Pensando São Paulo: Universidades e Institutos

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PENSANDO SAO PAULO Universidades e Institutos Reitores e diretores mostram como suas instituições se preparam para os desafios do século 21

niversidades e os institutos de squisa estão conscientes de que seu papel é muito importante para que São Paulo e o Brasil superem seus problemas e consigam, no século 21, sociedades mais justas. Esta é a conclusão geral de uma série de palestras nas quais reitores de universidades e diretores de institutos apresentaram suas visões para o futuro, em mais uma fase do Fórum São Paulo Século 21, promovido pela Assembléia Legislativa do Estado. Resumos dessas conferências aparecem neste encarte da revista Pesquisa FAPESP. Durante dois dias no mês de março, reitores e diretores apresentaram suas idéias, seus problemas e, também, suas vitórias. Cláudio Rodrigues, do Ipen, por exemplo, mostrou dados que indicam o sucesso da incubadora de empresas montada no câmpus da USP; Hermano Tavares, da Unicamp, contou como o país montou o melhor

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sistema de pós-graduação do Terceiro Mundo, e Alberto Duque Portugal, da Embrapa, lembrou que o Brasil, hoje, é o maior detentor de tecnologia agropecuária tropical e subtropical do mundo. Os problemas, porém, não foram escondidos. "O Instituto acumula dívidas no mercado': lembrou Plínio Assmann, do IPT. Sidney Storch Dutra, da Universidade de Santo Amaro, comparou o Brasil a uma saci, que p).lla com uma perna só, produzindo conhecimentos científicos, mas poucas patentes. "As tecnologias de que o mundo tropical precisa não chegam pela Internet nem por satélite", destacou o presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos, Nelson Raimundo Braga. O presente encarte inclui um texto especialmente preparado pelo deputado Carlos Zarattini, coordenador do grupo de Ciência, Tecnologia e Comunicações do Fórum. Nele, ele expõe suas idéias sobre a situação dessa área no estado.


Transfortnar o conhecitnento etn políticas públicas ;::::::====::::;:;::;~=::::~- z O Fórum São Paulo Século 21 foi criadeputado estadual Carlos "~ ~ do, em 1999, com o objetivo principal de Zarattini é o coordenador das 0 estabelecer um diálogo entre a Assembléia áreas de Ciência, Tecnologia " Legislativa do Estado de São Paulo e os die Comunicação do Fórum São Paulo versos setores da sociedade. A partir desse Século 21, organizado pela encontro, o Legislativo quer discutir um projeto capaz de fazer com que São Paulo Assembléia Legislativa do Estado. se mantenha no rumo do desenvolvimenPreparou cuidadosamente to e esteja à sua frente, aumentando a os trabalhos do grupo encarregado qualidade de vida da população do estado dessas áreas. Um conselho formado e melhorando as condições de produção. por 20 pessoas, incluindo O fórum e esta reflexão só estarão terminados no fim deste ano. Mas o que se conrepresentantes das universidades seguiu até agora já é muito importante. e dos institutos de pesquisa Surgiram novas propostas. Foram dados de São Paulo, de cientistas subsídios para que tanto o Executivo coe de empresas, discutiu mo o Legislativo apresentem novos projeprofundamente como tematizar Carlos Zarattini tos. No caso específico da Comissão de Ciência e Tecnologia, a Assembléia tem a questão, antes do próprio início agora um conhecimento muito melhor do que representa dos debates. "Os resultados foram e como se constitui esse sistema no estado. Principalmenmuito bons", afirma. te, são visualizadas de maneira mais ampla as perspectivas Zarattini não chegou a fazer uma exposição de que esse sistema leve a indústria, a agricultura, os serdurante os debates. O texto destas páginas, viços de São Paulo a se desenvolverem mais e aumentarem o bem-estar de seus habitantes. resumindo suas idéias sobre a situação da Muitos problemas ainda têm que ser enfrentados. Enciência e tecnologia no Estado, foi produzido tre eles, os problemas financeiros das universidades púespecialmente para a revista Pesquisa blicas do estStdo, que não estão ainda resolvidos, nem FAPESP. Defensor dos investimentos equacionados. As universidades não conseguem mais reem pesquisa científica e tecnológica, acha ter seus professores. Eles saem, em muitos casos aposentados, para ganhar mais em outros lugares. O número de importante a sociedade entender que essas profissionais que deixa as universidades públicas atingiu aplicações são decisivas para o futuro. dimensões muito grandes. Não é só isso. Há a questão do "Muitas vezes, não se obtêm resultados grande volume de aposentadorias, que pesa de forma sigem um ano ou dois", explica, "mas, dado nificativa nos orçamentos das universidades. o passo, certamente eles vão aparecer". Há o problema dos hospitais universitários, que atendem a população e não são devidamente ressarcidos pelo Formado em Economia pela Universidade SUS. São assuntos para os quais é necessário apresentar de São Paulo (USP) e técnico em transporte soluções. Precisam ser resolvidos para que as universidapúblico da Companhia do Metropolitano des públicas paulistas não sofram do mesmo mal que de São Paulo, Zarattini elegeu-se deputado acomete as universidades federais. Nelas, qualquer coisa estadual pelo Partido dos Trabalhadores (PT), se torna difícil, pois nenhum tipo de recurso está garanElas dependem, para funcionar, de verbas e da exetido. em 1998. Antes, foi suplente de vereador cução orçamentária do Ministério da Fazenda. Não se na Capital, entre 1992 e 1996, e participou pode deixar que as três universidades públicas paulistas das políticas estudantil e sindical, ocupando, tenham o mesmo problema. inclusive, o cargo de secretário-geral Quanto aos institutos, eles claramente precisam de maiores investimentos. Os institutos poderiam ser bem do Sindicato dos Metroviários de São Paulo.

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melhor aproveitados do que ocorre hoje. Alguns estão em também, por meio de incentivos fiscais e de crédito. Uma empresa que realiza um investimento para desenvolver um situação bastante difícil. Outros estão um pouco melhor. novo produto não pode pagar a mesma taxa de juros e o Mas todos enfrentam o problema de que é preciso memesmo nível de impostos de quem não faz nada e simlhorar a remuneração de sua mão-de-obra. Ao lado disso, existe a questão de situar qual é o papel dos institutos. plesmente compra uma patente estrangeira. O governo não definiu isso claramente. É preciso deterMuitas vezes se avalia que uma nova tecnologia, ao ser incorporada a um sistema de produção, leva ao desempreminar como eles serão interligados com a produção, com go. Esse debate vem sendo mal colocado. É verdade que setores do desenvolvimento e da economia. As universidades públicas devem também ser racionovas tecnologias, muitas vezes, levam ao desemprego nalizadas e democratizadas. Da maneira como é montanuma área específica. Mas, se o Brasil desenvolver inteiramente novas tecnologias, estará gerando mais e melhores do, o sistema universitário público de São Paulo sofre da empregos. Hoje, até projetas de falta de uma dinâmica muitas vezes edifícios são feitos fora do país. O necessária. E não se pode esquecer as universidades particulares. Elas que o Brasil compra de projetas e vêm tendo um crescimento explopatentes no exterior é gerador de deBrasil, sivo. Está na hora de exigir que semprego na sua população. Qual hoje, não tem elas também façam investimentos a solução? É ter dentro do país um em pesquisa científica. Essa deve sistema de pesquisa e desenvolviautonomia ser uma cobrança da sociedade. É mento capaz de criar novos tipos do ponto de emprego, de maior qualificação. preciso criar condições para que a Não se trata de um problema de expansão dessas universidades de vista leve a uma qualidade comparável tecnologia versus emprego. A quesà das universidades públicas. tão é de como o Brasil se inseriu da tecnologia'' Apesar de todas essas dificuldana chamada globalização e no sisdes, São Paulo tem o sistema de tema produtivo mundial. Até agora, o país se inseriu de maneira suciência e tecnologia mais avançabordinada. O Brasil está mais a reboque do que na diando do país. Mas não tem ainda algo necessário para dar o grande salto. Trata-se da participação da empresa privada teira. Aliás, bem a reboque. na pesquisa científica e, principalmente, no desenvolviUm grande desafio é o que universidades e institutos podem fazer para diminuir a desigualdade social. O número mento tecnológico. Essa é a grande questão que ainda está por ser resolvida. Ainda não está claro de que forma de pesquisas é bastante grande. Mas o retorno em termos esse salto vai ocorrer. de democracia social tem sido pequeno. A desigualdade Particularmente, creio que o governo estadual pode ter social no Brasil não está diminuindo. Pelo contrário, está aumentando. ·um dos objetivos da pesquisa científica e um papel decisivo nesse assunto. Ele pode determinar quais são suas prioridades e, por meio de suas empresas e de do desenvolvimento tecnológico deve ser evitar que isso ocorra. O país, hoje, não tem autonomia do ponto de visiniciativas governamentais, incentivar as empresas privadas a desenvolver pesquisas sobre questões básicas para a quata tecnológico. Não consegue crescer e ao mesmo tempo lidade de vida da população. Em outros países, especialdiminuir as desigualdades de renda de sua população. É mente nos Estados Unidos, existem políticas nesse sentido. preciso inverter isso. A solução não está somente no deAs Forças Armadas dos Estados Unidos e a NASA estimusenvolvimento científico e tecnológico. Mas passa por ele. lam empresas privadas a resolver questões relacionadas Evidentemente, tudo o que se fala e discute no fórum com a defesa e o programa espacial. Uma boa parte do dese transforma numa discussão política. Com certeza, o senvolvimento científico norte-americano saiu dessa base. que se discute no fórum chegará à sociedade por meio do Os problemas de São Paulo são outros. Mas pesquisas debate político. É necessário aproveitar o conhecimento sobre algumas questões fundamentais para a população acadêmico e transformá-lo em políticas públicas. paulista poderiam ser incentivadas dessa forma. Há o Não é possível conceber qualquer tipo de crescimento, exemplo do lixo, do saneamento básico. São Paulo tem no Brasil ou em qualquer outro lugar, sem grandes investiproblemas gravíssimos nessa área, especialmente nas rementos em ciência e tecnologia. No Brasil, esse investimengiões metropolitanas da capital, de Santos e de Campinas. to ainda é muito pequeno. Não existe ainda uma consciência de como é necessária a autonomia nesse campo. O país As condições são dramáticas. Novas técnicas são necessátem um número enorme de necessidades, de problemas. O rias. As que existem hoje não resolvem mais os problemas. O governo estadual poderia agir, por exemplo, garanpatrimônio intelectual brasileiro tem condições de resolvêtindo a compra, por intermédio de suas empresas, de um los. Mas é preciso organizar o sistema de ciência e tecnoproduto após seu desenvolvimento. Poderia trabalhar, logia. Sem investir nessa área, será muito difícil avançar.

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O prin1eiro lugar do sisten1a cabe à educação

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~ Penso que este evento começa num professor Jacques Marcovitch ~ ambiente de realização da comunidade é reitor da Universidade 3 científica. O projeto Genoma Xylella, amde São Paulo (USP) desde " piamente divulgado, mostrou a vitalidade novembro de 1997. Antes, entre e a capacidade de articulação dessa comu1994 e 199 7, foi pró-reitor nidade, para obter resultados reconhecidos internacionalmente. Sem dúvida, de Cultura e Extensão Universitária. sempre haverá preconceitos, por parte de Com 35 unidades espalhadas alguns. Mas acho que temos a capacidade pelo Estado e um posto avançado de conseguir resultados que se destacam em Marabá, na Amazônia Paraense, em escala internacional. a USP é uma das maiores Não se pode subestimar o momento histórico pelo qual passa a humanidade. universidades do Hemisfério Sul. O ser humano passou da comunicação Foi criada na década de 30. Mas pelo gesto para a comunicação pela fala e algumas de suas unidades são começou a se comunicar pela palavra esbem mais antigas. A Facuidade crita há apenas 7 mil anos. Só SOO anos de Direito, por exemplo, é de 1827. Jacques Marcovitch atrás teve origem a comunicação impressa. Foi há poucos anos que se iniciou o A Escola Politécnica, de 1893. uso da digitalização como forma de armazenar, acessar e Marcovitch formou-se em Administração comunicar informações. em 1968, na própria USP. Em 1972, obteve Cada uma dessas migrações trouxe grandes mudanças. o mestrado na Graduate School A migração do escrito para o impresso levou a humaniof Management da Universidade Vanderbilt, dade a duas grandes revoluções, uma científica, por volta de 1600, e uma tecnológica, por volta de 1800. Pode-se nos Estados Unidos. O doutorado, dizer que a era digital, na qual a humanidade está entranem Administração, foi conseguido na USP, do, antecipa duas grandes revoluções, semelhantes às ancom uma tese sobre Eficácia Organizacional. teriores mas ·ainda mais intensas, porque muito provavelMarcovitch fez o pós-doutoramento em 1978, mente ocorrerão simultaneamente. no lnternational Management lnstitute, Medindo as tendências, observamos que nos últimos 100 anos, o Brasil e o Estado de São Paulo se destacaram de Genebra, na Suíça. Sua experiência inclui mundialmente com relação à sua evolução demográfica. a diretoria da Faculdade de Economia, A população mundial, nesse período, aumentou de 1,6 Administração e Contabilidade (FEA), de 1983 bilhão para 6 bilhões de habitantes. Portanto, cresceu a 1986, e a do Instituto de Estudos Avançados em torno de 3,5 vezes. Já o Brasil, que passou de 17 mi(IEA) da USP, entre 1988 e 1993. Entre 1987 lhões para 170 milhões de habitantes, aumentou dez vezes em termos demográficos. Esse aumento, sem quale 1995, foi coordenador do Núcleo de Política quer discussão, provoca dores de crescimento, semee Gestão Tecnológica da USP. lhantes às de um jovem adolescente que cresce de maSuas atividades de ensino e pesquisa estão neira muito rápida. concentradas nas áreas de Gestão da Inovação, Assim, as dificuldades do Brasil não são as de uma Gestão da Cooperação Internacional, Gestão estrutura que sofre as dores terminais. Pelo contrário, são dores de crescimento. São elas as que devemos equaTecnológica e Estratégia Empresarial. Como cionar e enfrentar. Esse crescimento, único em escala professor, além de lecionar nos cursos de mundial, ocorreu de maneira simultânea com um prograduação e pós-graduação de Administração, cesso de urbanização que também se deu no menor praparticipa de programas de especialização zo conhecido em todo o mundo. Em apenas 30 anos, e em cursos de desenvolvimento gerencial. passamos de uma relação de 75% para 25%, na compa4

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PE NS A N DO SÃ O PAULO: U N IVER S IDADE S E IN STIT U TO S

O primário é o local básico que deve desmistificar, ração entre as populações rural e urbana, para exatadesde os primeiros dias de aula, os meios de comunicamente o inverso. ção que acabam por desenvolver um falso imaginário na Mas, se os brasileiros nunca foram tantos e nunca esmente das crianças, quer seja a televisão, quer seja o espativeram tão próximos, nunca estiveram tão distantes, na ço virtual. O secundário deve familiarizar o jovem com a distribuição da renda e na dualidade socioeconômica. A linguagem que o acompanhará ao longo da vida. O curdistância entre os níveis socioeconômicos está crescendo, so superior deve ser entendido como a primeira etapa da cobrando os preços de violência e de criminalidade dos educação continuada, que acompanhará o ser humano quais todos são testemunhas. ao longo de toda a sua vida. As rupturas tecnológicas fazem parte dessas tendênO segundo componente desse sistema de inovação é o cias. Mas, felizmente, no Brasil, e este fórum é um exemsistema de pesquisa, que inclui universidades, instituplo disso, estrutura-se uma consciência na qual as geratos, laboratórios de pesquisa e deções presentes preocupam-se com senvolvimento das empresas e as as gerações ainda não nascidas. A agências de financiamento. O teridéia de um fórum que olha para ceiro é o subsistema empresarial, os próximos 25 anos, mas estende ''Queremos de produção e prestação de serviseu horizonte até o final do séuma economia ços, constituído de dirigentes, caculo, constitui um exemplo dessa pitalistas, acionistas, sindicalistas, preocupação. de mercado, organizações não-governamentais A universidade, que recebe nao uma e associações de pequenas e méhoje jovens de 18 anos, que devem dias empresas. Finalmente, existem viver até 2070, sabe como é imsociedade os sistemas articulador e regulaportante esta visão voltada para o dor, que são de responsabilidade futuro. Pois também há notícias de mercado'' positivas. A esperança de vida audo Estado. mentou, a qualidade de vida meEsses quatro componentes aslhorou, a interdependência entre seguram o surgimento do novo. os atores sociais se ampliou. Mas, infelizmente, uma ecoPortanto, quando se fala em mais investimentos na área nomia criminosa está crescendo. Um fundamentalismo da ciência e tecnologia, isso significa mais recursos hude tipo religioso se instala pelo mundo, com a erosão do manos e financeiros para todo o sistema de inovação, papel do Estado, quando, na nossa sociedade, por ser aquele que abre o novo para enfrentar novos desafios. fragmentada, o Estado precisa consolidar-se. Não quer dizer mais dinheiro para um ou outro componente, mas sim recursos para que esses quatro compoQuais são os impasses? A tecnologia está avançando nentes possam assegurar uma relação mais harmoniosa, mais que as habilidades humanas. O desenvolvimento sustentado precisa de uma visão a-médio e longo pravoltada para ó futuro. zo. A instabilidade monetária de um lado e uma estruMas o que resta a ser feito? Lembremos o Projeto Genoma. Ele envolveu 196 cientistas, dos quais 172 eram de tura partidária que acaba privilegiando o curto prazo de outro tornam difícil qualquer equacionamento de universidades públicas em geral e 144 eram das universium desenvolvimento sustentado. A competição, que é dades públicas do Estado de São Paulo. Desses, 76 eram natural na economia de mercado, não é natural numa de minha universidade, a USP. Eles contribuíram para que sociedade. Queremos uma economia de mercado, mas o Brasil desse esse salto para o futuro. não uma sociedade de mercado. Não se pode substiAs universidades públicas ajudaram a formar novas tuir o ser pelo ter. gerações e colaboraram para o avanço do conhecimento. Por outro lado, do ponto de vista da comunicação, o Na USP, a universidade que melhor conheço, isso não Brasil sai de uma era na qual a informação era a comuniocorreu apenas na capital. Aconteceu na Escola Superior cação libertada. Quem viveu o período da ditadura no de Agricultura Luiz de Queiroz, em Piracicaba; aconteceu Brasil sabe como a comunicação libertava. Mas hoje, na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto; ocorreu em como disse Ignacio Ramonet, editor de Le Monde DiploBauru, em São Carlos, em cada canto do estado onde as matique, entramos numa era de tirania da comunicação. universidades estão instaladas. A comunicação, pelo excesso e pela falta de filtros qualiAs universidades públicas contribuíram também com tativos, está inibindo o poder criativo de adultos e jovens. suas atividades de extensão. Desde 1911, os alunos da FaIsso nos leva a entender a ciência e a tecnologia como inculdade de Direito, do Centro XI de Agosto, prestam astegrantes de um sistema de inovação mais amplo, constisistência jurídica gratuita aos excluídos. Outros exemplos tuído em primeiro lugar pelo sistema educacional, do importantes são a Estação Ciência e o Projeto Avizinhar, primário até a educação continuada. que aproxima as universidades das comunidades de exPESQUISA FAPESP

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P ENSAN DO SÃO PA U LO: UN IVER S IDADE S E I N STITUTO S

cluídos em sua volta. As universidades também ajudaram conformismo e a incerteza que conduzem o jovem a pera preservar e consolidar uma identidade nacional. O Muceber, no conhecimento incompleto, a forma de lidar seu Paulista, cujo patrimônio a Universidade de São Paucom o desconhecido. Um jovem que está hoje nos bancos da universidade e lo tem o privilégio de zelar, é um exemplo de como os deverá enfrentar os desafios de 2030 e 2040, longe de rehistoriadores e os museólogos estão dedicados à preserceber um quadro profissionalizante acabado, precisa devação da identidade nacional. Finalmente, não menos importante, a USP se debrusenvolver em si mesmo a capacidade de lidar com o inçou sobre os temas das políticas públicas, saúde, educacerto, por meio do inconformismo. Isso se aplica desde a ção, meio ambiente, violência, emprego. Colocou fora pesquisa nas áreas exatas e biomédicas até a que ocorre da universidade o que cada um de seus 4. 700 professonos setores mais aplicados da engenharia. res e 25 mil alunos de pós-graduação fizeram sobre esÉ preciso fazer mais na formação de recursos humanos. Isso significa uma graduação ses temas. Mas isso não chega. É preciso fazer mais, é preciso ajuque deve ser ampliada, mas sempre tendo uma referência qualitadar a abrir um espaço de reflexão tiva favorável à estruturação dos estrutural, baseado na prospectijovem projetos de vida dos jovens; uma va. Nas palavras de Antônio Cânprec1sa dido, as universidades fizeram pós-graduação que forme não só muito, mas ainda não fizeram o pesquisadores, mas prepare os desenvolver a quadros docentes necessários à suficiente. capacidade As Humanidades têm o papel expansão do ensino superior, púdeterminante de construir essas blico e privado; e uma educação de lidar com visões do futuro, centradas no ser continuada formada de maneira a humano, como epicentro da sociedar a todos um espaço acessível, o incerto'' dade moderna. Não se trata mais no qual possam atualizar-se consde ciência e tecnologia no sentido tantemente. Quanto à Assembléia Legislarestrito. Mas de filósofos, antropótiva, que vem dando toda a consideração às universidalogos, psicólogos, sociólogos que se debruçam para endes públicas, peço que continue a entender o ciclo lontender como o ser humano se insere numa sociedade onde o material e o tecnológico passaram a constituir o go das instituições universitárias e sua necessidade de centro das atenções. previsibilidade de recursos e de autonomia, com rigoro sa avaliação. As universidades públicas querem ser coAs Letras têm a missão de transformar visões e linguagens, de forma que sejam capazes de arquitetar novas bradas, mas é preciso entender que seus ciclos de tempo mentalidades que possam conciliar valores humanos e o são diferentes. Teses podem levar dez ou 15 anos para sistema econômico e político. Esses valores devem proserem conclÚídas. Um ciclo de formação, em algumas áreas, leva mais de dez anos. mover a cultura do respeito humano, apesar das difeAs universidades precisam de previsibilidade e autorenças. Devem ser valores de solidariedade e de universanomia. Uma forma de sedimentar a previsibilidade seria lismo, buscando um sistema econômico que induza a constitucionalizar a quota parte das universidades. Hoje, eficácia e a complementaridade nas cadeias setoriais, asnos recursos das universidades, estão embutidas, por segurando a competição de mercado, mas sem nunca inibir a cooperação entre os agentes econômicos. exemplo, despesas com hospitais e com a previdência. A Deve buscar-se também um sistema político que assesociedade tem uma falsa percepção dos investimentos que estão sendo realizados. gure o pluralismo de idéias, mas com o imprescindível consenso duradouro, que permita a implantação de proÉ necessário também cada vez mais promover estujetas ousados de políticas públicas. Já houve, no passado, dos estratégicos, usando as metodologias disponíveis. Por exemplo, olhar para o século 21 e ter dados razoaclássicos da literatura que influiram no imaginário da juventude. Cada um desses clássicos tem seu papel. Como velmente sólidos sobre demografia, urbanização, dualileitura obrigatória nas escolas, eles mostram muito bem dade socioeconômica e tecnologia, para que a sociedade como as letras dão sua contribuição para a arquitetura possa ser mais responsável com relação ao futuro. das mentalidades. As universidades públicas do Estado de São Paulo estão prontas para empreender esse trabalho, visando à É preciso também fazer mais no avanço do conhecimento, e isso quer dizer a pesquisa. Ela deve constituir a alimentação das decisões a serem tomadas sobre as pobase do inconformismo com o qual se lida com as incerlíticas públicas. Este espaço, aberto na Assembléia Legislativa, destinado a articular os atores sociais para tezas. Não se pode imaginar a pesquisa isolada do ensino. pensar sobre o futuro, deve ser multiplicado. O pesquisador que ensina leva para a sala de aula o in-

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Pesquisa brasileira precisa de u111 novo perfil ~ Mais do que nunca, São Paulo preciprofessor Hermano ~ sa de iniciativas como este fórum. OBrade Medeiros Ferreira Tavares, il sil atravessa uma década que não pode reitor da Universidade " ser considerada perdida. Nos últimos Estadual de Campinas (Unicamp), dez anos, o país evoluiu e trilhou camijá completou 25 anos de trabalho nhos, embora sem qualquer planejamento. O professor Jacques Marcovitch, na universidade. É professor titular reitor da Universidade de São Paulo, reda Facuidade de Engenharia Elétrica feriu-se à possibilidade de que este fóe de Computação. Com cerca rum pense os próximos 25 anos, talvez o de 90 trabalhos científicos próximo século. Vou restringir-me a penpublicados, suas principais áreas sar os próximos dez anos. Se este fórum fizer o trabalho de pende atuação estão nos campos sar os próximos dez anos do Estado de da pesquisa operacional/problemas São Paulo, particularmente no que diz combinatoriais, inteligência artificial, respeito ao desenvolvimento econômico e planejamento de sistemas seu relacionamento com a ciência e a tectelefônicos e análise de sistemas Hermano de M. Ferreira Tavares nologia, fará não somente um trabalho útil para toda a população. Será uma tareeconômicos. fa particularmente preponderante e indispensável para o Tavares é engenheiro eletrônico, formado desenvolvimento das universidades públicas do Estado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), de São Paulo, as quais, ao cabo de dez anos de autonomia, de São José dos Campos, em 1964. enfrentam dificuldades claríssimas. Em 1966 e 1968, fez mestrado e doutorado A revista inglesa The Economistpublicou recentemente dados sobre a evolução do Produto Nacional Bruto per na Universidade de Toulouse, na França. capita da Europa Ocidental nos últimos 1.000 anos. Pela Antes de ir para a Unicamp, ausência de contas públicas rigorosas, esses dados, natulecionou nas universidades federais ralmente, envolvem muitas suposições. Mas pode-se ver da Paraíba e de Pernambuco, com clareza que do ano 1000 até por volta de 1700, a renno ITA e na Escola de Engenharia da per capita do europeu manteve-se particularmente estável, oscilando por volta de US$ 700 anuais (em valores da USP em São Carlos. corrigidos para 1990). Apesar de relativamente nova, pois começou Dentro do espaço de vida de um ser humano, que a funcionar em outubro de 1966, a Unicamp era de entre 40 e 50 anos, não havia, assim, qualquer é uma das mais importantes universidades evolução. De um ano para outro, o avanço econômico brasileiras. De seus institutos sai 15% era quase que rigorosamente zero por cento. O avanço econômico era praticamente insignificante, resuminda produção científica do país. Eles abrigam, do-se basicamente a cobrir o aumento da população, ainda, 10% dos estudantes de pós-graduação. que também era bastante lento. O ser humano nascia e Com 2 mil professores, a Unicamp vivia sem qualquer perspectiva de crescimento e mutem cerca de 10.500 alunos de graduação dança nas suas condições econômicas e em sua qualie 1O mil de pós-graduação. dade de vida.

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Essa camisa de força, de dificuldade para a mudança econômica, foi rompida por volta de 1750, época em que se observa o início de um nítido avanço na renda per capita dos europeus. O processo se acelerou notavelmente nos últimos 100 anos. Em 1900, a renda per capitada Europa Ocidental era de cerca de US$ 2 mil por ano. Hoje, PESQUISA FAPESP

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tituto de Pesquisas Tecnológicas, muito importante, mais a cifra ultrapassa os US$ 20 mil na maioria dos países países europeus. dirigido para a área produtiva, multissetorial. O que aconteceu nessa época para causar tal mudanAs indústrias respondem, por sua vez, por uma parceça? Houve o início do processo de incorporação da tecla mínima do desenvolvimento da ciência e da tecnologia nologia à produção de bens, processo esse que a partir no Estado de São Paulo. Essa é uma das características bádesse ponto se intensificou. Esse foi um fenômeno inicialsicas do sistema brasileiro. As universidades brasileiras tiveram um aparecimente europeu, mas que se irradiou para países como o Brasil, de cultura européia. Não é possível admitir, pomento bastante tardio. Rigorosamente, pode-se dizer rém, sem qualquer possibilidade de erro, de que esse que a primeira universidade brasileira, na acepção plena do termo, foi a Universidade de São Paulo, criada em avanço seja algo inexorável. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, em 1500, 1934, por meio de um movimento extremamente meritório, facilitado pelo momento a cultura mais importante do mundo, em termos científicos e político vivido então pela Europa. Na década de 50, foram criatecnológicos, era a chinesa. Mas das várias outras universidades essa cultura sofreu percalços e não modelo no país, sobretudo federais. Fiavançou. Pelo contrário, a qualidade universidade nalmente, na década de 70, ocorde de vida de seu povo piorou. Há reu uma importante reforma na outros exemplos que apontam existente hoje nessa mesma direção. Um deles é universidade brasileira, que levou talvez tenha o da cultura islâmica, que teve deao modelo de universidade existente hoje e que, talvez, tenha chesenvolvimentos notáveis até 1300, chegado sobretudo na área da Matemática. gado ao seu esgotamento. Essa reforma universitária da Mas esses desenvolvimentos não ao esgotamento'' década de 70 tinha como pilares tiveram seqüência. Portanto, não podemos prebásicos a organização em departasumir que o crescimento como o mentos, com a derrubada das cátedras, a adoção do regime de dedicação exclusiva e a imverificado na Europa vá continuar para sempre. Esse crescimento é decorrente da incorporação da tecnoloplantação da pós-graduação. A criação da pós-graduação gia à produção. A tecnologia, por sua vez, é, com algum talvez seja o fato mais relevante da evolução da universitempo de atraso, puxada pelo desenvolvimento das ciêndade brasileira nos últimos 30 anos. Ela fixou a pesquisa e permitiu a criação de quadros cias básicas. renováveis, jovens que se dirigem cada vez mais para a O que garante a incorporação da tecnologia ao mununiversidade, dando ao Brasil uma posição ímpar no cedo produtivo é, provavelmente, um conjunto de valores nário mundiál. O país tem, talvez, o melhor sistema de culturais, instituições políticas e instituições econômicas. Portanto, é da maior importância que estejam juntos, pós-graduação do Terceiro Mundo. Desse modo, embocomo aqui neste fórum, segmentos universitários, que ra tenha começado a montar suas universidades tardiaimprimem os valores culturais de um povo, e segmentos mente, o Brasil tem hoje as melhores universidades da políticos, como o representado por esta Assembléia LeAmérica Latina. gislativa. Juntos, como está proposto na carta básica do Na década de 70, assim, com a reforma pela qual Fórum Século 21, eles podem pensar o futuro do estado, passaram na ocasião, as universidades brasileiras assufixar metas e determinar trilhas para serem seguidas pemiram papel de destaque. A principal característica deslas autoridades. se papel foi a integração entre a pesquisa científica e o ensino de pós-graduação. Entretanto, por ser um país A pesquisa científica no Brasil é feita, sobretudo, nas que pratica uma ciência relativamente nova, o Brasil universidades públicas e nos centros de pesquisa do sistema do Ministério de Ciência e Tecnologia. Uma fração tende a praticar uma ciência reflexa dos países avançados. A pesquisa desenvolvida nas universidades brasimenor dessa atividade é encontrada nas empresas estatais leiras não é, necessariamente, aquela da qual o país pree nos institutos de pesquisa estaduais. No Estado de São cisa. De certa maneira, ela segue a tendência acadêmica Paulo, em particular, existe um segmento bastante immundial, o que facilita, por exemplo, sua inclusão em portante de institutos estaduais de pesquisa. Existe, por exemplo, a rede de institutos de pesquisa grupos internacionais e a publicação de artigos em periódicos de circulação mundial. da Secretaria da Saúde, representada pelo Instituto BuÉ preciso, neste momento, com o amadurecimento da tantan e outros, igualmente notáveis. Há também a rede pós-graduação no Brasil e a necessidade de um desenvolda Secretaria da Agricultura, representada pelo Instituto Agronômico de Campinas. Pode-se citar, também, o Insvimento de um perfil competitivo no mercado mundial,

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PENSANDO SÃO PAULO: U NIVERSIDADES E INSTITUTOS

próximos dez anos. Não será necessária nenhuma mágique a pós-graduação e a pesquisa brasileira procurem caca. O objetivo não é extremamente difícil. A Argentina e minhos próprios. Faz-se necessário, sobretudo, que seja o Chile têm proporções superiores à brasileira. Não dos incorporada à nossa pesquisa, que é de boa qualidade, a 15% atuais, mas do dobro, dos 30%. indispensável preocupação com problemas de relevância Tenho 60 anos. Estou às portas da aposentadoria. social para o país. É necessário fazer pesquisa que tenha Passei a vida trabalhando no sistema universitário. Esrelevância social e cuja aplicáção possa ir ao encontro das perei a vida inteira por uma oportunidade como a que necessidades de melhoria da qualidade de vida da popuexiste no momento no estado. Temos, através deste Fólação brasileira. rum São Paulo Século 21, a oportunidade de pensar, Oitenta por cento das atividades científicas brasileiras planejar e preparar o Brasil, e especialmente o Estado estão concentrados na Região Sudeste. É o que mostra o de São Paulo, para os próximos dez anos. E é mais que mapa. Boa parte desta concentração está em São Paulo, o óbvio: o desenvolvimento cientíestado mais rico e mais populoso. fico, a melhoria da qualidade de Nem por isso, aliás, a situação do vida e o resgate da dívida social estado é extremamente cômoda. passam necessariamente pelo cresEssa distorção geográfica decorre ''As universidades cimento de uma ciência e uma de um processo de desenvolvimenpúblicas tecnologia que possam ser aplicato heterogêneo. Não poderá ser sodas à melhoria das condições de lucionado apenas com um esforço de São Paulo vida do povo brasileiro. financeiro de promoção à pesquiformam a metade Existe a possibilidade de que sa. É necessário um esforço mais isso seja feito agora. As universiprofundo. Não se trata, simplesdos doutores dades públicas devem ser colocamente, de um problema de finandas a serviço desse objetivo. Não ciamento da pesquisa. do Brasil'' se pode adiar mais uma posição. Um aspecto muito importante É possível criar metas válidas papara a compreensão do problema ra esses próximos dez anos, deliestá na distribuição da formação neando, por exemplo, quantos estudantes universitários de quadros para o ensino superior. O Brasil, em termos queremos ter no futuro e que tipo de pesquisa se pretende graduação, forma cerca de 300 mil bacharéis por ano. de fazer. Nesse total, a contribuição das universidades públicas no Devem ser cobrados resultados dessas pesquisas e o Estado de São Paulo é bastante modesta, de cerca de 10 processo de avaliação das universidades deve ser permamil bacharéis, ou 3% do total brasileiro. As instituições nente. O financiamento das universidades públicas do federais de ensino superior, que de certa maneira constiEstado de São Paulo precisa ser encarado com o máximo tuem a espinha dorsal do ensino universitário, contride seriedade: Parte substancial desse financiamento é buem com cerca de 18% desse total. destinada, no momento, ao pagamento de inativos e à Mas, quando se trata da pós-graduação, a posição das manutenção dos hospitais universitários. São pelo menos universidades públicas paulistas é bem mais expressiva. esses dois fatores que vêm estrangulando atualmente as As cinco universidades públicas existentes no Estado de São Paulo, três estaduais (USP, Unesp e Unicamp) e duas universidades públicas estaduais paulistas. Finalmente, há mais um fator que não pode deixar de federais (Unifesp e Universidade Federal de São Carlos) ser pensado pelo Fórum São Paulo Século 21. Trata-se da são as responsáveis por cerca de 50% da formação de necessidade de revigorar a rede de institutos de pesquisa doutores no país. De certa maneira, as universidades púdo Estado de São Paulo. Essa rede é da maior importânblicas paulistas são escolas de escolas. Elas formam uma cia. O desenvolvimento do sistema agrícola paulista, que boa parte dos profissionais que vão lecionar nas universié importantíssimo, dependeu fortemente dos institutos dades brasileiras. Esse quadro é da maior importância ligados à Secretaria da Agricultura. Mas boa parte deles quando se trata de pensar o futuro. mereceu, nas últimas décadas, um tratamento que não foi De qualquer maneira, deve-se estar atento para o fato de que apenas 15% da população potencialmente univero melhor que poderiam ter recebido. sitária do Brasil- os jovens com entre 20 e 24 anos- cheEssa rede de institutos é de importância fundamental gam às escolas superiores. Mesmo em São Paulo, onde se para o desenvolvimento de nosso estado. Mesmo assim, não tem recebido a atenção e o tratamento adequados. É poderia esperar um resultado bem melhor, devido à sua indispensável pensar no revigoramento e no crescimento situação com relação ao restante do país, essa proporção desse sistema. E, ao seu lado, pensar também no probleé de apenas 17%. Essa parcela é dramaticamente baixa. ma do dimensionamento das universidades públicas e do Para se ter um futuro melhor, é preciso estabelecer metas seu financiamento. com cuja aplicação será possível dobrar esse número nos PESQUISA FAPESP

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Cuidado cotn as falsas detnandas sociais A Unesp é uma universidade nova. reitor da Universidade Foi criada em 1976. Mas também é uma Estadual Paulista (Unesp), universidade com origens que remontam Antonio Manoel dos Santos ao início do século. Muitas das unidades Silva, é um veterano da instituição, que formaram o conglomerado para sua na qual leciona há 33 anos. constituição são antigas. Suas faculdades mais antigas são as de Odontologia e Com dez livros e mais em Araraquara; começaram a Farmácia de 100 artigos publicados, funcionar em 1923. A Faculdade de Ciêné professor de Literatura Brasileira cias Agrárias e Veterinárias de Jaboticano Instituto de Biociências, Letras bal tem origem numa escola agrícola e Ciências Exatas do câmpus fundada em 1921. A Unesp tem esta particularidade: é a mais nova das universida Unesp em São José dades públicas, mas, em alguns pontos, do Rio Preto. Antes de ser também é antiga. Sua estrutura foi muiescolhido para a reitoria, ocupou to violentada quando de sua criação: foos cargos de pró-reitor ram extintos cursos de graduação, oude Pós-Graduação e Pesquisa Antonio Manoel dos Santos Silva tros foram deslocados, alguns foram criados. Sua reitoria estava oficialmente e de vice-reitor. Entre seus em Ilha Solteira, a 666 km de São Paulo. trabalhos, está a consolidação do sistema Em 1984, a Unesp passou por uma reestruturação. de pós-graduação da universidade. De certa maneira, foi democratizada, uma vez que muiEntre 1989 e 1993, o professor Silva to mais pessoas passaram a participar dos órgãos colefoi vice-reitor da Universidade Ibero-Americana giados que definem seus destinos. Importantíssimo foi o ano de 1989, quando se estabeleceu a autonomia das de Pós-Graduação, com sede em Salamanca, três universidades públicas do Estado, entre elas a na Espanha. Desde então, é diretor regional Unesp, que passaram a ter aplicado nelas um índice do da Associação Universitária Ibero-Americana orçamento do Estado. A partir desse ano, a Unesp tepara o Brasil, Portugal e Cone Sul. Foi até ve um crescimento relativamente muito forte. Isso ino início deste ano membro fluenciou seu papel de preparar cientistas e diferentes tipos de profissionais e situar-se na fronteira do conhedo Conselho Superior da FAPESP. cimento dentro do Estado de São Paulo, em pesquisas e A Unesp está presente na maioria das regiões desenvolvimento. do Estado, com 15 campi universitários, No início da autonomia, em 1989, a Unesp tinha 12 três campi avançados, 24 unidades mil alunos de graduação. Hoje, tem 21 mil. Tinha 900 universitárias e dez unidades alunos regulares na pós-graduação. Hoje, tem 7 mil. Os números relativos ao crescimento do número de alunos complementares em 15 cidades. Com cerca das outras duas universidades estaduais não devem ser de 3.500 professores, atende cerca muito diferentes. Esse crescimento em dez anos mostra de 23.260 alunos. Mantém 80 cursos como foi importante para a universidade ter autonomia de graduação e 46 de pós-graduação, na gestão dos recursos que, aprovados pela Assembléia Legislativa, o Estado é obrigado mensalmente a repassar com 92 programas de mestrado para a universidade pública. e 67 de doutorado.

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Mas a Unesp está, de certa maneira, estrangulada. Não porque não esteja desenvolvendo bem o que desenvolve hoje. Mas porque não pode usar seu potencial para se desenvolver mais. A Unesp tem uma potencialidade altíssima para desenvolver o ensino e pesquisa. lO

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P ENSAN D O SÃ O PAUL O: UN I V ER S ID A DE S E I NST ITU T OS

As universidades têm de expor isso às instâncias que Mas não pode fazer mais do que faz. Os cordões que fatomam as decisões, o Executivo e o Legislativo. Esses prozem este estrangulamento são vários. Vou citar um exemplo. Em 1989, no começo da autonomia, o pagablemas não são só das universidades, são também da somento de inativos consumia 7% dos recursos da Unesp. ciedade que as sustenta. As universidades públicas e os institutos de pesquisa do Estado de São Paulo formam a Hoje, consome 26%. estrutura e a base para o desenvolvimento científico e tecMesmo assim, a Unesp continua a crescer. Em 1989, nológico fundamental para o desenvolvimento do País. a proporção do corpo docente com titulação mínima Assim, um dos problemas das universidades é como de doutor era de 38%. Hoje, subiu para 72%. Há a pretrabalhar as demandas sociais de maneira a distinguir as visão de chegar ao fim do ano 2000 com uma proporrealmente humanas das ditadas pelo eixo exclusivo do ção próxima às da USP e da Unicamp, de 85%. Daqui a seis anos, a Unesp terá condições de abrigar 30 mil alumercado. Elas têm de trabalhar isso muito bem, até nos na graduação e 12 mil na mesmo para atender às próprias pós-graduação. O papel da uniexigências do mercado. Têm de pensar muito nisso. Essa é uma versidade na preparação de cienquestão que vem sendo discutida tistas e profissionais qualificados ''Para matar de maneira candente dentro das é justamente este: o de formar sea universidade res humanos, na graduação e na próprias universidades. Outra insuficiência da univerpós-graduação. As universidades pública, basta fizeram muito, de acordo com os sidade pública é sua territorialiexigir que atenda objetivos ou metas estabelecidos dade. As universidades públicas por diversas instâncias, quando ocupam quase todo o Estado de ao imediato do foram criadas. Mas não fizeram o São Paulo, mas não todo o estasuficiente. do. Há vazios. Pode-se citar dois mercado'' Um dos problemas diz respeilugares, o Vale do Ribeira e o litoto às relações da universidade ral. Eles não têm universidades com as empresas inovadoras. públicas e lá o desenvolvimento Falta algo para que elas possam absorver e desenvolver científico e tecnológico é precário. As três universidades estaduais não podem resolver a pesquisa nacional. Outro é sua situação no que diz os problemas que estrangulam o sistema público do enrespeito às demandas sociais. Quem lidera essas demandas e quais são elas? Hoje, as universidades públisino superior de São Paulo. Mas podem contribuir com cas recebem demandas de diversas instâncias. Uma das as instâncias que decidem, deliberando ou executando. mais agressivas é a mídia. Ela pensa a curto prazo, enIsso não está fora do tema central deste encontro, o dequanto o prazo na universidade é no mínimo médio e senvolvimento científico e tecnológico, pois isso nos longo. Não se faz melhoramento genético em menos de conduz para ó eixo central, a sociedade do conhecimendez anos. Pode ser que com as novas tecnologias esse to. Se, de fato, a sociedade do século 21 for a sociedade prazo diminua. Mas não se fazem coisas assim em prado conhecimento, quem não tiver acesso direto ou indizo curto. reto aos atores do conhecimento, que são as universidaUm dos elementos a serem considerados é o tempo des, estará excluído dessa sociedade. do próprio pesquisador. Ele tem de dividir a tarefa de Se me perguntassem como resolver esses problemas, responderia "não sei". Mas sou professor há 37 anos e pesquisar com a docência, o tempo dedicado a formar creio que as universidades, com seu grande corpo de esaqueles que vão dar continuidade às linhas de pesquisa. Isso é demoradíssimo. É necessário levar em conta, tampecialistas, doutores, cientistas, pesquisadores de ponta, bém, o tempo dedicado à própria constituição da unipodem juntar-se aos que devem pensar o futuro do esversidade. Ela precisa ser dinâmica e perceber as mutado. Assim, será possível chegar a algumas soluções, indanças que ocorrem em sua volta. clusive a de dobrar o número de alunos nas escolas púAs demandas sociais feitas às universidades são de blicas superiores de São Paulo. dois tipos. Algumas são ditadas pelo mercado e podem Isso não é tão difícil. Lugares mais pobres do que São ser extremamente perigosas. Outras são demandas soPaulo já o conseguiram. São Paulo é privilegiado com ciais realmente humanas. Sua identificação é um dos relação à infra-estrutura física, comercial, industrial. A maiores problemas das universidades, não só para o deinfra-estrutura oferecida pelas suas universidades públisenvolvimento da pesquisa e da tecnologia como para a cas e por algumas universidades privadas pode fazer formação dos recursos humanos. Para matar a universicom que, além de não ter excluídos pela miséria da fome dade pública, basta exigir que elas atendam ao imediato e da falta de moradia, São Paulo não tenha também os do mercado. excluídos do conhecimento. PESQUISA FAPESP

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O gigante que pula colll ullla perna só A vigésima sétima Conferência Geral eitor da Universidade de Santo iiiiiiiiiiiiiiiiii;:::====;;jjjjjjjjiiiiiiiiii ~ ~ da Unesco sobre educação superior, realiAmaro (Unisa), Sidney Storch ~ zada em novembro de 1993, em Paris, Outra é o representante ;o apresentou ao mundo uma definição soda Região 3, que compreende bre o que efetivamente é educação supeos Estados de São Paulo, rior. Trata-se, afirma, de "todo tipo de estudos, treinamento ou formação para Rio de Janeiro e Espírito Santo, pesquisa em nível pós-secundário, ofereno conselho deliberativo cido por universidades ou outros estabedo Conselho de Reitores lecimentos educacionais aprovados como das Universidades Brasileiras instituições de educação superior pelas (CRUB). Outra é formado autoridades competentes do Estado." Essa definição tem a ver efetivamente em Engenharia Eletrônica pela com o papel das universidades no processo Universidade Federal da Paraíba de desenvolvimento das nações e dos povos, (UFPB), tem especialização tema central deste fórum. A proposta que em Administração Financeira pela trago para este seminário é a de que as Escola de Administração Sidney Storch Outra universidades assumam, de fato, um papel de liderança no processo de desenvolde Empresas da Fundação Getúlio vimento, no que tange à ciência e tecnologia. Essa é uma Vargas e MBA na Sociedade conclusão óbvia, devido ao fato de que as universidades de Desenvolvimento Empresarial de São Paulo. dispõem de trunfos únicos para desempenhar este papel. Atualmente, faz doutorado em Educação Isso está inerente à sua própria missão, que consiste, pela Universidade Andrews, dos Estados primeiramente, em formar os dirigentes de amanhã. Essa formação é papel da universidade. Ao mesmo tempo em Unidos. Foi diretor-geral do Hospital que ela forma pessoas no nível superior, forma líderes. A São Vicente, de Curitiba, e diretor pesquisa dentro da universidade deve, acima de tudo, administrativo e financeiro da Amico procurar ampliar os horizontes e expandir as mentes. AsAssistência Médica de São Paulo. sim, os líderes poderão, de fato, pensar no benefício do A Universidade de Santo Amaro funciona seu próximo e da sociedade. A natureza fundamental da existência da universidaem dois campi na Zona Sul da cidade de é a de ser o motor do saber dentro da sociedade. Nos de São Paulo. Surgiu em 1968, como 35 anos que correram até 1995, o número de alunos matriOrganização Santamarense de Educação culados em cursos superiores em todo o mundo multiplie Cultura (Osec). Ganhou o novo nome cou-se por mais de seis. Hoje, existem provavelmente 90 ao adquirir o status de universidade, em 1994. milhões de pessoas matriculadas no ensino superior. A afirmação de que a educação é a alavanca do conhecimento Tem 10 mil alunos e 800 professores, não é ouvida só no Brasil. Ela ocorre em todo o mundo. em 27 cursos superiores. O CRUB reúne Esse aumento quantitativo não foi acompanhado por reitores de dezenas de universidades um crescimento qualitativo no sentido e contexto do debrasileiras. Participa da busca de soluções senvolvimento das nações. Ficou constatado que ocasiopara problemas como o financiamento nou um aumento ainda maior na disparidade entre os países. No contexto mundial, 75% de novos conhecimendos hospitais universitários e participa tos no mundo provêm de um número restrito de países, a de projetas como a Ação da Cidadania saber, Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, Japão, Francontra a Fome e a Universidade Solidária. ça e Canadá. Esses países representam apenas 13% da popu-

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lação do globo. Praticamente todos os 87% restantes compram e consomem conhecimento, tecnologia e ciência. 12

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PEN S ANDO SA O PAULO: U NIVER S IDAD ES E IN S TITUTO S

Isso pode ser corroborado por um dado publicado na ses países, quem paga a pesquisa básica é o governo, quem executa é a universidade. Na pesquisa aplicada, quem paedição de março de 1995 da revista Science. De acordo ga, fundamentalmente, é a indústria, com alguma particom esse dado, a América Latina produz apenas 0,9% das cipação do governo. A parcela governamental corresponpesquisas realizadas no mundo. Deve-se ressaltar que, destes 0,9%, 70% das pesquisas da América Latina são de em grande parte à compra de patentes e de tecnologia, realizadas no Brasil. Portanto, apesar do número global para que elas sejam trazidas para dentro do país. Quanto não ser favorável, o Brasil é líder dentro do contexto da ao desenvolvimento de novos produtos, quem paga e quem realiza é o setor privado. É a outra perna do Saci. América Latina. Trata-se de um fator importante. Este modelo, no qual a universidade faz a ciência funDe qualquer forma, pode-se fazer o diagnóstico de damental, a pesquisa básica, e a indústria aplica e desenque o Brasil é fundamentalmente um consumidor de covolve tecnologia, parece ser o que mais fomenta o desennhecimento. Vamos analisar um pouco mais profundavolvimento de forma rápida e mente essa questão. Para isso, vou segura. Não é função da universiusar dados de um trabalho produdade desenvolver produtos finais. zido pelo presidente da FAPESP, Isso exige conhecimentos de caracprofessor Carlos Henrique de Bri''Não faz parte terísticas do mercado e um envolto Cruz. Nele, é comparada a disdas funções vimento comercial não pertinentribuição institucional da atividade de pesquisa e desenvolvimento tes à universidade. A universidade da universidade faz a pesquisa básica e a indústria no Brasil com a de outros países. desenvolver faz a pesquisa aplicada. Os dados mostram que existe uma diferença significativa. Nos No modelo brasileiro, já existe produtos finais Estados Unidos, Japão, Alemanha, uma perna. Está faltando a outra, França, Inglaterra, Itália e Canadá, que é a aplicação e o investimento para o mercado'' a maior parte da atividade de pesdo setor privado. As universidades podem e devem tomar a iniciatiquisa e desenvolvimento é realizava, liderar e buscar esse processo. da na indústria. No Brasil, ocorre exatamente o inverso. A pesquisa é realizada fundamenDurante muitos anos, a universidade brasileira esteve um talmente na universidade. O trabalho também compara pouco dissociada de sua real função. Isso ocorreu como artigos científicos publicados e patentes registradas nos uma reação ao regime militar, no qual a universidade, com Estados Unidos. O Brasil aparece entre os países que proraras exceções, esteve mais voltada para a questão polítiduzem artigos científicos de maneira significativa, mas ca, para a implantação da democracia. No setor privado, não havia razão para investir em pesquisa e gerar novas tecnão está entre os que registram patentes. nologias. Havia um exagerado protecionismo e a reserva Vale uma comparação com a Coréia, país que há 20 de mercado, ~orno no caso da informática, por exemplo. anos estava numa situação muito semelhante à do Brasil. Hoje, a sociedade brasileira paga por esses 20 anos de Hoje, a Coréia aparece significativamente como grande publicadora de artigos científicos e registro de patentes, nossa história. Para solucionar o problema, o Brasil precisa ser ágil. Não pode demorar muito. A impressão é a de ou seja, possui as duas pernas que medem a questão da que as instituições não-públicas têm um pouco dessa agipesquisa e desenvolvimento de forma mais equilibrada. Todos devem concordar que no Brasil temos uma situalidade. Devido a essa velocidade, as instituições privadas podem exercer um papel importantíssimo de atrair contração diferente, estamos com uma perna só, publicamos tos de parceria com o setor público e rapidamente gerar muito e quase não registramos patentes. Usando uma figura da mitologia brasileira, poderíamos afirmar que expertise em determinados nichos de mercado. A partir ainda sofremos da síndrome do Saci. O Brasil está pulandaí, é possível ter o retorno desejado em termos de desenvolvimento que tanto se almeja, do qual o país tanto predo com uma perna só. Faz pesquisa nas universidades, cisa, e que certamente nos conduzirá a um Brasil mais mas não consegue transformar esta ciência e tecnologia em efetivo desenvolvimento para benefício de seu povo. justo. Afinal, esta é a proposta fundamental deste fórum. Na década de 80, o Brasil tinha uma situação até um Concluindo, reafirmo que acima de tudo a função primeira das universidades ainda é a de combater a escaspouco melhor que a da Coréia. Por volta de 1984 e 1985, posez de material humano. As grandes indústrias mundiais rém, houve uma grande mudança na situação coreana. Naquele período, houve um significativo aumento nos invesimplantarão suas atividades de pesquisa e desenvolvimento onde houver potenciais de recursos humanos. timentos das empresas em pesquisa e desenvolvimento, o Portanto, o aumento do investimento privado em ciência que gerou um grande acréscimo no registro de patentes. e tecnologia depende significativamente da nossa capaciÉ possível observar que o modelo coreano é quase dade de recrutar e desenvolver talentos. uma cópia do modelo seguido nos Estados Unidos. NesPESQUISA FAPESP

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Surgetn novas oportunidades para a educação continuada

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~ Quando se analisa o papel de uma insprofessor José Rubens § tituição social em relação aos vários segRebelatto, reitor il mentos sociais, é necessário estabelecer da Universidade Federal " com clareza quais são seus objetivos, suas de São Carlos (UFSCar), formou-se metas, sua missão. É preciso determinar em Educação Física em 1975 qual é seu contrato social ou, pelo menos, qual era na sua gênese, quando a instituie em Fisioterapia em 1978, ção foi concebida. O assunto é polêmico, nos dois casos pela Pontifícia mas neste debate vou assumir uma deterUniversidade Católica de Campinas. minada missão para a universidade públiComeçou a lecionar na UFSCar ca. Trata-se da tarefa de produzir conheciem 1980. Nessa universidade, mento e de torná-lo acessível a todas as pessoas que possam precisar dele. fez especialização em Análise Até pouco tempo atrás, era usual ouvir e Programação de Condições que os objetivos das universidades, pelo de Ensino, em 1983, o mestrado, menos as públicas, eram o ensino, a pesem Educação Especial, em 1986, quisa e a extensão. Mais recentemente, dee o doutorado, em Educação, José Rubens Rebelatto monstrou-se, inclusive em trabalhos acadêmicos, que essas são apenas atividades. em 1991. Suas áreas principais As razões de ser dessas atividades é que devem evidenciar de pesquisa são as de Prevenção a missão da instituição. Para que fazer pesquisa, para que em Fisioterapia e de Ensino em Fisioterapia. produzir o conhecimento, para que realizar a atividade Antes de chegar à reitoria, o professor do ensino de extensão, se não for para a produção do coRebelatto ocupou diversos cargos na UFSCar, nhecimento e tornar esse conhecimento acessível? A primeira parte é a produção do conhecimento. A inclusive os de chefe dos departamentos universidade pública está produzindo o conhecimento? de Ciências da Saúde e de Fisioterapia Quais são as atividades dessa instituição no seu dia-ae Terapia Ocupacional, vice-coordenador dia que caracterizam a consecução desta parte de seu dos órgãos suplementares, pró-reitor compromisso social? Aparentemente, sim. Mais de 96% de extensão e vice-reitor. do conhecimento científico e tecnológico brasileiros são produzidos nas universidades públicas. As atividades de A Universidade Federal de São Carlos pesquisa e de formação de futuros cientistas são feitas, tem atualmente cerca de 4.800 alunos majoritariamente, nas universidades públicas. na graduação e 1.400 na pós-graduação, Quais as atividades desenvolvidas cotidianamente peçom 25 cursos de graduação e 28 opções las instituições públicas para tornar esse conhecimento em pós-graduação. Além das instalações acessível? Uma das mais tradicionais e conhecidas dessas maneiras é a formação dos futuros profissionais, que vão em São Carlos, tem outro câmpus permanente interferir na sociedade para resolver seus problemas. Ouna cidade de Araras, onde funciona o curso tra, menos conhecida, é a pós-graduação. Ao formar prode Engenharia Agronômica. Dos seus fissionais cientistas para o país, torna acessível à sociedaprofessores, nada menos do que 96,31% de o conhecimento gerado pela universidade. Existe, porém, uma atividade ainda menos conhecida, têm mestrado ou doutorado. que é a de extensão. Ela está passando por uma evolução É a maior proporção entre as universidades muito grande. Ela entra na concepção da educação confederais brasileiras.

tinuada, educação permanente ou educação para a vida toda. Essa atividade tem características que a tornam diferente das outras. Nem melhor nem pior, mas diferente e com um potencial de atendimento de demanda superior

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PENSANDO SÃO PAULO: UN I VERSIDADES E I NSTITU T OS

bastante privilegiado. Esse privilégio vem, entre outros O terceiro exemplo é a incubadora de cooperativas fatores, de não ter os limites formais da graduação e da que a Universidade Federal de São Carlos está pondo em pós-graduação, podendo, por isso, atender demandas esprática em conjunto com a UniTrabalho. O problema a pecíficas da sociedade. ser enfrentado, no caso, é o desemprego e a exclusão social, resultados do momento político-econômico existente A extensão é pouco explorada, especialmente por ser atualmente em todo o mundo e também no Brasil. O um universo inacabado. Existe uma quantidade signifiprojeto partiu da convicção de que determinadas camacativa de formas de atividades de extensão que precisam das sociais poderiam usar o auxílio de várias áreas do coser mais bem estudadas, descobertas e implementadas. A Universidade Federal de São Carlos está desenvolvennhecimento, como engenharia de produção, engenharia civil, ciências sociais, psicologia, advocacia e outras, para do várias experiências nesse campo. Três formas vão ser citadas, por suas características especiais. São os núenfrentar essa situação. cleos de extensão, os escritórios A universidade fornece o coregionais e as incubadoras de conhecimento e uma infra-estrutura básica para que as pessoas foroperativas. mem uma cooperativa. A partir Os núcleos de extensão da Uni''Primeira daí, elas vão ao mercado e ofereversidade Federal de São Carlos cooperativa cem seus serviços. A primeira coestão voltados para determinados operativa formada na Universidasegmentos sociais. Eles surgiram formada na de Federal de São Carlos foi uma da necessidade de organizar ativiUFSCar hoje faz cooperativa de serviços de limpedades da universidade. Há núcleos za. Antes, eram pessoas excluídas voltados para empresas, sindicaa limpeza totalmente do mundo do trabatos, município, saúde e cidadania. lho. Hoje, fornecem serviços de Além de se mostrarem eficazes na da universidade'' limpeza inclusive para a própria organização das atividades interuniversidade, pois ganharam a linas, eles se mostraram potentes citação. A universidade consegue organismos de interlocução do serviços por um preço bem menor que o pago a outras diagnóstico das demandas dos segmentos sociais e de empresas e os cooperados ganham muito mais do que agilização de trabalhos. receberiam como empregados dessas empresas. Quanto ao segundo exemplo, a UFSCar tem hoje escritórios regionais em três cidades: Araçatuba, Assis e A educação continuada tem relação com o compromisso da universidade pública de, além de formar futuros Fernandópolis. Eles surgiram da freqüência com que preprofissionais, ser responsável pela educação do cidadão feitos ou associações comerciais de municípios distantes no decorrer de sua vida. Isso exige outra concepção do da sede procuravam a universidade, pedindo seu auxílio que deve ser o papel da universidade no que era chamapara a solução de problemas específicos. Isso levou à criado de extensão. A Universidade Federal de São Carlos esção de um programa, com o qual, a partir de uma infratudou o que vem sendo chamado de educação continuaestrutura fornecida pelos interessados e com a supervisão da ou educação permanente em vários países, Portugal, de um pesquisador e professor da universidade, eram traEspanha, Itália e Inglaterra. Descobriu que grande parte çados alguns objetivos, como diagnosticar mais corretado que é feito nesses países já se faz nas universidades púmente o problema levantado. blicas brasileiras. O programa envolve o uso de grupos de pesquisa e A diferença exigida para que esse passo seja dado é baalunos de graduação e pós-graduação da universidade sicamente uma postura a favor dessas atividades, com para o treinamento de pessoas do próprio município, maior agilidade administrativa e disposição para a captacapazes de resolver os problemas quando a universidação de recursos. A diferença está principalmente nessas de se retira. Nem sempre o programa corre bem. Esse três posições, embora nem mesmo elas devam ser encatipo de atividade levanta um grande número de probleradas como fundamentais. mas. Um deles é a descontinuidade político-partidária A missão de produzir o conhecimento e torná-lo acesna direção dos municípios. Muitas vezes, o escritório está funcionando muito bem, mas é fechado quando se sível e a realização das atividades de pesquisa, ensino e principalmente de extensão são exemplos do compromisso e muda o prefeito. Houve cidades em que o mesmo escrida contribuição das universidades públicas para o desentório foi inaugurado quatro vezes. Quando isso acontevolvimento da ciência e tecnologia. Isso, se concatenado ceu, foi estabelecida a exigência de que um escritório regional só é montado depois que uma legislação a rescom uma política governamental, da Secretaria de C&T, poderia fazer do Estado de São Paulo um exemplo único peito é estudada e aprovada pela Câmara Municipal. de desenvolvimento regional e evolução social no país. Isso deu maior estabilidade ao programa. PESQUISA FAPESP

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Sucesso leva à atnpliação da incubadora de etnpresas

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O Instituto de Pesquisas Energéticas e professor Claudio Rodrigues, Nucleares (Ipen) foi fundado em 19S6. superintendente do Instituto Pouco mais de um ano depois de sua funde Pesquisas Energéticas dação, começou a operar, no câmpus da e Nucleares (lpen), é um dos mais Universidade de São Paulo (USP), o priexperientes cientistas brasileiros meiro reator nuclear de pesquisa do Hemisfério Sul. É uma instituição científica no campo da física nuclear. Desde e tecnológica cujo compromisso é melho1965, quando foi contratado como rar a qualidade de vida do povo brasileiro. pesquisador auxiliar do Instituto Para isso, produz conhecimento científico, de Energia Atômica, antigo nome desenvolve tecnologias, gera produtos e do lpen, ele trabalha nessa área. serviços e forma recursos humanos. Tem cursos de pós-graduação que outorgaFormado em física pela ram, no ano passado, 29 títulos de doutor Universidade de São Paulo (USP), e 43 de mestre. Sua área, de SOO mil meRodrigues obteve o doutorado tros quadrados, ocupa cerca de um quarem 1970, na Universidade Estadual to do câmpus da Cidade Universitária de de Campinas (Unicamp), com Claudio Rodrigues São Paulo. A principal atividade atual do Ipen uma tese sobre os movimentos está na área da saúde. Produz medicamentos e outros dos átomos do metanol estudados através materiais radioativos para diagnóstico e terapia de diverdo espalhamento de nêutrons. sas doenças. A distribuição desses medicamentos atinge De 1971 a 1973, com uma bolsa todo o território brasileiro. Mais de SOO hospitais e clínide pós-doutorado da FAPESP, esteve cas recebem, em média quatro vezes por semana, materiais radioativos produzidos pelo Ipen. Os produtos do no Instituto de Tecnologia da Califórnia, Instituto foram responsáveis, em 1999, pelo atendimento nos Estados Unidos, participando de mais de um milhão e meio de pacientes. de pesquisas sobre a presença do dióxido A distribuiÇão do material radioativo é just in time. O de carbono de origem industrial na atmosfera. material radioativo produzido é transportado aos hospiO atual mandato é o segundo de Rodrigues tais imediatamente; se não chegar rapidamente ao cliente, perde a atividade. Há materiais radioativos com meiacomo superintendente do lpen. Ele ocupou vida de duas horas, ou seja, depois de duas horas, o o mesmo cargo de 1985 a 1990, período medicamento já perdeu metade da atividade. É por isso no qual entrou em funcionamento o primeiro que o Ipen funciona sem interrupções, em três turnos. reatar nuclear construído no Brasil, Há alguns anos, o Ipen desenvolveu um novo mecao IPEN/MB-01. Os produtos preparados nismo de gestão. Adotou uma política e um planejamento de gestão que focam principalmente as atividades do no lpen são usados hoje na medicina, Instituto dirigidas para a demanda da sociedade e para o na indústria e na agricultura de todo o Brasil cliente. Em função disso, entrou fortemente num projeto e de vários países da América Latina. de excelência tecnológica patrocinado pelo Conselho NaAs atividades de pesquisa desenvolvidas cional de Pesquisas e pelo Ministério da Ciência e Tecnono instituto, no entanto, não se limitam logia. Todos os produtos médicos que saem do Ipen têm o certificado ISO 9002. ao campo estritamente nuclear. O Instituto, porém, não está ausente do novo paradigAli se investigam, também, áreas como ma da participação das instituições de pesquisa de São a obtenção de hormônios humanos Paulo. Faz parte de uma importante parceria constituída por engenharia genética e o crescimento pelo Ipen, o IPT e a USP, com a forte participação do Sebrae, que instalou no câmpus da USP em São Paulo uma de monocristais para uso em lasers. 16

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P ENSANDO SA O PA U LO : U N I V ER S IDADE S E I NS TIT UT O S

incubadora de negócios de base tecnológica. Trata-se do USP, aproveitando espaços ainda disponíveis. Ele conCentro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec). tribuiria para a política de atração de investimentos de A missão do Centro é ajudar o nascimento de novos qualidade da Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico, contribuiria para a alteração da negócios, idéias e empreendimentos de base tecnológica. Fornece uma infra-estrutura básica com condições de vocação econômica da Região Metropolitana de São aumentar o índice de sobrevivência e competitividade Paulo e intensificaria a interação do Ipen, IPT e USP das novas empresas. Seu objetivo é auxiliar o crescimencom as empresas. O parque serviria, ainda, como motivação para a parto da economia brasileira, aumentar a geração de empreticipação dos cerca de 4 mil pesquisadores que trabalham gos e melhorar a capacidade de exportação. A incubadohoje na área e seria um estímulo para a ampliação dos ra foi inaugurada no segundo semestre de 1998. empreendimentos bem-sucedidos a partir da incubadora Há vários exemplos de empresas já incubadas no do câmpus. Esse parque tecnolóCietec. Na área da biomedicina, há gico já está em gestação. Um gruempresas que desenvolvem tecnopo executivo formado pelos parlogias para a produção de válvulas ceiros e constituído pela Secretaria para catéteres, grampeadores ciconhecimento da Ciência, Tecnologia e Desenrúrgicos e endoscópios. Na biotece a tecnologia volvimento Econômico está dannologia, a fabricação de hormônio do os primeiros passos para transde crescimento humano, sintetizaobtidos nas formá-lo em realidade. do por bactérias geneticamente universidades Há várias sugestões, proposimõdificadas, é exemplo de uma ções e ações para que a produção pesquisa que começou no Ipen e devem chega r científica e tecnológica seja efetique está sendo transformada num vamente utilizada no desenvolvinegócio de importância significasociedade'' mento social e econômico de São tiva para a sociedade, principalmente se considerarmos o alto ínPaulo. É importante, de qualquer maneira, captar o interesse do setor, dice de nanismo encontrado na por sua participação na definição de políticas e dos propopulação brasileira. gramas de incentivo à cooperação entre instituições de pesNo início, havia o prognóstico de que seriam necessáquisa e empresas. É preciso tentar flexibilizar os mecanisrios entre três e quatro anos para que empresas de base mos legais que impedem ou dificultam essa cooperação. tecnológica ocupassem o espaço alocado, capaz de abriSão necessários novos programas governamentais de gar 15 empresas. O prognóstico estava errado. Em pouco apoio à inovação tecnológica que estejam voltados para a mais de um ano, os 15 módulos já estavam ocupados. realidade, que sejam capazes de apoiar a inovação nas Hoje, mais de 80 empresas e negócios esperam a oportuempresas de ·acordo com sua capacidade. As instituições nidade de serem incubadas no parque. de pesquisa precisam contar com o apoio de programas e Já existe uma proposta da parceria Ipen-IPT-USP, enorganismos governamentais capazes de auxiliá-las no decaminhada à Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desensenvolvimento dessas atividades, principalmente na sua volvimento Econômico, para a adequação de um número maior de galpões. Assim, o Centro receberia um número interação com as empresas e na preparação de novos negócios dentro ou perto dos câmpus universitários. bem maior de empresas. Num primeiro momento, seriam Não é possível, ainda, esquecer o problema do capital criados mais 15 módulos. Mas é possível que o total de 70 de risco. As empresas residentes ou incubadas num Cenempresas incubadas possa ser atingido antes do fim do tro de Criação de Empresas Tecnológicas ou num parque ano. É provável que seja aberto no câmpus do IPT um espaço para empresas que tenham sinergia com esse Instituto. tecnológico precisam de capital de risco. Mas a solução desse probléma ainda está distante dos modelos proposÉ um novo modelo. Pela primeira vez, uma incubadora instos para a interação da ciência e da tecnologia. talada na área da USP teve sucesso e o sucesso foi forte. As novas empresas não estão acostumadas a buscar O objetivo desse trabalho é criar condições para que a capital de risco e não sabem onde procurá-lo. As grandes iniciativa privada participe um pouco mais da ciência no empresas, por sua vez, ou não estão interessadas numa Brasil. O conhecimento científico e o desenvolvimento tecnológico obtidos nas universidades devem chegar reassociação ou, muitas vezes, não sabem falar a linguagem existente no mundo científico. Nosso mundo científico almente à sociedade, ao mercado. A proposta é fazer isso não está acostumado ou não está interessado em ouvir o em parcerias com empresas privadas, pequenas, médias e discurso das empresas. É preciso fazer com que esses pamesmo grandes. radigmas sejam destruídos. Só assim, realmente, o saber Esse seria o objetivo de um parque tecnológico que poderia ser instalado inicialmente dentro da área da alcançará o fazer.

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Área da saúde precisa de tratatnento diferenciado professor José da Rocha Carvalheira é o responsável pela Coordenação dos Institutos de Pesquisa, um órgão da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. É também o presidente da comissão brasileira que estuda as vacinas contra a Aids. O estudo das doenças transmissíveis, como o mal de Chagas, faz parte de sua carreira. Carvalheira era professor titular do Departamento de Medicina Social da Facuidade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade José da de São Paulo, de onde se aposentou, em 1994, para dirigir o Instituto de Saúde, outro órgão estadual. Da direção do Instituto, passou para a coordenação dos institutos. Embora a coordenação seja relativamente recente, pois foi criada em 1969, ela é responsável por alguns nomes muito tradicionais da ciência brasileira, como o Instituto Butantan, o Instituto Adolfo Lutz, o Instituto Emílio Ribas, o Instituto Pasteur, a Hemorrede e outros organismos do governo estadual de São Paulo. Uma de suas funções é justamente a de servir como órgão de gestão, política, técnica e orçamentária, desses organismos, dos centros de vigilância e dos programas de ação coletiva ligados à saúde no estado.

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O esforço de coordenação de ciência e

~ tecnologia na Secretaria da Saúde come-

a çou há pelo menos 30 anos, com a refor" ma administrativa de 1969, quando foi criada a coordenadoria dos Institutos de Pesquisa. Os institutos tradicionais de pesquisa da área, porém, trabalham desde o início do século. Portanto, por serem anteriores até à constituição da própria Universidade de São Paulo, têm um papel extremamente relevante na história da pesquisa básica, da pesquisa aplicada e dos processos de produção associados. O Instituto Butantan fará 100 anos em 2001. O Instituto Adolfo Lutz é anterior ao Butantan. O Hospital Emílio Ribas e o Instituto Pasteur também são do começo Rocha Carvalheira do século. Essas instituições deram o tom da introdução da pesquisa experimental no Brasil. É preciso refletir sobre o que representava o paradigma adotado nessa época e que norteou a composição dessas instituições. A questão era sempre determinada socialmente. Havia problemas com os quais a sociedade se defrontava e para os quais era necessário encontrar algum tipo de solução. Na área da saúde, o paradigma era dado pelo Instituto Pasteur de Paris. Era um aprofundamento da pesquisa básica, dentro aa percepção de que a pesquisa básica deveria ser informada pela realidade concreta, por meio de trabalhos de campo. Mais que isso, havia uma associação íntima com a pesquisa clínica e com a produção de soros e, posteriormente, de vacinas. Era assim que as instituições enfrentavam os problemas colocados pela sociedade. A coordenação incorporou essas estruturas com toda a sua perspectiva e todo o seu trabalho acumulado. A estrutura mais nova a ser criada foi o Instituto de Saúde, voltado fundamentalmente para uma característica da área de saúde menos existente em outras áreas, que é o aparecimento de uma tecnologia que não é material, mas tem maior importância. O papel de uma secretaria da saúde é dar conta da situação de saúde da população, promover e preservar a saúde, prevenir no que for possível a ocorrência de doenças, atender as pessoas que caíram doentes e, no final, tentar recuperar as seqüelas dos que adoeceram e completaram o ciclo da doença. Uma secretaria desse tipo não pode, assim, valer-se única e exclusivamente de tecnologias materiais, como PESQUISA FAPESP


PENSANDO SAO PAULO: UNIVERSIDADES E INSTITUTOS

medicamentos, equipamentos, vacinas e outros produtos dor Mário Covas. A comissão fez várias sugestões ao Exedessa natureza. Na área da saúde, é da maior importância cutivo, ao Legislativo e a outras áreas de âmbito federal. a tecnologia não material, de organização de serviços e das Uma dessas recomendações propunha a criação, no âmmodalidades de gestão e atendimento, para que o poder bito federal, de um organismo parecido com o Conselho público possa cumprir seus papéis. Este é o grande prode Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo (Concite). blema com o qual se defronta, atualmente, a coordenação. Esse conselho teria caráter deliberativo e, portanto, podeApesar de seu nome indicar uma coordenação de insres muito maiores, com comissões voltadas para diversos titutos de pesquisa, ela assumiu uma dimensão mais amsetores e que acompanhariam o estado da arte em cada pla. Passou a incorporar uma parcela do que se convenárea, mantendo o conselho informado sobre o assunto. cionou chamar de saúde coletiva, envolvendo aí todos os Recomendava-se, ainda, a criação de um Instituto de sistemas de vigilância epidemiológica e sanitária e mesAltos Estudos associado ao Congresso Nacional para cuimo estruturas ambulatoriais e dar dessas questões. O Congresso hospitalares destinadas ao combados Estados Unidos tem um orgate a doenças transmissíveis, como nismo semelhante. Uma Assemé o caso do Instituto Emílio Ribas bléia Legislativa do porte da de ''os principais e do Centro de Referência de Aids. São Paulo também poderia penbeneficiários não sar em ter um instrumento como Trata-se de um problema de extrema complexidade e inclui a esse, de modo a acompanhar os consegu1nam análise do processo social mais processos que tramitam pelo Lecomprar a importante vivido atualmente pegislativo estadual. Existem permanentemente lo Brasil, o processo de municipavacina contra lização da saúde. Um processo em tramitação questões de extredessa envergadura não pode deima complexidade e que, portana Aids'' to, devem merecer uma reflexão xar de ser analisado por um pensamento crítico, de passar por uma de grande profundidade. Na área análise científica detalhada. Essa é da saúde, há situações de extreuma das tarefas a que estão associadas as instituições de ma sensibilidade, nas quais o problema da propriedade pesquisa da Secretaria da Saúde de São Paulo. intelectual e transferência de tecnologia precisa ser traNos últimos dez anos, apareceu uma característica de tado com uma ótica diferente da mera análise do ponto de vista do mercado e da consideração de produtos ou extrema relevância na área da saúde. Foi a criação de um mecanismo de controle social representado por conseprocessos como meras mercadorias. Um exemplo, no qual estou diretamente inserido atualmente, é a tentatilhos municipais, estaduais e, no nível federal, pelo Conselho Nacional de Saúde. Além dos conselhos, que são o va, da qual participa toda a humanidade, de se conseinstrumento paritário de controle social, existem, de maguir uma vaéina contra a Aids. neira também paritária, as conferências municipais e esExatamente sobre esse ponto, no qual os principais taduais e a Conferência Nacional de Saúde. As conferênbeneficiários seriam seguramente países incapazes de adcias, realizadas periodicamente, são os instrumentos que quirir a vacina em quantidades suficientes, coloca-se em indicam os rumos desejados pela população brasileira nível internacional uma discussão de extrema profundidade sobre mecanismos alternativos para trabalhar a para seu sistema de saúde. Foi realizada em 1993, em Brasília, uma primeira conquestão da propriedade intelectual. ferência nacional de ciência e tecnologia em saúde. Entre A Fundação Rockefeller, por exemplo, propôs que as teses mais importantes levadas por São Paulo a essa uma terceira parte, a Organização Mundial de Saúde ou conferência estava a de que, na convergência do sistema a própria Fundação, sirva como intermediário sobre esde ciência e tecnologia com o sistema de saúde, a oriensas questões, permitindo que fossem abrandadas as exitação deve ser dada pelo SUS, com base nas necessidades gências de propriedade intelectual para a transferência da de saúde da população. Propôs-se, na época, a criação de tecnologia de produção de alguns produtos mais avançauma Secretaria Nacional de Ciência e Tecnologia em Saúde, dos do ponto de vista tecnológico. O objetivo seria tornáque nunca foi constituída, e de coordenações estaduais, los acessíveis aos necessitados sem obedecer, obrigatoriasemelhantes à existente em São Paulo. mente, às leis do mercado. Antes disso, em 1991, o Congresso Nacional organiO preço da vacina contra a hepatite levou quase 20 zou uma Comissão Parlamentar de Inquérito mista para anos para cair de US$ 50 por dose para alguns centavos por dose e poder, assim, ser distribuída nos países pobres, examinar as causas e dimensões do atraso tecnológico brasileiro. A rela tora era a deputada Irma Passoni e o predo Terceiro Mundo. Na área da saúde, assim, esta é uma sidente da comissão era o então senador e hoje governaquestão de extrema importância. PESQUISA FAPESP

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En1 busca de recursos para novas necessidades ;;;;;;;=:==========::;;.;;;;;.; ~ O Instituto de Pesquisas Tecnológicas armado em Engenharia § já completou 100 anos. Sua existência tem Elétrica e Mecânica & sido um exemplo de pioneirismo. É o retrapela Escola Politécnica " to da saga paulista da busca da construção da Universidade de São Paulo de um país industrialmente competitivo e (USP), Plínio Assmann acumulou de um povo que quer a modernidade. O IPT foi o berço do concreto armado no uma enorme experiência Brasil. Foi também a origem da indústria antes de assumir o cargo aeronáutica brasileira, muito antes da Emde diretor-superintendente braer, com seus protótipos de aviões com do Instituto de Pesquisas estrutura de madeira brasileira, muitos, Tecnológicas (IPT), em junho muitos mesmo, ainda hoje servindo aos aeroclubes do país. . de 1998. Entre os cargos Foi também a origem da engenharia de que ocupou estão o de secretário construção naval, experimentada no seu dos Transportes do Estado banco de provas para navios, o primeiro de São Paulo, o de presidente do Brasil. Esteve no começo do estudo da da Companhia Siderúrgica Paulista Plínio Assmann mecânica de solos para áreas de risco em obras de infra-estrutura e áreas urbaniza(Cosipa), o de presidente do Metrô das. Isso também ocorreu com a tecnologia do álcool-mode São Paulo e o de presidente tor. O IPT foi a principal base tecnológica de todo um prodo conselho de administração do Metrô cesso de desenvolvimento econômico brasileiro durante do Rio de Janeiro. o meio século da política de substituição das importações. Assmann foi ainda fundador e primeiro Durante esse tempo, o IPT forjou um conceito de pesquisa industrial básica adequada aos movimentos de depresidente da Associação Nacional senvolvimento do país, adequou extensões tecnológicas dos Transportes Públicos, fundador às necessidades do mercado e formou uma numerosa e presidente da Associação de Administração equipe de pesquisadores competentes na gestão de polítiParticipativa (Anpar) e da Agência cas públicas, ética e profissionalmente preparados. Em de Desenvolvimento de Cubatão (ADC) fase importante de sua vida o IPT teve continuidade administrativa invejável. Inquestionavelmente, o IPT é um e presidente do Instituto Brasileiro elemento significativo da política industrial. de Siderurgia e do Instituto de Engenharia No caso brasileiro atual, o IPT é parte da política inde São Paulo. Também ocupou a presidência dustrial real e não formal. Atrás de cada laboratório do dos conselhos de administração da Ferrovia IPT há procedimentos básicos para setores industriais Paulista (Fepasa), da Dersa, da Caraíba que podem progredir ou não, direcionar-se nessa ou naquela direção, na medida dos estímulos tecnológicos doMetais e da Companhia Brasileira do Cobre. minados no IPT. Com cerca de 1.000 funcionários, Uma recente pesquisa divulgada pela Sobeete, a assodos quais 800 são pesquisadores e técnicos, ciação de empresas e profissionais dedicada aos estudos o IPT tem 72 laboratórios, com condições dos impactos da globalização no país, mostrou que emde realizar mais de 3 mil tipos de ensaios, presas multinacionais, que representam 15% do PIB industrial, investem 3% do seu faturamento em inovação e testes e análises. O Instituto já está entrando capacitação para adaptar os produtos e processos já deem seu segundo século. Foi fundado senvolvidos pelas suas matrizes e, em 40% dos casos anaem 1899, como Gabinete de Resistência lisados, para desenvolver novos produtos. de Materiais da Escola Politécnica. Se, por um lado, isso mostra que a abertura da econo-

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mia não resultará no extermínio dos esforços de inovação 20

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PENSANDO SÃO PAU LO: UN I VERS I DADES E I NST I TUTOS

tecnológica no Brasil, indica, por outro, o quanto a inprática, de objetivos e de caráter nitidamente pró-ativo, dústria nacional precisa investir para se manter competielegeu dois programas-mestres: o primeiro, de apoio tecnotiva e o quanto é preciso fazer para dominar tecnologias lógico a micro e pequenas empresas, por meio de laboratórios itinerantes que vão às fábricas prover conhecimenem nosso ambiente, particularmente aquelas tecnologias adequadas às vantagens competitivas brasileiras, que soto e o domínio tecnológico do qual essas empresas estão mente serão estudadas por nós mesmos. Vale dizer, por hoje órfãs. É o chamado Projeto Prumo. O segundo, de nossos institutos de tecnologia. apoio de extensão tecnológica à exportação, é o Projex. Há que mencionar um dilema que não é apenas do As instituições de fomento à pesquisa estão cada vez mais abrindo programas de cooperação com empresas. IPT, mas de todos os institutos que trabalham abaixo de Esse caminho está certo e tudo que se fizer nessa parte seu ponto de equilíbrio. De um modo geral, as agências ainda será pouco. A ciência tem sido mais fomentada do de fomento não remuneram a aplicação de mão-de-obra que a tecnologia com recursos púprópria da instituição nos projetas propostos. Cobrem apenas blicos. O que distingue o esforço materiais, equipamentos e mãocientífico do esforço de desenvolde-obra contratados com terceivimento tecnológico é a política ''os últimos industrial. Atrás do desenvolviros. No caso do IPT, temos difiinvestimentos mento científico vem o conheciculdade de usar esses fundos de mento, atrás do conhecimento agências na proporção adequada significativos tecnológico vem o emprego. para o programa de metrologia. feitos pelo O IPT tem grande potencialiSe forem usados os próprios pesdade de crescimento e pode fazêquisadores do IPT no trabalho, ele IPT ocorreram lo rapidamente. Sua vocação é será obrigado a pleitear maior multidisciplinar. Os seus 70 labosubsídio do Tesouro do Estado pana década de 70'' ratórios abrangem praticamente ra compensar a receita cessante, todos os campos da tecnologia para o que não há lógica. Outra questão relevante é a práindustrial e podem trabalhar em conjunto, o que praticamente coloca o IPT numa situatica do fomento de não financiar a pessoa jurídica. As agências organizaram-se para financiar o pesquisador. Isso poção ímpar no contexto. Mas o IPT precisa modernizar-se. de ser adequado para a pesquisa científica, mas nem sempre Os últimos investimentos significativos que fez ocorreram na década de 70. é para a pesquisa tecnológica. Esse assunto precisa ser reDe lá para cá, o país abandonou a sua política indussolvido até para o benefício das próprias agências de fotrial autárquica, a economia modernizou-se e o mundo mento, que estão sujeitas a críticas, ao privatizarem recursos públicos à margem das práticas da legislação em vigor. se globalizou. Particularmente, hoje é importante a ação na tecnologia metrológica, fundamental para a competiO IPT vai crescer para atender às demandas da moção industrial, tanto no mercado interno como externo. derna tecnologia. Neste ano, pretende aumentar em 50% o seu ritmo de investimentos e crescer 15%. Mas a situaDificilmente duplicaremos as exportações brasileiras sem ção financeira do Instituto não é boa. Ele acumula díviuma base metrológica moderna. Igualmente o comércio eletrônico, business to business, somente será possível com das no mercado, vencidas e não pagas. Necessita rapidametrologia garantida nos produtos comercializados. mente de um aporte extraordinário para poder continuar A atualização dos laboratórios de metrologia do IPT é atuar normalmente. É certo que o desenvolvimento do orçada em aproximadamente US$ 12 milhões. A metroIPT não deverá estrategicamente basear-se em recursos logia é essencial para embasar a exportação e conter a imextras. Eles são, no entanto, agora necessários na situação portação de produtos de baixa qualidade. É ainda funde curto prazo, mas, superado esse problema, o IPT tradamental para agilizar a elaboração de normas, feitas balhará no seu ponto de equilíbrio, o que não consegue profissionalmente e não de forma amadora, como ocorre fazer hoje. A partir daí, poderá crescer em condição sauno Brasil, assim como para construir barreiras técnicas e dável e permanente. regulamentos que respondam às necessidades de controles Na base desse crescimento, é imprescindível a presenquanto aos aspectos de saúde, segurança e meio ambiença permanente de recursos do Tesouro, como hoje, numa te. O Brasil não pode escancarar as porteiras à importaproporção de 50% do orçamento total. Para cada real que ção sem se proteger, como fazem os países adiantados, o IPT crescer com recursos auferidos de sua atuação no contra produtos que não lhe interessam. mercado, o Estado deverá crescer numa participação Além de propugnar pela agilização da normalização igual. Esta é uma proposta aceitável para a sociedade, e com base em modernização metrológica, o IPT, incorposua execução dará a ela um IPT tão atuante como no seu primeiro século de vida. rando uma opção consciente por uma política industrial PESQUISA FAPESP

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Novas responsabilidades . se sotnatn a' pesquisa iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii;;;;;:::::;;;;;;:==::; z Os institutos de pesquisas ligados à engenheiro agrônomo ~ agricultura em seu sentido amplo foram Eduardo Antonio Bulisani, fundados no Estado de São Paulo para re6 diretor-geral do Instituto " solver problemas da comunidade por meio Agronômico de Campinas (IAC), de experimentação e pesquisa, essencialformou-se pela Escola Superior mente, e também para se conseguir apropriação de conhecimento e prestar serviços de Agricultura Luiz de Queiroz tecnológicos. A impressão é a de que os ca(Esalq) da Universidade sos paulistas foram extremamente bem-sude São Paulo. Em 1979, obteve cedidos. Em poucos lugares do mundo foi o mestrado, pela Universidade possível alcançar tanto sucesso com relação do Estado de Washington, aos recursos investidos. Os cálculos de taxa de retorno desses investimentos são todos nos Estados Unidos, e em 1994 altamente expressivos e ainda mais quano doutorado, pela Esalq. do se consideram produtos individuais, coDesde 1969, Bulisani é pesquisador mo café, cana-de-açúcar, algodão e citros. do Instituto Agronômico, É sempre bom lembrar casos que reletrabalhando especialmente no setor Eduardo Antonio Bulisani vam a importância da pesquisa agrícola. Um dos mais citados é o do algodão. de Leguminosas. De 1981 a 1992, Quando, em 1929, houve uma crise de excesso de produfoi chefe da seção técnica e, ção de café, o algodão já existia como uma alternativa tecde 1992 a 1998, diretor de divisão. nológica pronta para ser adotada. Isso contribuiu para Tem cerca de 30 artigos científicos que o Estado de São Paulo e o país sofressem menores publicados, especialmente sobre feijão, soja perdas do que ocorreria normalmente. Há exemplos mais recentes. A importância da existêne adubação verde. Ganhou duas vezes cia de uma tecnologia brasileira foi realçada por um fato, o prêmio de Honra ao Mérito do governo também ligado ao algodão, que ocorreu na safra de 1998 de Estado de São Paulo, pelo desenvolvimento e 1999 no Esrado de Goiás. Os produtores, trabalhando de novos cultivares de soja e feijão. com material importado, tiveram um prejuízo de aproxiO Instituto Agronômico já completou madamente R$ 55 milhões, devido ao intenso ataque de uma doença pouco importante para os cultivares de algoseu primeiro século. Foi fundado em 1887 dão desenvolvidos no Brasil. Ou seja, devido ao açodapelo imperador dom Pedro 11, com o nome mento da iniciativa privada em importar materiais novos de Estação Agronômica de Campinas, e plantá-los em larga escala, sem verificar se estavam pere passou para o governo do Estado feitamente adaptados ao meio, o potencial dos prejuízos de São Paulo em 1892. Nos últimos 50 anos, causados por um agente, responsável por uma moléstia, elevou-se a tal ponto que nem os cultivares aqui desenvollançou mais de 300 novos cultivares vidos, tidos como tolerantes, suportaram o ataque. Centede diversas plantas. Atualmente, nas de outros exemplos mostram como os institutos da seus pesquisadores trabalham em cerca área agrícola trabalhavam e trabalham com questões de de 140 projetas, usando 6 mil hectares alta relevância para a socioeconomia do país. distribuídos por 20 estações experimentais Os institutos paulistas ligados à agricultura, com o passar do tempo, passaram por um processo de especiaespalhadas pelo estado.

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lização. Os diversos institutos criaram escolas e, principalmente, uma competência para resolver problemas, especialmente quando atuam de maneira multidisciplinar e articulada. Sua capacidade instalada sempre pronta a se organizar e reorganizar permitiu que em pouco tempo 22

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PENSANDO SÃO PAULO: UNIVERSIDADES E INSTITUTOS

fossem resolvidas dificuldades como a ocorrida em Goiás, chamar de "agro-silvo-pastoril e pesca" é o de que eles asa do nematóide de cisto da soja, a da nova mosca branca sumiram, de maneira clara e precípua, a tarefa da difusão e transferência de conhecimento. Os institutos não poe dezenas de outras. dem prescindir dessa atividade. Mas essa responsabilidaNessa trajetória, os institutos se especializam cada vez de ajudou a quebrar um tripé que existia há algum temmais. Vão sendo formados especialistas focados no conhecimento dos produtos e relativamente poucos voltapo, no qual os componentes do ensino, da pesquisa e da dos para os sistemas produtivos como um todo. Mas, de extensão rural apareciam separados. Agora, os institutos são cobrados permanentemente pela difusão e transferênqualquer maneira, eles têm uma participação importancia de tecnologia, de uma maneira até um tanto contundente na definição de uma tecnologia agrícola tropical. Trate, pois há uma certa confusão entre difundir e transferir ta-se de uma tecnologia que não pode ser importada. Ela precisa ser brasileira. E hoje, sem dúvida, o Brasil é detencom treinar. Treinar um determinado número de produtor do maior e mais abrangente cotores ou industriais é até relativanhecimento desse setor no mundo. mente fácil. Coloca-se o pessoal num auditório e passam-se as exMas estão ocorrendo aconteciplicações. Porém, treinar todos os mentos importantes. ExaminanEstado produtores do estado, ou mesmo do-se o quadro de pessoal, de fins não tem ainda de 1992 até hoje, verifica-se que o segmentos de cadeias produtivas em IAC conseguiu manter, aproxisua totalidade, é muito mais commecanismos madamente, o mesmo número de plicado, especialmente com as eseficazes para pesquisadores. Entretanto, vem truturas e pessoal hoje existentes. Houve, assim, uma mudança ocorrendo uma perda sensível de a proteção pessoal de apoio. Nessa área, a de trajetória com relação à pesquiredução atingiu praticamente a sa agropecuária, à produção de do conhecimento'' metade do quadro de pessoal do bens e à prestação de serviços feiInstituto. Trata-se de uma grantas pelos institutos da área agrícola. Existem hoje, como diretrizes de dificuldade, que deve ser mais básicas em função da realidade socioeconômica do país, bem avaliada. Quando se examina a produção científica e tecnológida globalização e da modernização dos produtos e proca dos institutos, somada à sua prestação de serviços, cessos, quatro pontos que devem ser incorporados na concepção de sua atuação como básicos à sua inserção nota-se uma diferença em relação a um passado não distante. O que aconteceu, e está acontecendo cada vez com nas políticas públicas e na comunidade. Esses pontos são a geração de renda, a geração de trabalho, a inclusão somaior intensidade, não é um desvio de função ou missão. cial e a qualidade certificada dos produtos. Os institutos, Mas eles estão assumindo cada vez mais o papel de difuhoje, têm dificuldade para articular sua programação sores de tecnologias e principalmente, em conjunto com as universidades, um papel de apoio ou de complemencientífica dentro dessas diretrizes básicas. Os próximos taridade nos cursos de pós-graduação. Esse é um fato obpassos para que eles consigam continuar a trabalhar bem, servado praticamente em todos os países onde se desenprestar serviços à comunidade e avançar no conhecimenvolvem pesquisa e ensino públicos. to devem estar ligados à criação de mecanismos de aproO processo, incipiente até 1970, foi evoluindo em funpriação do conhecimento gerado. Existe porém, nesse campo, a questão do tratamento ção da capacidade instalada e da competência do pessoal desse conhecimento e da maneira como os institutos poformado em pós-graduação nos institutos. Hoje, é fato dem apropriar-se desse conhecimento em seu benefício corriqueiro, na análise de currículos de pesquisadores, próprio, auferindo recursos dele. Hoje, esse conhecimenencontrarmos também a qualificação de docente. Isso pode explicar em parte por que não ocorre uma to é público e o que é público não protege o seu conheciqueda na produção científica dos institutos. Muito pelo mento. O Estado não tem ainda mecanismos eficazes para sua proteção, ou mesmo para cobrar royalties ou contrário, observa-se em determinadas áreas até um acréscimo acentuado. Isso ocorre porque a participação dos usar processos de outra natureza para que esses recursos bolsistas está aumentando. O Instituto Agronômico abriga, voltem para as instituições geradoras. Além disso, será necessário criar novos mecanismos hoje, um grande número de bolsistas, estagiários de universidades e empresas ou recém-formados. Com 212 pesda gestão da pesquisa propriamente dita, principalmente quisadores científicos, atende até 300 bolsistas por ano, da gestão das instituições, do ponto de vista financeiro, não propriamente trabalhando, mas estudando no IAC. administrativo e patrimonial, a partir do imenso patriOutro fator que levou a mudanças de imagem e ativimônio e da capacidade instalada para se executar ciência dade dos institutos de pesquisa na área que podemos e tecnologia no estado.

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Medidas para tnotivar e tnanter os funcionários

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~ A conjuntura mundial vive, hoje, um presidente da Associação ~ processo de implosão dos Estados naciodos Pesquisadores Científicos 6 nais. Tudo o que ocorre hoje em termos do Estado de São Paulo, i' de debilitamento de empresas públicas, Nélson Raimundo Braga, de institutos de pesquisa e de universidaé engenheiro agrônomo formado des vem de uma compressão orçamentária com relação aos gastos sociais, resulpela Universidade Federal Rural tante desse processo. O prioritário para o do Rio de Janeiro (UFRJ) Estado, hoje, é pagar dívidas. Como se e trabalha como pesquisador fosse uma homenagem aos 500 anos do do Instituto Agronômico descobrimento, a dívida pública brasileide Campinas (IAC). Obteve ra, interna ou externa, atingiu cerca de US$ 500 bilhões. Esse é o fato maior da o mestrado no departamento conjuntura em que vive o Brasil e o munde Fitotecnia da Universidade do. Sem olhar isso, não é possível falar de Federal do Rio Grande do Sul instituições de pesquisa ou de coisa algu(UFRGS), com um trabalho ma. A situação das instituições de pesquide comparação de dez cultivares Nélson Raimundo Braga sa reflete o que ocorre com o país. Quanto à dimensão do setor de ciênde soja num ambiente de alto cia e tecnologia, é dispensável e redundante falar da imrendimento. O doutorado foi portância de instituições como os 17 institutos de pesquiconseguido no departamento de Fitotecnia sa paulistas, da Embrapa e das universidades públicas, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), estaduais e federais, em termos de geração de conheciem Minas Gerais. A tese examinou mento básico e de sua tradução em tecnologias capazes de responder a questões concretas apontadas pela socieas possibilidades do cultivo do grão-de-bico dade. As tecnologias de que o mundo tropical precisa não · na área de Viçosa. chegam pela Internet nem por satélite. Por isso, é fundaNo IAC, onde está desde 1975, Braga mental que o 13rasil revigore os institutos de pesquisa e as trabalha no Centro de Plantas Graníferas universidades do sistema público. e é autor de diversos trabalhos sobre As dificuldades em São Paulo não começaram hoje. Uma pesquisa feita em 1984 pelo Conselho Estadual de a adaptação do cultivo de grão-de-bico Ciência e Tecnologia indicava já um quadro de crise, de ao Estado de São Paulo e sobre retração orçamentária, de evasão de pessoal, de descontio melhoramento da soja. Participou nuidade de medidas governamentais que sustentassem os do lançamento de diversos novos cultivares institutos de pesquisa. É preciso, porém, conhecer os motide soja. Nos últimos anos, vem pesquisando vos da crise que atinge instituições de pesquisa da dimensão do Instituto Agronômico de Campinas. Em 1975, o IAC também a adubação verde, uma técnica dispunha de 3.200 servidores. Hoje, tem menos de 1.500. com a qual é possível melhorar o solo Se for feito o mapeamento desse pessoal, será possível e a produtividade das plantas com pouco observar que os pólos de criação de tecnologia no Instiou nenhum uso de adubos químicos. tuto Agronômico foram os mais debilitados. Um dos laEste é o seu terceiro ano, num segundo boratórios do Instituto, que participou do Projeto Genoma, merecedor de uma homenagem expressiva do mandato, na presidência da Associação governo do Estado, não dispunha de nenhum servidor de dos Pesquisadores.

apoio permanente. Realizou a sua missão com competência, mas recrutando pessoas na forma de bolsas e outras formas de emprego não-estáveis. A situação dos institutos de pesquisa está chegando ao limiar do escândalo.

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PE NS AN DO S ÃO PA U LO: UN I V ERSIDADE S E I NS TIT U T OS

Eles hoje recrutam pessoal para trabalhar inclusive sem nha condições de custear nossas atividades, como parte respeitar a legislação trabalhista. do trabalho. Assim, perderemos nossa autonomia e a isenNo caso do Instituto Agronômico, em particular, seus ção imprescindíveis a quem cumpre uma função pública pesquisadores tiveram este ano uma surpresa desagradáde interesse social. vel. Em janeiro, foram informados de que, diante da falta Não é digno que isso aconteça, não é justo. Ou se tode recursos, teriam de pagar parte do custo da publicação mam medidas urgentes de recuperação e de restauração de seus trabalhos. Ou seja, o autor de uma pesquisa tem dos institutos de pesquisa, ou eles passarão a representar de tirar do seu bolso, do seu salário, os recursos para coo papel de tradutores de tecnologias importadas, difusobrir os custos de um periódico da instituição. O estado res de tecnologia feita por outros e com interesse diferende penúria dos pesquisadores seria ainda pior se, no ano te do brasileiro. O país precisa buscar um caminho própassado, o governador Mário Covas, após quatro ou cinco prio, independente, autônomo e soberano, embora anos de luta de parte da Associação evidentemente com uma visão dos Pesquisadores e de setores soglobal e universal. É preciso inseciais solidários, não tivesse consarir-se nesse mundo, dito globaligrado a equiparação que os peszado, mas com soberania, com país precisa quisadores tinham por lei com os independência e com a cara de buscar um salários dos docentes das universiBrasil. É a isso que os institutos de dades estaduais. pesquisa se prestam. É para isso caminho próprio, Sem dúvida, foi um ato de que foram edificados. independente, grandeza do governador. Mas, A médio e longo prazo, o cacom relação ao pessoal de apoio, minho definitivo para recuperar autônomo nada, porém, foi concretizado. A uma política de pessoal que fixe, associação encaminhou ao govermotive e dê estabilidade aos instie soberano'' nador um anteprojeto que sinalitutos é proteger a carreira de peszava uma nova concepção de carsoal de apoio. Em caráter emerreira. Até o valor correspondente gencial, porém, é básico estender o do orçamento era secundário naquele instante. O objetidiferencial salarial concedido ao pessoal de apoio à saúde a todos os outros servidores, de maneira universal e não vo da associação era mostrar ser possível uma gestão moexcludente. Se o Brasil não tiver a Embrapa, empresas esderna nos institutos, para que eles possam recrutar, fixar, motivar e dar estabilidade ao seu pessoal permanente. taduais e universidades fortalecidas, não terá como reagir Parece, porém, que dentro de todos os governos, inpara desenvolver-se com soberania e justiça social. Abriclusive do atual governo estadual de São Paulo, existe um gará uma população de consumidores e produtores reentulho burocrático, formado por pessoas que aprendeféns de poucas transnacionais, que imporão aos brasileiram profissionalmente a técnica de dizer não. Sempre ros o que e cÓmo eles vão produzir e consumir. que se encaminha ao governo alguma coisa que tenha Os institutos de pesquisa vivem hoje um momento mérito social, essas pessoas têm o capricho de justificar o dramático. A associação tem sugerido que o Poder Execunão, de explicar o não. tivo e a Assembléia Legislativa realizem visitas e audiênDe qualquer maneira, vive-se hoje um processo de cias públicas nos próprios institutos. A posição dos pessensibilização do governo, da Assembléia Legislativa, de toquisadores científicos é de transparência, é de respeito à dos os deputados, de todos os partidos. Esse movimento verdade dos fatos. Não há nada a esconder. É preciso evinão tem caráter partidário, é um movimento em defesa do denciar méritos e carências de cada instituição. Brasil, de São Paulo e das suas instituições. Quem estiver O governador teria uma caminhada muito positiva se ao lado dessas instituições, integra o movimento. Deveele fosse aos institutos. Apesar das crises, ele encontraria mos buscar o caminho definitivo para conquistar uma poo Instituto Agronômico, por exemplo, produzindo novas lítica de recursos humanos que dê estabilidade aos instivariedades de manga, de café, de soja, amendoim, trigo, tutos a médio e longo prazo. Para isso, é fundamental tomar feijão, participando do Projeto Genoma, com espírito criamedidas que protejam os servidores de apoio à pesquisa. tivo e produtivo e tentando romper as dificuldades. DeO objetivo é evitar um mal maior, o colapso de instipois destas audiências, governador e deputados poderiam tuições que vão perder a sua característica de instituições assumir suas decisões com mais convicção. O que os pespúblicas para se transformarem talvez, na melhor das hiquisadores representados pela associação pedem neste momento é a ajuda do Poder Legislativo e do Executivo póteses, em prestadoras de serviços a terceiros. Daqui a para retirar os institutos do isolamento e da marginalidaalguns anos, nós, que pesquisamos soja, talvez sejamos compelidos a sair fazendo palestras ou outras atividades, de e para que suas realidades, finalmente, sejam conhecisob o patrocínio da Monsanto ou de quem quer que tedas e modificadas.

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Para crescer, a agricultura precisa ser cotnpetitiva o defender a adoção de novos parâmetros para avaliar os resultados da pesquisa agropecuária no Brasil, o ~ngenheiro agrônomo Alberto Duque Portugal pisa em terreno conhecido. Ele concentrou seus estudos e pesquisas nas áreas de gestão de pesquisa, socioeconomia, economia agrícola e desenvolvimento rural. Desde maio de 1995, ele é presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada ao Ministério da Agricultura Alberto e Abastecimento, responsável, em boa parte, pela posição de destaque do país com relação à agricultura em áreas tropicais e subtropicais. Sua experiência inclui um período, entre setembro de 1993 e março de 1994, no qual foi secretário-executivo e ministro interino, no Ministério da Agricultura. Portugal formou-se engenheiro agrônomo pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1968, e obteve o doutorado em sistemas agrícolas pela Universidade de Reading, na Inglaterra, em 1982. Trabalhou como engenheiro agrônomo e agente de extensão rural em Minas Gerais e Goiás. Foi chefe do Departamento de Zootecnia e diretor de Operações Técnicas da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). Antes de ir para Brasília, chefiou o Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Leite (CNPGL) da Embrapa, em Coronel Pacheco (MG). No setor privado, foi produtor rural e serviu como presidente da Associação de Produtores Rurais do Vale do Rio Preto (MG).

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O americano Jeffrey Sachs afirmou

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de gerar e absorver tecnologia. Informa-

~_ recentemente que o mundo não está divi~ dido pela ideologia, mas pela capacidade g ~ ções da Unesco e do Banco Mundial in-

dicam, realmente, que há uma forte correlação entre indicadores de renda e intensidade de ciência e tecnologia entre países. Relacionando-se a renda per capita PPA (Paridade de Poder Aquisitivo) com o número de pesquisadores científicos por milhão de habitantes, constatase que as regiões mais desenvolvidas do mundo, as que têm renda per capita acima de US$ 20 mil ao ano, têm acima de 3 mil pesquisadores por milhão de habitantes. Blocos de países em desenvolviDuque Portugal mento, como a América Latina, possuem uma renda per capita PPA entre US$ 5 mil e US$ 10 mil, e sua relação é de menos de 500 pesquisadores por milhão de habitantes. A mesma relação é observada quando se compara a renda per capita PPA com a porcentagem de investimentos em ciência e tecnologia ( C&T) com relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Tomando apenas o produto agrícola bruto, os países desenvolvidos investiram, em média, 2,3% no ano de 1997. Alguns se aplicaram mais do que i~so. Os Estados Unidos investiram 3,4%, o Reino Unido, 3,7% e o Canadá, 5,3%. Os países desenvolvidos investem mais de 2% de seu PIB em C&T, enquanto, para as nações em desenvolvimento, o valor médio é de 0,5%. Estima-se que a África invista apenas ao redor de 0,3% de seu PIB em C&T. Um fator importante é que essa diferença está aumentando. Entre 1971 e 1992, houve um crescimento de 68,7% nos investimentos em ciência e tecnologia dos países mais ricos. Nos menos desenvolvidos, o aumento foi de 27%. O Brasil melhorou bastante, nos últimos anos. Estima-se que esteja investindo ao redor de 1,0% de seu PIB em atividades de C&T, computando-se os setores público e privado. Este valor está muito acima da média dos países em desenvolvimento, de 0,5%, graças a esforços do governo federal e de vários estados, inclusive São Paulo. Mas, embora os investimentos estejam aumentando, ainda estão aquém das potencialidades e necessidades para que o Brasil entre num ritmo de desenvolvimento mais rápido. PESQUISA FAPESP


PENSANDO SÃO PAULO: UNIVERSIDADES E INSTITUTOS

Que fatores levam a essa diferença entre países ricos sível de agentes econômicos, especialmente pequenos e países pobres? Primeiro, os países ricos dão maior improdutores rurais. Esses desafios só poderão ser venciportância à C&T do que os países pobres. Portanto, indos se a estrutura produtiva brasileira tiver o suporte de vestem mais em C&T. Outro fator é a participação do uma forte estrutura de ciência e tecnologia. Estado. Nenhum país é capaz de criar um sistema forte Há áreas de C&T que farão a diferença, com impacde ciência e tecnologia, capaz de proporcionar desentos muito fortes sobre a agricultura no século que se inivolvimento, sem a ativa participação do Estado. Além cia. Entre elas há áreas inovadoras como a biotecnodisso, em todos os países mais ricos há uma crescente logia, incluindo a engenharia genética. Elas estão presença do setor privado, complementando ou somanmudando as vantagens competitivas entre regiões e paído esforços com o poder público. É um diferencial que ses. Elas tornam possível, por exemplo, desenhar um não se observa nos países em desenvolvimento. produto de acordo com os desejos do mercado. Podem Existe ainda um fator extretambém levar a métodos de promamente importante, que é a dução mais baratos e com o meexistência de um arcabouço legal nor uso de defensivos. adequado, capaz de proteger a Outra área inovadora é a agriagronegócio propriedade intelectual. O Brasil cultura de precisão. Constitui-se pOSSUI Um começou agora, na década de 90, em um sistema integrado de ina montar um arcabouço legal formações e tecnologias, baseado grande desse tipo, com agilidade e flexino conceito de que as variabilidapotencial bilidade, capaz de dar condições des espacial e temporal influenpara que a ciência e a tecnologia ciam os rendimentos de cultivos de crescimento avancem rapidamente e de estie a sua sustentabilidade. Seu uso mular a participação do setor permite a redução do risco econo Brasil'' privado em parceria com o setor nômico, ao diminuir custos de público. produção. Permite também reduHá vários motivos para que o zir o risco de contaminação, do Brasil e, em particular, o Estado de São Paulo contisolo e da água, já que os insumos são aplicados localizanuem a investir em pesquisa agropecuária. Embora tedamente, em quantidades variáveis e em tempos especínha decrescido a participação da agricultura na renda ficos, de conformidade com mapeamentos obtidos annacional, o que é normal num processo de desenvolviteriormente. mento, a contribuição do agronegócio, como um todo, Outras tecnologias são aquelas que agregam valor ao representa ao redor de 25% do PIB nacional. Além de produto agropecuário, ou atuam sobre o processamenser, isoladamente, o setor mais importante da econoto ou a diversificação de seu uso. Há ainda as tecnolomia, possui um grande potencial de crescimento, pela gias que torn(lm mais ágil o acesso e a disseminação de abundância de seus recursos naturais, como terras nos informações. Se o Brasil não conseguir dominar bem escerrados, e pela disponibilidade de tecnologia e capacisas tecnologias, dificilmente será capaz de vencer os seus dade empresarial. desafios e manter-se no mercado. Todas essas tecnoloNum mundo em rápido processo de globalização, gias terão um impacto muito grande no século 21. com crescente abertura comercial, a agricultura para A superação dos desafios e o domínio dessas tecnocrescer deve ser competitiva, em termos de qualidade logias são importantes não somente para a agricultura dos produtos, preços e continuidade de oferta. Ao mesbrasileira. Eles têm outros efeitos positivos. O Brasil tem mo tempo, precisa estar constantemente preocupada uma posição geográfica similar à de países menos desencom a sustentabilidade, especialmente do ponto de visvolvidos no mundo tropical: África, Ásia e América Lata ambiental. O Brasil precisa ser competitivo, mas sem tina. País tropical e subtropical, é detentor de um forte perder de vista essa questão. A questão ambiental já esestoque de conhecimento de tecnologia para o agronetá colocada de maneira decisiva e definitiva em toda gócio nessas áreas. O estoque de tecnologia tropical e a sociedade. Há ainda a questão da qualidade da nutrisubtropical desenvolvido pelo Brasil pode ser um exceção. Serão cada vez mais valorizados os vínculos exislente instrumento de cooperação técnica com países da tentes entre agricultura, alimento, nutrição e saúde. EsÁfrica, Ásia e da própria América Latina e do Caribe, tes são três desafios comuns à agricultura de qualquer com a conseqüente integração comercial e política, copaís do mundo. locando o Brasil em posição privilegiada. O Brasil tem, ainda, outro desafio: a eqüidade social. A Embrapa está inserida em todo esse contexto. A Precisa incorporar ao processo produtivo de mercado, sua missão é viabilizar soluções para o desenvolvimenao processo de desenvolvimento, o maior número posto sustentável do agronegócio brasileiro por meio da

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PENSAN D O SÃO PAU LO: UN I VERS ID ADES E I NS TI TU T OS

buscar a eficiência e a racionalização no uso de recursos geração, adaptação de transferência e conhecimentos e tecnologias em benefício da sociedade. O papel da Eme ter foco nas necessidades dos mais diversos segmentos brapa hoje não é simplesmente fazer pesquisa, mas da sociedade. Devem ser modelos com processos azeitaviabilizar soluções por meio da pesquisa, com a preodos, embasados em avaliações por resultado. cupação de olhar a do agronegócio com uma visão que Outro aparte é o necessário engajamento do setor vai desde a do pequeno produtor até à do grande emprivado. Esse setor participa ativamente no desenvolvipresário. mento da ciência e tecnologia em países desenvolvidos. A Embrapa entende como agronegócio não só a A equação do desenvolvimento brasileiro, em todas as grande empresa, mas todo um conjunto, composto pelo áreas, mas especialmente no agronegócio, não poderá que está dentro da fazenda, antes da fazenda e depois da ser adequadamente resolvida somente com os recursos do Estado. O setor privado terá de participar decisivafazenda, incluindo aí o pequeno produtor. Sua política de administração está baseada mente desse esforço. numa filosofia de relacionamento Finalmente, investimentos em com a sociedade e com o mercaciência e tecnologia agropecuária do, entendido num sentido ampelo Estado de São Paulo mantepequeno plo, não se limitando ao que se rão a sua liderança, em relação ao tem de receber refere a transações financeiras, e resto do Brasil, que resultará em com três políticas setoriais bem futuros bons negócios para o esa tecnologia, definidas, uma de pesquisa e detado. A Embrapa tem hoje em po1s nao senvolvimento, outra de negócios São Paulo cerca de 40 projetas de tecnológicos e uma terceira de copesquisa em andamento, envoltem condições municação empresarial. vendo 13 instituições em JaguaEssas políticas partem da preriúna, Campinas e São Carlos. A de comprá-la'' missa de que a Embrapa está num Embrapa tem procurado fazer negócio, como outro qualquer. um grande esforço. Acho que Mas está entendido que a Embratoda a estrutura de ciência e tecpa não vai vender tecnologia para o pequeno produtor. nologia tem que fazer seu dever de casa nesse sentido. Ele tem de receber essa tecnologia, pois não tem condições de comprá-la. Então, é óbvio que órgãos de desenvolvimento, ministérios, secretarias estaduais, cooperaFORU M S Ã O PAULO SÉCU LO 2 1 tivas, associações, têm de tornar viável essa tecnologia. PRESIDENTE: DEPUTADO VANDERLEI MACR IS Mas como podem o Estado de São Paulo e o Brasil RELATOR-GERAL: DEPUTADO ARNALDO JARDIM aumentar suas capacidades de gerar ciência e tecnologia agropecuárias? Há quatro questões fundamentais a conGRU PO T E M Á TIÇO NÚ M E RO 13 CL~NC JA, T E C NOLO G IA E C OMUNIC A ÇOES siderar. A primeira é a valorização institucional. É de fundamental importância que a população brasileira enCOORDENADOR: DE PUTADO CARLOS ZARATTINI care a questão da ciência e tecnologia como um seta r esRELATOR: DEPUTADO EDMUR MESQUITA CONSELHO TEMATICO: tratégico, tão importante para o seu futuro como a eduJosB ANIBA L PERES DE P ONTES cação, a segurança e o transporte. F LAV IO GRYNSZPAN Outro ponto é o arcabouço legal. Felizmente, nos OZIRES S ILVA últimos anos, o Brasil aprovou uma legislação sobre ALDO M ALAVAS I propriedade intelectual, o que aumentou a possibilidaH ERNAN CHA IMOVICH ANTON IO M ANOEL DOS SANTOS S ILVA de de o setor privado investir também na área. Mas, CARLOS V OGT ainda, é preciso buscar, dentro do arcabouço legal braCRODOWALDO PAVAN sileiro, um nicho que dê à ciência e tecnologia um amJOAO PISYSIEZNIG F ILHO biente propício para o desenvolvimento institucional. NELY BACELAR A pesquisa precisa de continuidade, estabilidade, agili0 TAVIANO H ELENE dade e flexibilidade, características essenciais a instiNBLSON RAIMU DO B RAGA EDUARDO ANTON IO B ULISAN I tuições que queiram acompanhar o avanço científico FERNANDO L EÇA mundial. CARLOS H ENRIQUE DE BRITO CRUZ Também é fundamental desenvolver e exercitar moCLAUD IO RODRIGUES delos de gestão capazes de atender às expectativas da soH BLIO WALDMAN ciedade e do próprio governo, que é quem banca os reMARCOS ANTON IO MONTE IRO M ONICA TEIXEIRA cursos das instituições públicas. Esses modelos devem

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