Prêmio FCW 2013

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Especial

prêmio

fcw

Fundação Conrado Wessel

Os vencedores do Prêmio Conrado Wessel de Arte, Ciência e Cultura 2013


DIRETORIA EXECUTIVA diretor-presidente

Dr. Américo Fialdini Júnior diretor vice-presidente

Dr. Sérgio Roberto de Figueiredo Santos e Marchese superintendente

José M. Caricati coordenador científico

Dr. Erney Plessmann de Camargo coordenador cultural

Dr. Carlos Vogt supervisor administrativo

José Álvaro Fioravanti assistente de diretoria

Sérgio Kosuge

CONSELHO CURADOR presidente

Dr. Jorge Márcio Arantes Cardoso membros

Dr. Antonio Augusto Orcesi da Costa Dr. Erli dos Reis Rodrigues Cel.PM Kleber Danúbio Alencar Júnior Dr. Nelson Miyoshi Tanaka Dr. Reinaldo Antonio Nahas Prof. Stefan Graf von Galen equipe administrativa

Brenda Krishina Érika de Souza Takaki Márcia Lopes Maria Francinete de Sousa Samuel Veríssimo Tania de Oliveira Vanessa Tiemi Kasaya Vanderlei Souza de Lima coordenacão desta edição

José M. Caricati

FUNDAÇÃO CONRADO WESSEL Rua Pará, 50 - 15º andar Higienópolis - CEP 01243-020 São Paulo - SP - Brasil tel./fax +55 11 3237-2590 / 3237-4770 www.fcw.org.br


Índice

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Estudos na Escola Politécnica forneceram a base técnica para Conrado Wessel criar fábrica de papel fotográfico

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Premiação da FCW reúne personalidades marcantes da pesquisa e cultura

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O trabalho de Niède Guidon em prol dos sítios arqueológicos do Parque Nacional Serra da Capivara colocou o Piauí em um lugar de destaque na pré-história das Américas

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Conheça os três ensaios fotográficos vencedores em Arte de 2013

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Luiz Hildebrando Pereira da Silva fez carreira no Instituto Pasteur e hoje é um dos responsáveis pela diminuição dos casos de malária em Rondônia

Quem são os parceiros da Fundação Conrado Wessel

20

Saiba quem escolheu os ganhadores desta edição

José Rodrigues Coura estuda – e combate – o mal de Chagas enquanto se dedica a espalhar especialistas em infectologia e parasitologia por todo o país

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Cronograma da premiação 2014

especial prêmio conrado wessel  |  pesquisa fapesp

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Conhecimento indispensável

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especial prêmio conrado wessel  |  pesquisa fapesp

U

baldo Augusto Conrado Wessel, instituidor da Fundação Conrado Wessel (FCW), fez nos seus últimos anos de vida uma anotação em que louvava os professores da Escola Politécnica de São Paulo, incorporada à Universidade de São Paulo (USP) em 1934. “Os conhecimentos que adquiri quando estudei em Viena, a fotoquímica e a fabricação de clichês estavam longe de poder me aventurar a uma empresa de tal porte, ou seja, a fábrica de papéis fotográficos”, escreveu. “Para me aperfeiçoar em química, meu pai conseguiu que eu frequentasse, como ouvinte, as aulas de química na Escola Politécnica. Lá, eu aprendi muita coisa; os professores eram muito gentis e dedicados. Devo aqui externar o meu sincero agradecimento aos drs. Höttinger, Lindenberg, Wanderley e Magalhães. A eles devo o que aprendi.” O reconhecimento da competência e o elogio aos professores ganham especial relevo este ano, quando a USP completa 80 anos. Wessel (1891-1993) frequentou a Poli como aluno e auxiliar de laboratório do professor Roberto Höttinger, entre 1915 e 1919. Antes ele havia estudado no Instituto K. K. Lehr und Versuchs Antstalt, de Viena, na Áustria, de 1911 a 1913, à época, a melhor escola do mundo para aprender sobre fotografia, clicheria e inovações tecnológicas trazidas pela descoberta dos raios X e da fotoquímica. Wessel foi aluno de José Maria Eder, inventor, professor de fotoquímica e fotometria, um dos primeiros a desenvolver a foto-

Acervo FCW

Estudos na Escola Politécnica forneceram a base técnica para Conrado Wessel criar fábrica de papel fotográfico


Wessel no Jardim da Luz, fotografado por lambe-lambe no inĂ­cio dos anos 1920: contatos de venda eram feitos pelo inventor

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grafia de raios X e também um dos pioneiros a usar a técnica em zoologia, arqueologia e na medicina forense. Sua influência sobre o aluno sul-americano foi grande e reconhecida – era comum o professor escolhê-lo para ajudar em trabalhos no seu laboratório. As experiências de Eder influenciaram o estudante a buscar uma nova fórmula capaz de reproduzir as fotos em papel, vidro, plástico ou outros materiais sensíveis à luz. Embora excelentes, os estudos realizados na Áustria não bastavam para o que Wessel almejava. Foi o conhecimento adquirido em São Paulo com Höttinger, na Poli, que consolidou suas pesquisas. O jovem inventor conseguiu dois feitos depois de terminados todos os cursos: a patente de um novo papel fotográfico, em 26 de outubro de 1921, e a instalação de sua primeira fábrica. Nada foi fácil. Wessel enfrentou grandes dificuldades

F

oi no Jardim da Luz que o inventor fazia contatos de venda direta para os fotógrafos lambe-lambes. Os esforços frutificaram. Quando eclodiu a Revolução de 1924 houve escassez de produtos em São Paulo. Um fotógrafo conhecido como Russo lembrou-se de Wessel e adquiriu todo seu papel fotográfico. “Russo comprou as 150 caixas que ainda tinha em estoque, e me disse: ‘Fabrique mais, muito mais, o material é excelente’.” Foi o que ele fez: “Criei alento e tratei de produzir o máximo. Assim, a revolução que estourou em São Paulo em junho de 1924 permitiu que a indústria fotográfica brasileira não morresse no seu nascedouro”. A partir de 1924, com prestígio assegurado entre os profissionais da fotografia, sua história tomou outra direção. A fábrica de papel cresceu e Wessel legou o patrimônio acumulado, décadas depois, à criação da FCW. O patrimônio foi triplicado pelos atuais administradores e continua a expandir o patrocínio às atividades sociais transformadoras. Hoje a FCW mantém as já conhecidas doações anuais a entidades cuja relação o próprio Wessel definiu em seu testamento: o Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo, a Fundação Antonio

Fotos  Acervo FCW

Depois de 1924, a fábrica de papel de Wessel cresceu e todo o patrimônio acumulado foi legado à FCW

ao tentar entrar no mercado dominado pelas empresas Kodak, Agfa e Gevaert. Ele gostava de usar a imagem de uma abelha e de um cão para expressar como se sentia brigando contra os gigantes do setor (ver página ao lado).

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especial prêmio conrado wessel  |  pesquisa fapesp


Prudente, o Serviço de Promoção Social do Exército de Salvação, as Aldeias Infantis SOS do Brasil, a Escola Benjamin Constant e mais 27 entidades que atendem crianças carentes. O Corpo de Bombeiros recebe a maior porção das cotas anuais da FCW por intenção de seu fundador. Em 2014, mais de 40 bombeiros divididos em três grupos se aperfeiçoarão no exterior com patrocínio da fundação. Um grupo seguiu para Indianápolis, nos Estados Unidos, para participar do Fire Department Instructor Conference em abril. Outro grupo seguirá em julho, onde fará um curso especializado na Academia dos Bombeiros, em College Station, no Texas. Por fim, uma terceira equipe estará em Belfast, na Irlanda do Norte, como participante do World Police and Fire Games, em agosto. São também significativas as contribuições anuais para o Serviço de Promoção Social do Exército de Salvação no resgate dos desamparados e para as Aldeias Infantis SOS Brasil no acompanhamento de órfãos. No mesmo perfil se inclui a doação à Escola Benjamin Constant, em São Paulo, onde Wessel fez seus primeiros estudos. É preciso registrar a doação feita anualmente à Fundação Antonio Prudente, mantenedora do Hospital A.C. Camargo, e a cota anual de entidades que atendem crianças, com a parceria de escolha do Ministério Público do estado. Somadas às anteriores, estas últimas doações chegam a 23.857 famílias atendidas.

A

fora as doações, há a promoção às categorias Arte, Ciência, Cultura mediante prêmios (ver página 8), apoio a publicações específicas de cunho internacional, aporte a eventos da mesma linha de atuação e parceria na outorga de bolsas a doutores em cursos pós-doc no exterior. Há atribuição do Prêmio Almirante Álvaro Alberto, em parceria da FCW com a Marinha do Brasil e o CNPq, e as três bolsas complementares pós-doc FCW para as bolsas Capes. No total, até este ano de 2014 foram concedidos 130 prêmios e bolsas. E ainda cabe lembrar de Moisés Bonella, o aluno que ficou quatro anos na Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, mantido com bolsa FCW/Indiana.

A fundação patrocina as revistas científicas Anais da Academia Brasileira de Ciências (ABC), JATM/Journal of Aerospace Technology and Management (DCTA) e Pesquisa Naval (Marinha do Brasil). Também apoia o Núcleo Fundações por meio do Projeto de Inserção Digital, que já formou mais de 2.400 alunos carentes, e a Fundação Escola Aberta do Terceiro Setor, entidade com mais de mil alunos formados via educação a distância com cursos para monitores administrativos para o terceiro setor. Tais ações de incentivo têm um traço comum: a certeza de cumprir missão de caráter público indispensável à nação. Para isso, buscam-se novos talentos ao mesmo tempo que se reconhecem os de maior contribuição social ao país. n

Imagem utilizada por Conrado Wessel para mostrar como se sentia (um inseto) ao enfrentar grandes empresas. Na página anterior, cartão-postal enviado para o pai quando estudou em Viena, entre 1911 e 1913

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Arte e ciência, lado a lado Premiação da FCW reúne personalidades marcantes da pesquisa e cultura

2013 ciência

Luiz Hildebrando Pereira da Silva medicina

José Rodrigues Coura cultura

Niède Guidon

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especial prêmio conrado wessel  |  pesquisa fapesp

A

festa dos ganhadores dos Prêmios FCW de Arte, Ciência e Cultura ocorre desde 2004 na Sala São Paulo, no centro da capital pau­ lista, e é um evento por onde já passaram alguns dos mais expressivos artistas bra­ sileiros. O maestro João Carlos Martins, o violinista Moisés Bonella e o pianista Ney Fialkow, os violonistas Fabio Zanon e Yamandu Cos­ ta, o pianista e arranjador Cesar Camargo Mariano e a cantora lírica Céline Imbert, a Orquestra Jazz Sinfônica e, em especial, o pianista Arnaldo Cohen – parceiro de primeira hora da Fundação Conrado Wessel – se apre­ sentaram depois da homenagem às personalidades da ciência, da medicina, da cultura e aos fotógrafos. Nes­ te ano de 2014, o concerto foi da Orquestra Sinfônica da USP, com regência do maestro Ricardo Bologna. O alto nível dos artistas faz jus ao naipe de 96 ga­ nhadores do Prêmio FCW, de 2002 a 2013. Os laurea­ dos em Ciência, Medicina e Cultura recebem, cada um, R$ 300 mil; os três ganhadores da categoria En­ saio Fotográfico dividem R$ 200 mil. Todos ganham também uma escultura do artista plástico Vlavianos e um certificado. O reconhecimento se dá àqueles cientistas, médicos e artistas cujo currículo não se limita a sua área de formação. Em outras palavras, as realizações de cada um que tenham a ver também com benefícios para a sociedade são amplamente levadas em conta pelo júri (página 49), além da obra acadê­ mica, científica ou artística. Os integrantes do júri vêm das instituições parceiras da FCW (página 48),


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* Laureado falecido

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especial prêmio conrado wessel  |  pesquisa fapesp

Ciência

Ciência

ciência Geral

Sérgio Rezende

Jorge Kalil

Jairton Dupont

Físico

Imunologista

Químico

medicina

medicina

medicina

Marcos Moraes

Miguel Srougi

Angelita Habr-Gama

Oncologista

Urologista

Coloproctologista

Cultura

Cultura

cultura

João Carlos Martins

Paulo Vanzolini *

Maestro

Compositor e

Nelson Pereira dos Santos

zoólogo

Cineasta

2012

2011

2010

fotos 2012 e 2011  Léo Ramos fotos 2010  1 liane neves  2 eduardo cesar  3 léo ramos

entre elas, a Academia Nacional de Me­ dicina, a mais nova instituição a ter con­ vênio com a fundação. Neste ano os ganhadores nas categorias Ciência e Medicina têm perfis que, de certa forma, são semelhantes quando se vê pelo prisma social. Luiz Hildebrando Pereira da Silva (Ciência) é um parasitologista que, ao se aposentar no Instituto Pasteur, de Paris, decidiu continuar trabalhando no Brasil (página 14). Não em São Paulo, on­ de nasceu, se formou e começou a carreira científica, mas em Rondônia, um estado com carências extremas na área da saúde. Foi lá que instalou um centro de pesquisa em medicina tropical. Já José Rodrigues Coura, um paraibano radicado no Rio de Janeiro, ajudou a espalhar especialistas em doenças infecciosas parasitárias por todo o Brasil, em regiões como a Amazônia e o pantanal, graças a uma forte vocação de formador de pesquisadores (página 20). A ganhadora em Cultura, Niède Gui­ don, tem em comum com Hildebrando e Coura o gosto pelo sertão (página 26). Arqueóloga paulista, foi a idealizadora do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí. Criou ali a Fundação do Museu do Homem Americano e luta pela preserva­ ção da região, riquíssima em imagens ru­ pestres que ajudam a contar a história da presença humana nas Américas. Nestas páginas há nome, especialidade e foto dos ganhadores dos Prêmios FCW. Os critérios foram aperfeiçoados ao longo desses 12 anos e algumas categorias sofre­ ram modificações. Nas edições de 2003, 2004, 2005 e 2006 de Ciência e Cultura houve seis premiados; nas de 2007, 2008 e 2009 houve quatro premiados; a partir de 2010 foram três. O mesmo ocorreu com a categoria Arte. A premiação apenas das fotos publicitárias evoluiu, desde 2011, pa­ ra os ensaios fotográficos (página 32). Em 2013, fotógrafos de 18 estados e do Distrito Federal ganharam motivação para se ins­ crever pelo endereço www.fcw.org.br. Por fim, um livro lançado sempre no segundo semestre resume o esforço da FCW – cons­ tante, anual e já reconhecido pela comuni­ dade científica – de premiar os melhores em Arte, Ciência e Cultura. n


fotos 2009  1 Léo Ramos  2 jader rocha  3 eduardo cesar  4 silvia machado fotos 2008  2 paulo soares / esalq fotos 20 07  1 liane neves  2 eduardo cesar  3 fábio motta /AE  4 gl áucia rodrigues

2009

Ciência Geral

Ciência Geral

Ciência Geral

Jerson Lima da Silva

Leopoldo de Meis

Iván Izquierdo

Bioquímico

Bioquímico

Neurocientista

Ciência Aplicada

Ciência Aplicada

João Gomes de Oliveira

Ernesto Paterniani *

Engenheiro

Geneticista

Hisako Higashi

mecânico

de plantas

Bioquímica

Medicina

Medicina

Medicina

Ricardo Pasquini

Fulvio Pileggi

Ivo Pitanguy

Hematologista

Cardiologista

plástico

Cultura

Cultura

Cultura

Antonio Nóbrega

Affonso Ávila *

Músico e

Ariano Suassuna

dançarino

Dramaturgo

ensaísta

2008

Ciência Aplicada

Cirurgião

Poeta e

2007 especial prêmio conrado wessel  |  pesquisa fapesp

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Medicina

Ciência Geral

Medicina

Sérgio Mascarenhas

Ricardo Brentani *

Wanderley de Souza

Adib Jatene

Oncologista

Físico

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Cardiologista

Parasitologista

Ciência Aplicada ao Meio Ambiente

Ciência Aplicada ao Campo

Ciência Aplicada ao Meio Ambiente

Ciência Aplicada ao Campo

Carlos Nobre

Magno Ramalho

Aziz Ab’Sáber *

Luiz C. Fazuoli

Climatologista

Geneticista de plantas

Geógrafo

Agrônomo

Ciência Aplicada à Água

Cultura

Ciência Aplicada à Água

Cultura

Aldo Rebouças *

Escritora

Galizia Tundisi

Crítico e ensaísta

Ruth Rocha

Geólogo

Biólogo

2006

2005

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Fábio Lucas

fotos 2006  1, 3, 6 Miguel Boyayan  2,4 eduardo cesar  5 ÂNgelo abreu/ufl a fotos 20 05  1 Léo Ramos  2 Francisco Emolo /Jornal da USP  3, 6 Miguel Boyayan  4, 5 Eduardo Cesar

Ciência Geral


fotos 2004  1 Miguel Boyayan  3 Eduardo Cesar  4 Arquivo pessoal  6 Léo Ramos  fotos 2003  1 Miguel Boyayan  2 ASCOM / INPA  3 Léo Ramos  4 eduardo tavares  5 Marcos Esteves / Embrapa  6 Divulgação

Ciência geral

Medicina

Ciência Geral

Medicina

Isaias Raw

Cesar Victora

Bioquímico

Epidemiologista

Carlos Henrique de Brito Cruz

Maria Inês Schmidt

Físico

Epidemiologista

Ciência Aplicada ao Meio Ambiente

Ciência Aplicada ao Campo

Ciência Aplicada ao Meio Ambiente

Ciência Aplicada ao Campo

Museu Paraense Emílio Goeldi

Instituto Agronômico

Philip Fearnside

Jairo Vieira

Biólogo

Agrônomo

Ciência Aplicada à Água

Cultura

Ciência Aplicada ao Mar

Cultura

Alberto Franco *

Poeta

Dieter Muehe

Escritora

Ferreira Gullar

Oceanógrafo

Geógrafo

2004

2003

Lya Luft

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CIÊNCIA

Combate sem trégua Luiz Hildebrando Pereira da Silva fez carreira no Instituto Pasteur e hoje é um dos responsáveis pela diminuição dos casos de malária em Rondônia

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especial prêmio conrado wessel  |  pesquisa fapesp

P

rimeiro ele virou comunista e, em decorrência, virou parasitologista. As duas escolhas pautaram, paradoxalmente, sua trajetória de vida: a primeira o expulsou do Brasil por duas vezes, nos anos 1960; e a segunda o trouxe de volta, mais de 30 anos depois. Aos 85 anos, Luiz Hildebrando Pereira da Silva, diretor aposentado da Unidade de Parasitologia Experimental do Instituto Pasteur, na França, ainda divide sua agenda entre Paris e Porto Velho, onde dirige o Instituto de Patologias Tropicais de Rondônia (Ipepatro) e é vice-diretor de Pesquisa, Desenvolvimento Tecnológico, Inovação e Serviços de Referência da Fiocruz Rondônia. Mas conciliou suas escolhas: “Eu me identifico com o comunismo que defende os grandes ideais do Iluminismo: a liberdade, a igualdade e a fraternidade”. Ao comunismo, ele chegou adolescente. Aos 15 anos, ingressou no Partido Comunista Brasileiro (PCB), inspirado pelo heroísmo do marechal Jukov e pelo “papel determinante” da União Soviética na luta contra o nazismo. À parasitologia, foi entronizado por Samuel Pessoa, também comunista, pioneiro nos estudos epidemiológicos em comunidades rurais brasileiras. Recém-formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), em 1953, Luiz Hildebrando escapou da residência médica e embrenhou-se em Misericórdia de Piancó, no sertão da Paraíba, num programa de pesquisa sobre epidemiologia de doenças parasitárias dirigido por Pessoa. Foi lá que,


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lĂŠo ramos


Q Acima, Luiz Hildebrando no jardim da casa de François Jacob (esq.), que dividiu o Nobel de Medicina de 1965 com Jacques Monod. Abaixo, no estande da Voz Operária, jornal do PCB, na festa anual do diário comunista francês L’Humanité, durante os anos 1970, em Paris

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através da lente de um microscópio e à luz de gambiarra, viu o parasita Schistosoma mansoni, de alta incidência em áreas litorâneas do Nordeste, mas até então inédito no sertão. Sentiu, pela primeira vez, “a emoção estética da descoberta” e virou cientista. Voltou à USP em 1956 como assistente da cadeira de parasitologia para estudar o ciclo evolutivo do Trypanosoma cruzi. Inoculado pela inquietação científica – e, acidentalmente, também pelo parasita –, utilizou micromanipulação e técnicas de biologia para resolver uma suspeita que assaltava epidemiologistas desde Carlos Chagas: não havia sexualidade entre os T. cruzi. O encanto pela genética foi reforçado em um curso em Piracicaba (SP), durante o qual conheceu o trabalho dos franceses François Jacob e Elie Wollman. Um ano depois de ter sido aprovado no concurso para livre-docente de parasitologia, em 1960, conseguiu uma bolsa do Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Tecnológica (CNPq) para estágio de pós-doutorado, um ano na Universidade Livre, em Bruxelas, com René Thomas, no laboratório de Jean Brachet; um ano no Instituto Pasteur, em Paris, com François Jacob, no laboratório de André Lwoff. Em Bruxelas estudou a lisogenia dos bacteriófagos e, na França, a genética da lisogenia. Retornou à USP em 1963. Ten-

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uando o Itamaraty promoveu uma campanha de repatriamento de cientistas, em 1967, acreditou que a ditadura se esgotava. Aceitou organizar um curso no Departamento de Bioquímica da USP, em julho, e também o convite de José Moura Gonçalves, diretor da Faculdade de Medicina da USP em Ribeirão Preto, para o cargo de professor no Departamento de Genética. Chegou em junho de 1968, seis meses antes da edição do Ato Institucional nº 5, foi demitido em abril do ano seguinte e retornou à França. Em Paris, reassumiu sua posição no CNRS e seu posto no Pasteur. Por ter aceitado emprego em um governo estrangeiro sem a autorização da Presidência da República, prevista na Constituição de 1967, foi alvo de processo para perda de nacionalidade. Ficou três anos sem passaporte. Foi um longo período de exílio, durante o qual virou referência intelectual dos exilados brasileiros – comunistas e não

fotos ARquivo famliar e Eduardo Cesar

tava organizar um laboratório de genética de microrganismos quando veio o golpe militar. Passou três meses preso no navio Raul Soares, denunciado por recolher fundos e dar asilo a comunistas procurados. Acabou demitido por ato do governador Adhemar de Barros, em 9 de outubro de 1964, último dia da vigência do Ato Institucional nº 1. Voltou à França e, com o apoio de François Jacob, integrou-se ao Instituto Pasteur como assistente, ganhou posição de pesquisador no Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), mas não desistiu do que Lwoff dizia ser seu “primeiro amor”: o T. cruzi.


comunistas – na França, no cargo de secretário político da base do PCB em Paris. No Pasteur, a pesquisa em biologia molecular avançava a passos largos: Jacob acabara de ganhar, junto com Jacques Monod, o Prêmio Nobel de Medicina de 1965, com o modelo de regulação da expressão gênica em bactérias. E foi pela mão de Jacob que Luiz Hildebrando chegou à fronteira do conhecimento. Ele o aconselhou a pegar um atalho em sua pesquisa sobre lisogenia dos bacteriófagos. “Por que vocês não exploram aquela ideia dos dois operons com sentido contrário que vocês descobriram no bacteriófago λ [lambda]?”, sugeriu Jacob. O atalho levou ao gene CRO (control of the repressor and others) e à descrição da “regulação genética de genes reguladores, um passo à frente no modelo proposto por Jacob e Monod”. Os resultados foram anun­ciados no artigo publicado em Proceedings of National Academy of Science, em 1970, “Regulation of repressor expression in bacteriophage”, assinado por Harvey Eisen, P. H. Brachet, Luiz Hildebrando e François Jacob. Em 1971 foi nomeado chefe da Unidade de Diferenciação Celular do Departa-

mento de Biologia Molecular do Instituto Pasteur e, em 1976, diretor do Departamento de Biologia Molecular. Naquele momento, foi procurado por Jacques Monod, então diretor do instituto. “Ele me disse: ‘A OMS insiste que o Pasteur relance suas pesquisas em parasitologia. Você aceita assumir a direção de uma nova unidade de parasitologia que incorpore a metodologia molecular em pesquisas?’. Aceitei na hora”, contou Luiz Hildebrando em entrevista à revista do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), em 2003. A Unidade de Parasitologia Experimental foi criada em 1978 com o objetivo de desenvolver pesquisa sobre biologia molecular de parasitas da malária, particularmente de Plasmodium falciparum. Luiz Hildebrando voltava, assim, à parasitologia, agora com larga experiência em biologia molecular. Foi um período de intensa atividade de pesquisa: desenvolveu estudos sobre antígenos de Plasmodium falciparum e imunidade, analisou o papel dos anticorpos citofílicos, entre outras investigações envolvendo imunidade e antígenos.

Luiz Hildebrando com morador de Porto Velho, em 2002: ações bem-sucedidas contra a malária

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Acima, com o então presidente francês François Mitterrand na inauguração do prédio da Imunologia do Instituto Pasteur, em 1981. Ao lado, durante o primeiro estágio no Pasteur, em 1965

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Luiz Hildebrando só pôde se dedicar inteiramente à Unidade de Parasitologia Experimental em 1980, depois de ver fracassar mais uma tentativa de voltar ao Brasil após a anistia. Maurício Matos Peixoto, então presidente do CNPq, pretendia criar uma unidade interdepartamental no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, para estudos de protozoários patogênicos e de diferenciação celular, o que possibilitaria reintegrar os pesquisadores demitidos, com salários bancados pelo CNPq por um período de quatro anos. Luiz Hildebrando aceitou a missão de consultar Isaac Roitman, José Carlos da Costa Maia, Vitor e Ruth Nussenzweig, Michel Rabinovitch, Erney Camargo, Tomas Maack e Isaias Raw – em Nova York, Paris, Genebra e São Paulo. Todos se mostraram dispostos a integrar o ICB, com exceção de Raw, que já se dedicava à produção de imunobiológicos no Instituto Butantan. O então reitor da USP, Waldir Muniz Oliva, no entanto, colocou objeções financeiras. No meio das negociações, Peixoto foi demitido do CNPq. E não se falou mais no assunto. A USP só reconheceria a injustiça das demissões da Faculdade de Medicina em 18 de setembro de 2008, quando conferiu a cada um deles – dois já haviam morrido – o título de professor emérito. Nos 15 anos que antecederam sua aposentadoria no Instituto Pasteur, em 1996, Luiz Hildebrando consolidou sua pesquisa sobre a bioquímica e biologia molecular dos parasitas da malária, aplicações vacinais e epidemiologia da doença. Em 1990, em colaboração com Erney Camargo, orga-

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nizou uma equipe de pesquisa em Rondônia. “Nos anos 1980/1990, em consequência de uma grande migração de sulistas patrocinada pelo regime militar, Rondônia tornara-se a região de maior incidência de malária no país”, lembra Camargo.

A

posentado do Pasteur, Luiz Hildebrando decidiu aportar em Rondônia. Prestou concurso na USP e, em 1997, foi nomeado titular de parasitologia e assumiu a direção dos programas em Rondônia. Instalou-se em Porto Velho, montou o Centro de Medicina Tropical (Cepem) na Secretaria da Saúde de Rondônia e criou o Ipepatro, com um grupo de médicos e biologistas. Em pouco tempo, verificou que as vítimas assintomáticas do Plasmodium vivax podiam transmitir a doença. O artigo “Asymptomatic infections by Plasmodium vivax in a native Amazonian population” foi publicado na revista Lancet, em 1999. Em 2010, no artigo “The dynamics of transmission and spatial distribution of malaria in riverside areas of Porto Velho, Rondônia, in the Amazon region of Brazil”, publicado na PLoS One, constatou que, apesar de a transmissão poder ocorrer intra e extradomicílio, a manutenção da malária nas áreas endêmicas era essencialmente dependente da transmis-


Fotos Arquivo Familiar

são intradomiciliar, reforçada pela presença das fontes de infecção permanente (assintomáticos). E que a mobilidade das populações amazônicas é fator essencial da difusão e extensão da endemia da malária. Desde então, a equipe do Cepem vem registrando sucesso com o procedimento SIPT (selective intermittent preventive treatment), que visa ao controle de recaídas do P. vivax. A área-piloto, Candeias do Jamari, é a única cidade no estado que, em 2010/11, apresentava um API (annual parasite incidence) superior a 200 e alta incidência do P. vivax, devido essencialmente às recaídas. “Com apoio da Secretaria da Saúde do ministério, a API caiu significativamente para 82 em 2013”, ele conta. Essas ações já impactam as estatísticas. Em 2011, os registros de malária na região amazônica tinham caído de 600 mil, em 1999, para 300 mil. No mesmo período, a participação de Rondônia nesse total caíra ainda mais, de 40% em 1999 para 12% em 2011. E a incidência continua em queda. Em 2013 foram registrados 168 mil casos na Amazônia e em Rondônia com baixa acentuada: 7% do total, com menos de 14 mil casos. “O mais importante é que em Rondônia está-se verificando queda não apenas do P. falciparum, mas também do P. vivax”, comemora Luiz Hildebrando. As perspectivas são ainda mais promissoras com os resultados de ensaios clínicos com a Tafenoquina, uma nova quinolina produzida pelo laboratório multinacional

GSK, em dose única, contra as formas hepáticas de P. vivax. “Se o ensaio for positivo, poderemos melhorar a prevenção das recaídas de malária vivax, pois o método SIPT exige tratamento preventivo por várias semanas, usando a cloroquina”, conta Luiz Hildebrando. “A expectativa é que a campanha contra a malária, que se mantinha apenas em controle, possa evoluir, brevemente, se não para uma erradicação, ao menos para uma eliminação.” A equipe registra progressos também no desenvolvimento de biotecnologias aplicadas à saúde, principalmente com a produção de anticorpos monoclonais originados em camelídeos (alpacas e lhamas de Rondônia), clonando o segmento ativo do anticorpo. “O anticorpo VHH é sintetizado e expresso pela E. coli transgênica. Nossa equipe foi bem-sucedida na preparação do VHH contra a enzima fosfolipase das serpentes Bothrops e Crotalus. Já foram isolados e caracterizados cerca de 20 VHH, cujas sequências foram determinadas e, algumas, patenteadas”, explica. Há bons resultados também com a tecnologia de isolamento e produção de VHH, que reage com antígenos da superfície viral, em particular de hantavírus, e dos vírus da febre amarela e da raiva. n

Número de casos de malária na região amazônica continua caindo

Com Cecile, atual esposa, filhos, noras e netos reunidos em Paris, em 2010

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MEDICINA

Ações simultâneas José Rodrigues Coura estuda – e combate – o mal de Chagas enquanto se dedica a espalhar especialistas em infectologia e parasitologia por todo o país

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chefe do Laboratório de Doenças Parasitárias do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), José Rodrigues Coura, com mais de 250 artigos científicos e oito livros publicados, abre um pequeno sorriso quando perguntado sobre seus principais trabalhos de pesquisa. “O que eu fiz de melhor foi formar gente competente. Espalhei profissionais em doenças infectocontagiosas do Rio Grande do Sul ao Amazonas”, diz. A julgar pelo que dizem os que o conhecem de perto, esta é apenas meia verdade. Desde o final do curso na Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, a UFRJ), Coura atendeu pacientes em hospitais e consultório, foi professor de instituições de ensino superior, criou cursos de pós-graduação, geriu o IOC e fez pesquisa básica. O que, aliás, segue fazendo diariamente, aos 86 anos. A carreira simultânea de médico, professor, pesquisador e gestor não era vislumbrada por Coura quando estudava em Taperoá, na Paraíba, onde nasceu, ou como interno no colégio da cidade vizinha de Patos. “Quando acabei o ginásio [ensino fundamental], voltei para Taperoá e me dispus a administrar a improdutiva fazenda da família por três anos”, diz ele, o quinto de 10 filhos. “Meus esforços deram em nada e fui para o Rio de Janeiro morar com uma irmã.” Lá conseguiu um emprego de contínuo no escritório da Standard Oil, atual Esso. Seis meses depois Coura largou o emprego e, aos 20 anos, foi fazer o serviço militar, que


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LĂŠo Ramos


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“Fazer o curso de medicina com um pouco mais de idade foi bom, porque eu tinha mais maturidade” 22

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oura começou o curso com 25 anos e terminou com 30 anos, sempre trabalhando simultaneamente como funcionário público do Exército. “Hoje sinto que foi muito bom fazer a faculdade de medicina um pouco mais tarde que o convencional, porque eu já tinha alguma experiência de vida e conseguia ver as coisas com alguma maturidade”, diz. Após o curso, o jovem médico tirou uma licença-prêmio de seis meses e fez um curso de especialização na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo com Luiz Décourt, um dos pioneiros da cirurgia cardíaca no Brasil, e com João e Bernardino Tranchesi, assistentes dele. Voltou para o Rio conhecendo bem clínica médica e cardiologia e prestou concurso para médico do Exército. Em 1960, aos 33 anos, ocorreu sua entrada para o mundo da ciência. Coura ainda trabalhava no Exército quando o professor José Rodrigues da Silva o convidou para ser instrutor de ensino na cadeira de clínica de doenças tropicais e infecciosas do Hospital São Francisco de Assis da Faculdade de Medicina. Na rotina de atendimento e ensino viu grande número de pacientes com doença de Chagas e miocardites provocadas por varíola e decidiu seguir na cardiologia. Para conseguir se dedicar integralmente à carreira acadêmica havia uma dificuldade: o salário do Exército era quase três vezes maior do que o da Universidade do Brasil. “O Rodrigues me ofereceu espaço na clínica dele e comecei a trabalhar lá também, para

fotos Arquivo Pessoal

naquela época convocava os jovens com essa idade. Aproveitou e prestou concurso para trabalhar como auxiliar de escritório na Escola do Estado-Maior do Exército. “Depois que acabei o serviço militar continuei no escritório durante o dia e fiz o curso científico [atual ensino médio] à noite.” Por coincidência, o trabalho ficava ao lado da faculdade de medicina, no bairro da Urca, e o jovem paraibano achou que valia a pena tentar fazer o curso. “Em parte, era prático, por ser muito perto; mas talvez o fato de uma irmã ter morrido em consequência de meningite meningocócica tenha me influenciado”, analisa ele hoje, mais de 60 anos depois.


ganhar mais. Ficava na universidade até as 17 horas, ia para a clínica e saía às 21 horas.” Com isso, deu baixa como capitão médico em 1962. Seu primeiro artigo científico foi escrito em 1961. Era um trabalho de revisão sobre o Furacin, novo medicamento que havia sido lançado para ajudar pacientes chagásicos. “Preparei o texto e entreguei para o Rodrigues. Algum tempo depois ele me disse que estava muito bom, devolveu dentro de um envelope e foi embora.” Entretanto, o texto estava cheio de marcações vermelhas e trazia uma recomendação: “Leia os originais de Carlos Chagas para aprender a escrever”. “Foi uma lição muito útil. Os artigos de Chagas são de fato muito bem escritos”, diz o pesquisador.

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m 1963, ele ganhou uma bolsa do Conselho Britânico para a Universidade de Londres e fez cursos de aperfeiçoamento no Hammersmith e National Heart Hospitals e frequentou a London School of Tropical Medicine and Hygiene. “Usei esse período de estudos para embasar minha tese de livre-docência Contribuição ao estudo da doença de Chagas no estado da Guanabara apresentada em 1965”, conta. No ano seguinte prestou concurso para professor titular na

Universidade Federal Fluminense (UFF) e, uma vez aprovado, organizou o Serviço de Doenças Infecciosas no Hospital Universitário Antônio Pedro e reformulou o currículo da disciplina. Continuou também trabalhando parcialmente na Universidade do Brasil – que já tinha virado UFRJ – e estudando, além de Chagas, esquistossomose, malária e doenças infecciosas e parasitárias em geral. Com base em suas pesquisas sobre Chagas, Coura criou o conceito que chamou de complexo cruzi, em 1966. Ele percebeu que os modelos experimentais da infecção chagásica nunca reproduzem de modo rigoroso a infecção e a doença humana, da mesma forma como ela ocorre na natureza. Isso acontece porque são muitas as diferenças entre as espécies de hospedeiros e seus mecanismos de defesa e a relação com as diversas cepas do Trypanosoma cruzi, o parasita causador da doença, além de a moléstia variar de região para região. De 1984 a 1996 Coura e sua equipe de pesquisadores confirmaram essa ideia em trabalhos de campo realizados em Minas Gerais, Paraíba, Piauí e Amazonas. O pesquisador deixou a UFF para ser professor adjunto na UFRJ, em 1970. No ano seguinte assumiu como professor titular a disciplina de doenças infecciosas

Acima, Coura atendendo pacientes numa choupana em piaçabal da Amazônia, na década de 1990. Ao lado, crianças na frente de rolos de piaçaba prontos para ser embarcados para Barcelos e Manaus, no mesmo período

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Fotos  Rodrigo Mé x as e Arquivo Pessoal

Coura em maio de 2014 trabalhando em seu laboratório: atividade intensa aos 86 anos

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e parasitárias, substituindo o mestre José Rodrigues, morto em 1968. Na volta a sua casa de origem, Coura organizou o curso de pós-graduação da disciplina, o primeiro da área médica credenciado no Brasil pelo Conselho Federal de Educação. Também organizou o Departamento de Medicina Preventiva da faculdade – modelo para vários outros no país – e instalou o atual Serviço de Doenças Infecciosas no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho. Nos anos 1970 começou outra fase importante de sua vida profissional. Ele foi convidado pelo então ministro da Saúde, Mário Lemos, a fazer um diagnóstico da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que não se desenvolvia. Coura se licenciou por três meses da UFRJ e visitou todas as unidades da fundação. Sua conclusão na época: a Fiocruz era uma ficção. “Não havia carreira profissional nem orçamento, os salários eram miseráveis e poucos trabalhavam”, lembra Coura. Ele apresentou um plano de recuperação, mas não aceitou implementá-lo. “Eu estava feliz na UFRJ.”

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Em 1979 houve novo convite para assumir os cargos de vice-presidente de Pesquisa da Fiocruz e de diretor do IOC, a mais antiga instituição que compõe a fundação. Desta vez Coura aceitou, mas percebeu que as condições continuavam ruins. “Faltavam boas cabeças para liderar as pesquisas e ensinar os mais jovens”, diz. Ele conseguiu levar para o IOC cientistas que estavam se aposentando ou viviam no exterior, em parte expulsos pela ditadura militar. Da Venezuela vieram Leônidas e Maria Leane; de Genebra, Luís Rey; da Inglaterra, Hélio e Peggy Pereira; dos Estados Unidos, Henrique e Jane Lenzi. Zigman Brener se aposentou na UFMG e foi para o Centro René Rachou, a Fiocruz de Minas; Zilton e Sônia Andrade saíram da UFBA e foram para a unidade do IOC de Salvador; Elói Garcia e Samuel Goldenberg também aceitaram o desafio. Além dos novos recursos humanos, foram criados os cursos de pós-graduação em biologia parasitária e medicina tropical e o curso técnico de pesquisa para jovens. “Na primeira gestão de Coura como diretor, o IOC voltou a ter uma base de


profissionais técnico-científicos importante e competente”, diz o atual diretor do instituto, Wilson Savino. Na segunda gestão, ele mudou a estratégia de distribuição de recursos na instituição, que passou a ser definida por um mapa de produtividade interna. “Ele tinha uma visão de gestão que levou o IOC a um novo patamar de qualidade.” Paulo Gadelha, presidente da Fiocruz, chama a atenção para a formação de diferentes gerações de pesquisadores da fundação e de outras instituições. “Ele sempre foi uma referência forte na área de biomedicina e é também uma referência para o ensino”, diz.

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ois exemplos ajudam a entender a extensão da contribuição do veterano médico e pesquisador. Em 1991, ele estava com estudantes em Barcelos, no Amazonas, e começou a investigar a ocorrência do inseto barbeiro, hospedeiro do parasita T. cruzi, na piaçaba colhida pela população local. “Fiz os testes e deu contaminação em alto grau”, diz Coura. “Os piaçabeiros invadem a área dos animais para colher a planta, comem e espantam os animais que são a fonte de alimento do barbeiro e este, sem opção, ataca o homem.” É o ciclo silvestre da doença, sobre a qual seu grupo publicou diversos artigos a partir de 1994. Coura, como médico, também ajudava a tratar os piaçabeiros e suas famílias. “Ele é, seguramente, um dos dois especialistas que mais entendem o mal de Chagas no

Brasil, ao lado de João Carlos Pinto Dias, da Fiocruz de Minas”, testemunha Savino. Outro exemplo vem de Mato Grosso do Sul, quando ele realizou pesquisas no pantanal com um grupo que incluía Rivaldo Venâncio, ex-aluno na pós-graduação do IOC. “Ele percebeu de imediato a carência de ensino e pesquisa no estado e se ofereceu para criar dois cursos de mestrado: de biologia parasitária e de medicina tropical”, diz Venâncio, hoje professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e responsável técnico pelo escritório da Fiocruz na região. Coura e outros professores do IOC estiveram em Campo Grande e de 1997 a 2001 formaram 24 mestres nessa área – destes, 18 se tornaram doutores. A UFMS criou seus próprios cursos de pós-graduação e o perfil do estado na área mudou, com profissionais ensinando em outras universidades e trabalhando em serviços públicos municipais de saúde. “Ele fez isso aqui, na Paraíba, no Piauí, no Amazonas...”, avisa Venâncio. Daí o sorriso de Coura, pai de um filho e duas filhas, quando perguntado sobre suas contribuições em quase 60 anos de carreira: “Pelas minhas contas, formei mais de 200 profissionais competentes. Não é motivo de orgulho?”. n

Ao perceber a carência de ensino e pesquisa no MS, Coura se ofereceu para criar cursos de formação

Barbeiro infectado com T. cruzi sobre fibras de piaçaba em comunidade da Amazônia: com seu hábitat invadido, sem alimento, inseto ataca seres humanos

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cultura

Lições do semiárido O trabalho de Niède Guidon em prol dos sítios arqueológicos do Parque Nacional Serra da Capivara colocou o Piauí em um lugar de destaque na pré-história das Américas

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ilha de pai francês e mãe brasileira, Niède Guidon graduou-se em história natural na Universidade de São Paulo (USP) em 1959. Naquela época, o curso abarcava dois ramos do conhecimento, a biologia e a geologia, que acabariam ganhando vida própria na academia com o passar do tempo. Formada, passou um rápido período como professora da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo e ingressou em seguida no Museu Paulista, que em 1963 seria incorporado à USP. Não havia no Brasil formação específica em arqueologia, área que a então jovem paulista de Jaú queria seguir. “O Paulo Duarte, do Museu Paulista, me incentivou a estudar arqueologia na França”, lembra Niède, hoje com 81 anos. Ela procurou a embaixada da França e pediu uma bolsa de estudos para se aprofundar na disciplina em Paris. Conseguiu e fez um curso de especialização em arqueologia pré-histórica na Sorbonne entre 1961 e 1962. De volta ao país, começou a trabalhar no museu. A ideia era fazer pesquisa por aqui. Mas houve o golpe militar em 1964 e Niède teve que, às pressas, retirar o passaporte da gaveta. Não que ela tivesse de fato alguma atuação política em partidos de esquerda. Mas uma tia ficou sabendo por um amigo militar que alguém do trabalho a denunciara por atividades supostamente subversivas. “Tive de sair rapidamente do país”, relembra a arqueóloga. “Deixei até um apartamento montado em São Paulo.” A alternativa foi fazer carreira na França, sua segunda pátria, onde obteve o doutorado e o pós-doutorado, também na Sorbon-


andrĂŠ pessoa


ne, e teve a chance de se aperfeiçoar com pesquisadores renomados, como o arqueólogo e etnólogo André Leroi-Gourhan, criador em 1962 da cadeira de pré-história no Museu do Homem, em Paris. Anos mais tarde, o Brasil iria entrar definitivamente como cenário de seus trabalhos de campo. Pesquisadora do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) em Paris, Niède era assistente da arqueóloga francesa Annette Laming-Emperaire durante a primeira missão franco-brasileira que, em 1973, procurava vestígios do homem mais antigo das Américas. Os interesses científicos de Annette se centravam na Patagônia e, em solo brasileiro, na região de Lagoa Santa, nos arredores de Belo Horizonte, onde poderia haver vestígios de uma remota ocupação humana no continente. Niède não gostava muito desse tipo de pesquisa, que buscava descobrir o homem mais antigo das Américas. Fez então um trato com a francesa. Prepararia toda a expedição à localidade mineira desde que ela a deixasse ir ao Piauí para ver as belas pinturas rupestres preservadas no semiárido nordestino.

Estudos feitos no Piauí podem mudar a data de chegada e a rota de entrada do homem moderno nas Américas

fotos  arquivo pessoal

Niède em trabalho de campo em São Raimundo Nonato, em 1978 (abaixo) e 2003 (ao lado)

Dessa visita à região de São Raimundo Nonato, no sudeste do Piauí, há mais de quatro décadas, nasceria um trabalho que, unindo preservação e pesquisa da pré-história no Brasil e conservação e estudos ambientais, levaria à criação do Parque Nacional Serra da Capivara em 1979. Considerado patrimônio cultural da humanidade pela Unesco, o parque abriga o maior número de sítios pré-históricos conhecidos das Américas, mais de 1.400, dos quais 900 ornamentados com pinturas rupestres feitas há milhares de anos, talvez dezenas de milhares de anos. “Apenas na minha primeira visita, em 1973, encontramos 55 sítios com pinturas rupestres”, conta Niède. “Isso nos animou a trabalhar na região.” Até 1993, Niède passava temporadas no Piauí enquanto vivia na França. A partir daquele ano, passou a residir em São Raimundo Nonato. “O governo brasileiro pediu à França que me emprestasse para fazer um projeto visando à proteção e conservação da serra da Capivara”, afirma a arqueóloga, que, em 1999, se aposentou na França, mas continua em plena atividade até hoje. O parque no semiárido do Piauí é enorme. Abrange 129 mil hectares em meio à vegetação de caatinga. Em 1986, Niède criou (e até hoje a preside) a Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham), ao lado de pesquisadores brasileiros e franceses. Desde 1994, a Fumdham, que coordena

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Durante a primeira expedição à serra da Capivara, em 1973, Niède se impressionou com a quantidade de sítios pré-históricos com pinturas rupestres

as pesquisas e cuida do acervo natural da unidade de conservação, coadministra o parque ao lado do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente. A unidade de conservação – que mantém mais de uma centena de sítios pré-históricos abertos para visitação pública – vive uma situação crônica de falta de verbas e pessoal, ameaças de desmatamento de suas áreas verdes e caça de seus animais e assentamentos ilegais no seu entorno. “Há anos prometem inaugurar o aeroporto de São Raimundo Nonato para facilitar a visitação ao parque, mas a obra nunca fica pronta”, reclama Niède. A última previsão é de que o aeroporto seja aberto para voos comerciais ainda neste semestre. Essas dificuldades, no entanto, nunca a afastaram de seu importante trabalho de preservação e pesquisa nessa região de beleza e importância única no país. Por uma dessas ironias da vida, as pesquisas feitas em São Raimundo Nonato acabaram levando a carreira da arqueóloga brasileira justamente para a questão que, inicialmente, queria evitar: a cronologia a respeito da chegada do homem às Américas. Trinta anos atrás, ninguém acreditava que a presença do Homo sapiens no Nordeste, região seca e teorica-

mente desfavorável à ocupação humana, pudesse ser muito antiga. Niède tomou um susto quando recebeu os dados das primeiras datações, feitas na França, de uma amostra de carvão obtida no sítio pré-histórico chamado Pedra Furada, conhecido desde os anos 1960 e uma espécie de cartão-postal do lugar. O carvão provinha de uma fogueira, possivelmente feita por seres humanos no interior desse abrigo sob rochas, e sua idade fornecida pelo método do carbono 14 bateu na casa dos 32 mil anos. Segundo esses exames, as fogueiras eram bem mais antigas do que a idade normalmente associada à entrada das primeiras levas de Homo sapiens nas Américas, por volta de 13 mil anos de idade.

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estinados a causar polêmica, os resultados de Pedra Furada foram publicados em um artigo que ganhou em 1986 as páginas da prestigiada revista científica Nature. Grande parte da comunidade científica, em especial arqueólogos americanos, jamais endossou a afirmação de que a fogueira teria sido feita por humanos. Para esses críticos, os carvões foram produzidos de forma natural, por incêndios espontâneos, e a ocupação humana no Piauí é, como sempre se acreditou, muito mais recente. “Os europeus

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da mais recuadas no tempo, jogaram mais lenha na fogueira da polêmica. As informações coletadas em décadas de pesquisa na serra da Capivara levaram Niède e os pesquisadores da Fumdham a formular uma teoria alternativa sobre a entrada do homem em nosso continente. Para a arqueóloga brasileira, as levas iniciais de H. sapiens não chegaram às Américas via estreito de Bering, na divisa do Alasca com a Sibéria, há cerca de 13 mil anos, como sustenta a visão mais clássica sobre esse processo. Niède defende a ideia de que o homem moderno saiu da África e aqui desembarcou por via oceânica, depois de ter cruzado o Atlântico, pulando de ilha em ilha, cerca de 100 mil anos atrás. Ele teria aproveitado uma janela de oportunidade histórica para fazer a migração: havia então uma grande seca na África, que o empurrava a procurar comida no mar, e o nível do Atlântico estava 140 metros abaixo do atual, fazendo surgir mais ilhas e encurtando a distância entre os dois continentes.

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or esse cenário, os primeiros desbravadores das Américas aportaram no Caribe e na costa norte do Brasil, provavelmente na região do atual rio Parnaíba, na divisa do Maranhão com o Piauí. Desse ponto, eles teriam se espalhado, ao longo dos anos, pelo interior do continente e outros pontos da costa. “Se há pesquisas mostrando que macacos fizeram essa travessia de ilha em ilha da África para as Américas há alguns milhões de anos, por que os homens também não podem ter feito essa migração?”, indaga a arqueóloga. Durante muito tempo, as teses de Niède foram vistas com reticência em boa parte do meio científico, embora a excelência do trabalho da Fumdham em prol da conservação do patrimônio pré-histórico do Piauí seja uma unanimidade. Nos últimos anos, aos poucos e sem muito alarde, alguns pesquisadores mudaram sua visão sobre as pesquisas feitas na serra da Capivara a respeito da presença do homem moderno nas Américas. “O trabalho social e de preservação do patrimônio feito pela Niède Guidon na serra da Capivara é único no país e raramente encontrado em outras partes do mundo”, afirma o arqueólogo e

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fotos  arquivo pessoal e andré pessoa

nunca questionaram os nossos dados”, afirma Niède, que manteve sua posição e seguiu com as pesquisas. Infelizmente, os sítios arqueológicos da serra da Capivara nunca forneceram ossadas humanas que pudessem ser datadas de forma direta, um tipo de dado científico mais difícil de ser alvo de reprovações. A saída foi continuar apostando em evidências indiretas para tentar determinar quando o homem fincou pé na região. Datações posteriores de artefatos de pedra lascada encontrados em vários sítios arqueológicos do parque, que teriam sido feitos por humanos, e de pinturas rupestres empurraram para ainda mais longe a presença humana no Nordeste, algo entre 50 mil e 100 mil anos atrás. “Nossa pintura rupestre é contemporânea à encontrada nas cavernas da Europa”, afirma Niède. Claro que essas novas idades, ain-


antropólogo Walter Neves, coordenador do Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos do Instituto de Biociências da USP. “Já sua sugestão de que o homem chegou às Américas entre 30 mil e 100 mil anos atrás é bastante polêmica. Ela ainda não encontra aceitação entre seus pares.”

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egundo Neves, que também é um grande crítico da visão clássica sobre a entrada do homem em nosso continente, não há dúvidas com relação às idades fornecidas pelas datações efetuadas em material coletado em São Raimundo Nonato. O que se questiona é se os instrumentos líticos encontrados em Pedra Furada foram realmente feitos por mãos humanas. “Minha impressão sobre o assunto mudou muito nos últimos anos. A convite da própria Niède, tive a oportunidade de analisar os instrumentos líticos desse sítio polêmico há alguns anos. Hoje estou 99% convencido de que se trata de fato de artefatos produzidos pelo homem. O Prêmio Conrado Wessel para o trabalho da Niède é mais do que merecido”, afirma o pesquisador da USP. A arqueóloga francesa Anne Marie-Pessis, atualmente professora da Univer-

sidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pesquisadora da Fumdham, trabalha com Niède nas terras do semiário do Piauí desde 1982. Seu depoimento ajuda a dimensionar a importância da atuação de Niède numa área remota do país. “Desde o início das pesquisas numa região então desconhecida, que hoje é o Parque Nacional Serra da Capivara, a Niède adotou uma abordagem pluridisciplinar nas pesquisas científicas e integrou cientistas de diversas áreas do conhecimento”, diz Anne Marie, que publicou dois livros sobre o parque, um referente às pinturas rupestres e outro sobre o bioma e as sociedades humanas da região. “Essa interação continuada entre especialistas das ciências naturais, do ambiente e das ciências humanas estruturada em torno do fenômeno arqueológico resultou na construção da atual pesquisa interdisciplinar. Para os estudantes e jovens cientistas que participaram de seus trabalhos foi muito enriquecedor transcender os limites de uma única disciplina fragmentada e se aprofundar em temas, métodos e técnicas que desafiavam as tentações interpretativas generalizantes da arqueologia e da antropologia.” n

Niède em escavação de 1980 (ao lado) e no parque, em 2014: patrimônio cultural da humanidade

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arte

Vestígio das águas

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s 70 anos de lançamento de Pedra do sono, em 2012, livro de estreia de poesia de João Cabral de Melo Neto, sugeriu a Gilvan Barreto, pernambucano morador do Rio de Janeiro, rodar o semiárido de seu estado à procura de água. O trabalho rendeu o ensaio O livro do Sol feito no verão de 2013, quando ocorreu o auge da maior seca dos últimos 60 anos no Nordeste. “Fiquei um mês buscando vestígios do culto à água, tendo a obra de João Cabral como um guia”, conta Barreto. Suas fotos ganharam o primeiro lugar do prêmio de Arte da FCW 2013. O paulista Lalo de Almeida ganhou o segundo lugar com Belo Monte – Os impactos de uma megaobra sobre o entorno da hidrelétrica que está sendo construída no Pará. Roberta Sant’Anna, de Porto Alegre, ficou em terceiro, com Parque aquático. Barreto recebeu R$ 114,3 mil e os outros dois, R$ 42,8 mil cada um, além da escultura de Vlavianos. A FCW recebeu em 2013 inscrições de 305 fotógrafos, entre ensaios publicados e inéditos, de 18 estados, além do Distrito Federal. Os trabalhos dos 12 finalistas de Arte foram expostos em um dos espaços da Sala São Paulo no dia 9 de junho, dia da premiação. Rubens Fernandes Júnior, curador de fotografia da FCW e diretor da Faculdade de Comunicação e Marketing da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), presidiu o júri de 10 professores e fotógrafos.

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2013 finalistas e ensaios Daniel Soares Marenco sem título Davilym Dourado Carros Edson Viggiani Junior Bom Retiro: o lugar do devir Fernando Bohrer Schmitt Vocação singular Jomar Bragança Paisagem confrontada José Cintra Baptista Churros, pipoca e progresso... José Eduardo Nogueira Diniz Os espiões Luiz Arthur Leitão Vieira O espetáculo do crescimento Marco Antonio Santos da Rocha Filho Já não é mais verão Marlos de Almeida Bakker Com que sonham os peixes? Valdemir Magalhães Cunha Minha pequena Alemanha Wilson César Ferreira Totens


ensaio fotogrรกfico 1ยบ lugar O livro do Sol, de Gilvan Barreto

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Por um mês, Gilvan Barreto percorreu o sertão pernambucano procurando registrar o que chamou de “vestígios do culto à água”. Era o verão de 2013 e a região passava pela pior seca em 60 anos. O livro de estreia do poeta João Cabral de Melo Neto, Pedra do sono (1942), orientou o ensaio premiado

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2º lugar Belo Monte – Os impactos de uma megaobra, de Lalo de Almeida

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As fotos foram feitas em Altamira, cidade próxima de onde está sendo construída a hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. O local, que já tinha uma infraestrutura precária, teve sua população aumentada em 50% em dois anos. Lalo de Almeida retratou situações que se agravaram, como a violência, a habitação, o trânsito e o saneamento básico

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3º lugar Parque aquático, de Roberta Sant’Anna

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Roberta Sant’Anna percorreu os parques aquáticos de cidades do Rio Grande do Sul nos verões de 2012 e 2013. O objetivo foi simples: mostrar as pessoas relaxadas, em um ambiente de férias, onde as inibições do cotidiano são deixadas de lado

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2009 fotografia publicitária 1º lugar Ousadia ímpar, de Denise Wichmann

2011

fotografia publicitária

ensaio fotográfico

1º lugar Cantora de ópera,

1º lugar

de José Luiz

Albinos,

Pederneiras

de Gustavo Lacerda

2º lugar

ensaio fotográfico publicado

Negros paroxismos, de Lucio Adeodato

3º lugar Panoramas,

ensaio fotográfico

1º lugar A curva e o caminho,

de Cassio Vasconcellos

ensaio fotográfico publicado

de André François

1º lugar TV P&B, de Tadeu Vilani

ensaio fotográfico 1º lugar

1º lugar

Sufocamento,

O sol no céu

de Pedro David

de nossa casa, de

2º lugar

Marcio Rodrigues e

2º lugar

Marco Mendes

Vi elas,

Planos de fuga,

de Francilins

2º lugar

de Mauro Restiffe

2º lugar

Imagens humanas,

3º lugar

Drom,

de João Roberto

Belvedere,

o caminho cigano,

Ripper

de Bob Wolfenson

de Gui Mohallem

3º lugar Índios contemporâneos,

ensaio fotográfico inédito

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2010

ensaio fotográfico inédito 1º lugar Cidadão X, de Júlio Bittencourt

de Kenji Arimura

2012

Castilho Leal

3º lugar Sem título, de Ricardo Barcellos

2008


2005

2003

fotografia publicitária

fotografia publicitária

1º lugar

1º lugar

Existem chances

Campanha do

fotografia publicitária

de cura...,

produto giz,

de Maurício Nahas

de Bob Wolfenson

1º lugar

2º lugar

Tim: viver sem

Gol. Sempre

fronteiras,

fiel a você...,

de Gustavo Lacerda

de Andreas Heiniger

2º lugar

3º lugar

Abraço,

Lonas Alpargatas:

de Ricardo de Vicq

o superpoder do caminhoneiro,

2007

2º lugar

de Gustavo Lacerda

Ensaio fotográfico

Píer, de Leonardo Martins Vilela, para G’Staff

fotografia publicitária

3º lugar Menino com bola,

fotografia publicitária

1º lugar Caminhos do coração, de Alexandre

1º lugar

Salgado

Irado,

2º lugar

1º lugar

120 razões para ser

O chão de

cliente completo,

Graciliano,

de Gustavo Lacerda

de Tiago Santana

de Ricardo Cunha

de Márcia Ramalho

2002 fotografia publicitária 1º lugar

2º lugar

Colorama,

Numa janela

de Klaus Mitteldorf

do edifício Prestes Maia, 911, de Julio Bittencourt

2º lugar

ensaio fotográfico 1º lugar

Borboleta,

Redemunho,

3º lugar

AXE,

de João Castilho

Gordinha,

de Maurício Nahas

de Paulo Vainer

2º lugar

de Felipe Hellmeister

2º lugar O homem e a terra, de Lalo de Almeida

2006

2004

3º lugar ISA - Projeto Água Viva, de Allard

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Instituições Parceiras da FCW Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP Ligada à Secretaria do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, é uma das principais agências de fomento à pesquisa científica e tecnológica. Desde 1962 concede auxílio à pesquisa e bolsas em todas as áreas do conhecimento, financiando atividades de apoio à investigação, ao intercâmbio e à divulgação da ciência e tecnologia em São Paulo. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes Vinculada ao Ministério da Educação, promove o desenvolvimento da pós-graduação nacional e a formação de pessoal de alto nível, no Brasil e no exterior. Subsidia a formação de recursos humanos altamente qualificados para a docência de grau superior, a pesquisa e o atendimento da demanda dos setores públicos e privados. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq Fundação vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia para apoio à pesquisa brasileira, que contribui diretamente para a formação de pesquisadores (mestres, doutores e especialistas em várias áreas do conhecimento). É uma das mais sólidas estruturas públicas de apoio à ciência, tecnologia e inovação dos países em desenvolvimento. Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC Fundada há mais de 50 anos, é uma entidade civil, sem fins lucrativos, voltada principalmente para a defesa do avanço científico e tecnológico e do desenvolvimento educacional e cultural do Brasil. Academia Brasileira de Ciências – ABC Sociedade civil sem fins lucrativos, tem por objetivo contribuir para o desenvolvimento da ciência e tecnologia, da educação e do bem-estar social do país. Reúne seus membros em 10 áreas das Ciências: Matemáticas, Físicas, Químicas, da Terra, Biológicas, Biomédicas, da Saúde, Agrárias, da Engenharia e Humanas. Academia Brasileira de Letras – ABL Fundada em 20 de julho de 1897 por Machado de Assis, com sede no Rio de Janeiro, tem por fim a cultura da língua nacional. É composta por 40 membros efetivos e perpétuos e 20 membros correspondentes estrangeiros. Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial Criado na década de 1950, é uma organização do Comando da Aeronáutica que tem como missão o ensino, a pesquisa e o desenvolvimento de atividades aeronáuticas, espaciais e de defesa, nos setores da ciência e da tecnologia. Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa Organização sem fins lucrativos que tem por objetivo maior articular os interesses das agências estaduais de fomento à pesquisa em todo o país. Criado oficialmente em 2007, o conselho já agrega fundações de 22 estados mais o Distrito Federal. Marinha do Brasil Integrante do Ministério da Defesa. Contribui para a defesa do país e atua na garantia dos poderes constitucionais e em apoio à política externa do país. Academia Nacional de Medicina – ANM Fundada em 1829, contribui para o estudo, a discussão e o desenvolvimento das práticas da medicina, cirurgia, saúde pública e ciências afins, além de servir como órgão de consulta do governo brasileiro sobre questões de saúde e educação médica.

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Júri dos prêmios FCW de 2013 ciência

parceira que indicou

Jacob Palis Jr. / Presidente abc Carlos A. Vogt fcw Erney Plessmann de Camargo Fcw Glaucius Oliva Cnpq Hernan Chaimovich FAPESP Jorge Almeida Guimarães Capes José Roberto Drugowich de Felício Fcw Marcello André Barcinski Capes Marco Antonio Sala Minucci FCW Mario Neto Borges Confap Regina Pekelmann Markus Sbpc Sergio Machado Rezende FCW Vilson Rosa de Almeida DCTA Wilson Barbosa Guerra Marinha do Brasil

cultura Carlos A. Vogt / Presidente Fcw Aldo Malavasi SBPC Ana Mae Tavares Bastos Barbosa Fcw Celso Lafer Fapesp / ABL Domício Proença Filho Abl Liane Hentschke CNPq

medicina Renata Caruso Fialdini / Presidente Fcw Angelita Habr-Gama FCW Erney Plessmann de Camargo Fcw Guilherme Suarez Kurtz Capes Marcelo André Barcinski FCW Marcos Fernando de Oliveira Moraes ANM Manoel Barral Netto CNPq Rubens Belfort Mattos Júnior ABC Walter Colli FAPESP

Arte / ensaio fotográfico Rubens Fernandes Junior / Presidente Fcw Cláudia Guilmar Linhares Sanz UnB Helouise Lima Costa MAC-USP Joaquim Marçal Ferreira de Andrade PUC-Rio José Afonso da Silva Júnior UFPE Juan Esteves Revista Fotografe Melhor Mariano Klautau Filho Unama Pedro David Vencedor do prêmio FCW de Arte 2012 Ricardo de Leone Chaves Fotógrafo e editor do jornal Zero Hora Ronaldo Entler Facom-Faap

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CRONOGRAMA DA PREMIAÇÃO 2014 Prazo para recebimento das indicações (Ciência e Cultura)

Preparação dos dossiês dos indicados (Ciência e Cultura)

17 a 25 de novembro de 2014

Julgamento e escolha dos premiados (Ciência e Cultura)

27 e 28 de novembro de 2014

Prazo para recebimento das inscrições (Arte)

Escolha dos premiados (Arte)

Cerimônia de premiação

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14 de novembro de 2014

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15 de dezembro de 2014 a 10 de março de 2015

23 a 27 de março de 2015

15 de junho de 2015




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