 1998. Belmonte - A orla avançou 500 metros sobre o mar na foz do rio Jequitinhonha. Porto de Ilhéus - Obras no porto causaram erosão nas praias ao norte e acúmulo de areia ao sul. Caravelas - Em 40 anos, a linha da costa recuou 200 metros em 15 quilômetros de praias. Atafona - Na foz do rio Paraiba do Sul, a erosão pôs abaixo um quarteirão de casas.
Barra de Maricá - O mar consome as praias e derrubou casas à beira-mar em 2001. Saquarema - Na praia de Ponta Negra, uma rodovia ruiu por causa do avanço do mar. '--------
São Vicente - Construção de emissário submarino agravou erosão na praia do Gonzaguinha. Ilha Comprida - Acúmulo de areia desloca foz do rio Ribeira de Iquape para o sul.
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- A erosão derrubou o Farol da Conceição em 1993.
Balneário do Hermenegildo - A erosão destruiu 30 casas.
te vulnerável litoral pernambucano, Bahia (UFBA) e responsável pelos caafetado pela escassez de sedimentos e pítulos do levantamento referentes aos carente de dunas naturais que deteestados da Bahia, Sergipe e Paraíba. nham o avanço do mar. Ameaçadora em boa parte da cosOs primeiros registros de erosão ta, a ação do oceano nem sempre gera no estado remontam a 1914 e foram danos. Em alguns casos, o capricho agravadas principalmendas ondas produz situate pelas obras do porto, ções curiosas. No litoral que alterou as correntes norte de São Paulo, três Porto de litorâneas que atingem praias vizinhas do muOlinda. Em 1953, foram nicípio de Ubatuba apreSuape, ao sul encomendados estudos sentam características de Recife, ao Laboratoire Daucompletamente diferenphinois d'Hydraulique tes. Uma delas, a de Sufez o mar Neyrpic, em Grenoble, nunga, recebe ondas vioavançar sobre na França, que recomenlentas vindas do sul e é dou a construção de alvo de um processo áreas urbanas quebra-mares próximo conhecido como rotação ao porto, numa área em praial, na qual há alterque não existem recifes nância de erosão e deponaturais, comuns na região. Desse sição nos extremos das praias, conmodo, as faixas de areia na cidade praforme estudo conduzido por Michel ticamente desapareceram, substituídas Michaelovitch de Mahiques, pesquipor muralhas de pedras erguidas contra sador do Instituto Oceanográfico da a força das ondas. Mas o que se conseUniversidade de São Paulo (USP), e a guiu foi transferir a erosão para a cosdoutoranda Cristina Célia Martins. O ta mais ao norte, chegando até a cidagrupo do Oceanográfico, integrado por de de Paulista, a 16 quilômetros do Moysés Gonsalez Tessler, autor do caRecife, onde a poluída praia de Ianga pítulo paulista do levantamento, que emagreceu 100 metros nos últimos contou com apoio da FAPESP, está dez anos. Uma situação parecida com a procurando entender com precisão os que se observa a partir dos anos 80 em processos de erosão e reconstituição Fortaleza, no Ceará, após a construção natural das praias do Estado de São de um quebra-mar ter bloqueado o fluPaulo. "O importante não é detectar xo de sedimentos e causado erosão nas unicamente a erosão, mas avaliar o bapraias a oeste da cidade. lanço de sedimentos que entram e saem Nas últimas décadas, a erosão no lida praia." Ao lado de Sununga, com toral pernambucano só piorou -corn a sua areia grossa e mar bravo, enconconstrução de prédios, estradas e diques tra-se a praia do Lázaro, bem mais calsobre as praias. Na praia de Boa Viagem, ma, protegida do impacto direto das uma das mais conhecidas do Recife, o ondas por uma baía e um costão romar engoliu cinco metros da faixa de choso. Em seguida, vem a praia de Domingas Dias, plácida e com areia fina.
o impacto do porto - De toda a costa, as áreas mais suscetíveis à erosão estão na região Nordeste, onde as praias originalmente padecem de escassez de areia causada pela falta de rios capazes de abastecer o mar com sedimentos. Em Pernambuco, um dos estados mais afetados por esse problema, cerca de seis em cada dez praias dos 187 quilômetros de costa cedem terreno para o mar. Na capital do estado, o Porto de Recife, com 3,4 quilômetros de extensão, deslocou os efeitos da erosão para Olinda, uma cidade vizinha 8 quilômetros ao norte. É uma interferência que agrava a situação do historicamen50 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
praia, em 20 anos. "E a tendência é piorar': adverte o geólogo Valdir Manso, do Laboratório de Geologia e Geofísica Marinha da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que monitora continuamente 15 pontos da costa pernambucana. A intervenção humana na paisagem, com a construção do porto de Suape no município de Ipojuca, 40 quilômetros ao sul do Recife, interrompeu o fluxo de sedimentos e amplificou o problema. Como conseqüência, o mar avançou sobre áreas urbanizadas, como a praia de Toquinho, onde os proprietários de mansões à beira-mar optaram por erguer muralhas de rochas na areia na tentativa de manter o mar distante. Com a consultoria da UFPE, a prefeitura de Ipojuca elaborou um projeto de R$ 5 milhões destinado a proteger a orla com a construção de um dique de proteção a 200 metros mar adentro. ntender por que uma praia perde ou ganha areia não é fácil mesmo para os pesquisadores - o que se tem claro são os efeitos desses fenômenos. No litoral do Rio Grande do Norte, o desgaste ameaça poços de petróleo que, na década de 80, haviam sido instalados a 800 metros da praia no campo petrolífero de Macau-Serra, próximo à Ponta do Tubarão. Preventivamente, esses poços à beira-mar foram circundados por muros de contenção. Na maré alta, a água chega até eles. Em Guamaré, cidade produtora de petróleo e gás natural a pouco mais de duas horas de carro de Natal, dutos e emissários submarinos instalados a 1,5
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OS PROJETOS Atlas de Erosão e Progradação Costeira do Litoral Brasileiro
Avaliação Multitemática do Transporte de Sedimentos em um Ambiente Praial: Praia da Sununga, Ubatuba, Estado de São Paulo
MODALIDADE
Programa de Geologia e Geofísica Marinha
COORDENADOR
Linha Regular de Auxílio a Pesquisa COORDENADOR
DIETER MUEHE - UFRJ
INVESTIMENTO
R$ 47.000,00
MODALIDADE
MICHEL MICHAELOVITCHDE MAHIQUES - Instituto Oceanográfico/USP INVESTIMENTO
(Secirrn)
R$ 163.920,67
(FAPESP)
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metro de profundidade encontram-se hoje à flor da terra. Em um estudo financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo Fundo Setorial do Petróleo e Gás Natural (CTPetro) e a Petrobras, a equipe da geóloga Helenice Vital, do Laboratório de Geologia e Geofísica Marinha e Monitoramento Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, descobriu que uma convergência de fatores provoca erosão nessa parte do estado. De um lado, os rios que drenam a região são de pequeno porte e não fornecem sedimentos em quantidades significativas e, para piorar a situação, alguns deles foram represados. De outro, as características tectônicas da plataforma produzem áreas com rebaixamento do terreno, criando o mesmo efeito que uma elevação do nível do mar. Nos municípios de São Bento e Caiçara do Norte, as praias recuaram 250 metros nos últimos 30 anos.
Já o mistério da destruição do Farol da Conceição, no Rio Grande do Sul, só foi desvendado com uma análise do movimento das ondas. Constatou-se que elas são mais fortes e carregam mais energia que nas praias vizinhas. O fundo do oceano funciona como uma lente que aumenta a energia das ondas no ponto erodido. A síndrome é conhecida como efeito foco. "Como não havia urbanização, a causa só podia ser natural", diz Lauro Callia ri, pesquisador do Laboratório de Oceanografia Geológica da Fundação Universidade Federal de Rio Grande. Projeções internacionais sugerem que o nível do mar pode subir de 40 a 50 centímetros nos próximos cem anos. "Ninguém sabe ainda se isso realmente acontecerá, mas convém tratar o assunto com seriedade, uma vez que o fundo do mar próximo à costa tem uma declividade baixa", diz Muehe. Uma elevação de 50 centímetros no nível do Atlântico poderia consumir
100 metros de praia, em regiões como o Norte e o Nordeste. Mesmo o litoral sul de São Paulo poderia sofrer, apesar de resguardado por planície de até 25 quilômetros de extensão entre o mar e a serra. Quem ignora essa possibilidade desdenha a dinâmica do mar. Sabe-se que, nos últimos 120 mil anos, o nível do mar oscilou muitas vezes, em decorrência de fenômenos climáticos. Há 17 mil anos, o oceano voltou a subir após ter descido mais de 100 metros devido ao período glacial, fazendo com que a linha de costa se situasse a dezenas de quilômetros defronte à linha de costa atual. Há 5.100 anos, o mar subiu e seu nível ficou 4 metros acima do atual. Ninguém aposta numa nova glaciação capaz de afetar o nível do mar nas próximas gerações, mas com certeza sai menos caro monitorar o comportamento do litoral e estabelecer faixas de proteção do que esperar pelo pior e mais tarde reconstruir as bordas das cidades costeiras. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 51
Avenida São João, centro de São Paulo: luz do Sol não chega ao solo por causa do excesso de prédios
te o dia e geladeiras à noite. O põe-e-tira de agasalho - e, claro, a propagação de habitações precárias, nas quais vivem 12% dos 10 milhões de moradores da capital- é conseqüência do crescimento desordenado da metrópole, agora esmiuçado com a publicação este mês do Atlas Ambiental do Município de São Paulo, projeto conduzido pelas secretarias municipais do Verde e do Meio Ambiente e do Planejamento, com apoio do Biota-FAPESP, programa de levantamento da flora e da fauna paulistas. O Atlas, cujos primeiros resultados foram anunciados em dezembro de 2000 (veja Pesquisa FAPESP n° 60), já se encontra na internet (http://atlasambiental.prefeitura.sp.gov.br). O projeto de pesquisa que o fundamentou "é resultado de uma parceria paradigmática entre o poder público municipal e o sistema de pesquisa do Estado de São Paulo", comenta José Fernando Perez, diretor científico da FAPESP, no prefácio do livro. "O sucesso desse empreendimento deve nos remeter a uma reflexão sobre o potencial dessa relação possível e necessária, mas ainda tão pouco explorada." O Atlas mostra como se distribuem os 200 quilômetros quadrados que ainda restam de vegetação intacta no município, o equivalente a 13% do seu território (1.512 quilômetros quadrados). Ao longo de seus quase 450 anos, a serem completados no início de 2004, a construção de casas, prédios e indústrias pôs abaixo 87% da vegetação nativa da capital paulista. De acordo com esse estudo, coordenado pela geóloga Harmi Takiya, subprefeita da Moóca, a cidade perdeu um quinto de sua vegetação natural entre 1990 e 2000. Hoje as árvores se concentram nos 39 parques estaduais e municipais e em poucos bairros Jardins, Pinheiros e Morumbi, na Zona Oeste, e Moema, na parte da Zona Sul S4 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
mais próxima ao Centro. Mas à medida que se segue rumo a Capão Redondo e Jardim Ângela, no miolo da Zona Sul, o braço mais longo da cidade, a cerca de 20 quilômetros do Centro, as árvores escasseiam. Ganha espaço uma paisagem horizontal absolutamente urbana, com prédios esparsos e impressionantes conjuntos de casas precárias e a temperatura sobe, lentamente. Em bairros mais próximos da serra do Mar, como Marsilac, por causa da proximidade com a reserva de Capivari-Monos, a temperatura é bem mais baixa, oscilando ao redor dos 23° Celsius. Mosaico de microclimas - Em uma das vertentes de trabalho do Atlas, uma equipe da Universidade de São Paulo (USP) descobriu que, em conseqüência das distintas formas de ocupação do espaço urbano, a cidade apresenta 77 climas diferentes - vistos em uma concepção mais ampla, que, além da temperatura e da umidade do ar, consi-
dera os fatores que alteram as características do clima e influenciam o bem-estar das pessoas, como o tipo de construção predominante (mais ou menos casas, prédios ou favelas) e a intensidade do trânsito, já que a temperatura pode subir com o calor emitido pelos carros e a poluição. O resultado é um mosaico que ganha homogeneidade nos extremos da cidade, por causa da proximidade com as serras da Cantareira, ao norte, e a do Mar, ao sul. Há também uma certa uniformidade nos bairros que crrcundam o Centro, num arco que começa na Barra Funda, na Zona Oeste, passa por Limão e Santana, na Norte, avança até Penha e Vila Matilde, na Leste, e termina no Sacomã, na Zona Sul da cidade. Há variações de temperatura dentro dos próprios bairros, em ruas ou praças, razão pela qual esses climas também podem ser chamados de microclimas. Mas o mosaico se embaralha, com diferenças mais acentuadas de temperatura, nas porções das regiões Oeste e Sul próximas ao Centro (veja mapa). Uma das principais causas de tamanha variação é o desmatamento, associado a loteamentos clandestinos e favelas que se disseminam nos extremos da cidde. Aos danos da devastação, de acordo com o estudo coordenado pelo geógrafo José Roberto Tarifa, soma-se inicialmente o impacto provocado pela impermeabilização do solo: São Paulo tem hoje 60 mil quilômetros de ruas asfaltadas, que retêm calor e assim tornam a cidade mais quente. Há também uma forte influência da circulação diária dos 3 milhões de carros na cidade. Além de gerar calor com a queima de combustíveis, que corresponde a um décimo da energia que a cidade recebe do Sol, os veículos lançam ao ar 2,6 milhões de toneladas de poluentes por ano, segundo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de
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Obs.: Medição feita às 10h do dia 3 de setembro de 1999. Foram consideradas apenas as 14 categorias básicas de microclimas, sem as variações internas de cada uma delas.
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I Represa de Guarapiranga: com clima ameno, é um oásis em meio a regiões de intensa urbanização
São Paulo (Cetesb) - e, quanto mais fumaça no ar, mais calor. Adicione-se o concreto de 4 milhões de casas e prédios. Resultado: a temperatura tende a subir ainda mais com a densidade de construções verticais - efeito conhecido como ilhas de calor. O centro histórico de São Paulo é uma exceção. A densidade de arranha-céus é tão elevada que surge o efeito oposto, as ilhas de frio: em muitos prédios, os andares mais baixos não recebem a luz do Sol. Desde que começou a estudar o clima de São Paulo há 30 anos, Tarifa não se conformava com a idéia de que ambientes tão diferentes - as alamedas dos Jardins e o tapete acinzentado de casas da Zona Leste - tivessem o clima homogêneo, de acordo com a visão clássica de físicos e meteorologistas. "Os estudos eram segmentados e avaliavam apenas um ou outro aspecto, como as chuvas ou a poluição", diz Tarifa, que logo após aposentar-se da USP, em 2002, foi contratado pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), em Rondonópolis. "A visão antiga não levava em consideração que a vida das pessoas em São Paulo sofre 56 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
a influência, por exemplo, da qualidade do ar e do conforto térmico." Segundo ele, a mudança na forma de analisar o problema era necessária também porque há períodos do dia em que as atividades dos moradores, a exemplo do deslocamento para o trabalho, pesam mais que o relevo para definir a temperatura em uma região específica em um determinado horário. Tarifa e Gustavo Armani, outro geógrafo do Laboratório de Climatologia e Biogeografia da USP,reuniram os estudos sobre o clima paulistano realizados de 1970 a 2000 e compararam os dados com fotos aéreas da cidade e imagens do satélite Landsat 7. Foi a partir dessa base de dados que eles listaram 18variá-
o PROJETO Atlas Ambiental de São Paulo
do Município
MODALIDADE linha Regular de Auxílio a Pesquisa/ integrado ao programa BiotalFAPESP COORDENADOR HARMI TAKIYA - Secretaria e do Meio Ambiente INVESTIMENTO
R$ 148.845/00
do Verde
veis relacionadas ao clima da cidade. O clima de uma região é definido inicialmente por oito delas,como a temperatura da superfície do solo, a umidade do ar e a quantidade de chuva. Os outros dez fatores regulam essas características básicas: são os chamados controles climáticos, como emissão de poluentes, dimensão da cobertura vegetal e densidade da população e de edifícios. O resultado final - os 77 climas apresentados no livro Os Climas na Cidade de São Paulo - Teoria e Prática, publicado em 2001 - deixa claro que essas expressões da urbanidade são hoje mais importantes na definição do clima metropolitano que o próprio relevo, um dos principais fatores determinantes das características dos climas naturais até o início do século passado. São Paulo cresceu a partir de uma colina entre os rios Tietê e Tamanduateí, a 720 metros de altitude, sobre a qual os padres jesuítas José de Anchieta e Manuel da Nóbrega criaram o Colégio de São Paulo de Piratininga em uma precária cabana de madeira. Dali, os moradores ganharam, primeiro, as terras mais planas e baixas. Num segundo momento, avançaram rumo à elevação conhecida pelos geógrafos como espigão central, a 800 metros acima do nível do mar, sobre o qual hoje se assentam bairros como Sumaré, Cerqueira
César, Vila Mariana e Jabaquara. O trecho mais alto desse corredor é a avenida Paulista, que até 1900 não passava de um bucólico conjunto de chácaras e mansões. Desde o começo do século passado, a população da cidade, então com 240 mil habitantes, cresceu 40 vezes e hoje se espalha até mesmo pelas áreas antes de difícil acesso como a serra da Cantareira, uma muralha natural a 1.200 metros de altitude. "Cada vez que se altera o espaço, redefine-se o clima", lembra Tarifa. Cercada ao norte pela Cantareira e ao sul pela serra do Mar, a maior metrópole brasileira se encontra em um corredor que facilita a entrada das massas de ar frio provenientes da Antártica e das correntes de ar carregadas de umidade do oceano Atlântico, distante apenas 45 quilômetros em linha reta - ainda hoje elementos naturais responsáveis pela temperatura relativamente amena da cidade.
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Terra sem garoa - Da época dos jesuítas para cá, São Paulo devorou quase todo o verde ao redor e deixou de ter apenas cinco climas, como há quinhentos anos, na época do descobrimento. Os cinco tipos eram variações do clima Tropical, marcados por uma estação fria e seca, que se estende pelo outono e o inverno, e outra quente e chuvosa, durante a primavera e o verão, com temperaturas médias que variavam de 15° Celsius a 25° Celsius. De acordo com um estudo feito no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, a temperatura média da cidade subiu 1,30 Celsius nos últimos 40 anos. Até os anos 60, a capital ainda erra a Terra da Garoa, por causa da chuva fina e assídua que se somava a um clima mais frio que o atual. No inverno, os paulistanos não dispensavam casacos grossos, luvas e cachecóis. Tão elevada diversidade de climas não é uma exclusividade de São Paulo. Em maior ou menor grau, existe também em metrópoles mundo afora, como a Cidade do México, Santiago, no Chile, e Buenos Aires, na Argentina. "Variações tão acentuadas de climas surgem quando se abdica do sonho de uma vida harmoniosa com o ambiente", comenta Tarifa. "É um fenômeno que ocorre quando a lógica do lucro passa a determinar a forma como os espaços devem ser ocupados." •
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Biblioteca de Revistas Científicas disponível na Internet www.scielo.org
Notícias • Química
Crianças criam cultura O artigo A Transmissão
da Cultura da Brincadeira: Algumas Possibilidades de Investigação traz um estudo sobre alguns fatores relacionados às brincadeiras infantis, tais como o vocabulário típico, sua aprendizagem social, as regras existentes e os diferentes tipos de interação entre as crianças. O trabalho promove uma reflexão sobre os fatores envolvidos na produção das brincadeira. "A investigação dessas categorias é importante para uma melhor descrição da brincadeira e também para criar indicadores para a compreensão das relações entre os grupos de crianças no que diz respeito à socialização, à constituição do sujeito e à transmissão da cultura'; afirmam os pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), responsáveis pelo artigo. Segundo o estudo, a cultura da brincadeira deve ser estudada a partir dos processos de aprendizagem dos indivíduos, já que nos grupos de brincadeira estão presentes todos os elementos de uma sociedade: os rituais, as regras, as sanções e as formas de se esquivar das dificuldades. Por isso, com base nesses estudos culturais, os pesquisadores concluem que "as crianças não são somente criadas, crianças se criam, crianças criam cultura". PSICOLOGIA: ALEGRE -
REFLEXÃO
E CRITICA
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V. 16 - N°·1
- PORTO
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79722003000100012&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
• Educação
Abandono do magistério Duas professoras da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) realizaram uma pesquisa para examinar a questão do abandono do magistério público na rede de ensino do Estado de São Paulo. Os resultados estão no artigo Professores, Desencanto com a Profissão e Abandono do Magistério, disponível no Scielo. O objetivo do estudo, que se baseou em dados quantitativos da Secretaria Estadual de Educação, foi
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compreender de que modo o processo de exoneração do magistério acontece ao longo da vida e da experiência profissional dos professores. Com base em um questionário enviado a 158 ex-professores da rede pública, além de 16 entrevistas individuais, Flavinês Rebolo Lapo e Belmira Oliveira Bueno perceberam que houve um aumento da ordem de 300% nos pedidos de desistência do cargo de docente. "Além dos baixos salários, as precárias situações, a insatisfação no trabalho e o desprestígio profissional estão entre os fatores que mais contribuem para que os professores deixem a profissão", concluem as pesquisadoras. Para elas, este processo acontece em várias etapas até atingir o abandono defmitivo, por meio de uma série de mecanismos pessoais e institucionais de que os docentes fazem uso ao longo de suas carreiras. CADERNOS DE PESQUISA - W 118 - SÃo PAULO - MAR.
www.seielo.br/seielo.
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• Saúde
Jogos para diabéticos O artigo A Experiência de Jogos em Grupos Operativos na Educação em Saúde para Diabéticos discute uma estratégia educativa desenvolvida em um ambulatório, cujo objetivo é estimular o indivíduo a refletir sobre seu cotidiano relacionado à sua patologia. Trata-se do Programa Educativo através de Jogos para Grupos Operativos, desenvolvido no Serviço Especial de Endocrinologia e Metabologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC/UFMG). O estudo, que se concentrou no caso específico do diabetes melito, caracterizou-se como um instrumento de educação em saúde sob uma perspectiva de promoção, prevenção e controle da doença. Foi implementada uma dinâmica de interação entre o profissional e o paciente que se baseou na utilização de jogos educativos e técnicas pedagógicas aplicadas em diferentes grupos no ambulatório. As técnicas usadas foram: curso de orientação sobre a doença, consulta individual, grupo operativo e uso de jogos educativos de comunicação e aprendizagem. Tais técnicas possibilitaram a construção do conhecimento mútuo e a troca de vivências entre os pacientes, além do entendimento da experiência individual da doença pelo profissional de saúde. Foi concluído que essa técnica pode contribuir para uma rápida adesão ao tratamento e maior responsabilidade em relação aos cuidados com
a doença, com conseqüente vida dos indivíduos. CADERNO
DE SAODE
JANEIRO - JULHO/AGO.
POBLICA
melhoria da qualidade de
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• Psicologia
Baixa freqüência Dentre os diversos problemas que reduzem a qualidade de vida dos idosos, os distúrbios auditivos estão entre os mais comuns. "Nos Estados Unidos, aproximadamente 30% das pessoas com mais de 65 anos de idade e 50% das pessoas com mais de 75 anos de idade sofrem com alguma perda auditiva': consta no estudo Envelhecimento do Processamento Temporal Auditivo, das pesquisadoras Vera Tôrres das Neves e Maria Angela Guimarães Feitosa, ambas da Universidade de Brasília (UnB). O artigo faz uma revisão da literatura sobre o envelhecimento do processamento temporal auditivo, especificamente estudos sobre detecção de interrupções em sons por sujeitos adultos de mais idade. São apresentadas definições e descrições da presbiacusia, ou a deficiência auditiva adquirida por envelhecimento biológico natural, além de suas conseqüências e sua prevalência no decorrer do processo evolutivo humano. De acordo com os procedimentos experimentais, as pesquisadoras verificaram que a diminuição da capacidade de processamento dos estímulos sonoros nem sempre é relacionada a danos do aparelho auditivo periférico, podendo estar relacionada também a perdas de neurônios centrais. Ou seja, o processamento temporal auditivo pode ser, em muitos casos, uma forma de processamento central, executada no encéfalo. PSICOLOGIA: SET./DEZ.
TEORIA E PESQUISA
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BRASILlA
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• Dermatologia
Cuidados com a pele
Utilizando Métodos de Histo-morfometria e Autofluorescência procura analisar as possíveis alterações da pele normal com o passar dos anos. Após uma série de estudos realizados por pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFCE) com amostras de pele do abdômen de 18 corpos, foi concluído que o envelhecimento é a principal característica que leva à redução natural da espessura da derme e epiderme. Porém as mudanças da pele ao longo da vida nem sempre seguem um perfil linear, apresentando drásticas alterações nas últimas décadas de vida. A redução da espessura da derme e epiderme se dá principalmente com indivíduos após os 60 anos de idade. O estudo concluiu também que, apesar de algumas alterações estruturais da pele serem inerentes ao envelhecimento, outras estão relacionadas à exposição ao sol, influências ambientais, grau de nutrição ou alterações do estado de saúde, como doenças endócrinas. ANAIS
BRASILEIROS
DE DERMATOLOGIA
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• Enfermagem
Intuição nipônica A dificuldade com o idioma pode interferir na compreensão e no tratamento de doenças por parte dos profissionais de enfermagem, quando o hospitalizado é um estrangeiro. Partindo desse pressuposto, em que a comunicação verbal e não-verbal é essencial no processo de descoberta das enfermidades em um paciente, duas pesquisadoras da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram o estudo A Comuni-
cação no Processo da Hospitalização do Imigrante Japonês para conhecer a importância da comunicação para o imigrante japonês durante o seu processo de internação em um hospital. Foram entrevistados pacientes japoneses em um hospital de São Paulo numa pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica. Percebeu-se que os imigrantes possuem dificuldades de relacionamento pelo fato de o idioma ser uma barreira, impedindo-os de manter uma comunicação efetiva com a equipe de saúde. Conseqüentemente, os japoneses tinham dificuldades para compreender a sua doença e o tratamento ao qual estavam sendo submetidos. "O estudo revelou que a falta de entendimento do idioma fez com que a grande maioria dos entrevistados se acomodasse e não aprendesse a língua portuguesa", diz o artigo, que, devido a esta falta de entendimento, chama a atenção para a falsa impressão de que os imigrantes podem transmitir de que está tudo em ordem. "Nesse caso, devemos lembrar que pequenos gestos ou um olhar podem ser tão significativos quanto as palavras': concluem as pesquisadoras.
As características da pele humana passam por mudanças de acordo com a idade do ser humano, devido às forças ambientais como radiação ultravioleta, assim como por fatores intrinsecos, alguns deles relacionados com alterações no tecido conjuntivo da derme, que atua como alicerce estrutural para epiderme. O artigo Estudo das Al-
www.seielo.br/seielo
terações Relacionadas com a Idade na Pele Humana,
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REVISTA LATINO-AMERICANA - RIBEIRÃO
DE ENFERMAGEM
PRETO - NOV./DEZ.
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PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 59
TecnO/og' 'a de o" tuna . geração é qUe fica a ~tna COisa no d' nt'ga Ia segUint
e.
ITECNOLOGIA
•
LINHA
DE
PRODUÇÃO
MUNDO
Interferências na formação de cristais
Impurezas definem as mudanças de padrão
Com a ajuda de simulações de computador e de colegas na Hungria e na França, pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia dos Estados Unidos (Nist, sigla em inglês) conseguiram avançar no entendimento de como partículas estranhas - sejam impurezas ou não - interferem nos padrões de formação dos cristais. Primei-
• Receptor capta sinais múltiplos Quem ainda se recorda da aflição, há dois anos, do pessoal das equipes de resgate tentando comunicação por rádio depois do ataque às torres gêmeas, em Nova York, consegue imaginar o que significaria uma comunicação livre dos sinais cruzados e da incompatibilidade de sistemas. Em setembro, a Agência de Pesquisa Naval da Marinha
ro, eles descobriram que as simulações de computador desenvolvidas para projetar a formação de ligas metálicas tinham impressionante semelhança com as imagens de cristais reais formadas em filmes de polímeros bem mais finos que um fio de cabelo. Em ambos os casos, encontravam-se partículas dispostas de maneira aleatória, que os cientistas ape-
dos Estados Unidos anunciou a invenção de um receptor digital que promete comunicar-se com todos os sistemas atualmente em uso. Alta precisão e velocidade de processamento permitirão a esses aparelhos administrar a recepção de uma multiplicidade de sinais simultâneos nas mais amplas larguras de banda. Deborah Van Betchen, diretora da divisão de eletrônica da Agência de Pesquisa Naval, diz que a Hypres - empresa
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lidaram de "dendritos zonzos': E os três eixos do cristal tendiam à assimetria, diferentemente do que ocorre nos cristais puros, que tendem a ser regulares e simétricos. Simulações posteriores mostraram que a rotação conjunta das partículas durante o processo de cristalização leva à produção de dendritos espiralados. Já a alternância de fileiras de par-
do Estado de Nova York que se encarregará da fabricação dos novos receptores - desenvolverá um protótipo do aparelho capaz de "digitalizar" simultaneamente todos os sinais nas faixas mais críticas para a comunicação militar (HF e VHF) e filtrará os sinais com a ajuda de um software. O controle por software, aliás, é fundamental para o uso combinado com um sistema tático de rádio (JTRS, em inglês) que o De-
tículas de uma direção para outra produz padrões em ziguezague. Os pesquisadores acreditam que esses padrões complexos possam ser reproduzidos experimentalmente. As sugestões vão desde a utilização de um rolo para imprimir um padrão no cristal em formação até o emprego de campos eletromagnéticos externos ou laser orientando as partículas. •
partamento de Defesa concebeu e já está a caminho. Os rádios JTRS, também equipados com tecnologia digital, substituirão os modelos analógicos, com o objetivo de reduzir custos e a complexidade dos aparelhos. •
• Investimento em tecnologia sem fio Oito novos projetos - que vão desde a transmissão multimídia via redes sem fio até a
investigação de novos espaços de banda ultralarga para comunicação sem fio e redes de sensores inteligentes - foram contemplados com US$ 3,5 milhões nos Estados Unidos. Além da fundação estatal Discovery Grants, um consórcio que reúne as empresas Ericsson, Hewlett-Packard, IBM, Intersil, Nokia e Texas Instruments, entre outras, financia a iniciativa. Os estudos, que começaram em agosto, são de responsabilidade de 20 pesquisadores da Iacobs School of Engineering da Universidade da Califórnia, em San Diego (UC San Diego News Release, 28 de agosto). Entre os projetos consta um sobre espaços de banda ultralarga para comunicação sem fio, que investigará a possibilidade de projetar sistemas capazes de suportar conexões com mais de 100 megabits por segundo e por usuário. Também serão estudados os protocolos de configuração de comunicação e as arquiteturas sem fio das redes de telefonia e de Internet. Outro projeto escolhido vai tratar das redes de sensores para captura de imagens e interatividade. O objetivo é examinar os principais problemas que surgem quando os sensores dos equipamentos de te.lecomunicações abrangem áreas muito grandes. •
• Laser quebra barreira do quilowatt Uma importante invenção no campo da tecnologia do laser, com capacidade para liberar mais de 1 quilowatt (kW) de força com um feixe de alta qualidade em fibra única, foi desenvolvida pelo Centro de Pesquisa Optico- Eletrônica da Universidade de Southampton, na Inglaterra. As fibras e amplificadores de laser são filamentos de vidro transparente um pouco mais espessos que um fio de cabelo. Foram criadas em meados dos anos 80 na própria universidade a partir de fibras ópticas de telefonia. Para produzir laser, o minúsculo núcleo da fibra recebe uma carga de íons semelhante à utilizada nos grandes lasers industriais. Surpresos, os pesquisadores descobriram que a tímida luminescência das fibras que alimentam a Internet pode ascender à escala do quilowatt - potência suficiente para cortar uma placa de aço. Comparados aos atuais lasers industriais, os lasers a fibra são fontes mais flexíveis, compactas e robustas com feixes de melhor qualidade. "Conseguir fazê-Ias quebrar a barreira do quilowatt é um marco", diz David Paine, diretor do centro de pesquisa. •
Plástico reciclado é base de tubos condutores de esgoto
Embalagens transformadas Encontrar novos usos para as garrafas descartadas de refrigerantes, água e outros produtos, as embalagens de poli (tereftalato de etileno), chamadas de PET, tem sido um desafio para a imaginação. Afinal, nos últimos anos esse plástico resistente, depois de reciclado, transformou-se em roupas, tintas, pisos, revestimentos ~ outros produtos. E desde maio pode ser encontrado também em tubos para esgoto de prédios, produzidos pela Empresa Brasileira de Reciclagem (EBR), de Diadema, na Grande São Paulo. Antes de chegar ao produto final, chamado de Tubopet, Guido Nigra, diretor da empresa, ouviu de vários especialistas que dificilmente conseguiria produzir tubos de PET. Mas não desanimou. Procurou ajuda no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e no Departamento de Engenharia de Materiais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Para chegar aos tubos que fazem as mesmas funções das tubulações em PVc, o material,
formado por uma mistura de plásticos reciclados, é moído e passa por uma máquina extrusora, onde ganha a forma final. Guido Nigra conta que as extrusoras convencionais tiveram de ser adaptadas para produzir os tubos de PET, fabricados com base nas especificações da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). •
• Gaúchos ganham parque tecnológico A HP Brasil inaugurou em Porto Alegre um centro de pesquisa e desenvolvimento, o maior da empresa na América Latina, no novo parque tecnológico da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, o TecnoPUc. Nas novas instalações, que ocupam uma área superior a 3 mil metros quadrados, operam 80 profissionais como uma extensão dos vários laboratórios mundiais da HP para a geração de produtos e pesquisa avançada de novas tecnologias. •
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 63
Informação sobre o câncer nas escolas Especialistas do Hospital do Câncer, de São Paulo, produziram um kit com informações sobre prevenção, diagnóstico precoce e dúvidas a respeito da doença, que está sendo distribuído a professores de escolas públicas e particulares do Estado de São Paulo para uso em salas de aula. O kit Educação em Câncer, composto por cinco manuais, cartazes, folhetos e duas fitas de vídeo, é resultado do projeto de difusão científica do Centro Antonio Prudente de Pesquisa e Tratamento do Câncer, um dos dez Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) apoiados pela FAPESP. A iniciativa tem como objetivo colaborar para a mudança do perfil da doença no país, marcada pela falta de prevenção e diagnóstico tardio. No kit podem ser encontradas informações sobre fatores de risco, sintomas, pre-
• Alunos criam robô para detectar bomba
II
Um robô controlado via rádio, utilizado para tarefas que representem risco para o operador, como detecção de bombas e ambientes contaminados por radioatividade, foi desenvolvido por alunos da Faculdade de Engenharia Mecânica da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) com materiais disponíveis no mercado, para que possa ser reproduzido com facilidade. O Veículo de Operação Remota (VOR1) é equipado com câmera colorida,
venção, faixas etárias mais propensas a diferentes tipos de tumores, esclarecimento das dúvidas mais freqüentes e formas de tratamento. Segundo os especialistas, cerca de 70% dos casos de câncer são causados pela exposição indevi-
da a fatores de risco como cigarro, responsável por 35% de todos os tumores, álcool, 15%, sol em excesso,
10%, e bactérias ou vírus, 10%. O material também é encontrado nos sites do Hospital do Câncer (http:// www.ecancer.org.br) e do projeto Saúde Brasil (www.saudebrasilnet.corn.br), de onde poderá ser reproduzido na íntegra. •
Material resulta de projeto de difusão científica
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mira laser para guiá -10 e um braço mecânico que lhe permite agarrar objetos com até 10 centímetros de diâmetro. Segundo o coordenador do curso de Engenharia Mecânica, Nicola Getschko, "o ob-
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jetrvo de trabalhar
com o VORl é criar condições realistas de trabalho para o futuro profissional". Getschko conta que o conhecimento adquirido vai ser utilizado no desenvolvimento de outro
•••• I~ Veículo é equipado com braço mecânico e mira laser
protótipo para testes de controle e de comunicação por meio de fios. •
• Recuperação de águas contaminadas Um processo de recuperação de águas industriais contaminadas com compostos de silicone, usados na indústria têxtil para amaciamento de fibras sintéticas, recebeu o prêmio de melhor trabalho entre os 73 projetos científicos apresentados no II Encontro sobre Aplicações Ambientais de Processos Oxidativos Avançados (Epoa), realizado em
~----------~---Campinas. Os pesquisadores Claudio Augusto Oller do Nascimento, Antônio Carlos Silva da Costa Teixeira e Roberto Guardani, do Laboratório de Simulação e Controle de Processos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, desenvolveram um método que utiliza a luz para transformar os compostos poluentes em substâncias menos nocivas ao ambiente. Todas as fases da pesquisa, do desenvolvimento do processo à elaboração da patente (veja Pesquisa FAPESP N° 86), foram financiadas pela FAPES~ •
• Empresa fecha contrato no Havaí A empresa Fujitec, de Fortaleza, fechou contrato para implantar até maio de 2004 um novo sistema de bilhetes eletrônicos para os 550 ônibus de Honolulu, no Havaí. Inicialmente serão 30 mil cartões, com previsão de chegar a 250 mil em um ano, para atender aos usuários do sistema coletivo de transporte. Criada por dois ex-alunos do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), de São José dos Campos, Adalberto Pessoa e Danilo Reis, a empresa participou de licitação realizada pela prefeitura da capital havaiana em um consórcio formado com a Smartalliance, dos Estados Unidos. "Caberá à empresa norteamericana fornecer os cartões, computadores e a infraestrutura de rede, e a Fujitec o sistema de software e de hardware necessário para a emissão de cartões e das cargas de valor, além do controle dos bilhetes eletrônicos", explica Reis. O contrato é de US$ 2,2 milhões. Desse total, a Fujitec ficará com US$ 1,3 milhão. •
Patentes Inovações financiadas pelo Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec) da FAPESP. Contato: nuplitec@fapesp.br
Título: Fases Estacionárias para Cromatografia Líquida de Alta Eficiência Baseadas em Polissiloxanos Adsorvidos e Imobilizados na Superfície de Sílica Porosa Inventores: Kenneth Coflins, Carol Coflins, Isabel Jardim, Tania Anazawa, Maria do Carmo da Silva, Carla Bottoli, Edivan Tonhi, Zahra Chaudhry e Marcos Kapor Titularidade: Unicamp/FAPESP Membrana de hidrogel reforçada acelera cicatrização
• Curativo para queimaduras
• Novos materiais para cromatografia líquida
Desenvolvimento de uma membrana de hidrogel reforçada com fibras de polipropileno, um material plástico, ideal para o tratamento de queimados. Essa membrana apresenta como vantagens grande resistência mecânica e estabilidade, mantendo as características originais do gel sem reforço, como flexibilidade, adesão à pele, permeabilidade a líquido e gases e barreira contra microrganismos. O polipropileno permite que os curativos sejam fabricados em qualquer dimensão.
Novos materiais foram desenvolvidos para a Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE), resultando em análises eficientes e econômicas para controlar a qualidade de vários produtos. A CLAE é um instrumento de separação que utiliza colunas cromatográficas, que consistem de um tubo de aço inoxidável recheado com material poroso ou não. A esses materiais se dá o nome de fase estacionária. Atualmente, a CLAE utiliza colunas recheadas com fases estacionárias quimicamente ligadas ao suporte poroso de sílica. As propostas nesse invento envolvem um conceito em que polímeros do tipo polissiloxano encontram-se adsorvidos (fixação de moléculas de uma substância na superfície de outra) e imobilizados dentro dos poros da sílica, eliminando a reação química
Título: Curativo Formado por Polímero Hidrofílico Reforçado por Fibras Têxteis Hidrofóbicas Enxertadas com Monômeros Hidrofílicos Inventor: Luiz Henrique Catalani, Lilian Cristine Lopérgolo e Ademar Benévolo Lugão Titularidade: USP/FAPESP
• Prevenção de danos aos neurônios Aplicação de medicamentos para prevenir danos a neurônios causados pelo ácido metilmalônico, tóxico para as células. Esse ácido se acumula no organismo em função de uma deficiência metabólica genética, a acidose metilmalônica, doença que causa retardo do desenvolvimento infantil. Em testes feitos em cultura de células de neurônios, elas morreram quando tratadas com ácido metilmalônico. Quando tratadas com esse ácido na presença de drogas que abrem canais de potássio, como o anti-hipertensivo diazóxido, a morte celular foi inibida.
Título: Uso de Agonistas de Canais de Potássio para Prevenir e Tratar Danos Teciduais Promovidos por Ácido Metilmalônico Inventores: Alicia I<owaltowski e Roger Castilho Titularidade: USP/Unicampl FAPESP
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Electrocell faz os ajustes finais da célula
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à Eletropaulo
MARCOS
Placas bipolares de grafite: conduzem e distribuem o hidrogênio dentro da célula
DE OLIVEIRA
•
TECNOLOGIA ENERGIA
m equipamento com 1,5 metro de largura, 2 de altura e 1 de profundidade, que produz energia elétrica com hidrogênio, é o resultado de cinco anos de pesquisas realizadas na empresa paulistana Electrocell. Até o final do ano, ele deverá ser entregue para a AES Eletropau10, a distribuidora de energia que atende a 24 municípios, inclusive a capital, da Região Metropolitana de São Paulo. Dentro dele está instalada a chamada célula a combustível, um conjunto de módulos de eletrodos e membranas condutoras capaz de produzir 30 quilowatts (kW) de energia, suficientes para suprir de dois a três andares de um prédio-ou 40 casas populares. Ela vai funcionar com hidrogênio acondicionado em cilindros, embora esteja preparada para também extrair esse combustível do gás natural e do etanol (o álcool utilizado nos veículos). Dessa forma inaugura-se uma nova fase energética em São Paulo, que passa a integrar um restrito grupo de cidades no mundo onde existem células a combustível em uso, embora ainda de forma alternativa e experimental. São equipamentos que concentram grande interesse tecnológico e são considerados, pelos especialistas da área, a novidade energética com grandes chances de ser disseminada neste início de século. Empresas canadenses, norte-americanas e alemãs já produzem as células, mas ainda sob encomenda, sem linha de produção consistente, há pouco mais de cinco anos. Essa produção comercial vem na esteira do programa espacial norte-americano, iniciado na década de 1950, que produziu células para as naves das séries Gemini, Apollo e, depois, para os ônibus espaciais. O objetivo no espaço era produzir, além de energia elétrica, água para os astronautas, um subproduto desses equipamentos. Com avanços tecnológicos dos materiais e da eletrônica nos últimos 15 anos, as células tornaram-se mais baratas e formatadas para uso em situações mais corriqueiras. As células a combustível funcionam como uma bateria ou uma pilha, transformando energia química em energia elétrica, quebrando as moléculas de hidrogênio que
U
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 67
reagem com o oxigênio do ar. Na forma estacionária são parecidas e fazem as funções de um gerador, mas em tamanho reduzido. A diferença mais importante é que fazem isso de forma silenciosa e sem emitir poluentes. Quem já ficou ao lado de um gerador a diesel em funcionamento sabe bem o barulho e a fumaça que ele emite. Assim, as células abrem novos espaços e servem de poderosa ferramenta em que a preocupação ambiental e o silêncio ganham pontos. ara a Eletropaulo, as células podem representar o início de formas alternativas de produção de energia elétrica. "Quando recebermos a célula, nós vamos levá-Ia, provavelmente, para um prédio, onde será simulada a substituição de um no break (equipamento que evita a paralisação de uma rede de computadores)': explica a engenheira eletrônica Mara Ellern, especialista em análise de negócios da Eletropau10. "Vamos verificar o funcionamento e as possíveis falhas." Antes de irem para o teste de campo as células também vão passar por análise final do professor José Antônio Iardini, do Departamento de Engenharia de Energia e Automação Elétrica, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Os no breaks normalmente suprem a rede de computadores por 15 minutos, funcionam com enormes pilhas e seu custo sai em torno de US$ 1 mil por kW. As células, para fazer o mesmo serviço, tendem a ficar num preço em torno de US$ 1,5 mil pelo mesmo kW. "A vantagem da célula é que ela opera por um tempo que só é limitado pela capacida-
Primeiro protótipo da Electrocell produziu 25 watts de energia elétrica
P
Célula a combustível comercial: montagem final com cinco módulos de 10 quilowatts cada
de de armazenamento de combustível, podendo chegar a uma autonomia de muitos dias de operação se conectada a tubulações de gás natural. Com isso, a manutenção fica menor, além de diminuir as exigências de espaço físico e a emissão de poluentes. "Meu sonho é colocar, no futuro, as células em uma aplicação nobre como em um hospital, porque, além da energia elétrica limpa e silenciosa e sem interrupção, elas podem fornecer água quente para esterilização", diz Mara. A água é produzida porque os prótons do hidrogênio (depois de os elétrons serem des-
dação ambiental, a poluição e o efeito estufa levaram a uma busca por energias limpas. Uma inquietação concretizada no Fórum Mundial de Kyoto, no Japão, em 1997, quando grande parte dos países se comprometeu a diminuir o nível de poluentes na atmosfera. A preocupação ambiental somada ao surgimento de novos materiais e o barateamento das células a combustível, também um ganho da década passada, levaram o hidrogênio novamente à bai-
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tinados à produção de energia elétrica), quando atravessam a membrana polimérica condutora, no interior da célula, encontram o oxigênio do outro lado. Planos e expectativa - Para obter o equipamento, a Eletropaulo investiu R$ 1,7 milhão na fabricação da célula, com recursos do Fundo Setorial de Energia (CTEnerg), controlado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e administrado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Do lado da Electrocell, a expectativa é grande para entregar o primeiro pro-
Ia energética. Desde então, bilhões de dólares são gastos todos os anos para á implementação e a popularização das células que produzem energia elétrica de forma limpa e silenciosa. Somente Q governo norte-americano deve investir US$ 5,5 bilhões em células nos próximos dez anos. Em junho deste ano, o presidente da Comissão Européia, Romano Prodi, anunciou que os países-mem bros irão investir € 2 bilhões em cinCO;; anos nas pesquisas com hidrogênio. Nu comunicado de Prodi consta também intenção de colocar esse combustível as células na frente da economia enen
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duto comercial. "Os primeiro protótipos nós desenvolvemos dentro do projeto do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP, num trabalho iniciado em 2000, que fez decolar a empresa", conta o engenheiro eletrônico Gilberto Ianólio, um dos quatro sócios. "Dentro do projeto do PIPE fizemos protótipos de 25 watts (W), de 75 W e um de 10 kW:' Nesses projetos, inclusive o da Eletropaulo, que envolve o conjunto final de cinco módulos de 10 kW cada, os pesquisadores da Electrocell estão utilizando 90% de material desenvolvido no Brasil. O úni-
co produto importado é a Membrana de Troca de Prótons, chamada na sigla em inglês de PEM, que caracteriza o tipo de célula. Esse polímero, chamado de náfion, considerado o coração desse tipo de célula, foi desenvolvido pela empresa norte-americana Dupont na década de 1960 para a produção eletrolítica (por eletrólise, reação química por meio de corrente elétrica em meio aquoso) de cloro. Essa membrana está'instalada no interior da célula como se fosse um sanduíche, tendo de cada lado catalisadores e eletrodos, um positivo e ou. tro negativo. Esse conjunto leva o nome
de Conjunto de Membrana e Eletrodos, ou MEA em inglês. Para montar a célula, os quatro sócios e mais 20 colaboradores desenvolveram toda a engenharia que envolve esse equipamento. "São as engenharias de construção do stack (conjunto de MEAs), de controle, de processamento de energia, além de processos de vedação, refrigeração e integração" diz [anólio. Outro produto elaborado e fabricado pela Electrocell são as placas bipolares de grafite. Elas servem para a condução e distribuição do gás hidrogênio dentro da célula, além de fazer a
quisa e de ensino no país estão empenhados nos estudos das células e de seus componentes e várias empresas da área energética financiam projetos de pesquisa e desenvolvimento, como Eletropau10, Petrobras, CopeI (PR) e Cernig (MG). No ano passado, sob a coordenação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e do Fundo Setorial de Energia, foi estabelecido o Programa Brasileiro de Células a Combustível, que pretendia aglutinar pesquisadores desse tipo de equipamento no país, além de ter estabelecido uma meta de 50 megawatts (MW) - como comparação, a hi-
PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 69
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ligação entre um MEA e outro. Fora o trabalho direto na célula, foi preciso montar todo o sistema elétrico que transforma a energia de corrente contínua (DC) que a célula produz para a corrente alternada (AC) usada no nosso dia-a-dia. Para a Electrocell, esse momento é de afirmação. "Não arriscamos mais, estamos produzindo um equipamento que é fruto de desenvolvimento tecnológico", afirma Ianólio, "Agora não é mais possível errar", diz ele. "Nossa meta é montar uma fábrica de células a combustível para produção seriada no Brasil. Para isso já ternos um layout planejado para absorver urna equipe de 58 funcionários': conta o engenheiro químico Gerhard Ett, outro sócio. Funcionamento básico de uma célula a combustível Instalada no Centro Incubador de Empresas de Tecnologia (Cietec), que fica para diminuir o preço da célula da Elecdentro do prédio do Instituto de Pestrocell. Outro fator importante é que quisas Energéticas e Nucleares (Ipen), na Cidade Universitária, em São Paulo, a esses equipamentos do tipo PEM são os candidatos naturais para uso em autoempresa contou com um amplo apoio móveis. "É o tipo de célula mais versácientífico e tecnológico. "Na área teóritil, para ser usada tanto em veículos ca e de pesquisa básica tivemos a colacorno na forma estacionária para geboração do professor Ernesto Gonzalez, ração de energia elétrica': diz Linardi. do Instituto de Química de São Carlos Atualmente, todas as montadoras de da Universidade de São Paulo (USP), e veículos testam a célula PEM em veícuna área tecnológica do professor Marlos experimentais na substituição do celo Linardi, do Ipen", conta Ianólio. Pela convivência dentro do Ipen, o motor a combustão ou como complemento a ele. pessoal da Electrocell esteve nos últimos . Outra vantagem da PEM é que ela anos muito próximo do professor Litrabalha em baixas temperaturas, em nardi e do seu grupo de oito pesquisadores. Entre as contribuições do instituto aos projetos da Electrocell existe um PROJETO contrato formal de parceria no desenvolvimento dos eletrodos e dos cataliDesenvolvimento de Células sadores. Linardi está finalizando a proa Combustível Integrado dução laboratorial de um novo tipo de com Software e Hardware de Monitoração, Diagnóstico, MEA. "Desenvolvemos camadas de eleControle e Periféricos trodos e de catalisadores que são aplicadas ao náfion", conta o pesquisador do MODALIDADE Ipen que também recebe financiamenPrograma de Inovação Tecnológica to da FAPESP e do Fundo Setorial do em Pequenas Empresas (PIPEl Petróleo e do Gás (CTPetro). ''Agora esCOORDENADOR tamos requerendo urna patente nacioGERHARD ETT - Electrocell nal sobre esse produto e poderemos repassar a tecnologia para a Electrocell," INVESTIM E NTO Para Linardi, a adoção de catalisadoR$ 241.580,00 e US$ 24.000,00 res e eletrodos próprios será muito útil
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torno dos 80° Celsius (C), facilitando a instalação em veículos automotores. Se as baixas temperaturas facilitam o uso automotivo, as altas trazem novas vantagens. "Em outro projeto, nós estamos desenvolvendo uma célula a combustível do tipo óxido sólido cerâmico (Sofc, sigla em inglês)': conta o pesquisador. Essa célula opera em altas temperaturas, entre 800° e 1.000° C, e numa estação estacionária trabalha como co-geradora, fornecendo vapor d'água para uma caldeira, produzindo mais energia elétrica. Seja qual for o tipo da célula, a dependência do hidrogênio é total. E a maneira mais simples de obtê-lo, que seria por meio da eletrólise da água, é um processo que usa a energia elétrica e é muito caro. O uso da célula, nesses casos, está restrito às usinas hidrelétricas. Como elas não têm meios de estocar esse tipo de energia, as usinas podem, fora dos horários de pico, produzir hidrogênio com o excedente não utilizado na rede. Reforma energética - Mas o que garantirá o sucesso das células a combustível são os reformadores, equipamentos capazes de extrair o hidrogênio do gás natural, da gasolina ou do metanol. Nessa linha, em julho deste ano, o Laboratório de Hidrogênio do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) apresentou um reformador de etanol, o álcool produzido da cana-de-açúcar. "É uma reação termo química em que reagentes e catalisadores são usados para transformar o etanol em hidrogênio': explica o pesquisador Antônio José Marin Neto. A idéia do professor Ennio Peres da Silva, coordenador do laboratório e também secretário-executivo do Centro Nacional de Referência em Energia do Hidrogênio (Ceneh), igualmente abrigado na Unicamp, é aperfeiçoar esse primeiro protótipo e colocá-Io em urna caminhonete (veja Pesquisa FAPESP n° 82) dotada de célula a combustível que está sendo montada no Ceneh e deve ficar pronta no início de 2004. •
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ITECNOLOGIA
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TRANSPORTE --
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Híbridos nas ruas Ônibus com tração elétrica e convencional, produzido em São Bernardo, ganha destaque internacional
SYLVIA LEITE
percorrer as ruas e avenidas de São Bernardo do Campo, na região do ABC paulista, o ônibus produzido pela empresa Eletra marca mais um ponto para esse tradicional pólo da indústria automobilística brasileira. Equipado de forma inovadora combinando duas formas de propulsão num mesmo veículo, a energia elétrica e o motor a diesel, o ônibus levou a empresa a ficar entre as sete instituições finalistas na categoria energia no prêmio World Technology 2003, de um total de 15indicados por 700 pesquisadores e organizações de 50 países que formam a World TechnologyNetwork. O prêGosto mio, considerado uma espécie de Oscar tecnológico, é patrocinado por empresas e organizações do porte da Nasdaq, Microsoft, DuPont e revista Time. Esse tipo de tecnologia está presente comercialmente em automóveis das empresas japonesas Toyota, com o carro Prius, e Honda, com o Insight. Entre os ônibus, existem poucos fabricantes com essas características no mundo além do Brasil, apenas os Estados Unidos possuem esse tipo de ônibus em
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do freguês: tecnologia
adaptável a várias marcas de carroceria
operação comercial. Entre as vantagens em relação aos convencionais, estão o baixo preço e os ganhos ambientais. Segundo medições do Instituto de PósGraduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ), a redução dos particulados, ou fumaça preta, chega a 90% em relação ao ônibus convencional. No balanço geral, a emissão de poluentes fica 63% menor. "Com esses índices de
e de chassi
emissão de particulados, nosso ônibus já atende à norma Euro V,que só entrará em vigor na Europa em 2008': diz o engenheiro eletrônico Antônio Vicente de Souza e Silva,diretor técnico da empresa e responsável pelo desenvolvimento do ônibus híbrido. "No Brasil, ainda vigora a Euro Il'; compara. O funcionamento desse ônibus se baseia num sistema com um motor de combustão interna, um motor elétrico, PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 71
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sistema eletrônico tem custo fixo, sem relação com o tamanho do ônibus
um gerador e um conjunto de baterias administrados por um sistema eletrônico que calcula, a cada momento, a necessidade energética do veículo. "Diferente dos veículos convencionais, o motor a combustão serve apenas para acionar o gerador que abastece o veículo de energia elétrica. O motor elétrico é o responsável pela movimentação do ônibus e recebe a energia do gerador e do banco de baterias", diz o engenheiro. Nas baterias fica acumulada a energia excedente produzida pelo gerador. Quando comparado ao trólebus, o híbrido tem a vantagem de não depender da rede de fiação aérea para obter energia elétrica. ''A rede exige manutenção constante, está exposta a contratempos, como quedas de árvores e raios, e limita a movimentação do veículo." O ônibus híbrido mesmo quando está parado é abastecido com a energia elétrica vinda do gerador que recarrega as baterias. Nos percursos planos, quando a demanda do motor elétrico é reduzida, a energia excedente também é armazenada. O aproveitamento ener72 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
gético se dá, ainda, durante a frenagemo"Em um veículo convencional, a energia de movimento se transforma em calor no sistema de freio e acaba se perdendo. No híbrido, a eletrônica reconhece o comando para frenagem e transforma o motor elétrico em um gerador, acumulando energia nas bate'rias ao invés de dissipá-Ia no sistema de freios:' fato de o motor a combustão ser usado apenas para acionar o gerador possibilita que sua potência seja bem inferior à utilizada em veículos convencionais do mesmo porte. Para movimentar um ônibus padrão de 12 metros (rn) com sistema de tração convencional, por exemplo, é necessário um motor de pelo menos 210 cavalos (cv), enquanto o híbrido só demanda 80 cv - a potência de uma van. Isso diminui o consumo de combustível e de óleo lubrificante, além de reduzir os gastos com manutenção do motor.
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O argumento de venda da empresa, no entanto, está centrado na redução de poluentes, nos gastos com combustível e manutenção, e na durabilidade do veículo, que, segundo Silva, é pelo menos duas vezes superior. "O tempo de vida do tradicional é de cinco a sete anos, enquanto os híbridos duram o mesmo que os trólebus, ou seja, 15 anos." No combustível, ainda segundo a Coppe, a economia varia de 15% a 30% a depender da rota. A redução nos custos operacionais se estende, também, ao óleo lubrificante, lona de freio, pneus e manutenção do motor. Veículo multimarcas - A tecnologia dos ônibus híbridos é adaptável a praticamente todas as marcas de carroceria e chassis, que podem ser escolhidas de acordo com a necessidade do cliente. Até o momento, foram usadas carrocerias da Marcopolo e da Buscar e chassis da Volvo, Mercedes e Volkswagen. Com os motores ocorre o mesmo. Os híbridos produzidos pela Eletra têm motores a combustão da International ou da Mercedes e motores elétricos da Weg e da Equacional. "Isso é importante porque, às vezes,o cliente tem
Baterias instaladas no teto do ônibus armazenam energia excedente gerada nos percursos planos
uma frota com chassis e carroceria de determinada marca e quer continuar com ela para facilitar a manutenção", diz o engenheiro. Um ônibus híbrido padrão de 12 m, por exemplo, custa 30% mais que um convencional. A diferença cai para 10% no articulado de 18 m e sobe para 40% no microônibus. O motivo da variação é que o sistema eletrônico tem um custo fixo sem relação direta com o tamanho do veículo. Silva assegura, no entanto, que a diferença de 30%, no carro padrão, se paga em aproximadamente três anos com a economia de consumo e manutenção. Um veículo padrão de 12 m pode ser vendido no mercado internacional por US$ 150 mil. Nos Estados Unidos, um modelo semelhante custa em torno de US$ 370 mil. A diferença de preço ocorre, segundo ele, pelo fato de o Brasil ser um dos maiores produtores de carrocerias e chassis do mundo e dispor de mão-de-obra de baixo custo. A Eletra ainda tem uma produção tímida. Segundo a diretora-presidente, Maria Beatriz Setti Braga, a empresa possui 14 ônibus em circulação comercial e trabalha na produção de 51 veícu-
los que serão entregues até o final do semestre. "Quando começarmos a produzir em maior quantidade, nosso preço chegará perto do ônibus convencional", promete. Ela esclarece, no entanto, que a empresa não pretende entrar no mercado de produção em massa, porque não tem a intenção de concorrer com grandes montadoras. "Nosso trabalho será sempre por encomenda, como ocorre com os aviões da Embraer", exemplifica. eatriz e o irmão, João Antônio, são proprietários da ABC Transportes Urbanos que atua há 90 anos em São Bernardo. Eles criaram a Eletra há quatro anos para atender uma demanda da empresa de ônibus. "Nós queríamos um veículo que não poluísse, não fizesse barulho e consumisse pouco combustível. Inicialmente pensamos em comprar ônibus elétricos à bateria, mas decidimos aproveitar a experiência do engenheiro Antônio e Silva, que trabalhou por muitos anos no projeto e produção de trólebus, e fazer nosso próprio híbrido", diz Maria Beatriz.
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Paulistão e exportação - O desenvolvimento do primeiro ônibus durou 12 meses e custou cerca de US$ 500 mil. Segundo a presidente, os primeiros carros da Eletra entraram em circulação em 1999, um pouco antes dos híbridos norte-americanos que só começaram a rodar em 2000. Quatro anos depois, com patentes requeridas no Brasil, nos Estados Unidos, no Chile, no Panamá e países da União Européia, a empresa começa a fechar os primeiros grandes contratos. O primeiro é para o projeto Paulistão, da Prefeitura de São Paulo, que será feito exclusivamente com híbridos. Segundo a diretora presidente, já foi assinado o contrato para a produção dos primeiros 15 ônibus. A Metra Sistema Metropolitano de Transporte testa, desde o final de 2002, três ônibus híbridos da Eletra, num percurso de 33 quilômetros entre os bairros de São Mateus e Iabaquara, em São Paulo, passando pelas cidades de São Bernardo e Santo André. As exportações também começam a se concretizar. A empresa possui um veículo em demonstração no Chile, onde vai participar de uma grande concorrência para a substituição da frota urbana da cidade de Santiago. O prestígio alcançado com o prêmio poderá acelerar o processo de crescimento da empresa. Afinal, o híbrido brasileiro foi escolhido entre os melhores projetos de desenvolvimento tecnológico na área de energia por um júri internacional e concorreu com empresas e universidades de diversas partes do mundo. Nessa categoria, o vencedor foi o Lawrence Berkeley Laboratory, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, pelo conjunto de trabalhos no campo energético que resultou em melhor eficiência e diminuição dos impactos ambientais. Entre as empresas finalistas, a Eletra teve companhia brasileira em outras categorias. Na área de empreendedor social, o primeiro lugar foi conquistado pelo professor de informática e empresário Rodrigo Baggio, criador do Centro para Democratização da Informática, entidade voltada para a inclusão digital. Como finalista nessa área também ficou o diretor do projeto Viva Rio, Rubem César Fernandes, que oferece cursos de informática em comunidades pobres no Rio de Janeiro. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 73
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ncontrados nas mais diversas formas e áreas de aplicação, os sensores estão em toda parte. Nos dispositivos usados para contar pessoas que entram ou saem de lojas, na avaliação química de bebidas e na identificação de algumas moléculas de gás em meio a 1 milhão de outras que compõem o ar. Na indústria siderúrgica, por exemplo, a tarefa de controlar o processo de fabricação de aços é feita com o auxílio de um senso r descartáveL Colocado em um vagão com 200 toneladas de aço a 1.600° Celsius, o dispositivo, antes de derreter, tem apenas 4 ou 5 segundos para avaliar o nível de oxigênio no metal, medida fundamental para determinar as características finais do produto. Formado por mais de dez componentes, apenas um deles, justamente o mais importante, feito em material cerâmico e chamado de coração do sensor, não é fabricado no Brasil. Mas, pelos resultados apresentados em um estudo conduzido com óxidos cerâmicos por dois grupos da Universidade de São Paulo (USP) e um do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), essa dependência do produto importado poderá ser suprida com tecnologia nacional. "Temos condições não só de desenvolver um material igual, mas até melhor, porque atuamos exatamente no ponto do sensor mais problemático, que é o fenômeno intergranular", diz o professor Reginaldo Muccillo, do Ipen, coordenador do projeto temático financiado pela FAPESP sobre materiais cerâmicos. O grupo do Ipen faz parte do Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos (CMDMC), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) da Fundação em que a interação com as indústrias é incentivada. O fenômeno intergranular está relacionado ao processo de fabricação dos materiais cerâmicos, que tem como ponto de partida um pó, que pode ter vários componentes. Para transformar esse pó tanto em um vaso como em um sensor, é necessário que o material seja colocado no forno a altas temperaturas, em um processo conhecido como sinterização. O produto final é um material sólido constituído de pequenos grãos. A região de contato que existe entre eles,
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Pastilhas de óxido de zircônio são a base de sensores que avaliam oxigênio
chamada de intergranular, é crítica para a passagem de oxigênio, a condução de elétrons e de calor, além de determinar as propriedades mecânicas. "No temático, a ênfase é para o estudo das propriedades elétricas", relata Muccillo. Essa escolha deve-se ao fato de que na maioria dos sensores é necessário utilizar um sinal elétrico para fazer as medições desejadas. "Se o contorno do grão não for muito bem elaborado, o material fica resistente à passagem de íons de oxigênio", explica o professor Douglas Gouvêa, do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Escola Politécnica da USP, que elabora a estrutura interna (microestrutura) das cerâmicas. "Estudamos como processar esses materiais para ter um grão maior ou menor, porosidade mínima ou máxima, dependendo da aplicação", relata. O terceiro grupo que participa do projeto tem à frente o professor Renato Jardim, do Instituto de Física da USP, especialista nos fenômenos de transporte elétrico a baixas temperaturas dos materiais supercondutores. "Um grupo complementa o outro", diz Muccillo. Ampla aplicação - Nesse projeto, que teve início em setembro de 2000 e está previsto para terminar em agosto do ano que vem, são estudados vários óxidos cerâmicos, como óxido de zircônio, de estanho, de alumínio, manganitas de lantânio e supercondutores cerâmicos. Essas substâncias têm amplas aplicações em dispositivos, sensores, baterias e células a combustível. Como exemplo de aplicação do óxido de zircônio, ele cita o senso r de oxigênio, que pode ser usado tanto pela indústria siderúrgica no processo de fabricação do aço como na automobilística para determinar em tempo real o teor de oxigênio no motor 76 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
e no cano de escapamento de veículos. Esses sensores permitem um melhor rendimento e o controle do equilíbrio entre ar e combustível. Também nas caldeiras de hospitais é possível economizar combustível. Muccillo estuda o óxido de zircônio desde 1979. Essa dedicação já resultou em um pedido de patente da preparação de uma massa cerâmica, à base de óxido de zircônio e óxido de magnésio, para ser usada em sensores de oxigênio descartáveis, que garantem uma sobrevida de 10 segundos antes de se desintegrarem nos vagões de aço. Ele diz que o Brasil, mesmo tendo a matéria-prima para a produção de óxido de zircônio e laboratórios de pesquisa com capacidade de desenvolver materiais apropriados para sensores, importa o componente cerâmico. "Um quilo do óxido seria sufi-
o PROJETO Estudo de Fenômenos Intergranulares em Óxidos Cerâmicos MOOALIOAOE
Projeto Temático COORDENADOR REGINALDO
M UCCILLO
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Ipen
INVESTIMENTO
R$ 309.075,00
e US$ 216.752,00
ciente para fazer uns mil sensores. Uma pequena usina produzindo 500 quilos por mês poderia suprir a demanda atual do país", afirma o coordenador. Tratamento térmico - Douglas lembra que uma das idéias discutidas dentro do projeto temático é reativar a produção de óxido de zircônio no Brasil, abandonada depois que o Ipen desativou a sua usina piloto. Ele ressalta que o grupo tem uma contribuição interessante a dar nas fases de conformação e queima das cerâmicas, partes do processo dominadas plenamente apenas pelas empresas detentoras no exterior da tecnologia de fabricação do coração do sensor. Na fase da queima, por exemplo, o seu grupo conseguiu baixar o patamar de sinterização do óxido de zircônio de 1.550° durante duas horas para 1.350° por dez segundos. "Realmente é uma condição especial de fabricação. Mas se a indústria conseguir baixar a temperatura para 1.350° por meia hora terá um ganho energético enorme", diz Muccillo. Os pesquisadores já atestaram a possibilidade de ganhos energéticos no processo de fabricação, com a redução da temperatura e do tempo de sinterização, Agora eles vão trabalhar na caracterização do material, para ter certeza de que todas as propriedades da cerâmica serão mantidas e ela poderá ser usada na confecção industrial de sensores. •
ITECNOLOGIA
M ETEOROLOGIA
Gotas em detalhes Coletar desenvolvido na Unesp registra volume de chuvas, data e horário em que ocorreram
odistante ano de 1442 os agricultores da Coréia do Sul já conseguiam medir a quantidade de chuvas que caía em suas terras e, com essa informação, enviada a Seul, a capital do reino, planejavam as colheitas. A medição era feita com um equipamento de metal no formato de tambor,com escalainterna, que mais tarde no Ocidente recebeu o nome de pluviômetro. Mais de cinco séculos depois, novas funções foram agregadas a esse aparelho, utilizado por meteorologistas,pecuaristas, empresasde construção civil,de geração de energia hidrelétrica e outros setores. Apesar da grande demanda, ainda hoje quase todos os instrumentos eletrônicos para medir chuvas enColetar tem baixo consumo de energia contrados no mercado brasileiro são fabricados fora do país. A constatação de que faltava um aparelho toO equipamento, de pequenas ditalmente nacional, que fosse facilmente . mensões, funciona ligado a um pluviôadaptado às necessidades dos usuários metro, um recipiente plástico que capta a água da chuva. A cada 0,2 milímetro locais,levou o professor João Eduardo registrado, é enviado um sinal elétrico Machado Perea Martins, do Departamento de Computação da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual PROJETO Paulista(Unesp), de Bauru, a desenvolverum coletor de dados automático caImplementação de um Sistema pazde armazenar grandes quantidades Automático para Aquisição de de dados pluviométricos, processar inDados Pluviométricos formações,econômico no consumo de MODALIOAOE energia e com baixo custo de montaLinha Regular de Auxílio a Pesquisa gem. "O valar comercial do produto importado chega a US$ 500, já o preço COORDENADOR de custo de montagem do nosso coleJOÃO EOUARDO MACHADO PEREA MARTINS - Unesp tar é de US$ 25", diz. Perea prepara-se parapatentear o coletor e conta ter reINVESTIMENTO cebidovárias consultas de empresas inR$ 46.315,00 teressadasem conhecer o projeto.
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para o coletor. Durante o período em que fica no campo, o aparelho registra não só o volume de chuvas, mas também a data e o horário em que ocorreram, minuto a minuto. O coletor tem uma memória onde ficam armazenados os dados registrados, transferidos posteriormente para um computador. O software para a recepção dos dados pelo computador também foi desenvolvido por Perea e pode ser adaptado às pesquisas locais. Informação preservada - O pesquisador conta que tudo foi pensado para simplificar a instalação do equipamento em campo. "Basta apertar dois parafusos para conectar o pluviômetro ao coletar." Falta de energia elétrica também não é problema. Três pilhas garantem seu funcionamento por até dois anos. Se houver falha, as informações não são perdidas. "Ele tem urna memória especial, que retém informação mesmo quando acaba a energia",explica. O diretor do Instituto de Pesquisas Meteorológicas (IPMet), de Bauru, Maurício de Agostinho Antonio, que utilizou o coletor na fase experimental, cita como principais vantagens seu baixo custo e a boa resposta temporal. Segundo Osmar Cavassan, da Faculdade de Ciências da Unesp, também de Bauru, "o equipamento permite correlacionar variações na fauna e na flora com as características físicasdo ambiente, principalmente clima e solo': Agora ele está à espera da instalação do coletor na versão final para utilizá-lo em projetos de pesquisa, principalmente de ecologia. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 77
ITECNOLOGIA CRIAÇÃO
ANIMAL
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do camarão Cultivo em água doce e pesquisa genética fortalecem a produção de crustáceo marinho
Os próximos três anos, a Rede de Genoma Nacional estará envolvida no trabalho de mapeamento do genoma do camarão-branco do Pacífico, o Litopenaeus vannamei, espécie cultivada na quase totalidade dos viveiros brasileiros. São 13laboratórios que estão aprimorando o conhecimento sobre a genética desse crustáceo, que ganha importância a cada ano, principalmente porque o Brasil teve um crescimento espantoso nas exportações desse produto. Passou de US$ 14,2 milhões em 1999 para US$ 155 milhões em 2002. Neste ano, a previsão é atingir US$ 240 milhões. A produção total deve ficar em 90 mil toneladas, sendo que mais de 90% sairá da região Nordeste do país, onde o cultivo do camarão ocupa o segundo lugar na pauta de exportações, atrás apenas dos derivados da cana-deaçúcar. Assim, quanto mais se conhecer o animal e a criação, mais asseguradas estarão a produtividade e a expansão dessa iguaria apreciada em todos os cantos do planeta. Outra boa notícia sobre esse animal aquático criado em terrenos à beira-mar, onde se aproveita a água marinha ou de estuários, é que ele pode ser cultivado em água doce, conforme estudos do professor Paulo de Paula Mendes, do Departamento de Pesca da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). "Depois de três anos de pesquisas conseguimos
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aclimatar e criar o camarão marinho em água totalmente doce, igual à de beber", conta Mendes, que preparou a divulgação do trabalho para o XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca, marcado para o final de setembro, em Porto Seguro (BA). A base da técnica usada consiste em reduzir a concentração salina da água de forma lenta até eliminar o sal. Com esse processo, Mendes diz que conseguiu um índice de sobrevivência de 95%. "A criação desse camarão em água totalmente doce é inédita inclusive em outros países que criam o crustáceo, como China, Tailândia, Indonésia e Equador:' O cultivo do camarão em águas ligeiramente doces já é uma prática usada em algumas localidades do Nordeste brasileiro. No Rio Grande do Norte, Estado líder na produção de camarão, existem experiências para cultivo em água com baixíssima salinidade. A atividade é uma forma de interiorizar a criação e levá-Ia a regiões com escassas possibilidades de geração de emprego e renda. Na cidade de Tangará, o açude do Trairi, região a 300 quilômetros de Natal, abriga 70 hectares de viveiros desse tipo financiados pela Agência de Fomento do Rio Grande do Norte com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Segundo o professor Mendes, "a criação em água doce desse camarão irá promover mais uma oportunidade de fixação do homem no campo, principalmente o pequeno produtor, e até servir como meio de subsistência". Em algumas fazendas,
o rendimento bruto dessa cultura pode atingir US$ 10 mil por hectare num ano, com o quilo do camarão vendido à indústria processadora por R$ 8,00. Esses números resultam do fato de o Brasil possuir a maior produtividade do mundo, com 5.400 quilos por hectare ao ano (kg/ha/ano). Na China, é de 1.158 kg/ha/ano, e na Tailândia, 3.421 kg/ha/ano, a segunda maior. Famílias diferentes· O excelente desempenho brasileiro é resultado da bem-sucedida colaboração entre pro-· dutores e pesquisadores de instituições públicas, que culminou, neste ano, com o início do projeto Genoma Camarão. As primeiras pesquisas com essa espécie começaram em 1998 na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Foi um trabalho de identificação, por meio da análise do DNA, da variabilidade de reprodutores de diferentes famílias (pedigrees) em vários viveiros. O objetivo era afastar a possibilidade de consangüinidade, um fator que pode gerar deficiências de resistência e de crescimento. Para a criação do camarão, esses estudos são muito importantes porque esses crustáceos são extremamente prolíferos. Um único casal pode sustentar vários viveiros, faci-
litando o cruzamento de indivíduos de uma mesma família. Um dos problemas enfrentados pelos pesquisadores foi selecionar os diferentes reprodutores. As pesquisas chegaram, então, a um diagnóstico da variação genética encontrada nos diversos plantéis de reprodutores do Litopenaeus vannamei. Com essa informação, foi possível orientar cruzamentos para estabelecer diferentes linhagens nos laboratórios de produção de póslarvas - o primeiro estágio de crescimento do camarão no viveiro. "Em 2000, iniciamos nosso programa de genômica do camarão do PaCÍfico por meio de um projeto de prospecção de microssatélites (seqüências de repetições curtas no genoma), marcadores extremamente úteis para estudos de variação genética, identificação de linhagens, estudos de pedigrees e mapeamento genético. Após dois anos de prospecção desses microssatélites, foi natural propormos a realização do projeto Genoma para obtermos o conhecimento das etiquetas de seqüências expressas (ESTs) - fragmentos do código genético que ajudam a identificar os genes", explica o coordenador do projeto, professor Pedro Manoel Galetti Iúnior, do Departamento de Gené-
tica e Evolução da Universidade Federal de São Carlos (UFScar). A pesquisa não será realmente um trabalho fácil. Um dos motivos é o tamanho do genoma do Litopenaeus vannamei, aproximadamente dois terços do genoma humano, que representa cerca de 2 bilhões de pares de bases. No total, o projeto vai seqüenciar 300.000 ESTs de diferentes tecidos e fases de desenvolvimento do camarão. Peneirando os cromossomos . Outro trabalho que deverá em breve gerar resultados práticos foi concluído pelo professor Wagner Molina, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Genética e Biologia Molecular da UFRN, um dos participantes do projeto Genoma. O pesquisador completou o estudo do cariótipo - conjunto de cromossomos que são as estruturas que contêm a informação genética - do camarão e atestou que o crustáceo possui 88 cromossomos, em dois lotes, um paterno e um materno. Só como comparação, os humanos possuem 46 cromossomos. O próximo passo será a tentativa de manipulação genética dos cromossomos para tornar os camarões estéreis, o que evitaria a indesejável reprodução nos viveiros de engorda. ''A reprodução, PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 79
que não interessa ao produtor, requer energia dos animais. Camarões estéreis poderiam usar essa energia para o crescimento, favorecendo a produção. Outro ganho com a esterilidade seria para o ambiente marinho, porque não se tem controle sobre as criações e sabemos que muitos camarões-brancos do Pacífico já estão no mar do Nordeste, por causa de vazamentos dos viveiros. As conseqüências para o ambiente são imprevisíveis, porque a espécie não é nativa. Ela pode estar competindo com os camarões naturais da nossa costa': alerta Wagner Molina. Os problemas ambientais também se estendem para os locais de criação. Muitos criadores instalaram seus viveiros em mangues, prejudicando esses ecossistemas. No final de 2001, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) promoveu uma megaoperação que multou 180 produtores, a maioria de pequeno porte. A metade das multas foi por causa do desmatamento de áreas de manguezais. A procura por esses ambientes tem algumas explicações. Além de proporcionar água de boa qualidade, os mangues são ricos em nutrientes, o que permite reduzir o uso de ração. pode estar na criação do camarão em água doce, evitando assim os problemas nas áreas de preservação ~ ambiental e garantindo o bom desenvolvimento da carcinicultura, como é chamada a criação do crustáceo. Provavelmente, quando esse novo caminho estiver sendo estabelecido nos próximos anos, os primeiros resultados do projeto Genoma começarão a estar disponíveis. Assim a expansão da criação será ainda mais beneficiada. Galetti Iúnior quer disponibilizar parte das informações sobre o Genoma antes mesmo da conclusão final do trabalho. O objetivo é que as pesquisas que levem a resultados práticos comecem a ser feitas logo. ''As informações sobre marcas genéticas que acompanham caracteres de importância econômica permitirão a seleção assistida por esses marcadores. Daí surgirão informações sobre o funcionamento dos genes identificados e a maneira como esse conhecimento pode ser potencializado em benefício da atividade de cultivo", diz o pesquisador. O projeto Genoma Camarão terá um custo total de R$ 3 milhões, finan-
Tanques de criação de larvas de camarão
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No microscópio, análise de pós-larvas
Camarão recebe marca de tinta que define linhagem
Nos 11 mil hectares de cultivo de camarão predominam as fazendas que usam água do mar ou de estuários
ciados pela Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Ministério da Agricultura e Abastecimento e governo do Estado do Rio Grande do Norte. Do seqüenciamento participam as seguintes universidades: UFSCar, UFRPE, UFRN, Universidade de São Paulo, Universidade Estadual Paulista, Universidade Federal do Maranhão, Universidade Federal do Ceará, PontifíciaUniversidade Católica do Rio . Grande do Sul,Universidade Federal de Santa Catarina, Universidade Estadual Santa Cruz (Ilhéus, Bahia) e Universidade Federal do Pará. Emprego e divisas- O interesse dos nordestinos nas pesquisas é grande. A carcinicultura é um setor que trabalha com a perspectiva de produzir 90 mil toneladaseste ano, 40 mil a mais do que em 2002.A atividade gera 3,75 postos de trabalho diretos e indiretos por hectare contra os 2,14 na fruticultura irrigada do Valedo São Francisco, por exemplo, segundopesquisa do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Em 2002, a carcinicultura produziu divisas, por meio
dos 11 mil hectares de cultivo, para cerca de 40 mil pessoas que trabalham ao redor de 680 produtores em todo o país. O camarão-branco do Pacífico, encontrado naturalmente da costa do México até o Chile, foi trazido ao Brasil nos anos 80. Era uma espécie criada com sucesso em países como o Equador, grande produtor na época-A técnica de cultivo para esse crustáceo já existia e foi adotada pelos produtores que começavam o negócio no Brasil. Uma das vantagens sobre as espécies de camarões brasileiros era que o Litopenaeus vannamei precisava de menos proteína para crescer,embora fosse menos resistente a doenças. Muitos brasileiros foram aprender com os equatorianos as técnicas de manejo, que, no fim, não se mostraram eficazes. No final dos anos 90, uma virose, chamada de mancha branca, dizimou 90% da produção do país e o governo brasileiro proibiu a importação das matrizes reprodutoras por motivos sanitários. Os produtores trabalharam duro para desenvolver a cadeia reprodutiva em cativeiro e hoje as técnicas de manejo são mais avançadas que as dos maiores países produtores. Enquanto os brasileiros lutam para conseguir um
camarão resistentea doenças, investindo em pesquisas genéticas, produtores chineses e tailandeses usam grandes doses de antibióticos nos viveiros. Com isso, enfrentam barreiras sanitárias dos maiores importadores, como Estados Unidos, França e Espanha. Manejo avançado • "O Genoma do Camarão pode nos ajudar a ter um produto ainda melhor. Investimos no projeto também para despertar o interesse da comunidade científica brasileira para as pesquisas com o camarão", diz Itamar Rocha, presidente da ABCC. Alguns laboratórios, como o Aquatec, no Rio Grande do Norte, já se preocupam com melhoramento genético há algum tempo. O resultado é uma produção de 250 milhões de larvas vendidas para cinco Estados brasileiros. "Há seis anos, começamos um trabalho de seleção de famílias e formação de pedigrees com alta qualidade. Para nós, o Genoma será uma poderosa ferramenta para uma seleção ainda mais rigorosa", diz Ana Carolina de Barros Guerrelhas, bióloga e sócia do laboratório. Para ela, o Brasil não deve se preocupar em ser o maior produtor, mas sim um dos melhores. • PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 81
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HUMANIDADES CAPA
.que o homem branco apagou Ao contrário do que se dizia, o Brasil tinha sociedades complexas antes da chegada de europeus MARCOS
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escola, a os livros de História ensinam, rapidamente, que havia três grupos indígenas com sociedades avançadas na América précolombiana, até 1492: astecas e maias acima do Equador e incas aqui nos Andes. Exibindo cidades com rica arquitetura erigida em pedra, domínio sobre a agricultura, hierarquia social e certos conhecimentos científicos, esses povos, cada um à sua maneira e com suas particularidades, costumam ser agrupados na coluna das "civilizações" conquistadas - destruí das, talvez seja o melhor termo - pelas armas de fogo e doenças trazidas pelos primeiros colonizadores europeus do século 16. São a luz que se apagou com a chegada do homem branco. Aos demais povos ameríndios, inclusive os do Brasil, igualmente vítimas do desembarque dos novos senhores vindos do Velho Mundo, restou a imagem de sociedades primitivas, das trevas, sem refinamento cultural ou marcantes distinções de classes, composta por pequenas aldeias isoladas umas das outras onde imperava o nomadismo. Enfim, representavam o atraso - perto do esplendor imperial de seus contemporâneos andinos e centro-americanos. Recentes descobertas arqueológicas em pelo menos dois pontos distintos da Amazônia brasileira sugerem que astecas, maias e incas não eram os únicos a ter o monopólio das sociedades complexas na época do desembarque do navegador Cristóvão Colombo. Nos últimos anos, intensos trabalhos de campo conduzidos por pesquisadores nacionais e do exterior no Alto Xingu, no norte do Mato Grosso, e na confluência dos rios Negro e Solirnões, a cerca de 30 quilômetros de Manaus, no Amazonas, indicam a existência de grandes e refinados assentamentos humanos, habitados simultaneamente por alguns milhares de pessoas, nessas áreas 500 anos atrás - ou até mesmo antes disso. As evidências mais espetaculares de ocupações dessa Índios kuikuro dançam na magnitude - um feito só posvéspera do Quarup: seus sível com a adoção de um esprováveis ancestrais talvez tilo de vida sedentário e de tivessem rituais parecidos
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práticas que alteravam a floresta nativa e possibilitavam a adoção de uma agricultura razoavelmente produtiva - saíram de sítios pré-históricos situados nas terras hoje habitadas pelo povo kuikuro, dentro da reserva indígena do Xingu, e se materializaram nas páginas da edição de 19 setembro de revista norteamericana Science, uma das publicações de maior peso entre os cientistas. Num artigo de quatro páginas, ilustrado por seis imagens de satélite, uma pouco usual equipe de autores - três da Universidade da Flórida, dois do Museu Nacional do Rio de Janeiro e dois índios kuikuro - descreve a estrutura do tipo de sociedade que havia nesse ponto da Amazônia entre 1.200 e 1.600 d.C: um conjunto de 19 aldeias de formato circular, as maiores protegidas por fossas de até 5 metros de profundidade e muros de paliçadas, interligadas por uma extensa e larga malha de estradas de terra batida. Os pesquisadores estimam que entre 2.500 e 5.000 pessoas moravam nas maiores aldeias. O capricho e a precisão com que as vias foram concebidas e executadas impressionam. Elas eram extremamente retilíneas, com larguras entre 10 e 50 metros e extensão de 3 a 5 quilômetros. "As estradas são um trabalho de engenharia que movimentou uma quantidade enorme de terra no plano horizontal", afirma o arqueólogo Michael Heckenberger, da Universidade da Flórida, principal autor do texto na Science, um norte-americano de 41 anos que fala português fluentemente por ter vivido sete anos no Brasil, um e meio dos quais dentro do Xingu. Indícios de praças, pontes, represas e canais e do cultivo de mandioca e outras plantas também foram encontrados no sítio arqueológico, que compreende uma área de 400 quilômetros quadrados, equivalente a um terço do território da capital fluminense, não muito distante das três aldeias contemporâneas dos kuikuro. "Construir essas estruturas na floresta talvez não tenha 84 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
Recriação artística de aldeia pré-colonial no Xingu: praça circular, estradas retilíneas e fileiras de casas
sido mais complicado do que fazer pirâmides, mas representa uma outra forma de monumentalidade" compara Heckenberger. "Esse povo tinha uma monumentalidade horizontal': diz o antropólogo Carlos Fausto, do Museu Nacional, outro autor do estudo. "As estradas tinham uma função mais estética do que prática." Segundo Fausto, os índios não transportavam nada de tão grande entre as aldeias que justificasse abrir caminhos de, no mínimo, 10 metros de largura, onde passam com f6lga dois automóveis. Os largos caminhos desbravados na floresta estariam ligados à tradição de promover rituais coletivos entre as tribos e simbolizariam a união entre as aldeias. Se essa hipótese estiver correta, entre os séculos 13 e 16, enquanto os incas, por exemplo, demonstravam o seu conhecimento construindo cidades de pedra nas terras altas dos Andes, os membros desse antigo povo do Xingu, instalados numa área plana de floresta tropical, montavam uma majestosa malha viária nas franjas da Amazônia, talvez o seu legado arquitetônico mais surpreendente. Os vestígios da "cidade" xinguana foram datados pelo método de carbono 14 e o traçado das estradas, que se baseava nos movimentos do Sol e denotava conhecimentos de astronomia, foi mapeado com o auxílio de um GPS de alta precisão. A versão do aparelho usado
no Xingu, capaz de fornecer a localização precisa de um ponto geográfico com o auxílio de satélites, tinha uma margem de erro de menos de 1 metro. O instrumento foi de grande valia para os dois índios que também assinam o artigo da Science, Afukaká Kuikuro e Urissapá Tabata Kuikuro. "Eles são ótimos em achar o trajeto das estradas e sítios arqueológicos': conta Heckenberger. Muitas vezes, trechos dos caminhos abertos pelos habitantes dos antigos assentamentos encontram-se atualmente tomados pela floresta. Nesses pontos, é difícillocalizar os salientes meios-fios que se formavam nas bordas das estradas e que podiam chegar a 1 metro de altura. sautores do estudo acreditam que, em seus aspectos centrais, o assentamento pré-colonial era uma versão expandida do modo de vida dos menos de 600 kuikuro presentes hoje no Xingu, que também abrem estradas e fazem roças. Nas antigas aldeias de caráter mais residencial, as casas, provavelmente erigidas com estrutura de madeira e cobertas por sapé, como as moradias atuais, ficavam em torno da praça central. A diferença é que agora existe apenas um anel de moradias. Na época do descobrimento da América, deveria haver vários. Não há, contudo, certeza de que os
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Imagem de satélite da área dos kuikuro: antigas estradas (em vermelho) e valas (preto) e as estradas atuais (azul)
mento da floresta. Não se trata disso. Provocativamente intitulado "Amazônia 1492: Floresta Virgem ou Bosque Cultural?", o texto sugere que aquilo que a maioria das pessoas encara como "floresta virgem" é, na verdade, produto de uma interação milenar entre as populações indígenas e o ecossistema. E que a interferência humana no meio ambiente não degradou o solo local.
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índios que ali viveram há 500 anos eram realmente os ancestrais dos atuais kuikuro. A hipótese está longe de ser absur~ da, embora não tenha sido comprovada. "Mas, como há continuidade cultural ao longo de mais de mil anos de história dos povos do Xingu, pode-se pensar o passado por meio do presente'; diz Fausto. "É bem possível que vários aspectos da cultura xinguana atual já estivessem presentes entre as populações que construíram e viveram nas antigas grandes aldeias." Entre eles, a adoção de hierarquia política, que distingue os índios entre chefes e não-chefes, e de alguns rituais intertribais, semelhantes ao o famoso Quarup, a festa em homenagem aos líderes mortos. Os índios da época pré-colonial viviam em perfeita harmonia com a floresta intocada, certo? Bem, acredita-se
que eles estavam em paz com o meio ambiente. Mas a mata - é forçoso dizer - não era mais virgem. Para edificar uma sociedade de tal complexidade, com estradas ligando aldeias fortificadas e cinturões agrícolas ao seu redor, os antigos kuikuro promoviam grandes alterações na paisagem natural - assim como fazem os kuikuro de hoje. Mas os pesquisadores se apressam em dizer que não se tratava de agressões descabidas aos recursos naturais. "Alguns estudos de etnobotânica mostram que o manejo indígena do meio ambiente, de forma consciente ou inconsciente, tende a produzir maior biodiversidade do que se a floresta fosse, de fato, 'virgem"; explica Fausto. Ecologistas mais radicais, românticos, podem ter visto o trabalho dos brasileiros e norte-americanos na Science como um estímulo ao desmata-
Terra preta - Muitos quilômetros acima dos antigos assentamentos na área dos kuikuro, mais vestígios de sociedades complexas na época do descobrimento saem de uma mini-Mesopotâmia tropical, distante 30 quilômetros de Manaus, e parecem confirmar as descobertas no Alto Xingu. Numa porção de terra situada na confluência entre os rios Solimões e Negro, a equipe de Eduardo Góes Neves, do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (MAE/USP) identificou 70 sítios arqueológicos com evidências de presença humana e realizou 71 datações por carbono 14 para determinar a sua idade aproximada. Os sítios mais antigos remontam a 8.000 anos. Num deles, por exemplo, descobriu-se uma ponta de lança feita de sílex de 7.700 anos. As áreas arqueológicas mais novas, que concentram a maior parte dos trabalhos realizados até agora, têm sítios com idade entre 2.500 e 500 anos. Cinco desses sítios mais recentes já foram escavados e mapeados digitalmente: Açutuba, Osvaldo, Lago Grande, Hatahara e Dona Stella. O material de estudo nesses locais pode até ser menos espetacular do que as antigas estradas do Alto Xingu. Mas não menos eloqüente. Nessa região próxima à periferia da capital amazonense, foram encontradas partes de esqueletos humanos dispostas diretamente no solo ou dentro de urnas, incontáveis fragmentos de cerâmicas, valas escavadas na parte de trás de alguns sítios, resquícios de paliçadas - e muita terra preta. Extremamente fértil e rico em nutrientes e repleto de pedaços de cerâmica, esse tipo de solo orgânico costuma ser interpretado como uma marca produzida por grandes e prolongados assentamentos em uma PESQUISA FAPESP 92 • OUTUBRO DE 2003 • 85
determinada região. Em alguns locais, a terra preta foi usada pelos povos précolombianos, junto com centenas de pedaços de cerâmica, como matéria-prima para construir montículos de 1 ou 2 metros de altura que tinham a função de tumbas. Escavando esses montículos, os pesquisadores depararam, às vezes, com urnas funerárias. "Todos esses elementos indicam que a presença dos povos ameríndios foi contínua em alguns pontos da Amazônia Central': diz Neves, cujo projeto é financiado pela FAPESP."Certos sítios foram habitados por décadas seguidas, talvez até mais de cem anos ininterruptos, por uns poucos milhares de pessoas:' orno esse conjunto de achados do passado é interpretado pelo arqueólogo e serve para embasar a teoria da existência de sociedades complexas na Amazônia pré-colonial? Os montículos erigidos com terra preta e cacos de cerâmica, como os dez encontrados no sítio Hataraha, situado numa área elevada vizinha à planície aluvial do Solimões, são um indício de que haveria uma certa divisão de trabalho - e, por conseguinte, diferenças hierárquicas - entre os povos ameríndios da floresta. "Alguém com comando precisava coordenar os esforços de vários homens para que se conseguisse obter esse tipo de tumba funerária", comenta Neves, que, até o mês passado, se recuperava de uma malária contraída em sua última viagem à Amazônia. A descoberta de valas nos fundos de áreas onde houve ocupações humanas denota uma preocupação dos habitantes de uma aldeia de se defender de ataques de outras povoações. Em Açutuba, o maior sítio identificado pelo projeto de Neves, com 90 hectares de área, os pesquisadores localizaram duas fossas na parte de trás de seu terreno. As dimensões dos buracos são significativas: 150 metros de extensão por 2 metros de profundidade. Perto das valas, foram achados também vestígios de paliçadas, antigos muros de madeira, o que reforça a idéia de que os índios queriam proteger a retaguarda de Açutuba. "Se havia preocupação em guarnecer os fundos de uma aldeia, é porque havia risco de guerras entre as tribos", deduz o arqueólogo da USP. O mesmo racio-
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cínio vale para as aldeias fortificadas dos kuikuro no Alto Xingu. Presente na maioria dos sítios localizados na confluência dos rios Solirnões e Negro (e também na área dos kuikuro e em outras partes da bacia amazônica), a terra preta é um dos elemento-chave para sustentar as teses de que os índios pré-coloniais já levavam um estilo 'de vida mais elaborado do que se pensava. Em outras palavras, é um indício de que os povos pré-colombianos (ou ao menós algumas levas deles) se fixaram em pontos da bacia amazônica, erigiram aldeias perenes de porte significativo, onde praticavam alguma forma de agricultura. Com o passar do tempo, os resíduos produzidos por essa ocupação contínua de uma área - a carcaça de animais caçados na floresta, as sobras de peixes pescados nos rios vizinhos, pedaços de plantas coletadas ou cultivadas, excrementos humanos, a madeira usada na construção de habitações - acabaram dando origem à terra preta. Na Amazônia, a maioria dos sítios arqueológicos que apresentam essa formação geológica tem entre 2.500 e 500 anos. Bem no centro de Manaus, na praça Dom Pedro, operários que trabalhavam numa obra de revitalização do espaço
público descobriram, sem querer, em agosto passado, três urnas funerárias numa camada de terra preta com idade estimada entre 1.000 e 1.200 anos. De acordo com a interpretação de Neves, a terra preta se torna mais comum há cerca de dois milênios e meio porque, nesse momento da pré-história, deve ter havido uma explosão demo gráfica - e de sedentarismo - entre as tribos ameríndias. Quando, cerca de cinco séculos atrás, o tamanho das populações indígenas dá sinais de declínio, em razão das armas e doenças trazidas pelo europeus, a formação desse tipo de solo começa a rarear. Até a década de 1980, não havia consenso de que a terra preta era resultado da ação do homem. Alguns estudiosos imaginavam até que esse tipo de solo negro, que, quando aflora, é usado atualmente para agricultura, pudesse ter-se formado a partir de material oriundo de vulcões andinos trazidos pelo vento ou de sedimentos provenientes de lagos. "Hoje, quase todo mundo aceita a idéia de que a terra preta é fruto da intervenção do homem na paisagem na região", assegura o arqueólogo da USP. A questão ainda em aberto é saber quanto tempo a terra preta demora para se originar.
de décadas atrás, as condições naturais no trópico úmido - solos pobres e pouco alimento disponível ao nível do solo - eram adversas à presença humana em grande escala e somente possibilitavam a formação de pequenas aldeias, com menos de cem pessoas, que ocupavam áreas de poucos hectares. Quando a comida acabava, as pequenas aldeias eram refeitas em outro lugar, o que acontecia com freqüência. Uma crítica comum feita por Meggers os trabalhos de seus colegas que dizem ter descoberto vestígios de grandes assentamentos humanos na Amazônia é que esses pesquisadores teriam, na verdade, encontrado resquícios de pequenas aldeias que nunca foram contemporâneas. No caso da área dos kuikuro, fica difícil acreditar que os índios tenham construído uma malha viária tão grande e larga para ligar aldeias que existiram em épocas distintas. eorias alternativas à idéia de que a Amazônia foi morada exclusiva de povos pré-coloniais sem elaborada organização política e social não são exatamente uma novidade produzida no século 21 por pesquisadores como Heckenberger, Fausto, Neves e outros. Em certa medida, cronistas europeus do século 16 que passaram pela floresta equatorial, por exemplo, fizeram referências a sociedades organizadas na bacia amazônica. O problema é que uma das mais famosas alusões desse gênero não passa de lenda, a saga das guerreiras amazonas. Nas últimas décadas, alguns estudiosos passaram a procurar evidências mais concretas que pudessem contradizer as idéias dos seguidores de Meggers. Mas a tese de que poderia ter havido sociedades complexas nos trópicos na época do descobrimento nunca se firmou devido à escassez de provas materiais que a sustentassem. A descoberta de grandes estradas e aldeias pré-colonias no Alto Xingu e de assentamentos antigos e densos nos arredores de Manaus começam a preencher essa lacuna. Os povos da floresta podiam até não ser tão sofisticados quanto seus vizinhos dos Andes ou da América Central, mas também não eram assim tão "primitivos". "Não eram um império inca ou maia. No entanto, eram complexos, com uma estrutura amazônica", resume Heckenberger. •
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"Alguns autores acham que 1 centímetro de terra preta leva dez anos para se formar. Pessoalmente, acredito que esse processo é mais rápido e tem mais a ver com a dimensão dos assentamentos do que com o seu tempo de duração", afirma Neves. Em Açutuba, por exemplo, podem ter vivido 3 mil índios num mesmo período, segundo suas estimativas. Quando recorrem à expressão sociedade complexa, arqueólogos, antropólogos e outros estudiosos imaginam um povo que havia deixado para trás - ou relegado a um segundo plano - a vida nômade de caçador e coletor das dádivas da fauna e flora nativa. Um grupo
de pessoas que tinha se fixado num pedaço de terra e desenvolvido alguma forma de agricultura. Um assentamento com algum grau de sedentarimo, dotado de aldeias para algumas centenas ou talvez milhares de pessoas, com hierarquia social e divisão do trabalho. A hipótese de que houve culturas com essas características na Amazônia pré-colonial se choca com a visão tradicional e ainda dominante da arqueologia, muito influenciada, a partir da década de 1950, pelos trabalhos de campo e artigos da norte-americana Betty Meggers. Para a veterana pesquisadora, ainda hoje ativa aos 81 anos e fiel às suas teses
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OS PROJETOS
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Complexidade Social na Pré-história tardia da Amazônia (Alto Xingu)
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Levantamento arqueológico da área de confluência dos rios Negro e Solimões: continuidade das escavações, análise da composição química e montagem de um sistema de informações geográficas
EDUARDO GÓES NEVES - MAE/USP
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US$ 150.100 (National Science Foundation, EUA)
INVESTIMENTO
R$ 209.968)8
(FAPESP)
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• HUMANIDADES
oberto Ventura (1957-2002) morreu tragicamente (um acidente de carro) aos 45 anos, em meio à escrita da biografia de Euclides da Cunha, morto tragicamente aos 43 anos, após ter escrito sobre a vida de Antonio Conselheiro, morto tragicamente em Canudos. Essas vidas paralelas reúnem-se de forma notável na obra póstuma de Ventura, Euclides da Cunha - Esboço Biográfico, estudo sobre a vida do autor de Os Sertões que, de forma inovadora e para acentuar ainda mais o paradoxo, revela a duplicidade Euclides-Conselheiro, em que o líder do Monte Belo aparece como uma projeção psicanalítica e uma criação literária do escritor. "Roberto insistia muito no fato de ser um ensaio, o que lhe permitiria trabalhar várias interpretações da vida de Euclides, como a das vidas paralelas ou a retórica das antíteses ou das antinomias em Os Sertões. Mas não se pode esquecer de que, embora a obra como está diga pouco sobre como seria em verdade, ela é útil para entender o escritor e sua obra, pois Roberto era um detalhista que traz indicações precisas sobre a vida de Euclides", observa o professor João Alexandre Barbosa, orientado r de Ventura e amigo do pesquisador. É verdade: o Euclides de Ventura está longe de ser uma ficção. Fruto de dez anos de pesquisas obsessivas, o esboço biográfico, encontrado por amigos no computador, pode até ousar na interpretação, como o próprio pesquisador preconizava, mas é um retrato fiel, ainda que não terminado, de um homem torturado pelo contraste entre os seus ideais e a realidade nacional e um apaixonado pela República, que, em poucas semanas do novo regime, estava desiludido com seus rumos. Acima de tudo, o Euclides que Ventura traz à luz é um homem inseguro e ameaçado pelos seus próprios fantasmas (temor da sexualidade, da irracionalidade, do caos, da anarquia), que viu o Conselheiro e Canudos como ameaça a seus valores. Daí o Conselheiro ameaçador e fanático e Canudos como a urbs maldita, pondo em xeque a própria objetividade do escritor, ao mesmo tempo um crítico da insurreição do Belo Monte e da ação destrutiva do exército sobre as populações pobres. Mas a subjetividade venceu: o relato de Euclides, como nos mostra Ventura, fecha os olhos para os excessos e faz do Conselheiro um personagem ficcional mais do que real, já que o autor de Os Sertões, ainda que observador direto, não teve acesso - e não quis ter - a toda a verdade sobre Canudos e seus habitantes. Até mesmo o "apolítico" Machado de Assis protestou contra a perseguição que se fazia ao movimento e concluiu que, por falta de informações, restou a imaginação para descobrir a doutrina da seita e a "poesia para floreá-Ia': Há que se levar em conta a trajetória do escritor que, de família pobre, seguiu sempre carreiras sob o manto protetor do Estado, como nota Ventura. Um leitor apaixonado das grandes hagiografias da Revolução Francesa, formou-se um romântico pleno de racionalidades: "Euclides se sentia desajustado no mundo urbano e civilizado, em que a beleza e a moral se degradavam, ameaçando a linha reta da inteireza de caráter e do dever. Adotava uma postura romântica diante da vida e da história, com sentimentos que oscilavam entre a utopia e a melancolia': escreve o biógrafo. "Mais do que um poeta romântico, tentou ser, ele próprio, um herói, que perseguia visões inspiradas nos romances e narrativas da Revolução Francesa que lera na juventude:' Um mal, aliás, típico da época e que fazia parte da formação de boa parte dos adeptos mais fervorosos do fim da monarquia decadente e da República. Acreditava na evolução da humanidade que ocorreria por meio de uma série linear de etapas históricas. Cadete rebelado contra o exército imperial, foi chamado a escrever uma coluna política para A Província de São Paulo, atual O Estado de S. Paulo, a convite de Júlio de Mesquita. A amizade iniciada entre os dois, que incluía o desejo pela República, levou mais tarde à cobertura de Canudos para o jornal. Ventura observa como os artigos para os Mesquita tra-
Roberto Ventura: biógrafo ousa ao interpretar biografado
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ziam a marca futura de Os Sertões e muito do pensamento de Euclides, em especial o conflito entre ideal e real, entre espírito e sociedade. as o tom revolucionário jacobino impregnava a sua visão de Canudos antes de partir para o sertão: em A Nossa Vendéia, escrito para o Estadão antes de partir, traz o tom apologético do Estado, do exército e da luta contra retrógados que queriam restaurar a monarquia. O tom de Os Sertões será bem outro após vivenciar o massacre, embora a crítica de Euclides seja muito amena em relação ao tamanho da carnificina real. E foi cobrir a guerra já desiludido com a recente República que tanto desejara, "a ruína do sonho republicano convertido em amarga decepção e na busca de um novo rumo para o país". Mais: "Criou, em Os Sertões, uma tensão constante entre a perspectiva naturalista, que concebe a história a partir do determinismo do meio e da raça, e a construção literária, marcada pelo tom antiépico e pelo fatalismo trágico". Para Ventura, Euclides propôs uma outra visão de Canudos como movimento sebastianista e messiânico, mas, apesar da visão negativa da insurreição, acusou os governos estadual e federal pelo massacre, realizado em nome da ordem e do progresso. "E construiu o Conselheiro como personagem trágico, guiado por maldições hereditárias e crenças messiânicas, que o levaram à loucura, ao conflito com a República e à queda na desgraça." O livro, apesar da complexidade, foi um sucesso e, em 1903, Euclides assumia sua carreira na Academia Brasileira de Letras. Com a vitória literária veio o prestígio federal e um convite do barão do Rio Branco para ser chefe da comissão brasileira de reconhecimento do Alto Perus. A viagem ao Amazonas renderia um novo "livro-vingador': Um Paraíso Perdido, que se integraria a Os Sertões como "uma ampla interpretação histórico-cultural com elevado clamor por justiça social': "O fracasso do projeto nacional encontra sua imagem na natureza amazônica. Natureza vista por Euclides como inacabada, 'tumultuária', em instabilidade permanente dos elementos naturais e humanos", diz Ventura. Mas o destino cortou o fio da narrativa. Em 1909, em tiroteio com o amante da mulher, o escritor morre. Foi um dos maiores escândalos da cultura nacional. "Sua trajetória sentimental apresenta, por ironia, paralelos com as peripécias de Conselheiro, o personagem que tentou esboçar nas páginas de Os Sertões. Ambos tiveram o destino marcado pelo adultério das esposas, pela vendeta entre suas famílias e a de seus inimigos e pelas posições que tomaram perante a República, um se opondo e o outro apoiando e depois criticando o novo regime". Ironia sem fim. •
Prisioneiros de Canudos: multidão de mulheres chamadas por Euclides de "fúrias que encalçam o exército" 90 • OUTUBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
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"400 JAGUNÇOS PRISIONEIROS.
CANUDOS, BAHIA. 1897". ORIGINAL DE FLÁVIO DE BARROS, PERTENCENTE
AO MUSEU DA REPÚBLICA
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DIGITALMENTE
NOS LABORATÓRIOS DA RESERVA TÉCNICA FOTOGRÁFICA/INSTITUTO
MOREIRA SAlLES
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Entre assimilação e alteridade Obra mostra contribuição OSWALDO TRUZZI
inOria da minoria existe e deseja seu }( reconhecimento: esta é a chave para a apreciação do livro bem ilustrado e editado de Rachel Mizrahi. Desde a apresentação, transparece a motivação persistente da autora em mostrar, sobretudo à comunidade judaica mais ampla, que o pequeno grupo de judeu-orientais estabelecidos na Mooca, do qual sua família e outras provinham, existiu e tem uma história. Tal motivação inicial foi aos poucos se ampliando, para incluir os judeus sefaradis. O capítulo 1 situa brevemente a história da presença de judeus no Oriente Médio, onde por séculos conviveram à sombra da relativa tolerância religiosa islâmica e depois do império otomano. Ao final do século 19, quando o império turco já apresentava sinais de desagregação, e o Brasil começava a atrair imigrantes, a autora chama a atenção para a comunidade dos judeu-orientais propriamente ditos e a dos sefaradis, expulsos da Península Ibérica ao final do século 15. Correligionários, mas portadores de tradições culturais distintas: a convivência milenar com os árabes fez com que os primeiros assimilassem muitos traços' dessa cultura língua, música, dança, alimentação e tradições patriarcais -, enquanto os sefaradis se diferenciavam sobretudo pela prática do ladino - dialeto próprio, resultante de uma mistura do espanhol, português, árabe, hebraico e turco. A autora então detém-se sobre trajetórias de famílias pertencentes aos dois grupos no Rio de Janeiro (capítulo 2) e em São Paulo (capítulos 3 e 4). Apoiada sobretudo em fontes orais, percorre os esforços dessas comunidades em se inserir economicamente na nova terra e, sobretudo, em manter suas tradições religiosas, agrupando-se para orar privadamente e fundando sinagogas, na tentativa de conservar sociabilidades, ritos e entonações de reza próprios a cada região de origem. De modo geral, observa o maior cosmopolitismo, tolerância, liberalidade e integração dos sefaradis (facilitada inclusive pela proximidade entre o ladi94 • OUTUBRODE 2003 • PESQUISA FAPESP 92
de imigração judaica ao Brasil no e o português), em contraposição ao maior conservadorismo religioso, apego à cultura original (regionalismo), endogamia, concenRachei Mizrahi tração e conseqüente isolamento dos judeu-orientais. AE Ateliê Editorial A obra tem o mérito de nos deixar entrever uma comu330 páginas R$ 70,00 nidade judaica complexa, entrecortada por origens e tradições distintas, temas sugeridos nos capítulos 5 - impacto na comunidade de novos imigrantes judeus do Oriente Médio - e 6, que trata da força dos regionalismos. Em São Paulo, por exemplo, foi significativa a maior proximidade inicial entre judeu-orientais instalados na Mooca e sírios e libaneses, praticantes da mesma língua, do que com os judeus asquenazes, de fala iídiche, mais numerosos. Prescindindo a tradição religiosa judaica de uma hierarquia centralizadora como a cristã, esse é apenas um exemplo, entre muitos, das inúmeras clivagens, alimentadas por regionalismos e desconfianças - inclusive quanto à pertinência religiosa de alguns grupos que acompanharam a história das comunidades judaicas e de suas sinagogas. Os casos também fornecem amplo material para se refletir sobre os dilemas e exigências que envolveram o difícil equilíbrio entre a assimilação exigida pelo país de acolhimento - e a alteridade - condição de manutenção da identidade grupal. Apesar do tom muito descritivo de alguns capítulos e das hesitações em cotejar de modo mais completo a comparação entre as trajetórias dos dois grupos (compreensível aliás para uma autora cuja família procede de um deles), há no trabalho de Rachel o enorme mérito de recuperar e sistematizar informações que de outro modo ficariam confinadas à memória familiar e que estariam, com o passar dos anos, irremediavelmente perdidas. Por tal motivo, a obra assinala uma contribuição indelével ao registro da história das minorias étnicas no Brasil. Imigrantes Judeus do Oriente Médio São Paulo e Rio de Janeiro
OSWALDO TRUZZI é professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
Dicionário Crítico Câmara Cascudo Marcos Silva (orqanizador) Editora Perspectiva/FAPESP 331 páginas I R$ 45,00
A Arte do Romance Henry James Marcelo Pen (organização,tradução e notas) Editora Globo 320 páginas I R$ 39,00
Muito antes de a cultura popular virar moda e ser respeitada como assunto sério, Luís da Câmara Cascudo já a dissecava com olhar de especialista, revelando toda a sua riqueza. Cascudo mostrou que o popular não era pobreza cultural, mas podia ser uma forma diferenciada de erudição. Esse dicionário dá conta da riqueza do pensamento de Cascudo.
Eis um livro que traz competência em dose dupla: por um lado, a tradução esmerada de Marcelo Pen de textos até então pouco conhecidos dos leitores que não lêem inglês; por outro, a riqueza dos prefácios de Henry Iames, um curso intensivo sobre os fundamentos da ficção. No princípio de tudo o desejo de representar a vida por meio das palavras, reunindo, de forma harmônica, a espontaneidade do texto com o artifício da escrita.
Editora Perspectiva: ni: 3885-8388 www.editoraperspectiva.com.br
Editora Globo: (11) 3457-1545 www.somlivre.com.br
Brasil: Formação do Estado e da Nação BKASIL: FORMAÇÃO 00 ESTAOO F. DANAÇÃO
István Jancsó (orqanizador) Editora Hucitec/FAPESP 703 páginas I R$ 95,00
Uma obra fascinante que reúne uma coleção de artigos sobre todas as complexidades da relação entre Estado e Nação no caso brasileiro. O estudo é fruto de um seminário realizado em 2001 na Universidade de São Paulo sobre o "enigma da nossa formação" nacional, visto sob a perspectiva histórica (1780 a 1850), mas que fala, sobretudo, dos problemas que são mais do que atuais no país. Entre os articulistas: Tamar Herzog, Luiz Geraldo Silva, Pedro Puntoni, etc. Editora Unijuí: (55) 3332-0343 www.unijui.tche.br/unijui/editoraoueditorapedidos@unijui.tche.br
A Evolução Geológica da Terra e a Fragilidade da Vida I<enitiro Suguio/Uko Suzuki Editora Edgard Blücher Ltda. 152 páginas I R$ 35,00 O tamanho do volume, reduzido, e sua forma, didática, não faz juz às intenções dos autores: dar conta do estado atual dos conhecimentos sobre a Terra e sua situação no Sistema Solar e no universo. Pode-se dizer que se trata de uma história da história do nosso planeta, deixando claro como os conhecimentos sobre sua origem e futuro avançaram em poucos séculos. Editora Edgard Blücher Ltda: e-mail: eblucher@uol.com.br
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As Vozes da Canção na Mídia Heloísa de Araújo Duarte Valente Via Lettera Editora e Livraria/FAPESP 240 páginas I R$ 40,00 Manuel Bandeira era incisivo: só resta dançar um tango argentino. Heloísa Valente partiu da mesma idéia e em seu estudo disseca como se dá a intersecção entre o tango e a mídia. Ao mesmo tempo que as canções portenhas eram extremamente ligadas à mídia e a ela deveram sua propagação, sobreviveram ao caráter de rápido esquecimento do meio. Um livro fascinante que fala sobre discos, partituras e de como UIlJ. gênero conseguiu vencer o tempo e marcá-lo. Via Lettera Editora e Livraria: (11) 3862-0760/3675-4785 www.vialettera.com.brouvialettera.com.br/vialettera@uol.com.br
Enredos de Clio Pensar e Escrever a História com Paul Veyne Hélio Rebello Cardoso Junior Editora Unesp 214 páginas I R$ 27,00 Em oposição direta à segmentação dos saberes nas Ciências Humanas, Hélio Cardoso, a partir da obra do historiador francês Paul Veyne, coloca em discussão as relações entre filosofia e história e de como a prática do historiador o leva sempre a questionamentos de cunho filosófico. Nesse contexto, o pesquisador discute temas como as tarefas narrativas do historiador, o conceito de causalidade histórica e relações entre conceito, acontecimento e totalidade da história. Editora Unesp: (11) 3242-7171 www.editora.unesp.broufeu@editora.unesp.br
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FAPESP
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First Latin American Symposium on Dependable Computing
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21-24 de Outubro de 2003 Escola Politécnica da USP- São Paulo/SP
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Para maiores informações, acesse: Estão abertas as inscrições para os cursos de Mestrado e Doutorado em Política Científica e Tecnológica.
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ENCE abre inscrições para Mestrado A Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, ENCE, estará com inscrições abertas até 13 de outubro para o curso de mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais. Os cursos oferecidos abrangem três áreas de concentração: Demografia; Estatística Social e População, Sociedade e Território: teoria e prática de pesquisa interdisciplinar. Mais informações: Tel.: (21) 2142-46841 2142-469l. E-mail: cpgence@ibge.gov.br .
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VAGAS PARA DOCENTE Faculdade de Engenharia Mecânica Departamento de Projeto Mecânico Brevemente estarão abertas as inscrições para os processos seletivos, conforme segue abaixo: l.
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Disciplinas:Projeto de Sistemas Mecânicos, Resistência dos Materiais I, Resistência dos Materiais II, Elementos de Máquinas I e Elementos de Máquinas 11. Cargo:Professor Doutor Regime:RTP
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Pós-graduação em Engenharia Mecânica A Faculdade de Engenharia da UNESP, campus de Bauru, por meio do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica, vai abrir inscrições, de 10111/2003 a 21/1112003, para seleção somente de alunos regulares. Mais informações: Telefones: (14) 221-6109/221-6120/221-6119 http://www.feb.unesp.br http://www.feb.unesp.br/-bpiubeli/fe.htm
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Disciplinas:Redes de Comunicação em Ambiente Industrial, Controle Avançado de Sistemas, Sistemas de Aquisição de Dados, Circuitos Lógicos e Projeto de Sistemas Mecatrônicos. Cargo:Professor Doutor Regime:RTP Mais informações: Secretaria do Departamento de Projeto Mecânico da Faculdade de Engenharia Mecânica - Unicamp, Bloco C, com Denise Aparecida Villela, através do tel. (19) 3788-3166/3788-3165 ou e-mail: denise@fem.unicamp.br
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COMPETÊNCIA MÉDICA EM CARDIOLOGIA Concebido para reconhecer e • divulgar nacionalmente e internacionalmente o mérito: científico de médicos' cardiologistas e' pesquisadores na • área de cardiologia que nele se inscreverem com trabalhos a : serem julgados por um júri de alto : nível nacional e internacional. I
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CATEGORIAS
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Internacional em Cardiologia Destinado a estrangeiros e brasileiros que: desenvolveram seustrabalhos no exterior.
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Nacional em Cardiologia Destinado I
a pesquisas
e trabalhos
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realizados no Brasil que não tiveram a participação do InCor-HCFMUSP.
Nacional em Cardiologia -lnCor Destinado.a
pesquisas
e trabalhos:
realizados no InCor-HCFMUSP.
INSCRIÇÕES. Os trabalhos deverão ser inscritos entre os : dias 01 de abril de 2003 e 15 de outubro: I
de 2003.
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www.zerbini.org.br ou retire o regulamento na I Fundação Zerbini, Av. Brig. Faria Lima, • • 1884 - 2Q ando - Edif. Cal Center ] São Paulo-SP - Tel.: (Oxx11) 3038-5300. I
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E HUMANISMO
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Pesquisadores comprovam: o mar avança sobre vilanjos epraias
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