Naquela noite e book desenhos pinheiro

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NAQUELA NOITE

Trabalho realizado pelos alunos do 9.ยบ ano do Agrupamento de Escolas de Palmeira | 2012

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“A cidade estava deserta, abandonada. Para onde fora aquela gente que vira há pouco? Começou a sentir-se só, tomado de uma sensação esquisita. Olhou o relógio: dez e dez. A hora de começarem os cinemas. Mas naquela noite não havia cinemas, não havia pessoas, não havia nada. Que mundo estranho! Então era aquilo a famosa noite de consoada!”

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Tinha perdido a noção do tempo. Naquele dia, todos estariam felizes e em família, mas ele estava só, a interrogar-se como havia ficado ali, sem uma única pessoa que lhe fizesse companhia.

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À sua volta só via luzes que atravessavam as janelas das casas que havia naquela rua. Nada mais. Sentia-se só, como nunca antes se havia sentido, pois aquela noite era especial.

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Ele não sabia sequer o porquê de ter ficado sozinho, mas a verdade é que a sua solidão já vinha de há muitos anos atrás.

Abandonado em criança; uma infância num orfanato; um resto de vida pelas ruas a tentar encontrar o seu anjo da guarda…

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Era dono das ruas, mas nada nas ruas lhe pertencia.

Cada dia que passava na sua vida era um dia perdido pois nada havia ganho. Apesar dos seus esforços na adolescência e no início da sua vida de adulto, nada tinha conseguido. Não tinha uma carreira e tinha perdido todos os seus sonhos e objetivos. Não era feliz. Comia aquilo que encontrava e vivia com aquilo que os outros já não queriam viver. Já há muitos anos que a sua noite de consoada era assim. 6


Contudo, ele tinha esperanรงa que algo de bom lhe acontecesse, pois hรก um ano, nesse mesmo dia, tinha pedido a uma estrela que lhe desse pelo menos um dia de felicidade na sua vida. 7


“Será ela capaz de concretizar este meu único pedido em trinta anos de pura solidão?”- pensava ele todos os dias. Era uma incógnita. Mais que um pedido, era uma enorme vontade de mudar de vida. Mas seria esta noite diferente de todas as outras? Seria a estrela capaz de oferecer uma vida digna àquele homem que nada de mal fez para merecer tão baixo nível de vida?

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Seria possível as pessoas começarem a olhá-lo com outros olhos? Seria possível um dia ele ter uma família, descobrir o que é ser feliz por um momento que fosse?

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Pela noite dentro, envolto nos seus pensamentos, o homem caminhava sozinho e triste, com frio e fome.

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Todos sabiam que ele não fazia mal a ninguém e que um dia a sorte iria bater-lhe à porta. Mas já estava a ficar farto de esperar. A sua esperança diminuía a cada momento. Tinha fome. Procurou o que comer, pois a fraqueza já o dominava. A tristeza envelhecia o seu olhar e as próprias ruas, já fartas de ver o seu sofrimento e de escutar os seus lamentos, esperavam também ansiosas a atenção da estrela.

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Seria hoje, passado um ano, que a estrela iria concretizar o seu único desejo, aquele em que pensava todos os dias? Reacendeuse a esperança. Afinal, era noite de consoada!

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O seu pensamento fê-lo recuar trinta anos da sua vida. Sempre tivera curiosidade em conhecer os seus pais. “Por que o teriam abandonado ao deusdará?” Esta era a pergunta que constantemente lhe atropelava as ideias. Todos os dias pensava se não poderia ter tido uma vida diferente e feliz, como aquelas que ele podia imaginar por detrás das cortinas das janelas iluminadas, nas casas que se viam ao longo das ruas da cidade. 13


Lá no alto, a estrela observava todos os seus passos, seguia o seu coração, sentia o seu respirar e esperava a altura certa de o poder ajudar, de lhe revelar o

seu anjo da guarda. Depois de muito caminhar, ouviu vozes e risos vindos de uma casa próxima. Espreitou por uma das janelas daquela casa enorme e distinta e viu a felicidade das crianças com a família reunida. Como gostaria de viver naquele ambiente alegre e acolhedor! 14


Continuou a vaguear pela escuridão da noite até chegar a um banco no meio de uma praça.

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Sentou-se e aconchegou os farrapos que lhe cobriam o corpo. Esticou o cobertor que lhe haviam dado e acabou por adormecer. Acordou com as doze badaladas da meia-noite. Ergueu-se devagar e o que viu ao levantar-se deixou-o intrigado.

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Viam-se pontos de luz… aquele banco, aquele céu, aquelas ruas… nada se parecia com aquilo que prendeu o seu olhar horas antes. No seu olhar, um brilho especial, a criança que este era há trinta anos atrás estava de novo a viver. A excitação que atravessava o seu corpo, o desejo que tanto ansiava que acontecesse… era agora a realidade!

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Uma criança fitava-o com uns enormes olhos, parecia tanto ele, tanto a

imagem que se desvanecia ao longo dos tempos... Chamou-o, sussurrou-lhe ao ouvido algo que ele não entendeu. Estendeu-lhe a mão e conduziu-o para a sua casa. Era uma casa acolhedora, envolta num espírito natalício.

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Num cantinho da sala, lá estava ela: a árvore dos sonhos de todas as crianças, com alguns presentes. Em cima da mesa de jantar, uma ceia especial e as iguarias da quadra natalícia consolavam aquele homem que esperou ansiosamente por um milagre. 19


No calor daquela casa, também o seu coração se encontrava agora bem mais cheio de felicidade. Que conforto, que satisfação e que magia lhe transmitia aquela família onde se encontrava agora! Tudo era extremamente surreal para ele.

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Na longa conversa da noite, aquele mesmo homem que horas atrรกs se sentia sozinho, abandonado, perdido, contava agora a sua histรณria de vida, de hรก trinta anos. 21


- Sabes, esta é a melhor noite da minha vida! Durante todos estes anos vivi sempre só, apenas tive comigo a força e a coragem de nunca desistir de sonhar. Em pequeno fui abandonado pelos meus pais, não conheci ninguém da minha família. dizia ele, conversando com um dos irmãos, sem o saber.

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E continuava: - Sei que tinha irmãos. Vários, penso eu. Lembrome vagamente de um casebre onde vivíamos pobres… mas felizes! Não sei o que é feito deles, se são vivos, sequer… Depois a minhas lembranças são só tristezas: abandono e solidão. Trinta anos de pura solidão, sempre rodeado de gente apressada. Ninguém sequer para conversar… Como estou feliz hoje, aqui, neste momento! - Ainda bem! – dizia o seu interlocutor. - Estamos no Natal e costumamos partilhar o Natal com todos os que nos batem à porta. Este ano 23


foste tu que resolveste aparecer em nossa casa. - Mas não fui eu que decidi! Foi uma criança que me trouxe até aqui! – exclamou, olhando atentamente para todos os recantos da casa. - Onde está ela agora, que não a vejo!? Observou de novo aquela sala. De repente o seu olhar deteve-se numa pequena moldura de madeira antiga. Servia de suporte a uma fotografia amarelecida pelo tempo em que sobressaíam os olhos vivos e enormes de uma criança. 24


Era a criança que o conduzira até àquela casa. Como poderia ser? Aproximou-se sempre acompanhado do anfitrião. Na fotografia havia outras pessoas. Reconheceu alguns traços das faces e o seu pensamento voltou ao passado, ao casebre… aos rostos familiares… Uma luz iluminou-se no seu espírito.

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- Quem são estas pessoas? – perguntou ele ao dono da casa. - Esta é a minha família: os meus pais e os meus irmãos. Este é o meu irmão que desapareceu de casa e nunca mais soubemos dele. – respondeu. 26


- O que lhes aconteceu? – quis saber. - Procurámo-lo por toda a parte, mas não o encontrámos. O meu pai teve de emigrar para a grande cidade. A minha mãe perdeu a alegria de viver e acabou por definhar com o desgosto. Fomos cada um para seu lado e eu fiquei-me por aqui e aqui vivo feliz com os meus. Emocionado, concluiu: - Mas hoje é Noite de Natal. É tempo de paz e alegria.

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O homem solitário sentiu-se mais e mais feliz. O desejo formulado há um ano atrás concretizara-se. Aquele momento era o que tinha pedido à estrela. Tinha encontrado o seu anjo da guarda. A partir daí a sua vida só poderia mudar.

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Lรก fora o frio varria as ruas.

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Na escuridĂŁo do cĂŠu uma estrela brilhou e iluminou aquela casa.

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