Mensalmente com o POSTAL em conjunto com o PÚBLICO
OUTUBRO 2013 | n.º 62 8.962 EXEMPLARES
www.issuu.com/postaldoalgarve d.r.
Grande ecrã: d.r.
O vibrador no cinema
p. 3
Aqui há espectáulo: d.r.
O ciclo autárquico e a decisão da programação cultural
Projecto Barril: Reinventar o território
p. 5
p. 4
Letras e leituras:
Gabo - eterna memória
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p. 6
Da minha biblioteca d.r.
Álvaro de Campos:
António Ramos Rosa, pelas suas palavras p. 10
A última visita a Tavira 8
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04.10.2013
Cultura.Sul
Editorial
Espaço CRIA
Annus horribilis
O empreendedorismo é uma moda ou veio para ficar?
Ricardo Claro
Editor ricardoc.postal@gmail.com
Nunca podemos presumir que determinadas pessoas são mais relevantes do que outras, muito menos na morte. Não obstante, o ano que ainda corre é para a cultura no Algarve, e do país, um verdadeiro annus horribilis no que à matéria dos adeus físicos respeita. Não porque determinadas pessoas sejam necessariamente mais importantes do que quaisquer outras, mas porque o seu espaço vital era enorme na cultura e enorme é, pois, o vazio que deixam. É a segunda vez que ocupo este ano este espaço com um adeus a homens de grande valor. Primeiro Rosa Mendes e agora António Ramos Rosa. Vultos maiores, humanos de reconhecido valor e donos de um papel determinante e determinativo na cena cultural do Algarve, este editorial é um espaço que é seu por direito. O adeus fez-se com um singelo e simultaneamente imenso “Estou vivo e escrevo o Sol”. Aos 88 anos, António Ramos Rosa deixa o espaço que se enche agora da vida eterna dos seus poemas, das linhas imensas de significados que nos entregou como legado. Farense ilustre, laureado repetidas vezes por uma obra que muito consideram ímpar, o Prémio Pessoa (1988) e Poeta Europeu da Década (1991), nunca se deslumbrou pelas distinções, antes fê-las representativas de uma liberdade inabalável, nomeadamente, quando recusou uma distinção atribuída pelo poder em pleno Estado Novo. Há quem tenha o dom de se fazer dono de um tempo fora do tempo pela obra que deixa por este caminho que é o da vida. António Ramos é um desses exemplos de conquista da eternidade, e é-o mesmo que o não soubesse, de eternamente grande que foi em vida... “Vivi tanto que já não tenho outra noção de eternidade que não seja a duração da minha vida” Em Torno do Imponderável, 2012
Susana Imaginário Gestora de Ciência e Tecnologia no CRIA – Divisão de Empreendedorismo e Transferência de Tecnologia da UAlg
Nos últimos anos tem-se verificado o aumento da importância dada à temática do empreendedorismo, que, num sentido estreito, está associada à criação de empresas. Este conceito, embora seja utilizado desde o século XVII, ganhou mais importância na década de 40, do século XX. Todavia, agora que passou a ser estudado por outras ciências que não apenas as económicas, nomeadamente a Sociologia e a Psicologia, atingiu um novo apogeu. Portugal não tem ficado indiferente a este fenómeno, sendo cada vez mais frequente o aparecimento de concursos de ideias de negócios, o ensino de disciplinas de empreendedorismo nas escolas (principalmente ao nível do ensino superior) e a implementação de programas de educação para o empreendedorismo. Se, por um lado, as primeiras medidas estão mais voltadas para a população adulta, as últimas abrangem todas
as faixas etárias da população estudantil. Estes programas de educação para o empreendedorismo apresentam uma diversidade de abordagens práticas e dinâmicas que promovem a aquisição de conhecimentos e competências empresariais e empreendedoras, ao mesmo tempo que potenciam o desenvolvimento de competências
a criação de uma empresa na sala de aula, enquanto outros se baseiam no desenvolvimento de um plano de negócios para uma possível empresa e outros preveem o desenvolvimento de produtos inovadores. Quando se fala em competências empreendedoras é concordante a existência de características empreendedoras e de d.r.
pessoais e sociais, como por exemplo o sentido de responsabilidade e a capacidade de iniciativa. Embora os programas já implementados, ou em vigor, apresentem diferentes metodologias, é possível referir que existem modelos que pressupõem
características intraempreendedoras. Das primeiras pode-se destacar a adaptabilidade a diferentes situações, a persuasão, a assunção dos riscos e a competitividade. Relativamente às características intraempreendedoras, pode-se destacar a capa-
Ficha Técnica:
Direcção: GORDA Associação Sócio-Cultural
cidade de iniciativa, o trabalho independente, a capacidade de comunicação e de gestão do tempo. Com base nesta descrição, pressupõe-se então, que uma pessoa empreendedora não é apenas aquela que cria a sua própria empresa, podendo as suas características empreendedoras refletir-se em todos os aspetos da sua vida quotidiana. Desta forma, podemos ser empreendedores quando criamos o nosso próprio trabalho, quando procuramos um trabalho, quando nos empenhamos para manter o trabalho que temos e quando precisamos gerir o nosso tempo, a nossa casa e o nosso orçamento familiar. Tendo em conta a atual crise económica, muito marcada pelo aumento do desemprego e pela diminuição do rendimento mensal da população ativa, a educação para o empreendedorismo surge como uma necessidade para o desenvolvimento pessoal e profissional dos jovens, podendo até mesmo ser considerada como uma possível solução para fazer face a este problema. Neste sentido, torna-se essencial que exista uma aposta educativa no fomento do empreendedorismo e das competências empreendedoras, que deve ter início desde tenra idade com iniciativas adequadas à faixa etária em questão.
Juventude com arte e ideias! João Evaristo
Coordenador da Casa da Juventude de Olhão
Talento, rigor, empenho, dedicação e responsabilidade são algumas das características que regularmente tenho vindo a encontrar na maioria dos nossos jovens. Quem acompanha e apoia esses jovens, como é o caso da Casa da Juventude de Olhão, observa diariamente a concretização des-
Paginação: Postal do Algarve Responsáveis pelas secções: • Contos da Ria Formosa: Pedro Jubilot • Espaço ALFA: Raúl Grade Coelho • Espaço AGECAL: Jorge Queiroz • Espaço CRIA: Hugo Barros • Espaço Educação: Direcção Regional de Educação do Algarve • Espaço Cultura: Direcção Regional de Cultura do Algarve • Grande ecrã: Cineclube de Faro Cineclube de Tavira • Juventude, artes e ideias: Jady Batista • Da minha biblioteca: Adriana Nogueira • Momento: Vítor Correia • Panorâmica: Ricardo Claro • Património: Isabel Soares • Sala de leitura: Paulo Pires Colaboradores desta edição: Joana Pires João Evaristo Paulo Serra Susana Imaginário Parceiros: Direcção Regional de Cultura do Algarve, Direcção Regional de Educação do Algarve, Postal do Algarve
Juventude, artes e ideias
sas qualidades nas inúmeras actividades artísticas, desportivas ou de carácter social realizadas por todo o lado. Dos muitos obstáculos que estes jovens têm que ultrapassar, um deles não se compreende, refiro-me a alguma falta de reconhecimento ou até descrença por parte dos seus pares, mas mais grave por parte das gerações anteriores. Acreditar na juventude, reconhecer o seu valor, dar-lhes estímulo e apoio é uma responsabilidade de todos. O espaço J - Juventude Artes e Ideias tem cumprido bem esse papel. Para além de um excelente exemplo da dedicação e talento representados por Jady Batista, Mariana Ramos e Danie-
Editor: Ricardo Claro
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e-mail redacção: geralcultura.sul@gmail.com e-mail publicidade: anabelagoncalves3@gmail.com
on-line em: www.issuu.com/postaldoalgarve
la Rita, entre muitos outros colaboradores pontuais, tem contribuído, ao longo dos últimos 12 meses, para a divulgação das muitas iniciativas dos jovens junto da comunidade. Este espaço é hoje um orgulho para todos os que o acompanham, pelo conceito inovador e pela função que desempenha. A parceria com o «Cultura.Sul» e o «O Olhanense» permitiu uma
maior expansão da informação, dignificando o J e atraindo mais jovens para a imprensa local e regional. Nestas 12 edições podemos comprovar a qualidade do trabalho desenvolvido por estes jovens mas, acima de tudo, e caso dúvidas houvessem, a responsabilidade de iniciar um projecto e mantê-lo.Parabéns e continuação do excelente trabalho.
Tiragem: 8.962 exemplares
Cultura.Sul
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Grande ecrã Cineclube de Faro
Programação: cineclubefaro.blogspot.pt IPJ | 21.30 HORAS | ENTRADA PAGA CICLO FRAGMENTOS FAMILIARES
8 OUT | LIKE SOMEONE IN LOVE, Abbas Kiarostami, França/Japão, 2012, 109’, M/12 15 OUT | UMA FAMÍLIA RESPEITÁVEL, Massoud Bakhshi, Irão/França, 2012, 90’, M/12 22 OUT | APENAS O VENTO, Benedek Fliegauf, Hungria/Alemanha/França, 2012, 95’, M/12 29 OUT | NOIVA PROMETIDA, Rama Burshtein, Israel, 2012, 90’, M/12 SEDE | 21.30 HORAS | ENTRADA GRATUITA CICLO MIKE LEIGH 1971-1996 10 OUT | LIFE IS SWEET, 1990 (leg. ing.) 17 OUT | MEANTIME, 1984 (leg. ing.) 24 OUT I NU, 1993 (leg. por.) 31 OUT I SEGREDOS E MENTIRAS, 1996 (leg. por.) FILME FRANCÊS DO MÊS | BIBLIOTECA MUNICIPAL | 21.30 HORAS 25 OUT | L’ARBRE ET LA FORET, Olivier Ducastel, Jacques Martineau, França, 2010
Um vibrador no cinema Enquanto estamos à espera de poder exibir um leque de filmes com bastante interesse (Beyond the Hills, The Guard, Dans la Maison, etc...), cujas cópias ainda não estão disponíveis para exibição em Tavira, este mês apresentamos dois filmes nacionais com interesse, ao mesmo tempo tentando cumprir a quota de 30% de filmes nacionais que o ICA exige que exibamos (ao longo do ano). Claro que a falta de disponibilidade de cópias tem a ver com o que escrevi no mês passado sobre a crescente “digitalização” da exibição cinematográfica no nosso país... Além destes dois filmes nacionais, um documentário sobre Gilberto Gil e a sua música: Viramundo; o último filme de Costa Gavras (Z, The Missing, etc...) sobre a mentalidade dos bancos nessa “crise” económica que inventaram (ai, blasfêmia!): “continuaremos a roubar os pobres para dar aos ricos”; e um filme que
Cineclube de Tavira d.r.
Programação: www.cineclubetavira.com 281 971 546 | 965 209 198 | 934 485 440 cinetavira@gmail.com SESSÕES REGULARES Cine-Teatro António Pinheiro | 21.30 horas 17 OUT | LE CAPITAL (O CAPITAL), Costa Gavras, França 2012 (114’) M/12
Hysteria, um filme sobre uma particular invenção
24 OUT | HYSTERIA (BOAS VIBRAÇÕES), Tanya Wexler, Reino Unido/França/Alemanha/Luxemburgo 2012 (100’) M/16 31 OUT | ATÉ VER A LUZ, Basil Da Cunha, Suíça/Portugal 2012 (95’) M/16
al (Secretary, Stranger Than Fiction, Away We Go, etc...). É sempre um prazer vê-la no grande ecrã, pela sua escolha e interpretação dos papéis... Divirtam-se!
de certa forma passou despercebido em Portugal: Hysteria (Boas Vibrações), sobre a invenção de uma ferramenta interessante e bastante popular: o vibrador. Ainda por cima o filme tem um elenco que conta com a Maggie Gyllenha-
Cineclube de Tavira
Espaço AGECAL
Gestão de museus, breve história (1) Na Antiga Grécia “museion” significava o lugar das musas, protectoras das artes e das ciências, onde se reuniam sábios e conhecimentos de todas as disciplinas. Na Idade Média predominaram os tesouros religiosos e as relíquias de santos. As catedrais e igrejas eram os principais locais de exposição de objectos artísticos. Durante o Renascimento aparecem as coleções reais, da aristocracia e da Igreja, objetos produzidos pelo homem (artificiallia) ou pela natureza (naturallia). Em muitas cidades da Europa “gabinetes de curiosidades” e também as primeiras galerias de arte. Os visitantes desses espaços, embrionários dos atuais museus, eram os próprios donos ou seus convidados, sendo excepcionalmente abertos ao público em ocasiões especiais. Em 1564 a Galeria dos Uffizi em Florença, projeto de Giorgio Vasari, de planta rectangular com três alas contínuas, foi o primeiro edifício especialmente desenhado para a função museológica. Nos séculos XVII e XVIII os palácios começaram a integrar galerias onde se guardavam pinturas de artistas de renome e também objectos valiosos. A Grande Galeria do Louvre
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Imagem do claustro do Museu de Faro que integra a Rede Portuguesa de Museus, a par dos de Albufeira, Portimão e Tavira foi inaugurada em 1793 por Napoleão Bonaparte. Os acervos resultantes das conquistas militares e da colonização começaram a ser exibidos em edifícios adaptados para fins expositivos. Objetos retirados dos contextos de origem foram colocados nas capitais imperiais, como um obelisco de Luxor dedicado a Ramsés II instalado em 1833 na Praça da Concór-
dia em Paris. As galerias e museus deixaram gradualmente de ser territórios condicionados às elites e ao academismo que ditava dogmas e modelos de como cultivar as “belas” artes. Em Portugal o liberalismo extinguiu no séc. XIX as ordens religiosas e ao desocupar edifícios criou oportunidades para a criação de museus, arquivos e bibliotecas. Uma porta-
ria de 1836 determinou que todas as capitais distritais tivessem os seus museus, gabinetes de pintura e de “raridades”. Em 1883 surge o primeiro museu público, o Museu Portuense e no ano seguinte o Museu Nacional de Bellas Artes e Archeologia inaugurado por D. Luís I. Em 1911 este foi subdividido em Museu Nacional de Arte Antiga instalado nas Janelas Verdes e no Museu Nacional de Arte Contemporânea. No séc. XX o conceito de museu evoluiu nas suas características, finalidades e especializações temáticas. Em Portugal com a implantação da democracia registou-se um enorme esforço de renovação teórica e um aumento de novas unidades museológicas. As cidades possuem hoje espaços de memória, de educação e investigação, marcados pela arquitetura e o turismo cultural. Surgiram também novas unidades expositivas destinadas ao mercado da produção artística contemporânea, galerias privadas e certames dirigidos a compradores institucionais e particulares. Muitos museus são hoje estruturas complexas, integram sistemas de comunicação, buscam centralidades
e possuem corpos profissionais especializados. Outros projectos procuraram a afirmação das periferias, valorizando a história e património locais com modelos conceptuais alternativos, museus de território, ecomuseus e outros. No Algarve existem dois museus com origem no séc. XIX, ambos situados em Faro, o ex-Museu Industrial Marítimo (1889) actual Museu Marítimo Ramalho Ortigão sob tutela do Museu de Marinha e o Museu Arqueológico e Lapidar Infante D. Henrique (1894) atual Museu Municipal de Faro. A maioria dos museus algarvios surgiu depois de 1974, predominando os de tutela autárquica. A Lei-Quadro dos Museus Portugueses (Lei nº 47/2004 de 19 de Agosto), explicitou as funções museológicas e estabeleceu também os requisitos para pertença à Rede Portuguesa de Museus – RPM. Este enquadramento permitiu entre outros aspectos a evolução na democratização e também apoios técnico-financeiros a acções concebidas e propostas pelos museus portugueses. No Algarve integram hoje a RPM os Museus Municipais de Albufeira, Faro, Portimão e Tavira. Direção da AGECAL
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Cultura.Sul
Aqui há espectáculo
Novo ciclo, novas realidades se impõem a continuidade do esforço e a salvaguarda das metas ultrapassadas. Exige-se hoje como sempre, mas particularmente hoje e no futuro, engenho e arte para do pouco muito fazer e para de pequenos nadas soluções de relevo construir. O desafio que se coloca na área da cultura aos autarcas, sejam presidentes ou vereadores com competências no pelouro, é exigente, mas exigente é-o também a assunção de responsabilidades na gestão da
12 OUT | Gala Internacional de Dança Terpsícore, 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 15 € 19 OUT | Abraça a CAuSA, com Sara Gonçalves, César Matoso, Virgílio Lança, Retro Nova, Dino, Nome e Tim (música), 21 horas, duração: 2h30, preço: 10 € 26 OUT | Sonho da Música III, 21.30 horas, duração: 1h45, preço: 10 € 30 OUT | 14ª Festa do Cinema Francês – “L’Écume des Jours”, de Michel Gondry, 22 horas, duração: 2h05, preço: 3.50 € 31 OUT | 14ª Festa do Cinema Francês – “Azur et Asmar”, de Michel Ocelot (10.30 horas), “Les Amants de Pont Neuf”, de Leos Carax (19 horas), “Alceste à Bicyclette”, de Philippe Le Guay (22 horas), preço: 3.50 € cada
Destaques
Mudam-se os tempos mudam-se as vontades. De quatro em quatro anos a ida às urnas para eleições autárquicas dita alterações de maior ou menos monta nos quadros dirigentes das autarquias, nomeadamente nas respectivas presidências e vereações, entre elas a da Cultura. Se esta é uma verdade para a maioria dos actos eleitorais, neste que decorreu no passado domingo é um facto notório. São dez caras novas na cadeira de presidente e, ainda
Teatro Municipal de Faro Programação: www.teatromunicipaldefaro.pt
26 OUT | Sonho da Música III, 21.30 horas, duração: 1h45, preço: 10 € É o terceiro “Sonho da Música” do Coral Ossónoba, já uma tradição em Faro, a que não se pode faltar. Dividido em três partes, Franz Lehár lidera a primeira. Árias famosas d’ “A Viúva Alegre” e “Giuditta” serão interpretadas pela
bem conhecida soprano Ana Ester Neves. A segunda parte é dedicada a Vinícius de Moraes, para comemorar o centenário do seu nascimento. Na terceira parte, é tempo de reviver momentos inesquecíveis do filme “Música no Coração”.
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AMO - Auditório Municipal de Olhão Programação: www.cm-olhao.pt/auditorio
Destaque
Até 26 OUT | Diálogos Pétreos, por Leandro Sindoncha (escultura), das 14 às 18 horas, entrada livre 5 OUT | Samirah (dança oriental), 21.30 horas, preço: 6 € 19 OUT | As Aventuras da Cigarra e da Formiga (música infantil), 16 horas, preço: 5 € (até aos 12 anos), 8 € (maiores de 12) 26 OUT | E Tudo o Casamento Levou (comédia), 21.30 horas, preço: 10 € (balcão), 12 € (plateia)
res publica. Aos que abraçam a função pública agora com novas responsabilidades ou com responsabilidades acrescidas, fruto da votação do passado domingo, importa dar o benefício da dúvida se mais se não quiser entregar, mas cabe acima de tudo aos algarvios olhar os novos titulares com o respeito que a função merece e, simultaneamente, seguir de perto a sua acção no sentido de acompanhar as decisões tomadas naquele que é um dos sectores fundamentais da vida. Sem Cultura há um empobrecimento radical das populações e seca-se um espaço vital no que respeita ao desenvolvimento, à criatividade e qualidade de vida. Este - muito embora aqui se não estinga - é o verdadeiro valor da Cultura e a sua importância no desenvolvimento integrado dos povos é um dado que, muitas vezes não palpável ou facilmente mensurável, justifica o máximo empenho. Aos autarcas pede-se isto tão só e não é pouco, mas ao pedir-se pede-se apenas o exigível em face de um direito inalienável dos cidadãos, o do acesso à Cultura. Ricardo Claro
Em digressão por inúmeras salas de espectáculo do país, é a vez do AMO receber esta comédia romântica que conta com Maria João Abreu e Almeno Gonçalves como protagonistas. E Tudo o Casamento Levou retrata a histó-
ria de um casal que se ama, que não pode viver um sem o outro, mas que também não consegue viver sem conflito. Prepare-se para rir bastante com episódios que decerto também já viveu.
Cine-Teatro Louletano Programação: http://cineteatro.cm-loule.pt 6 OUT | “O Sonho de uma Noite de São João” (cinema), 15.30 horas, duração: 1h25, entrada livre 10 OUT | “Até ver a Luz, de Basil da Cunha (cinema), 21 horas, duração: 1h35, preço: 3 € 17 OUT | “Contraluz”, de Fernando Fragata (cinema), 21 horas, duração: 1h45, entrada livre 20 OUT | “Turbo” (cinema), 15.30 horas, duração: 1h46, entrada livre 24 OUT | Improvisos à 5.ª, com “Ensinar-te”, 21 horas, entrada livre 26 OUT | Dead Combo (música), 21.30 horas, duração: 1h15, preço: 10 € 31 OUT | “Contrato”, de Nicolau Breyner (cinema), 21 horas, duração: 1h35, entrada livre 26 OUT | Dead Combo (música), 21.30 horas, duração: 1h15, preço: 10 € Os DEAD COMBO são Tó Trips e Pedro Gonçalves, músicos que encarnam duas personagens que poderiam ter saído de uma BD: um gato pingado e um gangster. Formado em 2003, o grupo já lançou 5 álbuns, três dos quais galardoados como
“Álbum do Ano” e/ou “Álbum da Década” em Portugal. “Lisboa Mulata”, o último registo de originais, foi editado em Outubro de 2011 e conta com a participação dos convidados Marc Ribot, Camané e Alexandre Frazão.
TEMPO - Teatro Municipal de Portimão Programação: www.teatromunicipaldeportimao.pt 8 OUT | Stacey Kent (música), 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 18 € (plateia), 15 € (balcão) 17 OUT | Quem se importa, de Mara Mourão (documentário), 21 horas, duração: 1h30, entrada livre 19 OUT | Vol.2 (música), 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 3 € (7.5€ com álbum autografado) 26 OUT | Caríssimas Canções, com Sérgio Godinho, Hélder Gonçalves, Manuela Azevedo e Nuno Rafael, 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 16 €
Destaque
que alguns sejam mandatos de suposta continuidade ou novos presidentes com larga intervenção na gestão anterior de autarquias, a verdade é que estamos perante dez novos protagonistas, para o melhor ou para o pior. Desejamos todos, cidadãos, forças vivas e gentes das artes e da Cultura em geral, que estes rostos sejam a face de uma aposta na vertente cultural séria, despudorada e sustentável. Isso exige o esforço feito ao longo de anos pelas autarquias na promoção da Cultura e o largo investimento realizado no sector, independentemente de uma análise crítica das escolhas preconizadas. Construíram-se infra-estruturas, criaram-se públicos, apoiaram-se agentes culturais, desenvolveram-se estratégias em rede, apostou-se na qualidade técnica, edificada e discursiva e este esforço e os seus frutos não devem e, acima de tudo, não podem ser desbaratados. Ainda que a conjuntura se anuncie de continuidade na crise e na austeridade e as autarquias tenham hoje garrotes que durante décadas desconheceram, a verdade é que
Destaque
Desafio na área da Cultura é exigente
26 OUT | E Tudo o Casamento Levou (comédia), 21.30 horas, preço: 10 € (balcão), 12 € (plateia)
8 OUT | Stacey Kent (música), 21.30 horas, duração: 1h30, preço: 18 € (plateia), 15 € (balcão) A aclamada cantora norte-americana Stacey Kent regressa a Portugal para apresentar o seu novo trabalho “The Changing Lights”. Jay Livingston, três vezes vencedor de Óscares da Academia para Melhor Canção Original, escreveu: “Stacey Kent é uma revelação.
Não há ninguém hoje em dia que possa ser comparado com ela. Tem o estilo das grandes vozes como Billie Holiday e Ella Fitzgerald e canta as palavras como Nat King Cole: claras, limpas com um fraseado perfeito. E isto é do melhor que se consegue”.
Cultura.Sul
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Panorâmica
Eles não sabem nem sonham... Projecto Barril já é uma realidade
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As palavras de António Gedeão que lembram que “o sonho comanda a vida” são mais do que certas quando se fala do Projecto Barril. Assim diz o poema e, também ali, na antiga armação atuneira de Santa Luzia, o sonho comandou os destinos, e a vontade o tornou realidade. É da mente e perseverança de um outro António, Almeida Pires, que nasce a aposta numa revolução naquele que é o território da Praia do Barril. Um reinventar que se quer seja apenas a ponta do iceberg de um projecto em que as palavras de ordem são sinergias, envolvimento da comunidade e visão global integrativa. A Praia do Barril é por si só um local único, cujas potencialidades endógenas poderiam à primeira vista ser tidas como sobejantes para a satisfacção de um entendimento primário daquilo que pode ser o aproveitamento de um território. Mas António Almeida Pires e o Grupo Pedras, proprietário dos empreendimentos turísticos Pedras D’el Rei e Pedras da Rainha, não se ficaram pela elementaridade da análise e conceberam um verdadeiro conceito integrado de reinvenção de um produto eminentemente turístico. Sol, areal e mar a Praia do Barril tem naturalmente e uma infra-estrutura turística e balnear dentro dos moldes tradicionais também já aquele areal de excelência do concelho de Tavira tinha. A inserção dentro de uma reserva natural era um facto, o charme da viagem de mini comboio até ao areal e um enquadramento ambiental de excepção eram ali dados adquiridos. Mas tudo isto basta? Para António Almeida Pires, em declarações ao Cultura.Sul, não. O potencial do Barril é imenso e o aproveitamento que dele se faz exíguo face àquilo que em tese se poderia fazer. Este mote foi suficiente para que António Almeida Pires assumisse a missão de transformar a tese numa realidade palpável que
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será apresentada ao público este sábado, e que é já um projecto em andamento, com mais de um ano de preparação. No terreno estão já a desenvolver o projecto a Comissão Instaladora do Projecto Barril, formada pela Universidade do Algarve, a Câmara de Tavira, a Associação Portuguesa do Ambiente, o Instituto de Conservação da Natureza, o Instituto de Emprego e Formação Profissional, as associações Almargem e Raiz e o Grupo Pedras, e 12 profissionais em regime de estágio com o apoio do Instituto de Emprego e Formação Profissional que, durante um ano, farão do Projecto Barril a sua aposta profissional.
Aliar o conceito à comunidade
Barril e Querença projectos de futuro Na presidência da Comissão Instaladora do Projecto Barril está António Covas, professor da Universidade do Algarve responsável por um projecto de desenvolvimento integrado do território que já decorre em Querença e cujos resultados têm sido muito positivos. “No Barril a ideia de desenvolvimento do projecto está já a ser desenvolvida e consubstanciada na prática pelos estagiários que acompanharão cada uma das fases de implementação e que, simultaneamente, são responsáveis por propostas e soluções que tornem o projecto cada vez mais ambicioso e consolidado”, refere Almeida Pires. Os 12 profissionais seleccionados para integrarem o projecto, dominam áreas tão diversas como a Biologia Marinha, Aquacultura e Pesca, o Planeamento Urbano e Territorial, a Arqueologia, a Arquitectura Paisagista, a Engenharia Civil, as Ciências do Mar e a Geomática, a Agronomia e a Gestão Ambiental, bem como, a Gestão, as Relações Internacionais, as Artes Visuais e a Engenharia Alimentar. Multidisciplinaridade para um projecto multifacetado
e à competitividade de outros destinos, nomeadamente, na bacia do Mediterrâneo onde esta oferta ainda não está explorada de forma eficiente. Aliada a esta oferta está também a ideia de atrair ao Barril um outro tipo de turista, ligado ao nicho de observação de aves, potenciando o facto de se estar dentro de uma reserva natural com excepcionais potencialidades no campo da avifauna. Por outro lado, também a flora única da Ria Formosa e a sua fauna em termos gerais não serão esquecidas pelo Projecto Barril.
A equipa por detrás do Projecto Barril que quer aliar ao turismo de sol & mar uma miríade de outras respostas para os mais diversos públicos e que, de uma assentada quer lado-a-lado turismo e ciência, visitantes e comunidade local, lazer e património, aproveitamento dos recursos marinhos e agricultura, ambiente e gastronomia, história, arte e muito mais. Uma oferta diferenciada O património edificado da antiga armação do Barril está apto a ser uma valência polifacetada, capaz de dar acolhimento a várias iniciativas que podem ocupar o espaço da Praia do Barril e que permitem antecipar uma resposta eficiente ao combate à sazonalidade que grassa no turismo algarvio como uma praga capaz de dizimar aquele que é o principal potencial da região. O que se propõe no Projecto Barril é que se crie uma oferta diferenciada a nível regional e que este possa ser um projecto piloto para uma nova concepção daquilo que pode ser o aproveitamento das potencialidades da região.
“ESPECTÁCULO COM SEU JORGE” 11 OUT | 22.00 | Portimão Arena Para além de interpretar temas do novo disco, intitulado “Músicas para Churrasco nº 2” , o cantor e compositor promete incluir no alinhamento do concerto canções bem conhecidas
A aposta no mar e nos recursos marinhos, com a criação de uma estação náutica, com uma oferta de serviços ao longo de todo o ano e nas mais variadas áreas, como o mergulho, a vela, o kitesurf ou a pesca desportiva, entre tantas outras actividades, é um dos passos fundamentais do projecto. As estações de sky são um pólo turístico de primeira linha e o que se quer no Barril é o mesmo no que toca às actividades ligadas ao mar. O aproveitamento das construções da armação do Barril para acolherem exposições, mostras, encontros e reuniões, entre outros eventos, é outras das apostas do projecto que assim alia a vertente cultural ao conceito. Mas cultura é também património, material e imaterial, e neste campo o próprio edificado da armação do Barril é em si mesmo património a preservar e conservar, bem como o é, a história de um local associado a uma arte de pesca que durante anos foi fundamental para a região. Também aqui o Projecto Barril aposta em desenvolver um discurso museológico, mas não só, capaz de ser uma mais-valia
para a ideia de reinvenção daquela unidade territorial A desejada atribuição a Portugal, com Tavira à cabeça, da classificação como património imaterial da humanidade no âmbito da dieta mediterrânica é outra das mais-valias a explorar. Trata-se de valorizar a classificação da UNESCO em termos regionais e nacionais e com isso trazer valor acrescentado ao projecto com integração da gastronomia, cultura, tradições, usos e costumes, mas também do modo de vida associado ao conceito de dieta mediterrânica. O turismo sénior e acessível são outras duas áreas que se querem determinantes neste projecto. Tornar o Barril um destino de eleição para estes dois nichos do mercado global de turismo é uma ambição que António Almeida Pires quer ver conquistada em pleno. Trata-se de dois mercados potenciais de turismo que são certamente, uma vez aproveitados, um acréscimo de competitividade do Algarve enquanto destino turístico de referência na Europa e uma das respostas mais eficientes à sazonalidade
O Projecto Barril não se esquece do continente só porque está sedeado numa ilha. A oferta de alojamento sustentáculo, também ela, de todo o projecto está garantida pelo empreendimento Pedras D’el Rei, que garante resposta nesta área, mas acima de tudo o que os promotores da ideia desejam é que Tavira ganhe com esta ideia e muito em particular Santa Luzia, a comunidade mais próxima do Barril. Não se pode pensar o território sem pensar as suas gentes e envolvê-las na sua reinvenção e no desenvolvimento sustentável e integrado do seu potencial e assim se faz em grande medida o futuro do próprio Projecto Barril. Santa Luzia é uma comunidade âncora para o desenvolvimento de todo este conceito e a ligação entre o projecto e as pessoas é determinante na óptica dos responsáveis. Há um mundo de ideias que podem crescer dentro e a partir do Projecto Barril e a abertura dos promotores é completa, não se trata de um conceito fechado, mas antes de algo que se quer evolutivo e agregador por que na armação do Barril um futuro diferente já se começou a desenhar fazendo desse futuro um presente feito de desafio. Ricardo Claro
“A MAGIA DA MÚSICA CELTA IRLANDESA” 4 OUT | 21.30 | Centro Cultural de Lagos As canções de Linda Scanlon transportam o público pelos campos verdes da velha Irlanda, pelos seus pubs regados com música tradicional e por temáticas tão duras como a emigração massiva para a América
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Cultura.Sul
Letras e Leituras
Gabo - eterna memória
Paulo Serra
Investigador da UAlg associado ao CLEPUL
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Escrevo hoje sobre um escritor de eleição que me marcou na minha tenra juventude desde as suas primeiras linhas e que, infelizmente, tendo hoje cerca de 86 anos não mais voltará a escrever, por motivos de saúde. Gabriel García Márquez foi o pai do realismo mágico e laureado com o Prémio Nobel de Literatura em 1982, nomeadamente por uma obra que ainda hoje faz correr muita tinta: Cem Anos de Solidão, que deu um grande impulso ao chamado boom da literatura hispano-americana, fazendo com que o Velho Mundo passasse a ler toda uma nova geração de autores da América do Sul. Na escrita de García Márquez sente-se como a magia invade o real e rege as leis da natureza, em que os eventos fantásticos se tornam extraordinários junto de uma comunidade mítica, a célebre Macondo, que parece viver parado num período medieval, mais ou menos no século em que os conquistadores espanhóis chegaram àquelas paragens. A Macondo de Gabriel García Márquez, uma alegorização do espaço que representa todo o continente sul-americano, é o palco da acção da sua obra de estreia, A Revoada, sendo depois retomada em Cem Anos de Solidão, numa tentativa de retratar nessa povoação o percurso histórico, social e político da América Latina, bem como em Ninguém Escreve ao Coronel, perfazendo neste tríptico o chamado «ciclo de Macondo». Por outro lado, no seu conto «A incrível e triste história de Cândida Eréndira e da sua Avó Desalmada» desenvolve-se a história dessas duas personagens que tinham já aparecido num episódio de Cem Anos de Solidão. Mas, se lermos bem certas passagens dessa principal obra de García Márquez, podemos perceber como o extraordinário não é tão pacífico quanto isso: «Mal tinham começado quando Amaranta reparou que Remedios, a bela, estava transparente, com uma palidez intensa. (...) Fernanda sentiu que um delicado vento de
luz lhe arrancou os lençóis das mãos e desdobrou-os em toda a sua amplitude. Amaranta sentiu um tremor misterioso nas rendas dos seus saiotes e tentou agarrar-se ao lençol para não cair, no momento em que Remedios, a bela, começava a elevar-se. Úrsula, já quase cega, foi a única que teve serenidade para identificar a natureza daquele vento irreparável.» (p. 185). A anunciar este episódio, não só existe um intróito de tamanho bastante considerável, com cerca de duas páginas, acerca da natureza singular da
encarada pelos outros como idiota, como um «milagre» ou «prodígio», ainda que no decurso da narrativa outros eventos igualmente estranhos sejam facilmente aceites. Pode, portanto, haver convergência desses dois mundos, pode até haver aceitação, mas não se exclui, totalmente ou em parte, uma aura de estranhamento. Gabriel García Márquez justifica o realismo mágico como uma realidade ontológica das Caraíbas, um espaço que já é por si próprio um compósito de mestiçagem e hibridismo, onde as-
noite após noite com as suas histórias de além-túmulo.» (p. 87). Gabriel García Márquez responsabiliza assim esta matriarca pelo seu realismo mágico ou mítico, visto que, atendendo às suas palavras, o autor colombiano defende não ter criado nada de verdadeiramente original, d.r.
Gabriel García Márquez foi Nobel da Literatura personagem como se alerta para um volteface, onde predominam os vocábulos (aqui sublinhados) que contribuem para reforçar a aura de mistério ou de sobrenaturalidade. Linhas depois, como que para confirmar que este evento tem muito pouco de natural, ao contrário do que seria suposto no realismo mágico e contradizendo a ideia assente de que os autores mágico-realistas defendem uma ausência ou imparcialidade por parte do autor-narrador, para quem o mágico seria sempre tomado como possível e plausível. Ressalve-se também que ainda na história se falará desse acontecimento como algo de positivamente extraordinário, a que os forasteiros se referem como «patranha» enquanto outros pensam na ascensão aos céus dessa criatura,
sume a importante herança africana: «No Caribe, ao qual pertenço, misturou-se a imaginação transbordante dos escravos negros africanos com a dos nativos pré-colombianos e depois com a fantasia dos andaluzes e o culto dos galegos pelo sobrenatural. Essa capacidade de olhar a realidade de certa maneira mágica é própria do Caribe.» (Plínio Apuleyo Mendoza, O Aroma da Goiaba, p. 89). Gabriel García Márquez, em entrevista, acerca da influência que a leitura de A Metamorfose de Kafka teve em si, desde as primeiras linhas, exclama mesmo: «Porra - pensei - assim falava a minha avó.» (p. 86). O autor refere diversas vezes a avó enquanto uma grande influência igualmente decisiva na sua obra: «era uma mulher imaginativa e supersticiosa, que me aterrorizava
“OSSOS QUE CONTAM HISTÓRIA” Até 25 JAN | Museu Municipal de Tavira - Núcleo Islâmico Exposição dá a conhecer, entre outros aspectos, o esqueleto de peixes, anfíbios, répteis, mamíferos e aves, o seu modo de locomoção, a sua dentição…
tendo antes repescado no tesouro da mitologia local caribenha: «Para ela, os mitos, as lendas, as crenças das pessoas, faziam parte, e de forma muito natural da sua vida quotidiana. Pensando nela, apercebi-me de imediato que não estava a inventar nada, mas simplesmente a captar e a referir um mundo de presságios, de terapias, de premonições, de superstições (...).» (p. 99). A ideia de um mundo pautado por um pensamento típico da Idade das Trevas ecoa ainda em diversos momentos de colapso, próximos de um Juízo Final apocalíptico, como quando a obra Cem Anos de Solidão termina com o desaparecimento de Macondo da face da terra, da mesma forma que se foi assistindo a horrores como o massacre da companhia bananeira, baseado num
facto verídico que terá ocorrido em Ciénaga, em 1928, uma cidade localizada a norte de Aracataca, terra-natal do autor. É ainda emblemática a recorrente frase de Úrsula em Cem Anos de Solidão: «o tempo corre em círculos», especialmente numa saga familiar em que Arcadios e Aurelianos se vão sucedendo ao longo de gerações, como se fossem sempre ressurreições dos seus antepassados, com certas marcas características. A confusão gerada pela profusão dos nomes foi de tal ordem que em certas edições em castelhano se incluíram árvores genealógicas desta família. As metáforas ganham vida na escrita deste colombiano, a que acresce o realismo da descrição, como o rasto de sangue de José Arcadio Buendía: «Assim que José Arcadio fechou a porta do quarto, o estampido de uma bala ressoou pela casa. Um fio de sangue passou por debaixo da porta, atravessou a sala, saiu para a rua, seguiu um curso direito pelos passeios desirmanados, desceu escadinhas e subiu parapeitos, passou ao largo pela Rua dos Turcos, dobrou uma esquina à direita e outra à esquerda, virou em ângulo recto em frente da casa dos Buendía, passou por debaixo da porta fechada, atravessou a sala de visitas rente às paredes para não sujar os tapetes, continuou pela outra sala, evitou numa curva larga a mesa da sala de jantar, avançou pelo corredor das begónias e passou sem ser visto por baixo da cadeira de Amaranta que dava uma lição de Aritmética a Aureliano José, enfiou-se pelo celeiro e apareceu na cozinha onde Úrsula se preparava para partir trinta e seis ovos para fazer o pão./- Ave-Maria Puríssima! - gritou Úrsula.» (p. 107).
“ARQUITECTURA EM PERCURSO” Até 15 OUT | Teatro Municipal de Portimão Exposição apresenta fragmentos significativos do percurso criativo de alunos que são hoje arquitectos dos espaços algarvios e de investigadores do Mestrado Integrado em Arquitectura (MIA) do ISMAT
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“Instalação pública bicicleta MENINA e MENINO” Portimão Foto de Vítor Correia PUB
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Cultura.Sul
Contos de Outono na Ria Formosa
A última visita de Álvaro de Campos a Tavira «(…) pus em Álvaro de Campos toda a emoção que não dou nem a mim nem à vida» Fernando Pessoa d.r.
Pedro Jubilot
pjubilot@hotmail.com canalsonora.blogs.sapo.pt
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Quando apertam as saudades da terra natal ao sul, onde também um rio encontra o seu mar, Fernando Pessoa mete-se frequentemente pelas ruas da baixa abaixo, até vislumbrar o rio que ali desagua num terreiro. Mas só isso não lhe basta para se encher de emoções. Vai parando pelas casas de vinho que encontra pelo caminho, e vazando copos com quem como ele se encosta aos balcões da vida por ali. Quando chega ao Martinho da Arcada, já quase a sede o matou. Envenena os amigos de tertúlia com poesias infantis, é o que eles dizem. Para ele, multifacetado criador de personagens, estes versos são tão bons como os outros. Isso diverte-o muito, mas desagrada-os a eles que esperam do poeta as grandes coisas a que os acostumou. Depois, já quase sem forças assoma-se ao grande rio, descendo os largos degraus de pedra do cais das colunas, onde se estacam dois simples obeliscos que marcam uma partida ou uma chegada. Ou apenas uma passagem, ou uma meta tão só, corrigiria ele. No entanto chega ali já muito cansado. Talvez assim consiga dormir melhor no comboio descendente. De Lisboa ao Algarve. Vai só pegar a mala de viagem. Na estação de Loulé, enquanto o comboio pára para largar e receber passageiros, entra um cauteleiro que o acorda numa cantilena. O homem vai soltando os números que se queriam da sorte, intercalados de uma poesia que parece improvisada a irónicas palavras vindas de um coração repleto de dor. Numa verdade dita de forma simples e acutilante, em quadras que embora de entendimento popular revelavam um conhecimento prático de vida. Gostava de lhe ter dito que arranjasse alguém que as escrevesse caso ele não soubesse. Assim estremunhado, pareceram-lhe boas, as que reteve: «O homem sonha acordado/Sonhando a vida percorre/E desse sonho dourado/Só acorda, quando morre!»; e «Sem que o discurso eu pedisse,/Ele falou; e eu escutei./ Gostei do que ele não disse;/Do que disse não gostei.». Da janela do trem já em andamento,
A Ponte Romana em Tavira perguntou-lhe o nome. Qualquer coisa Aleixo, foi o que conseguiu perceber. Desta vez decide fazer uma paragem na vila da restauração. Sai do comboio em Olhão para visitar o genial Dr. Francisco Fernandes Lopes, um extraordinário intelectual do seu tempo, que vivia ali. Disse-lhe dele Almada Negreiros: ‘Ele está, para mim, no meio da primeira fila dos que estão à frente disto tudo.’ Na troca de novidades e leituras, Pessoa perguntou ao seu anfitrião por João Lúcio, do qual lhe dera a conhecer um dos seus livros, em tempos lá na cidade. Ficou consternado ao receber a notícia de que o poeta, esse também ilustre advogado olhanense, tinha já falecido vítima da gripe pneumónica. Pena, teria gostado de o conhecer. Confessa ao amigo que é ao seu poema ‘A Dor das Pedras’: « (…)E ninguém sabe ver que pode o infinito/ Duma dor existir numa pedra do chão;/Que pode acontecer que um palmo de granito /Sofra, por vezes, mais que um grande coração. (…)», que Alberto Caeiro se refere quando diz no poema XXVIII: «Li hoje quase duas páginas/Do livro d› um poeta mystico (…)/ Porque os poetas mys-
ticos dizem que as flores sentem/E dizem que as pedras teem alma/E que os rios teem extases ao luar.// Mas as flores, se sentissem, não eram flores,/ Eram gente;/E se as pedras tivessem alma, eram cousas vivas, não eram pedras;(…)». Ao ouvir essa revelação, Francisco Lopes levou-o a passear até aos pinheiros de Marim, na zona leste de Olhão, onde ficou fascinado com a concepção que o próprio João Lúcio dera ao seu chalé, um belo exemplo de arquitectura simbolista em Portugal, do qual só conhecia a Quinta da Regaleira na sua amada Sintra. A obra impressionou-o. Pediu ao amigo que lhe mostrasse mais poemas dele e quis saber mais sobre a sua vida. Mais tarde o olhanense leu-lhe o poema ‘O Meu Algarve’. A conversa continuou até de madrugada. As aguardentes de medronho e figo deliciaram Pessoa. Como sempre tentou convencer o Dr. Lopes a passar uma temporada em Lisboa para coordenar estudos, lançamentos de revistas e organizar saraus, junto do seu grupo de amigos. Mas Francisco não queria abandonar a família e a sua terra. Tentou explicar a Pessoa os efeitos do inspirativo êxtase do cheiro da salmoura, a inconstância leve da brisa
“PEQUENAS E GRANDES MARAVILHAS DA NATUREZA” Até 9 OUT | Centro Autárquico de Quarteira Mostra fotográfica retrata algumas espécies botânicas e borboletas que se encontram nas Paisagens Protegidas Locais da Rocha da Pena e da Fonte da Benémola, do concelho de Loulé
do mar levantino, e a vista contrastiva que tinha dali das açoteias e mirantes, para o cerro de S. Miguel ou para as ilhas barreira na ria. Pela manhã foram às praças. Lopes mostrou-lhe o barco caíque, contando-lhe a aventura dos olhanenses que nele velejaram ao Brasil. Ficou impressionado com o movimento daquela pequena vila marítima. Depois subiram a larga avenida a caminho da estação desembocando num jardim. Mestre Caeiro teria expressado algo sobre a beleza daquele espaço e talvez percebido melhor o malogrado poeta João Lúcio. Embarcou com destino à bela e adormecida, a antiga, importante e histórica cidade de Tavira, a ‘Veneza algarvia’. Chega e começa a sentir à medida que vai tomando notas. Rabisca: «Cheguei finalmente à vila da minha infância./Desci do comboio, recordei-me, olhei, vi, comparei./(tudo isto levou o espaço de tempo de um olhar cansado).Tudo é velho onde fui novo». Pára diante da paisagem e continua a recordar transportando-se para uma vivência da sua infância algarvia: “Meu horizonte de quintal e praia!”; “Na nora do quintal da minha casa o burro anda à nora, anda
à nora / E o mistério do mundo é do tamanho disto”. Quem o vê passar reconhece o Álvaro de Campos que nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890. É engenheiro naval por Glasgow. Foi criado à imagem e semelhança de Pessoa. Desde o seu retrato físico (1,75 de altura, mais dois centímetros do que ele) à sua vida: «…O que conquistei? Nada./Nada, aliás, tenho a valer conquistado.». E ei-lo ali na sua cidade observando a paisagem vista da mesa do café que convoca um «Chá com torradas na província de outrora(…) Na ampla sala de jantar das tias velhas», no largo da Alagoa defronte à antiga igreja da Nª Srª da Ajuda. Mas o homem de gabardine cinzenta levanta-se, e sente: «Trago o meu tédio e a minha falência fisicamente no pesar-me mais a mala.». Atravessa a pé pela velha ponte romana sobre o rio de uma maré-baixa. Olha pró lado da barra e pressente ao fundo: «Ah, as praias longínquas, os cais vistos de longe,/ E depois as praias próximas, os cais vistos de perto.». Vira para um jardim de palmeiras que no meio tem um coreto vindo da fundição do ouro no Porto. Na residencial Sequa, o homem que de roupa interior branca acende um cigarro, aparece reflectido no espelho do guarda-fatos, como um tipo judeu vagamente português de cara rapada. Da janela do seu quarto observa a mulher que chega num carro preto e sai apressada fugindo da chuva oblíqua. Toca a campainha e sobe. Quer saber qual a porta do quarto do Sr. Engº. Bate e ele abre-a. Traz cartas, mapas e projectos. E também alguns livros. Cumpre-se o encontro. De novo só, o homem alto e magro de cabelo liso aparado, tem febre e escreve: «cada rua é um canal de uma Veneza de tédios», a frase solitária que surge na folha logo que premidas as teclas da máquina Royal. A noite levou-lhe o sono mas despeja-lhes os sonhos. «Esta vila da minha infância é afinal uma cidade estrangeira. Sou forasteiro, tourist, transeunte». Às primeiras horas da manhã a cidade está deserta. Chama um carro de praça. O sol já brilha timidamente sobre o pequeno rio do sul. Quer partir para Lisboa, não sem passar pelo cemitério onde repousa a sua grande influência: o tio-avô Jacques C. Pessoa, ‘livre-pensador’, assim mesmo escrito na sua lápide funerária. No cais de embarque crê que esta poderá bem ter sido a sua última visita a Tavira. Mas dizem que por vezes é visto por aí a dormir a vida.
“CONCERTO PELOS VOL. 2” 19 OUT | 21.30 | Grande Auditório do TEMPO – Teatro Municipal de Portimão Banda pop/rock portimonense apresenta o seu álbum de estreia “Viver o entretanto”
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Espaço ao Património
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Sala de leitura
O Lugar da História da Arte no Três livros improváveis conhecimento do nosso Património
Joana Pires
Licenciada em História - variante História da Arte
Muitos se perguntam: o que faz um Historiador da Arte? O que faz? Pinta quadros? Executa esculturas? Intervém em escavações com os Arqueólogos e procura os vestígios do passado? No Portugal do século XXI, a profissão/formação do Historiador da Arte ainda se encontra pouco difundida num contexto onde os lugares dos técnicos de Património se encontram generalizados. Assim, poderemos facilmente identificar quais os propósitos de um Arqueólogo, de um Historiador, de um licenciado em Património, quanto ao Historiador da Arte, essa profissão/formação elitista que em pouco se associa ao sentido lato da palavra PATRIMÓNIO, fica a pairar no imaginário comum, onde se associam estes profissionais a técnicos de um Louvre em Paris, um MOMA em Nova Iorque ou o Palácio Pitti em Florença, mas sem lugar próprio no mercado de trabalho nacional. Em Portugal, estes profissionais, passam muitas vezes despercebidos, integrados em organismos públicos e privados ou em museus e que trabalham sobre as questões do Património, sobretudo edificado e móvel. Mas que preparação real possuem? Os Historiadores da Arte possuem uma formação de um tronco comum, a História, que se complementa com as disciplinas de Arte e outras completares ao estudo da História e a partir das quais se encontram capacitados para classificar, analisar objetos, artefactos e património artístico à luz do seu contexto histórico. Comummente associam o seu trabalho à arquitetura, como arte maior, ao estudo do imóvel histórico ou à pintura pelo peso que esta desempenha no contexto Europeu e dos mercados de Arte. Todavia, estes profissionais deverão contactar directamente com obra de arte num todo, tratando-se de uma Igreja ou um machado de pedra polida, uma arquitectura vernácula ou um edifico régio, fazendo a sua análise interdisciplinar com os Arqueológos e potenciando desta forma o conhecimento mais vasto da peça/monumento, através do enquadramento histórico, da ligação primordial entre o seu “encomen-
dante” ou de quem dela usufruiu, do ambiente que rodeava essa peça-objecto e quais os propósitos da sua execução/produção. Não nos esqueçamos que as grandes encomendas artísticas serviram vários propósitos ao longo de milénios. Propósitos individuais, de grupo restrito e elitista, de comunidade e, numa análise mais globalizante propósitos de propaganda política dos vários Regimes ao longo da História. Habituamo-nos ainda, a estabelecer uma relação relativamente à análise estilística e histórica de um d.r.
Pormenor da Vénus de Brassempouy quadro ou de um fresco como Arte dominantemente Europeia. A estes profissionais foi-lhes dado peso no contexto internacional dos grandes Museus dos vários centros Europeus de Arte. No entanto, a realidade Portuguesa e do Património Artístico Português em nada se pode igualar, quer na sua complexidade regional, quer na sua heterogeneidade geográfica, devendo o Historiador de Arte português integrar uma equipa de investigação in situ, ou uma equipa de Museu, quer estejamos a falar de Museus de Arte, Museus de Sítio, Museus Municipais ou Museus de Arqueologia. Esta abertura irá potenciar o
entendimento entre objeto e espectador/intérprete da obra, através da utilização de um discurso Museológico que realce a importância da peça enquanto objeto vivo, transmissor de uma mensagem, de uma linguagem própria e capacitado de encetar um diálogo com o seu visitante, afastando a imagem de mero objeto artístico de grande valor pecuniário. Já ao falarmos em trabalho de campo, o profissional de Arte poderá contribuir para a classificação de elementos arquitectónicos provenientes de escavações, de ruínas ou de locais abandonados. Com estes trabalhos, o conhecimento, a proteção e salvaguarda do património ganhará um relevo diferente com base em enquadramentos científicos de época histórica, de estilos artísticos ou de técnicas utilizadas que poderão estabelecer e correlacionar com paralelos extrafronteiras. Num âmbito mais alargado de Património Cultural Imaterial interessa ao Historiador de Arte, sobretudo, a procura mais aprofundada do conhecimento das relações emotivas e sociológicas no contexto de cultos, tradições que se personificam na manufatura através de objetos materiais e manifestações imateriais do quotidiano das populações. Poderemos, no final, fazer um reconhecimento destes profissionais e integrá-los na realidade portuguesa das várias ciências que se encontram à disposição do conhecimento, da investigação e da salvaguarda patrimonial com o devido alcance? Poderemos nós canalizar estes profissionais, ainda que inconscientemente, para um espaço pouco arrumado em que não se sabe muito bem do que se trata ou, em última análise, deslocá-los para espaços e funções definidas apenas ao nível das grandes metrópoles sem aproveitarmos o seu contributo internamente? Poderá o país e regiões como o Algarve demarcar-se da responsabilidade de aproveitamento de recursos qualificados sem verdadeiramente conhecer a especificidade da sua formação e atribuir-lhes competências no estudo, proteção, salvaguarda e divulgação do Património no seu todo? Deveremos questionar-nos sobre qual o lugar da História da Arte e o seu contributo para o verdadeiro conhecimento do nosso Património? Reflitamos então e reaproveitemos estes técnicos já formados e os que todos os anos concluem as suas licenciaturas e especializações. Ganha o Património, ganham as suas gentes e o reconhecimento do País enquanto criador de capacidade técnica e científica nas áreas das disciplinas Humanas, Sociais e Artísticas.
Paulo Pires
Programador Cultural no Departamento Sociocultural do Município de Silves
Nesta rentrée deixo três sugestões de leitura que podem constituir, pela suas abordagens e temáticas sui generis, boas estratégias para seduzir os mais cépticos, acomodados ou indiferentes, no sentido de uma maior aproximação (por uma via mais descontraída e informal) ao mundo dos livros. Começo por destacar a obra Nascido para mandar – guia prático para chegar ao Poder em Portugal, de José de Pina (Produções Fictícias/Gradiva). Se há livros positivamente out-of-the-box, este é sem dúvida um deles. Num original misto de rigor, ironia, sátira e desconcerto, o autor – reconhecido especialista em humor político veiculado pelos media – revisita os bastidores ora mais desnudados ora mais insondáveis dos universos político e futebolístico (e suas solidariedades e promiscuidades), as perversidades e contradanças de um regime (tido) democrático e, assim, as melhores estratégias para atingir uma efectiva posição de relevo nessa realidade que parece ter tanto de séria e formal como de cómica e hilariante. Trata-se também de uma incursão pela nossa capacidade de nos rirmos de nós próprios, pois “o humorismo alivia-nos das vicissitudes da vida, activando o nosso senso de proporção e revelando-nos que a seriedade exagerada tende ao absurdo” (Charlie Chaplin). Pelo meio, há conselhos práticos (o mamar e chuchar, as cambalhotas, os beijinhos, as petas, birras e os amigos imaginários…) para pais que querem que os seus filhos comecem cedo a ganhar sede de poder. Os locais onde comer, comprar roupa, adquirir viatura ou descontrair também não são esquecidos (com exemplos concretos de Lisboa e do Porto), sendo aqueles tipificados segundo a intenção de se ser conotado com a esquerda, o centro ou a direita (há ainda as modalidades mistas). Os desportos a adoptar, a relação com as mulheres (ter, não ter, ter muitas), os amigos
Um livro humorístico tremendamente sério a privilegiar, bem como as regras de conversação e comportamento também não fogem à lupa atenta, quase científica e tremendamente real do autor. Sublinho ainda a apresentação dos códigos de ética do político e do dirigente de futebol, de que realço dois dos mandamentos do político: os primeiros cinco dias de férias devem ser sempre, mas sempre, no Algarve, e depois pode ser noutro sítio qualquer; e nos comícios da rentrée os oradores devem envergar um blusão desportivo ou um pullover pelos ombros, e devem dizer várias vezes no discurso: “Vamos trabalhar”. Ficamos ainda a saber que há, grosso modo, três tipos de personalidade política: o Verbo-de-encher, o Espalha brasas e o Idiota útil, detalhadamente caracterizados, havendo inclusive um teste que cada leitor pode preencher para descobrir o seu perfil. Uma nota final para o “utilíssimo e criativo” conceito de irresponsabilidade subjectiva. Vale a pena ler atentamente este capítulo, que frisa a importância de ter sempre à mão um bom punhado de desculpas esfarrapadas (e singularíssimas) para defesa perante diferentes tipos de acusações. No fim da obra percebemos ainda como se deve morrer (há vários cenários conforme o efeito pretendido) para se ficar com nome de rua, jardim, escola, pavilhão gimnodesportivo, estádio ou aeroporto. Recomendo ainda duas obras únicas: A arte de dar peidos (ensaio teórico-físico e metódico), de Pierre-Thomas-Nicolas Hurtaut (editora Orfeu Negro); e A arte de pagar as suas dívidas e de satisfazer os seus credores sem gastar um cêntimo, de Honoré de Balzac (editora Nova Delphi).
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Cultura.Sul
Na senda da Cultura
Orquestra Clássica do Sul define programação da temporada A nova temporada da Orquestra Clássica do Sul (OCS) foi apresentada em Lisboa à comunicação social, numa sessão em que o maestro titular, Cesário Costa, deu a conhecer os perfis de evolução da OCS para a próxima temporada naquele que é o primeiro ano da orquestra que herda toda a história e responsabilidade da Orquestra do Algarve. Como o Cultura.Sul noticiou na última edição, agora com um território que se estende a todo o sul do Tejo, da OCS espera-se mais e melhor e maior responsabilidade, quer pela dimensão, quer pela abrangência. E a resposta não se faz tardia com a orquestra a agigantar-se para dar cumprimento ao seu novo desígnio fruto de um crescimento que lhe era mais do que natural. Assim, a OCS estende os seus concertos a todo o Alentejo e à Península de Setúbal, bem como, a terras da Andaluzia no cumprimento de um desígnio europeu de uma verdadeira União Europeia das regiões
d.r.
e leva até novas paragens não só os concertos carregados de erudição e mestria, mas também as actividades pedagógicas, educacionais e formativas e desafia todos a cooperarem no desenvolvimento da música como parte integrante da cultura e, mais do que isso, da própria vida. Novidades Entre as novidades, Cesário Costa, em declarações ao Cultura.Sul, realça a criação dos lugares de embaixadores da OCS. António Zambujo, músico, Nuno Júdice, ensaísta, poeta e ficcionista algarvio, e José Huan Diaz Trillo, escritor e político andaluz, são os primeiros ‘porta-estandarte’ da orquestra. “Temos de ser o mais imaginativos possível e estabelecer, cada vez mais, pontes com outras correntes artísticas” diz o maestro titular que vê na colaboração com estas personalidades uma mais-valia preciosa para a OCS. O maestro dá exem-
Cesário Costa apresentou a programação plos, com António Zambujo terão lugar concertos em parceria, que mostrarão novos arranjos para as músicas do cantor e com Nuno Júdice pretende-se reinventar as composições de poemas já hoje musicados de sua autoria.
Plataforma cultural Território de encontros é o que Cesário Costa pretende fazer da OCS e da sua intervenção no todo cultural, espaço para o cruzamento de artes e de artistas e de grande
divulgação da música, muito para além do irrepreensível trabalho da orquestra na área da música erudita. A OCS vai cruzar-se com a Orquestra de Jazz do Algarve, encontrar-se com músicos de outros géneros, manter os concertos promenade e as idas às escolas para mostrar aos mais miúdos uma das mais belas formas de arte que a humanidade foi capaz de criar. A par disto, e numa visão que antecipa muito trabalho e dedicação, lugar para os habituais concertos de Ano Novo, Natal e abertura do Ano Académico da Universidade do Algarve, bem como para os ciclos de música Barroca, Americana e Sacra e, ainda, para os prestigiados concertos Caixa Geral de Depósitos. A fechar as novidades uma parceria estrita a encetar com a Universidade de Évora e com o seu curso de música e espaço ainda para um concurso internacional para jovens maestros e outro para jovens solistas a par de um atelier para novos compositores. Uma rentrée em tudo promissora, porque afinal a música, como o saber, não ocupa lugar. Ricardo Claro
“Que gestão para os museus atuais?” em debate no Castelo de Loulé “Que gestão para os museus atuais?” foi o tema da Mesa Redonda organizada pela Associação Portuguesa de Museologia (APOM) em parceria com a Direcção Regional de Cultura do Algarve, contando com o apoio do município de Loulé na cedência do espaço para o evento. A mesa foi constituída por elementos com forte ligação à museologia, tais como, José d’Encarnação, professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e administrador do fórum Museum, Dália Paulo, museóloga e directora regional de Cultura do Algarve, José Gameiro, director do Museu de Portimão e júri do Fórum Europeu de Museus, Alexandra Gonçalves, vereadora da Cultura da Câmara de Faro e professora da Universidade do Algarve, e Emanuel Sancho, director do Museu de São Brás de Alportel e representante do Minom Portugal. APOM foi anfitriã do encontro A APOM esteve representada pelo seu vice-presidente, Pedro Inácio, e pela delegada regional do sul, Maria Luísa Francisco, que referiram que esta iniciativa “teve
fotos: d.r.
museus, a inovação e criatividade, as experiências museológicas em espaços urbanos e rurais, a função social dos museus e a ligação entre turismo e museus, nomeadamente a importância do envolvimento activo do turista na experiência museológica.
Profissionais em debate A assistência foi composta maioritariamente por profissionais de museus, elementos da Rede de Museus do Algarve (RMA) e ainda elementos de museus do Baixo Alentejo.
Os especialistas que orientaram o debate como principal objectivo o debate sobre as possíveis e inovadoras formas de gestão dos museus actuais, tal como, a reflexão sobre as potencialidades dos espaços museológicos, contratempos, metodologias, processos e práticas vivenciadas”.
A mesa redonda foi aberta a todos os públicos, não obstante o direccionamento em especial para os profissionais de museologia, tendo a partilha de experiências profissionais nesta área focado também os desafios da gestão privada de
Vista da assistência à mesa redonda em Loulé
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Cultura.Sul
Da minha biblioteca
«Uma página está cheia de caminhos.» António Ramos Rosa, pelas suas palavras As palavras inscrevem-se sobre o muro da mão só as letras sobrevivem sobre o muro a boca busca a boca branca do corpo que se dissemina sobre a página.
Escrever é anunciar um corpo que nunca será corpo
O corpo renascerá na folha violenta entre formigas pedras ervas no silêncio voraz na sombra opaca e deslumbrante das palavras?
Adriana Nogueira
Classicista Professora da Univ. do Algarve adriana.nogueira.cultura.sul@gmail.com
Todos os textos que tentei escrever sobre António Ramos Rosa me pareceram insuficientes perante a sua perda. Creio que os leitores desta página me compreenderão. Deixo excertos de poemas e prosa poética, a minha escolha de palavras suas, lidas e relidas na minha biblioteca. Hoje, a palavra é do poeta.
e manter a distância entre o dito e o inominável
(1977) In Boca incompleta, Lisboa: Arcádia, p. 34 d.r.
Diante da folha branca. A tentação de escrever. Porquê? Que tenho eu para dizer? Nada. Talvez nada. Desisto. Não. O papel branco branco. (…) O branco, a página? O branco da página? Uma página está cheia de caminhos. E que caminho escolher que caminho quando não se sabe qual o caminho ou se um caminho nos leva a algum lado?
As palavras vêm de lugares fragmentários de uma disseminação de iniciais de magmas respiradas do odor de gérmen de olhos As palavras podem formar uma escrita nativa de corpos claros
(1986), In Clareiras, Lisboa: Ulmeiro, p.29
Que são as palavras? Imprecisas armas em praias concêntricas torres de sílex e de cal aves insólitas
Quem escreve é uma sombra, quem respira é uma sombra? O corpo não respira. Ardem apenas sílabas No vento. Estou vivo na pedra. Entro na página E sob a cinza atinjo uma palavra nua.
Respirar é abrir na sombra uma sombra e respirar na sombra um corpo de sombra. Ninguém nos vê nem verá jamais. Respirar a sombra viva. (1975) In Respirar a sombra viva, Lisboa: Plátano, p.44
O meu corpo é uma ilha branca com os sulcos das armas e a única música é de areia e de ervas em que a aridez repousa e o ignorado adormece. Uma chuva verde limpa as cinzas e os destroços. O meu verdadeiro nome tem o aroma do iodo e as artérias de argila, mas eu não o pronuncio, apenas o respiro. (1988) In A imagem e o desejo,
Escrever é actualizar a possibilidade de me identificar com este obscuro fluxo que a palavra reaviva no seu silêncio essencial.
Sou somos uma face uma sombra uma sombra uma face.
(1991) In A intacta ferida, Lisboa: Relógio D’Água, p.67
Lisboa: Universitária Editora, p.22
(1981) O centro na distância, Lisboa: Arcádia, p.41
(1984) In Dinâmica Subtil, Lisboa: Ulmeiro, p.10
Ramos Rosa, desenho gráfico em vidro acrílico, de Helder de Carvalho (pormenor)
«Uma frase» Uma frase sem cor mas com o sabor do vento. Uma frase que veio do silêncio da claridade. E agora é o alto sossego na tensão de um dia pleno. Exacta é a fábula que os teus dedos quase tocam. Sob o solo entreaberto os teus lábios solares. Durmo entre folhas, entre braços abertos, em grutas silenciosas. Terra e corpo conjugam-se num só intenso ardor. Escrevo o dia, fonte absoluta, invento o que respiro.
As palavras são travessias brancas faces giratórias elas permitem a ascensão das formas elevam-se estrato após estrato ou voam em diagonal até à cúpula diáfana. As palavras são por vezes um clarão no dia calcinado (1983) In, Gravitações, s.l: Litexa, p.30
Frases frases já não complicadas mas orientadas para a plenitude do ser (1984) Dinâmica Subtil, Lisboa: Ulmeiro, p.94
Agendar
(1987) In No calcanhar do vento, Coimbra: Centelha, p.62
“UMA HISTÓRIA SOBRE MIM” 11 OUT a 22 NOV | Antigos Paços do Concelho de Lagos Pintura e escultura de Helena Björnberg. Em 2009 iniciou a produção em bronze dos projectos de esculturas que estava a desenvolver há vários anos, daí o tema da presente exposição
“SÉRGIO GODINHO APRESENTA CARÍSSIMAS CANÇÕES” 26 OUT | 21.30 | Grande Auditório do TEMPO – Teatro Municipal de Portimão Espectáculo baseado no seu livro de crónicas “Caríssimas 40 Canções...”, evocando alguns dos temas, intérpretes e compositores que marcaram o seu percurso artístico
12 04.10.2013
Cultura.Sul
Os Bens Culturais e o Turismo: um convívio difícil?
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d.r.
Os bens culturais são património nacional e constituem, no seu todo, um recurso de criação de conhecimento, de educação e de riqueza. A sua gestão deve procurar assegurar a prevalência do seu uso público sobre a sua apropriação em prol de interesses particulares. Não sendo fácil o convívio entre a preservação e o respeito pelos bens culturais e as atividades turísticas, constitui um enorme repto gerir o património cultural como um recurso útil para quem se desloca temporariamente para fora do seu local de residência habitual por motivos de ócio. O Turismo algarvio enfrenta atualmente grandes desafios, entre os quais uma absoluta necessidade de qualificação de um destino que, desde os anos 60 do passado século, se tem baseado quase exclusivamente no trinómio sol-mar-praia. Parece hoje consensual que a patente perda de competitividade do Turismo algarvio deve contrariar-se pelo investimento na formação de meios humanos e capacitação dos agentes que operam no setor e pelo incremento de qualidade e diversificação da oferta de produtos com potencial turístico. Nesta segunda vertente, os recursos culturais constituem um incontornável fator de complementaridade do já referido trinómio, que continua a constituir a principal oferta turística da região. Para intervenção prioritária no incremento do uso de visita e de aproveitamento dos bens culturais imóveis para fins turísticos, a Direção Regional de Cultura do Algarve identifica dois segmentos patrimoniais
marcantes da identidade regional: o património de matriz islâmica e o património dos Descobrimentos. É neste sentido que a Direção Regional de Cultura do Algarve tem vindo a desenvolver um trabalho de cooperação com o Turismo do Algarve e com o apoio do Turismo de Portugal em quatro projetos que estarão concretizados no horizonte 2014/15: 1. O projeto de Requalificação e Valorização do Promontório de Sagres, cuja primeira fase procura inverter um inegável processo de degradação daquele que é o principal monumento do Algarve enquanto significado imaterial para a memória coletiva nacional e em termos de projeção internacional do património algarvio, concretizando na sua segunda fase a consolidação do monumento como recurso turístico. 2. O projeto de cooperação transfronteiriça Descubriter, desenvolvido em parceria com a Fundación Nao Victoria (sediada em Sevilha), com o Turismo do Algarve e com os municípios de Vila do Bispo e Lagos, visando a criação e consolidação de uma Rota Europeia dos Descobrimentos a partir dos bens culturais existentes na Andaluzia e no Algarve, verdadeiro berço da expansão marítima ibérica. 3. O projeto de cooperação transfronteiriça Rota de Al-Mutamid, em parceria com a fundação Legado Andalusí (sediada em Granada) e com os municípios de Tavira e Silves e com a Associação de Defesa do Património de Aljezur, aprofundando o potencial cultural do
património de raiz islâmica preservado no Algarve e na Andaluzia Ocidental e consolidando uma das rotas dos «Itinerários do Ândalus», os quais corporizam um grande itinerário cultural reconhecido pelo Conselho da Europa. 4. O projeto circummediterrânico Umayyad / Omíadas, que explora os bens culturais coevos da dinastia que governou o Califado de Córdova até ao século X da nossa era, os quais constituem uma marca de convivência que é, simultaneamente, um dos mais interessantes recursos culturais comuns da Europa do Sul, do Próximo Oriente e da África setentrional. Às entidades públicas, nomeadamente da área da Cultura e do Turismo, compete a boa gestão destes recursos culturais. Mas é nossa convicção que só a dinâmica e iniciativa empresarial dos operadores e agentes turísticos os consubstanciarão em relevantes produtos turísticos. De contrário, nunca passarão de recursos. Os recursos culturais contribuem para a diversificação e qualificação da oferta turística do Algarve, constituindo um fator complementar do trinómio sol-mar-praia. A Direção Regional de Cultura do Algarve tem vindo a desenvolver um trabalho de cooperação com o Turismo do Algarve e com o apoio do Turismo de Portugal em projetos de valorização de dois segmentos patrimoniais marcantes da identidade regional: o património de matriz islâmica e o património dos Descobrimentos. Direção Regional de Cultura do Algarve
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