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Diaconia
Para fora dos muros da igreja Restabelecer dignidade ONG cristã Bem-estar social Dimensão da missão Fé e amor atuante Deixar-se carregar
ÍNDICE
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FAMÍLIA
Por uma vida sem violência
Ano 12 –> Número 55 –> Julho a Setembro de 2014
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Lições de uma catástrofe
Casa das diaconisas aos 75 anos
SOLIDARIEDADE
irmandade
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comissão da verdade Resquícios da ditadura
SEÇÕES PALAVRAS CRUZADAS > 6 MOSAICO BÍBLICO > 6 NOTAS ECUMÊNICAS > 7
38 REFLEXÃO Olhar para o alto
36
ENTREVISTA
Dr. Ricardo Siegle Gripes e resfriados
CONSULTÓRIO DA FÉ > 33 O REFORMADOR > 34 DE OLHO NA EDUCAÇÃO > 35 ESPIRITUALIDADE > 40 PENÚLTIMA PALAVRA > 42 NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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AO LEITOR Revista trimestral da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil-IECLB, editada e distribuída pela Editora Sinodal CNPJ 09278990/0002-80 ISSN 1679-9052
Diretor Nestor Paulo Friedrich Coordenador Eloy Teckemeier Redator João Artur Müller da Silva Editor Clovis Horst Lindner Jornalista responsável Eloy Teckemeier (Reg. Prof. 11.408) Conselho editorial Clovis Horst Lindner, Doris Helena Schaun Gerber, Eloy Teckemeier, Ingelore Starke Koch, João Artur Müller da Silva, Marcelo Schneider, Nestor Paulo Friedrich, Olga Farina e Vera Regina Waskow. Arte e diagramação Clovis Horst Lindner Criação e tratamento de imagens Mythos Comunicação - Blumenau/SC Capa Arte: Cristiano Zambiasi Jr. Impressão Gráfica e Editora Pallotti Colaboradores desta edição Armindo Klumb, Denise Falcke, Emílio Voigt, Gisela Beulke, Helio Teixeira, Helmar R. Roelke, Ingrit Vogt, Irineu Valmor Wolf, Joaninho Borchardt, Katilene Wilms Labes, Leandro Hofstaetter, Luciana Reichert, Micael V. Behs, Nestor Paulo Friedrich, Neusa Butzlaff, Osvino Toillier, Roberto E. Zwetsch, Rodolfo Gaede Neto, Rui Bender, Ruthild Brakemeier, Simone Engel Voigt, Susanne Buchweitz, Valério G. Schaper, Valmi Ione Becker e Werner Kiefer. Publicidade Editora Sinodal Fone/Fax: (51) 3037.2366 E-mail: editora@editorasinodal.com.br Assinaturas Editora Sinodal Fone/Fax: (51) 3037.2366 E-mail: novolhar@editorasinodal.com.br www.novolhar.com.br Assinatura anual: R$ 30,00 Correspondência E-mail: novolhar@editorasinodal.com.br Rua Amadeo Rossi, 467 93030-220 São Leopoldo/RS
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Diaconia: igreja em ação
A
Novolhar está de volta. Estamos felizes, porque uma legião de fãs muito maior do que nossa carteira de assinantes resolveu mobilizar-se contra o fim da publicação. O resultado está aí com esta primeira edição depois da crise. Obrigado a todas as pessoas que se mobilizaram nos sínodos, nas comunidades, no corpo editorial, nas redes sociais, dentro da Editora Sinodal e na direção da nossa igreja. Mas o retorno não é tudo. Agora a tarefa comum é angariar assinaturas e manter a chama acesa. A primeira edição chega até você com uma ampla série de reportagens sobre “Diaconia”, a tarefa mais encarnada da igreja de Jesus Cristo, pela qual ela é convocada a sujar as mãos com as dores do mundo. Tais dores são muitas e conclamam a cristandade a sair de seus claustros, estendendo mãos e dons em direção aos “pequeninos irmãos” do nosso Mestre. O alcance dessa faceta missionária da igreja vai muito além do assistencialismo, desafiando para a ação social responsável e eficiente num mundo carente de solidariedade e repleto de feridas abertas. A volta da revista também é acompanhada de algumas novidades editoriais. A primeira delas é a introdução de “Palavras Cruzadas” no lugar da seção “Olhar com Humor”. A criação das peças é um hobby do pastor aposentado Irineu Valmor Wolf, que irá preparar alguns de seus desafios exclusivamente para a Novolhar. Duas novas seções, além dessa, foram introduzidas na revista. A primeira abre espaço para a educação, na pena inspirada e sábia do professor e escritor Osvino Toillier, que nos brindará com seus belos textos a cada nova edição na seção “De Olho na Educação”. A segunda conta com a interação e a curiosidade do nosso leitor e da nossa leitora. Com o título “Consultório da Fé”, a revista abre espaço para perguntas sobre a fé. Envie-nos as suas dúvidas e deixe-nos conhecer a sua curiosidade. A cada edição, vamos responder a uma pergunta. Como sempre foi nos últimos dez anos, também agora a Novolhar continua com um denso leque de reportagens para sua informação e lazer. Fazemos votos de que você possa divertir-se com o conteúdo das páginas que seguem. EQUIPE DA NOVOLHAR
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OPINIÃO
Al-Anon Queremos expressar nossa gratidão pelo generoso espaço de duas páginas na revista Novolhar de novembro/dezembro de 2013 para a divulgação do Al-Anon em nível nacional. Como um programa de recuperação para familiares e amigos de alcoólicos, o instigante título “Coragem para mudar” certamente chamou a atenção sobre o assunto, reforçado pela chamada de capa e no índice da revista. Com essa publicação a Novolhar contribuiu imensamente para tornar o Al-Anon mais conhecido em todo o território nacional. No Brasil, há perto de 700
Grupos Al-Anon e cerca de 20 Grupos Alateen (para jovens de 12 a 19 anos) auxiliando no resgate da sanidade e da dignidade perdida em muitos lares de alcoólicos. Gratos mais uma vez, recebam nossos cumprimentos pela excelente revista que é a Novolhar, e compartilhamos da alegria de muitos com a notícia da retomada da publicação (interrompida em dezembro passado). Elisabeth L. Gubert – por e-mail Coordenadora do Serviço de Informação Al-Anon Gaúcho
Pentecostes e enchentes O que uma coisa tem a ver com a outra? Em princípio, foi mera coincidência. Enquanto celebrávamos nas comunidades onde era possível, havia outras isoladas pelas águas dos rios que transbordavam. As chuvas que se precipitaram sobre a Região Norte Catarinense no sábado e domingo, 7 e 8 de junho, fizeram com que muitas famílias da região tivessem que abandonar com urgência as suas casas. Segundo informações da Defesa Civil, 42 municípios de Santa Catarina
foram afetados pelas chuvas, a maioria deles já decretou situação de emergência ou de calamidade pública. No Sínodo Norte Catarinense, os municípios mais afetados em Santa Catarina foram: Jaraguá do Sul, Guaramirim, Massaranduba, Schroeder, Corupá, Rio Negrinho, Mafra, Canoinhas, Porto União. Também no Paraná na área de abrangência do SNC, foram atingidos os municípios de Rio Negro, Campo do Tenente, Cruz Machado, União da Vitória, Colônia Amazonas, Porto Vitória entre outros. Com a rápida intervenção da Defesa Civil, Corpo de Bombeiros, Exército e cooperação da comunidade foi possível evitar uma tragédia maior. Muita gente pôde experimentar a solidariedade concreta; tanto no ajudar como no receber. Assim formamos uma grande corrente de solidariedade ecumênica e vidas em comunhão. INÁCIO LEMKE – por e-mail Teólogo e pastor sinodal do Sínodo Norte Catarinense em Joinville (SC)
Ordem na casa ou falta de visão missionária? Membros afastados não se sentem bem em nossa comunidade. Eis aí um tema delicado. A comunidade de Jesus Cristo que não consegue reconciliar-se com os seus irmãos afastados não tem credibilidade para falar em fazer missão. Ainda mais quando ela vê como normal que as pessoas se desliguem da comunidade para se filiar a outras denominações. Será que a causa do afastamento reside no membro que sai, que não participa, não contribui, que até de “sócio” é tachado? Que tal a gente se colocar no lugar dele? Ou melhor, fazer-lhe uma visita para nos colocar a seu lado; não para acertar contribuições em atraso, não para falar de dinheiro, mas para ouvi-lo com o coração, para compreender os seus motivos, as suas dores e dispor-nos a compartilhá-los? Ao longo do meu ministério, tenho observado que a causa do afastamento geralmente está dentro da comunidade, e não no membro afastado. Pode ser doloroso, mas é preciso reconhecer que a prática comunitária que enaltece os méritos humanos machuca os pobres e humildes e dificulta, entre nós, a vivência da justificação pela graça de Deus. O caminho da reconciliação requer revisão de atitudes e mudanças na forma de exercitarmos o nosso modo de ser comunidade, de viver a fé, de escolher as lideranças, de lidar com os recursos financeiros, de praticar a voluntariedade, a partilha e a comunhão. Afinal, a graça de Deus nos basta ou precisamos de um monte de regras legalistas que põem ordem na comunidade e que, ao mesmo tempo, afastam os mais fracos do rebanho? Crer “que o poder se aperfeiçoa na fraqueza” (2 Coríntios 12.9) é, acima de tudo, confiar no Deus que não nos deixa faltar nada e nos ensina a alegria de abraçar o irmão, a irmã que voltam para casa (Lucas 15.11 ss). A comunidade de Jesus vive do perdão, e como tal é acolhedora, valoriza todos os dons, reconcilia-se com os afastados e confia na capacidade de decisão e de contribuição voluntária de cada um de seus membros. GERALDO SCHACH – por e-mail Teólogo e ministro aposentado em Itapema (SC) NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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CRUZADAS
MOSAICO BÍBLICO
Diaconia Ruínas na Ilha de Malta
Cultura mediterrânea por Emilio Voigt
Novolhar inova! A partir desta edição, você é desafiado a encontrar as palavras e compor as Cruzadas, montadas pelo pastor emérito Irineu Valmor Wolf, de Indaial (SC). Bom divertimento!
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Cada povo possui características particulares, que se manifestam, por exemplo, em diferentes línguas e costumes. Estudos indicam que, nos tempos bíblicos, havia elementos comuns a diversos povos em torno do mar Mediterrâneo. Um elemento importante era a interdependência entre pessoa e grupo. Na cultura mediterrânea, as pessoas não se compreendiam como indivíduos isolados, mas como parte de um grupo. O indivíduo é aquilo que o grupo é. Por isso as pessoas orientavam suas convicções e atitudes de acordo com regras e expectativas do grupo. Não existia o que chamamos de individualismo. Outro princípio que determinava as relações entre as pessoas era a reciprocidade. Esse princípio é simples: cada bem ou favor recebido é retribuído de alguma forma. Um convite para uma refeição, um pequeno presente ou uma boa ação sinalizavam o início de uma relação de reciprocidade. Os bens e favores nem sempre correspondiam. O importante é que a troca estivesse baseada em apoio mútuo. Por fim, os termos honra e vergonha manifestam valores que eram desejáveis ou que deveriam ser evitados. Honra e vergonha determinavam o status de uma pessoa dentro de um grupo. Honra é o valor que alguém tem aos olhos da sociedade. Por isso buscava-se realizar certas ações para conquistar honra. Tanto no judaísmo como no cristianismo havia críticas ao ideal de honra e vergonha. O Evangelho de João diz que não se deve aceitar glória (honra) das pessoas, mas a glória que vem de Deus (João 5.44). Da mesma forma, Lucas 22.24-26 indica que a maior honra consiste em servir, e não em ser servido. N EMILIO VOIGT é teólogo e assessor de Formação do Sínodo Vale do Itajaí da IECLB em Blumenau (SC)
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Notas ecumênicas Demitido
Luteranos em crescimento
Naveen Qayyum / WCC
A igreja luterana cresce. De acordo com uma pesquisa entre as 142 igrejas-membro, dez comunidades reconhecidas e dois reconhecidos conselhos de igreja da Federação Luterana Mundial (FLM), a comunidade conta atualmente com 72.268.329 membros em 79 países. Isso representa um aumento de quase 2,5% em relação ao último levantamento em 2011.
As igrejas-membro na África e na Ásia continuam crescendo. As igrejas africanas da FLM relataram 3% mais membros do que em 2011. Ainda mais rapidamente crescem as igrejas luteranas na Ásia, que, de acordo com as estatísticas, registraram um crescimento de 19%. As igrejas-membro da FLM na América do Norte, Europa e na América Latina e no Caribe registraram um ligeiro declínio no número de membros. Na América do Norte, o número de membros diminuiu 7,8%, e na Europa, 1,6%. Na América Latina e no Caribe, a membresia, apenas 0,3% menor, mantém-se relativamente constante.
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a segunda reunião da Junta Diretiva do Conselho Latino-Ameri cano de Igrejas (CLAI) sob a presidência do Rev. Felipe Adolf, reunida em maio em Bogotá, na Colômbia, foi decidida a demissão do secretário-geral do CLAI, Rev. Nilton Giese (foto), pastor da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). Em carta enviada às igrejas-membro do CLAI, datada de 15 de maio, Adolf afirma: “Esse processo de reestruturação requer assumir uma visão crítica da estrutura como instituição e linha de ação. Para isso será feita uma avaliação institucional que permita aprofundar sua orientação estratégica e programática. Essa proposta de reestruturação será apresentada à Junta Diretiva em sua próxima reunião no mês de março de 2015. Neste marco, a Junta Diretiva considerou que era necessária uma mudança na Secretaria-Geral e decidiu rescindir os serviços do secretário-geral, Rev. Nilton Giese, a quem expressamos nossa gratidão pelo tempo que desenvolveu seu ministério com o CLAI”. Em nota, o pastor presidente da IECLB, Nestor Paulo Friedrich, manifestou mal-estar pela demissão do Rev. Giese e ameaça suspender a participação da igreja brasileira no CLAI.
Pastor Nilton Giese
AMPARO LEGAL É necessário dialogar sobre os direitos da vida comum entre pessoas do mesmo sexo que decidiram viver juntas. Elas necessitam de um amparo legal na sociedade. DOM LEONARDO STEINER é secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
CESE premiado O Programa Ação para Crianças, da Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), com sede em Salvador (BA), recebeu em maio o troféu do Prêmio Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). O Prêmio ODM é uma iniciativa do governo federal em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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CAPA
Para fora dos muros da igreja por Rui Bender
a PALAVRA DIACONIA TRANSMITE DESEJO DE MEDIAÇÃO. DEFINE O ESPÍRITO CENTRAL QUE MOVE A AÇÃO SOCIAL DA IGREJA, COMO UM BRAÇO DELA EM DIREÇÃO AO MUNDO E SUAS DORES. PELA DIACONIA, A CRISTANDADE ASSUME TODAS AS CONSEQUÊNCIAS DO MANDAMENTO DO AMOR DADO POR JESUS. 8
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ertamente você já ouviu alguma vez na vida a palavra “diaconia”. Ela é mais conhecida no mundo protestante, sendo um termo de origem grega. Inicialmente, significa “serviço junto à mesa”. Posteriormente, o conceito foi ampliado para “serviço” em sentido geral. “Quanto ao significado teológico do termo, o Novo Testamento emprega-o com o sentido de serviço na causa do reino de Deus”, explica o pastor Rodolfo Gaede Neto, teólogo e professor da Faculdades EST em São Leopoldo (RS). Quanto à fundamentação bíblica, “a palavra de Jesus registrada em Marcos 10.45 é o principal alicerce da diaconia”, frisa Rodolfo. Para ele, a diaconia da igreja só pode ser construída sobre o fundamento da diaconia do próprio Jesus. “Se o próprio Jesus veio a este mundo para servir à causa do reino de Deus, seus seguidores e suas seguidoras são movidos por esse mesmo espírito de serviço”, observa o teólogo.
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Além de Jesus ter dedicado a própria vida ao serviço, “a diaconia ocupa um espaço importante também em suas atividades de ensino”, continua o professor. A parábola do bom samaritano é um exemplo desses textos de ensino, em que “o cuidado dispensado a uma pessoa machucada é considerado cumprimento do amor ao próximo” (cf. Lucas 10.25-37). Portanto o mandamento do amor ao próximo é a orientação básica para a ação diaconal. “Cumpri-lo equivale a colocar-se a serviço do cuidado de pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade”, salienta o teólogo. Mas ainda existem muitos outros textos bíblicos que servem de base para a diaconia. Tradicionalmente, a única tradução conhecida para o termo diaconia era “serviço”. Mas o teólogo britânico John Neil Collins contesta que essa
seja a única possibilidade de tradução. Ele argumenta que existem significados diferentes para a palavra diaconia no Novo Testamento, entre eles “mediação”. “Nesse caso, diaconia é o serviço de mediação entre a comunidade de fé e aquelas pessoas que estão fora dela”, conclui Rodolfo. As conse quências para o trabalho diaconal são várias. Rodolfo menciona duas: a) enquanto a palavra serviço pode ter a conotação de submissão (servilidade), mediação pode ter a conotação de uma função importante numa causa importante; b) diaconia enquanto mediação rompe as barreiras para fora da comunidade constituída e vai ao encontro das pessoas que se encontram na periferia. Por sua vez, o teólogo alemão Dierk Starnitzke diz que diaconia é o braço da igreja para fora de seus muros. Ele argumenta que, a partir de textos bíblicos, podemos afirmar a presença de Deus tanto no seio da comunidade reunida como junto daquelas pessoas que não podem vir à igreja porque estão lá fora na periferia. “Estar solidariamente com os pequeninos e as pequeninas lá fora é servir ao próprio Cristo, conforme atesta a narrativa de Mateus 25.31-46. Portanto a diaconia atua lá fora, representando a comunidade constituída, como se fosse seu braço estendido”, esclarece Rodolfo. Por isso, antes de construir templos, as comunidades e igrejas deveriam preocupar-se em sentir as necessidades das pessoas. O teólogo da Faculdades EST comenta que “a teologia vê o ser humano na sua integralidade”. Logo “não é possível separar suas necessidades materiais e espirituais. Apenas construir templos, ou seja, cuidar apenas da dimensão espiritual do ser humano, seria desconsiderar suas
demais necessidades. A solidariedade, o amor ao próximo, a diaconia são partes inerentes à fé cristã”. Lutero afirmava que uma boa árvore produz bons frutos. Ou seja, uma comunidade cristã exercita naturalmente o amor ao próximo a partir da fé. Além disso, a Constituição brasileira garante assistência a todos quantos dela necessitam. Temos legislações de proteção aos segmentos mais vulneráveis da sociedade (crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiências etc.). “Iniciativas importantes são tomadas por parte do Estado, investimentos volumosos são feitos para o desenvolvimento de projetos importantes na área social. Todavia o Estado ainda não consegue dar conta de toda a demanda existente nessa área. Os motivos certamente são muitos”, lamenta Rodolfo. Enquanto isso, as igrejas, quando são sérias e apresentam projetos que realmente visem diminuir os problemas da sociedade, têm acesso a recursos públicos da área social. “O problema é que há igrejas que confundem diaconia com proselitismo. Essas realizam ações sociais com o objetivo de aumentar o número de seus adeptos e não para contribuir na construção de uma sociedade de bem-estar social”, denuncia o teólogo. Ele observa que “a seriedade de uma igreja – no que diz respeito à questão social – mostra-se quando ela se interessa pelos conselhos municipais na área social e participa deles para a formulação e o acompanhamento de políticas públicas que visem à construção da cidadania”. No que diz respeito às organizações não-governamentais (ONGs), “elas têm um papel relevante na sociedade brasileira para o enfrentamento da questão social; aquele modelo criado nos anos 1970, com expressivo florescimento nos anos
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1980, hoje dá lugar a outras formas de organização e gestão, adequando-se ao atual momento político, econômico e social”, analisa Rodolfo. E acrescenta: “Todas as iniciativas sérias, sejam elas públicas, religiosas ou de organizações autônomas, têm seu lugar na sociedade civil, e as contribuições são bem-vindas e necessárias para a construção de uma sociedade que enfrenta de maneira organizada seus problemas na área social”. Que expectativas se tem em relação ao futuro da diaconia? “A diaconia, embora enfrente algumas dificuldades no que diz respeito à questão ministerial no interior das igrejas, tem perspectivas de um grande futuro quando se dispõe a contribuir na construção da cidadania no Brasil”, admite Rodolfo.
Ele cita os motivos: a) o Estado e a sociedade civil brasileira estão abertos à participação de todos os segmentos na busca do bem-estar social; b) a sociedade civil organizada necessita da contribuição das igrejas para enfrentar os problemas sociais; as igrejas sérias pautam-se por valores ligados à fé cristã que podem fazer uma grande diferença no engajamento social; c) além das igrejas históricas, que tradicionalmente manifestam preocupação com a questão social, hoje também igrejas pentecostais, quando se aprofundam na reflexão teológica, descobrem a diaconia como um campo interessante e necessário
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Um pouco de história As obras de misericórdia (dar de comer às pessoas famintas, dar de beber às pessoas sedentas, acolher as pessoas forasteiras, visitar as pessoas enfermas e presas e sepultar as pessoas mortas) têm sua origem no Egito Antigo. Lá elas eram tidas como código de cuidado das pessoas mais fragilizadas. O Novo Testamento acolheu as obras de misericórdia na fala de Jesus registrada em Mateus 25.31-46, dando-lhes tal importância que sua prática define a entrada no reino de Deus, enquanto a falta de sua prática exclui do reino de Deus.
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Reprodução Novolhar
por Rodolfo Gaede Neto
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paraRITA o pleno exercício do minisSURITA: térioGARANTIA da Igreja deDE Jesus Cristo neste mundo. SEGURANÇA “Se o próprio Jesus de Nazaré comALIMENTAR preendeu a sua missão neste mundo PARA O BRASIL, como sendo diaconia, as igrejas que COM VOLUME o seguem não podem fecharEos olhos diante do DIVERSIDADE. sofrimento de tantas pequeninas irmãs e tantos pequeninos irmãos”, adverte Rodolfo. E ele prevê: “O futuro da diaconia no Brasil está diretamente ligado ao estudo responsável da teologia, a uma profunda reflexão teológica que atente ao amor incondicional de Deus para com todas as suas criaturas, consideradas na sua N integralidade e dignidade”.
RUI BENDER é jornalista em São Leopoldo (RS)
Também o Judaísmo Antigo mantinha em sua legislação social expressamente a proteção das pessoas mais vulneráveis, especialmente de órfãos, viúvas, estrangeiros e pobres (Lv 19.9-10; 23.22; 25.35-38; Dt 24.19-22). Além disso, garante espaço, no profetismo, para a denúncia da exploração contra essas pessoas vulnerabilizadas (Am 8.4-6; Is 1.17,23; 2.11-15; 5.8; 65.17-25; Jr 23.2; Os 6.6). E, nos cultos, garante espaço para a lamentação das dores do indivíduo, como forma de compartilhamento do sofrimento com a comunidade reunida, um exercício profundamente terapêutico (Salmos de Lamentação). Na história da igreja cristã dos primeiros séculos, percebemos uma atuação determinada dos cristãos nas situações de epidemias, dedicando-se destemidamente a salvar vidas, a cuidar de enfermos e moribundos e a sepultar
dignamente os mortos. Dos assim chamados Pais da Igreja temos testemunhos de impressionante sensibilidade em relação aos problemas sociais da época, a exemplo de João Crisóstomo, Basílio Magno, Gregório de Nissa, Gregório de Nazianzo, entre outros. Na Idade Média, os mosteiros assumiram papel relevante no cuidado de pessoas pobres e doentes. Chama especial atenção a existência, naquela época, da roda dos excluídos: um recipiente giratório em que mães podiam colocar suas crianças que não podiam criar; fazendo girar o recipiente, as crianças iam para o interior do mosteiro, onde eram recolhidas, acolhidas, cuidadas, criadas e educadas. No século XIX, a diaconia refloresceu na Europa. O processo de industrialização gerou muita miséria. Grandes figuras surgiram para fazer frente à necessidade de cuidado de crianças, mulheres, pessoas com
deficiências, idosos, pobres etc., a exemplo de Johann Hinrich Wichern, Wilhelm Loehe, Theodor e Friederike Fliedner, Elizabeth Fry, Amalie Sieveking, Florence Nightingale e muitos outros e muitas outras. Como fruto do trabalho dessas pessoas foram criadas as instituições de formação de diaconisas, diáconos e diáconas e as instituições de cuidado de pessoas com deficiência, idosos etc., que existem até hoje em grande número. No contexto da Segunda Guerra Mundial, surgiram as grandes agências internacionais de cooperação, criadas com o objetivo de angariar fundos para apoiar o desenvolvimento de comunidades e regiões N empobrecidas mundo afora. RODOLFO GAEDE NETO é teólogo e professor da Faculdades EST em São Leopoldo (RS)
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CAPA
Restabelecer por Helmar R. Roelke
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exto clássico para definir a teologia diaconal de Jesus é Marcos 10.35-45, em que Jesus estabelece seus princípios: Servir em contraposição a poder e dominação. Para a reflexão sobre diaconia, também é apontado o texto de Mateus 25.31-46, em que estão resumidas as obras de misericórdia. Com isso já estamos no centro da teologia diaconal de Jesus, pois nos versículos 31 e 32 Jesus afirma que, quando “o Filho do Homem vier […], ele se sentará no seu trono real. Todos os povos da terra se reunirão diante dele […]”. Este é o centro da mensagem de Jesus: a universalidade da graça de Deus, manifestada nesse Reino. Esse Reino acontece onde discípulos e discípulas se deixam capacitar e advogam em favor do ser humano, que por sua origem divina precisa ser liberto de todos os interesses, teologias e ideologias que estancam vida digna. Nessa compreensão, Jesus não só anuncia o reino de Deus, mas também o faz acontecer. Seu anúncio e suas ações fazem com que o reino de Deus se torne palpável, palatável e evidente ao ser humano. Jesus anima em sua característica de liberdade evangélica a apontar para diversas possibilidades de compreensão diaconal. Também ele o faz quando enumera suas obras de misericórdia corporais, introduzindo nelas o uso de práticas já existentes em sua época.
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Diaconia como obra de misericórdia tendo o ser humano e a criação de Deus como objeto, observando que o afastamento de Deus implica o ser humano desconsiderar que é feito à semelhança de Deus e, como consequência, desobrigando-o a cuidar da boa criação de Deus. Diaconia como obra de misericórdia capacitando pessoas que descobrem que Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos. Diaconia como obra de misericórdia mantida de fora, como expressa vivencialmente o discípulo Lutero: “A minha força nada faz, sozinho estou perdido”. Diaconia como obra de misericórdia fomentada e alimentada por espiritualidade, que tenha critérios evangélicos, como Paulo expressa em Gálatas 5.16: “Quero dizer a vocês
o seguinte: deixem que o Espírito de Deus dirija a vida de vocês e não obedeçam aos desejos da natureza humana” (Gálatas 5.16). Em suas diversas manifestações, sempre se percebe que diaconia visa a valores que estabelecem o reino de Deus, pois o que importa é restabelecer a dignidade humana. Porém longe do pensamento de que só através dos agentes diaconais remunerados o Reino é tornado palpável e visível. É sempre bom sermos lembrados dessa marca e tesouro luterano do sacerdócio geral de todos os crentes, em que todos são agentes, mas ao mesmo tempo também objetos do agir de Deus na N consecução de seu Reino. HELMAR R. ROELKE é teólogo e pastor aposentado em Vitória (ES)
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Interessante observar que o Evangelho de Mateus, no qual Jesus enumera as obras de misericórdia, culmina com o “Ide…” (Mateus 28.19). O imperativo faz ver que a ordem é sermos ativos e não passivos. Para melhor entender o que é diaconia, poderíamos transformar o “Ide…” em gerúndio, transposição que podemos basear em Atos 9.2, onde os seguidores de Jesus são qualificados como aqueles que “eram do Caminho”. Toda ação diaconal assim estará sempre a caminho, vivendo, andando, vivenciando, de olhos e ouvidos atentos, ajudando onde há fome, onde há sede, onde há forasteiros, onde há enfermos, onde há presos. Disso deduzimos que não há uma fórmula pronta para ações diaconais. Importam a criatividade e a sensibilidade do ser humano com o ser humano. A comunidade cristã está sempre a caminho, procurando ser útil, pois cada momento histórico exige respostas diaconais concretas, calcadas nos jeitos de Jesus. Poderíamos, nessa concepção de liberdade e responsabilidade evangélica, arriscar indicar algumas obras de misericórdia e seus valores para os tempos atuais em nosso país e na IECLB. Sublinhando o gerúndio, para reforçar que estamos sempre a caminho: Diaconia como obra de misericórdia construindo solidariedade, disponibilizando dons e capacidades recebidas de Deus em favor de outros, concretizando a marca luterana do sacerdócio geral de todos os crentes. Diaconia como obra de misericórdia contrapondo-se ao poder e à dominação, agindo de tal forma que o ser humano não se torne dependente, submisso ou enganado por nenhum poder, a nenhum interesse, seja ele ideológico, político ou teológico, alheio aos jeitos de Jesus.
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de inspiração cristã por Armindo Klumb
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ma organização não governamental de inspiração cristã – assim é a Diaconia, criada em julho de 1967 no Rio de Janeiro como resposta das igrejas evangélicas brasileiras à convocação feita pela Confederação Evangélica do Brasil (CEB). Num primeiro momento, ela atua em 17 estados. Na década de 1980, transfere sua sede para Recife (PE). Desenvolve ações nos estados de Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte.
A Diaconia conta com um número expressivo de igrejas evangélicas no seu quadro de associados: Associação das Igrejas do Cristianismo Decidido, Confederação das Uniões Brasileiras da Igreja Adventista do Sétimo Dia, Exército da Salvação, Igreja de Cristo no Brasil, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, Igreja Evangélica Luterana do Brasil, Igreja Metodista, Igreja Presbiteriana do Brasil, Igreja Presbiteriana Independente do Brasil e União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do
Brasil. Essas igrejas se unem para trabalhar pela efetivação de políticas públicas de promoção e defesa de direitos, priorizando populações de baixa renda, para a transformação da sociedade. O público da ação institucional da Diaconia é formado por crianças, adolescentes, jovens, homens, mulheres, famílias, grupos, associações e comunidades eclesiásticas em quatro territórios: Pajeú, Oeste Potiguar e regiões metropolitanas de Recife e Fortaleza. Nesses contextos, ela trabalha as temáticas de Direitos
Fotos: Arquivo Diaconia
Capacitação de mulheres pedreiras para a construção de cisternas no Assentamento Ursulina em Caraúbas (RN)
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II Semana de Meio Ambiente (SEMEIA Urbana) no Recife (PE) em junho de 2013
da Infância e Adolescência, Direitos das Juventudes, Relações de Gênero, Geração de Trabalho e Renda, Meio Ambiente e Clima e Segurança e Soberania Alimentar, Nutricional e Hídrica. A ação da Diaconia caracteriza-se pelo fortalecimento de grupos sociais e pelo empoderamento de pessoas, pela mobilização de comunidades para a efetivação de políticas públicas que visem à transformação da sociedade, pelo desenvolvimento de tecnologias de convivência com o semiárido e por processos metodológicos, participativos e mobilizadores. Isso se torna possível graças ao apoio de indivíduos, igrejas, agências internacionais de cooperação e programas de governo, bem como com o compromisso da equipe, formada por pessoas de diferentes
expertises, que trabalham norteados pelos ideais de justiça, equidade, fraternidade e cidadania. A instituição tem como desafio contribuir para o desenvolvimento transformador, que, sob o ponto de vista teológico, implica afirmar que todas as pessoas são criadas à imagem de Deus e devem viver dignamente com justiça e direitos plenos, garantidos em comunidades sustentáveis. Para isso ela se envolve e promove ações de incidência, tanto públicas como políticas, junto à sociedade em geral, com o objetivo de mostrar que todas as pessoas têm um papel relevante na transformação da realidade. A tarefa de construir conhecimentos que desagreguem as estruturas opressoras a partir de uma articulação de saberes, aprendizados e habili-
dades é outro desafio que a Diaconia assume. Nesse sentido, é necessário criar comunidades resilientes que valorizem e compartilhem aquilo que acumularam em sua caminhada. Além disso, a instituição participa de processos de intercâmbio desses conhecimentos com outras organizações e grupos que trabalham no mesmo sentido. Por fim, a articulação de igrejas para o ecumenismo de serviço constitui uma ação desafiadora e importante para o cumprimento de sua missão, sendo isso um fator relevante para que o desenvolvimento transformador se torne uma realidade N a ser vivida no mundo.
ARMINDO KLUMB é teólogo e diretor da Diaconia em Recife (PE)
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Estado de Bem-Estar por Helio Teixeira
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Dois casos emblemáticos são bem conhecidos: o trabalho com jovens infratores encarcerados, desenvolvido pelo criador da dia-
O Johannesstift de Berlim tem o nome do pastor Johann Wichern, criador da diaconia na Alemanha
Clovis Horst Lindner
prática moderna de assistência social por parte das igrejas aos empobrecidos na sociedade de mercado surgiu na Europa Ocidental no século 19. Foi nesse período que ocorreu uma certa reorientação das práticas sociais das igrejas, e a palavra diaconia, no mundo protestante, bem como o termo caritas, no mundo católico, passaram a designar a organização de instituições que buscavam enfrentar a assim chamada questão social, que constituía tanto a aparição como o empobrecimento da classe dos operários, e isso devido à lógica inerente ao sistema capitalista de produção. Essa nova forma de perceber o problema da escassez como resultado racionalizado sob determinada lógica de planejamento, cuja finalidade constitui-se na produção como fato social e a apropriação da riqueza como fato privado, deu ocasião à diaconia/caritas ser concebida a partir de três ângulos específicos, a saber: 1) o trabalho voluntariado das comunidades e lideranças religiosas; 2) os novos métodos científicos; e 3) o apelo programático à opinião pública e às autoridades políticas, que, em muitos casos, passavam a adotar essas práticas, as quais eram geradas em meio aos trabalhos dos grupos cristãos, tornando-as políticas públicas e de Estado.
conia na Alemanha, Johann Hinrich Wichern (1808-1881), e o trabalho de aplicação e disseminação do método biomédico em situações de guerra e falta de saneamento básico e organização da primeira escola de enfermagem da Inglaterra por Florence Nightingale (1820-1910), depois de estudar diaconia na Alemanha, em Kaiserwerth, na escola de diaconisas liderada pelo pastor Theodor Fliedner. No Brasil, o médico Moncorvo Filho atuou também nesse esquema triplo de: trabalho voluntariado, métodos científicos e sensibilização
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da opinião pública e autoridades governamentais. Ele criou o Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro ainda no final do século 19. A relação da diaconia/caritas com o Estado é quase sempre estruturada a partir de contextos nos quais a presença efetiva dos aparelhos estatais é diminuta. O atual sistema de seguridade social do Brasil permite a atuação de organizações (religiosas) sem fins lucrativos nas políticas de assistência social, saúde e educação como parceiras no alcance dos objetivos de bem-estar social pelos quais o Estado brasileiro é constituído. Essas organizações constituem parte do assim chamado Terceiro Setor, que abriga setores alternativos entre o Estado e o mercado. Essa relação da diaconia/caritas com o Estado moderno não é sempre pacífica, podendo assumir tonalidades de cooptação ideológica ou de resistência política. Em alguns países desenvolvidos da Europa Central, o Estado de Bem-Estar Social caracteriza-se como uma forma organizada de conter os problemas de ordem econômico-social de caráter sistêmico, pois as políticas sociais não são simples ajudas aos pobres, mas ações que visam mudar a situação dos empobrecidos, criando as condições básicas para o protagonismo dos desprivilegiados, como acesso a educação, saúde e transporte etc. É interessante notar que a diaconia/caritas, juntamente com outras forças sociais, fomentou o surgimento do Estado de Bem-Estar Social na Inglaterra, tendo sido o próprio termo Estado de Bem-Estar Social cunhado e propugnado pelo pastor anglicano William N Temple (1881-1944). HELIO TEIXEIRA é doutorando em Teologia na Faculdades EST em São Leopoldo (RS)
de riscos de desastres por Valério G. Schaper Os primeiros esforços de constituição de ações estruturadas de proteção ou cuidado com a população, que tiveram início durante a Segunda Guerra Mundial, visavam socorrer e proteger as pessoas atingidas por ações militares. No Brasil, a disseminação de conhecimentos e metodologias de gestão de risco teve início com a criação, em 2003, do Ministério das Cidades, que incorporou a noção de gestão de risco como parte do planejamento urbano. A constituição de um campo de conhecimento e de práticas locais convergentes com políticas públicas remonta a não mais do que 20 anos. O que foi se consolidando ao longo do tempo é a ideia de que, se os riscos são, em grande parte, inevitáveis, é possível estruturar estrategicamente ações que visem reduzir os custos e minimizar os danos, sobretudo os sociais. Evidentemente, os riscos de desastres não são todos iguais, seja em natureza ou extensão, mas todos são passíveis de acompanhamento, medidas de prevenção e ações de redução de danos. O desastre aponta para perdas que superam as possibilidades e habilidades naturais de a sociedade lidar com o evento com seus próprios recursos. Assim, a combinação de ameaças ou
risco com vulnerabilidade configura o desastre. Os riscos ou ameaças são basicamente de dois tipos: naturais ou provocados pela ação do ser humano. A vulnerabilidade trata da ausência de condições (sociais, culturais, econômicas) ou de habilidades (físicas, espirituais ou morais) para fazer frente aos riscos ou ameaças. A magnitude do risco de desastre é diretamente proporcional à magnitude da vulnerabilidade. Entretanto, o risco de desastre e a percepção do mesmo é uma construção social com elementos de ordem multidimensional (culturais, históricas, religiosas etc). Hoje a construção social do risco de desastre e de sua percepção recebe ainda a intervenção dos interesses dos meios de comunicação e da economia. Porque sempre esteve e está historicamente envolvida com as populações mais vulneráveis, a igreja deve incluir em sua compreensão e intervenção diaconal a gestão de riscos de desastres, sobretudo na denúncia de certa naturalização do desastre como dimensão intrínseca e inevitável de uma economia sem coração. Diante de uma lógica econômica perversa que administra dores para gerar lucros, a gestão de riscos de desastre converteu-se em urgente tarefa diaconal da igreja. N VALÉRIO G. SCHAPER é professor na Faculdades EST em São Leopoldo (RS)
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Diaconia é uma dimensão da por Ingrit Vogt
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imperador D. Pedro I reinava e a religião oficial do novo país era o catolicismo quando imigrantes luteranos começaram a chegar ao Brasil. Em meio à ausência e ao abandono por parte do governo, em breve eles construíram escolas e templos, e não tardou para que pequenos hospitais surgissem nas comunidades. O serviço e o atendimento às pessoas doentes,
às pessoas idosas e às crianças foi algo que caracterizou a vivência da fé e sua prática no âmbito comunitário. Ainda no início do século XIX, vieram da Alemanha as primeiras diaconisas de uma Casa Matriz em Wittenberg, a qual também se abriu para formar jovens brasileiras. Essas mulheres trabalharam incansavelmente e lançaram a semente para iniciativas diaconais importantes até
que, em 1939, foi fundada a Casa Matriz de Diaconisas. Ao longo de seus 75 anos de serviço, a Casa Matriz tem dado uma contribuição marcante para o rosto da diaconia na IECLB. A partir de 1974, a Casa Matriz abrigou o Seminário Bíblico-Diaconal, que formava assistentes comunitárias num curso de três anos, reconhecido pela IECLB. Em 1976, estudantes egressos do Seminário Bíblico-Diaconal e da Associação Diacônica Luterana (ADL) criaram a Comunhão de Obreiros Diaconais (COD), hoje denominada de Comunhão Diaconal. Existem, desde então, duas comunhões diaconais na IECLB: a comunhão da Irmandade Evangélica Luterana, que congrega diaconisas, irmãs diaconais e pastoras com identificação diaconal, e a Comunhão Diaconal, que é um importante espaço de convívio, de reflexão e de articulação entre as diáconas e os diáconos da IECLB. A diaconia adquiriu maior expressão em âmbito nacional a partir
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CASA MATRIZ DE DIACONISAS: Durante 75 anos de serviço, a Casa Matriz tem dado uma contribuição marcante para o rosto da diaconia na IECLB
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Arquivo ADL
de 1988 com a criação do Departamento de Diaconia, sediado na SecretariaGeral, como integrante da Secretaria de Missão. A ênfase do trabalho do Departamento foi no sentido de promover uma incidência interna em diferentes setores na IECLB, ajudando a formar convicção de que a diaconia é um ministério que também deve ser valorizado e reconhecido como tal. De forma planejada, o Departamento atuou para prover motivação e liderança a um significativo número de pessoas que atuavam de forma voluntária em âmbitos locais: para oferecer espaços de encontro, compartilhar as experiências e articular as iniciativas, avançar no planejamento conjunto, bem como para oferecer capacitação tanto teológica como prática. Em 2006, no processo de reorganização da Secretaria-Geral, o Departamento de Diaconia foi transformado em Coordenação de Diaconia. Desde 2008, a Coordenação está abrigada na Secretaria da Ação Comunitária, juntamente com outras coordenações, que têm em comum a tarefa de coordenar, capacitar e articular uma série
ASSOCIAÇÃO DIACÔNICA LUTERANA: Desde 1956, a casa vem dando formação diaconal na IECLB
de programas e projetos voltados para a dinâmica comunitária nos 18 sínodos que formam a IECLB e alinhados com o Plano de Ação Missionária da Igreja (PAMI). Na IECLB, encontram-se em pleno desenvolvimento vários programas e projetos que tiveram seu nascedouro em temáticas trabalha-
Principais datas para a história da Diaconia na IECLB A partir de 1913 – Diaconisas de Wittenberg vêm trabalhar em diversas comunidades no Brasil. 1939 – Casa Matriz de Diaconisas em São Leopoldo/RS. 1956 – Associação Diacônica Luterana-ADL em Lagoa Serra Pelada/ES. 1974 – Seminário Bíblico-Diaconal junto à Casa Matriz de Diaconisas. 1976 – Comunhão Diaconal - COD, por concluintes do curso no Seminário Bíblico Diaconal e na ADL. 1988 – Departamento de Diaconia, abrigado na Secretaria-Geral da IECLB, Porto Alegre/RS. 1992 – Criação do setor Diaconia Inclusão, ligado ao Departamento de Diaconia, maior impulso ao trabalho com pessoas com deficiência. 1992 – Criação do Conselho Nacional de Diaconia – CONAD. 1996 – Dia Nacional de Diaconia é instituído e celebrado desde então no Domingo Misericordias Domini (3º Domingo da Páscoa). 2000 – Fundação Luterana de Diaconia – FLD em Porto Alegre/RS. Dia 26 de cada mês é dia de orar pela Diaconia no mundo.
das pelo Departamento de Diaconia, como saúde comunitária, voluntários e voluntárias de missão, formação de multiplicadores e multiplicadoras em diaconia, acompanhamento de pessoas doentes e em fase terminal, atividades com pessoas idosas, crianças e adolescentes e trabalho com pessoas com deficiência, que é coordenado através do projeto Construindo Comunidades Inclusivas. Somam-se a essas, em resposta a desafios atuais, o envolvimento em iniciativas como Diaconia em Rede e Mecanismo de Atuação em Emergências, em parceria com a Fundação Luterana de Diaconia. A prática diaconal é uma dimensão necessária da missão da igreja e que fortalece a vida comunitária. E o fortalecimento da diaconia comunitária, de forma articulada em rede, por sua vez, reforça a nossa presença e o testemunho na sociedade brasileira. N INGRIT VOGT é diácona e secretária-geral da IECLB em Porto Alegre (RS)
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em 1520, ele acentua que a pessoa deve estar convicta de que aquilo que faz agrada a Deus. Dessa forma ela se liga a Deus. Referindo-se aos Dez Mandamentos, Lutero diz: “A boa obra mais alta e mais nobre é a fé em Cristo”. Isso porque ela traz consigo amor, paz, alegria e esperança. Obras como orar, jejuar, dar esmolas, fazer doações, se não forem praticadas confiando em Deus, “são obras às quais se cortou a cabeça e, portanto, não valem nada”. Para Lutero também não existem obras menores ou maiores. Ele diz: “Uma obra, como levantar uma palha, na confiança de que isso agrada a Deus, é mais do que a obra de ressuscitar todos os mortos ou se deixar queimar”.
por Ruthild Brakemeier
É
impossível comprar a salvação – “No momento em que o dinheiro tinir na caixa, a alma saltará ao céu.” Com essas palavras, determinadas lideranças na época da Reforma motivavam pessoas a fazer doações à igreja. Martim Lutero combateu com veemência a ideia de que é possível “comprar” a salvação por meio de boas obras. Pelo estudo da Bíblia ele havia chegado à descoberta libertadora de que a salvação é um presente de Deus, e nada precisamos ou podemos fazer para merecê-la. Por isso Lutero evitava incentivar a prática de boas ações.
“Encontrar referências sobre diaconia nos escritos de Lutero é como procurar um alfinete no palheiro”, diz Gottfried Hammann em seu livro “História da Diaconia Cristã”. Também não foi resgatada a importância do ministério diaconal pela teologia da Reforma, apesar de haver argumentos convincentes para isso a partir da Bíblia.
Fé e amor são inseparáveis – Apesar de não dar maior ênfase à prática da diaconia em seus escritos e sermões, Lutero deixou claro que a fé tem consequências. Baseado em Gálatas 5.6, o reformador diz: “Uma fé viva tem como consequência óbvia o amor atuante”. Foi principalmente na “doutrina do sacerdócio geral de todos os crentes” que Lutero baseou sua teologia da diaconia. Ele diz que o serviço recíproco é a marca de uma congregação viva e que todos os membros da igreja são, por força de seu sacerdócio geral, diáconas e diáconos. Ele argumenta que fé e amor formam uma unidade inseparável. Pela fé e pelo amor cada pessoa batizada deve tornar-se “um Cristo para o outro”.
Obras que agradam a Deus – Lutero não menosprezou as boas obras, mas quis vê-las em estreita ligação com a fé da pessoa que as pratica. No “Sermão sobre as Boas Obras”, editado
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CAIXAS COMUNITÁRIAS: Lutero queria comunidades responsáveis para acabar com a mendicância
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A organização do trabalho diaconal – Durante toda a Idade Média, a falta de uma organização diaconal eficiente trouxe grandes prejuízos para a sociedade. A pobreza em toda a Europa era enorme, e havia muitos rostos: fome, doenças, abandono. Epidemias como a cólera eram frequentes e dizi-
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RUTHILD BRAKEMEIER é diaconisa na Casa Matriz de Diaconisas em São Leopoldo (RS)
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mavam a população. A mendicância, como único meio de sobrevivência para famílias carentes, crescia a ponto de tornar-se intolerável. A quem caberia a responsabilidade de organizar uma ajuda substancial? Na igreja constituída, o diaconato tinha perdido suas funções originais de cuidar dos necessitados. Lutero pensou que uma forma de aliviar sofrimento, envolvendo os membros, seria a criação de “caixas comunitárias”. A mendicância seria proibida, e cada comunidade cuidaria de seus pobres. Numa prédica ele disse: “Seria bom que se iniciasse dividindo uma cidade em quatro distritos. E, se a gente tivesse as pessoas para isso, colocasse em cada distrito um pregador e um diaconum [sic] que distribuísse os bens e cuidasse dos doentes e observasse quem passa necessidade?”. Esse plano ainda hoje espera por sua concretização nas comunidades luteranas. N COMUNIDADES LUTERANAS: O plano de Lutero ainda hoje espera por concretização
A diaconia na JE por Katilene Wilms Labes A geração atual de jovens busca associar seus interesses pessoais e profissionais com suas habilidades e com o desejo de ajudar pessoas e contribuir para um mundo melhor. Como agentes catalizadores de mudanças, 2% dos jovens atuais estão agindo em busca de mudanças para o mundo onde vivemos. No passado, as ações diaconais da igreja eram centradas em hospitais, ancionatos, instituições para crianças carentes. Hoje crescem as ações com menor custo financeiro e que atingem menos pessoas, mas
que são em número maior, através da realização de ações isoladas. A Juventude Evangélica da IECLB, JE, possui princípios e ações diaconais. Das Diretrizes da JE destacamos: “As atividades com jovens têm como objetivo geral a participação na missão de Deus, propiciando a educação cristã, o conhecimento e a vivência do evangelho de Jesus Cristo, mediante oração, reflexão e serviço, possibilitando que as pessoas jovens testemunhem a fé cristã”. Os materiais desenvolvidos para apoio nos encontros de JE, os temas das diferentes edições do Congresso Nacional da Juventude Evangélica e suas oficinas, os seminários nacionais de
formação de lideranças e as atividades ainda em planejamento têm como objetivo motivar o jovem luterano para a percepção das dificuldades do outro, que é nosso irmão. É importante salientar que nem todas as atividades com jovens na IECLB se concentram na JE. Há jovens que participam de diferentes atividades nas comunidades e envolvem-se em grupos e organizações servindo em outras esferas da sociedade. Como pessoas cristãs, confessamos a fé no Trino e Uno Deus. É essa fé que constitui a identidade da igreja, da diaconia, da juventude brasileira e da JE. (Sugiro assistir ao vídeo “O Sonho Brasileiro” no youtube.) N KATILENE WILMS LABES é educadora e coordena o trabalho com jovens no Sínodo Vale do Itajaí em Blumenau (SC)
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Carregar e deixar-se por Valmi Ione Becker
U
ma pessoa cristã que vive a sua igreja olha para os lados. Ali, na periferia, ela percebe famílias sofredoras, gente solitária e depressiva. Fazer o quê? Ora, envolver-se com essas pessoas a partir do olhar apaixonado de Deus, exercer o ministério curador
e restaurador, oferecer comunhão e perspectivas às mesmas. Quem age assim faz diaconia. A diaconia motiva-nos a ir ao encontro das necessidades de quem está próximo. Assim, não foi difícil constatar que, ao nosso lado, havia inúmeras mulheres e um sem-núme-
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APOIO: Grupo de cuidadoras e coordenadoras em Joinville e no Sínodo Norte Catarinense
ro de homens que se envolviam diuturnamente no cuidado a familiares doentes. Ações desse tipo cansam muito, e foi refletindo sobre essa situação que nasceu a ideia de criar o Grupo de Apoio às Cuidadoras e Cuidadores. Lembro bem daquele dia em que preparamos o ambiente para o primeiro encontro. As pessoas vinham chegando e eram acolhidas com carinho. A vela acesa no centro da sala promovia calma e aconchego. A comunhão ocorria à medida que o chá, acompanhado de deliciosos biscoitinhos, era servido. Agora era preciso apresentar-se. Uma das “cuidadoras” disse que se envolvia com o marido acometido do mal de Alzheimer. Outra que seu esposo sofria do mal de Parkinson. Uma terceira cuidava de dois filhos com deficiência. À medida que se compartilhava, vinham mais e mais confidências. Constatei que aquele povo se doava em cuidados às suas queridas e aos seus queridos acometidos de enfermidades mentais; às suas mães idosas e doentes... A reflexão bíblica que minha colega e eu apresentamos promoveu a partilha de dores e sofrimentos, mas também apontou para a esperança e comunhão. Foi assim que iniciou o Grupo de Apoio às Cuidadoras e Cuidadores. Os referidos encontros continuam acontecendo. As pessoas cuidadoras organizam-se para poder participar do referido grupo. Como? Elas solicitam ajuda aos familiares ou aos vizinhos para que olhem pelo doente na sua ausência. Daí então, quando dos nossos encontros, cuidamos da “cuidadora”. Enquanto ela é cuidada, ela também tem a chance de cuidar, de escutar, de compreender, de solidarizar-se com a dor das pessoas que estão a seu lado.
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CAPA Aqui e ali, ouvem-se testemunhos da importância desse grupo. Uma senhora expressou-se assim: “Esses encontros me fazem muito bem. A espiritualidade, a troca de informações, a partilha, tudo isso fortalece a esperança que carrego dentro de mim. Essa experiência me dá a certeza de que não estou sozinha na luta diária e que o grupo, que a minha igreja está comigo”. Outro dia, a filha de uma das participantes me confidenciou que o “Grupo de Apoio às Cuidadoras e aos Cuidadores” faz bem à sua mãe, que cuida do pai doente. Em que sentido? Sua resposta foi espontânea: Ela se mostra mais tranquila, amorosa, calma e paciente. No Novo Testamento, Jesus ens in a que nos cabe carregar os fardos umas das outras, uns dos outros. As participantes de nosso Grupo de Cuidadoras e Cuidadores afirmam, sempre de novo, que se sentem carregadas e queridas pelo grupo. Quando, por força maior, não podem participar do encontro, elas recebem telefonemas das que participaram e essas declaram que sentiram sua falta. Entendo que todas as comunidades da IECLB deveriam ter um grupo de apoio às pessoas que cuidam de alguém. Sabem por quê? Porque é ali que a diaconia se torna palpável em meio às pessoas que sofrem. É ali que podemos oferecer um espaço de solidariedade, apoio, carinho, partilha e cuidado. Tiago provoca-nos quando escreve: “Portanto, a fé é assim: se não vier acompanhado de ações, é coisa morta” (Tiago 1.16). N
VALMI IONE BECKER é diácona e coordenadora do Departamento Sinodal de Diaconia do Sínodo Norte Catarinense em Joinville (SC)
Desafio: provocar por Simone Engel Voigt
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erta vez, após um encontro sobre diaconia, uma mulher disse: “Agora eu entendi que aquilo que meu grupo vem fazendo tem um nome – é diaconia”. Ela se referia ao engajamento do grupo em favor de mulheres e homens do campo que foram vítimas de intoxicação por pesticidas, sua participação em atividades de direitos humanos e a visitação na comunidade a pessoas doentes, enlutadas ou solitárias. “Diaconia não é qualquer ação. É ação de solidariedade que transforma, a partir da fé cristã, situações de injustiça em justiça, de indignidade em dignidade.” Outra pessoa também disse que praticava diaconia: “Todo final de mês, preparo cinco cestas básicas e entrego a algumas pessoas de um bairro de periferia”. Nesse caso, temos que cuidar para não confundir assistência com assistencialismo. O assistencialismo não é diaconia. O objetivo do assistencialismo é assistir. São ações que somente procuram remediar problemas, sem pensar em possibilidades de transformação do sofrimento ou da necessidade. “Diaconia tem a forma da assistência. Caracteriza-se pelo contato pessoal direto que exige. É diaconia
próxima. Implica envolver-se com o problema alheio, participar do sofrimento, estar ao lado, doar seu tempo. Assistência é amor concreto a pessoas com deficiências, por exemplo, ou que têm outras dificuldades. É nada fácil de praticar. A assistência é vital. Constitui uma prova da autenticidade do amor e do compromisso com a outra pessoa” (Gottfried Brakemeier). A diaconia está fundamentada biblicamente na pessoa de Jesus Cristo. Toda a vida e o agir de Jesus apontam para o reino de Deus e visam resgatar a dignidade da pessoa humana. Jesus questiona leis e costumes que prejudicam a vida e aponta para ações que favorecem a vivência do amor. Através de alguns textos básicos da diaconia (Marcos 10.46-52; João 13.1-35; Mateus 25.31-46; Marcos 10.13-16 e Lucas 10.25-37) percebemos que o agir de Jesus: inverte situa ções e valores da época – conhece a realidade; vai ao encontro das pessoas, visita, conversa; acolhe, reintegra crianças, doentes, pessoas pecadoras e excluídas; vê e acolhe a pessoa assim como ela é, de forma integral; respeita e valoriza a pessoa – faz com ela e não por ela; oferece nova possibilidade de vida; fala do amor de Deus e age concretizando esse amor no dia a dia. NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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CAPA Como praticar diaconia? A ação diaconal abrange atividades diaconais nas comunidades, instituições e movimentos que visam praticar apoio e solidariedade a pessoas, como expressão da fé e reconhecimento do amor de Deus. As ações diaconais definem-se a partir das exigências de situações, contextos e pessoas. Formação, reflexão, planejamento e avaliação fazem parte da prática diaconal. É imprescindível conhecer as necessidades e as prioridades da comunidade, analisar causas e consequências, definir objetivos da ação diaconal, examinar a sua viabilidade e os recursos disponíveis. É fundamental que a ação seja avaliada com uma reflexão conjunta sobre seus resultados e o impacto provocado nas pessoas envolvidas.
Ação de misericórdia: tem olhos, ouvidos, sentimentos para a dor, é sensível. Ação de justiça: é sensível para os direitos das pessoas. Anuncia e denuncia. Tem formas de: Assistência: está próxima de quem sofre. Solidariedade: ajuda a aliviar dores, faz com o outro. Parceria: atua com o diferente, fomenta a cooperação. Ação política: pessoas cristãs se envolvem na política, em conselhos municipais, em movimentos sociais. (Gottfried Brakemeier)
O que falta para que as nossas comunidades luteranas possam ainda mais e melhor expressar ações diaconais transformadoras? Cabe a nós pessoas cristãs continuarmos a missão diaconal de Jesus. Somos desafiados e desafiadas a juntos e juntas provocar mudanças a serviço da vida, deixando sinais concretos do grande amor de N Deus em nosso contexto.
SIMONE ENGEL VOIGT é diácona e coordenadora do trabalho com jovens e programas de intercâmbio da Secretaria de Ação Comunitária da IECLB em Blumenau (SC)
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Diaconia que por Susanne Buchweitz
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diaconia está na base das ações da Fundação Luterana de Diaconia-FLD e se expressa, entre outros, pela existência do Programa de Pequenos Projetos, que apoia iniciativas tanto de instituições, comunidades e paróquias vinculadas à Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), como da sociedade em geral. A compreensão da FLD, a partir da teologia luterana, é que diaconia é amor, entrega incondicional, dedicação e firmeza que conduz ao agir através do amor doado por Deus a nós. Esse agir é uma ação refletida, que parte da fé em Jesus Cristo e que busca a transformação social, na qual tanto a pessoa cuidada como a pessoa que cuida são consideradas sujeitos de transformação. A diaconia age de forma integral em um contexto de sofrimento, onde a dignidade e os direitos humanos se encontram ameaçados. Dessa forma, diaconia significa agir, a exemplo de Jesus Cristo, que sempre buscou igualdade social para transformar a vida das pessoas. Contribuir para a construção de cidadania daquelas pessoas em situação de pobreza e violações diversas, pela defesa de direitos, pela superação das injustiças e violências e pela promoção de um desenvolvimento transformador.
Fortalecimento comunitário – O Icuí-Guajará, localizado no município de Ananindeua, área metropolitana de Belém (PA), tem cerca de 500 mil habitantes e abriga uma das maiores ocupações urbanas da América Latina, conhecida como PAAR. A instituição diaconal Associação Mururé (AMU), criada em 2006 pela Paróquia Evangélica de Confissão Luterana em Belém (PECLB), realizou nos últimos anos um processo de diagnóstico do potencial social e político das organizações do bairro, com o objetivo de construir um Fórum de Entidades. A FLD e outras organizações apoiaram a iniciativa de fortalecimento comunitário. Como resultados, foram mapeadas 600 organizações, realizadas audiências públicas sobre transporte público e violência e reuniões com o governo municipal para a implementação de políticas públicas. Posteriormente, atividades de capacitação, que receberam apoio da FLD, foram agregadas, com oficinas de serigrafia e hortas orgânicas para a juventude local. Senso de coletividade – O Programa Comunitário da Reconciliação, vinculado à Paróquia Luterana de Santo Amaro, na cidade de São Paulo (SP), é outra iniciativa diaconal que recebeu apoio do Programa de Pequenos Projetos da FLD. As duas iniciativas, Costurando novas
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de costura, artesanato, panificação e cooperativismo. De acordo com o relatório encaminhado para a FLD em dezembro de 2013, a proposta trouxe mudanças, incluindo a postura e a atitude nas participantes. Muitas se tornaram mais participativas e fortalecidas na promoção de atividades de geração de renda na comunidade. Houve o
desenvolvimento do senso coletivo. Algumas mulheres juntaram-se para ampliar a confecção e comercialização de doces e salgados. Todas fizeram descobertas que as valorizam, descobriram um sentimento de conquista N e realização. SUSANNE BUCHWEITZ é jornalista e assessora de comunicação da Fundação Luterana de Diaconia (FLD) em Porto Alegre (RS)
Divulgação Novolhar
perspectivas, em 2010, e Conquistas, em 2012, buscam fortalecer as relações familiares através da oferta de cursos voltados à geração de renda familiar e da melhoria da qualidade de vida da comunidade. Um total de 150 mulheres, a maioria chefes de família, moradora na comunidade da Vila José, no extremo sul da cidade, participa das oficinas
IGUALDADE SOCIAL O município de Ananindeua, área metropolitana de Belém (PA), tem cerca de 500 mil habitantes e abriga uma das maiores ocupações urbanas da América Latina, conhecida como PAAR. A instituição diaconal Associação Mururé (AMU), criada em 2006 pela Paróquia Evangélica de Confissão Luterana em Belém (PECLB), realizou nos últimos anos um processo de diagnóstico do potencial social e político das organizações do bairro, com o objetivo de construir um Fórum de Entidades.
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FAMÍLIA
Por uma vida sem violência
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otineiramente, somos impactados por notícias de agressões entre casais nos noticiários. Muitas vezes, há casos que chegam a causar a morte ou sérios danos às vítimas. Mas será que a violência conjugal se restringe aos casos de grande gravidade que chegam à mídia? Muito antes de um desfecho trágico, observa-se que a violência se instala nos relacionamentos de forma sutil e aumenta sua intensidade em escalada. Pode iniciar ainda na etapa do namoro e vai se agravando ao longo do relacionamento. A violência conjugal é um fenômeno complexo e possui diversas causas, entre elas: características do contexto em que os casais vivem, estereótipos de gênero, características pessoais dos envolvidos, abuso de álcool e outras substâncias, sentimentos de posse, ciúme e infidelidade, experiências precoces de vitimização na família de origem e exposição à violência conjugal na infância. Nesse sentido, costuma-se identificar um ciclo de violência que se perpetua de geração em geração. Quando os filhos observam a violência no relacionamento dos pais, repetem o modelo aprendido em seus futuros relacionamentos, percebendo, equivocadamente, a violência como algo natural e esperado nos relacionamentos amorosos.
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Além das múltiplas causas, existem diferentes formas de manifestação da violência conjugal, sendo as mais frequentes a psicológica, a física e a sexual. A violência psicológica é caracterizada por ações como ameaças, ofensas e humilhações. A manifestação física da violência refere-se a agressões como tapas, empurrões, chutes ou qualquer ação que cause dano físico. Por sua vez, a violência sexual ocorre, mesmo nas relações de casais, quando existe contato ou relacionamento sexual sem que um parceiro manifeste interesse ou dê o seu consentimento. Dentre as diferentes formas, a violência psicológica é a de mais difícil identificação, pois não deixa marcas visíveis, mas geralmente causa muitos prejuízos à autoestima e pode ser o ponto de partida para as demais formas. Nesse sentido, todos devem estar atentos à violência desde suas manifestações iniciais. Se não permitimos que estranhos nos ofendam e agridam, por que somos mais tolerantes com a violência que ocorre dentro de casa em nossas relações íntimas? Será que é porque se acredita que em briga de marido e mulher ninguém deve meter a colher? Pensamentos como esses contribuem para que as pessoas mantenham as situações de violência como um segredo ou motivo de vergonha. Além
Jessica Michels
por Denise Falcke
disso, quando a violência ocorre nos relacionamentos conjugais, ela gera uma confusão de sentimentos, pois é justamente aquele a quem se ama que agride. É comum que, logo após um episódio de violência grave, quem agrediu pede desculpas e promete que isso nunca mais vai ocorrer, tor nando-se prestativo e inibindo as iniciativas de denúncia. Todavia novas discussões surgem com o passar dos dias e novos episódios de violência ocorrem, gerando um ciclo de repetição difícil de ser rompido.
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NEM TÃO DOCE LAR A exposição “Nem Tão Doce Lar” é uma iniciativa da Fundação Luterana de Diaconia-FLD. Nos últimos anos, a exposição tem percorrido diversas comunidades da IECLB, chamando a atenção para a violência doméstica e suas consequências, promovendo conscientização e intenso debate. A foto acima retrata parte da exposição feita em Joinville (SC). Comunidades, escolas e entidades interessadas em promover o debate sobre vio|ência doméstica com o material da FLD podem entrar em contato: fld@fld.com.br
O primeiro passo para a superação é a identificação das situações de violência vivenciadas. É necessário romper com a ideia de que “não foi nada” e “um dia, tudo vai ficar bem”. Reconhecer a violência (física, sexual ou psicológica) é o que vai motivar a mudança. Nos casos menos graves, conversar com o/a parceiro/a e mostrar os sentimentos em relação às situações vivenciadas pode ajudar a resolver a situação. Porém, em casos mais graves, será necessário buscar ajuda, contar
com algum conhecido em quem se confie, buscar os serviços de saúde ou mesmo a delegacia. A denúncia constitui-se em outro passo essencial para a mudança. Por fim, é necessário ter força e persistência na luta por seus direitos, para que se possa ter uma vida digna e sem violência, tanto na rua como dentro N da própria casa.
DENISE FALCKE é psicóloga e integra o Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UNISINOS em São Leopoldo (RS)
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SOLIDARIEDADE CIDADE INUNDADA: Mais de 50 municípios atingidos e 70 mil desabrigados foi o saldo das chuvas de Natal
Lições de uma catástrofe por Joaninho Borchardt
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altava menos de uma semana para o Natal. Na cidade, as luzes e os enfeites nas casas e no comércio anunciavam a festa universal do congraçamento entre as pessoas. Na roça, as casas já estavam todas arrumadas. As famílias alegravam-se e preparavam-se para as festas natalinas. Nuvens grossas e escuras levantaram no horizonte. Seria mais um dia típico de chuvas de verão? Não! Foram sete dias seguidos de chuvas intensas. Os rios saíram de seus leitos e invadiram casas na roça e na cidade. Pontes foram arrancadas. Animais, móveis, eletrodomésticos e entulhos foram violentamente arrastados pela força da água. Estradas
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ficaram interrompidas. Foram mais de 800 milímetros em apenas uma semana. TRAGÉDIA – Seu Antônio Sten era diarista e zelador da igreja. Na tarde do dia 19 de dezembro, a chuva veio forte. Sua esposa Olinda e a filha Valéria ainda conseguiram recolher os animais para dentro dos abrigos. Antônio colocou sua moto na área de serviço. Os três estavam amedrontados. De repente, ouviu-se um estrondo. Lama, árvores e entulhos precipitaram-se sobre a casa. A mãe e a filha estavam na cozinha, e seu Antônio, na área de serviço. Não deu tempo para correr. A casa desmo-
ronou sobre eles, que ficaram sob os escombros. A muito custo, Dona Olinda conseguiu livrar-se. Ferida e quase sem forças, pediu ao marido e à filha que mantivessem a calma e orassem enquanto procuraria por socorro. Caminhou dois quilômetros até a casa mais próxima. Depois de mais de quatro horas de desespero e dor sob os escombros, os dois foram resgatados com a ajuda dos vizinhos. Da casa e da mobília não sobrou nada, apenas a roupa do corpo. A família está começando a vida do zero, com ajuda da comunidade religiosa e dos amigos. REDE DE SOLIDARIEDADE – Milhares de famílias passaram por situações parecidas como a de Antônio, desalojadas ou desabrigadas. Mas, em meio a destruição, medo e tristeza, renasceu o espírito da solidariedade. Foi bonito ver a mobilização do povo. O jornalista Marcos Sacramento, de Vitória, escreveu no blog Diário do Centro do Mundo: “Com a mesma intensidade das chuvas formou-se uma eficiente rede de solidariedade para arrecadar mantimentos, colchões, remédios e dinheiro. Voluntários estão se revezando nas bases da Defesa Civil para separar donativos e carregar os caminhões que os levarão até os necessitados”. As comunidades luteranas de todo o país deram suas ofertas para ajudar os mais necessitados. No culto de Natal na comunidade de Melgaço, interior do município de Domingos Martins, por exemplo, no momento das ofertas, as pessoas pegavam dinheiro emprestado umas das outras para poder ajudar mais. Uma senhora que morava perto da igreja foi para casa rapidamente e voltou com uma
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Fotos: Arquivo do autor
NO CAMINHO: nota de cem reais. A casa da família Foi a maior coleSten estava ta já vista naquela bem na trilha da avalanche e comunidade, conta restou só a roupa o pastor Anivaldo do corpo Kuhn. Foi um Natal inesquecível, diferente e verdadeiro, em que ninguém observou se a casa estava limpa. Ninguém se lembrou de trocar presentes ou festejar nem tampouco da roupa nova no armário. Aprendemos que com a natureza não se brinca: respeita-se e se preserva. Aprendemos com o desespero de que somos todos iguais e devemos acolher e socorrer conhecidos e desconhecidos. Reaprendemos a festejar a vida e agradecer a Deus pela ajuda mútua entre irmãos e irmãs. Do mesmo céu que vieram as chuvas, em volume nunca visto, inundando tudo, veio também a ajuda dos helicópteros da Defesa Civil e do Exército, levando alimentos, roupas e remédios e resgatando pessoas em situação de risco. Do céu
também veio o brilho do sol, que possibilitou a limpeza e a secagem do que ainda podia ser reaproveitado. E do céu vem a esperança e a força para reconstruir e começar tudo de novo. O mandamento cristão foi cumprido como nunca em meio a essa
catástrofe, como está escrito: “Carregai as cargas uns dos outros e assim cumprireis a lei de Cristo” N (Gálatas 6.2).
JOANINHO BORCHARDT é teólogo e pastor sinodal do Sínodo Espírito Santo a Belém em Vitória (ES)
SOLIDARIEDADE: Antônio Sten e o pastor Joaninho com a família resgatada pela solidariedade, que arrecadou toneladas em doações para recomeçar
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Foros: Arquivo Casa Matriz de Diaconisas
IRMANDADE
AÇÃO DE GRAÇAS: Um culto especial marcou a gratidão da entidade pelos 75 anos de fundação
Casa Matriz completa 75 anos por Gisela Beulke
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ratidão é o que sentimos ao olhar para trás e constatar que Deus cuidou da Irmandade durante os 75 anos de sua existência. Mas também é hora de olhar para frente com fé e esperança. Desde 1913, há Irmãs luteranas trabalhando no Brasil. Imigrantes alemães sentiram a falta de alguém que tivesse conhecimentos na área da enfermagem e da pedagogia e por isso pediram à Alemanha por Irmãs. Logo também mulheres brasileiras desejaram atuar como Irmãs. Num
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Congresso de Mulheres – OASE – reunidas em Santa Cruz do Sul, RS, em 1938, aprovou-se a fundação de uma Casa Matriz de Diaconisas em solo brasileiro. No dia 17 de maio de 1939, esse desejo se concretizou: nascia a Casa Matriz de Diaconisas. Houve e ainda há Irmãs atuando em comunidades, hospitais, ancionatos, centros sociais, periferias de grandes cidades, em áreas indígenas, no acompanhamento a migrantes para o norte e centro do país. Elas trabalham na área da formação, em especial preparando ministros e mi-
nistras para atuar na diaconia. Muitas sementes foram lançadas, e marcas foram deixadas. Durante 25 anos, de 1974 até fins de 1998, a Casa Matriz de Diaconisas ofereceu formação teológico-diaconal, curso esse com três a quatro anos de duração. A partir de 1999, a formação teológico-diaconal foi assumida pela Faculdades EST em São Leopoldo (RS). Neste ano do jubileu, a Convenção de Irmãs aconteceu em maio, terminando com a celebração dos 75 anos da Casa Matriz de Diaconisas.
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O tema da Convenção foi: Fortalecer a Diaconia – Vivendo Comunhão na Irmandade. Fomos conduzidas nessa reflexão pela pastora Rosângela Stange, da Secretaria de Ação Comunitária da IECLB, que nos motivou a refletir sobre nossa vida e forma de viver e a intensificar a comunhão entre nós hoje. O culto dos 75 anos foi oficiado por vários ministros e ministras, e a prédica esteve a cargo da pastora Sílvia Genz, segunda vice-presidente da IECLB. Ela falou sobre o texto bíblico de João 20, que narra o encontro de Jesus, o ressuscitado, com Maria Madalena. Poderíamos perguntar: o que uma mulher fazia sozinha de madrugada no túmulo? Maria Madalena vivenciou momentos de dor e tristeza. Viera visitar o túmulo de Jesus. Mas seus olhos se abriram ao ver o túmulo
escuro e vazio. Jesus lhe pergunta: Mulher, por que choras? A Irmandade também vivenciou momentos de tristeza, choro e preocupação. Hoje se pergunta pela continuidade dessa obra, por vocações para a Irmandade e o ministério diaconal. Mas também se confia que essas perguntas e dúvidas possam ser revertidas em alegria ao buscar Jesus e perceber sua presença conosco. A vida é constituída por mudanças, e é isso que a Irmandade Evangélica Luterana experimentou e ousou no decorrer de seus 75 anos de existência. Na década de 1990, por exemplo, liberou o hábito e o celibato. Por isso há diversas Irmãs casadas, com filhos e netos. Hoje também se integram na Irmandade mulheres que se sentem vocaciona-
das para tal, concluíram um curso profissional secular, mas não desejam cursar Teologia ou não querem atuar como ministras na área pastoral em comunidades. Essas são chamadas de IRMÃS DIACONAIS. Com essas mudanças, duas mulheres ingressaram na Irmandade em 2013, e atualmente há seis aspirantes à Irmandade. A seara continua sendo grande, e os trabalhadores na área da diaconia são poucos. Deus continua chamando trabalhadores, e nós convidamos mulheres, jovens e adultas. Venham conhecer a Irmandade Evangélica Luterana. Façam parte dessa família que deseja viver em comunhão e servir a quem precisa de ajuda, motivadas N pelo amor de Deus. GISELA BEULKE é irmã diaconisa e diretora da Casa Matriz de Diaconisas em São Leopoldo (RS)
CONVENÇÃO: No ano do jubileu, a Convenção Nacional das Diaconisas terminou com a celebração dos 75 anos de fundação
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COMISSÃO DA VERDADE
As igrejas e os resquícios da ditadura por Micael V. Behs
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Micael V. Behs
no Uruguai, Argentina, grejas e a grande Chile, Estados Unidos e imprensa exerceSuíça. Hoje ele integra ram um papel funa Comissão da Verdade, damental na preparação do golpe de 1964. que analisa o papel das Jornais manipulavam inigrejas durante o regime formações e igrejas. Com militar no país. base nessas distorções, A Comissão tem a usavam a linguagem tarefa principal de apurar religiosa para legitimar as graves violações aos o anticomunismo. Instadireitos humanos e os lado o golpe, houve até crimes de lesa-humaniigrejas que realizaram dade cometidos durante a cultos de ação de graças. ditadura, desde torturas, A análise é do cientista assassinatos e prisões social Anivaldo Padiilegais. “Acontece que ANTICOMUNISMO: Anivaldo Padilha – entre Oneide Bobsin, reitor da Faculdades lha, que, no início de EST, e o professor Rudolf von Sinner – permaneceu exilado durante 13 anos por esses crimes não foram abril, inaugurou a série conta das distorções que levaram as igrejas a lutar contra o comunismo cometidos isoladamente “Conversas na Martim por policiais que ultraLutero”, promovida pelo Instituto de Bispos católicos que tinham uma passaram, digamos, os limites que a Ética da Faculdades EST. forte estrutura intelectual e pas- lei colocava. O extermínio da opoÀ medida que a ditadura militar toral mudaram de posição a partir sição foi uma política de Estado”, se consolidou e começaram a apa- da introdução do Ato Institucional lembrou Padilha. recer denúncias sobre torturas, os número 5. Eles conseguiram certa “Os crimes cometidos tiveram setores mais democráticos das igrejas hegemonia na Conferência Nacional o apoio e a colaboração de setores passaram a criticar o Estado, afirmou dos Bispos do Brasil (CNBB), que das Forças Armadas, de empresários Padilha em entrevista exclusiva con- contava ainda com um significativo que financiavam a repressão, como cedida à Novolhar. número de bispos coniventes com o foi o caso da Folha de S. Paulo, que Ainda no início do golpe, pastores, poder militar. emprestava carros para transportar padres e agentes de pastorais foram Anivaldo militava, então, no mo- agentes da polícia de forma disfarpresos e não receberam qualquer vimento ecumênico e estudantil. Ele çada.” apoio solidário por parte das igrejas. era diretor do Departamento NacioA Comissão, apontou o militanAté mesmo a hierarquia católica nal da Juventude da Igreja Metodista te ecumênico, tem a incumbência apoiou o golpe e a ditadura. Dom e estudante de Ciências Sociais na de arrolar esses crimes. Processos Geraldo de Proença Sigaud, de Belo Universidade de São Paulo (USP). formais contra torturadores vão deHorizonte, chegou a escrever um Foi preso e torturado em 1970 e pender do Ministério Público e do catecismo anticomunista. permaneceu exilado durante 13 anos Supremo Tribunal Federal. O Supre-
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consultório da fé mo interpretou que a Lei da Anistia anistiou tanto os que lutaram contra a ditadura como os torturadores. Esse posicionamento pode ser revisto, uma vez que a Corte Interamericana de Direitos Humanos está exigindo do Brasil a revisão da Lei da Anistia, pois entende que ela foi uma autoanistia imposta pelos militares e não tem valor de acordo com o Direito Internacional. Na avaliação de Anivaldo, a ditadura terminou formalmente em 1985, mas há resquícios ainda presentes nos dias de hoje. Ele mencionou questões vinculadas à segurança pública, à violência policial e ao sistema eleitoral. O Congresso Nacional, destacou, é um lugar de fazer negócios. “Não adianta, então, ficar denunciando corrupção no Congresso. Temos que ter um novo modelo político, uma reforma política, uma reforma do Judiciário, porque esse poder continua autoritário, elitista. A população pobre não tem acesso à justiça”, avaliou. Durante a conversa com professores, estudantes e comunidade em geral, Padilha mencionou protestantes engajados no combate ao regime de exceção. Lembrou os nomes dos presbiterianos Paulo Wright e Ivan Mota Dias, da metodista Heleni Guariba, mortos sob tortura; dos jovens metodistas Celso e Fernando Cardoso da Silva; do missionário estadunidense presbiteriano Richard Shaull, um dos que plantaram as sementes da teologia da libertação em solo brasileiro, e do pastor luterano Breno Schumann, morto num misterioso acidente de trânsito, no dia 11 de março de 1973, aos 34 anos N de idade.
MICAEL V. BEHS é jornalista e assessor de imprensa da Faculdades EST em São Leopoldo (RS)
Quando morre um bebê não batizado, ele vai pro céu? por Werner Kiefer Uma pergunta como esta pode estar cheia de questionamentos. Por que não o batizamos? Essa e tantas outras questões são inquietantes. Desafiamos leitores e leitoras da Novolhar a compartilhar questões como essa. Existem espaços na comunidade cristã onde seremos acolhidos, aceitos e compreendidos. A fé cristã dá-nos essa liberdade para dialogar sobre as dúvidas. A dúvida é amiga da fé, desde que a articulemos em espaços apropriados. Através dela crescemos na confiança em nosso Salvador Jesus Cristo. A igreja não tem o poder de dizer quem vai para o céu ou para o inferno. Mas ela testemunha: somos salvos pela graça de Deus mediante a fé (Efésios 2.8). A graça amorosa de Deus vai muito além de nossa compreensão. Por causa dessa graça, a salvação nos é dada pela fé, que vem pela pregação da palavra de Deus (Romanos 10.17). O Batismo é um meio da graça. Essa não é a única via para a salvação. Deus dispõe de outros meios para nos salvar. A afirmação de Jesus – “Deixem que as crianças venham a mim” (Marcos 10.14) – não está condicionada ao Batismo, bem como à nossa compreensão racional acerca de Deus. O que decide a nossa salvação é o amor de Deus. Por causa do amor de Deus batizamos, testemunhando assim ao mundo o seu amor (Mateus 28.19-20). A fé apega-se à promessa de Deus no Batismo, mas não está exclusivamente condicionada a esse sacramento. A salvação não exclui os não batizados. Mesmo aqueles que foram batizados não têm garantia da salvação. Diante da situação inesperada e cheia de sofrimento da morte de um bebê não batizado, só podemos confessar: “Entrega o teu caminho ao Senhor. Confia nele e o mais ele fará” (Salmo 37.5). A morte não nos separa de Deus, mesmo quando não batizados. Deus cuida de todos nós! Também do bebê que não é batizado e veio a falecer. Onde Deus está, ali é o céu. Confie na graça que vem reconciliar-te também diante das dores da perda. O que decide a salvação é o amor de Deus. Esse amor também se torna visível quando somos acolhidos para compartilhar o nosso sofrimento diante de perdas e dores N existenciais. WERNER KIEFER é teólogo e ministro da IECLB na Comunidade Matriz de Porto Alegre (RS) NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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o reformador
A voz interior “Eu mesmo já salvei a muitos, mas a mim mesmo não posso salvar.”
Martim Lutero
por Leandro Hofstaetter
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BARÃO DE MÜNCHHAUSEN é um personagem da literatura alemã juvenil que se equilibra entre a realidade e a fantasia em seu mundo próprio, onde enfrenta os mais diversos perigos e escapa de modos impossíveis (sendo o mais famoso deles a fuga de um pântano onde afundava, puxando-se pelos próprios cabelos). É uma interessante parábola para a tentativa de alguns cristãos de salvar-se a si mesmos.
interior. Essa é formada por tudo aquilo que marca a existência de uma pessoa. Quero dizer, por tudo aquilo que um ser humano tem de DNA e por experiência, desde as suas próprias características que o distinguem dos demais até os seus aprendizados em relação à sua circunstância e educação familiar e cultural. A voz que vem do seu Eu não é apenas dele, e sim uma mistura de tudo isso. Quem contro-
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resce cada vez mais o número de pessoas cujas doutrinas se assentam sobre uma suposta voz interna que devemos ouvir para conseguir dar conta de nossas vidas. E mais: somente no escutar dessa voz e no silenciar perante o mundo conseguiremos atingir a tão esperada e proclamada paz interior e, por conseguinte, também a exterior. À pergunta do que venha a ser essa voz nem todos sabem responder. Muitos entretanto dizem que é Deus, pois ele está tão intimamente ligado, que chegam até a dizer que ele está dentro do ser humano. Por isso, se realmente conseguirmos silenciar, ele falará conosco e saberemos, enfim, o que fazer e por onde seguir. Para Lutero, no entanto, o ser humano é um escravo de seu ego, e essa suposta voz interior nada mais é do que o apelo egoísta de alguém ensimesmado e pronto a realizar tudo que seja em seu favor. Ou seja, nada a ver com o Deus anunciado por Jesus Cristo. O ser humano é somente um pedinte perante Deus. Vejamos o porquê do repúdio de Lutero à suposta voz
laria o que vem de dentro é o próprio ser humano. No entanto, sabemos que isso não é verdade. Agimos muitas vezes por instinto e não conseguimos separar uma ação humana deste todo complicado que é a própria pessoa. Explico: mesmo às vezes tendo consciência do que fazemos, essa mesma consciência vem atada a uma série de pré-requisitos que não são tão conscientes assim. É a velha contradição humana que angustia o próprio apóstolo Paulo quando pergunta: por que, ao fazer o bem que quero, realizo o mal que não quero? Seguindo a tradição bíblica, Lutero reafirma que somente há salvação para o ser humano através de uma voz exterior. Essa é a voz de Deus: que o atinge de fora através de boca humana. Essa voz é mediada através das escrituras do Antigo
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DE OLHO NA EDUCAÇÃO e Novo Testamentos. A voz do evangelho que julga e salva é algo exterior e não pode ser confundido com a voz interior. Se o ser humano depender dele apenas, acontecerá aquilo que o apóstolo Paulo descreveu. Se o ser humano ouvir a palavra da salvação, ele sairá do ensimesmamento e poderá libertar-se de si e tornar-se livre para servir ao próximo por conta do amor de Deus. E é justamente por isso que Lutero bate tanto na tecla de que a palavra de Deus age de duas formas, todas exteriores: através da boca do pregador e através dos sacramentos. Por conta de que o ser humano de tudo duvida, poderia a palavra pregada cair em abstração. Por isso Jesus Cristo nos deu os sacramentos, que são palavra tornada concreta, que nos auxilia na fé em Deus e na comunhão com os irmãos e irmãs. Desta forma, Lutero nos chama a desconfiar apenas de nossa voz interior, mesmo que ela seja mediada através do estudo e da meditação das Escrituras. De nada adianta ficar em casa lendo a Bíblia e orando sozinho. É necessário colocar-se em relação, pois é diante dos outros que fé e amor são postos à prova. Precisamos ouvir dos outros a palavra da Bíblia e partilhar do evangelho concreto que encontramos nos sacramentos. É desse contexto a sua frase lapidar: Eu mesmo já salvei a muitos, mas a mim mesmo não posso salvar. Sou dependente da palavra de Deus na boca e nos gestos de outros e de uma comunidade reunida que me conforta e estabelece laços de unidade através dos sacramentos. A minha salvação não é minha. Sou um pedinte diante de Deus e dos outros. Nada mais contrário à soberba e autonomia tão caras aos nossos olhos nos dias de hoje. Mesmo distante do nosso tempo, Lutero nos chama a atenção. N Seguiremos seu conselho? LEANDRO HOFSTAETTER é teólogo e doutor em Filosofia em Joinville (SC)
Educação: Utopia da humanidade por Osvino Toillier A educação transformou-se em preciosa mercadoria no mercado global, o que condiciona a instituição educacional a produzir resultados operacionais, porque essa é a régua com que os investidores medem suas aplicações. A recente criação do maior grupo educacional do mundo com a fusão da Kroton e Anhanguera alcança o impressionante número de 1.108.000 alunos. As avaliações nacionais e internacionais produzem repercussão profunda nas instituições educacionais de todos os níveis, condicionando currículos, impondo conteúdos, atropelando convicções pedagógicas que se rendem à imposição do mercado: é preciso produzir resultados para os pais e a sociedade. Afinal, essa é imagem que se busca: ENEM, PISA, SAEB e outras siglas. Educação é isso apenas? Será que não estamos nos submetendo a condicionamentos de que não nos damos conta? A minha resposta: Sim, com certeza! E a maioria dos dirigentes não tem consciência disso, preocupada em cumprir meta: a escola tem que ser destaque nas avaliações externas. E o professor? Ao professor não se pergunta, em muitas escolas, se ele está de acordo. Ele até já perdeu o direito de escolher o livro didático, porque essa passou a ser feita pela equipe técnica. Ao professor cabe cumprir o programa, desenvolver aulas interessantes para que o aluno aprenda a trabalhar intensivamente na sala de aula e dar tema de casa diariamente. Atividades externas são colocadas sob suspeita como atividade não produtiva. E tem mais: muitos alunos estão em atendimento emocional porque não suportam o grau de tensão pela cobrança que enfrentam. A escola precisa de resultados, e em razão disso a esteira roda. Se não tiver condições de acompanhar, procura outro colégio. A grande crise da educação é precisamente esta: a escola tornou-se instituição de resultado do mercado, e isso não combina com utopia, com sonho, com processo, com tempo necessário para aprender, sem pressa nem pressão. Onde foi que nos perdemos? Quando o professor deixou de ser protagonista e virou coadjuvante? A utopia exige que tenhamos a coragem de devolver à escola a poesia e o sonho, em que o brincar e o lúdico sejam permitidos como forma de aprender. Aí conteúdo vira curiosidade! Eu tenho esperança de que somos N capazes de reversão de turbina! OSVINO TOILLIER é professor e mestrando em Educação em Porto Alegre (RS) NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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ENTREVISTA
Combate a gripes e resfriados por Luciana Reichert
Quais os cuidados que devemos tomar com a chegada do inverno? Com a chegada do inverno a gente sabe que aumenta a incidência de doenças respiratórias, tanto virais como bacterianas, principalmente virais, que são as mais comuns. A primeira coisa a cuidar nessa época é tentar manter o ambiente o mais arejado possível, pois ambientes fechados facilitam a transmissão de agentes infecciosos. É importante ter uma alimentação saudável e equilibrada, lavar as mãos e usar o álcool gel. Quem tem problemas alérgicos sofre mais nesta época do ano? Piora nesta época. As alterações na mucosa facilitam que vírus ou bactérias consigam levar a um processo infeccioso. Além das alergias, quais são as outras enfermidades que mais atacam nesta época? As principais doenças de inverno são respiratórias, as gripes e os
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resfriados, que são doenças virais, e as infecções bacterianas também. As doenças virais são as grandes vilãs do inverno. Quais são essas doenças bacterianas? Aí nós temos as amigdalites, as faringites de origem bacteriana, principalmente causadas pelo streptococcus. São doenças que podem vir como complicação de uma doença viral. O que a gente estranha é o fato de que se usam muitos antibióticos para essas doenças, o que, na verdade, não precisaria. A gente recomenda evitar ao máximo o uso de antibióticos. Usar realmente depois de o médico avaliar, e se usar, a gente recomenda que se use o de menor espectro possível. Quais são os riscos de usar antibióticos indiscriminadamente? De começar a gerar bactérias resistentes a essa classe de antibióticos, fazendo com que essas bactérias mais resistentes comecem a não responder ao tratamento, fazendo com que periodicamente se necessite aumentar o espectro do antibiótico, usando antibióticos cada vez mais potentes, até chegar a um ponto em que não vai mais ter antibiótico que funcione. A gente já está chegando num ponto em que pacientes internados na UTI têm bactérias tão resistentes, que nenhum antibiótico disponível
Luciana Reichert
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om o frio chega também a época de gripes e resfriados. A estação mais fria do ano requer alguns cuidados. Para esclarecer mais sobre o assunto, o Dr. Ricardo Siegle, médico infectologista, responsável pelo controle de infecção hospitalar no Hospital Regina em Novo Hamburgo (RS), explica sobre doenças de inverno.
funciona. As pessoas vão voltar a morrer de infecções que antes eram tratáveis. Às vezes, a pessoa dá um ou dois espirros e já está tomando antibiótico. A vacina contra a gripe é realmente eficaz? A todos os que puderem fazer se recomenda que façam. Ela é altamente eficaz. Ela tem algum efeito colateral? Sim. Qualquer remédio, qualquer produto que a gente ingere pode ter um efeito colateral. Pode ter tanto efeitos gravíssimos, como alergia, choque anafilático para quem não tolera algum componente da vacina, como alguns mais comuns, que são os efeitos irritativos locais. Quem já está gripado pode fazer a vacina? Para quem está gripado ou com febre a gente recomenda deixar passar esse período e depois fazer.
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Assim como quem sofre de imunossupressão grave, quem está fazendo quimioterapia, usando corticoides em altas doses, também não deve fazer.
Medicamentos em forma de chás vendidos em farmácias têm riscos? O uso indiscriminado desses descongestionantes pode causar aceleração cardíaca e arritmias em alguns pacientes de risco. A presença do ácido acetilsalicílico pode favorecer a formação de úlceras no estômago e também ser tóxico para os rins.
Fique ligado: O uso indiscriminado de descongestionantes pode causar aceleração cardíaca e arritmias em alguns pacientes de risco. O USO INDISCRIMIDADO De ANTIBIÓTICOS começa a gerar bactérias resistentes, fazendo com que TAIS bactérias não respondAM MAIS ao tratamento. COM ISSO, periodicamente se necessitA aumentar o espectro do antibiótico, usando antibióticos cada vez mais potentes, até chegar a um ponto em que não vai mais ter antibiótico que funcione. A gente já está chegando num ponto em que pacientes internados na UTI têm bactérias tão resistentes, que nenhum antibiótico disponível funciona. As pessoas vão voltar a morrer de infecções que antes eram tratáveis.
A mudança de temperatura é mito ou é mesmo prejudicial ao organismo? Não é mito. A mudança de temperatura favorece a irritação da via aérea para quem é sensível ou é alérgico e pode reduzir as defesas do sistema imunológico. Com as mudanças em geral de temperatura ficamos mais suscetíveis a doenças respiratórias.
O que deve fazer quem já está gripado ou resfriado? O que cura resfriado é chá caseiro, bastante líquido, eventualmente um analgésico, se estiver com muita dor, ou um paracetamol, se tiver febre. A gripe dura de dois a quatro dias. Recomenda-se repouso e não ir trabalhar ou ir à escola para evitar a transmissão aos colegas. Indo gripado, o rendimento no trabalho diminui, a pessoa deixa de fazer repouso, prolonga o tempo de doença e passa a gripe N para os colegas.
LUCIANA REICHERT é jornalista em São Leopoldo (RS) NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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REFLEXÃO
Olhar para o alto Todavia, estou sempre contigo, tu me seguras pela minha mão direita. Tu me guias com o teu conselho e depois me recebes na glória. Salmo 73.23-24
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onta-se que um jovem que trabalhava num navio, certo dia, em plena viagem e diante de uma tempestade que se aproximava, teve que subir até o mastro para consertar algo. O vento estava forte. O navio em alto-mar era sacudido fortemente pelas ondas e pelo vento. E lá estava o jovem, agarrado ao mastro do navio. Ele olhava para baixo e via como a força das ondas e do vento tornava a viagem perigosa. Lá do alto do mastro, sentiu medo e começou a ficar tonto. Corria o risco de desmaiar, caindo lá de cima para dentro das águas perigosas do mar. O capitão do navio viu o perigo no qual o jovem se encontrava. Então gritou para ele: “Jovem, não olhe para baixo. Olhe para cima!”. O jovem desviou seu olhar apavorado das ondas do mar, que eram tão ameaçadoras, e olhou para o alto, e a tontura passou. Esse olhar para o alto salvou sua vida. Ao contrário do que muitas vezes nós fazemos diante de dificuldades e adversidades, esse jovem não se fixou em seu medo e em seu sofrimento, mas olhou para o alto. E esse olhar para o alto, esse olhar para Deus salvou sua vida. Sim, porque se não conseguirmos olhar para o alto, se não voltarmos diária e continuamente o nosso olhar para Deus,
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corremos o risco de sucumbir ou entrar em pânico e desespero diante da primeira dificuldade ou desafio a ser enfrentado. A verdade é que, olhando nua e cruamente para a realidade, constatamos que a mesma não está fácil para ninguém. Vemos tantas pessoas insatisfeitas, seja com seu trabalho, com a vizinhança, com a família, com a igreja a que pertencem, com o jeito como a sociedade anda, insatisfeitas até consigo próprias. E me pergunto: o que vem causando tanta insatisfação e desânimo? Um dos grandes problemas e que tem gerado muita insatisfação é que hoje em dia é muito grande o valor que se coloca sobre o ter, e assim grande parte das pessoas acaba por trabalhar além do que as suas condições físicas e emocionais permitem, a fim de satisfazer seus desejos e anseios materiais. Assim, diante desse corre-corre que a vida nos impõe ou que nós próprios nos impomos, facilmente nos deixamos levar pelas ofertas encantadoras deste mundo e desviamos os nossos olhos do caminho proposto por Deus, ou seja, facilmente desviamos o foco daquilo que realmente é importante e dá fundamento à nossa vida. Descuidamos de nós, da nossa saúde, da nossa família. Não temos tempo para
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por Neusa Butzlaff
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ir à igreja, ouvir a palavra de Deus, não tiramos tempo para a comunhão com outras pessoas. Alimentamos o nosso físico e esquecemos o nosso lado espiritual e emocional. No entanto, chega um momento em que nossas forças terminam e precisam ser recarregadas. E eu pergunto: onde recarregamos as nossas energias, onde buscamos o alimento e o combustível para aquilo que serve de alicerce e fundamento para a nossa vida? Muitos lembram-se de voltar os olhos para Deus apenas quando o “sapato aperta”, quando o desespero bate à porta. E então ainda exigem soluções milagrosas para seus problemas. No entanto, quando tudo vai bem, agem e vivem como se Deus não existisse. Nesse sentido, quero lembrar as palavras de confiança do salmista. No salmo 73, ele assim afirma: “Todavia, estou sempre contigo, tu me seguras pela minha mão direita. Tu me guias com o teu conselho e depois me recebes na glória”. Sim, aquela pessoa que mantém seus olhos voltados para Deus sabe e pode viver a partir da certeza de que Deus é um Deus presente, um Deus conosco, o qual nos segura pela mão e que nos carrega quando assim for necessário. E quem se sente cuidado e guardado por esse Deus dificilmente perderá o sentido da vida, pois manterá o foco naquilo que dá sustento e fundamento a ela. Isso não significa que jamais haverá problemas, dificuldades, tristezas, desilusões, mas significa que maior do que todas as dificuldades serão a nossa disposição e a nossa força para superá-las, porque nós temos um Deus que está conosco, que nos guia e segura pela mão, assim como afirma o salmista no Salmo 73. N NEUSA BUTZLAFF é teóloga e ministra da IECLB em Marcelino Ramos (RS) NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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ESPIRITUALIDADE
Pátria de chuteiras?
por Roberto E. Zwetsch
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unho de 2014 ficará marcado no calendário brasileiro pelo evento máximo do futebol mundial: a Copa do Mundo. Durante um mês, a imprensa só falou de futebol. Seremos hoje a “pátria de chuteiras”? Estará nos pés de nossos habilidosos jogadores de futebol a dignidade brasileira, a sua força como povo e nação? Mas a questão colocada remonta a um tema mais antigo, que vem do início do cristianismo, passa pelos Pais da Igreja, marca o longo período da Idade Média, ganha força renovadora na Reforma, desdobra-se com o Iluminismo e o Liberalismo e chega aos tempos atuais com novas ressonâncias. A questão é saber como se portam as pessoas e as igrejas cristãs diante do Estado, do poder político. Há uma teoria que prevaleceu nas igrejas cristãs, fazendo uma nítida separação entre o governo espiritual, supostamente a cargo da igreja, e o governo secular-político, restrito às autoridades, sejam governos autocráticos ou democráticos. Essa tradição acarretou consequências danosas ao longo da história, pois significou mui-
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tas vezes a subserviência das pessoas e das igrejas aos governos de plantão. Quando se busca na teologia de Lutero algum princípio ou ensino teológico que nos sirva de inspiração para tratar desse tema, há quem recorde que dele veio uma chamada doutrina dos dois reinos. Na realidade, ela nunca foi como tal encontrada em seus escritos. De qualquer forma, a expressão está ligada ao nome de Lutero e às igrejas luteranas. De fato, Lutero propugnou a autonomia de ambas as instituições, mas nunca a separação em termos de responsabilidades para com o bem comum da cidadania, do povo. O que se pode afirmar, em boa teologia, é que Lutero defendeu que tanto o poder secular como o poder espiritual têm tarefas comuns a desempenhar para o bem das pessoas e das comunidades, e isso como atribuição concedida por Deus, o Senhor de ambos os poderes. Porque o Deus criador continua a agir no mundo até os dias de hoje, assim como fará no futuro. A teologia luterana tem, assim, uma contribuição para os debates atuais sobre participação política, responsabilidade social, cuidado
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A copa do mundo de futebol torna o brasil uma pátria de chuteiras e levanta a questão do nosso comportamento como pessoas e igreja diante do estado, do poder político.
com o meio ambiente ou o futuro da humanidade neste planeta limitado e vulnerável em que vivemos. Segundo o pastor Walter Altmann em seu livro Lutero e Libertação, essa responsabilidade pública da comunidade cristã verifica-se nas decisões entre o que é justo e o que é injusto: “Trata-se de lutar concretamente em favor da justiça e do direito, da democracia e da participação popular, tanto na ordem do Estado como na das próprias igrejas”. Mas com base em que critério avaliar essas ações, o cumprimento de tarefas tão grandiosas? Aqui entra outro argumento da teologia de Lutero,
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central no evangelho de Jesus. Segundo o teólogo finlandês Antti Raunio, estudioso de Lutero, a responsabilidade pela justiça social é a característica de uma boa comunidade, seja civil ou cristã. Tal responsabilidade é medida a partir da defesa dos direitos dos mais pobres e vulneráveis. No escrito de Lutero Exposição do Salmo 82, ele foi bem enfático: é preciso que a sociedade institua leis em defesa do bem comum, leis que garantam os direitos dos pobres. Por quê? Porque na ausência dessas leis “os pobres, órfãos e viúvas são esquecidos, e as pessoas destroem, assaltam, roubam e ludibriam-se reciprocamente”. Lutero reconhece que a ausência de leis sociais boas acaba por afetar, em primeiro lugar, os membros mais fracos da sociedade. A base para esse posicionamento vem da lei do amor! É impressionante e muito atual que Lutero tenha colocado o amor como fundamento tanto da lei de Deus como de leis seculares. O bem do outro, o bem do próximo, é que deve guiar a formulação de leis públicas que garantam a justiça social e o bem de toda a sociedade. O amor ao próximo cumpre toda
a lei, escreveu o apóstolo Paulo (Romanos 13.10). Por isso amar é o maior desafio para qualquer ser humano e a sociedade humana. Porque amar exige criatividade, capacidade de escutar e compreender a outra pessoa, suas necessidades e desejos, para responder à altura e com sentido de justiça. Amor e justiça: se faltar um desses dois, a sociedade perde, a humanidade se apequena, sofre e destrói a si mesma. Amar é doar-se ao outro, como Deus fez por nós. Amar o próximo é procurar sempre o seu bem, mesmo quando eu mesmo possa vir a ser prejudicado. Paradoxalmente, essa regra é a única que pode manter saudável e justa uma sociedade. Isso contraria tudo o que ouvimos na propaganda como ideal da sociedade consumista dos dias atuais. A partir da lei do amor, Lutero uniu na explicação do mandamento maior os dois âmbitos: o espiritual e o secular, a pátria do céu e a pátria da terra. Quem somos nós para separá-las? Pátria de chuteiras? Devagar com o andor que o N santo é de barro. ROBERTO E. ZWETSCH é teólogo, pastor da IECLB e professor da Faculdades EST em São Leopoldo (RS)
As salas do Centro de Retiros, junto com a capela da Casa Matriz, oferecem um espaço ideal para retiros, encontros e eventos. As instalações da hospedagem contam com quartos com banheiro, refeitório e local para estacionamento. Em meio a abundante natureza, o ambiente tranquilo e acolhedor favorece a reflexão, a integração e o lazer. Dispomos de serviço de hospedagem, individual ou em grupos, ideal para realização de retiros, eventos ou para aqueles que desejam apenas hospedar-se aqui. Av. Wilhelm Rotermund, 395 - Morro do Espelho - São Leopoldo Fone: (51) 3037-0037 | retiros@diaconisas.com.br | www.diaconisas.com.br NOVOLHAR.COM.BR –> Jul/Set 2014
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penúltima palavra
Um bom protesto! por Nestor Paulo Friedrich
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propaganda é a alma do negócio – diz um ditado popular. O apóstolo Paulo expressou ideia semelhante, referindo-se à Palavra de Deus: Como as pessoas poderão crer, se não ouvirem a mensagem? (Romanos 10.14). Para a igreja de Jesus Cristo, o “negócio” é a palavra do Senhor. Não por acaso temos enorme alegria em dizer que a IECLB é a igreja da
palavra. O papel da igreja é anunciar o evangelho. Em meio às trevas da vida, a igreja anuncia que já brilha a luz de Cristo. Isso é o que nos afiança a palavra. Para fazer ecoar essa palavra, precisamos de meios e oportunidades. Na IECLB, cada culto é uma oportunidade para o anúncio do evangelho. Leituras bíblicas, orações, hinos, particularmente a prédica, são meios para o anúncio da palavra. Como o culto, há tantas outras oportunidades e meios para fazer ouvir a palavra. São os programas de rádio e de televisão. É o que se quer com o Jorev Luterano, com os jornais sinodais, a revista O Amigo das Crianças, o Portal Luteranos, nossos devocionários, os boletins de paróquias, comunidades, sínodos e de outras organizações. Uma década atrás, a IECLB ousou dar um passo a mais em termos de comunicação da palavra. Criou a revista Novolhar. Queria dispor de A trajetória entre a primeira e a última edições da revista agora é retomada com a presente edição.
um instrumento mais moderno, com linguagem atual, para abordar assuntos contemporâneos e complexos, iluminando-os com a luz que irrompe do evangelho, da palavra. No final do ano passado, entendeu-se que a Novolhar não tinha mais condições de sobrevida. Era uma questão de matemática: o número de assinantes impedia sua circulação. Decisão necessária – terminar a edição da revista, dizia a notícia. Bastou falar em encerramento desse projeto para que muitas vozes viessem em sua defesa, por sua continuidade. “Como é possível que uma revista com essa qualidade não encontre espaço e chão suficiente para ampliar o conhecimento e oferecer fundamentos para o exercício da cidadania a partir da fé cristã?” – questionou o pastor emérito Rolf Droste. As vozes do bom protesto contribuíram com o movimento que se fez por parte da presidência da IECLB junto aos pastores e à pastora sinodais e aos membros do Conselho da Igreja. Duas rodadas de diálogo resultaram no que poderíamos chamar de pacto pela manutenção da Novolhar. E deu certo. Conseguimos! A manutenção da Novolhar, com novo vigor, alegra-nos e é motivo de gratidão a todas as pessoas e instâncias da igreja que por ela se empenharam. Valeu nosso mutirão em defesa desse veículo para uma comunicação séria, coerente, construtiva, que busca divulgar a palavra de Deus pelo viés luterano. Imprescindível é que não nos acomodemos, mas que invistamos nesse e em todos os meios de que dispomos para “vender nosso produto”, anunciar a palavra. É nessa perspectiva que já se decidiu: o tema do ano de 2015 será “Comunicação”. N NESTOR PAULO FRIEDRICH é Pastor Presidente da IECLB em Porto Alegre (RS)
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